liberté, egalité, fraternité - nome dos autores

15
LIBERTÉ, ÉGALITÉ, FRATERNITÉ NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO Karla Raphaella Costa Pereira (PPGE/UECE) Maria Núbia de Araújo (UECE) Prof. Dr. Frederico Jorge Ferreira Costa (PPGE/UECE) RESUMO Este trabalho apresenta os resultados iniciais de pesquisa realizada que visa compreender o papel da educação na sociedade capitalista, bem como as possibilidades dela, nesta sociedade, propiciar o desenvolvimento das potencialidades humanas. Compreende que a educação possui um sentido latu, geral, e um sentido, stricto. Neste sentido, mesmo servindo prioritariamente aos interesses da classe dominante, ela, por sua autonomia relativa, engendra a contradição em seu seio, permitindo ao professor o desenvolvimento de atividades educativas de caráter emancipador. O texto desenvolve uma análise acerca do desenvolvimento do discurso burguês de liberdade, igualdade e fraternidade, gestado nas Revoluções Burguesas e ampliado na contemporaneidade, como tentativa de adaptação do sistema à crise que enfrenta. A educação não é, de acordo com os resultados obtidos neste estudo, apenas um aparelho reprodutor da ideologia. A pesquisa é de natureza teórico- bibliográfica e toma uma perspectiva ontológica do conhecimento e da análise do real calcada no materialismo histórico dialético. Palavras-chave: Democracia burguesa. Trabalho. Educação. INTRODUÇÃO O texto apresenta uma discussão acerca do papel da educação na sociedade burguesa, com foco para a possibilidade de desenvolver no educando as potencialidades humanas. Em sentido lato 1 , a educação é o complexo social responsável por transmitir os conhecimentos, valores e habilidades desenvolvidas pelo homem ao longo de sua démarche histórica, tendo como complexo fundante o trabalho. Desta forma, a análise fundamenta-se na ontologia do ser social, tomando como pólo regente a própria realidade. A compreensão da função social da educação no mundo humano é imprescindível para esboçar uma crítica de seu papel na sociedade capitalista, pois, entende-se aqui que a matriz fundamental de construção dessa sociedade, que tem como fundamento último a relação dos homens com a natureza, o trabalho, determina, em larga medida, sua atuação. Em sentido stricto, no entanto, a educação, quando está a serviço das classes dominantes, à exploração e desapropriação dos trabalhadores, que são os legítimos produtores da riqueza social, tem servido prioritariamente, nos termos de Lukács 2 , como ideologia. 1 Sobre isso ver: SAVIANI, Demerval. O trabalho como princípio educativo frente às novas tecnologias. In: FERRETI, Celso João (Org.). Novas tecnologias, trabalho e educação: um debate multidisciplinar. Petrópolis: Vozes, 1994. 2 A ideologia é sobretudo a forma de elaboração ideal da realidade que serve para tornar a práxis social humana consciente e capaz de agir” (LUKÁCS, 2013, p. 465).

Upload: karlinharapha

Post on 20-Dec-2015

13 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

Artigo - Política e educação. Uso liberado desde que se faça a citação de autoria.

TRANSCRIPT

LIBERTÉ, ÉGALITÉ, FRATERNITÉ NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO

Karla Raphaella Costa Pereira (PPGE/UECE)

Maria Núbia de Araújo (UECE)

Prof. Dr. Frederico Jorge Ferreira Costa (PPGE/UECE)

RESUMO

Este trabalho apresenta os resultados iniciais de pesquisa realizada que visa compreender o

papel da educação na sociedade capitalista, bem como as possibilidades dela, nesta sociedade,

propiciar o desenvolvimento das potencialidades humanas. Compreende que a educação

possui um sentido latu, geral, e um sentido, stricto. Neste sentido, mesmo servindo

prioritariamente aos interesses da classe dominante, ela, por sua autonomia relativa, engendra

a contradição em seu seio, permitindo ao professor o desenvolvimento de atividades

educativas de caráter emancipador. O texto desenvolve uma análise acerca do

desenvolvimento do discurso burguês de liberdade, igualdade e fraternidade, gestado nas

Revoluções Burguesas e ampliado na contemporaneidade, como tentativa de adaptação do

sistema à crise que enfrenta. A educação não é, de acordo com os resultados obtidos neste

estudo, apenas um aparelho reprodutor da ideologia. A pesquisa é de natureza teórico-

bibliográfica e toma uma perspectiva ontológica do conhecimento e da análise do real calcada

no materialismo histórico dialético.

Palavras-chave: Democracia burguesa. Trabalho. Educação.

INTRODUÇÃO

O texto apresenta uma discussão acerca do papel da educação na sociedade

burguesa, com foco para a possibilidade de desenvolver no educando as potencialidades

humanas. Em sentido lato1, a educação é o complexo social responsável por transmitir os

conhecimentos, valores e habilidades desenvolvidas pelo homem ao longo de sua démarche

histórica, tendo como complexo fundante o trabalho.

Desta forma, a análise fundamenta-se na ontologia do ser social, tomando como

pólo regente a própria realidade. A compreensão da função social da educação no mundo

humano é imprescindível para esboçar uma crítica de seu papel na sociedade capitalista, pois,

entende-se aqui que a matriz fundamental de construção dessa sociedade, que tem como

fundamento último a relação dos homens com a natureza, o trabalho, determina, em larga

medida, sua atuação.

