livro genetica final
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Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas
Departamento de Educação a Distância
Universidade Aberta do Brasil
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Introdução.................................................................................................................... 04
Capítulo 1: Genética de Transmissão: 1ª e 2ª Lei de Mendel.................. 13
Capítulo 2: Genética de Transmissão: Extensões do Mendelismo........ 52
Capítulo 3: Genética de Transmissão: Herança e Sexo.............................. 82
Capítulo 4: Genética de Transmissão: Ligação e Mapas Genéticos.... 100
Capítulo 5: Genética Molecular: Estrutura dos Ácidos Nucleicos...... 118
Capítulo 6: Genética Molecular: Duplicação do DNA............................... 133
Capítulo 7: Genética Molecular: Transcrição.............................................. 140
Capítulo 8: Genética Molecular: Tradução................................................... 147
Capítulo 9: Genética Molecular: Mutação e Mecanismos de Reparo..162
Referências................................................................................................................ 171
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Muitas vezes, ouvimos falar: Fulano é a cara do pai, olha o jeito de andar e
de dormir, não nega que é seu filho... Se observarmos o zigoto, de um animal e
compararmos com outros de espécies diferentes, por exemplo, um camundongo e
nós humanos, veremos que são muito parecidos, porém, as espécies adultas que
surgem daquela única célula são bem diferentes... Nós, organismos multicelulares,
com células fisiológicas e morfológicas tão diferentes, surgimos a partir de uma
única célula... Desde a pré-história nos perguntamos por que nos parecemos com
nossos pais? Como essas características são passadas de pais para filhos? Esse livro
vem com o objetivo de esclarecer essas questões. Estudaremos como os gametas,
células responsáveis pelo processo de reprodução sexuada, contendo os
cromossomos, transferem essas informações para o novo ser, quais os mecanismos
que permitem que essas características sejam passadas, de pais para filhos; em
nível bioquímico, que moléculas são essas? E como elas conseguem essa façanha?
1. OBJETIVOS DA GENÉTICA
A genética é a área da biologia que se preocupa em explicar como as
semelhanças e diferenças entre os seres vivos, e entre os pais e filhos, são
transmitidas de uma geração a outra, ou, em outras palavras, estuda a
hereditariedade ou herança biológica.
Para que ocorra essa transmissão de características, é necessário que o
material hereditário (material genético), ou o material que será transmitido entre
as gerações, seja passado através dos gametas, único elo físico entre as gerações. O
que resulta na formação do zigoto.
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O zigoto é uma única célula resultante da fertilização do gameta feminino e
masculino e carrega toda a informação para a formação do novo ser multicelular
que apresenta: células, tecidos e órgãos distintos, mas que interagem e funcionam
de forma sincronizada e semelhante à geração anterior.
Para que esse material genético possa ser passado de uma geração a outra e
possa regular, na nova geração, todas as etapas do desenvolvimento, é necessário
que ele apresente uma série de propriedades.
1º) Capacidade de replicação: cada nova célula formada no organismo
também leva a informação contida no zigoto. E cada geração, para se
perpetuar, necessita formar um grande número de gametas para passar para
as novas gerações, logo, é necessário que esse material seja capaz de produzir
cópias dele mesmo (replicar ou duplicar).
2º) Transferir e traduzir Informações: o material genético que vem
nos zigotos, além de trazer informações dos genitores, tem que ter
mecanismos que traduzam essa informação em ações, que são capazes de
controlar e gerenciar desde a formação do zigoto, até cada etapa do
desenvolvimento, como o funcionamento de cada célula, as reações
bioquímicas entre as células, tecidos e órgãos etc.
3º) Capacidade de sofrer mutação: apesar de pais e filhos, ou
organismos de uma mesma espécie se assemelhar, nós somos todos
diferentes, e muitas vezes essas pequenas diferenças podem ir se
acumulando e passando para as gerações posteriores. O acúmulo dessas
diferenças pode permitir o surgimento de novas espécies. A capacidade que
tem o material genético de sofrer modificações é o que permite essa grande
variedade entre a prole e entre as diferentes espécies e conseqüentemente a
evolução.
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2. OS TRÊS GRANDES MARCOS DA GENÉTICA
A genética tem pouco mais de 100 anos, mas os avanços científicos e o
desenvolvimento tecnológico permitiram, em pouco tempo, um grande avanço no
conhecimento das principais formas de transmissão das características genéticas,
da estrutura química desse material genético e, principalmente, de como esse
material genético controla e interfere na característica herdada.
Três grandes eventos marcaram essa história:
2.1. MENDEL E AS REGRAS DE HERANÇA
Gregor Mendel, conhecido como o pai da genética, foi o primeiro que,
através da montagem de experimentos e análise estatísticas dos dados em ervilhas,
propôs padrões de herança para características, tais como: forma da ervilha, cor do
cotilédone da semente, altura do pé etc. Mendel chegou à conclusão de que cada
característica é determinada por 2 fatores hereditários (genes) e que, na hora de
formar os gametas, só um dos fatores vai para os gametas, mas que, ao ocorrer
fertilização, esses fatores voltam a se reunir. Esses fatores ou genes podem
apresentar formas (alelos) e contribuições diferentes para a expressão da
característica, por exemplo, a característica cor do cotilédone da semente pode ser;
verde (determinado por um alelo) ou amarela (determinado por outro alelo). A
relação, na planta, entre esses dois alelos é que vai determinar qual a cor do
cotilédone que será expressa. A coexistência de alelos em uma planta não
compromete, portanto, sua integridade, Mendel também descobriu que alelos de
genes diferentes são herdados de forma independente uns dos outros. ( Veremos
os estudos de Mendel no capítulo 1). É com Mendel que se inicia um dos níveis de
análise genética, que chamamos de genética clássica ou genética de
transmissão.
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2.2. WATSON E CRICK: A ESTRUTURA DO DNA
Após a redescoberta dos trabalhos de Mendel, em 1900, a grande pergunta
que não queria calar é o que eram os fatores hereditários ou genes? Só na década
de 50, experimentos feitos por Hershey e Chase mostram que, em bacteriófagos, o
material que penetra na bactéria e é capaz de formar um novo vírus é o ácido
desoxirribonucleico, o DNA. Porém são Watson e Crick que conseguem explicar e
montar um modelo da estrutura e como esse DNA é capaz de produzir cópias dele
mesmo para passar para a descendência. (Capítulos 5 e 6)
2.3. O PROJETO GENOMA HUMANO: SEQUENCIAMENTO DO DNA E
CATALOGAÇÃO DOS GENES
Os geneticistas, na primeira metade do século XX, sonhavam em identificar
o material de que os genes são feitos, geneticista na segunda metade do século
sonhavam com os modos de determinar as sequências de bases nas moléculas de
DNA. Perto do final do século XX, já era possível determinar as sequências de bases
de vários organismos. Esse processo é chamado sequenciamento do DNA e
culminou, em 2001, com o sequenciamento do DNA humano, com uma média de
2,7 bilhões de pares de bases e de 20000 a 25000 genes. A coleção de genes
sequenciados de um organismo forma o que chamamos de genoma. Foi também
observado que o DNA de eucariotos e incluindo o DNA humano apresentam um
grande número de sequências de nucleotídeos que não expressam genes, ou seja,
que não compõem o genoma.
Após o sequenciamento, esses genes foram catalogados por localização,
estrutura e função potencial.
Os esforços hoje estão voltados para estudar, em nível molecular, o modo
como eles influenciam a grande variedade de características dos seres vivos. O
enfoque da genética baseado na análise das sequências de DNA que constituem um
genoma é chamado de genômica.
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3. PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS DA GENÉTICA NO SÉCULO XX
Além dos acontecimentos mais marcantes que vieram para mudar a ciência
da genética, sabemos que existiu uma série de descobertas que entremeou esses
eventos e que contribuíu de forma decisiva para que eles acontecessem. Na tabela
abaixo, relacionamos esses eventos.
ANO EVENTO
1900 As leis fundamentais da hereditariedade, descobertas por Mendel em
1865, são redescobertas independentemente por C. Correns, H. de Vries
e E. von Tschermak.
1901 .H. de Vries adota o termo mutação para descrever mudanças na
qualidade do material hereditário.
1902-1909 W. Bateson cria os termos Genética, homozigótico, heterozigótico,
alelomorfo e epistasia, além de uma nomenclatura para designar as
gerações em experimentos genéticos: P, F1, F2 etc.
1903 W. Sutton correlaciona as leis de Mendel com o comportamento dos
cromossomos na meiose. Ele e T. Boveri, independentemente, sugerem
que os fatores hereditários deveriam estar nos cromossomos.
1906 W. Bateson e seus colaboradores E. R. Saunders e R. C. Punnett
descrevem o primeiro caso de ligação genética (linkage), em ervilha-
doce, e de interação genética na herança da forma da crista de
galináceos.
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1909
F. A. Janssens sugere que as figuras em forma de letra X
observadas na meiose, resultantes da sobreposição de
cromátides de cromossomos homólogos, seriam originadas pela
troca de pedaços entre elas (permutação ou crossing-over).
A. E. Garrod publica o livro Inborn Errors of Metabolism (Erros
inatos do metabolismo), em que aparecem as primeiras
discussões sobre genética bioquímica.
W. L. Johannsen enfatiza a distinção entre a aparência de um
organismo e sua constituição genética e cria o termo fenótipo
para designar a primeira e genótipo para a segunda. Ele cria
também o termo gene para designar os fatores hereditários.
N. Nilsson Ehle elabora a hipótese de múltiplos fatores (genes
aditivos) para explicar a herança quantitativa da cor da
semente do trigo.
1911 T. H. Morgan descobre os primeiros genes com herança ligada ao sexo
na mosca-do-vinagre Drosophila melanogaster, e sugere que eles
estariam localizados no cromossomo sexual X, iniciando a consolidação
da teoria cromossômica da herança.
1916-1917 E. Twort e F. H. D’Herelle descobrem, independentemente, um vírus
capaz de atacar e destruir bactérias (bacteriófago).
1927 H. J. Muller, um ex-aluno de Morgan, trabalhando com Drosophila
melanogaster, demonstra que raios X são indutores de mutação.
1928 F. Griffith descobre a transformação bacteriana em pneumococos.
1931 C. Stern, trabalhando com Drosophila melanogaster, e H. S. Creighton e
B. McClintock, com milho, fornecem as provas citológicas da ocorrência
de permutação (crossing-over) na meiose.
1935 G. W. Beadle e B. Ephrussi, com base em seus estudos sobre a cor de
olho em Drosophila, lançam a hipótese de que os genes atuam
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controlando as reações químicas celulares por meio de enzimas.
1936 T. Dobzhansky publica o livro Genetics and the Origin of Species
(Genética e a origem das espécies), um marco na área da Genética
evolutiva e na construção da moderna teoria evolucionista.
1939 E. L. Ellis e M. Delbrück iniciam os estudos com bacteriófagos,
marcando o começo dos trabalhos genéticos em vírus.
1941 G. W. Beadie e E. L. Tatum publicam o primeiro trabalho sobre genética
bioquímica no fungo Neurospora crassa, o qual consolidou a teoria
um gene — uma enzima.
1944 O. T. Avery, C. M. MacLeod e M. McCarty isolam o princípio
transformante do pneumococo, mostrando tratar-se do ácido
desoxirribonucleico (DNA), substância descoberta em 1869 por
Miescher.
1950 J. V. Neel fornece provas de que a anemia falciforme (siclemia) é
condicionada pela versão recessiva (alelo recessivo) de um gene.
B. McClintock propõe a existência de “genes saltadores”
(transposons) para explicar certos casos de herança em milho,
o que foi confirmado, 30 anos mais tarde, em diversos
organismos.
1952 A. D. Hershey e M. Chase mostram que apenas o DNA do vírus
bacteriófago penetra na bactéria durante a infecção e que isso é
suficiente para produzir novos vírus completos, sugerindo ser o DNA o
material hereditário viral.
1953 1. Watson e F. Crick propõem a estrutura em dupla-hélice para a
molécula de DNA.
1956 J. H. Tjio e A. Levan demonstram que os humanos têm 46 cromossomos
em suas células (até então, pensava-se que fossem 48).
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1958 M. Meselson e E. W. Stahl demonstram a duplicação semiconservativa
do DNA.
1961 F. Crick, L. Barnett, S. Brenner e R. J. Watts-Tobin obtêm fortes
indícios de que a linguagem genética baseia-se em sequências de
três bases nitrogenadas na molécula de DNA.
E. Jacob e J. Monod propõem o modelo de regulação gênica em
bactéria e a existência do RNA mensageiro, identificado logo
depois.
M. W. Nirenberg, H. Matthaei, 5. Ochoa e H. G. Khorana
desvendam o código genético, estabelecendo a relação entre os
20 aminoácidos que formam as proteínas e 61 trincas de bases
nitrogenadas do RNA mensageiro.
1974 C. A. Hutchinson, J. E. Newbold, S. S. Potter e M. A. Edgell demonstram a
herança exclusivamente materna do DNA mitocondrial em híbridos
entre cavalo e jumento.
1978 W. Arber, D. Nathans e H. O. Smith recebem o Prêmio Nobel em
Fisiologia ou Medicina pela descoberta das enzimas de restrição e
sua aplicação em problemas de Genética molecular.
1980 P. Berg, W. Gilbert e F. Sanger recebem o Prêmio Nobel em Química. O
primeiro por seus estudos sobre a bioquímica dos ácidos nucleicos, que
levaram ao desenvolvimento da tecnologia do DNA recombinante
(Engenharia Genética); os dois últimos por sua contribuição no
desenvolvimento de métodos de sequenciamento do DNA.
1989 S. Altman e T. R. Cech recebem o Prêmio Nobel em Química pela
descoberta das ribozimas, moléculas de RNA com atividade catalítica.
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1993 R. J. Roberts e P. A. Sharp recebem o Prêmio Nobel em
Fisiologia ou Medicina pela descoberta dos genes
interrompidos (split genes) dos organismos eucarióticos.
K. B. MuIlis e M. Smith recebem o Prêmio Nobel em Química. O
primeiro pela invenção do método PCR (reação da polimerase
em cadeia) para multiplicação de segmentos específicos de DNA
in vitro; o segundo pelo desenvolvimento da técnica de
mutações dirigidas em sítios específicos e seu emprego no
estudo de proteínas.
