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Belo Horizonte, Novembro de 2009
RELATÓRIO FINAL
LETALIDADE NO SISTEMA DE DEFESA SOCIAL DE MINAS GERAIS
2008
REL
ATÓ
RIO
FIN
AL
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1
GOVERNADOR DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Aécio Neves da Cunha VICE-GOVERNADOR/ PRESIDENTE DO COMITÊ DE DEFESA SOCIAL Antônio Augusto Junho Anastasia SECRETÁRIO DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL
Maurício Campos de Oliveira Júnior COMANDANTE-GERAL DA POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS Coronel Renato Vieira de Souza CHEFE DE POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Delegado Geral Marco Antônio Monteiro de Castro COMANDANTE-GERAL DO CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DE MINAS GERAIS
Coronel BM Gilvan de Almeida Sá SECRETÁRIA-ADJUNTA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL Luzia Soraia Silva Ghader SUPERINTENDENTE DE AVALIAÇÃO E QUALIDADE DA ATUAÇÃO DO SISTEMA DE DEFESA SOCIAL José Francisco da Silva EMPREENDEDORA PÚBLICA/ GERENTE DO PROJETO ESTRUTURADOR
Silvia Caroline Listgarten DIRETORA DE ANÁLISE E AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO OPERACIONAL
Juliana Maron GERENTE DE ANÁLISE E AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO OPERACIONAL Edmilson Antonio Pereira Junior CORREGEDORES
Cel. César Romero Machado Santos (Corregedor da Polícia Militar) Dr. Geraldo de Moraes Júnior (Corregedor-Geral de Polícia Civil) Cel. Israel Marcos Rosa Pereira (Corregedor do Corpo de Bombeiros Militar) Dra. Luciana Nobre de Moura (Corregedora da SEDS)
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COLABORADORES
Ten Marco Túlio Machado – Corregedoria CBMG Ten Alex Lamy de Gouvea – Corregedoria PMMG Maj. Carlos Gonçalves Silva Júnior - PMMG Ana Flávia Alves Moreira - ACADEPOL Antônio Gama Júnior – Corregedoria PCMG Luciana Nobre de Moura – Corregedoria SEDS Aroldo Júnior Vilela Paes – Corregedoria SEDS Vivian Gonçalves Sant'Ana – Corregedoria SEDS Ten. Cel. Carlos Putini Neto - Ouvidoria Geral MG Gustavo Gorgosinho Alves de Meira - Defensoria Pública - Corregedoria Geral Letícia D' Ercoli Rodrigues - Ordem dos Advogados do Brasil
COORDENADORA DA AÇÃO Viviane Ferreira Batista DIRETORIA DE ANÁLISE E AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO OPERACIONAL Aline Soares Gonzaga Márcia Cássia Pinto Sales Nilo Vianna Teixeira Rhona Maria Correa Kayello Vanessa Viana de Carvalho
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COORDENADOR DA PESQUISA
Ignacio Cano (LAV-UERJ) EQUIPE DE PESQUISA:
Alberto Alvadia Thais Lemos Duarte Andreia Cidade Marinho Sandra Regina Cabral Rodrigo Alisson Fernandes Luís Felipe Zilli
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S U M A R I O
PAG.
1. Introdução.................................................................................................. 5
2. Incidentes Registrados.............................................................................. 9
3. Vitimização............................................................................................... 15
4. Características dos Episódios................................................................. 27
5. Conclusões e recomendações. ............................................................... 39
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1. Introdução.
Em 2004, a Ouvidoria de Polícia de Minas Gerais criou um Núcleo de
Ensino, Pesquisa e Extensão, uma de cujas missões era desenvolver ou
coordenar pesquisas na área de controle externo da atividade policial.
Desde o começo, uma das áreas prioritárias de monitoramento e pesquisa
foi o uso da força policial e a vitimização de policiais e civis durante as
intervenções policiais. Trata-se de um tema cujo estudo no Brasil é
tradicionalmente dificultado pela restrição de acesso às informações e pelo
fato de que as próprias corporações policiais nem sempre dispõem de registros
sistematizados sobre este tema.
Para tentar garantir o acesso mais completo possível aos dados, o
Colegiado de Corregedorias dos Órgãos de Defesa Social estabeleceu,
através da Resolução 01/ 2004, o envio regular das seguintes informações
para as Ouvidorias de Polícia.
RESOLUÇÃO Nº 01/2004 Estabelece obrigatoriedade de fornecimento de dados advindos de registro sobre homicídios e lesões, envolvendo policiais, à Ouvidoria de Polícia. O Presidente do Colegiado de Corregedorias dos Órgãos de Defesa Social, no uso de suas atribuições que lhe confere o Decreto nº 43.695 de 11/12/2003, determina: Art. 1º As Polícias Civil, Militar e Corpo de Bombeiros Militar, através de suas Corregedorias e/ou do Centro Integrado de Atendimento e Despachos – CIAD, deverão encaminhar à Ouvidoria da Polícia uma cópia no modelo de formulário anexo, quando do registro no boletim de Ocorrência que conste algum dos seguintes eventos: I – homicídio doloso ou culposo, cometido contra profissional da segurança pública, em qualquer circunstância, seja durante o serviço ou na folga; II – homicídio doloso ou culposo cometido por profissionais da segurança pública, em qualquer circunstância, seja durante o serviço ou na folga e independentemente de circunstâncias excludentes de ilicitude; III – lesões dolosas, culposas ou acidentais sofridas por pessoas em decorrência da ação de profissionais da segurança pública, em qualquer circunstância, seja durante o serviço ou na folga e independentemente de circunstâncias excludentes de ilicitude; IV – suicídios e tentativas de suicídios cometidas por profissionais de segurança pública. Art. 2º A remessa do formulário deverá ocorrer, até o dia 15 do mês subseqüente após ser exarada a ocorrência pelo agente competente;
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Parágrafo único – O ―caput‖ deste artigo não exclui a obrigação das Corregedorias de Polícias e/ou do Centro Integrado de Atendimento e Despachos, de encaminharem à Ouvidoria da Polícia, as cópias no modelo do formulário anexo de ocorrências lavradas nos cinco anos anteriores à vigência desta resolução que versarem sobre registros referenciados no Art. 1º, incisos I a IV. Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de 1º de janeiro de 2005.
A partir de janeiro de 2005 a Ouvidoria começou a receber este tipo de
informação. Nos anos iniciais a própria Ouvidoria analisava os dados e
produzia os relatórios, mas em anos sucessivos a Secretaria de Defesa Social
foi assumindo esta tarefa. A criação de uma Comissão da Pesquisa de
Letalidade Policial, composta por membros das instituições do Sistema de
Defesa Social e de outras instituições relevantes, significou um passo
importante na tentativa de que as informações e as análises tivessem uma
repercussão nas políticas públicas, com o objetivo último de reduzir a
letalidade. Se, inicialmente, o monitoramento era relativo exclusivamente às
corporações policiais, com o tempo ele foi expandido, em alguma medida, a
outras instituições que fazem parte da Secretaria de Defesa Social, como os
bombeiros. Entretanto, em função da particularidade da função policial e da
dificuldade de acesso a informações de outras instituições, a quase totalidade
dos casos apresentados neste relatório corresponde às polícias.
Na prática, o encaminhamento das informações não foi isento de
problemas e, em diversos momentos, houve indícios de que a cobertura não
era completa. Contudo, este processo permitiu iniciar um monitoramento
sistemático a partir do ano de 2005, refletido em relatórios sobre a letalidade
policial nos anos de 2005, 2006 e 2007. O acúmulo de informações ao longo do
tempo possui a vantagem de criar uma série temporal para estudar a evolução
do fenômeno.
O presente relatório é uma continuação deste monitoramento e contém
os dados relativos ao ano de 2008. Uma equipe de pesquisadores leu os
documentos e resumos fornecidos pelas corporações policiais, ou obtidos de
outras fontes, e preencheu um formulário para cada caso, com o objetivo de
extrair os dados relevantes. A informação dos formulários foi digitada para
compor o banco de dados que foi utilizado na análise.
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Os critérios de inclusão para os casos contemplados foram os seguintes:
1. Episódios relatados nos quais houve disparo de arma de fogo que
provocou morte ou ferimento em alguns dos participantes.
