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LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTO DO GÊNERO POÉTICO-SOCIAL
Lourdes Aparecida Galhardo Peres1
Milton Hermes Rodrigues2
Resumo
O presente artigo tem como finalidade apresentar os resultados da implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica, uma das atividades desenvolvida durante a realização do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. A implementação foi realizada com alunos da 6ª série ou 7º ano, do Ensino Fundamental, no Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, no município de Maringá. A intervenção teve como objetivo principal desenvolver, aprimorar no aluno do 7º ano, o gosto pela leitura de poemas, mais especificamente de poesia social, de modo a incutir-lhe o prazer e o exercício da consciência crítico-reflexiva. Para esse trabalho, foi disponibilizada ao aluno uma coletânea de poemas e de músicas de cunho social, selecionada pela professora PDE responsável pelo projeto e por este artigo. Durante o curso foi elaborado o material didático, denominado Unidade Didática, conforme especificado no projeto de implementação. A finalidade maior foi o ensino da leitura e a interpretação de texto do gênero poético-social. Os princípios teóricos que nortearam o trabalho foram pautados na teoria sócio-interacionista da linguagem, na linha Vygotskiana; a concepção de gênero pautou-se nas ideias de Bakhtin, conforme as Diretrizes Curriculares Educacionais do Paraná (DCEs), e a metodologia empregada foi a sugerida pela Estética da Recepção, teoria de Jauss, dentre outros, a partir dos estudos de Zilberman e Bornini & Aguiar (1993), que, a nosso ver, privilegiam as relações obra/autor/leitor, objeto de nosso interesse. As atividades propostas foram aplicadas em 15 oficinas, de duas horas/aula cada uma, cuja culminância se deu por meio de um sarau na sala de aula, onde os alunos declamaram os poemas estudados e expuseram no mural da sala de aula as atividades sugeridas e realizadas no transcorrer do trabalho. Palavras-chave: Ensino-aprendizagem; Leitura; Interpretação; Poemas Sociais.
1 Professora de Língua Portuguesa da Rede Estadual de Ensino do Estado do Paraná, participante do Programa
de Desenvolvimento Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná – SEED-PR. 2 Professor Dr. do Curso de Letras da Universidade Estadual de Maringá – UEM.
1 Introdução
Com a nossa experiência como professora de Língua Portuguesa na rede
pública do Estado do Paraná, atuando em sala de aula por mais de vinte anos,
notamos que o ensino da leitura do gênero poético, dentro do conteúdo da disciplina
de Língua Portuguesa para o Ensino Fundamental e Médio, é de suma importância
para o desenvolvimento da sensibilidade, criticidade, criatividade e imaginação do
aluno. Podemos até dizer que a poesia ajuda o aluno a descobrir a si próprio, pois
no texto poético estão envolvidos os sentimentos, as emoções, os encantamentos
que proporcionam prazer e lazer ao indivíduo. A poesia ajuda também o aluno a ter
certa independência em relação à língua, pois, segundo Gardner (apud Quevedo
2000, p. 22), não se pode gostar de poesia sem ter pelo menos um certo domínio
dos aspectos da linguagem (fonologia, sintaxe, semântica e pragmática).
Acreditamos que o ensino da leitura do texto poético na escola pode auxiliar a
aprendizagem do aluno de maneira bastante significativa, na ampliação das
habilidades e da sensibilidade linguística do educando, além de favorecer a
criatividade e desenvolver a sua imaginação. Além disso, coloca-o em melhores
condições para ver criticamente o mundo. No entanto, o trabalho com esse gênero
textual tem se mostrado ineficaz, uma vez que, geralmente quando o professor
trabalha esse gênero, é mero pretexto para se ensinarem conteúdos gramaticais.
Desse modo, os educadores acabam criando um distanciamento ainda maior entre o
aluno e o texto poético.
As Diretrizes Curriculares Estaduais - DCEs de Língua Portuguesa (2008),
documento que norteia as práticas pedagógicas da escola pública paranaense,
propõem que se privilegie, na ação pedagógica, o contato real do estudante com a
multiplicidade de textos que são produzidos e circulam socialmente. Não obstante,
está ocorrendo uma interpretação errônea, pois a leitura de textos literários foi
praticamente substituída por textos não literários de tipos diversos e de caráter
utilitário.
As DCEs (2008) do Paraná também orientam a reflexão sobre o ensino da
Língua e da Literatura, quando pregam que é nas aulas de Língua Materna que o
estudante tem a oportunidade de aprimorar sua competência linguística, de forma a
garantir uma inserção ativa e crítica na sociedade. Assim sendo, cabe à escola
pública oferecer ensino de qualidade aos educandos. As DCEs utilizam, em parte, as
sugestões de Silva (2005) quanto à prática de leitura como um meio de princípio de
cidadania, uma vez que o leitor cidadão, ao realizar diferentes práticas de leitura, se
inteira de suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar
mais propenso às conquistas de outros interesses igualmente importantes para a
construção de uma sociedade mais justa e democrática.
Segundo as DCEs (2008), praticar a leitura em diferentes situações requer a
compreensão das esferas discursivas em que os textos são produzidos e circulam,
bem como identificam as intenções e os interlocutores do discurso. Relatam ainda
que é nessa “dimensão dialógica, discursiva que a leitura deve ser experienciada,
desde a alfabetização”. Mencionam também que “o reconhecimento das vozes
sociais e das ideologias presentes no discurso, tomadas das teorizações de Bakhtin,
ajudam na construção de sentido de um texto e na compreensão das relações de
poder a ele inerentes”.
Portanto, uma aprendizagem só poderá ter significado satisfatório quando o
educador puder cativar a atenção dos seus alunos. Desta forma, acreditamos que,
com a leitura do texto poético, o professor poderá obter a atenção e a confiança dos
seus alunos, mas para que eles possam compreender a importância da poesia em
seu cotidiano, é preciso que o professor desenvolva o ensino da leitura desse
gênero na sala de aula. Não há como formar ou descobrir poetas sem trabalhar a
poesia. Uma competência ou habilidade pessoal só é desabrochada quando
trabalhada de forma que permita a desconstrução do olhar banalizado sobre o
assunto em questão e cria-se um novo olhar. Desta forma, trabalhar poesia na sala
de aula é uma ferramenta relevante e indispensável para resgatar o olhar sobre esse
gênero que, na maioria das vezes, é deixado de lado no cotidiano escolar.
Podemos mencionar ainda que, atualmente, a leitura, de modo geral, não tem
sido muito utilizada pelos alunos, visto que a televisão, o rádio e a internet, entre
outros, são recursos muito mais atraentes do que ler um livro, na visão de muitos.
Cabe ao educador despertar nos educandos a arte da leitura, pois ela é o caminho
que conduz o leitor ao conhecimento, à imaginação e à criatividade.
Para estudar poesia é fundamental que se pratique a leitura, para escrever é
preciso imaginação, portanto, sendo a leitura um meio relevante para desenvolver a
imaginação, a sensibilidade e a criatividade do leitor, sua prática deve ser constante
na sala de aula. Pode-se afirmar que o modo como se apresenta a poesia nas aulas,
na maioria das escolas da atualidade, não promove o encontro do leitor com o texto
nem o desperta para o prazer que esse gênero proporciona.
Como despertar o prazer dos alunos pela leitura de poema se o professor não
for o primeiro a ter o hábito de ler? Para o ensino da leitura se faz necessário um
professor que, “além de posicionar-se como um leitor assíduo, crítico e competente,
entenda realmente a complexidade do ato de ler” (SILVA, 2002, p. 22). Não há como
desenvolver na criança o que ela mesma não gosta ou não tem, o hábito de fazer. A
poesia requer sensibilização que será feita pelo docente, o mesmo deve sensibilizar-
se para que possa transmitir deleite aos seus alunos. Não há dúvidas de que o
professor exerce forte influência sobre seus alunos e, se o próprio não cultivar a
prática da leitura, dificilmente conseguirá desenvolvê-la em seus alunos.
Segundo PAES (1996):
...a poesia tende a chamar a atenção da criança para as surpresas que podem estar escondidas na língua que ela fala todos os dias sem se dar conta. Por exemplo, a rima, ou seja, a semelhança de sons finais entre duas palavras sucessivas, obriga o leitor a voltar atrás na leitura. Esta passa então a ser feita não linha após linha, sempre para frente, como na prosa, e sim num ir e vir entre o que está adiante e o que ficou atrás. Com isso, desautomatiza-se a leitura e se direciona a atenção para o conjunto de significados do texto... (PAES, 1996, p. 24; apud Gebara, 2002, p.14).
Essas afirmações deixam claro que a leitura da poesia possibilita uma
ampliação do modo de ler, além de reaver experiências anteriores e mesmo
acrescentar novas experiências que surgem na convivência escolar. A poesia é um
texto literário, um discurso artístico; desta forma, a ausência da leitura do texto
poético na sala de aula implica na não-formação do gosto pelo gênero lírico. Vale
ressaltar que é de grande importância a prática da leitura do poema crítico-social,
pois, além de despertar o senso crítico e poético no aluno, possibilita o
desenvolvimento de uma educação voltada para a sensibilidade, a criticidade e a
cidadania das nossas crianças e jovens, características almejadas por todos os
educadores.