Em sentido stricto, no entanto, a educação, quando está a serviço das classes

dominantes, à exploração e desapropriação dos trabalhadores, que são os legítimos produtores

da riqueza social, tem servido prioritariamente, nos termos de Lukács2, como ideologia.

1 Sobre isso ver: SAVIANI, Demerval. O trabalho como princípio educativo frente às novas tecnologias. In: FERRETI,

Celso João (Org.). Novas tecnologias, trabalho e educação: um debate multidisciplinar. Petrópolis: Vozes, 1994. 2 “A ideologia é sobretudo a forma de elaboração ideal da realidade que serve para tornar a práxis social humana consciente e

capaz de agir” (LUKÁCS, 2013, p. 465).

2

Nos últimos anos, o aumento da violência, do desemprego, da miséria e das

contradições da sociedade capitalista, evidenciam o caráter cada vez mais excludente e

opressor da forma de organização social atual. Nesse sentido, o sistema de educação vai ser

indispensável para a produção e reprodução da sociabilidade regida pelo capital.

O texto divide-se em três partes. Na primeira, apresenta-se, de forma breve, o

contexto de ascensão da burguesia como classe dominante e sua atuação no campo

ideológico. No segundo, destaca-se a atual conjuntura de crise do sistema do capital e a

ampliação do direito do cidadão como resposta às necessidades postas pela crise. A ampliação

formal das categorias de igualdade, liberdade e fraternidade que conformam a ideia de

cidadania diante das necessidades postas pela crise. No último capítulo, aponta as

possibilidades e os limites da educação, dentro das coordenadas estabelecidas pelo discurso da

cidadania de desenvolver as potencialidades humanas.

Baseados, para tanto, nas seguintes fontes: Marx (1971, 1845, 2010a, 2010b e

2010c); Tonet (2012, 2013a e 2013b); Lukács (2013); Lessa (2008 e 2012); Lessa e Tonet

(2008) Andrade (2012); De Paula, Moraes e Costa (2012); Gomes (2012); Manacorda

(2010); e Mészáros (2002, 2003).

Entende-se que a relevância deste trabalho está assentada no fato de a educação

ser importante para compreender os limites e as possibilidades da atividade educativa para

que se tenha uma práxis consciente e, assim, contribuir com as possibilidades de

desenvolvimento das potencialidades genuinamente humanas, no caminho para construção de

uma sociedade para além do capital.

1 - A cidadania burguesa como garantia da igualdade formal

A ascensão da burguesia e sua consolidação como classe hegemônica a partir do

desenvolvimento das forças produtivas deu-se na passagem da Idade Média para a Idade

Moderna, através de um processo de revoluções burguesas, a Independência dos Países

Baixos (1568-1648), Revolução Inglesa (1640-1689,) Revolução Francesa (1789) e

Independência dos Estados Unidos (1775–1783), e contribuíram na transformação do mundo

segundo os interesses da acumulação capitalista, reconfigurando um conjunto de ideias e

concepções político-econômicas e sócio-culturais. Com o advento da visão antropocêntrica,

mudaram o ponto de vista político, econômico, sociocultural e filosófico. “O ciclo das

chamadas revoluções burguesas foi o momento em que dentre outras coisas, a burguesia lutou

3

para instruir o seu poder, também, no Estado. Ou seja, para emancipar-se politicamente como

classe” (ANDRADE, 2012, p.15).

O novo modo de produção capitalista permitiu, ao longo do processo de transição

da sociedade feudal, uma nova forma de produção com base na acumulação da riqueza

assegurada pelo ato da compra e venda da força de trabalho, o qual consolidou o surgimento

das classes sociais: burguesia e proletariado.

[...] ao longo deste processo, também vão se constituindo as duas grandes classes

que serão os eixos fundamentais desta nova sociedade: a classe burguesa e a classe

proletária. A primeira, através da transformação de alguns servos e camponeses em

comerciantes e depois em industriais e a segunda através da transformação da

maioria dos servos em força de trabalho livre. Deste modo, vai se constituindo a

célula manter da nova forma de sociabilidade: o ato de compra-e-venda de força de

trabalho, com todas as suas exigências e consequências (TONET, 2013a, p. 30).

A Revolução Francesa trouxe uma série de conquistas para a humanidade, no

contexto dos direitos do cidadão, ou seja, no campo da emancipação política. Esta revolução

ainda hoje é considerada um marco divisório, pois reivindicava para si o domínio geral em

nome dos direitos gerais da sociedade.

A sociedade passaria, após a Revolução Francesa, que conclamava Liberdade,

Igualdade e Fraternidade em nível universal a limitar-se a constituição de uma sociedade

baseada num contrato social. No dia 26 de agosto de 1789, a Assembleia Nacional

Constituinte proclamou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Tal declaração

tinha como pontos princípios a defesa do respeito ao Estado, à dignidade do homem, a

liberdade e a igualdade perante a lei, o direito à propriedade individual e a liberdade do direito

de opinião. Tais pressupostos eram base da constituição da nova sociedade, a burguesa, uma

sociedade baseada num contrato social evitaria os conflitos.

“Como o homem é por natureza competitivo, mau, egoísta, avaro, não restaria à

humanidade outro caminho senão reconhecer esse fato e buscar uma forma de sociedade em

que a luta de todos contra todos não a desagregasse” (LESSA, 2012, p. 134). Esta se

fundamentava na concepção de que todos os homens são livres para estabelecer vínculos no

campo do trabalho, nesse sentido, havia a classe dos proprietários e a classe dos não

proprietários. Os primeiros detinham a liberdade de vender, comprar e investir, dentre outras,

já os trabalhadores possuíam apenas a sua mão-de-obra como seu único bem.