2. Episódios relatados nos quais houve participação de agentes de
segurança pública, seja na qualidade de autores ou na qualidade de
vítimas (ou ambos simultaneamente). Casos em que os agentes de
segurança eram apenas testemunhas ou registraram os fatos
acontecidos sem a sua participação direta foram desconsiderados.
3. Fatos acontecidos entre os dias 1 de janeiro e 31 de dezembro de
2008.
Para que um caso fosse incluído era preciso que satisfizesse os três
critérios simultaneamente. Observe-se que tanto homicídios quanto suicídios e
acidentes podem cumprir as condições estabelecidas.
Na medida em que surgiram dúvidas e casos limite, novos critérios mais
específicos foram sendo adotados, entre eles:
a. O ferimento ou a morte deviam ser produzidos diretamente pelos
disparos de arma e não por qualquer outra causa. Casos em que
houve disparos que não provocaram vítimas, mas houve ferimentos
por outras causas não foram contemplados. Especificamente, se o
disparo provocou, por exemplo, a queda de um objeto que, por sua
vez, causou dano na vítima, o fato também não foi aceito, pois o
ferimento não foi causado diretamente pela arma. Da mesma forma,
os feridos por faca ou outros meios não foram contabilizados na
contagem total de feridos, mesmo quando existiam no mesmo
episódio outros feridos por arma de fogo.
b. Réplicas de armas e balas de borracha não foram consideradas. Era
preciso que o disparo fosse feito com uma arma de fogo com
munição metálica.
c. Casos de ferimentos produzidos por arma de fogo foram aceitos
mesmo quando não provocaram perfuração (por exemplo, pelo efeito
do colete anti-balas), desde que houvesse ferimento. Assim,
ferimentos de raspão ou por estilhaços provocados por arma de fogo
foram incorporados.
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d. Fatos acontecidos fora do estado de Minas, mas protagonizados por
agentes de segurança pública do Estado de Minas (por exemplo,
durante suas férias) foram incluídos. Prevaleceu a interpretação de
que o foco do estudo são as instituições do estado,
independentemente de onde atuem os seus agentes.
e. Embora o monitoramento esteja dirigido fundamentalmente ao
Sistema de Defesa Social do estado de MG, são considerados
também os casos protagonizados por agentes federais (como a
Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal) acontecidos no
território do estado.
De uma forma geral, os critérios de inclusão adotados são equivalentes
aos usados em anos anteriores, com o objetivo de poder acompanhar a
evolução da série temporal ao longo do tempo.
Concretamente, agentes de segurança pública reformados foram
também considerados, mas a intenção era analisá-los de forma separada,
como foi feito no relatório de 2007. De qualquer forma, em 2008 não foi
registrado nenhum caso relativo a agentes públicos aposentados.
A intenção do monitoramento da letalidade nos últimos anos foi a
incorporação de casos de ferimentos ou mortes por uso de uso de força não
letal, o que está parcialmente incluído na Resolução 01/2004, mas a escassez
de informações recebidas neste sentido fizeram com que optássemos por
elaborar uma análise apenas dos casos de arma de fogo, na mesma linha que
os anos anteriores.
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2. Incidentes Registrados.
Em total, 163 casos foram registrados dentro dos critérios de
admissibilidade. O número de episódios é inferior ao dos últimos anos,
confirmando uma tendência descendente que vem desde 2005.
TABELA 1
NÚMERO DE EPISÓDIOS QUE RESULTARAM EM MORTES OU FERIMENTOS POR DISPAROS DE ARMA DE FOGO EFETUADOS POR OU CONTRA AGENTES DE SEGURANÇA PÚBLICA, POR ANO
ANO
2002 2003 2005 2006 2007 2008
Número de Episódios 208 282 300 241 200 164
A grande maioria dos casos foi enviada pelas polícias, particularmente
pela Polícia Militar, conforme a resolução mencionada. O Corpo de Bombeiros
encaminhou dois casos. Diferentemente de anos anteriores, não houve fatos
comunicados através de outras instituições, como a Ouvidoria ou a Assembléia
Legislativa.
O procedimento de busca na imprensa pode ser entendido como uma
forma de monitorar o grau de cobertura das informações fornecidas pelas
corporações. O procedimento seguiu critérios parecidos ao realizado em 2007.
A equipe de pesquisa efetuou uma busca no site da agência que realiza
o ‗clipping‘ para o Governo de Minas (http://www.ideiafixa.com.br/), procurando
as matérias jornalísticas que descrevessem fatos que cumprissem os critérios
de seleção do nosso monitoramento. Para tanto, foram procuradas as matérias
que contivessem ao menos uma das seguintes palavras chaves:
a) ferida b) ferido c) morto d) morte e) disparo f) conflito g) arma
h) bala perdida i) policiais j) polícia
Os seguintes jornais foram contemplados nessa busca, os mesmos que
tinham sido incluídos em 2007:
http://www.ideiafixa.com.br/
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a) Estado de Minas
b) Jornal Hoje em Dia
c) O Tempo
d) Jornal Super
e) Jornal Aqui
Cada matéria publicada nesses jornais durante o ano de 2008 que
incluísse alguma das palavras mencionadas acima (e fosse selecionada pelo
mecanismo de busca eletrônico) era lida pela equipe de pesquisa para verificar
se continha um caso relevante. Entretanto, cumpre registrar que alguns
problemas enfrentados com o mecanismo automatizado de busca no
mencionado site não nos permitem oferecer garantia plena de que a
confiabilidade nessa busca seja perfeita.
Desse modo, foi obtido na imprensa um total de 11 de casos, mas
apenas 6 não tinham sido enviados pelas corporações. A diminuição dos
episódios que possuem como fonte exclusiva a imprensa, em comparação com
o ano passado (em que houve 13 casos), pode estar indicando que o grau de
cobertura das informações das instituições de segurança pública tem
melhorado neste ano. A outra explicação possível, menos plausível, é uma
menor atenção por parte dos jornais aos episódios de letalidade policial.
A tabela seguinte revela o número de casos que corresponde a cada
fonte. Um mesmo episódio pode ser registrado por mais de uma fonte, razão
pela qual o somatório dessas freqüências é superior ao número total de casos.
TABELA 2
Número de Casos por Fonte
Freqüência %
Polícia Militar 140 85,4
Polícia Civil 19 11,6
Corpo de Bombeiros 2 1,2
Imprensa 11 6.7
No total, 8 casos foram obtidos de mais de uma fonte. Para evitar a
possibilidade de duplicidade, foram realizadas ordenações e revisões de
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acordo com diversas variáveis: número de Boletim de Ocorrência, data, local,
nome dos envolvidos e unidades policiais. Mais de dez repetições foram
detectadas através destes procedimentos. Quando era identificado um caso
com mais de uma fonte, todas informações das distintas fontes eram
integradas para constituir um episódio único.
A distribuição dos casos mês a mês não é homogênea, mas também
não revela tendência clara numa direção. Por outro lado, não há indício de falta
de cobertura no ultimo mês do ano, como aconteceu em 2007.
GRÁFICO 1
NÚMERO DE CASOS POR MÊS
A grande maioria dos episódios, mais de 90%, são protagonizados por
policiais militares. Os policiais civis apenas são partícipes de 8 casos, 10 a
menos do que no ano anterior. Há ainda dois casos de bombeiros, os dois com
os agentes como vítimas: um suicídio consumado e um caso de tentativa de
Mês do Fato
DezNovOutSetAgoJulJunMaiAbrMarFevJan
Nú
me
ro d
e C
as
os
20
15
10
5
0
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execução sumária contra um bombeiro, que resultou ferido. De fato, espera-se
que os bombeiros, em função do seu trabalho de defesa civil, estejam
envolvidos muito raramente em confrontos armados. Agentes penitenciários
aparecem também em dois episódios: um foi baleado e ferido ao sair de casa
(tentativa de execução sumária) e outro respondeu com disparos a uma
agressão de um detento, ferindo-o. Existe ainda um caso com a participação da
Polícia Federal. Como já foi mencionado, neste ano não foi registrado nenhum
caso de agente de segurança pública reformado.