2 Fundamentação Teórica
Nossa atenção neste artigo, cujo objetivo geral é desenvolver, aprimorar no
aluno da 6ª série ou 7º ano o gosto pela leitura da poesia social, de modo a incutir-
lhe o prazer da leitura e o exercício da consciência crítico-reflexiva, está voltada ao
ensino da leitura e interpretação de texto, fazendo um recorte ao gênero poético-
social, objeto do Projeto de Intervenção Pedagógica. Sentimos, como já
mencionamos, que essa prática tem sido abordada na escola de forma superficial ou
mesmo tem ficado em segundo plano. Propomos neste artigo apresentar os
resultados da prática de leitura para os textos poéticos que levem em conta seus
aspectos de textualidade, bem como suas peculiaridades textuais. Assim, o leitor, de
mero decodificador de sentido, será instigado a interagir criativamente com o texto
na leitura literária a fim de compreender efetivamente seus sentidos de forma crítica.
Como este artigo tem a intenção de mostrar os resultados obtidos sobre o
ensino da leitura de textos do gênero poético, no cotidiano da escola, a fim de
contribuir para a mudança de estratégias no ensino do gênero poema, na escola
pública, tornando mais amplo o conhecimento do aluno-leitor sobre o referido
gênero, achamos necessário fazer antes um estudo para melhor compreensão e
embasamento teórico-metodológico.
O Projeto Político-Pedagógico da escola onde foi desenvolvido este estudo,
Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, está embasado nas Diretrizes Curriculares da
Educação Básica do Estado do Paraná - DCEs. As Diretrizes Curriculares de Língua
Portuguesa para a Educação Pública do Estado do Paraná consideram o ensino da
língua materna como “um processo dinâmico e histórico dos agentes na interação
verbal, tanto na constituição social da linguagem quanto dos sujeitos que por meio
dela interagem” (DCEs, 2008, p.50).
Segundo as DCEs (2008), o leitor no contexto escolar “tem um papel ativo no
processo da leitura”. Elas abordam que o leitor “para se efetivar como co-produtor,
procura pistas formais, formula e reformula hipóteses, aceita ou rejeita conclusões,
usa estratégias baseadas no seu conhecimento linguístico, nas suas experiências e
na sua vivência sócio-cultural”. Portanto, a leitura de textos literários - especialmente
a poesia - não pode ser reduzida e fragmentada no ambiente escolar como um
pretexto para se ensinar apenas determinado conteúdo da língua.
Paulo Freire, em sua obra Pedagogia da Autonomia; Saberes necessários à
Prática educativa (2003), ressalta que “ensinar exige corporeificação das palavras
pelo exemplo”, ou seja, o professor deve dar o exemplo a seus alunos. Desta forma
não há como ele (professor) exigir leitura de seus alunos se o mesmo não tiver o
hábito de ler constantemente. Freire propõe que o professor deixe de lado a frase
“faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço”, pois o professor deve ensinar
pelo exemplo, não deve ensinar uma coisa e na prática fazer diferente, por isso,
primeiramente o professor deve desenvolver a prática da leitura em si mesma, para
depois aplicá-la junto aos alunos. É fundamental que o docente conduza o ensino de
poesia de forma prazerosa, despertando a imaginação dos alunos, sem deixar de
lado a seriedade que o estudo exige.
Para Vygotski (1992), "a imaginação é um momento totalmente necessário,
inseparável do pensamento realista." Portanto, deve-se deixar a imaginação dos
alunos fluir, para que assim descubram suas habilidades e o prazer da leitura de
poemas. Para isto o professor deve utilizar métodos e técnicas que permitam o
trabalho da leitura e posteriormente a escrita de poesia. Preferentemente uma
técnica que seja capaz de despertar a sensibilidade e a imaginação do aluno.
Elias José (2003), em seu texto “Tem tudo a ver”, diz que "vivemos rodeados
de poesia". Podemos notar sua presença em músicas, textos publicitários, frases e
outros. Desta maneira, seu estudo se faz necessário para a inclusão posterior de
outros gêneros textuais que estejam interligados à poesia, além dos benefícios de
trabalhar o poema em si. O referido autor afirma que "ser poeta é um dom que exige
talento especial. Brincar de poesia é uma possibilidade aberta a todos” (2003,
p.101).
Fernando Paixão, em seu livro O que é poesia (1982), diz que a “poesia se
caracteriza essencialmente pelo uso criativo e inovador que se faz das palavras,
expressando a subjetividade”. Paixão fala sobre a função do tempo, a poesia e o seu
ritmo, a imagem poética e o poema como fontes de prazer, dá ao leitor a ideia de
como acontece o momento da poesia e o efeito que ela tem sobre o poeta e as
pessoas à sua volta. Paixão relata ainda que para o poeta o que importa são os
sentimentos que expõem sua visão de mundo, e ele fará isso transformando o
significado das palavras, retirando-as do seu uso habitual e colocando-as em um
contexto diferente, não usual. O autor apresenta quatro tempos que se cruzam no
momento do poema, revelando a sua concepção na questão temporal. Paixão nos
fala sobre o tempo histórico-social presente no contexto ideológico do poema; o
tempo pessoal do individuo, do poeta, com suas experiências, existências e a sua
vivência na linguagem acumulada durante os anos; o tempo das imagens que
aparecem no poema, onde revelam que o poeta tem um universo simbólico; e por
último o tempo rítmico da frase, onde o leitor é estimulado a um movimento
imaginário no pensamento. O poeta estabelece um elo entre ele, com seu universo
simbólico e o real. Com isso, por meio do uso da subjetividade, passam a se
relacionar simultaneamente dentro da realidade, possibilitando que o poeta faça a
combinação dos quatro tempos, sintetizados através do tempo poético,
apresentando na ideia geral do poema, a união desses tempos determinantes.
Paixão finaliza o seu livro dizendo que “o ser poético não equivale somente a ter
sabedoria para arranjar palavras, organizar versos”, mas especialmente diz ele que
“saber britar e jardinar fenômenos no mundo da vida: amizade, diferenças,
solidariedade, amor, ou seja, uma possibilidade que esteja ao alcance de todos”.
Maria Helena Martins, em seu livro O que é leitura (1984), afirma que “o ato
de ler é usualmente relacionado com a escrita, e o leitor visto como decodificador da
letra” (p.8). Para a autora, a ideia de leitura não deveria ser restrita às letras, mas
sim a todas as nossas interpretações do que acontece ao nosso redor, pois estas
condições exteriores ou objetivas influem diretamente nas nossas condições
interiores ou subjetivas, e esta segunda condição é a que define a forma com que
interpretamos tanto o mundo quanto os textos escritos. Segundo a autora, a relação
leitura-letras é predominante devido à mistificação da pessoa letrada e da
informação escrita.
Martins afirma ainda que esta mistificação resulta em convenções, como a de
que o nível de leitura considerado correto é o objeto da leitura. Estas convenções
afastam os não letrados da leitura e da cultura e impedem o aluno de desenvolver
sua própria técnica de aprendizagem e leitura. A autora apresenta em seu referido
livro três níveis de leituras: o sensorial, o emocional e o racional. O nível sensorial
começa muito cedo e nos acompanha por toda vida, pois os sentidos, tato, visão e
olfato fornecem a resposta mais imediata às exigências e ofertas do mundo,
provocando prazer ou rejeição, sem a necessidade de racionalizações, justificativas,
apenas porque impressionam. O nível emocional, de acordo com a autora, lida com
os sentimentos, que necessariamente implicaria falta de objetividade e presença de
subjetividade com o texto, não obstante seja o que menos admitimos, e de onde
advém nossa empatia com o texto. Já o nível racional, conforme afirma Martins, é
considerado correto pelos intelectuais, dá significação e permite o questionamento
das informações que nos são fornecidas. O questionamento e a discussão permitem
uma ampliação dos conhecimentos.
Martins destaca ainda que, mesmo que a interação entre as leituras racional,
emocional e sensorial seja espontânea, o leitor lê com o entendimento de existirem
somente o certo e o errado, e impede as diversas maneiras de se ler, tanto em
relação ao nível quanto ao objeto de leitura. Por isso, abandona uma leitura e abraça
outra que difere de sua opinião por esta ser apropriada aos paradigmas. Porém,
ambas as leituras podem pertencer àquele objeto. Aceitando o convencionalismo, o
leitor não descobre sua maneira de ler e não acrescenta a si as informações mais
pertinentes ao seu dia-a-dia ou modo de vida. A autora também ressalta que para
compreendermos, e para a leitura se efetivar, deve preencher uma lacuna em nossa
vida, precisa vir ao encontro de uma necessidade, de um desejo de expansão
sensorial, emocional ou racional, de uma vontade de conhecer mais. Ela afirma
ainda ser o homem um ser pensante por natureza, mas sua capacidade precisa de
tanto treinamento quanto necessita seu físico para, por exemplo, tornar-se um atleta.
O treinamento para a leitura efetiva implica aprendermos e desenvolvermos
determinadas técnicas, particularmente aquelas ligadas à poesia.
Permitir que o aluno leia poemas de diferentes épocas é comungar com as
ideias de Bakhtin (1997), quando diz, por exemplo, que uma obra não pode ficar
confinada em sua contemporaneidade, pois suas raízes se fixam a um passado
distante e ao surgir em sua época ela representa o fruto pronto proveniente de um
complicado e demorado processo de formação. Contentar-se em compreender e
explicar uma obra, a partir das condições de sua época, é contentar-se apenas no
seu sentido superficial.