De acordo com Lessa, isso se dá devido a uma inversão entre fundado e fundante

com o objetivo de mistificar o status quo. As leis estabelecidas, no contexto das Revoluções

Burguesas, não apenas ordenariam, mas fundariam a sociedade.

E se a lei afirma o direito à propriedade privada, se alei garante o “direito” de o

capital explorar o trabalho, não há injustiça na exploração do homem pelo homem.

4

Por essa via, o complexo do Direito, por milhares de anos, tem fornecido elementos

importantes à constituição de uma visão de mundo que, nas sociedades de classe,

tem auxiliado para tornar “operativa” a práxis cotidiana dos indivíduos. E, nessa

exata medida, o Direito é uma forma específica de ideologia (LESSA, 2012, p. 69).

Dessa forma, desenvolve-se um antagonismo, a classe dos capitalistas e a dos

trabalhadores, acirrando cada vez mais, seus interesses opostos. Ora, na verdade, a liberdade

não existe para o trabalhador, já que tem que transformar o trabalho, no mínimo, em moradia,

comida e subsistência, pois, como afirma Lessa e Tonet, “[...] o burguês é muito mais

poderoso do que o operário, a igualdade política afirmada pela democracia significa, de fato, a

máxima liberdade para o capital explorar a força de trabalho” (2008, p.88).

Atualmente, os sistemas de governos no mundo inteiro ainda ancoram seus

fundamentos na Revolução Francesa. Tais princípios tornaram-se direitos políticos, civis,

sociais e culturais, dentre outros. Tratar-se-á aqui desses direitos, sobretudo, os direitos

políticos, civis e sociais.

Entende-se, pois, que:

O Estado capitalista, cuja expressão política mais acabada é a democracia burguesa,

nada mais é, para Marx e Lukács, do que todo Estado sempre foi: um instrumento

especial de repressão a serviço das classes dominantes. O que torna o Estado

burguês diferentemente do Estado escravista, ou mesmo do feudal, é que ele mantém

e reproduz a desigualdade social afirmando a igualdade política e jurídica entre os

indivíduos (LESSA e TONET, 2008, p.89).

Após a revolução, duas classes se estabelecem: a burguesia e o proletariado. A

relação entre essas duas classes, apesar de ser de exploração, é diferente daquela gestada nas

sociedades escravistas, o trabalhador aqui vende a sua força de trabalho e é, aparentemente,

livre para fazê-lo. O burguês compra a força de trabalho em forma de salário, mas para que

seja possível separar o trabalhador de sua força de trabalho e, assim, aferi-la um preço, é

preciso que o trabalhador seja apartado dos meios de produção e do produto final do seu

trabalho, reduzindo o artesão a uma simples mercadoria.

Nas palavras de Marx e Engels, não se pode negar que a burguesia desempenhou

um papel revolucionário, pois superou as formas de organizações sociais anteriores a ela,

possibilitou o desenvolvimento sem precedentes das forças produtivas, proporcionou,

também, um grande progresso político e conquistou a soberania que se constituíram, inclusive

em melhores condições sociais para a humanidade.

Historicamente, a burguesia desempenhou um papel revolucionário. Onde quer que

tenha assumido o poder, a burguesia pôs fim a todas as relações feudais, patriarcais e

idílicas. Destruiu impiedosamente os vários laços feudais que ligavam o homem e

seus “superiores naturais”, deixando como única forma de relação de homem a

homem o laço do frio interesse, o insensível “pagamento à vista”. Afogou os êxtases

sagrados do fervor religioso, do entusiasmo cavalheiresco, do sentimentalismo

pequeno-burguês nas águas gélidas do cálculo egoísta. Fez da dignidade pessoal um

simples valor de troca e em nome das numerosas liberdades conquistadas

5

estabeleceu a implacável liberdade de comércio. Em suma, substitui a exploração,

encoberta pelas ilusões religiosas e políticas, pela exploração aberta, única, direta e

brutal. A burguesia despojou de sua auréola toda a ocupação até então considerada

honrada e encarada com respeito. Converteu o médico, o jurista, o padre, o poeta, o

homem da ciência em trabalhadores assalariados. A burguesia rasgou o véu

sentimental da família, reduzindo as relações familiares a meras relações monetárias

(MARX E ENGELS, 2003, P. 28-29).

Ao vender sua força de trabalho, o homem dirige-se a fábrica para realizar

determinada atividade, apartado da dimensão humanizadora do trabalho, ele sente que aquela

atividade lhe é exterior, não lhe pertence. No trabalho, o homem, enquanto mercadoria,

pertence ao patrão, deve-lhe servir e realizar as tarefas para as quais é pago.

No próximo tópico será possível perceber como o discurso da democracia

burguesa não consegue escamotear o verdadeiro interesse do capital, manter seu acúmulo. No

contexto de crise e de administração da barbárie, as concessões feitas à classe dos

trabalhadores não têm conseguido manter a aparência da cidadania.

2 A administração da barbárie e a manutenção do sistema do capital

O aprofundamento da barbárie, da violência, da miséria, do desemprego crônico,

postos pela crise estrutural do capital3, impõe ao sistema uma maior necessidade de

mistificação do real, que passa por uma série de mediações, dentre elas, a ampliação do

discurso político da liberdade, da igualdade e da garantia do direito.