1995 Fleischmann e colaboradores publicam a primeira sequência completa
de bases nitrogenadas de um organismo de vida livre, a bactéria
Haemophilus influenzae.
1996 Mais de 600 cientistas, trabalhando em cooperação, completam o
sequenciamento das bases nitrogenadas dos cromossomos de
Saccharomyces cerevisiae, o primeiro genoma eucariótico
completamente sequenciado.
1997 S. B. Prusiner recebe o Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina pela
descoberta dos príons.
2000 É anunciada a conclusão do sequenciamento dos cerca de 3 bilhões de
pares de bases que constituem o genoma humano.
Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
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GENÉTICA DE TRANSMISSÃO:
1ª E 2ª LEI DE MENDEL
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GENÉTICA DE TRANSMISSÃO
1. LEI DA SEGREGAÇÃO DOS FATORES, 1ª LEI DE MENDEL, OU LEI DA PUREZA
DOS GAMETAS
Figura 1.1: vagem e flor da ervilha, primeiro vegetal utilizado nos estudos da genética.
Fonte: Snustad, D.Peter; Simmons, Michael J.,2008.
INTRODUÇÃO
Apesar de há milhares de anos se tentar explicar como as características
genéticas são transmitidas, só no fim século XIX, obteve-se os primeiros resultados
significativos a respeito de como essas características são passadas de pais para
filhos, surgindo dessa forma o que hoje chamamos de genética de transmissão.
Nesse capítulo, falaremos sobre os trabalhos de Mendel, sua metodologia e seus
postulados, que serviram de ponto de partida para o entendimento dessa ciência.
1.1. QUEM FOI MENDEL!
Gregor Johann Mendel nasceu em 1822, no vilarejo de Heinzendorf, antiga
Áustria e hoje República Tcheca, filho de pais agricultores pobres, deve uma
criação rural o que facilitou o seu conhecimento sobre os processos de cultivo de
plantas, de criação de animais e seu amor pela natureza. A falta de condições
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financeiras para estudar fez com que Mendel aos 21 anos optasse por um
monastério católico na cidade de Brünn (hoje, Brno) para dar continuidade aos
seus estudos. Quatro anos mais tarde ordenou-se padre (1847), adotando o nome
Gregor pela igreja. Durante, esses quatro anos, Mendel aprendeu ciências agrárias
e técnicas de polinização. Entre 1851 e 1853 foi liberado por seus superiores do
mosteiro, para cursar na Universidade de Viena o curso de Física, porém assistiu
cursos adicionais de química, zoologia, botânica, fisiologia vegetal, paleontologia e
de Matemática, do qual, já tinha sido professor numa escola local, próxima ao
mosteiro. Também se dedicou ao estudo de técnicas de hibridização em plantas e
em especial em ervilhas. Em 1853, quando retornou ao Mosteiro, voltou as suas
atividades de monge-professor, agora de física e ciências naturais e começou em
1857, seus experimentos genéticos com ervilha, concluindo-os em 1864. Em 1865
apresentou os seus resultados na Natural History Society local e no ano seguinte,
publicou um relato detalhado nas publicações da sociedade. Mendel, porém, ficou
na obscuridade por 35 anos, não se sabe se por falta de entendimento do que
publicou na época, ou por que os interesses dos cientistas da época estavam
voltados para outras questões, como por exemplo, a evolução.
Figura 1.2: Gregor Johann Mendel (1822 – 1884). Fonte Klug et. al.,2010
Em 1900, três botânicos, Hugo de Vries na Holanda, Carl Correns na
Alemanha e Eric Von TschermaK-Seysenegg na Áustria de forma independente,
trabalhando com hibridização em outros vegetais descobriram ao pesquisarem a
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literatura científica, para corroborar com suas teorias sobre hereditariedade, que
Mendel há 35 anos tinha chegado às mesmas conclusões.
1.2. PORQUE MENDEL OBTEVE SUCESSO?
Várias foram as causas do sucesso de Mendel, a escolha do material, o seu
alto grau de organização científica na escolha da metodologia e seus
conhecimentos estatísticos, como conhecedor e professor de matemática por um
determinado tempo.
O material biológico escolhido por Mendel foram variedades de plantas da
espécie Pisum sativum (34 variedades, cedidas por horticultores da região),
também chamadas ervilhas-de-jardim ou ervilhas-de-cheiro (figura 1.3),
dicotiledôneas de fácil cultivo, podem ser plantadas em jardins experimentais, ou
em vasos, em uma estufa. Por apresentarem suas pétalas em forma de quilhas
(fechadas) são impedidas de realizarem fecundação cruzada de forma natural,
sendo assim, hermafroditas e autofecundantes, o que facilita a obtenção de
linhagens puras para uma determinada característica. Porém, é acessível para
cruzamentos experimentais de hibridização, originando híbridos férteis. Seu ciclo
de vida é curto, podendo originar várias gerações, em pouco tempo. Apresentam, a
cada geração, um grande número de descendentes, o que facilita o estudo
estatístico dos dados colhidos. Apresentam linhagens com características
individuais bem contrastantes, tais como cor dos cotilédones da semente que em
uma linhagem é verde e em outra linhagem amarela; altura do pé de ervilha que
poderia ser alto (em torno de 2,0 m de altura) ou baixo (em torno de 0,5 m de
altura) e assim sucessivamente para as sete características estudas por ele(figura
1.4).
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Figura 1.3: Flor hermafrodita da ervilha, com identificação das pétalas fechadas em
forma de quilha, isolando do meio esterno as estruturas reprodutora masculina e
feminina da flor. Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
Figura 1.4: As sete características estudadas por Mendel. Fonte: Griffiths et. al., 2009
Com relação à metodologia, Mendel preocupou-se em trabalhar na
observação de uma característica por vez, anotando seus resultados e
comparando-os com os das outras seis características estudadas, além de obter,
amostras significativas para a análise estatística dos dados, decorrência do grande
número de descendentes obtidos em cada geração.
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1.3. UM EXEMPLO DO EXPERIMENTO DE MENDEL
Um dos experimentos realizado por Mendel foi o cruzamento entre uma
variedade de ervilhas que durante várias gerações só produzia, por
autofecundação, sementes com cotilédones amarelos, com uma variedade que só
produzia cotilédones verdes, sendo assim denominadas sementes puras, para
essa característica analisada. Em cada experimento Mendel retirava as anteras,
estruturas vegetais onde se produz o grão de pólen, de algumas das plantas com
cotilédones amarelos, ficando essas variedades só com a estrutura reprodutora
feminina. Repetia o mesmo processo com as variedades de cotilédones verdes.
Como resultado em cada uma das variedades estudadas existiriam plantas
somente com estruturas reprodutoras femininas e outras hermafroditas. Após esse
processo de castração, Mendel esperava o amadurecimento reprodutivo das
plantas femininas e realizava a fertilização cruzada, retirando o pólen das anteras
das plantas de cotilédones verdes e colocando nas plantas femininas de
cotilédones amarelos, do mesmo jeito, retirava o pólen das de cotilédones
amarelos e fertilizava as femininas de cotilédones verdes (figura 1.5), realizando
cruzamentos recíprocos, nos dois casos, os resultados obtidos foram os mesmos:
os descendentes, todos nasceram com cotilédones amarelos. Essas plantas
resultantes da fertilização cruzada foram denominadas híbridas.
Figura 1.5: Polinização cruzada e autofecundação os dois tipos de cruzamentos usados
por Mendel. Fonte: Griffiths et. al., 2009
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O passo seguinte foi deixar as plantas híbridas autofecundarem para se
observar a descendência. A característica cotilédone verde que havia desaparecido
na geração anterior (híbrida) voltou a aparecer numa proporção aproximada de
uma semente de cotilédone verde para cada três com cotilédone amarelo (fig. 1.6).
Mendel chamou o 1º cruzamento entre linhagens puras de geração
parental, hoje chamada simplesmente geração P, a prole desse 1º cruzamento,
descendência híbrida, geração filial 1 ou F1 e os descendentes da autofecundação
de F1, geração filial 2, ou F2 e assim sucessivamente.
Figura 1.6: Representação esquemática das gerações P, F1 e F2 do cruzamento mono-
híbrido para a característica cor do cotilédone da semente Fonte: Amabis, José
M.,Martho, Gilberto R., 2006.
Completando o experimento, Mendel pegou as sementes com cotilédones
verde da geração F2 deixou germinar e autofecundar, obtendo em F3, sementes
com cotilédones verdes, já as sementes com cotilédones amarelos da geração F2, ao
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germinar e autofecundar gerou em 1/3 dos pés de ervilha somente sementes com
cotilédones amarelos e em outros 2/3, sementes com cotilédones amarelos e
verdes.
Mendel repetiu esse experimento, denominado cruzamento mono-híbrido
(pois só leva em consideração uma única característica ou caráter por vez), com as
outras seis características contrastantes da ervilha-de-jardim, obtendo sempre o
mesmo resultado. Em F1, no híbrido, só uma das características aparecia; em F2, a
proporção era sempre de aproximadamente 3 com a mesma característica de F1
para 1 com a característica que desaparecia em F1 (fig.1.7).
Mendel também vez o cruzamento recíproco entre as plantas híbridas, F1
com as plantas parentais de ervilhas de cotilédones verdes, obtendo na prole a
proporção de 1 ervilha de cotilédone amarela, para uma ervilha de cotilédone
verde. Hoje esse cruzamento é conhecido como cruzamento teste (fig. 1.8).
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Figura 1.7: Resultados dos cruzamentos Mendelianos nos quais os genitores diferem em
uma característica. Adaptada Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
Nº de características
Geração Parental(pura)
( P)
Plantas F1
(híbrida)
Autofecundação de
F1(híbridas) Plantas F2
Razão entre
os tipos F2
1 Forma das sementes
Lisa X Rugosa Sementes lisas Lisas X Lisas
5474 lisas e 1850 rugosas=
7324(total) 2,96: 1
2 Cor dos cotilédones
Amarelo X Verde
Sementes com cotilédones
amarelo Amarelo X Amarelo
6022com cotilédones
amarelo e 2001 com cotilédones
verdes= 8023 (total)
3,01: 1
3 Cor da flor
Violeta X branca Flores violeta Violeta X Violeta
705 flores violetas e 224
flores brancas= 929 (total)
3,15: 1
4 Textura das vagens
Inflada X comprimida Vagens infladas Inflada X Inflada
882 vagens infladas e 299
vagens comprimidas = 1181 (total)
2,95:1
5 Cor das vagens
Verdes X Amarelas Vagens verdes Verde X Verde
428 vagens verdes e 152
vagens amarelas= 580 (total)
2,82: 1
6 Posição das flores Axilar X Terminal
Flores axilares Axilar X Axilar
651 flores
axilares e 207
flores terminais=
858 (total)
3,14:1
7 Altura do caule Alto X baixo
Caule alto Alto X Alto
787 caule alto e
277 caule baixo =
1064(total)
2,84:1
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Figura 1.8: Esquema da autofecundação de F1, híbrida, aparecendo na prole a
proporção de 3: 1(esquerda) e o cruzamento teste entre F1, híbrida, e a planta de
cotilédones verdes dando a proporção de 1:1 (direita). Fonte: Griffiths et. al., 2009
1. 4. CONCLUSÕES DE MENDEL
Após análise estatística dos dados Mendel chegou às seguintes conclusões:
1º) Existem fatores unitários particulados, que funcionam como unidades
básicas da hereditariedade (hoje chamamos genes) responsáveis por
cada uma das características estudadas e são transmitidas de geração a
geração de forma inalterada através dos gametas; (Exemplo: Um fator
determina a cor do cotilédone verde e outro fator determina a cor do
cotilédone amarelo)
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2º) Cada planta ou organismo individual possuem um par desses fatores,
determinando a característica; (Exemplo cor do cotilédone)
3º) Na hora de formar os gametas só um dos fatores será encontrado nos
gametas;
4º) Na fertilização após o encontro do gameta masculino (presente no
pólen) com o gameta feminino (presente no pistilo) haverá uma
reconstituição do par de fatores.
5º) Cada planta pura, para uma dada característica possuirá um par de
fatores iguais;
6º) A planta híbrida apresentará um fator de cada tipo na formação do par;
7º) O fator que não aparece na geração F1, e só volta a reaparecer na geração
F2 é dito recessivo, e o fator que determina a característica em F1 é dito
dominante.
1.5. A CORRELAÇÃO ENTRE OS POSTULADOS DE MENDEL E O
COMPORTAMENTO DOS CROMOSSOMOS NA MEIOSE
As redescobertas dos trabalhos de Mendel em 1900 por Hugo de Vries na
Holanda, Carl Correns na Alemanha e Eric Von TschermaK-Seysenegg na Aústria, e
sua aceitação pelos cientistas originaram o levantamento de outras questões, tais
como: onde se localizam,nas células, os fatores hereditários ? Qual é o mecanismo
responsável por sua segregação durante a formação dos gametas.
Em 1902,Walter S. Sutton, trabalhando com a formação de gametas em
gafanhoto e Theodor Bovari trabalhando de forma independente, com meiose,
observaram uma grande semelhança entre o comportamento dos cromossomos na
meiose e a segregação dos fatores hereditários (genes) de Mendel, Sutton e Bovari
propuseram assim a hipótese de que os fatores hereditários de Mendel estavam
localizados em cromossomos homólogos, de tal maneira que sua separação na
meiose levaria à segregação dos fatores.(fig. 1.9)
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Figura 1.9: Representação esquemática da idéia originalmente proposta por Walter S.
Sutton e Bovari, em 1902, de que a segregação de um par de alelos resulta da separação
dos cromossomos homólogos na meiose. A hipótese foi confirmada e passou a
constituir um dos fundamentos da Genética. Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R.,
2006.
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1.6. A TERMINOLOGIA GENÉTICA ATUAL
Hoje sabemos que os fatores hereditários de Mendel são os genes, que
podem ser representado simbolicamente de várias formas, adotaremos
inicialmente, de forma simples, a letra da característica recessiva, na forma
minúscula, e em itálico, como símbolo representativo do traço recessivo (por
exemplo: Na característica cor do cotilédone, v = fator ou gene que determina a
característica ou traço cotilédone verde). O traço dominante da mesma
característica (cotilédone amarelo) é representado pela mesma letra, também em
itálico, só que maiúscula (V).