As obras rompem as fronteiras de seu tempo, vivem nos séculos, ou seja, na grande temporalidade e, assim, não é raro que essa vida (o que sempre sucede com uma grande obra) seja mais intensa e mais plena do que nos tempos de sua contemporaneidade. [...] Ora, muitas vezes a obra aumenta
em importância mais tarde, ou seja, insere-se na grande temporalidade. Uma obra não pode viver nos séculos futuros se não se nutriu dos séculos passados. Se ela nascesse por inteiro hoje (em sua contemporaneidade), se não mergulhasse no passado e não fosse consubstancialmente ligada a ele, não poderia viver no futuro. Tudo quanto pertence somente ao presente morre junto com ele. (BAKHTIN, 1997, p.364; Apud CEREJA, 2005,p.160)
Bakhtin, conforme relatado nas DCEs, coloca o “discurso poético como
expressão literária, cuja relação entre consciências sociais se processa de modo
diferente daquela que acontece na prosa romanesca”. De acordo com o autor, a
poesia apresenta uma relação dialógica menos intensa, isto é, se na prosa
romanesca há uma “orquestra de vozes, de centros de valor”, a poesia é uma
linguagem mais centralizadora, pois “requer uma uniformidade de todos os
discursos, sua redução a um denominador comum” (DCEs, 2006, p.32).
3 Metodologia da implementação
A metodologia empregada na implementação do trabalho de que resultou o
presente artigo escora-se principalmente na Estética da Recepção, que privilegia as
relações obra/autor/leitor. Tomamos por base a teoria de Jauss, a partir dos estudos
de Zilberman e Bornini & Aguiar (1993), uma vez que essa metodologia possibilita ao
aluno leitor exercer papel ativo, pois acreditamos que é interagindo por meio desta
tríade - obra/autor/leitor - que se alargarão seus horizontes de leitura. De acordo
com Bornini & Aguiar (1993), o método fundamenta-se na participação do aluno em
contato com a diversidade de textos, cada indivíduo que lê é influenciado pela sua
vivência anterior. Conforme salientam as autoras, para a Estética da Recepção a
atividade de leitura constantemente desafia a compreensão do leitor, por solidar
seus pressupostos no alargamento do seu horizonte de expectativa, ou seja, levar o
leitor a uma nova consciência crítica de seus códigos e expectativas habituais. Desta
forma a Estética da Recepção, por consolidar suas bases no leitor, deixa ainda um
legado muito importante: rejeita a ideia de uma única leitura possível, uma vez que
há diferentes leitores, há também diferentes leituras para um mesmo texto, e cada
leitura, por consequência, torna-se objeto para outras leituras, permitindo ao leitor
fazer escolhas, comparações, questionamentos, indagações, debates, tomadas de
decisões e reflexões. Dessa forma, exige do leitor atitude participativa durante o
desenvolvimento de suas etapas, tendo como ponto de partida seu momento
histórico e suas experiências de vida, além de seus interesses literários. O resultado
esperado é a ampliação de seu horizonte de expectativa em termos de
conhecimento e de vivência estética, proporcionando uma nova visão da realidade e,
ao mesmo tempo, preparando-o para leituras mais complexas.
São cinco as etapas de desenvolvimento do método recepcional: 1)
determinação ou sondagem do horizonte de expectativa; 2) atendimento ao
horizonte de expectativa; 3) ruptura do horizonte de expectativa, 4) questionamento
do horizonte de expectativa e 5) ampliação do horizonte de expectativa. Na última
fase do processo, os alunos tomam consciência das alterações e aquisições obtidas
através da experiência com a literatura, proporcionando, dessa forma, melhor
compreensão da leitura.
Essas cinco etapas do processo metodológico da Estética da Recepção, para
concretizar o ensino da leitura e interpretação de poemas do gênero crítico-social,
foram desenvolvidas em cada um dos textos sugeridos na coletânea, durante as
oficinas.
4 Poema Social:
Na poesia brasileira, como na de qualquer outra nacionalidade, alguns
autores se dedicam mais a produzir poesias voltadas aos problemas sociais, em
todas as épocas, como no século XIX aconteceu com Castro Alves.
Pelas suas características específicas, esse tipo de poesia envolvendo a luta
de classes e demais problemas sociais como a fome, a miséria, a escravidão, a
exploração do fraco e oprimido etc., e tendo como objetivo a compreensão das
ideologias presentes em qualquer obra literária, aqui denominamos de poesia crítico-
social ou poema-denúncia.
A poesia social ou engajada é vista como instrumento de luta social. O poeta
acredita em um mundo melhor e usa a poesia como arma para alcançar seus
objetivos. Para ele, fazer poesia é defender uma causa. É ser movido por ideias. É
um mundo exclusivo dos que possuem a sensibilidade ou coragem de se posicionar.
Ser engajado é estar na defesa de um ideal, seja ele político, filosófico ou religioso,
com a finalidade maior de alertar, informar, denunciar as mazelas que ocorrem na
sociedade.
Na maioria das vezes, o objetivo do poeta é fazer uma denúncia, um alerta,
uma crítica a algo relacionado ao contexto social como: a fome, a miséria, a
violência, a exploração humana, o desemprego, a pobreza, a solidão, a poluição do
meio ambiente, o desmatamento etc. São dores que machucam, que ferem a
dignidade de milhões de seres humanos. Somente iremos compreender tudo isso
por meio do nosso conhecimento de mundo, pelo que chamamos "análise do
discurso". Por meio da análise conseguimos desvendar a intencionalidade do autor e
fazer com que a leitura, de um modo geral, tenha sentido lógico. Após esta
explanação, os alunos dialogaram entre eles, citando alguns poemas e músicas de
seus conhecimentos que abordam problema social
5 Implementação das oficinas
Durante a participação do terceiro período do Programa de Desenvolvimento
Educacional (PDE) do Estado do Paraná, foi elaborado um material didático
pedagógico, com a denominação de Unidade Didática: Leitura e interpretação de
textos do gênero poético-social, cujo objetivo principal é desenvolver, aprimorar
no aluno do 7º ano o gosto pela leitura do poema social, de modo a incutir-lhe o
exercício e o prazer da consciência crítico-reflexiva.
A proposta de Implementação pedagógica na escola teve início durante a
semana pedagógica, realizada no segundo semestre do ano letivo de 2011, com a
exposição do projeto no salão nobre, à direção e a todos os profissionais de
educação, do Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, do município de Maringá. Os
participantes presentes mostraram-se bastantes receptivos e entusiasmados com a
proposta de trabalho. A mesma proposta foi apresentada aos alunos do 7º ano,
turma C, período matutino, do referido colégio, no início do terceiro trimestre. A
finalidade dessa ação foi levar ao conhecimento dos alunos os objetivos e as
diversas etapas que seriam necessárias para a implementação do mesmo.
Para compor o material didático que se constituiu de uma Unidade Didática,
foram selecionadas uma coletânea de textos poéticos, reunindo os seguintes títulos:
“O bicho” (Manuel Bandeira), “José” (Carlos Drummond de Andrade), “O açúcar” e
“Não há vagas” (Ferreira Gullar), “Meu guri” (Chico Buarque de Holanda), “A triste
partida” (Patativa do Assaré), “Além da imaginação” (Ulisses Tavares), “Canção do
exílio” (Gonçalves Dias), “Cidadão” (Lúcio Barbosa), “Casinha branca” (Gilson e
Joran) e “Paradoxo” (Gabriel o Pensador).
A realização das ações propostas na referida Unidade Didática previa
liberdade de pensamento aos alunos, pois, buscamos respaldo na teoria de Vygotski
(1992), que afirma ser "a imaginação um momento totalmente necessário,
inseparável do pensamento realista." Portanto, é importante deixar a imaginação dos
alunos fluir para que descubram suas habilidades e o prazer da leitura de poemas.
Desse modo, o professor deve utilizar métodos e técnicas que permitam o trabalho
da leitura e posteriormente da escrita de poemas. Preferentemente deve-se utilizar
uma técnica que seja capaz de despertar a sensibilidade e a imaginação do aluno.
Compartilhamos as ideias de Elias José, já mencionadas anteriormente, pois
também acreditamos ser o texto poético de grande importância para despertar no
aluno a sensibilidade, a criatividade e o gosto pela leitura do gênero literário. É nas
primeiras séries do ensino fundamental que a criança se mostra mais receptiva para
as leituras sugeridas pelo professor.
5.1. Oficina 01: Uma conversa sobre poesia
Na oficina 1, intitulada Reconhecendo um texto poético, iniciamos com uma
conversa informal, uma sondagem sobre a diferença entre poema e poesia. Após os
alunos darem suas opiniões sobre o que sabiam sobre essa diferença, mostramos
em slides a definição que o dicionário Michaelis (2000) traz como poema: sm (gr
poíema) 1- Obra em verso. 2- Composição poética do gênero épico, mais ou menos
extensa e com enredo. 3- Epopeia. 4- Obra em prosa em que há ficção e estilo
poético. 5- Assunto ou coisa digna de ser cantada em verso. O mesmo dicionário
grafa como poesia: sf (gr poíesis+ia1) 1- Arte de escrever em verso. 2- Conjunto das
obras em verso escritas numa língua. 3- Cada um dos gêneros poéticos. 4-
Composição poética pouco extensa; pequeno poema. 5- Qualidades que
caracterizam os bons versos. 6- Caráter do que desperta o sentimento do belo;
inspiração. 7- Elevação nas ideias, no estilo. 8- Atrativo, graça, encanto.