A democracia, no entanto, como afirmado no tópico anterior, responde às

necessidades do modo de produção capitalista, ou seja, da exploração do homem pelo homem.

Assim, conserva “legalmente”, através de seus aparelhos, os exploradores e os explorados,

cumprindo seus devidos papéis na sociabilidade hodierna.

Para Mészáros, a atual situação do mundo, já revela o caráter antagônico do

sistema capitalista que não é capaz de suprir as necessidades da humanidade. Nesse sentido,

Andrade (2012, p. 21) afirma:

Os “defeitos estruturais do capital” sobre os quais o Estado moderno deve agir são,

segundo Mészáros, a separação entre produção e controle; a fragmentação entre

produção e consumo; e a oposição entre produção e circulação. Em faces desses

“defeitos estruturais”, a função do Estado é “retificar” a carência de unidade

existente entre eles (grifo nosso).

A afirmação de Andrade coloca em xeque o papel do Estado como provedor e

mantenedor da igualdade dos homens, como conciliador de conflitos para o estabelecimento

do bem comum. A autora salienta que, na verdade, o papel do Estado é consertar as

3 Sobre isso, ver Mészáros, 2002.

6

deficiências que o capital possa sofrer, auxiliando da manutenção do padrão de acumulação

mesmo em meio aos “defeitos estruturais do capital”.

É importante assinalar que a legislação é mutante. Ela se transforma para adaptar-

se às necessidades do sistema. Ainda de acordo com Andrade (idem, ibidem), ao tomar

Mészáros, a legislação trabalhista tem sua ação voltada para a conveniência do sistema em

mutação, é “[...] por isso que as leis antissindicais repressivas do passado recente não são de

modo algum acidentais”.

Permitir que a classe trabalhadora compreenda os desdobramentos da exploração

e o caminho que a humanidade está trilhando rumo à destruição, guiada pelo capital, seria

assumir a possibilidade de revolução. Ora, se a classe trabalhadora, por mais miserável e

explorada, não se percebe como tal, é mais fácil manter o domínio societal. Nesse sentido, o

papel da ideologia é fundamental, mas ele não será abordado aqui. O que se tenta expor é que

os direitos conquistados nas Revoluções Burguesas, que já eram direitos de manutenção da

propriedade privada, são utilizados para escamotear a realidade bárbara em que está

mergulhada a humanidade, bem como o Estado é um instrumento ativo da manutenção dessa

lógica. O capital, para se manter, precisa controlar todos os aspectos do metabolismo social.

Como controla realmente todos os aspectos vitais do metabolismo social, o capital é

capaz de definir separadamente a esfera constituída da legitimação política como

uma questão estritamente formal, excluindo a priori a possibilidade de qualquer

contestação legítima em sua esfera substantiva de operação reprodutiva

socioeconômica (MESZÁROS, 2002, p. 21) (grifo do autor).

Deste modo, o trabalho, antagonista do capital4, não consegue romper com o

domínio do capital. Em momentos de conflito eminente, o Estado faz concessões, ajustes que

beneficiam minimamente a classe trabalhadora, tais ajustes balanceariam a dinâmica de

expansão do capital e as exigências do movimento operário, dos trabalhadores. Segundo

Mészáros (2010), o Estado de Bem-Estar foi a última manifestação desse tipo. Ele só pôde

existir no tempo e nos países onde estes ajustes eram possíveis e não interfeririam na

expansão do capital.

Em contraste com o aumento da fome, da miséria e do desemprego, apontados

anteriormente, assiste-se, diariamente, na mídia, o discurso do progresso da qualidade de vida

da população, que por meio de suas próprias atitudes podem acessar as melhorias das

condições de existência. Veja-se o discurso do empreendedorismo, da meritocracia e da

sustentabilidade. Os trabalhadores são, assim, anestesiados e desviados das reais necessidades

4 Corrobora-se com Lukács (2013), em sua leitura da obra de Marx, quando este afirma que o trabalho é matriz fundante do

ser social, responsável pela instituição do mundo humano, e que o capital é a apropriação do trabalho acumulado por outrem.

Capital e trabalho, portanto, só podem se constituir como antagonistas estruturais.

7

de superação do sistema do capital, diante das barbaridades que os acometem todos os dias,

tal tarefa deveria ser facilmente percebida.

Para suprir as necessidades de manutenção do consumo, por exemplo, a produção

volta-se para a destruição5, criando produtos com tempo de vida limitado e facilmente

tornados obsoletos. Para legitimar essa prática, o Estado restringe, portanto, os direitos do

consumidor, bem como não investe em fiscalização.

A democracia burguesa é contraditória. Marx, em Sobre a questão judaica, já

afirmava que a emancipação política, trazida pela burguesia, representava um grande

progresso, mas não poderia ser a forma da emancipação humana por estar dentro da ordem

mundial do capital.

O limite da emancipação política fica evidente de imediato no fato de o Estado ser

capaz de se libertar de uma limitação sem que o homem realmente fique livre dela,

no fato de o Estado ser capaz de ser um Estado livre [Freistaat, república] sem que

o homem seja um homem livre. (MARX, 2010ª, p. 38-39)

E nas Glosas Críticas assevera:

O princípio da política é a vontade. Quanto mais unilateral, isto é quanto mais

perfeito é o intelecto político, tanto mais ele crê na onipotência da vontade e tanto

mais é cego frente aos limites naturais e espirituais da vontade e, consequentemente,

tanto mais é incapaz de descobrir a fonte dos males sociais (MARX, 2010c, p. 62).