Os fatores hereditários alternativos que determinam traços diferentes
dentro de uma mesma característica (V e v) são denominados alelos. Logo cada
planta apresenta dois alelos para uma dada característica (VV ou Vv ou vv). Esses
pares de alelos representam o genótipo ou constituição gênica da planta para a
característica estudada. Os traços cotilédones amarelos ou cotilédones verdes,
variações dentro de uma mesma característica e expressão física dos fatores
hereditários, ou genes, é denominado fenótipo.
O fenótipo cotilédone amarelo dominante em relação ao fenótipo cotilédone
verde, apresenta dois genótipos diferentes, assim representados: VV encontrado
em plantas puras ou hoje chamadas homozigotas para essa característica, pois só
produzem um tipo de gameta V; e o genótipo Vv, encontrado em plantas híbridas
ou heterozigotas, capaz de produzirem dois tipos de gametas V ou v. O fenótipo
recessivo, cotilédone verde apresenta um único genótipo vv originando um único
tipo de gameta v.(fig. 1.10)
26
Figura 1.10: Esquema de um cruzamento mono-híbrido de ervilha-de-jardim, representando a característica cor do cotilédone Amarelo(V) e verde(v). Adaptada de Klug et. al., 2010.
27
1.7. CRUZAMENTO TESTE
O cruzamento teste, feito por Mendel, cruza um fenótipo dominante com um
recessivo e serve para identificar se o fenótipo dominante tem genótipo
homozigoto ou heterozigoto, quando obtemos toda a prole do cruzamento com
fenótipo dominante, podemos chegar a conclusão que o fenótipo dominante é
homozigoto, já quando obtemos aproximadamente metade da prole com o fenótipo
dominante e a outra metade recessiva o genótipo do fenótipo dominante é
heterozigoto.
1.8. OS QUADROS DE PUNNETT
Reginald C. Punnett construiu um diagrama que facilita visualização de um
cruzamento, nesse diagrama representamos os gametas masculinos em uma
coluna ou linha. Os gametas femininos, são representados dependendo dos
masculinos: caso os masculinos estejam representados em uma coluna os
femininos são representados em uma linha, mas se os masculinos foram
representados em uma linha os femininos ficam em uma coluna. No diagrama
também visualizamos como resultado do encontro gamético o genótipo e fenótipo
dos descendentes. (fig. 1.11).
28
Figura 1.11: Representação do Cruzamento-teste de uma só característica utilizando o quadrado de Punnett: Em (a), a planta genitora Cotilédone amarelo é homozigota, mas, em (b), a genitora Cotilédone amarelo é heterozigota. O genótipo de cada planta alta da P1 pode ser determinado por meio do exame da prole, quando cada uma é cruzada com
a planta baixa homozigota. recessiva. Adaptada de Klug et. al., 2010.
29
1.9. EXEMPLOS DE HERANÇA MONOGÊNICA OU MONO-HIBRIDISMO EM
OUTROS ORGANISMOS
1.9.1.HERANÇA DO TIPO DE FOLHA EM COLEUS BLUMEI (CÓLEO)
Na planta Coleus blumei, utilizada na ornamentação de jardins, a
característica que determina a forma da borda das folhas : crenada(levemente
ondulada) ou lobadas (profundamente recortada) é determinado por um par de
genes. onde o gene que determina folha lobada é dominante sobre o que determina
folha crenada.(fig. 1.12)
Figura 1.12: Representação esquemática entre plantas de Coleus blumei (foto) de folhas
lobadas e folhas crenadas. Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
30
1.9.2. HERANÇA DO TIPO DE ASA EM DROSOPHILA MELANOGASTER
A mosca Drosophila, também chamada mosca-do-vinagre ou mosca-da-
banana também apresenta características determinadas por um único par de
genes, um exemplo é o tipo das asas, onde os fenótipos asa longa (ou selvagem) e
asa vestigial (ou mutante), ao serem cruzados produzem em F1 toda a prole com
asas longas e em F2 mantém a proporção Mendeliana de 3/4 asas longa para 1/4
asa vestigial. (fig. 1.13)
Figura 1.13: Representação do cruzamento entre Drosophilas selvagens de asas longas
e mutantes de asas vestigiais (na foto, aumento ≈ 17X). Fonte: Amabis, José M.,Martho,
Gilberto R., 2006.
31
1.9.3. HERANÇA DA SENSIBILIDADE AO PTC NA ESPÉCIE HUMANA
Uma herança com padrão de herança monogênica na espécie humana é a
sensibilidade ao PTC (droga denominada feniltiocarbamida, ou feniltiouréia),
pessoas que são sensíveis ao PTC sentem um gosta amargo na boca quando são
colocados em contato com soluções de PTC, e outras pessoas nada sentem quando
em contato com a droga. Sensibilidade ao PTC é dominante em relação à
insensibilidade. (fig. 1.14)
Figura 1.14: Representação esquemática do cruzamento entre uma mulher sensível ao
PTC e um homem insensível ao PTC (Feniltiocarbamida). Adaptado de :Amabis, José
M.,Martho, Gilberto R., 2006.
32
1.10. HEREDOGRAMAS, GENEALOGIAS, ÁRVORES GENEALÓGICAS OU
PEDIGREE
Na espécie humana fica muito difícil determinar se um fenótipo é
hereditário ou não e qual o padrão de herança de uma dada característica, já que
não é possível se fazer cruzamentos experimentais e a prole resultante é muito
pequena, para que se tenha uma boa análise estatística, além disso, a possibilidade
de se estudar o comportamento de um determinado traço por várias gerações em
uma família é pouca provável, já que, às vezes aquele traço só se manifesta na
idade adulta, depois dos 40 anos.
O meio tradicional para o estudo de determinadas características
hereditárias em uma família é a construção de uma árvore familiar ou
heredograma, indicando a presença ou ausência de um traço em questão para cada
membro de cada geração. As genealogias são representações gráficas
convencionadas pelos geneticistas das relações de parentesco entre os indivíduos
de uma família. (fig.1.15)
33
Figura 1.15: Símbolos comumente empregados na representação gráfica de genealogias.
Fonte: Lima, Celso P.,1984
34
1.10.1. ANÁLISE DE GENEALOGIAS
Os heredogramas nem sempre são precisos para diagnosticar o tipo de
herança que estamos trabalhando, já que, o tamanho da amostra é pequeno e a
elaboração muitas vezes depende de informações prestadas pelo probando ou
propósito (isto é, pelo indivíduo afetado que atraiu a atenção dos pesquisadores),
ou por seus parentes que muitas vezes não estão tão interessados em colaborar de
forma mais efetiva, ou ainda, a história da família pode ser falseada porque o
investigador muitas vezes se baseia em dados que depende da memória de quem
os fornece. Para que se possa interpretar com menor chance de erro os dados é
necessário muitas vezes analisar vários genealogias referentes aquele fenótipo que
se está estudando.
Alguns critérios que não são rígidos, mas, que ajudam na identificação de padrões
de herança quando analisamos heredogramas.
Como se reconhece a herança autossômica (característica monogênica onde os
genes encontram-se em cromossomos autossômicos) dominante (fig. 1.16)
1) A característica ocorre igualmente em homens e mulheres;
2) Indivíduos afetados são sempre filhos de casais em que pelo menos um dos
cônjuges é afetado; dessa forma, um casal normal nunca tem filhos afetados
(a não ser por mutação que é raro ou por penetrância incompleta);
3) A característica ocorre em todas as gerações sem pular nenhuma;
Figura 1.16: Heredograma representativo de uma característica autossômica dominante.
Fonte: Klug et. al.,2010
35
Como se reconhece a herança autossômica recessiva (fig.1.17)
1) Os dois sexos são igualmente afetados;
2) Os indivíduos afetados geralmente são filhos de pais normais;
3) Dentre os irmãos do propósito, os indivíduos afetados e normais
distribuem-se na proporção de 3 normais para 1 afetado;
4) Os indivíduos afetados geralmente resultam de cruzamentos
consangüíneos.
Como se reconhece a herança recessiva ligada ao sexo (herança monogênica onde
os genes encontram-se numa porção do cromossomo sexual X que não tem
homologia no Y) (fig.1.18)
1) Mulheres afetadas são muito mais raras do que homens afetados;
2) Homens afetados geralmente têm filhos normais;
3) Os indivíduos afetados são filhos de mulheres normais que, por sua vez, são
filhas de homens afetados; em outras palavras, a anomalia passa de avô
4) para neto, através de suas filhas que são portadoras do gene.
Figura 1.17: Heredograma representativo de uma característica autossômica recessiva.
Fonte: Klug et. al.,2010
36
Figura 1.18: Heredograma representativo de uma característica ligada ao sexo recessiva.
Fonte: Lima, Celso P.,1984.
Como se reconhece a herança dominante ligada ao sexo (fig. 1.19)
1) A característica marcante deste tipo de herança é o fato de que os homens
afetados têm todas as suas filhas afetadas, embora nenhum de seus filhos o
seja;
2) As mulheres heterozigotas transmitem as características à metade de seus
descendentes, sejam meninos ou meninas.
3) As mulheres afetadas homozigotas transmitem as características a todos os
seus descendentes.
4) Este tipo de herança só pode ser reconhecido pela descendência dos
homens afetados; se não existir descendência deles torna- se impossível
reconhecer este tipo de herança, visto que ela se assemelha à herança
autossômica dominante.
37
Figura 1.19: Heredograma representativo de uma característica ligada ao sexo
dominante. Fonte: Lima, Celso P.,1984
1.11. A BASE MOLECULAR DA SEGREGAÇÃO E EXPRESSÃO MONOGÊNICA
1.11.1. COMO SURGEM OS ALELOS!
Quando falamos em alelos até agora não nos preocupamos com a estrutura
e função desses alelos somente como eles se segregam e se comportam em relação
aos outros alelos. Mas, a nível molecular como surgem os diferentes alelos? Esses
alelos são resultantes de mutações de alelos denominados selvagens, que se
caracterizam por aparecer em maior freqüência na população. Os alelos
resultantes de alterações no DNA do alelo selvagem são ditos, alelos mutantes.
Existem vários tipos de mutações, (que serão estudadas em outro capítulo), porém,
as mutações só são visíveis quando elas alteram o gene, de tal forma, que como
conseqüência altere o fenótipo. Um novo fenótipo resulta de uma mudança na
atividade funcional do produto celular (proteína) especificado pelo respectivo
gene.
Esses genes (ou alelos) mutantes podem ser em relação ao alelo selvagem
dominante ou recessivo. Quando a mutação altera o alelo selvagem e ele diminui
ou perde a função essa mutação é denominada mutação de perda de função, se a
perda for completa é formado um alelo denominado alelo nulo e o fenótipo
determinado por esse alelo é geralmente recessivo.
Em outros casos, a mutação altera o alelo selvagem formando alelos
mutantes com um aumento na atividade funcional em relação a atividade funcional
38
do alelo selvagem , aumentando assim, a quantidade do produto gênico, nesse caso,
denominamos a mutação de mutação de ganho de função, e o fenótipo resultante
geralmente é um fenótipo dominante.
Como já havia falado existem várias formas de representação dos alelos, a primeira
mais simples, usada por Mendel, onde se representa o fenótipo dominante com a
letra maiúscula e em itálico, do fenótipo recessivo e o recessivo com letra
minúscula e em itálico. Outra notação, determinada quando Morgan e Bridges
estudavam cor do olho em Drosophila, que pode ser usada para representar o alelo
selvagem e o alelo mutante é a primeira letra ou a combinação de duas ou três
letras do traço mutante em maiúsculo ou minúsculo, quando representa
respectivamente fenótipos mutantes dominantes e recessivos, acrescidos de um
sinal sobrescrito + para representar o alelo selvagem ou simplesmente para
simplificar, o sinal + para o alelo selvagem e o mutante com a letra inicial ou com a
combinação de duas ou três letras. Quando se está representando o genótipo
utiliza-se uma barra separando os alelos de um mesmo locus em cromossomos
homólogos. (fig. 1.20 a e b)
Figura 1.20a: Representação de notação para designar genótipos e alelos selvagens e
mutantes recessivo. Adaptada de Klug et.al., 2010
Tabela representando os genótipos e fenótipos para a cor do corpo em Drosophila que apresenta o alelo mutante recessivo e fenótipo ébano e o alelo selvagem dominante e+ fenótipo cor cinza.
Genótipos Fenótipos
e+/e+ ou +/+ Homozigoto cinza (tipo selvagem)
e+/e ou +/e Heterozigoto cinza (tipo selvagem)
e/e ou e/e Homozigoto ébano ( tipo mutante
39
Figura 1.20b: Representação de notação para designar genótipos e alelos selvagens e
mutantes dominantes. Adaptada de Klug et.al., 2010
2. 2ª LEI DE MENDEL OU LEI DA SEGREGAÇÃO INDEPENDENTE
Mendel após trabalhar na observação de uma característica por vez
começou a fazer experimentos com plantas que diferiam em duas características.
Ele cruzou a variedade de plantas que produziam sementes amarelas lisas, e que
por autofecundação só originavam plantas com sementes amarelas lisas, portanto
puras para as características cor e forma da semente, com a variedade de plantas
verdes rugosas também puras para essas características com o objetivo de analisar
como se comportavam as duas características ao mesmo tempo na hora de formar
os gametas e a prole.
Vamos usar as seguintes notações nos cruzamentos para representar os
genótipos que incluem dois pares de alelos que se encontram em cromossomos
homólogos distintos para as características: cor do cotilédone da semente; V
(Amarela) e v (verde) e forma da semente; R (Lisa) e r (rugosa), logo o genótipo da
planta com sementes amarela lisa pode ser assim representado VV RR e o da
planta verde rugosa vv rr. Ao cruzar essas duas linhagens Mendel obteve em F1
todas as plantas com semente amarelas lisas, indicando que os dois traços, amarelo
e liso são dominantes em relação à verde e rugoso com o seguinte genótipo Vv Rr.