A poesia é uma das modalidades mais antiga da escrita. No mundo greco-
romano, o estilo poético era muito valorizado e difundido, principalmente no campo
educativo. Isso ocorria porque o gênero constituía uma das principais e mais nobres
manifestações da linguagem verbal, e era necessário conhecê-la e saber utilizá-la, o
que justificava a importância do ensino da poesia na escola.
Ainda discorrendo sobre o gênero poético, partimos para a sondagem do
horizonte de expectativa dos alunos em relação à leitura de poemas. Iniciamos
questionando-os sobre a leitura de poemas que eles já haviam realizados ao longo
de suas vidas, até o presente momento. Perguntamos se eles costumam ler
poemas, quais seus gostos e autores preferidos, quais os seus sentimentos e
emoções causadas pelas leituras, quais as lembranças que ainda têm dos poemas
lidos, se houve algum poema que marcou mais e, em caso afirmativo, se essas
marcas foram positivas ou negativas para eles. Também questionamos sobre o que
sabem sobre a diferença entre um texto em prosa e um poema, como é feita a leitura
de um texto em versos, se é feita da mesma forma que a de um texto em prosa,
entre várias outras questões. Em seguida, foi apresentado o poema “Convite”, de
José Paulo Paes, cuja intenção, no sentido literal da palavra, foi fazer um convite
aos alunos para o estudo dos poemas selecionados para a implementação da
proposta.
Antes de entregar o poema aos alunos, escrevi a palavra CONVITE no quadro
de giz e questionei-lhes qual é o significado dessa palavra e o que ela lembrava. Foi
indagado a eles quais os tipos de convites que eles conhecem, se já receberam
algum convite alguma vez e para que evento foi, entre outras questões.
Dando continuidade, os alunos produziram frases e acrósticos com a palavra
“convite” e com o nome do autor do poema. Esgotada a exploração da palavra, foi
dito a eles que o poema que receberiam em seguida, teria a conotação de um
convite, só que seria um convite diferente daqueles que eles conheciam, seria o
convite à leitura de poemas que faríamos em nossas aulas durante as próximas
semanas.
De posse das cópias digitadas do poema “Convite”, os alunos o leram,
primeiro silenciosamente, depois em voz alta e em grupo. Cada grupo leu uma
estrofe, depois cada aluno leu um verso. Em seguida a professora leu em voz alta,
com entonação poética, para que os alunos percebessem a diferença existente entre
a leitura de um texto em prosa e a leitura de um texto em verso.
Para a compreensão do texto foram trabalhadas algumas questões de
interpretação tais como: o que eles entendem com os versos: “Poesia é brincar com
palavras como se brinca com bola, papagaio, pião”? Que argumentos o poeta utiliza
para defender a ideia de que “a leitura de poesias é uma brincadeira mais
interessante do que a de brincar de pião?” Você concorda com essa ideia?
Destaque do poema as comparações existentes. Na sua opinião, por que as
palavras não se “gastam” de tanto brincar, como acontecem com a bola, o papagaio
e o pião? “Para o poeta a palavra é como a água que está sempre nova”. O que ele
quis dizer com estes versos? Você concorda com o poeta? Dê a sua opinião. Para
manter a ideia de que a palavra, a poesia e a água estão sempre novas, o poeta cria
uma figura de linguagem chamada metáfora. Identifique-a e explique o sentido que
esta metáfora adquire neste poema. Justifique o título do poema. Que outro título
caberia neste poema? Justifique sua escola.
Os alunos apreciaram muito essa técnica, todos respondiam com entusiasmo,
acrescentando novas perguntas e comentários.
5.2. Oficina 02: Conhecendo a estrutura do poema
Antes de iniciarmos o estudo dos poemas da coletânea, achamos por bem
apresentar na segunda oficina, noções das estruturas do poema, visto que tal
gênero, enquanto texto literário, apresenta especificidades relacionadas à
valorização da linguagem e da estrutura poética, e a outros aspectos. Portanto, é
imprescindível compreender antes a sua estrutura e linguagem para facilitar a leitura
e entender melhor os textos a serem trabalhados, principalmente no que se refere às
estrofes, versos, denominação dos versos quanto ao número de sílabas poéticas,
denominação das estrofes quanto ao número de versos, denominação das rimas
quanto à distribuição nos versos e à qualidade, bem como o uso da métrica,
(escansão), o ritmo, além de apresentar aos alunos a denominação de alguns
poemas de forma fixa para a ampliação de seus conhecimentos como o soneto, a
balada, a quadra, o rondó, o haicai etc.
Para a realização desta oficina, o assunto foi apresentado em slides na TV-
Pendrive, conforme as atividades propostas na Unidade Didática. Em seguida, para
fixar melhor o assunto, levamos os alunos ao laboratório de informática onde
pesquisaram na internet um pouco mais sobre o assunto. Foi uma atividade muito
prazerosa. Os alunos queriam saber mais sobre as características do poema e
relatavam que nunca imaginavam que para compor um poema, havia “tantos
detalhes”.
5.3 Oficina 03: Outros recursos empregados na composição poética
Na terceira oficina, com o objetivo de fazer o aluno compreender o sentido
das palavras ou expressões de sentido figurado nos textos, levamos ao seu
conhecimento algumas figuras de linguagem. Neste momento, exemplificamos
apenas no poema “Convite” de José Paulo Paes. Nos demais textos da coletânea
oferecida, o assunto era abordado conforme as oficinas iam sendo trabalhadas.
Esclarecemos aqui que, por se tratar de alunos do 7º ano, na faixa de 10 a 12 anos,
julgamos o assunto ser de difícil compreensão para eles e optamos em trabalhar
apenas algumas figuras como comparação, metáfora, onomatopeia, antítese,
paradoxo, aliteração, assonância e personificação. Apresentamos em slides na TV-
Pendrive o conceito com exemplos de cada uma das figuras acima citadas,
conforme organizadas na Unidade Didática. Algumas frases aleatórias, contendo as
referidas figuras, foram exercitadas oralmente para que os alunos tivessem melhor
compreensão do assunto. Por se tratar de conteúdo mais específico nas séries finais
do ensino fundamental e do médio, as atividades foram apenas para que os alunos
tivessem uma noção mais clara do assunto, no momento da interpretação dos
textos.
5.4, Oficina 04: “O Bicho” (Manuel Bandeira)
O poema escolhido para iniciar os estudos sobre a leitura do poema social,
conforme projeto proposto, foi “O bicho”, da obra de Manuel Bandeira.
Iniciamos com uma sondagem do horizonte de expectativa dos alunos, a
respeito da palavra bicho. O horizonte de expectativa, na teoria de Jauss (1994), é
responsável pela primeira reação do leitor à obra, pois se encontra na consciência
individual como um saber construído socialmente e de acordo com o código de
normas estéticas e ideológicas de uma época. Para essa sondagem, escrevemos a
palavra bicho em um pedaço de cartolina, com pincel atômico e perguntamos aos
alunos o que tal palavra significava para eles. As respostas dadas foram registradas
no quadro de giz.
Em seguida, apresentamos um vídeo com imagens e a letra do poema,
encontrado no site do Youtube. Após assistirem ao vídeo, os alunos ficaram
conhecendo o real significado da palavra questionada anteriormente, isto é, a
palavra “bicho” fora empregada no poema no sentido figurado. Neste momento,
houve a reavaliação do horizonte de expectativa. Os alunos interagindo uns com os
outros, compartilharam suas ideias pré-existentes sobre a leitura do texto trabalhado.
Foi o momento do aprofundamento do conhecimento prévio. Perceberam que nem
sempre determinada leitura traz o esperado. Suas certezas são abaladas e, a partir
daí, eles se distanciaram do senso comum em que se encontravam, passaram a
aprofundar seus conhecimentos, ampliando seus horizontes de expectativas,
consequentemente, o entendimento se concretizou e passou a incorporar ou
acrescentar mais conhecimentos aos que já possuíam.
Na sequência, outros questionamentos sobre o texto foram realizados como:
O poeta mostra a animalização do ser humano através das ações que a personagem
pratica: catando, achava, examinava, cheirava, e engolia. Você acha que o poeta foi
infeliz nesta abordagem ou ele quis, neste poema, fazer um alerta, uma denúncia do
grave problema que nos cerca no cotidiano, isto é, a fome, a miséria, a
desigualdade, a exclusão social? Justifique seu pensamento. Por que o poeta usou a
expressão “meu Deus”? O que você sentiu ao ler o poema? A cena descrita pelo
poeta é real ou imaginária? Justifique. Quais as possíveis causas de haver tanta
gente na condição de bicho como retrata o poema? O que poderia ser feito para
solucionar o problema da miséria em um país? As respostas permitiram nova leitura
do texto, possibilitando aos alunos fazer comparações com seus conhecimentos
anteriores às leituras, ou seja, uma autoavaliação. Eles notaram que a cada etapa
de questões, acentuavam as dificuldades da leitura, entretanto, garantiam-lhes mais
conhecimentos.
Para finalizar o estudo do referido poema, foi solicitado aos alunos que
imaginassem a cena vista pelo poeta, fizessem uma ilustração coletiva em um painel
e a expusessem no mural da sala. Os alunos, em duplas, reescreveram o poema em
uma narrativa em prosa. Estas atividades causaram bastante prazer à maioria dos
alunos. Alguns deles declamaram o poema, outros pesquisaram e leram para a
classe outros textos com o mesmo tema. Os alunos perceberam que as leituras
realizadas causaram transformações na maneira de verem o mundo ao seu redor.