TABELA 3
Número de Casos por Tipo de Agente Envolvido
Freqüência % do total
Polícia Militar 152 92,7
Polícia Civil 8 4,9
Corpo de Bombeiros 2 1,2
Agentes Penitenciários 2 1,2
Polícia Federal 1 0,6
Em suma, a participação de bombeiros e agentes penitenciários é muito
pequena (4 casos, entre eles apenas um caso classificado como ‗confronto
com suspeitos1‘). Por isso, eles terão um impacto muito pequeno na análise
global, que pode ser entendida basicamente como análise de confrontos
envolvendo policiais.
Entre os civis envolvidos, 92% são homens e 5% mulheres, sendo que o
3% restante não apresenta informação para determinar o sexo. Os envolvidos
civis são bastante jovens, pois mais da metade deles têm menos de 24 anos. A
média de idade é de 25.6 anos, apenas um ano a mais da registrada em 2007.
Esse perfil não surpreende na medida em que homens jovens são as vítimas
preferenciais da violência letal no Brasil.
Cada episódio foi classificado dentro de uma tipologia geral de acordo
com a sua natureza, elaborada para facilitar a compreensão da dinâmica dos
fatos. As categorias seguem a mesma linha dos relatórios de anos passados,
embora com algumas modificações realizadas a partir de sugestões dos
1 Ver explicação dessa categoria mais adiante.
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membros da Comissão da Pesquisa de Letalidade Policial, rebatizada
posteriormente como Comissão de Acompanhamento da Letalidade.
Aproximadamente sete em cada dez casos são ―conflitos entre agentes
públicos e suspeitos‖, isto é, episódios em que os agentes intervêm, a princípio,
na sua qualidade de agentes de segurança pública, para preservar a lei, a
ordem ou a integridade das pessoas. Esta intervenção pode acontecer não
apenas durante o serviço profissional, mas também durante a folga, desde que
o servidor participe na qualidade de agente de segurança pública. A proporção
de casos enquadrada nesta categoria é análoga à encontrada no ano anterior.
No entanto, quando o servidor público participa de uma disputa privada,
como qualquer outro cidadão, o caso é classificado como ―conflito inter-
individual‖, ou seja, uma disputa que inclui indivíduos cuja profissão é agente
público. Nestes casos, o agente público não atua na qualidade de tal, mas age
como uma pessoa comum. Esta natureza engloba aproximadamente 8% dos
casos.
A terceira categoria mais freqüente é a que corresponde a agentes
públicos que reagem a um assalto, provocando ferimentos nos assaltantes ou
neles mesmos.
O registro de suicídios e de acidentes, dos quais não houve nenhum
caso encaminhado durante o primeiro semestre de 2007, é um outro indício de
que a cobertura dos registros fornecidos pelas corporações aparentemente
melhorou em 2008. O saldo final de 6 suicídios consumados de policiais
militares, 1 suicídio de policial civil e 1 suicídio de bombeiro confirma o risco de
suicídio nestas profissões de alto estresse e a importância de uma política
preventiva. Dois desses suicídios aconteceram em episódios classificados
como ‘homicídio-suicídio‘ nos quais a pessoa, neste caso um agente público,
comete um homicídio contra uma pessoa próxima antes de se suicidar.
Houve 8 casos de disparos acidentais, todos eles relativos a policiais
militares, embora em alguns casos o relato permita albergar dúvidas sobre se o
disparo foi ou não acidental. De qualquer forma, estes fatos sublinham a
necessidade de enfatizar a importância do treinamento no manuseio das armas
para reduzir os acidentes.
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A execução sumária é uma ação deliberada para matar uma pessoa.
Isto pode acontecer quando agentes públicos tratam de executar um suspeito,
à margem da lei, e também no caso contrário: quando civis tentam assassinar
um policial, por exemplo. Em 2008 houve 6 casos registrados de execução
sumária (ou tentativa) contra agente público e nenhum caso de execução
cometida por agente público contra civil.
O resumo do número de casos de acordo com a natureza pode ser
observado na tabela seguinte:
TABELA 4
Número de Ocorrências de acordo com a Natureza
TIPOLOGIA DO FATO
Número de
Episódios
% Civis Feridos
Civis Mortos
Agentes Públicos Feridos
Agentes Públicos Mortos
Conflito entre Agente e Suspeito 113 68,9 80 41 12 2
Conflito Inter-Individual 14 8,5 15 3 0 4
Agente Vítima de Assalto 13 7,9 6 3 5 3
Acidente 8 4,9 4 2 2 1
Suicídio ou tentativa 8 4,9 - - 2 6
Execução sumária contra agente ou tentativa 6 3,7 3 1 3 1
Homicídio-Suicídio 2 1,2 0 1 0 3
TOTAL 164 100% 108 51 24 20
A tabela contém, além do número de casos por natureza, o número de
feridos e de mortos acontecidos nestes episódios, separando os agentes
públicos dos civis. Embora a análise mais precisa da vitimização será realizada
no epígrafe seguinte, estas cifras podem ajudar a entender melhor as
características e os resultados desses confrontos. A grande maioria das vítimas
acontece em confrontos entre policiais e suspeitos.
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3. Vitimização.
Em primeiro lugar, é importante explicar o objetivo e o enfoque deste
monitoramento. Assim, este relatório não pretende determinar a legalidade ou a
adequação técnica da atuação dos agentes da lei em cada um dos episódios
coletados.
Idealmente, seria importante separar estes episódios em três situações:
a) casos em que os agentes públicos agiram de forma legal e
tecnicamente adequada, isto é, nos quais o uso da força letal era
imprescindível para preservar suas vidas ou as de terceiros2;
b) casos em que os agentes públicos, mesmo tendo agido conforme a
lei e os regulamentos, poderiam ter atuado de uma outra forma que
tivesse resultado num número menor de vítimas ou em danos menos
graves para as mesmas. Nestas situações, uma melhora no
treinamento, no equipamento ou uma alteração na doutrina, por
exemplo, poderiam ajudar a diminuir a letalidade;
c) casos em que o agente público comete crime pois usa a força contra
terceiros de forma ilegal e, portanto, deveria ser processado
penalmente.
Entretanto, o relatório não pretende realizar essa análise, entre outras
coisas porque a documentação existente para este trabalho é limitada e não
permite uma conclusão irrefutável sobre a legalidade ou sobre a adequação
das intervenções individuais dos agentes de segurança. Na verdade, o material
disponível corresponde a uma versão inicial dos fatos, seja das instituições ou
seja da imprensa, sem uma investigação em profundidade e sem laudos
técnicos. Portanto, é possível que em ocasiões a versão apresentada não
coincida exatamente com a realidade. Sabemos, por exemplo, que nos casos
de abusos policiais no Brasil não é raro que a primeira versão oficial seja a
apresentada pelos próprios policiais, que obviamente não confessarão os seus
2 De acordo com os ‗Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos
Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei‘ adotados pelas Nações Unidas no seu Congresso de Havana em 1990: “ Em qualquer caso, o uso letal intencional de armas de fogo só poderá ser feito quando estritamente inevitável à proteção da vida.”
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desvios. Por outro lado, matérias da imprensa podem conter acusações contra
policiais que não sejam inteiramente verdadeiras.
De qualquer forma, a intenção central deste monitoramento não é
oferecer conclusões finais sobre casos individuais, mas analisar o conjunto da
vitimização nos episódios que envolvem agentes de segurança pública do
estado, como uma ferramenta para refletir sobre possíveis medidas para
preveni-la. Nesta concepção, qualquer tipo de vitimização, seja dos civis ou dos
agentes públicos, é sempre um resultado negativo que deverá, a princípio, ser
minimizado, independentemente da sua legalidade. Em suma, o foco do
trabalho é a vitimização e não os crimes cometidos contra ou por agentes
públicos. Dentro da vitimização, a letalidade é uma dimensão mais específica
que também deve ser minimizada. Isto é, mesmo quando o uso da força seja
inevitável, é importante tentar reduzir, na medida do possível, os danos
produzidos3.
Nesse sentido, o conceito de letalidade —que está mantido no título do
relatório em função do histórico das pesquisas, do monitoramento e das
comissões formadas nesta área— deve ser entendido de forma ampla. Se as
pesquisas dos primeiros anos eram intituladas ―Letalidade da Ação Policial‖,
hoje o título é mais abrangente por vários motivos. Em primeiro lugar, abrange
todas as instituições do Sistema de Defesa Social e não apenas as polícias,
mesmo que as outras organizações, como os bombeiros e os agentes
penitenciários, apresentem uma probabilidade muito menor de participar em
incidentes armados. Em segundo lugar, inclui episódios de vitimização que não
poderiam ser qualificados, propriamente, de ação policial, mas que resultam
em vitimização, como os suicídios e os conflitos inter-individuais.