Essas Plantas F1 ele deixou autofecundar e resultou em todas as possibilidades de
combinações nas proporções; 9/16 plantas amarelas lisas, 1/16 plantas verdes
Tabela representando os genótipos e fenótipos para a forma da asa em Drosophila que apresenta o alelo mutante dominante Wr fenótipo asa rugosa e o alelo selvagem dominante Wr+ fenótipo asa lisa.
Genótipos Fenótipos
Wr/Wr Asa rugosa (tipo mutante)
Wr/Wr+ Asa rugosa (tipo mutante)
Wr+/Wr+ Asa normal (tipo selvagem)
40
rugosas, semelhantes aos fenótipos parentais, 3/16 plantas amarelas rugosas e
3/16 plantas verde lisa. (fig. 1.21 e 1.22)
Figura 1.21: Os cruzamentos de Mendel entre ervilhas que produziram sementes
amarelas e lisas e ervilhas que produziram sementes verdes e rugosas. Fonte: Snustad,
D.Peter; Simmons, Michael J.,2008.
Mendel também usou o cruzamento teste (cruzamento do di-híbrido com o
duplo recessivo) com o intuito de demonstrar que cada gameta do di-híbrido é
formado por um alelo do par V ou v e do par R ou r e que essas combinações
gaméticas apareciam em uma mesma proporção, indicativo de segregação
independente.(fig.1.23)
41
Figura 1.22: Representação simbólica dos resultados de um cruzamento entre uma
variedade de ervilhas com sementes amarelas e lisas e uma variedade com sementes
verdes e rugosas. Fonte: Snustad, D.Peter; Simmons, Michael J.,2008.
42
Figura 1.23: Representação do cruzamento teste de plantas de ervilhas amarela lisa (F1)
com o duplo recessivo (verde rugosa). Adaptado de Snustad, D.Peter; Simmons, Michael
J.,2008.
Mendel fez outras combinações entre as sete características estudadas por
ele, em todas elas obteve os mesmos resultados e com esses resultados Mendel
chegou às seguintes conclusões:z
1. Cada característica é controlada por um par de alelos que se
segregam na hora de formar os gametas;
2. Cada um dos pares segrega (separa) de forma independente do outro
3. na hora de formar os gametas, logo a alelo V pode estar em um
gameta junto com o alelo R ou com r e o alelo v pode vir em um
gameta tanto junto com o alelo R ou com r, as chances desses
encontros são as mesmas e essas combinações são feitas de forma
aleatória.
43
Após as conclusões, Mendel enuncia o que chamamos 2ª lei de Mendel ou
Lei da segregaç~o independente: “Os alelos de genes diferentes segregam-se, ou
distribuem-se, independentemente uns dos outros.”
Além dos experimentos com uma característica, cruzamentos mono-
híbridos, ou duas características ao mesmo tempo, cruzamentos di-híbridos,
Mendel fez experimentos com três características ao mesmo tempo, cruzamento
esse chamado tri-híbrido e observou que a segregação independente também é
aplicada nesses casos.
Depois de 1900 quando os trabalhos de Mendel foram redescobertos, as leis
de Mendel foram testadas em várias outras plantas e animais, os resultados
obtidos vieram para validar o trabalho de Mendel quase que de forma geral. A
exceção à lei de segregação independente é quando os dois ou mais pares de alelos
que determinam as características se encontram em um mesmo cromossomo
homólogo.
2.1. A MEIOSE E A 2ª LEI DE MENDEL
Sabemos que em um organismo diplóide cada um dos pares de homólogos é
constituído por cromossomos de origem paterna, proveniente do gameta
masculino e o outro, de origem materna, proveniente do gameta feminino. As
plantas de ervilhas possuem 14 cromossomos, ou seja, 7 pares de homólogos e
Mendel fez experimentos com 7 características ou traços distintos. Os pares de
alelos que determinam cada uma das características mendelianas se encontram
distribuídos nesses cromossomos. Cada uma das características estudada em um
par de homólogos. Os cromossomos homólogos na meiose segregam-se
independentemente levando junto os pares de alelos mendelianos.
Estudos posteriores que analisaram outras características das plantas de
ervilha, não conseguiram obter sempre os mesmos resultados de Mendel a
conclusão para isso é que características que estão em um mesmo par de
cromossomos homólogos segregam juntas na hora de formar os gametas (fig. 1.24)
44
Figura 1.24 Representação esquemática da segregação independente dos cromossomos
homólogos na meiose, responsável pela segregaçáo independente dos genes situados
em diferentes pares de homólogos. Em uma célula duplo-heterozigótica, há duas
possibilidades para a migração dos cromossomos, o que caracteriza a segregação
independente. Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
45
3. APLICAÇÕES DOS PRINCÍPIOS DE MENDEL
Se a base genética de uma característica é conhecida, os princípios de
Mendel podem ser usados para prever o resultado dos cruzamentos. Existem três
procedimentos analíticos que são parte das pesquisas genéticas cotidianas e são
utilizados para se fazer a análise de proporções fenotípicas. Essa análise pode ser
feitas por dois caminhos ou prevendo os genótipos dos genitores a partir das
proporções fenotípicas da prole, ou as proporções fenotípicas da prole tendo-se o
conhecimento dos genótipos dos genitores.
3.1. O QUADRADO DE PUNNETT
O método utilizado até agora “o quadrado de Punnett”, representados na
figura 2.3 e 2.4, é muito útil em situações que envolvem 1 ou 2 pares de genes, pois
dá uma visualização dos gametas formados pelos genitores e a representação de
todos os encontros gaméticos possíveis na formação da prole, resultando nos
genótipos. Podendo-se chegar às proporções fenotípicas quando se sabe a relação
de dominância entre os alelos que compõem os genótipos. Porém se torna muito
trabalhoso usarmos esse método quando passamos a ter 3 ou mais pares de alelos
determinando três ou mais características ao mesmo tempo. Com 3 pares de alelos,
resultantes do cruzamentos de 2 linhagens uma homozigota dominante com uma
homozigota recessiva, teríamos um tri-híbrido em F1. Esse F1 produziria 8 tipos
diferentes de gametas(fig. 1.25) que se for cruzado com outro igual a ele também
formará 8 diferentes tipos de gametas, gerando 8X8 = 64 genótipos, no quadrado
de Punnett.
46
Figura 1.25: Representação esquemática da segregação independente de 3 pares de
alelos originando os oito tipos de gametas. Adaptada de Amabis, José M.,Martho,
Gilberto R., 2006.
3.2. O MÉTODO DA LINHA BIFURCADA
Caracteriza-se por representar os fenótipos ou genótipos resultantes do
cruzamento de cada uma das características estudadas em linhas que se bifurcam,
em cada elo da bifurcação colocam-se os fenótipos ou genótipos de um dos
cruzamentos. (fig. 1.26a e 1.26b)
47
Figura 1.26a: O método da linha difurcada para prever o resultado de um cruzamento
envolvendo 3 genes que se distribuem independentemente em ervilhas. A proporção
fenotípica é dada pelo produto de cada cruzamento individualmente. Adaptado de
Snustad, D.Peter; Simmons, Michael J.,2008.
Cruzamento: Vv Rr Bb X Vv Rr Bb Segregação de gene
para cor do cotilédone
da semente
Segregação do
gene para forma
da semente
Segregação do
gene para cor da
casca da semente
Fenótipo combinados de
todos os três genes
3 Altas
1 Baixa
3 Lisas
1 Rugosa
3 Lisas
1 Rugosa
3 Cinzas
1 Branca
3 Cinzas
1 Branca
3 Cinzas
1 Branca
3 Cinzas
1 Branca
27 altas, lisas, cinzas
9 altas, lisas, brancas
9 altas,rugosas,cinzas
3 altas,rugosas,brancas
9 baixas,lisas,cinzas
3 baixas,lisas,brancas
3 baixas,rugosas,cinzas
1 baixa,rugosa,branca
48
Figura 1.26b: O método da linha difurcada para prever o resultado de um cruzamento
envolvendo 2 genes que se distribuem independentemente em ervilhas. A proporção
genotípica é dada pelo produto de cada cruzamento individualmente. Adaptado de
Snustad, D.Peter; Simmons, Michael J.,2008.
Observando as figuras acima vamos perceber que quando montamos a linha
bifurcada para os genótipos fica bem mais difícil manejar. Levando em conta só
duas características di-híbridas, já obtemos 3n onde n é igual ao número de
características heterozigotas e 3 é o número de genótipos distintos em cada
cruzamento mono-híbrido, caso tenhamos 3 pares de genes (cruzamento tri-
híbrido) teríamos 33= 27 genótipos diferentes.
Cruzamento: Vv Rr X Vv Rr Segregação de gene para cor do cotilédone da semente
Segregação do gene para forma da semente
Proporção dos Genótipos combinados de 2 pares de genes.
1 RR
1 VV RR
1 VV 2 Rr
2 VV Rr
1 rr
1 VV rr
1 RR
2 Vv RR
2 Vv 2 Rr 4 Vv Rr
1 rr 2 Vv rr
1 RR 1 vv RR
1 vv 2 Rr 2 vv Rr
1 rr 1 vv rr
49
3.3. O MÉTODO MATEMÁTICO
Um método alternativo ao quadrado de Punnett e o da linha bifurcada, e
mais rápido, é baseado no princípio da probabilidade.
Probabilidade é a chance de um determinado evento ocorrer, entre dois ou
mais eventos possíveis. Por exemplo, qual a probabilidade de em um nascimento
obtermos um menino? O número de eventos possíveis (minha amostra) são dois a
criança ou é menino ou é menina. Logo a probabilidade de que seja menino é 1 em
2 ou 1/2.
Eventos aleatórios são eventos que têm a mesma chance de ocorrer
quando comparados com outros eventos possíveis dentro de uma probabilidade.
Eventos independentes são eventos em que a ocorrência de um evento
não afeta a probabilidade do outro evento ocorrer. Exemplo: o nascimento de cada
filho é um evento independente já que nascimento do 1º não afeta ou não interfere
no nascimento do 2º e assim sucessivamente, ou em um cruzamento entre um
casal de heterozigotos, a probabilidade da mulher produzir gametas não interfere
na probabilidade do homem também produzir.
Eventos mutuamente exclusivos são eventos que quando um ocorre o
outro não pode ocorrer ao mesmo tempo. Um bom exemplo dentro da genética
para isso é o nascimento de uma criança, ela não pode ser ao mesmo tempo
menina e menino. Ou ele é menina ou ela é menino. Logo esses eventos são
mutuamente exclusivos.
Em estatística existem 2 regras básicas que são necessárias para a resolução
dos exercícios para cálculo das proporções genotípicas e fenotípicas da prole, são
elas a regra dos produtos (ou regra do “e”) e a regra da soma (ou regra do “ou”).
A regra do produto diz: “A probabilidade de dois eventos independentes
ocorrerem juntos (ao mesmo tempo) é igual ao produto das probabilidades de cada
um deles”. Exemplo: Uma mulher teve 2 crianças, qual a probabilidade que a
primeira seja menina e o segunda seja menino? Em cada nascimento a
probabilidade de ser menino ou de ser menina é a mesma, 1/2, e o nascimento de
cada filho é um evento independente já que nascimento do 1º não afeta ou não
50
interfere no nascimento do 2º. Logo a probabilidade da mulher ter o 1º menina e o
2º menino é igual ao produto das probabilidades individuais (1/2X1/2=1/4)
A regra da soma diz: “A probabilidade de dois eventos mutuamente exclusivos
ocorrerem é igual a soma das probabilidades de cada um ocorrer”.Exemplo; Qual a
probabilidade de em um nascimento nascer uma menina ou um menino? A
probabilidade é a soma das probabilidades individuais (P(menino=1/2))+
(P(menina=1/2)) = (1/2 + 1/2)= 1.
3.3.1. USANDO AS REGRAS DE PROBABILIDADE PARA REALIZAR
CRUZAMENTOS.
1. Em um cruzamento monogênico, qual a probabilidade de obtermos
indivíduos heterozigotos do cruzamento de um casal de heterozigotos
com genótipos Aa?
Cruzamento: Aa X Aa
A
1/2
a
1/2
A
1/2
AA
1/2x1/2=1/4
aA
1/2x1/2=1/4
a
1/2
Aa
1/2x1/2=1/4
aa
1/2x1/2=1/4
Proporção
genotípica
Proporção
fenótípica
1/4 AA 1/4+2/4 = 3/4 A_
Fenótipo
dominante
1/4 + 1/4 Aa= 2/4
1/4 = aa
Fenótipo
recessivo 1/4 = aa
♂
♀
51
2. Do cruzamento de duas plantas com genótipos Aa BB Cc Dd Ee X Aa Bb
Cc dd Ee qual a probabilidade de obtermos na prole um descendente
com o seguinte genótipo:
aa Bb Cc Dd ee
Resposta: Como cada característica segrega independente (são
eventos independentes); já que estamos considerando que se encontram
em cromossomos homólogos diferentes; poderemos achar a
probabilidade individual em cada cruzamento Aa X Aa. BB X Bb, Cc X Cc,
Dd X dd e Ee X Ee e depois multiplicar cada uma das probabilidades.
Aa X Aa = 1/4 aa; BB X Bb = 1/2 Bb; Cc X Cc = 1/2 Cc; Dd X dd = 1/2 Dd;
Ee X Ee = 1/4 ee.
P( aa Bb Cc Dd ee)= P(aa)XP(Bb)XP(Cc)XP(Dd)XP(ee)=
1/4X1/2X1/2X1/2X1/4= 1/128
3.3.2 QUANTOS GENÓTIPOS DISTINTOS UM CRUZAMENTO PRODUZ?
As regras de probabilidades podem ser facilmente utilizadas para prever
quantos genótipos ou fenótipos diferentes podem surgir na prole de linhagens
parentais complexas com quatro cinco ou mais pares de genes. Exemplo: No
cruzamento de tetra-híbrido quantos genótipos e quantos fenótipos diferentes
podem ter? Cruzamento tetra-híbrido: Aa Bb Cc Dd X Aa Bb Cc Dd. Cada
cruzamento individual gera 3 genótipos diferentes AA, Aa, aa e dois fenótipos
diferentes o dominante e o recessivo.podemos utilizar a fórmula 3n onde n é o
número de características individuais, ou seja o número de genótipos diferentes é:
34 = 81; já o número de fenótipos é 2n= 24 = 16.