A participação do Estado na administração da barbárie é fundamental para que

não se perceba que, inclusive, os direitos do homem, instituídos na Revolução Francesa, são

negados e que os direitos individuais são ameaçados pela barbárie social do capitalismo que

precisa manter a expansão da sua acumulação.

Desta forma, constantes são os casos nos quais os direitos, as leis não são

respeitadas. A corrupção é banalizada e legitimada pela ausência de punição, assim a memória

da população não consegue guardar a quantidade de escândalos vistos diuturnamente, na

política. A lei, novamente se adapta, quando não é sumariamente esquecida ou distorcida6.

“Se o Estado moderno quisesse acabar com impotência da sua administração, teria que acabar

com a atual vida privada. Se ele quisesse eliminar vida privada, deveria eliminar a si mesmo,

uma vez que ele só existe como antítese dela” (Marx, 2010c, p 61).

Marx (2010a, p. 49) assevera que “A aplicação prática do direito humano à

liberdade equivale ao direito humano à propriedade privada”. Na esteira do filósofo de Trier,

5 Sobre a “produção destrutiva” e a “destruição da produção”, ver Mészáros em Para além do capital. Editora da UNICAMP,

São Paulo. Boitempo, 2002. 6 É paradigmático o exemplo dos julgamentos dos casos do famoso mensalão do PT, iniciado em 2012, bem como os demais

casos envolvendo corrupção política no Brasil, mesmo assim, não são suficientes para construir-se uma memória na

população.

8

defende-se aqui que a revolução política é a revolução da sociedade burguesa, portanto, o

horizonte de luta da classe operária não pode se igualar à luta burguesa.

Em poucas palavras, na medida em que a única classe social historicamente

interessada na superação da propriedade privada, o proletariado, comparece nas lutas

políticas com propostas mais propriamente burguesas ou pequeno-burguesas,

centradas quase sempre na manutenção do emprego (isto é, manutenção da extração

da mais-valia), a proposta de superação do capital e sua substituição por uma

sociedade comunista parece carecer de toda a base social e, portanto, revela-se uma

mera utopia no sentido literal de não ter lugar na História (LESSA, 2012, p. 173).

Os objetivos das classes são como trabalho e capital, ontologicamente

antagônicos. O direito da revolução burguesa foi conquistado para o homem burguês. O

horizonte da luta proletária é a emancipação humana, superando, dessa forma, todo vestígio

de barbárie.

Na totalidade social do sistema, a educação, responsável por transmitir a

humanidade historicamente construída, responde também às necessidades do capital em crise.

Aos educadores, no entanto, não restaria nada a fazer a não ser se conformar com este fato e

esperar que a classe proletária, faça sua revolução? O próximo tópico de discussão tenta trazer

à tona esse debate e apresentar suas contradições e possibilidades.

3 - A educação contra o capital no caminho para a igualdade real

A educação, ao longo dos tempos, desenvolveu um papel determinado na história

da humanidade, tanto na transmissão do conhecimento às novas gerações, como no

estabelecimento da ideologia dominante. Segundo Manacorda (2010, p. 97), a educação no

capitalismo “é colocada como causadora de unilateralidade”, por isso sua função social no

capitalismo é majoritariamente de reprodução. Esta deve se colocar para além de uma questão

de administração de Estado ou de governos, é, na verdade, uma exigência do sistema e de sua

manutenção, não pode se prender às vicissitudes deste ou daquele interesse político-

parlamentar.

A emancipação política limita sua atividade ao Estado, o que não significa

emancipação humana. Compreende-se, na esteira de Marx e nas palavras de Tonet, por

emancipação humana

[...] uma nova forma de sociabilidade, situada para além do capital, na qual os

homens serão livres, isto é, na qual eles controlarão, de maneira livre, consciente,

coletiva e universal o processo de produção da riqueza material (o processo de

trabalho associado) e, a partir disto, o conjunto da vida social (TONET, 2013b, p. 2).

9

A partir do exposto acima, compreende-se que para se alcançar a emancipação

humana, ou seja, para que a humanidade possa ser plenamente livre, é necessária a superação

de toda alienação, exploração e dominação do homem pelo homem.

Numa fase superior da sociedade comunista, quando tiver sido eliminada a

subordinação escravizadora dos indivíduos à divisão do trabalho e, com ela, a

oposição entre trabalho intelectual e manual; quando o trabalho tiver deixado de ser

mero meio de vida e tiver se tornado a primeira necessidade vital; quando,

juntamente com o desenvolvimento multifacetado dos indivíduos, suas forças

produtivas também tiverem crescido e todas as fontes da riqueza coletiva jorrarem

em abundância, apenas então o estreito horizonte jurídico burguês poderá ser

plenamente superado e a sociedade poderá escrever em sua bandeira: “De cada um

segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades” (MARX, 1971, p.

31-32).

A educação, no percurso histórico, modificou-se assumindo a forma sistemática

atual. Partindo dessa concepção, educação e escola coincidem, no entanto, educação é, em sua

gênese, o processo de transmissão dos conhecimentos, valores, habilidades, técnicas, etc.

historicamente acumuladas pela humanidade, no processo de se fazer ser social pela ação do

trabalho.