Dessa forma eles não serão mais os mesmos, têm agora a consciência das
mudanças ocorridas e das aquisições somadas, fato que oportunizou a ampliação de
seus horizontes de expectativas. Outras atividades gramaticais contempladas no
plano anual foram inseridas, além de exercícios sobre a versificação (estrutura do
poema, versos, rimas, sílabas poéticas etc.), conforme indicadas na unidade
didática.
5.5. Oficina 05: “O Açúcar” (Ferreira Gullar)
O segundo poema trabalhado foi “O açúcar”, de Ferreira Gullar. Como
sondagem do horizonte de expectativa questionou-se aos alunos sobre a utilidade
do açúcar, qual a matéria-prima básica na sua produção, onde e como é produzido,
que outros produtos são extraídos da cana-de-açúcar, entre outras.
Após a leitura silenciosa e oral, organizou-se uma discussão sobre a
dependência do homem em relação aos outros homens no cultivo do açúcar (patrão,
empregado, comércio e consumidor). Em seguida, em atendimento ao horizonte de
expectativa, outras questões foram levantadas para aguçar ainda mais o
conhecimento e espírito crítico do aluno. Entre outras, foram debatidas questões
como: Quais são as relações de dependência expressas no poema e por que isso
acontece? O poema permite uma reflexão com relação à produção do açúcar e ao
respeito aos direitos humanos. “Homens de vidas amargas produzem tão doce
açúcar”. Os direitos humanos são respeitados no nosso país? Justifique seu
pensamento.
Para ampliar seus conhecimentos e expandir o horizonte de expectativa, os
alunos foram ao laboratório de informática e pesquisaram na internet outras formas
de se obter o açúcar, outras matérias-primas além da cana-de-açúcar e outros
produtos derivados da cana, além do açúcar. Para o questionamento do horizonte
de expectativa, os alunos pesquisaram e apresentaram um seminário sobre os
direitos dos trabalhadores do campo, plantadores e cortadores da cana,
principalmente em relação à saúde, à aposentadoria, os direitos trabalhistas que
nem sempre são respeitados. Por meio das pesquisas, ficaram sabendo que ainda
hoje, em muitas regiões do Brasil, esses direitos são negados aos trabalhadores do
campo.
Para a ampliação do horizonte de expectativa, os alunos pesquisaram a
origem da cana-de-açúcar. Ficaram sabendo que é uma planta proveniente do sul e
sudeste asiático. Com a expansão muçulmana a cana foi introduzida em áreas onde
não era cultivada. No continente Europeu ela foi cultivada na Espanha e
posteriormente levada para as Américas durante a expansão marítima onde foi
cultivada em países como Brasil, Cuba, México, Peru, Equador, Colômbia e
Venezuela. Aprenderam também que a cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil no
início do século XVI, quando foi iniciada a instalação de engenhos de açúcar, e que
foi a base da economia do nordeste brasileiro, na época dos engenhos, e a principal
força de trabalho empregada foi a da mão-de-obra escravizada, ou seja, “homens de
vidas amargas produzindo tão doce açúcar” como Gullar retrata em seu poema.
Concluindo a oficina, os alunos ilustraram o poema em estudo em etapas, desde o
preparo do solo e plantio da cana, passando pelo corte, o transporte para as usinas,
a moagem, a transformação em açúcar, o transporte do produto ao comércio e à
mesa do consumidor nas suas diversas utilidades.
5.6. Oficina 06: “José” (Carlos Drummond de Andrade)
O terceiro poema trabalhado foi “José” de Carlos Drummond de Andrade. Em
determinação ao horizonte de expectativa foi questionado se os alunos conheciam a
canção e qual era o assunto retratado? Quem é o eu lírico? Também consultaram o
significado das palavras desconhecidas no dicionário. Após a leitura do poema, os
alunos assistiram a um vídeo com a música cantada por Chico Buarque.
Em atendimento ao horizonte de expectativa, foi realizado o debate das
seguintes questões: Pode-se considerar que o poema retrata um problema social?
Comente. Por que o poeta escolheu o nome José para a personagem de seu
poema? Com base nos versos, caracterize a personagem José: seu caráter,
situação financeira, atitudes e responda: ele representa um bom ou mau exemplo de
ser humano? Justifique sua resposta.
A ruptura do horizonte de expectativa aconteceu por meio das seguintes
questões: O personagem José pode ser considerado uma metonímia. A quem ele se
refere? Qual é o tema central do poema José? Quais os sentimentos expressos na
figura de José que perpassam todo o poema? O que esses sentimentos deixam
evidentes? O poeta repete o verso “A noite esfriou”; em sua opinião, o que pretende
o poeta com essa repetição?
O questionamento do horizonte de expectativa ocorreu, quando levamos ao
conhecimento do aluno o contexto histórico da produção do poema. Nesta oficina, o
aluno ficou sabendo que o referido poema foi publicado em 1942, ano em que o
Brasil vivia no Estado Novo. Nesse período houve uma série de acontecimentos
políticos e econômicos que marcaram a sociedade brasileira, como a repressão
política, a precariedade das condições de trabalho, a modernização industrial que
culminou com a exclusão de trabalhadores não qualificados às modernidades, a
imposição de condutas autoritárias (ditadura), a urbanização dispersiva e outros
acontecimentos que intensificaram a situação de miséria enfrentada pela população
na época, e resultaram em uma desestruturação social. Com isso, originou-se,
principalmente, a desigualdade na distribuição de renda, intensificando ainda mais a
formação de classes opressoras e oprimidas.
As discussões permitiram aos alunos compreenderem que a figura de José
vem nesse poema representar um problema coletivo. O poema todo está centrado
na reflexão sobre a existência de José, que tenta resistir e seguir vivendo. Inicia e
finaliza de forma interrogativa, o que vem realçar o problema do direcionamento da
existência. Os alunos compreenderam que os versos iniciais apresentam uma
sensação de despojamento, esvaziamento, situação sem saída, conforme podemos
notar pelos verbos “acabou”, “apagou”, “sumiu”, “esfriou”. Ele todo está centrado na
reflexão sobre a existência dos “Josés” que resistem a tudo e continuam seguindo o
curso da vida, como fazem todos os brasileiros. Em seguida, os alunos consultaram
o professor de história para saber um pouco mais sobre esse período da política do
Brasil. Também produziram em grupos, paródias do poema. Assim se deu a
ampliação do horizonte de expectativa.
5.7. Oficina 07: “O meu guri” (Chico Buarque de Holanda)
O quarto texto da coletânea trabalhada foi a letra da música “O meu guri”, de
Chico Buarque de Holanda. Como determinação da sondagem do horizonte de
expectativa, questionamos os alunos sobre o significado da palavra “guri”, onde ela
é mais utilizada, se eles conhecem alguém que a utiliza na sua fala etc. Em seguida
os alunos ouviram a leitura da letra da música feita por um aluno e assistiram ao
vídeo cantado por Chico Buarque. Na sequência fizeram uma lista com as palavras
desconhecidas do texto e consultaram dicionários copiando os respectivos
significados, conforme o contexto.
Em atendimento ao horizonte de expectativa, foi realizado um debate sobre
as ideias expostas na canção. Entre elas foram trabalhadas questões como: Qual é
o tema da canção “O Meu guri”? Trace um perfil do eu-lírico, caracterizando-o. Por
que a mãe declara que não era o momento de seu filho rebentar? Pode-se
considerar a canção um lamento materno sobre um menino pobre. Como é a vida
desse menino? Como é a relação afetiva entre a mãe e o filho? Aponte os versos
que falam dessa relação. Qual o foco narrativo do poema?
Para a ruptura do horizonte de expectativa, os alunos pesquisaram no jornal
local e em outros da região e do Estado, casos recentes de jovens envolvidos em
roubos e tráficos de drogas. Constataram que, apesar da música ter sido escrita no
início da década de 1980, seu tema é bastante atual, pois o problema nela abordado
está todos os dias na mídia, quer seja na impressa, na televisionada ou na virtual.
O questionamento do horizonte de expectativa se deu por meio das questões
trabalhadas referentes à educação dos filhos, a falta de informação dos
adolescentes sobre a gravidez precoce. Os perigos das doenças sexualmente
transmissíveis, o despreparo de muitos pais para constituir famílias, o analfabetismo
que leva a tantos problemas e que ainda hoje não foi solucionado em nosso país,
apresentando índice além do ideal, entre outras. Outras questões foram debatidas
sobre o texto como: Na terceira estrofe, o ato de rezar deixa evidente a ingenuidade
da mãe. Por quê? A mãe fala do retrato do guri, manchete, venda nos olhos,
legenda e iniciais. O que sugerem estas imagens? As três primeiras estrofes do
texto terminam mostrando a crença da mãe na promessa do menino de “um dia
chegar lá”. O que significa “chegar lá”? Isso realmente acontece com o garoto da
música? Justifique.
Ampliando o horizonte de expectativa os alunos assistiram a alguns trechos
do filme Cidade de Deus, dirigido por Fernando Meirelles e Katia Lund. Em seguida,
cantaram a canção e produziram textos coletivos sobre as possíveis causas que
levam um garoto à delinquência?