Em um cruzamento teste Aa Bb Cc Dd X aa bb cc dd; cada cruzamento
individual produz 2 tipos de genótipos o Aa e o aa e também dois tipos de
fenótipos o dominante e o recessivo, nesse caso a mesma fórmula pode ser usada
tanto para calcular o genótipo quanto o fenótipo 2n = 24 = 16
52
GENÉTICA DE TRANSMISSÃO: EXTENSÕES DO MENDELISMO
53
EXTENSÕES DO MENDELISMO
INTRODUÇÃO
Os experimentos de Mendel estabeleceram que os genes existem em formas
alternativas (alelos). Na simplificação Mendeliana, para cada característica só
existiam dois alelos: o dominante que contribuía de forma definitiva para produzir
o fenótipo, e o recessivo que só se expressava na ausência do dominante. Hoje
sabemos que cada gene pode apresentar várias formas alélicas na natureza (que
surgem por mutação) e que essas várias formas podem apresentar efeitos
diferentes sobre o fenótipo. Evidentemente cada indivíduo diploide só pode
apresentar dois desses alelos, já que esses alelos se encontram na mesma posição
(locus) nos pares de cromossomos homólogos.
1. ALTERAÇÕES NAS PROPORÇÕES FENOTÍPICAS MENDELIANA
1. 1. DOMINÂNCIA INCOMPLETA
Na dominância completa, o alelo é dominante se tiver o mesmo efeito
fenotípico em dose dupla (AA) ou simples (Aa), e o organismo para essa
característica só apresenta dois fenótipos distintos, o dominante e o recessivo, (
representado pelo genótipo aa). No estudo da característica cor da flor em boca-
de-leão, Antirrhinum majus, foram observados três fenótipos diferentes: o
vermelho, o branco e o rosa. Ao ser realizado o cruzamento entre plantas de cor
vermelha(R1R1) e branca(R2R2), todos os descendentes F1 nasceram com uma cor
intermediária, rosa(R1R2). Ao cruzar as plantas de flores rosa (F1) nasceram em F2:
1/4 de plantas de flores vermelha; 2/4 plantas de flores rosa e 1/4 de plantas de
flores brancas, semelhante com a proporção genotípica de 1/4 R1R1; 2/4 R1R2 e
1/4 R2R2 obtida. A explicação para essa alteração na proporção fenotípica em
relação à proporção obtida por Mendel é que o alelo FV daria como produto gênico
final uma certa quantidade de pigmento, se ele aparece em dose dupla (FVFV =
fenótipo vermelho), ele produzirá duas vezes mais pigmento do que quando ele
aparece em dose simples (FVFB = fenótipo rosa), já o FBFB não produz pigmento,
54
resultando na cor branca. Esse tipo de herança não invalida a 1ª lei de Mendel,
mas apresenta uma proporção fenotípica diferente da obtida por ele em F2, e como
o fenótipo do heterozigoto é intermediário entre os dos homozigotos, foi
denominado de dominância incompleta. (fig. 2.1).
Figura 2.1: Dominância incompleta mostrada na cor da flor boca-de-leão. Fonte: Klug et
al.; 2010.
55
1.2. CODOMINÂNCIA
Outra exceção ao princípio de dominância completa surge quando um
heterozigoto apresenta característica encontrada em cada um dos homozigotos
associados, produzindo dois produtos gênicos detectáveis; nesse caso, a expressão
conjunta dos dois alelos no heterozigoto é denominada codominância. Um
exemplo desse tipo de herança é a do grupo sanguíneo do sistema MN, descoberto
por Karl Landsteiner e Philip Levin, controlado por alelos presentes no
cromossomo 4, indivíduos homozigotos para o alelo LM, produzem uma molécula
glicoprotéica na superfície dos eritrócitos que é um antígeno natural,
apresentando, dessa forma, o fenótipo grupo sanguíneo M; os que apresentam
somente alelos LN já produzem um outro tipo de glicoproteína na superfície das
hemácias que também funcionam como antígeno natural e o fenótipo é grupo
sanguíneo N; já o heterozigoto, que apresenta tanta o alelo LM, quanto o alelo LN
produzem os dois tipos de glicoproteínas e o fenótipo é grupo sanguíneo MN.
Como é previsto, um cruzamento entre dois genitores heterozigotos MN
pode produzir filhos com os três tipos de fenótipos, M, MN e N, na proporção de
1:2:1, semelhante à proporção genotípica.
Como não existe dominância completa entre os alelos, a notação genética
mais utilizada é a de representar os alelos com a mesma letra maiúscula e
sobrescrito a letra dos alelos alternativos. (fig.2.2).
Tabela representando os genótipos e fenótipos para a característica sistema sanguíneo MN
Genótipos Fenótipos
LMLM Grupo sanguíneo M
LMLN Grupo sanguíneo MN
LNLN Grupo sanguíneo N
Figura 2.2: Exemplo de codominância
56
1.3. ALELOS MÚLTIPLOS OU POLIALELIA
O conceito mendeliano de que os genes existem em não mais que dois
estados alélicos foi modificado quando se descobriu que a sequência de DNA, que
determina um gene, pode sofrer inúmeras mutações, em pontos diferentes,
originando diversos tipos de alelos. Esses diversos alelos só podem ser
identificados em um estudo genético populacional, já que nos organismos
diploides cada indivíduo só herda 2 alelos, presentes em um mesmo locus nos
cromossomos homólogos. Quando na população existem mais de dois estados
alélicos de um mesmo gene, estamos falando de alelos múltiplos ou polialelia.
Um dos exemplos clássicos de polialelia é a cor da pelagem em coelhos, que
apresenta 4 formas alélicas, cuja notação utilizada é c determina pelagem albina
(todo branco), ch, pelagem himalaia (corpo branco e as extremidades pretas, patas,
focinho e orelhas), cch, pelagem chinchila (pelagem branca com a ponta dos pelos
preta, o que dá uma ideia de conjunto acinzentado) e c+, pelagem selvagem (pelo
colorido por todo o corpo, normalmente castanho). O estudo de diversos
cruzamentos na população de coelhos permitiu determinar a relação de
dominância entre os diversos alelos. c+ > cch > ch > c, o sinal > indicando
dominância. (fig.2.3)
Tabela representando os diversos genótipos e fenótipos para a característica cor da pelagem em coelhos.
Genótipos Fenótipos
c+c+, c+cch , c+ch, , c+c Pelagem tipo selvagem
cchcch, cchch, , cchc Pelagem tipo chinchila
chch, chc Pelagem tipo himalaia
cc Pelagem branca ou albina
Figura 2.3: Exemplo de alelos múltiplos em coelhos
57
Outro exemplo de alelos múltiplos é o sistema sanguíneo ABO em humanos,
descoberto por Landsteiner, no início da década de 1900, e caracterizado pela
presença de antígenos na superfície dos eritrócitos. Com três alelos alternativos de
um gene, IA, IB e IO, a designação I representa isoaglutinogênio, outro termo para
antígeno, localizados em um locus do cromossomo 9. Mais uma vez lembrando que
apesar de na população encontrarmos três tipos de alelos para a determinação do
sistema sanguíneo ABO, cada indivíduo só é capaz de herdar dois desses alelos, um
que vem no cromossomo 9 de origem paterna e outro que vem no cromossomo 9
de origem materna.
O fenótipo ABO de qualquer indivíduo é averiguado mediante mistura de
uma amostra de sangue com um antissoro que contém anticorpos anti-A ou anti-B.
Se o antígeno estiver presente na superfície dos eritrócitos da pessoa, reagirá com
o anticorpo correspondente e causará agregação, ou aglutinação, dessas células
sanguíneas. Quando o indivíduo é testado desse modo, será revelado um entre
quatro fenótipos, se o indivíduo tiver o antígeno A ele será do grupo sanguíneo A,
caso tenha o antígeno B, ele será do grupo sanguíneo B, se tiver ambos os
antígenos, A e B, ele será do grupo sanguíneo AB, e caso não seja detectado
nenhum dos dois antígenos, ele será do grupo sanguíneo O.
Com relação aos genótipos, após estudos em muitas famílias diferentes,
chegou-se à conclusão de que, entre os três alelos encontrados na população, os
alelos IA e IB apresentam uma relação de codominância, e os alelos IA e IB com o
alelo IO uma relação de dominância, podendo ser encontrados os seguintes
genótipos e fenótipos na população, ver tabela abaixo na figura 2.4.
O conhecimento sobre os grupos sanguíneos humanos tem várias
aplicações. Uma das mais importantes é testar a compatibilidade das transfusões
de sangue. Outra aplicação envolve os casos de investigação de paternidade, em
que os recém-nascidos são inadvertidamente trocados no hospital, ou quando é
incerto se um homem específico é o pai de uma criança. Um exame dos grupos
sanguíneos ABO, assim como de outros antígenos hereditários, dos genitores e da
criança, pode ajudar a excluir a paternidade ou a maternidade, mas jamais prova a
paternidade ou maternidade.
58
1.3.1. MECANISMOS BIOQUÍMICOS PARA FORMAÇÃO DOS ANTÍGENOS A E B
Os antígenos A e B são carboidratos que se ligam a moléculas de
lipídeos(ácidos graxos) na superfície externa da membrana celular dos eritrócitos.
Tanto o antígeno A como o antígeno B têm como substância precursora uma
substância denominada substância H ou antígeno H, constituído por três
moléculas de carboidrato; galactose(Gal), N-acetilglicosamina (AcGluNH) e
fucose ligadas quimicamente. A especificidade dos antígenos A e B é dada pela
ligação química na porção terminal da substância H de mais um grupamento
carboidrato.
O produto gênico do alelo IA é uma enzima que adiciona à substância H o
carboidrato N-acetilglicosamina (AcGluNH). O alelo IB tem como produto uma
enzima modificada que só consegue adicionar a porção terminal da substância H
uma galactose(Gal). Indivíduos IAIB adicionam ou um ou outro na porção
terminal, e podemos encontrar, nesse caso, tanto substância H acrescida de
acetilglicosamina (AcGluNH), formando o antígeno A, ou acrescida de
galactose(Gal), formando o antígeno B nas superfícies dos eritrócitos. O alelo IO
apresenta uma mutação que não permite que seu produto gênico acrescente
Tabela representando os genótipos e fenótipos para a característica sistema sanguíneo ABO
Genótipos Fenótipos
IAIA, IAIO Grupo sanguíneo A
IBIB, IBIO Grupo sanguíneo B
IAIB Grupo sanguíneo AB
IOIO Grupo sanguíneo O
Figura 2.4: Exemplo de alelos múltiplos em humanos
59
nenhum carboidrato na porção terminal da substância H, sendo encontrada, em
indivíduos de fenótipo O, somente a substância H.(fig. 2.5)
1.3.2. O FENÓTIPO BOMBAIM
Em 1952, uma situação muito rara propiciou informações sobre a base
genética da substância H. Uma mulher, em Bombaim, Índia, ao necessitar de uma
transfusão, fez uma tipagem sanguínea e diagnosticou-se que ela não possuía
nenhum dos antígenos, A ou B sendo, portanto, do grupo sanguíneo O. Porém ao se
fazer a árvore genealógica dela, observou-se que um dos pais era do grupo AB e ela
Figura 2.5: Mecanismo
bioquímico para formação dos
antígenos A e B, a partir da
substância H, com a
participação dos genes IA e IB e
FUT1 na formação das enzimas
envolvidas. Fonte: Klug et al.;
2010.
60
tinha doado a dois filhos o alelo IB, o que é era inconsistente com a tipagem
sanguínea.
Posteriormente, demonstrou-se que a mulher era homozigota para uma
mutação recessiva rara em um gene denominado FUT1(codificador da enzima
fucosil-transferase), responsável pela ligação química na porção terminal da
substância H, da fucose. A substância H incompleta (sem fucose) não é reconhecida
pelas enzimas produzidas pelos genes IA e IB , não podendo formar os antígenos A
ou B e apresentando-se funcionalmente como do grupo O. Os filhos que herdaram
o alelo IB são heterozigotos para o gene FUT1, logo formam a substância H e
consequentemente os antígenos B.
1.4. GENES LETAIS
Um alelo que é capaz de causar a morte de um organismo é chamado de
alelo letal. Muitos produtos gênicos são essenciais ao desenvolvimento normal e à
sobrevivência de um organismo. Quando os genes que os produzem mutam, pode
resultar na morte prematura do organismo, dependendo da fase do
desenvolvimento (embrionário, primeira infância ou adulto) em que seu produto
gênico vai ser necessário. Quando, para ocorrer a morte do indivíduo, são
necessários dois alelos mutantes, chamamos a letalidade de recessiva, mas se um
único alelo mutante já determinar a morte do indivíduo, chamamos a letalidade de
dominante.
Existem alelos que podem determinar mais de uma característica, já que
seus produtos podem interferir em mais de uma via metabólica, quando isso
ocorre, chamamos o processo de pleiotropia
Um exemplo de genes letais é um gene pleiotrópico que participa da
determinação da cor da pelagem em camundongo e da sobrevida. O alelo AY
determina pelagem amarela, quando em heterozigose, enquanto o alelo A
determina pelagem aguti(cinzenta), quando em homozigose, porém o genótipo
AYAY mata ainda no período embrionário, não sendo encontrados camundongos
amarelos homozigotos. Logo o comportamento do alelo AY em relação à
sobrevivência é de letal recessivo, já que são necessários 2 alelos iguais para
61
causar a morte do camundongo, enquanto que, em relação à cor da pelagem, ele
comporta-se como um alelo dominante.
A letalidade também altera as proporções fenotípicas e genotípicas
mendelianas, já que alguns embriões morrem antes do nascimento, mudando
assim a proporção de nascidos vivos. Na figura 2.6, estão representados alguns
cruzamentos e as proporções fenotípicas e genotípicas resultantes desses
cruzamentos.
Figura 2.6: Exemplos de cruzamentos com alelo letal onde se percebe
alterações nas proporções fenotípicas e genotípicas. Fonte: Klug et al.;
2010.
62
O fenótipo sem cauda Manx em gatos também é produzido por um alelo que
é letal no estado homozigoto. Uma única dose do alelo Manx, ML, interfere
gravemente no desenvolvimento da coluna dorsal, resultando na falta de cauda no
heterozigoto MLM. Mas, no homozigoto MLML, a dupla dose do gene produz uma
anomalia tão extrema no desenvolvimento da coluna, que o embrião não
sobrevive.