Diferentemente da concepção burguesa, que vem na atualidade empregando à

educação o papel de gestar a mudança da sociedade, percebe-se que, na sua forma atual, a

educação não pode ser a alavanca para a emancipação (nem lhe cabe, segundo a teoria

marxista, esse papel). A transformação imputada à educação seria a de formar um indivíduo

consciente de seu papel de cidadão que possa atuar, nos limites do Estado, para a conquista de

melhorias, por isso negaria, por sua vez, a necessidade de superação do capital afirmada por

Marx.

A teoria materialista de que os homens são produto das circunstâncias e da educação

e de que, portanto, homens modificados são produto de circunstâncias diferentes e

de educação modificada esquece que as circunstâncias são modificadas precisamente

pelos homens e que o próprio educador precisa ser educado. Leva, pois,

forçosamente, à divisão da sociedade em duas partes, uma das quais se sobrepõe à

sociedade [...]. A coincidência da modificação das circunstâncias e da atividade

humana só pode ser apreendida e racionalmente compreendida como prática

transformadora (MARX, 1845, III Tese sobre Feuerbach).

Imprime-se, assim, a necessidade de existência do complexo da educação,

sobretudo para a classe trabalhadora, pois ele é importante para garantir a apropriação do

conhecimento. É forçoso esclarecer, no entanto, que a educação é apenas uma condição,

portanto, não suficiente para elevar sozinha a consciência e contribuir na superação do capital,

mas é imprescindível à práxis revolucionária. Isto porque a educação escolar, nos moldes das

sociedades de classe, serve para a classe dominante como instrumento de reprodução social.

Daí o interesse do Estado em manter os sistemas educacionais nacionais sob vigilância e sob

10

suas diretrizes. O capital orienta as políticas educacionais através de seus organismos

multilaterais. Gomes (2012, p. 187) destaca tal interesse:

A cornucópia ideológica dirigida em especial aos países sitiados na periferia do

capitalismo central encontra nas políticas educacionais um locus difusor das

imposições dos organismos multilaterais que buscam abolir qualquer tensão capaz

de revelar que as necessidades estruturais do capital são essencialmente distintas das

necessidades do conjunto da humanidade (grifo do autor).

De Paula, Moraes e Costa (2013, p. 190) citam as novas abordagens pedagógicas

que se agrupam nas chamadas pedagogias do “aprender a aprender”: “[...] pedagogia das

competências (Perrenoud), professor reflexivo (David Shön, Tardiff, Edgar Morin, Cesar

Coll)”. Os autores arrematam apontando que

[...] o conjunto dessas teorias fortalece o subjetivismo, a fragmentação do sujeito, o

esvaziamento e a desvalorização do professor, em detrimento da articulação sujeito-

objeto na perspectiva ontológica do ser social, tendo no trabalho sua categoria

fundante. Desse modo, tais perspectivas se coadunam com a chamada sociedade do

conhecimento e com as ilusões dissimuladas por um véu ideológico, contribuindo

para a reprodução do capital em seu sistema metabólico.

Assim, para estabelecer uma nova sociabilidade, se faz necessário, transformar o

modo de produção atual, proporcionando o aproveitamento integral na conquista histórica de

desenvolvimento das forças produtivas realizadas pela humanidade, até aqui. Colocando-o a

serviço de sanar todas as necessidades humanas emergenciais; então, com grau mais elevado

dessas forças produtivas, será possível superar as condições tanto de miséria material, quanto

intelectual, através do trabalho associado. Toda a produção estará à disposição das

necessidades humanas. Esta organização requererá o menor tempo para transformar a

natureza, liberando tempo livre para que o homem possa imergir-se em atividades de sua livre

escolha. “Os homens serão efetivamente (plenamente) livres quando puderem, de fato, ser

senhores de seu destino” (TONET, 2012, p. 35).

A emancipação humana não pode ser, portanto, gestada pela educação, nem

corresponde ela à emancipação política ou a conquista dos plenos direitos sociais, da melhoria

dos salários, do acesso aos serviços públicos, etc. A emancipação humana não se parece em

nada com o Estado de Bem-Estar.

A suprassunção da propriedade privada é, por conseguinte, a emancipação completa

de todas as qualidades e sentidos humanos; mas ela é esta emancipação justamente

pelo fato desses sentidos e propriedades terem se tornando humanos, tanto subjetiva

quanto objetivamente. (MARX, 2010b, 109).

A função da educação defendida aqui seria, portanto, analisar a realidade social a

partir da apropriação histórica e cumulativa dos melhores conhecimentos desenvolvidos pela

humanidade, abordando seus fenômenos, na aproximação da realidade, para tomar a

articulação entre esta e a totalidade social, dialeticamente, conservando seus elementos de

11

continuidade e superando os que necessitam se transformar. Assim a práxis,

indissociabilidade entre teoria e prática, entre subjetividade e objetividade, sob a regência

desta última na atividade humana educativa, imprimirá a sua intencionalidade.

O discurso proferido pelas instituições responsáveis pela educação dos cidadãos

que se destina a ampliar sua participação na esfera política e social como um exercício de sua

cidadania é mistificação do real, uma falácia que envolve a visão de liberdade e igualdade,

ambas limitadas em esferas representativas (parlamento) e espaço de participação como as

escolas, por isso não pode realizar uma mudança substancial na sociedade.