Em qualquer caso, o conceito de letalidade inclui também episódios em
que o desenlace não é fatal, desde que haja feridos por arma de fogo. Estes
casos de ferimento também não se enquadrariam, a princípio, numa idéia
estrita de ‗letalidade‘, mas são imprescindíveis para poder avaliar
adequadamente os casos com resultado fatal e para estudar a vitimização por
3 Conforme consagra o princípio 5b contido nos „Princípios Básicos sobre o Uso da Força e
Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei‟ anteriormente mencionados.
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arma de fogo de forma mais geral. Em suma, a noção de ‗letalidade‘ deve ser
entendida aqui de forma abrangente, e não restrita.
Em cada incidente, foram contabilizados o número de envolvidos
(autores e vítimas das agressões), de feridos e de mortos. Os agentes
vitimados foram separados por corporação.
Quando não havia certeza do número exato de envolvidos, registrou-se
o número aproximado, utilizando as seguintes categorias:
a) Indefinido, menos de 5
b) Indefinido, de 5 a 10
c) Indefinido, mais de 10
d) Totalmente Indefinido
Na hora de estimar o número total de envolvidos, optou-se por um
número intermediário de cada intervalo, utilizando um viés conservador para
não superestimar o número total4.
As cifras da vitimização registradas em 2008, comparadas com as de
anos anteriores, podem ser examinadas na seguinte tabela.
4 A categoria „a‟ (mencionada acima) foi substituída pelo valor 2; a categoria „b‟ pelo valor 7; a
categoria „c‟ pelo valor 11; e para a categoria „d‟ escolhemos o mínimo valor possível: 1.
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TABELA 5
VITIMIZAÇÃO POR ARMA DE FOGO NO SISTEMA DE DEFESA SOCIAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS, POR ANO
ANO
2002 2003 2005 2006 2007 2008
ENVOLVIDOS
Civis 336 554 616 377 421 317
Policiais Militares 374 479 498 342 374 316
Policiais Civis 6 48 34 28 39 15
Bombeiros Militares 0 0 2 7 4 2
Agentes Penitenciários 8
FERIDOS
Civis 121 149 198 135 127 108
Policiais Militares 52 49 56 29 48 22
Policiais Civis 1 9 10 3 2 0
Bombeiros Militares 0 0 1 1 1 1
Agentes Penitenciários 1
MORTOS
Civis 55 96 71 50 74 51
Policiais Militares 12 22 18 18 11 16
Policiais Civis 2 12 5 3 5 3
Bombeiros Militares 0 0 0 2 0 1
Agentes Penitenciários 0
O número de envolvidos em todas as categorias diminui em 2008 em
comparação com 2007, como caberia esperar em função do descenso no
número de episódios registrados5.
Um dado muito positivo é que o número de feridos também caiu em
todas as categorias em relação ao ano anterior. Os policiais militares feridos,
em particular, foram reduzidos a menos da metade.
Por sua vez, os civis mortos revelam também uma redução importante,
retornando ao patamar de 2006 depois da subida experimentada em 2007. Os
policiais militares mortos aumentam um pouco, mas dentro de um nível
compatível com o dos últimos anos.
5 A comparação relativa ao número de envolvidos não pode ser feita de forma automática com
anos anteriores a 2007, pois o procedimento de estimação dos envolvidos não era o mesmo.
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Os casos relativos a policiais civis e bombeiros são tão poucos que é
impossível estabelecer uma tendência confiável. De qualquer forma, a baixa
vitimização provocada e sofrida por policiais civis é sempre uma boa notícia,
considerando que a natureza do seu trabalho, diferentemente da dos
bombeiros, os expõe em alguma medida a confrontos armados.
Para dimensionar melhor as cifras da letalidade e seguindo a sugestão
proposta por instituições representadas na Comissão da Pesquisa de
Letalidade Policial, apresentam-se as cifras de vitimização fatal ponderadas por
outras variáveis. As dimensões usadas na ponderação foram as seguintes: a)
população; b) contingente policial; c) número de prisões efetuadas; d) número
de homicídios registrados; e) número de armas apreendidas pelas polícias. A
princípio, é esperável que o número de mortes se incremente na medida em
que a população, os efetivos policiais, as prisões, as apreensões de armas e a
violência em geral —representada pelos homicídios— aumente. As prisões de
suspeitos e as apreensões de armas, por exemplo, são situações de conflito
potencial nas quais poderia surgir um confronto armado.
Estas ponderações são mais importantes na medida em que a série
temporal se prolonga (no momento atual há dados desde 2002 a 2008), o que
poderia implicar diferenças significativas, no tempo, relativas ao tamanho da
população ou das corporações. Num contexto de crescimento demográfico ou
de aumento do contingente policial caberia esperar também algum aumento
dos casos registrados sem que isso signifique necessariamente um incremento
da incidência real do fenômeno.
No entanto, em alguns casos não dispomos de todas as informações
pertinentes relativas aos primeiros anos da série. De qualquer forma,
calculamos as ponderações mesmo nesta situação, com a idéia de que sirvam
de referência para anos futuros.
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TABELA 6
Vitimização Fatal por Arma de Fogo no Sistema de Defesa Social de MG, de acordo com população, número de agentes, homicídios e prisões
ANO
2002 2003 2005 2006 2007 2008
Civis Mortos 55 96 71 50 74 51
Agentes de Segurança Pública Mortos 14 34 23 23 16 20
Civis mortos para cada 100.000 hab. 0,40 0,27
Agentes mortos para cada 100.000 hab. 0,09 0,11
Civis mortos para cada 1.000 agentes6 1,39
Agentes mortos para cada 1.000 agentes 0,55
Civis mortos para cada 1.000 homicídios 19,65 14,23
Agentes mortos para cada 1.000 homicídios 4,25 5,58
Civis mortos para cada 1.000 prisões 0,24 0,15
Agentes mortos para cada 1.000 prisões 0,05 0,06
Civis mortos para cada 1.000 armas apreendidas 3,29
Agentes mortos para cada 1.000 armas apreendidas 1,29
A conclusão mais importante é que todas as ponderações confirmam
que a letalidade contra civis caiu em 2008 em comparação com o ano anterior.
Assim, mesmo quando considerados o nível geral de violência, o número de
prisões, o crescimento da população ou do contingente policial, a diminuição no
número de mortes de civis em intervenções de agentes de segurança pública
continua sendo clara. A mesma conclusão pode ser aplicada ao aumento da
letalidade dos funcionários de segurança pública em 2008, mas neste caso o
incremento é relativamente pequeno.
Em seguida, apresentamos quatro tipos de indicadores apropriados
para avaliar a letalidade das ações dos agentes de segurança pública:
a) O número médio de mortos por episódio revela a letalidade dessas
ocorrências, tanto para os agentes públicos quanto para os civis;
b) A razão entre agentes públicos mortos e civis mortos, que deveria
resultar num valor superior a 1, dado que os agentes são
teoricamente melhor treinados e, quando estão de serviço, costumam
trabalhar em grupo. Espera-se, portanto, que exista um maior
número de vítimas fatais entre os civis do que entre os policiais. No
entanto, quando a razão é muito superior a 1, ela pode estar
6 O indicador considerou o número de policiais militares, policiais civis e bombeiros.
-
21
revelando um uso excessivo da força por parte da polícia. O
professor Chevigny7 afirma que quando esse quociente é superior a
10, isto é, quando os civis mortos superam em mais de dez vezes os
policiais mortos, há evidências de uso excessivo da força e provável
ocorrência de execuções sumárias. Contudo, essa razão está
pensada originalmente para confrontos entre policiais e suspeitos de
cometer crimes, de forma que a ocorrência freqüente de execuções
sumárias de policiais, como tem sucedido no Rio e em São Paulo nos
últimos anos, ou de vítimas em conflitos inter-individuais pode
introduzir um viés no indicador.
c) A proporção de homicídios (de civis) provocados por intervenções de
agentes de segurança. O objetivo central das corporações é
preservar os bens jurídicos, sendo a vida dos cidadãos o principal
deles. Portanto, quando uma proporção considerável dos homicídios
é resultado da intervenção dos próprios agentes, há indícios de uso
excessivo da força. Em pesquisas internacionais, o esperado é que a
proporção de homicídios decorrente da intervenção dos agentes
públicos não ultrapasse em muito 5% do total. Quando ela é superior
a 10 ou 20%, isso constitui um indício de uso excessivo da força.
d) O índice de letalidade, que é a razão entre o número de mortos e o
número de feridos acontecidos nos incidentes armados. Em
confrontos legítimos, o número de feridos deve ser superior ao de
mortos, o que se traduz num valor do indicador inferior a 1.