Os alelos para cor da pelagem em camundongos e para o fenótipo sem
cauda Manx sendo genes pleiotrópicos apresentam fenótipos visíveis em
heterozigose, mas a maioria dos letais recessivos são silenciosos no heterozigoto.
Em tal situação, a letalidade recessiva é diagnosticada observando a morte de 25%
da prole em algum estágio do desenvolvimento.
Um exemplo de gene letal dominante é o da doença de Huntington, que se
caracteriza pela degeneração motora e nervosa, em humanos. Causada pelo alelo
autossômico dominante H, essa doença só se manifesta nos heterozigotos (Hh) na
idade adulta, permitindo assim que esses indivíduos cheguem à idade reprodutiva
e transmitam seus genes para os descendentes.
Genes letais dominantes são raros na população, quando causam morte
antes da idade reprodutiva, pois não permitem a perpetuação do alelo.
1.5. PENETRÂNCIA E EXPRESSIVIDADE
A herança monogênica estudada até agora produz mutantes e selvagens que
produzem claras proporções mendelianas. Em tais casos, podemos usar o fenótipo
para distinguir os genótipos mutantes e selvagens com quase 100% de certeza.
Mas existem muitos casos em que, mesmo o genótipo estando presente, o fenótipo
não é expresso. Sabemos, hoje, que a expressão do fenótipo não só depende do
genótipo e sim da interação desse genótipo com o meio interno celular, inclusive
com a possibilidade de interação com outros genes não caracterizados, com efeitos
epistáticos ou supressores, como também com o meio externo.
63
Definimos Penetrância como a porcentagem de indivíduos com um
determinado alelo que exibem o fenótipo associado a esse alelo. Nos casos em que
um determinado alelo está presente e expressa com 100% de certeza o fenótipo,
dizemos que a penetrância é completa. Mas quando um determinado alelo, como o
da polidactilia postaxial (herança autossômica dominante caracterizada por um
dedo extranumerário próximo ao quinto dedo da mão ou do pé) está presente, mas
o fenótipo só é expresso em 64,9% dos indivíduos, segundo estudo populacional na
África, a penetrância é dita incompleta, e a penetrância desse alelo é de 64,9%, ou
seja, 35,1% apesar de terem o genótipo para polidactilia, não apresentam o
fenótipo.
Outra medida para descrever a gama de expressão fenotípica é a chamada
de expressividade. A expressividade mede o grau em que determinado alelo é
expresso em nível fenotípico; isto é, a expressividade mede a intensidade do
fenótipo. Por exemplo, em cães da raça beagles, o alelo dominante, S, determina
pelagem homogênea, sem manchas, decorrente da distribuição homogênea dos
melanócitos. O alelo recessivo, s, determina uma distribuição heterogênea dos
melanócitos durante o desenvolvimento embrionário. Animais com genótipo SS ou
Ss, apresentam pelagem sem manchas, entretanto os com genótipos ss,
apresentam pelo menos 10 tipos diferentes de padrão de manchas( fenótipo
variegado), indo desde quase sem manchas até uniformemente pigmentados, como
o do genótipo dominante. Alelos que produzem fenótipos tão variados em seus
portadores, fala-se em expressividade gênica variável. (fig. 2.7)
64
1.6. INTERAÇÕES GÊNICAS NÃO ALÉLICAS
Caracteriza-se pela interação entre dois ou mais alelos, presentes no mesmo
ou em cromossomos homólogos diferentes, determinando uma mesma
característica.
A análise da proporção fenotípica entre os descendentes de um
cruzamento, além de informar quantos genes estão envolvidos na formação da
característica pode também revelar o tipo de interação entre eles.
1.6.1. INTERAÇÃO GÊNICA SIMPLES
Algumas das primeiras evidências de que uma característica pode ser
influenciada por mais de um gene foram obtidas por Bateson e Punnett, em 1905,
de experimentos de cruzamentos em galinhas. Tipos diferentes de galinhas
domésticas têm formas de cristas diferentes. As da raça Wyandottes têm cristas
rosa, as Brahmas têm cristas ervilhas, do cruzamento de Wyandottes e Brahmas
(cristas rosa e ervilha); apareceu outro tipo de crista denominada noz, e do
cruzamento de duas aves noz, obteveram-se quatro tipos de fenótipos: os três já
Figura 2.7: Representação
esquemática. Em cães da raça beagle
podem-se distinguir 10 padrões de
pelagem (ver no esquema, 1 a 10)
devidos à expressividade variável do
alelo que condiciona a variegação da
pelagem (Baseado em Griffiths, A. J.
F e cols., 1998). Fonte: Amabis, José
M.,Martho, Gilberto R., 2006.
65
conhecidos, crista rosa, ervilha, noz e outro fenótipo chamado de crista simples em
galinhas da raça leghorns, pela proporção fenotípica da descendência, crista
simples é representado pelo genótipo duplo-recessivo.( fig. 2.8) Bateson e Punnett
descobriram que o tipo de crista é determinado pela interação de dois pares de
alelos que se segregam independentemente. Usando a notação E e e para
representar os alelos do par que determina a forma crista ervilha; a notação R e r
a forma da crista rosa; e E_ expressando que o genótipo pode ser EE ou Ee o
mesmo aplicável para o R_, representamos os genótipos da seguinte forma: O
genótipo E_ rr, determinaria o fenótipo crista ervilha; o genótipo
ee R_ o fenótipo crista rosa; E_ R_, resultante do cruzamento de aves de crista
ervilha com crista rosa, o fenótipo crista noz; e o genótipo ee rr o fenótipo crista
simples.(fig.2.8)
Figura 2.8: Formas das cristas de galinha de
raças diferentes. (a) Rosa, Wyandottes; (b)
Ervilha, Brahmas; (c) noz, híbrida do
cruzamento entre galinhas com cristas rosa e
ervilha; (d) simples, Leghorns.Fonte: Snustad,
D.Peter; Simmons, Michael J.,2008.
66
Outro exemplo de interação gênica simples é o que ocorre com a cor da
plumagem em periquitos australianos, esses periquitos apresentam um grande
gama de cores, determinadas por dezenas de genes. No entanto, na determinação
das cores básicas da plumagem dessas aves – verde, azul, amarela e branca - estão
envolvidos somente dois pares de alelos, o par A e a e o par B e b, que se segregam
independentemente. Periquitos homozigóticos recessivos apresentam genótipo aa
bb e um fenótipo branco para a plumagem; Periquitos aa B_ são amarelos; já os A_
bb são azuis e os A_ B_ são verdes. O cruzamento de periquitos verdes
heterozigotos produz os 4 tipos de fenótipos na proporção de 9/16 verde: 3/16
amarelo: 3/16 azul e 1/16 branco.
P Wyandotte
(rosa)
ee RR
X Brahma
(ervilha)
EE rr
Gametas e R E r
F1 Híbrido
Ee Rr
X
Híbrido
Ee Rr
Gametas masculinos
E R E r e R e r
F2 E R EE RR EE Rr Ee RR Ee Rr
Gametas
femininos
E r EE Rr EE rr Ee Rr Ee rr
e R Ee RR Ee Rr ee RR ee Rr
e r Ee Rr Ee rr ee Rr ee rr
Figura 2.9: O experimeto de Bateson e Punnett sobre a forma das cristas em galinhas. O
entrecruzamento na F1 produz quatro tipos de fenótipos, cada um destacado por uma cor
diferente no quadrado de Punnett, em uma proporção 9:3:3:1
67
Tanto o alelo A como o alelo B produzem pigmentos. O alelo A produz o
pigmento melanina (um pigmento escuro) que, devido à dispersão da luz na
superfície da pena, contra o fundo escuro de melanina no centro da pena, aparece
como azul. O alelo B produz um pigmento amarelo chamado psitacina, que se
deposita na pena. Os alelos a e b são formas alteradas e não produzem,
respectivamente, melanina e psitacina, dando um fenótipo branco. Quando os
alelos A e B estão constituindo um mesmo genótipo, a cor da plumagem é verde,
essa cor resulta da mistura do efeito visual azul, causado pela presença de
melanina, e do amarelo, causado pela presença do pigmento psitacina.(fig 2.10)
1.6.2. EPISTASIA
É um exemplo de interação onde o efeito de um gene ou de um par de genes
dissimula ou modifica o efeito de outro gene ou de outro par gênico. Às vezes, os
genes envolvidos influem na mesma característica fenotípica de modo antagonista,
o que leva à dissimulação. Em outros casos, entretanto, os genes envolvidos
exercem sua influência reciprocamente, de maneira complementar ou cooperativa.
Á Figura 2.10: Esquemas de cortes
transversais das penas de periquitos para
mostrar como a presença e a distribuição dos
pigmentos melanina e psitacina determinam a
cor da plumagem. (Baseado em Campbell, N. A.
e cols., 1994).Fonte: Amabis, José M.,Martho,
Gilberto R., 2006.
68
A epistasia pode ser recessiva, quando o par de alelos localizados em um
locus impede ou suprime a expressão, do par de alelos, em outro locus. O par que
tem o efeito supressor é dito epistático e o par suprimido é dito hipostático.
Um exemplo de epistasia recessiva, a que já nos referimos, é a do
fenótipo Bombaim, o gene H quando em homozigose recessiva suprime a
expressão dos genes IA ou IB, apresentando o portador desse genótipo, fenótipo do
grupo sanguíneo O.(fig.2.5 e 2.11)
Outro exemplo de epistasia recessiva é o da cor da pelagem em
camundongos. O gene A produz um pigmento que funciona como precursor dos
alelos P que determina cor aguti (base do pelo preto com ponta amarela), e do
alelo p que determina cor preta, o gene a é alterado e não origina esse precursor.
F1 G. sanguíneo AB
Hh IAIB
X
G. sanguíneo AB
Hh IAIB
Gametas masculinos
F2 H IA H IB h IA h IB
H IA HH IAIA HH IAIB HH IAIA Hh IAIB
Gametas H IB HH IAIB HHIBIB Hh IAIB HhIBIB
femininos h IA Hh IAIA Hh IAIB hh IAIA hh IAIB
h IB Hh IAIB Hh IBIB hhIAIB hhIBIB
Proporção Fenotípica: 6/16 G.S.AB; 3/16 G.S. B;
3/16 G.S.A; 4/16 G.S. O
Figura 2. 11: Representação do cruzamento de indivíduos do grupo sanguíneo AB, heterozigotos para
os genes H, com conseqüente surgimento do fenótipo Grupo sanguíneo O (G.S. O).
69
Quando o genótipo do camundongo é A_P_ ou A_ pp os camundongos são aguti ou
pretos, respectivamente. Mas se o gene for aaP_ ou aapp o fenótipo é
albino.(fig.2.12a e b)
Figura 2.12a: Representação esquemática da seqüência de reações
bioquímicas que levam à síntese do pigmento melanina no pêlo de
camundongos aguti, preto e albino. Cada transformação química é controlada
por uma enzima, fabricada por um gene específico. Fonte: Amabis, José
M.,Martho, Gilberto R., 2006.
70
Quando um único alelo de um par já impede ou suprime o par de alelos de
outro locus, falamos em epistasia dominante.
O exemplo de epistasia dominante é o da cor do fruto em abobrinhas, o alelo
A impede ou suprime a expressão, enquanto o alelo a permite a expressão dos
alelos B e b, que se encontram em outro locus gênico, e determinam a cor amarela
Figura 2.12b: Representação esquemática do cruzamento de camundongos
em que a cor da pelagem resulta da epistasia recessiva. No cruzamento entre
animais duplo-heterozigóticos surge a proporção 9: 3 : 4, característica
desse tipo de epistasia. Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
71
e cor verde respectivamente. Como esses alelos segregam independentemente a
proporção em F2 do cruzamento de duas plantas de abobrinhas brancas
heterozigotas é de 12 brancas para 3 amarelas para uma verde.(fig. 2.13)
A cor da plumagem em galinhas também exemplifica a interação epistática
dominante, os pares de alelos que participam são denominados I e i, e o outro par
C e c. A presença de I já suprime ou impede a expressão do C ou c. (fig 2.14)
P Abobrinha branca
AA BB
X Abobrinha verde
aa bb
Gametas A B a b
F1 Aa Bb X Aa Bb
Gametas
F2 A B A b a B a b
A B AA BB AA Bb Aa BB Aa Bb
Gametas A b AA Bb AA bb Aa Bb Aa bb
a B Aa BB Aa Bb aa BB aa Bb
a b Aa Bb Aa bb aa Bb aa bb
Proporção fenotípica: 12/16 abobrinha branca; 3/16 abobrinha amarela;
1/16 abobrinha verde
Figura 2.13: Quadrado de Punnett representativo de um cruzamento de plantas de abobrinhas em
que a determinação da cor da abobrinha é resultante de epistasia dominante, originando uma
proporção fenotípica modificada de 12: 3: 1.
72
1.6.3. INTERAÇÃO GÊNICA COMPLEMENTAR (GENES DUPLOS RECESSIVOS)
Bateson e Punnett, descobriram em ervilha-doce (Lathyrus odoratus) ao
cruzar duas plantas de flores brancas homozigotas que a F1 obtida eram todas de
flores púrpuras, e o resultado da F2 foi de 9 púrpuras para sete brancas, indicando
que ocorre segregação independente de dois pares de alelos, assim
denominados: em um locus B e b e no outro locus A e a. A explicação para esse
resultado é que a cor da flor da ervilha é dada pela interação complementar de dois
alelos, se o os dois alelos A e B estiverem presentes o pigmento será produzido e a
flor será púrpura, caso falte um dos dois – aa B_, A_ bb ou aa bb – a planta
Figura 2.14: Representação
esquemática do cruzamento de
galináceos para coloração das penas,
resultante de epistasia dominante,
originando uma proporção fenotípica
modificada de 13: 3, Essa proporção
difere do esperado para a epistasia
dominante pois o genótipo ii cc também
é branco pois os alelos hipostáticos cc
não produzem pigmentos. Fonte:
Amabis, José M.,Martho, Gilberto R.,
2006.