O estudo da canção “O meu guri” oportunizou aos alunos a reflexão sobre o
grave problema social que parece não ter remédio, a delinquênia. Os alunos
compreenderam que a canção faz alusão ao jovem marginalizado, tanto dos
pequenos como dos grandes centros urbanos. São jovens que pertencem a um
grupo dominado pelo tráfico de drogas, e que estão nesse meio como numa guerra
que, como em qualquer guerra, tanto faz matar ou morrer. Embora essa canção fora
gravada no início dos anos 80, é um assunto que, infelizmente, ocupa os noticiários
policiais de praticamente todos os jornais de circulação nacional da atualidade. Em
outra visão, a canção foca também outro problema social, bastante comum na
sociedade atual, o problema da mãe “prematura” e marginalizada, despreparada
para gerar um filho que “rebenta” num momento impróprio, entre outros problemas.
5.8. Oficina 08: “A triste partida” (Patativa do Assaré)
O quinto poema da coletânea proposta neste estudo foi “A triste partida”, de
Patativa do Assaré. A determinação do horizonte de expectativas se deu por meio
de questionamentos aos alunos, fazendo uma sondagem sobre o que eles sabiam
sobre o título do poema e do tema nele abordado. Em um primeiro momento,
questionou-se o que o título do poema lhes vinha à mente. Em um segundo
momento, questionou-se sobre o que eles sabiam sobre a seca e seus problemas.
Ao atendimento do horizonte de expectativas, os alunos leram o poema na íntegra,
cuja linguagem causou-lhes bastante estranheza. Eles disseram que estava escrito
“tudo errado”. Nesse momento foi explicado a eles sobre as variações da língua.
Ficaram sabendo que não há linguagem errada, o que há são variações que uma
língua apresenta de acordo com as condições sociais, culturais, regionais e
históricas em que uma língua é utilizada. Todas elas são aceitas desde que
permitam a interação verbal entre as pessoas. Todavia, a norma padrão da língua ou
norma culta é a variação linguística de maior prestigio social, é a que se utiliza nas
escolas, na maioria dos livros, nos jornais, nas revistas, nos artigos científicos etc.
Algumas questões foram trabalhadas sobre este assunto, entre elas sugeriu-se, em
duplas, reescrever as duas primeiras estrofes, utilizando a norma culta da língua. Os
alunos notaram que na forma original o poema parece causar maior impacto do
problema, isto é, mexe mais com a emoção do leitor. Em seguida, eles consultaram
dicionários para saberem o significado das palavras desconhecidas.
Para a ruptura do atendimento de expectativas os alunos foram levados ao
laboratório de informática onde pesquisaram a biografia de Patativa do Assaré,
leram outros poemas de sua autoria, pesquisaram outros textos sobre a seca. Após
estas atividades os alunos fizeram uma descrição oral e coletiva do eu-lírico como:
características físicas, psicológicas, profissão, onde vive etc. Destacaram também o
assunto contido em cada uma das estrofes do poema em estudo.
Para o questionamento do horizonte de expectativas, os alunos promoveram
uma discussão sobre os diversos problemas causados pela seca. As regiões do
Brasil que mais sofrem com ela. Falaram também sobre o que São Paulo simboliza
para o povo nordestino, que foge da seca em busca de uma vida melhor.
O poema permitiu ainda que os alunos fizessem outra leitura. As histórias de
vida de milhares de brasileiros, que, muitas vezes sem profissão definida,
desempregados e endividados, vão para o exterior tentar a sorte na promessa de
encontrar o “Eldorado” tão sonhado. Entre eles havia vários alunos, cujos familiares
estavam ou já tinham ido ao estrangeiro, principalmente Estados Unidos, Inglaterra e
Japão, tentar uma vida melhor.
Para enriquecer ainda mais seus conhecimentos, foi solicitado ao professor
de geografia, uma aula expositiva sobre os problemas da ditadura da seca, a miséria
vivida pelo homem do sertão nordestino. Sugeriu-se também a leitura do primeiro
capítulo da obra Vidas Secas de Graciliano Ramos. Estas ações contribuíram muito
para a ampliação do horizonte de expectativas dos alunos.
Como conclusão dessa oficina, os alunos montaram um painel com recortes
de jornais e revistas com textos e imagens sobre a seca. Também acrescentaram ao
painel outros poemas e letras de músicas abordando o tema.
5.9. Oficina 09: “Além da imaginação” (Ulisses Tavares)
Na sequência, o sexto texto sugerido na coletânea foi “Além da imaginação”
de Ulisses Tavares. Para a sondagem do horizonte de expectativas, foi escrito no
quadro de giz o título do poema e indagou-se aos alunos sobre o que eles achavam
que o poema abordaria. Após várias respostas, a professora fez a leitura do poema.
Os alunos compreenderam que o poema trata de uma verdadeira crítica às
mazelas da sociedade, uma denúncia, principalmente no que se refere às
desigualdades sociais que tanto assolam o nosso país atualmente e que pouco se
faz para solucionar esses problemas.
Em seguida, para o atendimento do horizonte de expectativas, apresentou-se
um vídeo, encontrado no Youtube, com imagens ilustrando cada um dos versos do
poema, e outras atividades sugeridas na Unidade Didática como: Para que tipo de
leitor o autor teria criado esse poema? Justifique sua resposta. Relacione o título do
poema ao último verso e diga qual a ideia contida neles. A expressão “Tem gente”
se repete diversas vezes ao longo do poema. Em sua opinião, qual o efeito da
repetição para o leitor? O que o autor quis dizer com o verso: “Tem gente que existe
e parece imaginação.”?
Os alunos, em grupos de cinco, apresentaram suas opiniões sobre as
mazelas da sociedade, principalmente a fome, a falta de moradia, a precariedade da
saúde, a falta de segurança, de trabalho etc. Montaram um painel ilustrativo no
mural da sala de aula, com recortes de revistas, destacando as antíteses contidas
em cada uma das estrofes do texto, ocorreu então a expansão do horizonte de
expectativas.
Para a efetivação do questionamento do horizonte de expectativas, os alunos
fizeram um levantamento das causas e consequências dos problemas mencionados,
nos textos: “O meu guri”, “A triste partida” e “Além da imaginação”. Chegaram à
conclusão de que os três falam da pobreza, miséria, marginalização, analfabetismo e
exclusão social. A ideia que prevaleceu entre os alunos foi que os referidos
problemas só serão solucionados quando houver uma distribuição de renda mais
justa no país, bem como um programa de políticas públicas, realmente
comprometido em solucionar esses problemas sociais.
5.10. Oficina 10: “Canção do exílio” (Gonçalves Dias)
O sétimo poema da coletânea trabalhada foi “Canção do exílio”, da obra de
Gonçalves Dias. Iniciamos fazendo uma sondagem do conhecimento do aluno sobre
o que é um “exílio”. Em seguida, realizou-se a leitura. Primeiro a professora leu o
poema na íntegra. Em seguida, alguns alunos leram uma estrofe cada um, após, a
turma toda leu em forma de jogral da seguinte forma: um verso na voz masculina,
outro verso na voz feminina até a penúltima estrofe. A última estrofe foi lida em
uníssono. Esta forma de leitura causou bastante prazer à turma.
Para o atendimento ao horizonte de expectativas, algumas questões foram
trabalhadas oralmente, como: Quem é o eu-lírico do poema? Qual é o tema do
poema? Que mensagem você pode tirar da “Canção do exílio”? Que outro título
poderia ser dado ao poema, entre outras. Em seguida comentou-se ao aluno que o
referido poema foi produzido no primeiro momento do Romantismo Brasileiro, época
na qual se vivia uma forte onda de nacionalismo, que se devia ao recente
rompimento do Brasil-colônia com Portugal, e que esse assunto, eles irão estudar
quando estiver no ensino médio. Explicou-se também que o poeta retrata nos versos
do poema a aversão aos valores portugueses e ressalta os valores naturais do
Brasil, característica do Romantismo. Os alunos ficaram sabendo também que,
segundo alguns historiadores, Gonçalves Dias, quando escreveu o poema em
questão, cursava a faculdade de direito em Coimbra, em 1843. O eu lírico assume o
papel de exilado, neste caso um exílio físico e geográfico e faz alusão à terra natal,
ou seja, ao Brasil.
Ao questionamento do horizonte de expectativas, os alunos realizaram
atividades gramaticais sobre estrofes, versos, rimas, escansão de versos, sílabas
poéticas, linguagem figurada, produção de acrósticos com o título do poema e com o
nome do autor, e leitura da biografia do autor.
A título da ampliação do horizonte de expectativas, questionou-se à classe se
considera o exílio um problema social. Os alunos disseram que sim, pois muitas
vezes é preciso afastar do convívio social aqueles que ameaçam a tranquilidade de
todos. Exemplificaram falando dos traficantes, bandidos e assassinos que precisam
ficar exilados para não prejudicar as pessoas. Comentaram também que no mundo
antigo essa prática era comum às pessoas portadoras de lepra, pois se assim não
fosse, os demais membros da família e a sociedade toda, seriam acometidos desse
mal. Entretanto, quando foi citado o exílio político, eles disseram que esse problema
social é muito grave, pois no pensamento deles, todos os cidadãos têm o direito de
viver em sua pátria, têm o direito de ir e vir, não souberam argumentar por que. Foi
sugerido também que eles solicitassem ao professor de História, informações sobre
o exílio político ocorrido no Brasil, durante o regime militar. Quais as pessoas
importantes do nosso país que já foram exiladas por motivos políticos, bem como os
artistas que, além do exílio, tiveram suas produções proibidas de publicação.