Pesquisas em várias cidades8 dos EUA revelaram de fato valores em
torno de 0.5, enquanto que em São Paulo e no Rio de Janeiro os
valores chegavam a ultrapassar 2 e 3. Com efeito, um indicador
superior a 1, isto é, com mais mortos do que feridos, é uma forte
evidência de uso excessivo da força e da provável presença de
execuções sumárias. Como já foi comentado a propósito do indicador
anterior, tentativas de execuções de policiais tenderão também a
aumentar o valor do indicador. Em todos os casos, espera-se um
7 Chevigny, Pau (1991) "Police Deadly Force as Social Control: Jamaica, Brazil and Argentina",
Série Dossiê NEV, n.2, 1991, p. 10. Núcleo de Estudos da Violência, USP, São Paulo. 8 Cano, I. (1997) Letalidade da Ação Policial no Rio de Janeiro. ISER
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22
valor inferior a 1, particularmente nos episódios classificados como
―conflito entre agente e suspeito‖.
Os resultados dos quatro indicadores podem ser conferidos na seguinte
tabela.
TABELA 7
INDICADORES DE LETALIDADE NO SISTEMA DE DEFESA SOCIAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS, POR ANO
ANO
2002 2003 2005 2006 2007 2008
Número Médio de Civis Mortos por Episódio 0.26 0.34 0.24 0.21 0.38 0.31
Número Médio de Agentes Mortos por Episódio 0.07 0.12 0.08 0.09 0.08 0.12
Razão entre civis mortos e agentes mortos 3.9 2.8 3.1 2.4 4,6 2.5
Proporção de Homicídios dolosos (de civis) provocados por agentes públicos
1.4%
Índice de Letalidade (razão entre mortos e feridos) entre...
Civis 0.45 0.64 0.36 0.37 0.58 0.47
Policiais Militares 0.23 0.45 0.32 0.62 0.23 0.73
Policias Civis 2.00 1.33 0.50 1.00 2.50 --9
O número de civis mortos por episódio diminuiu levemente em 2008,
depois de uma forte subida no ano anterior. Já o número médio de agentes
mortos por incidente aumentou um pouco, mas dentro dos patamares históricos
registrados por este indicador.
A razão entre civis e agentes mortos experimentou uma queda bastante
pronunciada, atingindo um valor por volta de 2.5, o que implica reverter o
aumento no ano de 2007 e retornar ao patamar de 2006.
A proporção de homicídios dolosos de civis resultado da intervenção dos
agentes de segurança pública é bastante reduzida e compatível com
patamares internacionais.
9 O indicador não pode ser calculado porque o denominador, o número de feridos, é igual a 0.
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23
O índice de letalidade dos civis recuou um pouco em relação a 2007,
mas sem conseguir voltar aos níveis de anos anteriores. O valor continua
sendo razoável em termos de comparação internacional.
Por sua vez, o índice de letalidade dos policiais militares piorou bastante,
atingindo o valor mais alto em todos os anos pesquisados.
Em suma, os indicadores de letalidade relativos a civis experimentaram
uma melhora em 2008, que reverteu parcialmente o agravamento sofrido em
2007. Já os indicadores de letalidade dos policiais militares se deterioraram em
2008, embora os valores não sejam ainda dramáticos.
Vale lembrar que todas as análises partem do suposto de que a
comunicação dos casos segue um processo confiável e homogêneo no tempo.
Qualquer mudança ou omissão nos procedimentos de registro e comunicação
dos casos pode enviesar os resultados.
Com a intenção de aferir o valor dos indicadores para confrontos
armados, os valores de todos eles foram recalculados para os episódios
classificados de ‗conflito entre agente e suspeito‘, isto é, deixando de fora nesta
ocasião os acidentes, os suicídios, as execuções sumárias, os casos em que o
agente público é vítima de assalto e os conflitos inter-individuais. Os casos de
conflito entre agente e suspeito são os que respondem propriamente à
dinâmica de confrontos de agentes da lei no exercício da sua função e se
prestam melhor a uma comparação internacional. O novo total de casos passa
a ser de 113.
Os novos valores para 2007 e 2008 são os seguintes:
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24
TABELA 8
INDICADORES DE LETALIDADE NO SISTEMA DE DEFESA SOCIAL DO ESTADO DE MG, PARA OS EPISÓDIOS DE CONFLITO ENTRE AGENTES PÚBLICOS E SUSPEITOS
ANO
2007 2008
Número Médio de Civis Mortos por Episódio 0.41 0.36
Número Médio de Agentes Mortos por Episódio 0.04 0.02
Razão entre civis mortos e agentes mortos 11.6 20.5
Índice de Letalidade (razão entre mortos e feridos) entre...
Civis 0.62 0.51
Policiais Militares 0.10 0.17
Policias Civis 2.0 --10
Os valores não são muito diferentes dos obtidos para o conjunto total
dos casos, com duas exceções:
a) a razão entre civis mortos e agentes mortos é muito mais
elevada e bastante superior à de 2007. Esse resultado é surpreendente,
considerando que o número de civis mortos diminuiu e o número de
agentes falecidos aumentou no último ano. A explicação reside no
pequeno número de mortes de agentes públicos nos confrontos com
suspeitos. Dos 20 agentes falecidos, apenas dois foram mortos em
confrontos com suspeitos (o resto morreu em contextos diversos como
conflitos inter-individuais, suicídios, assaltos, etc.), enquanto que 41 dos
51 civis mortos perderam a vida nestas circunstâncias. Em 2007, 5 das
16 mortes de agentes aconteceram em confrontos com suspeitos, o que
resultou num indicador mais moderado. De qualquer forma, o valor de
2008 (20.5) levanta a suspeita da possibilidade de uso excessivo da
força nos confrontos, mesmo ressalvando o fato de que o denominador
ser muito pequeno (2) implica em grande instabilidade do indicador, que
poderia sofrer fortes alterações com um caso a mais ou a menos.
b) o índice de letalidade dos policiais militares é agora menor, de
novo em função do pequeno número de policiais mortos em confrontos
10
O indicador não pode ser calculado porque não há casos de feridos nem de mortos nesta categoria..
-
25
com suspeitos. Esse resultado confirma que o risco para os agentes da
lei, sobretudo o risco letal, é muito mais alto durante a folga do que
durante o serviço.
A grande maioria destes conflitos com suspeitos acontece durante o
serviço dos agentes (92%), mas há alguns casos em que o agente de folga
intervém num crime em flagrante. Nesse sentido, um recorte adicional é a
análise separada e específica dos casos de conflito com suspeitos durante o
serviço funcional. Estes são os casos que podem ser classificados em geral,
mais propriamente, como intervenções policiais, e que são mais susceptíveis
às medidas de planejamento e prevenção que as corporações possam tomar.
Os resultados dos indicadores de letalidade para esses episódios de
conflito com suspeitos durante o serviço são os seguintes.
TABELA 9
INDICADORES DE LETALIDADE NO SISTEMA DE DEFESA SOCIAL DO ESTADO DE MG, PARA OS EPISÓDIOS DE CONFLITO ENTRE AGENTES PÚBLICOS DE SERVIÇO E SUSPEITOS
ANO
2007 2008
Número Médio de Civis Mortos por Episódio 0.44 0.37
Número Médio de Agentes Mortos por Episódio 0.02 0.02
Razão entre civis mortos e agentes mortos 27.5 19
Índice de Letalidade (razão entre mortos e feridos) entre...