73
apresentará flor branca, os alelos recessivos aa ou bb dissimulam o expressão do
alelo dominante do outro locus . (fig. 2.15 e 2.16)
1.6.4. GENES DUPLOS COM EFEITO CUMULATIVO
Em abobrinha (Cucurbita pepo) a forma do fruto também é um exemplo de
interação determinada por dois pares de alelos que se segregam
independentemente. O fruto apresenta os fenótipos discoide, alongado e esférico. E
representaremos os alelos de um locus com as letras A e a e o outro par de alelos
com as letras B e b. Quando cruzamos uma planta de fruto discóide com uma de
fruto alongado, todos os descendentes em F1 apresentam fruto discoide, mas na
geração F2, resultantes do cruzamento de F1, aparecem plantas com fenótipo do
tipo esférico, diferente dos outros dois já apresentados. A explicação para esse
resultado é que a presença dos dois alelos A e B determinam o fenótipo discoide,
enquanto a ausência dos dois determina o fenótipo alongado, porém se só um dos
alelos A ou B estão presentes o fenótipo é esférico. Os genes A e B influenciam
igualmente na determinação dos fenótipos. (fig.2.17)
Gene A Gene B
MOLÉCULA
PRECURSORA
(INCOLOR)
A_
PRODUTO
INTERMEDIÁRIO
(INCOLOR)
B_
PRODUTO
FINAL
(PÚRPURA)
Figura 2.15: Representação esquemática da seqüência de reações bioquímicas que levam à síntese do
pigmento púrpura. Cada transformação química é controlada por uma enzima, fabricada por um gene
específico. São necessários ao dois alelos A e B para produção do pigmento. Interação gênica
complementar( genes duplos recessivos)
74
Figura 2.16: Representação esquemática de cruzamento entre duas linhagens de ervilha-
doce. Nessas linhagens, a coloração das flores depende da interação de dois pares de
alelos que se segregam independentemente. (Interação genes duplos recessivos ou
interação gênica complementar). Fonte: Amabis, José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
75
Além dessas interações gênicas já mencionadas existem outras que
modificam as proporções fenotípicas de um cruzamento di-híbrido, representadas
na tabela abaixo.(fig.2.18)
Figura 2.17: Quadrado de Punnett representativo de um cruzamento de plantas de abobrinhas em que a
determinação da forma do fruto é resultante de genes duplos de efeitos cumulativos, originando uma
proporção fenotípica modificada de 9:6:1.
P Abobrinha discoide
AA BB
X Abobrinha alongados
aa bb
Gametas A B a b
F1 Discoide
Aa Bb
X Discoide
Aa Bb
Gametas
F2 A B A b a B a b
A B AA BB AA Bb Aa BB Aa Bb
Gametas A b AA Bb AA bb Aa Bb Aa bb
a B Aa BB Aa Bb aa BB aa Bb
a b Aa Bb Aa bb aa Bb aa bb
Proporção fenotípica: 9/16 abobrinha fruto discoide; 6/16 abobrinha
fruto esférico; 1/16 abobrinha fruto alongados
Fonte:Klug et. al.,2010
76
1.7. HERANÇA QUANTITATIVA OU POLIGÊNICA
Até agora a maior parte dos nossos exemplos sobre variações fenotípicas
eram tipos que podiam ser classificados em categorias diversas e separadas: as
características das ervilhas de Mendel eram bem contrastantes, cor do cotilédone
verde ou amarelo, textura da semente da ervilha, lisa ou rugosa, mesmo nos casos
de dominância incompleta, os fenótipos eram bem pontuais, no exemplo da flor
boca-de-leão, ela apresenta fenótipos, branco, rosa e vermelho; o grupo sanguíneo
ABO, pode ser A, B, AB, O. Cada uma das características citadas apresenta
genótipos distintos que determinam fenótipos distintos. Quando isso ocorre,
falamos que essas características apresentam variação descontínua. Embora
Figura 2.18: Tabela representativa dos principais tipos de interações gênicas, onde se encontra
relacionado os possíveis genótipos com as proporções fenotípicas do cruzamento de dois duplo-
heterozigotos
Tipos de Interação Genótipos
A_ B_ A_ bb aa B_ aabb
Interação gênica simples 9 3 3 1
Epistasia dominante 12 3 1
Epistasia recessiva 9 3 4
Genes duplos com efeito
cumulativo
9 6 1
Genes duplos dominantes 15 1
Genes duplos recessivos 9 7
Interação dominante e recessiva 13 3
77
fenômenos como penetrância, expressividade variável, pleiotropia e epistasia
possam confundir um pouco a relação genótipo-fenótipo.
Na herança quantitativa, nós vamos estudar características que apresentam
uma variedade contínua de fenótipos, essa variedade contínua pode ser medida e
descrita em termos quantitativos, onde cada genótipo contribui com uma pequena
parcela para determinar o fenótipo, logo esses fenótipos são resultantes da
contribuição aditiva de dois, três ou um grande número de genes, por isso o nome
dado a esse estudo é herança quantitativa ou poligênica.
São exemplos de herança poligênica ou quantitativa a cor da pele, a altura,
ou o peso na espécie humana, a produção de leite ou de carne no gado, a
produtividade das colheitas e o conteúdo proteico das sementes.
Na herança quantitativa, o genótipo estabelece os limites quantitativos na
fertilização, mas os fenótipos sofrem grande influência do ambiente, por exemplo,
a altura humana é parte geneticamente determinada, mas se a pessoa tem uma boa
alimentação, pratica esportes etc. pode atingir, dentro de uma determinada faixa
de variação da altura genética, a maior altura. Os fenótipos que resultam da ação
gênica e de influências ambientais, às vezes, são denominados características
complexas ou multifatoriais.
Além das características quantitativas contínuas, em que a variação
fenotípica pode situar-se em qualquer ponto de uma variedade de medidas, há
duas outras classes de características poligênicas:
Características merísticas são aquelas em que os fenótipos são descritos
por números inteiros. Exemplo: o número de sementes por vagem, ou o número de
ovos postos por uma galinha, em um ano. São características quantitativas, mas
não têm uma infinidade de fenótipos: Por exemplo, a vagem pode conter 2 ou 4 ou
6 sementes, mas não 5,75.
Características com limiar são características poligênicas, mas que
apresentam só poucos tipos de fenótipos distintos na população. Sofrem grande
influência dos fatores ambientais, sendo, portanto, características multifatoriais.
São de grande interesse dos geneticistas humanos, pois um grande número de
doenças apresenta esse padrão de herança. Exemplo: a diabetes tipo II, a
esquizofrenia, o transtorno afetivo bipolar etc. Em humanos, a evidência de que
78
tais características são influenciadas por fatores genéticos vem de comparações
entre parentes, especialmente gêmeos.
1.7.1. AS CARACTERÍSTICAS QUANTITATIVAS PODEM SER EXPLICADAS EM
TERMOS MENDELIANOS
No início da década de 1900, a explicação da variação fenotípica contínua,
em termos mendelianos, causou muita controvérsia, mas Bateson e Gudny Yule
propuseram a hipótese dos fatores múltiplos ou genes múltiplos, na qual
muitos genes, cada um comportando-se mendelianamente, contribuíam para o
fenótipo de forma cumulativa ou quantitativa. Essa hipótese foi sustentada pelos
resultados experimentais, publicados pelo trabalho com a característica cor do
grão de trigo desenvolvido por Hermann Nilsson-Ehle.
Nilsson-Ehle iniciou seu trabalho cruzando plantas de trigo de grão
vermelho escuro com plantas de trigo de grãos branco, obtendo em F1 todas as
plantas com uma cor intermediária (vermelha), o que inicialmente o fez suspeitar
de dominância incompleta entre dois alelos de um mesmo locus, mas ao cruzar as
plantas F1, obteve em F2 15/16 plantas com grão que variavam em tons de
vermelho, podendo ser distinguidos até 4 tons de vermelho, e o 1/16 branco,
sugerindo que era uma herança com dois pares de alelos que se segregavam
independentemente.
Cada par tinha um alelo que contribuía de forma aditiva para compor o
fenótipo grão vermelho, e outro que não adicionava nada na formação do fenótipo.
Representando os alelos como A e a e B e b, os que apresentavam fenótipo grão
vermelho escuro possuíam um genótipo com o máximo de genes aditivos AA BB, já
os que eram brancos, apresentavam seu genótipo sem nenhum gene aditivo, aa bb.
F2 então ficou com cinco classes fenotípicas, a primeira representada por 4 alelos
aditivo, AA BB, e fenótipo vermelho escuro; a segunda por 3 alelos aditivos, Aa BB
ou AA Bb e fenótipo vermelho médio; a terceira com 2 alelos aditivos, AA bb, aa BB,
Aa Bb e fenótipo vermelho; a quarta com 1 alelo aditivo, Aa bb ou aa Bb e fenótipo
vermelho claro e a quinta e última classe com 0 alelos aditivo e fenótipo grão
branco. (fig.2.19)
79
Se fizermos um gráfico da distribuição da cor do grão em trigo, ou da
estatura, ou da cor da pele em humanos etc. observaremos que todas essas
características quantitativas apresentam uma mesma curva de distribuição, que
chamamos de curva de distribuição normal, ou curva em forma de sino. (fig. 2.20)
Figura 2.19: Representação esquemática
do cruzamento entre plantas de trigo
produtoras de grão vermelhos-escuro e
brancos. A proporção obtida na geração F2
mostra tratar-se de um caso de herança
quantitativa ou poligênica. Fonte: Amabis,
José M.,Martho, Gilberto R., 2006.
80
Figura 2.20: Representação esquemática de um gráfico de distribuição normal da
herança poligênica da cor do grão de trigo , determinada por 2 pares de alelos que se
segregam independentemente , com efeito aditivo
1.7.2. CALCULANDO O NÚMERO DE POLIGENES
Para estimar o número de genes (quantos pares de alelos) envolvidos na
determinação de uma característica quantitativa, pode-se usar a fórmula 1/4n =
relação entre os indivíduos F2 que expressam um dos dois fenótipos extremos. Ou
1/2n relação entre os indivíduos F2 que expressam um dos dois fenótipos
extremos, nesse caso obteremos o número de alelos envolvidos na herança
quantitativa (fig. 2.21).
Quando o número de poligenes é pequeno, às vezes, é mais fácil usar a
equação (2n+1) = número observado de categorias fenotípicas distintas.
Do cruzamento onde os dois genitores são heterozigotos para todos os
genes, pode-se determinar a proporção fenotípica de cada uma das classes
fenotípicas formadas, usando-se o triângulo de Pascal. Vamos supor que desejamos
saber a proporção fenotípica obtida no cruzamento entre dois híbridos para três
pares de genes de efeito cumulativo. Sabemos, pela fórmula, que o número de
fenótipos será sete. Construímos um triângulo com sete linhas. Na primeira,
colocamos o número 1. Os números das linhas começam sempre por 1, e os
números seguintes são obtidos somando o número imediatamente acima com o
6/16
4/16
1/16
Vermelho escuro
Vermelho
médio
Vermelho Vermelho
claro
Branco
81
que está à esquerda dele (quando não houver número acima ou à esquerda,
considera-se zero). Todas as linhas terminam novamente com o número 1:
1
1 1
1 2 1
1 3 3 1
1 4 6 4 1
1 5 10 10 5 1
1 6 15 20 15 6 1
Na sétima linha podemos ver que a proporção fenotípica para três pares de
genes na herança quantitativa (no cruzamento de dois indivíduos heterozigotos) é
1 : 6: 15 : 20 : 15 : 6 : 1.
Determinação do número de poligenes(n) envolvidos em
uma característica quantitativa
n Indivíduos que expressam um dos
fenótipos extremos
Classes fenotípicas
distintas
1 1/41 = 1/4 3
2 1/42 = 1/16 5
3 1/43 = 1/64 7
4 1/44 =1/256 9
5 1/45 = 1/1024 11
Figura 2.21: Representação na tabela do número de classes fenotípicas , e do
número de genes envolvidos em uma característica quantitativa.Fonte: Klug
et. al., 2010
82
GENÉTICA DE TRANSMISSÃO:
HERANÇA E SEXO
83
HERANÇA E SEXO
INTRODUÇÃO
Todos os casos que você estudou em genética, até agora, tinham uma coisa
em comum: as características de um indivíduo sempre dependiam dos genes que
ele herdava, independentemente de terem sido transmitidos pelo pai ou pela mãe.
Analisemos o conhecido caso do albinismo: pai normal (AA) e mãe albina
(aa) têm sempre descendentes normais (Aa). Também mãe normal (AA) e pai
albino (aa) geram crianças normais (Aa). Não importa qual dos progenitores, pai
ou mãe, tenha transmitido o gene A; em qualquer caso, ele condicionará produção
de melanina e pigmentação normal nos filhos.
Nesse tipo de herança, além disso, há outro fato: a criança que recebe um
gene dominante, não importando se é um menino ou uma menina, manifestará
aquele caráter. A característica não tem “preferência” por um dos sexos.
Há casos, no entanto, em que a herança da característica parece depender
tanto do sexo do progenitor, que transmite o gene, quanto do sexo da criança que
recebe o gene.
Há, na espécie humana, uma característica chamada daltonismo, em que a
pessoa se confunde na percepção de certas cores, muitas vezes do verde com o
vermelho. Quando um homem daltônico se casa com uma mulher normal, na
família da qual não há casos de daltonismo, todas as crianças, meninos e meninas,
nascem com visão normal. No entanto, quando uma mulher daltônica se casa com
um homem normal, todas as meninas, filhas do casal, nascem normais, porém
todos os meninos nascem daltônicos. Nesse caso, portanto, parece fazer diferença
não apenas o sexo de quem transmite o gene para o daltonismo, mas também o
sexo de quem recebe o gene. Além disso, percebe-se que existem muito mais
homens daltônicos do que mulheres daltônicas, diferentemente do caso do
albinismo, que se distribui mais ou menos da mesma forma nos dois sexos.
84
Foi demonstrado, na década de 1910, que os genes se localizam nos
cromossomos, filamentos existentes nos núcleos das células. Quando se tentou
entender casos de herança como o daltonismo, procurou-se, ao microscópico, por
uma diferença entre os cromossomos de homens e os de mulheres que pudessem
justificar a diferença no modo de transmissão da característica. Descobriu-se,
finalmente, que surgiu a suspeita de que a herança do daltonismo pudesse ser
explicada por esse par de cromossomos diferentes, que foram chamados de
cromossomos sexuais, enquanto os demais cromossomos eram chamados de
autossomos.