Para concluir essa oficina, foi sugerido aos alunos pesquisarem na internet
paráfrases do poema em estudo e ler para a turma.
5.11. Oficina 11: “Cidadão” (Lúcio Barbosa)
Nesta oficina, o texto indicado na coletânea foi a letra da música “Cidadão”,
de Lucio Barbosa. Como sondagem do horizonte de expectativas, em um primeiro
momento, foi dito aos alunos que o título do texto que iam estudar nesta oficina era a
palavra cidadão. Foi solicitado à turma que se reunisse em pequenos grupos,
trocassem ideias sobre o significado dessa palavra e, em seguida, respondessem a
pergunta: o que é cidadão para vocês? Após as respostas, em um segundo
momento, foi questionado à turma, que informações eles esperavam encontrar no
texto? Diversas sugestões foram expostas. Em um terceiro momento, solicitou-se
aos alunos encontrar no dicionário o significado da palavra cidadão. A turma
registrou no caderno de atividades: Cidadão: “s.m.: indivíduo no gozo dos direitos
civis e políticos de um estado, ou no desempenho de seus deveres para com
este”.(Novíssimo Dicionário Aurélio de Língua Portuguesa).
Em atendimento ao horizonte de expectativa, informou-se aos alunos que a
palavra cidadão inicialmente significava "habitante de uma cidade". Com o tempo
adquiriu significado mais amplo. Hoje é cidadão todo aquele que pertence a um país
com leis que protegem as pessoas, onde essas pessoas têm deveres para com a
organização do país, e usufruem dos direitos que um país politicamente organizado
proporciona aos seus cidadãos. Após essas informações, os alunos assistiram ao
vídeo da música “Cidadão”, interpretada por Zé Ramalho. Em seguida, outras
questões fora trabalhadas como: Em sua opinião a letra da música possui conteúdo
real ou imaginário? Quem é o eu-lírico da canção, isto é, a que cidadão ela faz
referência? Qual o tema da canção? Quem são as pessoas que realizam o trabalho
de construção? A música aborda um problema social. Qual é?
A ruptura do horizonte de expectativa aconteceu por meio do debate de
algumas ideias como: o que você pensa a respeito do fato de muitas pessoas que
trabalham na construção de obras suntuosas com escolas, shoppings, hospitais etc.,
e após terminarem as obras, não têm o direito ao acesso e muitas vezes são vistas
como ladrões, ao admirá-las, como menciona a letra da canção? A música “Cidadão”
faz uma reflexão sobre uma escolha de mudança de vida de um homem em
determinado momento de sua existência. O que você entendeu sobre essa reflexão?
Há visivelmente no texto um momento em que o trabalhador se arrepende de ter
saído de sua terra natal. Quais versos justificam essa afirmativa? O que há em
comum entre esse texto e “A triste partida de Patativa do Assaré?
Ao questionamento do horizonte de expectativas, optou-se pelo debate sobre
o emocional do eu-lírico, mais especificamente ao fato de ele se sentir excluído,
perdido, amargurado e tenta afogar suas mágoas na bebida: “meu domingo está
perdido / Dá vontade de beber”. O que você pensa a respeito da atitude de certas
pessoas que diante de um problema se entregam ao alcoolismo?
Para a ampliação do horizonte de expectativas, foi sugerido aos alunos
leituras sobre o preconceito social.
5.12. Oficina 12: “Casinha branca” (Gilson e Joran)
A letra da música “Casinha branca”, de Gilson e Joran, foi o nono texto
indicado na coletânea para ser trabalhado como texto social. A determinação do
horizonte de expectativas aconteceu por meio de uma conversa informal sobre o que
lhes vinha à mente a expressão “Casinha branca”. Diversas respostas foram dadas,
em seguida propôs-se escrever um acróstico com essas palavras e expor no mural
da sala. Em seguida os alunos ouviram a música.
Para o atendimento do horizonte de expectativa, foram feitos
questionamentos como: Que sentimentos você teve ao ler o texto? Descreva o eu-
lírico caracterizando-o física e psicologicamente. Qual é o tema do poema? Pode-se
considerar a solidão um problema social? Comente. Que fatos poderiam levar o eu-
lírico a desejar viver isolado no campo? No texto, o que o eu-lírico vê no rosto da
multidão? O que isso lhe causa?
Após as discussões das questões acima propostas, partiu-se para outras
atividades para concretizar a ruptura do horizonte de expectativas, como: É possível
uma pessoa se sentir só, mesmo estando no meio da multidão? Justifique seu
pensamento. Quais as consequências para uma pessoa viver na solidão? Isso é
bom? Você agiria como o eu-lírico da canção, diante de um problema que tivesse
que enfrentar? Comente.
Para o questionamento do horizonte de expectativa foi feito aos alunos um
breve comentário sobre o Arcadismo, escola literária que perdurou pela maioria do
século XVIII, tanto na Europa quanto no Brasil. Esta escola literária caracterizava-se
pela valorização da vida bucólica e dos elementos da natureza. O nome originou-se
de uma região grega chamada Arcádia (morada do deus Pan). A principal
característica é o bucolismo (bucolismo significa pastoril). Bucólico é adjetivo que
qualifica aquele que exalta a vida no campo, levando a vida despreocupada e
idealizada nos campos. Muitos dos participantes da Conjuração Mineira foram
poetas árcades, isto é, pertenceram a este período literário.
Após esta explanação, questionou-se ao aluno, se, pelas características da
canção, pode-se afirmar que o eu-lírico é um típico árcade. Também foi arguído o
que ele pensa a respeito da vida bucólica. Para finalizar a oficina, os alunos
ilustraram o texto, dando-se assim a ampliação do horizonte de expectativa.
5.13. Oficina 13: “Paradoxo” (Gabriel, O Pensador)
A décima terceira oficina tratou da leitura da letra da música “Paradoxo”, de
Gabriel, o Pensador. Iniciamos o trabalho fazendo a sondagem a respeito do
horizonte de expectativa do aluno a respeito da palavra paradoxo. Algumas
tentativas para defini-la foram ditas pela turma. Em seguida mostramos em slide, na
TV-pendrive, o verbete encontrado no dicionário Aurélio Século XXI, da Língua
Portuguesa o significado da palavra paradoxo: (cs) [Do gr. Parádoksos, pelo lat.
paradoxon.] Substantivo masculino. 1 Conceito que é ou parece contrário ao comum;
contrassenso, absurdo, disparate. Mostramos também uma definição da Gramática
Normativa da Língua Portuguesa, de Carlos Henrique da Rocha, 2006: Paradoxo:
reunião de ideias contraditórias e aparentemente inconciliáveis, num só
pensamento, o que nos leva expressar uma verdade com aparência de mentira.
Apresentamos ainda a palavra como figura de pensamento, encontrada na internet,
na página da enciclopédia livre Wikepedia:
Paradoxo relacionado com a antítese, o paradoxo (grifo do autor) é uma figura de pensamento que consiste quando a conotação extrapola o senso comum e a lógica. As expressões assim formuladas tornam-se proposições falsas, à luz do senso comum, mas que podem encerrar verdades do ponto de vista psicológico/poético. Simplificando, é uma afirmação ou opinião que à primeira vista parece ser contraditória, mas na realidade expressa uma verdade possível. Exemplo: "Eu sou um velho moço." (WIKIPEDIA, http://pt.wikipedia.org/wiki/Paradoxo_%28figura_de_estilo%29, acesso em 25/jun/2012).
Feita a sondagem, partimos para o atendimento do horizonte de expectativa.
Apresentamos a letra da música “Paradoxo” em cópia digitada e fizemos alguns
questionamentos como: Qual é o tema de “Paradoxo”? Quem é o eu- lírico? Como
você o caracteriza? Que problema social o poeta aborda no poema? Para você o
que significa viver “cada um no seu quadrado”? Em sua opinião, isso é positivo ou
negativo? Julgue. Você concorda com o fato de “vivermos monitorados”, isto é,
vigiados por câmeras por todos os lados? Por quê? No decorrer das atividades, os
alunos disseram que o texto ilustra bem a nossa realidade nos últimos tempos.
Alguns disseram que no bairro onde moram, constantemente ocorrem assaltos e na
tentativa de conter um pouco, os moradores instalam câmeras e cercas elétricas.
Para a ruptura do horizonte de expectativa, os alunos, em grupos, fizeram
algumas atividades interpretativas como: Você concorda com o poeta quando diz
que: “Dividimos as despesas; /Sem saber quem mora ao lado./ Não dividimos amor./
Não fazemos favor./ Cada um no seu quadrado”? Comente. O que você pensa sobre
o fato de que nos dias de hoje termos tantos amigos virtuais, mas nem sequer
sabemos quem mora ao nosso lado? Por que isso acontece?
Partimos então para o questionamento do horizonte de expectativa, hora em
que os alunos exercitaram algumas atividades gramaticais como classes de algumas
palavras destacadas do texto e analisaram a figura de pensamento paradoxo,
explicando a fuga do senso comum em alguns versos como: “Dividimos as despesas
/ Sem saber quem mora ao lado”; “E no salão social / Festas que lembram velório”;
“Temos centenas de amigos / Quase todos virtuais / Mas na parede ao lado/ Não
ouvimos os ais / De alguém agoniado”, entre outras. Os alunos que moram em
apartamentos comentaram que é bem isso que acontece, a maioria afirmou não
conhecer quem mora no apartamento vizinho.