Civis 0.68 0.51
Policiais Militares 0.07 0.20
Policias Civis -- --11
Os resultados são semelhantes aos obtidos para o conjunto dos casos
de conflito entre agentes e suspeitos, com uma exceção: a razão entre civis
mortos e agentes mortos continua sendo muito alta em 2008 (38 civis mortos
contra 2 agentes mortos), mas é menor do que em 2007 (55 civis mortos contra
2 agentes mortos). Em suma, isso confirma que o indicador é muito instável por
11
O indicador não pode ser calculado porque não há casos de feridos nem de mortos nesta categoria..
-
26
causa do pequeno tamanho do denominador e também indica que, mesmo
preocupante, o indicador não parece pior em 2008 do que em 2007, pelo
menos no referente a confrontos com suspeitos durante o serviço funcional.
-
27
4. Características dos Episódios.
Esta seção tenta descrever os incidentes armados a partir das
informações registradas nos documentos.
Praticamente um quarto das ocorrências aconteceu em Belo Horizonte
(24%), a mesma proporção encontrada nos anos anteriores. Em segundo lugar,
aparece Contagem e, bem mais distante, Betim. Apesar do fato de Contagem
ser apenas só um pouco maior do que Betim em termos populacionais, os
dados ano a ano confirmam que a letalidade é maior no primeiro município do
que no segundo.
A seguir, encontramos vários centros regionais, como Ipatinga,
Uberlândia, Divinópolis e Montes Claros. Governador Valadares, que aparecia
em terceiro lugar em 2007 com 8 casos, aparece agora com apenas dois
episódios.
A metade restante dos casos está espalhada por um grande número de
municípios do interior.
TABELA 10
NÚMERO DE CASOS POR MUNICÍPIO
Freqüência %
Belo Horizonte 39 23.8
Contagem 14 8.5
Betim 7 4.3
Ipatinga 7 4.3
Uberlândia 5 3.0
Divinópolis 4 2.4
Montes Claros 4 2.4
Santa Luzia 3 1.8
Sete Lagoas 3 1.8
Governador Valadares 2 1.2
Manga 2 1.2
Sabará 2 1.2
Aimorés 1 .6
Angelândia 1 .6
Araguari 1 .6
Bandeira do Sul 1 .6
Bom Jesus do Galho 1 .6
Bom Repouso 1 .6
Campanario 1 .6
Capim Branco 1 .6
Caputira 1 .6
Carlos Chagas 1 .6
Catuji 1 .6
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28
Formiga 1 .6
Franciscópolis 1 .6
Frei Lagoneiro 1 .6
Fronteira 1 .6
Fruta de Leite 1 .6
Frutal 1 .6
Gurinhatã 1 .6
Ibirité 1 .6
Igaparé 1 .6
Indaiabira 1 .6
Itabira 1 .6
Itaobim 1 .6
Itaúna 1 .6
Ituintaba 1 .6
Iturama 1 .6
Jaboticaba 1 .6
Janaina 1 .6
Juiz de Fora 1 .6
Lagoa Formosa 1 .6
Mariana 1 .6
Monte Alegre 1 .6
Monte Carmelo 1 .6
Muzambinho 1 .6
Nova Era 1 .6
Ouro Preto 1 .6
Palmeiras 1 .6
Paraopiba 1 .6
Patos de Minas 1 .6
Peçanha 1 .6
Pedro Leopoldo 1 .6
Pirajuba 1 .6
Pirapora 1 .6
Piunhi 1 .6
Pompéu 1 .6
Ponte Nova 1 .6
Porteirinha 1 .6
Raposos 1 .6
Ribeirão das Neves 1 .6
S.S. Paraíso 1 .6
Salvador - Bahia 1 .6
Santa Barbara do Leste 1 .6
São Gotardo 1 .6
São Joaquim de bicas 1 .6
São Sebastião do Anta 1 .6
Três corações 1 .6
Trimoteo 1 .6
Uberaba 1 .6
Uberlandia 1 .6
Vargem Grande do Rio Pardo 1 .6
Vespasiano 1 .6
Virginópolis 1 .6
-
29
Município Desconhecido 10 6.1
Total 164 100.0
Ainda em relação à distribuição territorial, um dado importante é o
relativo às unidades de lotação dos agentes públicos envolvidos. Estudos em
outros estados comprovaram que a existência de sub-culturas policiais
específicas em alguns batalhões e delegacias pode elevar de forma drástica a
letalidade das suas ações. Por isso, é importante monitorar os dados sobre
vitimização provocados pelas distintas unidades policiais para, se for o caso,
tomar medidas preventivas ou corretivas.
A tabela seguinte apresenta o número de ocorrências registradas para
cada unidade, bem como a vitimização acumulada nelas.
TABELA 11
NÚMERO DE OCORRÊNCIAS COM VÍTIMAS, DE ACORDO COM A UNIDADE POLICIAL À QUE PERTENCEM OS AGENTES
UNIDADE DE LOTAÇÃO Número de Ocorrências
Civis
Feridos
Civis
Mortos
Policiais
Feridos
Policiais
Mortos
14º BPM IPATINGA 7 6 1 1 0
39º BPM CONTAGEM 6 2 4 1 0
18º BPM CONTAGEM 5 3 4 1 0
33º BPM BETIM 5 5 2 2 0
13º BPM BELO HORIZONTE 4 4 0 0 0
22º BPM BELO HORIZONTE 4 2 3 0 0
11º BPM MANHUACU 3 1 2 0 0
11º RPM 3 1 2 0 0
17º BPM UBERLÂNDIA 3 3 0 0 0
23º BPM DIVINÓPOLIS 3 1 0 1 1
34º BPM BELO HORIZONTE 3 2 1 1 0
35º BPM 3 2 1 0 0
36º BPM 3 1 1 1 0
3º RPM 3 1 1 1 0
41º BPM 3 2 2 0 0
5º BPM 3 2 2 1 0
CPE 3 2 1 0 0
12º BPM 2 2 0 0 0
15º BPM 2 1 0 0 1
16º BPM 2 1 0 0 1
19º BPM 2 0 1 1 0
25º BPM 2 1 1 0 0
-
30
40º BPM 2 1 0 0 1
43º BPM 2 1 1 0 0
44º BPM 2 2 0 0 0
48º BPM 2 0 2 0 0
5º RPM 2 1 1 0 0
6º BPM 2 1 1 0 0
9º RPM 2 0 0 1 1
1° DRPC 1 0 0 0 2
10° DRPC 1 1 0 0 0
10º BPM 1 0 1 1 0
1º BPM 1 0 0 0 1
20ºBPM 1 0 0 0 1
24º BPM 1 1 0 0 0
26º BPM 1 1 0 0 0
2º BPM 1 6 0 0 0
30º BPM 1 1 0 0 0
32º BPM 1 0 0 0 1
3º BPM 1 0 0 1 0
46º BPM 1 1 0 1 0
4º BPM 1 1 0 0 0
7ª CIA PM 1 0 1 0 1
7ª RTM 1 1 0 0 0
7º BPM 1 0 1 0 0
Delegacia de Carlos Chagas 1 1 0 0 0
Delegacia Padre Paraíso 1 0 1 0 0
Desconhecida 58 43 13 9 9
TOTAL 164 108 51 24 20
O 14º BPM Batalhão, de Ipatinga é a unidade com maior número de
casos, seguido do 39º BP, de Contagem, do 18º BPM, de Contagem, e do 33º,
de Betim. Chama a atenção o fato de Contagem contar com dois batalhões de
alta letalidade.
Entre os batalhões mencionados, apenas o 18 º BP figurava nos
primeiros lugares em 2007. Já o 15º BPM (Patos de Minas), que ocupava o
primeiro lugar em 2007 com 7 ocorrências, passou para apenas dois casos em
2008.
Em relação à patente ou carreira dos agentes de segurança pública
envolvidos nestes incidentes, seja como autor ou como vítima, os totais podem
ser observados na seguinte tabela.
-
31
TABELA 12
Patente ou Carreira dos Agentes Públicos Envolvidos
Freqüência
PM
Soldado 100
Cabo 80
Sargento 54
Tenente 7
Capitão 1
PC
Agente 8
Detetive 1
Escrivão 1
Delegado 1
Perito Criminal 1
OUTROS
Agente Penitenciário 2
A prática totalidade dos agentes é de baixa patente ou de baixa
hierarquia. Soldados, cabos e sargentos são os protagonistas da grande
maioria dos incidentes. De fato, os documentos registram a participação de
apenas 8 oficiais da Polícia Militar e de 1 delegado.