Não é repetição desnecessária dizer, após tudo o que foi exposto que

[...] a natureza essencial da atividade educativa consiste em propiciar ao individuo a

apropriação de conhecimentos, habilidades, valores, comportamentos, etc. que se

constituem em patrimônio acumulado e decantado ao longo da história da

humanidade, contribuindo, assim, para que o indivíduo se construa como membro

do gênero humano e se torne apto a reagir face ao novo de um modo que contribua

para a reprodução do ser social, que se apresenta sempre sob uma determinada

forma particular (TONET, 2012, p. 69).

Já foi defendido aqui que o cidadão, instituído pelo Estado democrático burguês,

não representa a essência do homem. Foi exposto também que a natureza humana não é

egoísta, mas histórica, portanto o Estado não controla a animosidade do homem, mas mascara

a do capital. Indicou-se, ainda, que a educação burguesa visa à manutenção da mistificação da

exploração de muitos por poucos. Portanto, pode-se afirmar, neste momento, que a educação

desta sociedade não tem interesse em emancipar a humanidade do jugo do capital. Resta a

pergunta: se o horizonte é a emancipação, qual o caminho a percorrer, no campo da educação,

se ela possui uma importância cabal para a elevação da consciência de classe.

Coaduna-se, na análise aqui empreendida, com a argumentação de Tonet (2012),

quando este afirma que, as atividades dos professores devem estar articuladas com a

emancipação humana, não com a emancipação política, compreendendo por atividades

educativas emancipadoras aquelas que atendam a requisitos no intuito de contribuir para a

emancipação humana.

Tonet (idem, p. 71-73) aponta, então, cinco requisitos, que só de maneira

introdutória poder-se-á apesentar aqui: 1) “o conhecimento sólido e profundo da natureza da

emancipação humana, que é o fim que se pretende atingir”; 2) “o conhecimento do processo

histórico real, em suas dimensões universais e particulares”; 3) “o conhecimento da natureza

essencial do campo da educação”; 4) “domínio dos conteúdos específicos de cada área do

saber”; e, 5) “articulação da atividade educativa com as lutas desenvolvidas pelas classes

12

subalternas, especialmente com as lutas daqueles que ocupam posições decisivas na estrutura

produtiva”.

As atividades educativas emancipadoras só são possíveis dado o caráter do

fundamento da sociedade burguesa que precisa, por exemplo, desenvolver conhecimentos e

técnicas mais avançadas e, ao mesmo tempo, não permitir o acesso ao conhecimento, por isso

é possível dentro do sistema realizar tais atividades. A classe trabalhadora necessita dos

conhecimentos acumulados pela humanidade, mas, como bem lembra Tonet (2013b),

necessita, também, de um conhecimento revolucionário, ou seja, que dê condições ao homem

de compreender suas determinações históricas. O conhecimento dos limites da educação nesta

sociedade é indispensável para que se saiba que

Pretender, pois, organizar o processo educacional, no seu conjunto, de modo a

favorecer os interesses da classe trabalhadora, é uma empresa fadada, de antemão,

ao fracasso. A condição ineliminável para isso seria a completa destruição do capital

e do Estado, pois, como vimos, são eles que garantem, cada um a seu modo, mas

articuladamente, que a educação seja organizada em função dos interesses da

burguesia. Isto, por sua vez, implicaria uma revolução que destruísse a própria

classe trabalhadora como classe! (TONET, 2013b, p. 05).

Não é aceitável estabelecer fórmulas para as atividades educativas emancipadoras.

Elas precisam de uma concepção de mundo alinhada com o real, com percepção de sua

essência, de uma teoria revolucionária que permita a apreensão desta realidade e, mais

importante, de uma atitude que vise possibilitar aos alunos a compreensão de sua verdadeira

gênese e démarche histórica. O professor precisa assumir, portanto, tal tarefa e encontrar, de

acordo com suas disciplinas, como afirma Tonet (2013b), os meios e as possibilidades de

execução das atividades emancipadoras. Não é, certamente, tarefa fácil, mas é um imperativo

para aqueles comprometidos com a transformação da realidade.

A condição sine qua non da educação para superar tal realidade social e

estabelecer os passos para a igualdade real seria, segundo Marx, o desenvolvimento humano.

[...] a apropriação sensível da essência e da vida humanas, do ser humano objetivo,

da obra humana para o homem e pelo homem, não pode ser apreendida apenas no

sentido da fruição imediata, unilateral, não somente no sentido da posse, no sentido

do ter. O homem se apropria da sua essência omnilateral de uma maneira

omnilateral, portanto como um homem total (2010b, p. 108).

Tal condição de apropriação requer uma forma radicalmente nova de

sociabilidade que proporcione aos seres humanos a sua continuidade ontológica de

transformação do mundo, segundo as condições sócio-históricas, subjugando todas as

determinações às suas necessidades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

13

Expôs-se, neste texto, o discurso burguês da democracia como conquista do

cidadão para a manutenção de sua igualdade, liberdade e fraternidade, nos termos das

Revoluções Burguesas, bem como o imperativo do estabelecimento dessas leis, tomando

como justificativa a natureza essencialmente egoísta e má do homem que precisa ser

controlado pelo Estado.

Elucidou-se também a ampliação do discurso dos direitos e da cidadania como

resposta às necessidades de mistificação postas pela crise estrutural do capital que vem

agudizando as consequências de seu antagonismo estrutural frente ao trabalho.