Ampliando o horizonte de expectativa, foi sugerido aos alunos pesquisarem e
trazerem para o mural da sala outros textos que abordam o mesmo problema. Os
alunos ouviram e cantaram a música em estudo.
5.14. Oficina 14: “Não há vagas” (Ferreira Gullar)
O poema sugerido na Unidade Didática para fechar os textos da
implementação foi “Não há vagas”, de Ferreira Gullar. Este poema faz parte da
literatura engajada, já no vencido o período modernista.
Como sondagem do horizonte de expectativa, perguntamos aos alunos o que
a frase “Não há vagas” trazia-lhes à mente. Muitas respostas foram dadas como:
não há vagas em uma escola, em um hospital, em um jogo, em um hotel, em um
local de trabalho, em uma excursão, em um estacionamento, em uma sala de
espetáculos etc. Após a sondagem, cada aluno recebeu uma cópia do poema,
fizeram a leitura silenciosa e se inteiraram de que vagas o poeta se referia no texto.
Em seguida, um aluno leu o poema em voz alta e na sequência foi solicitado que
expusessem suas opiniões sobre a denúncia contida no poema. Outros
questionamentos foram feitos como, por exemplos: Por que o preço do feijão e do
arroz não cabe no poema? O que denunciam os versos: “Não cabem no poema o
gás / a luz o telefone / a sonegação / do leite / da carne / do açúcar /do pão”? Por
que o funcionário público não cabe no poema? Para o poeta, o que só cabe no
poema? E para você, o que só caberia em um poema? Entre outras questões,
atendendo desta forma ao horizonte de expectativa.
Para a ruptura do horizonte de expectativas, os alunos receberam
informações a respeito da poesia engajada. Os alunos anotaram em seus cadernos
de atividades a seguinte definição encontrada no site Portal do Professor: A Poesia
Engajada é instrumento de luta social. O poeta acredita em um mundo melhor e usa
a poesia como arma para alcançar seus objetivos. Para ele, fazer poesia é defender
uma causa. É ser movido por ideias. No mundo da Poesia Engajada não há lugar
para os neutros ou indiferentes. Este é um mundo exclusivo dos que possuem a
sensibilidade ou coragem de se posicionar. Ser engajado é estar na defesa do
“ideário político, filosófico ou religioso”, com o intuito maior de alertar, informar,
modificar, denunciar injustiças que assolam a humanidade. Outras indagações foram
feitas à turma, entre elas destacamos: O poeta parece fazer um desabafo quando
diz: “O poema, senhores, não fede nem cheira”. O que você pensa sobre isso?
Reflita sobre os acontecimentos atuais no nosso país e no mundo, liste os
acontecimentos que mais te afligem e diga por quê. Para a ampliação do horizonte
de expectativa, foi sugerido aos alunos pesquisarem na internet a biografia do poeta
e outros poemas da literatura engajada.
Para o desfecho da implementação foi organizado um sarau, onde os alunos
declamaram os poemas e cantaram as músicas trabalhadas na Unidade Didática e
expuseram as atividades realizadas no mural da sala de aula.
6. Outros resultados, a título de considerações finais
Sendo o objetivo principal do trabalho fomentar no aluno do 7º ano, do ensino
fundamental, o gosto pela leitura do poema social, de modo a incutir-lhe o prazer e o
exercício da consciência crítico-reflexiva, além de contribuir para a formação de
leitor, de levar ao aluno à competência para estabelecer relação entre o texto e a
realidade, a proposta desenvolvida alcançou o pretendido.
Os poemas selecionados e sua abordagem seguindo as etapas do método
recepcional (conforme Bordini e Aguiar), a invocação de fatos da atualidade (ou não)
relacionados à realidade social, política e cultural, tudo isso proporcionou ao aluno
leitor a oportunidade de transportar seu conhecimento de mundo para o ato de ler,
de exercitar sua liberdade de pensamento, de refletir sobre os problemas que o
cerca, no seu cotidiano, bem como os da sociedade e da política em que está
inserido. Puderam expor suas idéia em todo e qualquer instante crítico, de forma
sutil e prazerosa, propiciando o aumento significativo de seus conhecimentos.
Como verificamos durante a implementação das atividades da proposta, todas
as estratégias capazes de estimular a sensibilidade do aluno para a leitura do poema
social, segundo algumas orientações da Estética da Recepção, são válidas.
Salientamos que é fundamental que o professor, ao trabalhar o poema social em
sala de aula, demonstre prazer e sensibilidade pelo texto poético. A fim de que o
aluno perceba a sua importância e se habitue a ler por prazer. É papel do professor
estimular o aluno a compreender a imaginação do poeta e que ele, como leitor, viva
o seu próprio mundo de imaginação. Certamente a união desses dois mundos é um
desafio para nós professores, que precisamos estar preparados para a tarefa de
ensinar a leitura de um texto literário e, neste caso, o texto poético-social, pois além
do prazer da leitura ele proporciona meios para o conhecimento, o desenvolvimento
da consciência crítico-reflexiva e a transformação do cidadão em indivíduo
corretamente politizado. Conforme diz SILVA (2002):
Precisamos urgentemente superar essa visão à medida que no prazer da leitura, ou seja, na ampliação do campo do possível através do jogo criador existe conhecimento e conscientização. Em verdade, fruir o texto literário e crescer pessoalmente ou transformar-se politicamente são partes de um mesmo ato. (SILVA, 2002, p. 26).
É interessante que a poesia seja trabalhada com frequência, para que ocorra
maior interesse por parte dos alunos. Nas palavras de Elias José (2003, p. 11),
“vivemos rodeados de poesia”, ou seja, poesia é tudo que nos cerca e que nos
emociona quando tocamos, ouvimos ou provamos; poesia é a nossa inspiração para
viver a vida. Portanto, devemos incentivar cada vez mais nossos alunos a ler poesia.
Claro que a poesia não é a solução para todos os problemas da escola ou fora dela,
no entanto, é uma forma sutil, lúdica que ajuda o aluno a aprender a gostar de ler.
Não obstante, essa prática pedagógica, além de ser uma ação formadora mais
significativa, é também muito prazerosa. A leitura como lazer-prazer, sem o pretexto
de usar o poema apenas para se ensinar os conteúdos de Língua Portuguesa,
permite que o aluno perceba a beleza do gênero poético, além de absorver o
conhecimento e as mensagens que o poema transmite. Ele jamais deixará de
apreciar tal gênero e procurará ler constantemente, transformando-se num cidadão
mais sensível e crítico. É mediante a prática da leitura crítica que o aluno se tornará
cidadão consciente, crítico, participativo e transformador de uma sociedade. Dessa
forma, concluímos que não devemos nunca deixar de trabalhar a poesia na sala de
aula. A poesia dever ser vista pelo valor e importância que ela tem em si mesma,
pelo poder que tem em formar e transformar as pessoas, tornando-as mais sensíveis
e críticas diante do mundo ao seu redor. É válido ressaltar também que uma
proposta intertextual como a da leitura de poema social, onde o aluno busca relação
com outros textos e com o seu conhecimento de mundo, permite dizer que somos
um povo com ampla identidade cultural, temos várias identificações que podem se
modificar de acordo com a ampliação de nossos horizontes de expectativa. Assim,
além da Literatura, o conhecimento geral dos alunos também será bastante
ampliado. Portanto, ficou comprovado, no decorrer da intervenção, que os alunos
podem descobrir o prazer pela leitura de textos e, quiçá, de obras literárias, podendo
se tornar leitores
Finalizando este artigo, é importante registrar também que nem tudo foi
perfeito na implementação da proposta. Aconteceram vários transtornos, entre eles,
houve alunos desinteressados e que apresentaram resistência em realizar as
atividades propostas, mesmo com toda dedicação e incentivo de nossa parte. Outro
fator que sentimos desfavorável foi o fato de a implementação acontecer no último
trimestre escolar, época que se deu o retorno do professor PDE às salas de aula. Os
alunos já estavam saturados com os meses de estudos e também acostumados com
o professor substituto. Assim, o retorno do professor titular teve a conotação de ser
ele o substituto, precisando enfrentar todos os transtornos que acontecem com a
troca de professores no transcorrer de um trabalho. Além desses contratempos,
concomitantemente ao retorno do professor, ocorreu a sua participação como
monitor no GTR (Grupos de Trabalho em Rede), onde trabalhou o seu projeto com
grupos de professores, sobrecarregando-o ainda mais, de forma que o tempo
tornou-se escasso para melhor desempenho do trabalho. Acredito que se a
organização das tarefas propostas pela Secretaria de Educação fosse melhor
distribuída, evitando-se acúmulo de tarefas (para o professor), o resultado teria sido
ainda melhor. Apesar disso, a experiência foi válida e muito gratificante. Os
resultados alcançados na implementação do projeto do Ensino da Leitura e
Interpretação de Texto do Gênero Poético-social foram dentro do esperado.
autônomos e assíduos. Talvez este processo não se limitará a vida escolar, podendo
durar uma vida inteira. Sobre toda essa experiência, em que deve ser destacado o
crescimento profissional e pessoal, além do proveito para os alunos, fica o
agradecimento ao PDE, que a proporcionou, e às IES, que contribuíram orientando,
oferecendo cursos e disponibilizando professores.
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