A seguir, passamos a descrever as características gerais dos episódios
analisados. A metade dos casos acontece na rua. Outros 22 episódios são
registrados em aglomerados, provavelmente boa parte deles também na via
pública. Um total de 18 correspondem à zona rural. Em suma, a grande maioria
destes incidentes armados ocorre em espaços públicos. Em relação ao ano
passado, aumentam justamente os casos nos aglomerados e nas áreas rurais.
-
32
TABELA 13
TIPO DE LOCAL
Freqüência %
Via pública 83 50.6
Aglomerado 22 13.4
Zona rural 18 11.0
Residência particular 16 9.8
Estabelecimento commercial 10 6.1
Veículo coletivo 4 2.4
DP ou batalhão 3 1.8
Instituição pública 2 1.2
Estabelecimento prisional 1 .6
Estabelecimento sócio educativo 1 .6
Bar/ boate 1 .6
Não informado/Não identificado 3 1.8
Total 164 100.0
Na seção anterior, foi examinada a natureza das ocorrências de acordo
com os critérios da pesquisa. Uma outra forma de analisar os fatos é observar
os títulos dos Boletins de Ocorrência que registraram estes episódios, isto é, a
forma como a própria polícia os classifica. Esta tipologia está baseada no
REDS – Registro de Eventos de Defesa Social. Embora um B.O. possa ser
classificado com mais de um título, isto aconteceu em apenas um caso. Por
isso, será utilizado apenas o primeiro título na análise.
A tabela seguinte mostra os títulos tal como apareciam registrados nos
documentos, sem modificações. Tal como em anos anteriores, a maioria dos
fatos são tipificados pela polícia como homicídios tentados ou consumados.
Aumentaram, no entanto, os casos de ‗Lesão Corporal‘, que passaram de 9%
em 2007 a 16.5% em 2008.
-
33
TABELA 14
TÍTULOS DOS B.O.s
Título do B.O. Freqüência %
Homicídio tentado 73 44.5%
Homicídio consumado 40 24.4%
Homicídio 4 2.4%
Lesão corporal 27 16.5%
Suicídio Consumado 5 3.0%
Suicídio tentado 2 1.2%
Homicídio seguido de suicídio 1 0.6%
Art. 129 1° I 1 0.6%
Dano 1 0.6%
Porte de arma de fogo 1 0.6%
Porte de droga 1 0.6%
Sem informação 8 4.9%
Total 164 100%
Em suma, as mortes de civis pela polícia mineira são tipificadas como
homicídio ao invés de usar categorias como ‗resistência seguida de morte‘ ou
‗auto de resistência‘, utilizadas pelas polícias de vários estados brasileiros para
evitar a prisão dos agentes públicos e uma fiscalização mais rigorosa dos fatos
por parte do sistema de justiça criminal. Outro expediente utilizado pelas
polícias fluminense e paulista, por exemplo, é classificar o fato de acordo com o
crime supostamente cometido pela vítima fatal, omitindo a morte da mesma na
tipificação. Os dados mostram que isto ocorre em Minas Gerais muito
raramente e, mesmo assim, em casos de ferimentos (tipificados como ‗porte de
armas‘ ou ‗porte de drogas‘) e não de mortes.
Do total dos 164 episódios, os documentos indicavam que em 100 deles
os civis possuíam uma arma de fogo e em um mínimo de 70 casos fizeram uso
dessas armas. Considerando que há 12 fatos sem civis envolvidos, isto
significa que existem ainda 52 episódios em que os civis estariam, a princípio,
desarmados ou pelo menos não havia registro de armas nos documentos
consultados. Nestes episódios, foi registrada a apreensão de um total de 72
armas de civis após os fatos. Nessas armas, foi verificado que um total de 39
projéteis tinham sido deflagrados (uma média de 0.54 projéteis por arma
-
34
arrecadada). Embora as armas possam em alguns casos ter sido recarregadas,
esta reduzida média de disparos por arma sugere tiroteios curtos. A maioria
das armas apreendidas das que se conhece o tipo são revólveres (36) e, em
segundo lugar, pistolas (13). A escassez de apreensões de armas longas ou de
repetição é um bom sinal, na medida em que diminui a letalidade. Em estados
em que armas de caráter militar são comuns, a letalidade costuma ser muito
maior.
Quanto aos agentes públicos, eles estavam armados em quase todos os
casos (159). Um total de 98 armas de agentes foram apreendidas após os
fatos. Nessas armas, foi conferido que tinham sido deflagrados um total de
apenas 9 projéteis (média de 0.09 projéteis por arma). Este número de
projéteis registrados, embora provavelmente inferior ao real, também sugere
tiroteios curtos. As armas arrecadadas com os agentes públicos são quase
sempre pistolas ou revólveres, embora exista também um caso de
submetralhadora e um outro de escopeta.
Em 143 incidentes (87% do total), alguma vítima foi socorrida ao
hospital. A prática totalidade de casos com feridos registra o encaminhamento
para o hospital. Neste sentido, parece que o dever de prover socorro aos
feridos, conforme estabelecido no princípio 5c dos Princípios Básicos sobre o
Uso da Força, é sistematicamente respeitado.
Em mais de duas em cada três ocorrências, os agentes envolvidos
encontravam-se de serviço durante o incidente, enquanto há mais ou menos
um quarto do total dos casos em que os agentes estavam de folga. Esta
proporção é praticamente idêntica à obtida em 2007.
-
35
TABELA 15
Os Agentes estavam de serviço durante a ocorrência?
Freqüência %
Todos 115 70,1
Nenhum 41 25,0
Não informado 8 4,9
Total 164 100,0
Durante a folga, a letalidade dos agentes públicos é muito maior: 11 dos
20 agentes mortos e 11 dos 24 agentes feridos aconteceram fora de serviço.
Este padrão é consistente durante os últimos anos em Minas Gerais e também
comum a outros estados do Brasil, pois o risco de homicídio para os policiais
costuma ser sempre maior fora do horário de trabalho, seja exercendo outros
trabalhos de segurança privada, seja se envolvendo em conflitos privados, seja
como vítimas de crimes na rua. Durante o policiamento, os agentes estão
relativamente mais protegidos. Já a vitimização dos civis é superior durante o
serviço dos agentes: 39 dos 51 civis mortos e 82 dos 108 civis feridos foram
provocados por intervenções de agentes em serviço.
Em seguida, com o objetivo de realizar uma análise mais especifica das
intervenções dos operadores de segurança pública, foi estudada a vitimização
apenas dos casos classificados como ―conflito entre agentes e suspeitos‖.
Assim, foram deixados de lado para esta análise os episódios referentes a
―conflitos inter-individuais‖, ―execuções sumárias‖, ―disparos acidentais‖,
―suicídios‖ e ―agentes vítimas de assaltos‖. O novo total é de 113 ocorrências.
Os incidentes se dividem em operações de cunho diverso. O número de
respostas a chamados é o mais alto, seguido do patrulhamento rotineiro e das
operações especiais.
-
36
TABELA 16
Tipo de Intervenção
Freqüência %
Chamado 51 45,1
Patrulhamento rotineiro 26 23,0
Operação especial 17 15,0
Folga 6 5,3
Outros 2 1,8
Não informado 11 9,7 Total 113 100,0
Para comparar a letalidade das diversas intervenções, calculamos a
média de mortos e feridos segundo o tipo de intervenção. Contudo, as médias
são muitas vezes instáveis, pois o número de casos em algumas células é
reduzido.
A princípio, não se registram grandes diferenças na vitimização dos civis
de acordo com o tipo de intervenção, talvez com a exceção de um menor
número de civis mortos durante a folga. Este é exatamente o mesmo padrão
obtido também em 2007. Em relação à vitimização dos agentes, também não
se observam diferenças significativas de acordo com o tipo de intervenção.
TABELA 17
Média de Feridos e Mortos por Episódio, segundo o Tipo de Intervenção
Tipo de Intervenção Civis
Feridos Civis Mortos Agentes Feridos
Agentes Mortos
Chamado Média de Vítimas ,76 ,37 ,10 ,02
Número de Casos 51 51 51 51
Patrulhamento rotineiro Média de Vítimas ,77 ,38 ,08 ,00
Número de Casos 26 26 26 26
Operação especial Média de Vítimas ,59 ,41 ,12 ,06
Número de Casos 17 17 17 17
Folga Média de Vítimas ,67 ,17 ,17 ,00
Número de Casos 6 6 6 6
Outros Média de Vítimas 1,00 ,00 ,00 ,00
Número de Casos 2 2 2 2
Total Média de Vítimas ,74 ,36 ,10 ,02
Número de Casos 102 102 102 102
O fato que motivou a intervenção do agente público foi, na maioria dos
casos, um delito flagrante ou uma suspeição relativa a alguns dos envolvidos.