Defendeu-se que a educação serve ao velamento do real e que não é possível na

sociedade capitalista construir um sistema educacional que se volte para as necessidades da

classe trabalhadora e que a luta pela ampliação dos direitos cidadãos não deve ser o horizonte

da classe trabalhadora.

Além disso, objetivou-se expandir a discussão sobre a função social da educação

nesta sociedade para propiciar aos educadores uma compreensão desvelada do real, a partir da

apresentação do sentido lato da educação, como um complexo social responsável por

transmitir os conhecimentos, valores e habilidades produzidas pela humanidade, no curso da

história, tendo como categoria fundante o trabalho.

A perspectiva marxiana permite analisar a realidade e debruçar-se sobre o papel

ocupado pela educação humana, fato fundamental para crítica, nos termos de Marx, acerca

dos seus limites no sistema capitalista. Compreende-se que o trabalho é a base sobre a qual

repousa tal sociedade.

A educação, por ser categoria fundada no trabalho, estabelece com ele uma

relação de dependência ontológica e de autonomia relativa, por isso, encontra-se, na

reprodução social, ora negando a realidade, ora recriando-a com ilusões acerca da democracia,

cidadania e participação dos trabalhados em geral, bem como criticando-a dada sua autonomia

relativa.

Apesar de toda essa falácia sobre a possibilidade de mudança e gestão do

capitalismo, assiste-se a um estado de barbárie com violência, desemprego, miséria, advindo

das necessidades do capitalismo manter a expansão de seu acúmulo. Assim, a educação será

indispensável ao capital, sobretudo, ao transpor para a escola a tarefa de reprodução das

desigualdades sociais.

Aos professores cabe, portanto, a compreensão dos fatos apresentados para que

possa, nos limites possíveis de seu trabalho, defender o que Tonet chama de atividades

14

educativas emancipadoras, no seio de seus locais de trabalho, visando à possibilidade de

proporcionar aos educandos tanto um conhecimento do real como uma teoria revolucionária.

É importante que se saiba que a possibilidade de superação do capital já está posta na

realidade objetiva e que, essa possibilidade põe, ainda mais, ao sistema a necessidade de

mistificação. A emancipação política é uma forma limitada de liberdade. A verdadeira

liberdade humana está para além do sistema do capital. Formar para a cidadania é alinhar-se

com os interesses da classe burguesa.

Referências Bibliográficas

ANDRADE, Mariana Alves de. IN. Maria Cristina Soares Paniago; Edivânia Melo; Mariana

Alves de Andrade (Orgs). Marx, Mészáros e o Estado. São Paulo: Intstutito Lukács, 2012.

DE PAULA, Ruth; MOARES, Betânea, COSTA, Frederico. O ProJovem e a educação na

sociedade contemporânea. In: SANTOS, Deribaldo. et. al. (org.). Educação pública,

formação profissional e crise do capitalismo contemporâneo. Fortaleza: EdUECE, 2013. 313

p.

GOMES, Valdemarin Coelho. O ajuste das políticas educacionais às determinações do capital

em crise: considerações iniciais sobre a América Latina. In: BERTOLDO, Edna; MOREIRA,

Luciano Accioly Lemos; JIMENEZ, Susana. Trabalho, educação e formação humana frente

à necessidade histórica da revolução. São Paulo: Instituto Lukács, 2012. 239 p.

LESSA, Sérgio; TONET, Ivo. Introdução à Filosofia de Marx. São Paulo, SP: Expressão

Popular, 2008. 128p.

LESSA, Sérgio. Para compreender a ontologia de Lukács. Ijuí: Unijuí, 2012. 240 p.

LUKÁCS, György. Para uma ontologia do ser social II. Tradução de Ivo Tonet, Nélio

Schneider e Ronaldo Vielmi Fortes. São Paulo: Boitempo, 2013. 856 p.

MANACORDA, Mario Alighiero. Marx e a pedagogia moderna. Tradução de Newton

Ramos-de-Oliveira. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010.

MARX, Karl. Sobre a Questão Judaica. São Paulo: Boitempo, 2010a.

______. Manuscritos econômico-filosóficos. Trad. Jesus Ranieri. São Paulo: Boitempo,

2010b.

______. Glosas críticas marginais ao artigo “O rei da Prússia e a Reforma Social.” De um

prussiano. 1 ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010c, 80p.

______. Crítica do Programa de Gotha. Porto. Portucalense editora, 1971.

______. Teses sobre Feuerbach. Karl Heinrich Marx. Ed Ridendo Castigat Mores, versão

para eBook-eBooksBrasil.org. Alemanha, 1845.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto Comunista. Instituto José Luís e Rosa

Sundermann. Disponível em:

http://www.pstu.org.br/sites/default/files/biblioteca/marx_engels_manifesto.pdf Acesso em:

29 de maio de 2014.

15

MÉSZÁROS, István. Socialismo ou Barbárie. Tradução: Paulo Cezar Castenheira. São Paulo.

Boitempo Editorial, 2003.

______. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. Tradução: Sérgio Lessa e

Paulo Cezar Castenheira. São Paulo. Boitempo e Ed. UNICAMP. 2002

TONET, Ivo. Método científico: uma abordagem ontológica. São Paulo: Instituto Lukács,

2013a. 136 p.

______. Educação contra o capital. São Paulo: Instituto Lukács, 2012. 93 p.

______. Atividades educativas emancipadoras: Maceió – AL, 2013b. Disponível em:

http://www.ivotonet.xpg.com.br/. Acesso em: 07 mar. 2013.