Um quinto dos relatos afirmam que os policiais foram simplesmente ‗recebidos
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a tiros‘ durante o seu patrulhamento. Em comparação com 2007, aumentou o
peso relativo dos casos com delito flagrante e diminuiu a proporção de
incidentes provocados por abordagens de suspeitos.
De forma geral, o número de incidentes decorrentes de ordem judiciais
de apreensão e registro é muito pequeno, o que significa que os incidentes
armados acontecem basicamente de forma inesperada e sem planejamento.
TABELA 18
Motivo da Intervenção dos Agentes Públicos
Freqüência %
Delito Flagrante 44 38,9
Abordagem de suspeito 34 30,1
Recebidos a tiros 23 20,4
Apreensão/ registro com ordem judicial 4 3,5
Participação/ envolvimento em brigas 1 ,9
Outros 6 5,3 Não informado 1 ,9
Total 113 100,0
Como acabamos de relatar, alguns dos episódios armados foram
provocados por um crime cometido anteriormente. Entre eles, o mais comum é
o roubo, seguido da tentativa de homicídio. Ameaças e tráfico de drogas
aparecem em terceiro e quarto lugar, respectivamente. O número de casos de
furto é pequeno (3 casos), mas ainda preocupante, pois dado que o furto é um
crime cometido com violência, não deveria, a princípio, originar intervenções
armadas.
TABELA 19
Crime prévio que ocasionou o Incidente Armado
Freqüência %
Nenhum 34 30,1
Roubo 19 16,8
Tentativa de Homicídio 17 15,0
Ameaça 11 9,7
Tráfico 10 8,8
Porte ilegal de arma 6 5,3
Lesão corporal 5 4,4
Furto 3 2,7
Homicídio 1 ,9
Seqüestro 1 ,9
Outros 2 1,8
Não Informado 4 3,5
Total 113 100,0
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O tráfico de drogas não é um crime central na produção de confrontos
armados, ao contrário do que acontece em outros estados, notadamente no
Rio de Janeiro. Mesmo assim, a proporção de episódios originados de um
crime de tráfico aumentou de 4% em 2007 para 9% em 2007. Paralelamente,
se em 2007 9% dos casos de ‗confronto com suspeitos‘ resultaram em
apreensões de drogas, em 2008 a proporção duplicou-se (18%)12. É preciso
acompanhar esses dados no futuro para verificar se existe uma tendência
neste sentido.
12
No Rio de Janeiro, uma pesquisa sobre intervenções policiais com vítimas civis revelou que 29% das ocorrências fatais relatavam apreensão de drogas (cf. Cano, I. (1997) Letalidade da Ação Policial no Rio de Janeiro. ISER.
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5. Conclusões e recomendações.
As conclusões principais do estudo podem ser resumidas da seguinte
forma:
1. Existem vários indícios de que a cobertura das informações sobre
letalidade policial fornecidas pelas instituições, particularmente as
polícias, parece ter melhorado. O ponto mais importante é que o
número de casos identificado através da imprensa diminuiu
sensivelmente em relação ao ano anterior. Em segundo lugar, não há
um declínio significativo de casos no último mês do ano. Em terceiro
lugar, suicídios e acidentes foram reportados de forma regular,
diferentemente do que pareceu acontecer no primeiro semestre de
2007.
2. O número de incidentes armados diminuiu significativamente em
relação a 2007, continuando uma tendência de queda de vários anos.
Da mesma forma, o número de feridos, tanto civis quanto agentes
públicos, também experimentou uma queda importante. O número de
civis mortos em intervenções de agentes de segurança pública
também caiu, invertendo o aumento de 2007 e retornando aos níveis
de 2006. A mesma conclusão se mantém quando a evolução das
vítimas é ponderada pela população geral, pelo tamanho do
contingente policial, pelo número de homicídios e pelo número de
prisões. Já o número de agentes falecidos nestes incidentes
aumentou um pouco em 2008, mas continua no mesmo patamar dos
registros de anos anteriores.
3. Em geral, os índices de letalidade contra civis também melhoraram
em 2008. Assim, o número médio de mortes por episódio, a razão
entre civis mortos e agentes mortos e o índice de letalidade (razão
entre os mortos e os feridos) dos civis são todos inferiores aos
registrados no ano anterior e continuam dentro de parâmetros
internacionais. O único valor preocupante é o da razão entre civis
mortos e agentes mortos quando aplicado exclusivamente aos fatos
classificados como ‗confronto entre agentes públicos e suspeitos‘ (ou
seja, ignorando acidentes, suicídios, conflitos privados e casos em
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que o agente é vítima de execução sumária ou de crime na rua).
Neste caso, o valor deste indicador atinge um valor próximo de 20, o
que vai além do patamar esperado. No entanto, quando
consideramos apenas os casos durante o serviço funcional dos
agentes, o indicador, mesmo elevado, é inferior ao obtido em 2007.
De qualquer forma, o reduzido tamanho do denominador provoca que
este indicador seja bastante instável.
4. Os incidentes armados costumam ocorrer na rua e freqüentemente
são resultado de delitos flagrantes ou abordagens de suspeitos.
Esses delitos costumam ser roubos ou homicídios. A proporção de
casos relativos a tráfico de drogas é pequena, embora tenha
aumentado em relação a 2007. De qualquer forma, a grande maioria
destes incidentes armados não acontece em operações planejadas,
o que dificulta a sua prevenção. Para os policiais, a folga é
claramente mais perigosa do que o que o serviço.
5. O registro policial dos incidentes armados é feito em B.O.s
geralmente tipificados como ‗homicídio‘ ou ‗lesão corporal‘, isto é, de
acordo com a lei. Não existe uma tentativa de encobrir os fatos
recorrendo a uma tipificação que omita as vítimas fatais, como
acontece em outros estados. A obrigação de prestar socorro aos
feridos parece ser observada de forma sistemática.
6. Entre as unidades policiais com maior número de incidentes armados
destacaram o 14º BPM (Ipatinga), o 39º BPM (Ribeirão das Neves), o
18º BPM (Contagem) e o 33º BPM (Betim). Em relação ao ano
anterior, apenas o 18º BPM continua nos primeiros lugares, enquanto
que o 15º BPM (Patos de Minas) conseguiu diminuir drasticamente a
sua letalidade.
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Em função das conclusões precedentes, é possível formular as
seguintes recomendações:
1. Convocar reuniões com os comandantes dos batalhões com maior
letalidade, corregedores, ouvidores e membros da Secretaria de
Defesa Social, para tentar entender as causas desse cenário e
formular medidas para revertê-lo.
2. Recomendar à Comissão de Acompanhamento da Letalidade uma
análise detalhada dos casos classificados como disparos acidentais.
Alguns deles teriam acontecido em lutas corporais ou em situações
de tensão que permitem duvidar, em alguns casos, do caráter
acidental dos disparos.
3. Recomendar à Comissão de Acompanhamento da Letalidade uma
revisão detalhada dos casos de fuga de suspeitos. Alguns dos relatos
permitem suspeitar que alguns policiais estariam usando a arma
apenas para impedir a fuga de suspeitos desarmados, o que
contraria a lei e os princípios internacionais. O treinamento nas
Academias de Polícia deveria ser modificado em função desta
revisão, sublinhando que o uso da arma é permitido apenas em
casos de grave e imediata ameaça à vida ou à segurança do agente
público ou de terceiros.
4. Incorporar de forma ampla armamento não letal dentro do arsenal
disponível para os agentes de segurança no seu trabalho cotidiano.
Em vários episódios, o uso da arma por parte do agente responde a
uma ameaça de um civil que usa uma faca ou alguma outra arma
não letal. Nessas situações, o emprego de armas não letais (como
sprays de pimenta) poderia ter substituído ao disparo da arma,
protegendo melhor ao agente público e diminuindo a vitimização e o
dano causado ao civil.