Os demais tipos de genes, como o do albinismo, ficariam nos autossomos.
No decorrer desse capítulo, você entenderá como o daltonismo e outras heranças
semelhantes relacionadas com os cromossomos sexuais são transmitidas de pais
para filhos.
1. CROMOSSOMOS SEXUAIS
Em condições normais, qualquer célula diploide humana contém 23 pares
de cromossomos homólogos, isto é, 2n = 46. Dos 46 cromossomos, 23 são de
origem paterna e 23, de origem materna. Desses cromossomos, 44 são autossomos,
que não têm implicação com o sexo, e 2 são os cromossomos sexuais, também
conhecidos como heterossomos, os quais participam da determinação do sexo do
indivíduo.
Os cromossomos autossômicos são os relacionados às características
comuns aos dois sexos, enquanto os sexuais são os responsáveis pelas
características próprias de cada sexo. A formação de órgãos somáticos, tais como
fígado, baço, o estômago e outros, deve-se a genes localizados nos autossomos,
visto que esses órgãos existem nos dois sexos. O conjunto haploide de autossomos
de uma célula é representado pela letra A. Por outro lado, a formação dos órgãos
reprodutores, testículos e ovários, característicos de cada sexo, é condicionada por
genes localizados nos cromossomos sexuais e são representados, de modo geral,
por X e Y. O cromossomo Y é exclusivo do sexo masculino. O cromossomo X existe
85
na mulher em dose dupla, enquanto no homem ele se encontra em dose simples.
Assim, temos:
Homens: 44 autossomos + 2 sexuais (44A + XY)
Mulheres: 44 autossomos + 2 sexuais (44A + XX)
O cromossomo Y é mais curto e possui menos genes que o cromossomo X,
além de conter uma porção encurtada, em que existem genes exclusivos do sexo
masculino. Observe na figura acima que uma parte do cromossomo X não possui
alelos em Y, isto é, entre os dois cromossomos há uma região não-homóloga.
Figura3.1: Microscopia Eletrônica do
cromossomo X e Y. Diferença de
tamanho de cada cromossomo.
Fonte:http://www.sobiologia.com.br/co
nteudos/Genetica/herancaesexo.php
Figura 3.2: Representação esquemática dos cromossomos X e Y, indicando as
regiões homólogas. (cores fantasia) Fonte: César e Sezar, 2005.
86
Observe o esquema acima: lado a lado, observamos a representação de um
cromossomo X, maior, e de um cromossomo Y, menor. Primeira informação
importante: nesses cromossomos, na hora da meiose, ocorre pareamento somente
da porção representada em amarelo no esquema; por isso, eles são considerados
parcialmente homólogos.
Os genes localizados na região do cromossomo X, representada em
vermelho, são exclusivos do X, não existindo no Y; assim, para os caracteres
condicionados por esses genes, as mulheres possuem dois exemplares do gene,
enquanto os homens apresentam apenas um exemplar do gene, localizado no único
X que eles têm. Esses genes determinam a herança ligada ao X ou herança ligada
ao sexo.
A região do cromossomo Y, representada em azul, contém genes exclusivos
do Y e que serão encontrados somente nos homens. Os genes dessa região
condicionam assim a herança ligada ao Y, herança holândrica ou herança
restrita ao sexo, característica exclusiva dos indivíduos de sexo masculino.
Por fim, as regiões do X e do Y, representadas em amarelo, são homólogas.
Isso quer dizer que tanto o macho quanto a fêmea possuem dois genes para
características determinadas por essa região. Fala-se em herança parcialmente
ligada ao sexo, que é idêntica, quanto aos resultados à herança autossômica.
2. DETERMINAÇÃO GENÉTICA DO SEXO
Existem dois grandes grupos de mecanismos de determinação do sexo em
animais: o grupo que envolve apenas os cromossomos sexuais, do qual fazem parte
os sistemas XY, X0, ZW e Z0, e o grupo que não envolve os cromossomos sexuais,
interferindo nesse caso outros fatores, como os ambientais (temperatura, por
exemplo).
87
2.1. O SISTEMA XY
Em algumas espécies animais, incluindo a humana, a constituição genética
dos indivíduos do sexo masculino é representada por 2AXY e a dos gametas por
eles produzidos, AX e AY; na fêmea, cuja constituição genética é indicada por 2AXX,
produzem-se apenas gametas AX. No homem, a constituição genética é
representada por 44XY e a dos gametas por ele produzidos, 22X e 22Y; na mulher
44XX e os gametas, 22X.
2.2. MECANISMO DE COMPENSAÇÃO DE DOSE
Em 1949, o pesquisador inglês Murray Barr descobriu que há uma diferença
entre os núcleos interfásicos das células masculinas e femininas: na periferia dos
núcleos das células femininas dos mamíferos existe uma massa de cromatina que
não existe nas células masculinas. Essa cromatina possibilita identificar o sexo
Figura 3.3: Representação esquemática
do Sistema XY
Fonte:
http://www.sobiologia.com.br/conteudos
/Genetica/herancaesexo.php
88
celular dos indivíduos pelo simples exame dos núcleos interfásicos: a ela dá-se o
nome de cromatina sexual ou corpúsculo de Barr.
A partir da década de 1960, evidências permitiram que a pesquisadora
inglesa Mary Lyon levantasse a hipótese de que cada corpúsculo de Barr fosse um
cromossomo X que, na célula interfásica, se espirala e se torna inativo, dessa forma
esse corpúsculo cora-se mais intensamente que todos os demais cromossomos,
que se encontram ativos e na forma desespiralada de fios de cromatina.
Segundo a hipótese de Lyon, a inativação atinge ao acaso qualquer um dos
dois cromossomos X da mulher, seja o proveniente do espermatozoide ou do óvulo
dos progenitores. Alguns autores acreditam que a inativação de um cromossomo X
da mulher seria uma forma de igualar a quantidade de genes nos dois sexos. A esse
mecanismo chamam de compensação de dose.
Como a inativação ocorre ao acaso e em uma fase do desenvolvimento na
qual o número de células é relativamente pequeno, é de se esperar que metade das
células de uma mulher tenha ativo o X de origem paterna, enquanto que a outra
metade tenha o X de origem materna em funcionamento. Por isso, diz-se que as
mulheres s~o “mosaicos”, pois – quanto aos cromossomos sexuais apresentam
dois tipos de células.
A determinação do sexo nuclear (presença do corpúsculo de Barr) tem sido
utilizada em jogos olímpicos, quando há dúvidas quanto ao sexo do indivíduo.
89
2.3. O SISTEMA X0
Em algumas espécies, principalmente em insetos, o macho não tem o
cromossomo Y, somente o X; a fêmea continua portadora do par cromossômico
sexual X. Pela ausência do cromossomo sexual Y, chamamos a esse sistema de
sistema X0. As fêmeas são representadas por 2A + XX (homogaméticas) e os
machos 2A + X0 (heterogaméticos).
2.4. O SISTEMA ZW
Em muitas aves (inclusive os nossos conhecidos galos e galinhas),
borboletas e alguns peixes, a composição cromossômica do sexo é oposta à que
acabamos de estudar: o sexo homogamético é o masculino, enquanto as fêmeas são
heterogaméticas. Também a simbologia utilizada, nesse caso, para não causar
confusão com o sistema XY, é diferente: os cromossomos sexuais dos machos são
representados por ZZ, enquanto nas fêmeas os cromossomos sexuais são
representados por ZW.
Figura 3.4: Compare quanto à presença
do corpúsculo de Barr nas células
masculinas (acima) e femininas (abaixo).
Fonte:
http://www.sobiologia.com.br/conteudos/
Genetica/herancaesexo.php
90
2.5. O SISTEMA Z0
Uma variante do ZW é o sistema Z0. As fêmeas continuam sendo o sexo
heterogamético, porém apresentam apenas um cromossomo Z; assim, elas fazem
óvulos com e óvulos sem o cromossomo Z, enquanto os machos sempre produzem
espermatozoides com um cromossomo Z. Esse sistema existe em galinhas
domésticas e em répteis.
2.6. ABELHAS E PARTENOGÊNESE
Nas abelhas, a determinação sexual difere acentuadamente da que até agora
foi estudada. Nesses insetos, o sexo não depende da presença de cromossomos
sexuais, e sim da ploidia. Assim, os machos (zangões) são sempre haploides,
Figura 3.5: Esquema de alguns
casos de determinação do sexo.
Fonte:
http://www.sobiologia.com.br/cont
eudos/Genetica/herancaesexo.php
91
enquanto as fêmeas são diploides. A rainha é a única fêmea fértil da colmeia e, por
meiose, produz centenas de óvulos, muitos dos quais serão fecundados. Óvulos
fecundados originam zigotos que se desenvolvem em fêmeas. Se na fase larval,
essas fêmeas receberem uma alimentação especial, transformar-se-ão em novas
rainhas. Caso contrário, desenvolver-se-ão em operárias, que são estéreis.
Os óvulos não fecundados desenvolvem-se por mitose em machos
haploides. Esse processo é chamado de partenogênese (do grego, partheno =
virgem, gênesis = origem), ou seja, é considerado um processo de desenvolvimento
de óvulos não-fertilizados em indivíduos adultos haploides.
2.7. DETERMINAÇÃO DO SEXO EM PLANTAS
Grande parte das plantas produz flores hermafroditas, que contêm tanto
estruturas reprodutoras masculinas como femininas. Plantas desse tipo são
monoicas (do grego mono, um, e oikos, casa), termo que significa “uma casa para
dois sexos”. Outras espécies têm sexos separados, com plantas que produzem
flores masculinas e plantas que produzem flores femininas. Essas espécies são
denominadas dioicas (do grego di, duas, e oikos, casa), termo que significa “duas
casas, uma para cada sexo”.
92
Nas plantas dióicas, os sexos são determinados de forma semelhante à dos
animais. O espinafre e o cânhamo, por exemplo, têm sistema XY de determinação
do sexo; já o morando segue o sistema ZW.
2.8. ORGANISMOS QUE NÃO TÊM SISTEMA DE DETERMINAÇÃO DO SEXO
Os organismos monoicos (hermafroditas) não apresentam qualquer sistema
de determinação cromossômica ou genética de sexo. Todos os indivíduos da
espécie têm, basicamente, o mesmo cariótipo. Esse é o caso da maioria das plantas
e de animais como minhocas, caramujos e caracóis.
3. HERANÇA LIGADA AO SEXO
Habitualmente, classificam-se os casos de herança relacionada com o sexo
de acordo com a posição ocupada pelos genes, nos cromossomos sexuais. Para
tanto, vamos dividi-los em regiões.
A porção homóloga do cromossomo X possui genes que têm
correspondência com os genes da porção homóloga do cromossomo Y. Portanto, há
genes alelos entre X e Y, nessas regiões. Os genes da porção heteróloga do
cromossomo X não encontram correspondência com os genes da porção
heteróloga do cromossomo Y. Logo, não há genes alelos nessas regiões, quando um
cromossomo X se emparelha com um cromossomo Y.
93
Herança ligada ao sexo é aquela determinada por genes localizados na
região heteróloga do cromossomo X. Como as mulheres possuem dois
cromossomos X, elas têm duas dessas regiões. Já os homens, como possuem apenas
um cromossomo X (pois são XY), têm apenas um de cada gene. Um gene recessivo
presente no cromossomo X de um homem irá se manifestar, uma vez que não há
um alelo dominante que impeça a sua expressão.
O fato de a mulher apresentar dois cromossomos X permite concluir que
ela é sempre portadora de genes ligados ao sexo em dose dupla, formando pares de
alelos. Já o homem, por apresentar apenas um cromossomo X, tem esses genes
sempre em dose simples. No que se refere a esses caracteres ligados ao sexo,
costuma-se dizer que a mulher pode ser homozigota ou heterozigota, enquanto o
homem será sempre hemizigoto.
Nos humanos, os principais exemplos de herança ligada ao sexo são:
3.1. DALTONISMO
O daltonismo tem esse nome por ter sido descrito por John Dalton,
consagrado químico inglês, nascido em 1776 e falecido em 1844. Em 1794, ele
descreveu a cegueira parcial para cores, usando o seu próprio exemplo e o de seu
irmão, ambos daltônicos.
Trata-se da incapacidade relativa na distinção de certas cores que, na sua
forma clássica, geralmente cria confusão entre o verde e o vermelho. É um
distúrbio causado por um gene recessivo localizado na porção heteróloga do
cromossomo X, o gene Xd, enquanto o seu alelo dominante XD determina a visão
normal.
A mulher de genótipo XDXd, embora possua um gene para o daltonismo, não
manifesta a doença, pois se trata de um gene recessivo. Ela é chamada de
portadora do gene para o daltonismo. O homem de genótipo XdY, apesar de ter o
gene Xd em dose simples, manifesta a doença pela ausência do alelo dominante
capaz de impedir a expressão do gene recessivo.
94
O homem XdY não é nem homozigoto ou heterozigoto: é hemizigoto
recessivo, pois do par de genes ele só possui um. O homem de genótipo XDY é
hemizigoto dominante.
Se você consegue distinguir perfeitamente o número 74 entre as bolinhas
da figura acima, então você não é daltônico.
3.2. HEMOFILIA
É um distúrbio da coagulação sanguínea, em que falta o fator VIII, uma das
proteínas envolvidas no processo, encontrado no plasma das pessoas normais. As
pessoas hemofílicas têm uma tendência a apresentarem hemorragias graves
depois de traumatismos banais, como um pequeno ferimento ou uma extração
dentária. O tratamento da hemofilia consiste na administração do fator VIII
purificado, ou de derivados de sangue em que ele pode ser encontrado
(transfusões de sangue ou de plasma). Pelo uso frequente de sangue e de
derivados, os pacientes hemofílicos apresentam uma elevada incidência de AIDS e
de hepatite tipo B, doenças transmitidas através dessas vias.
A hemofilia atinge cerca de 300.000 pessoas. È condicionada por um gene
recessivo, representado por h, localizado no cromossomo X. É pouco frequente o
nascimento de mulheres hemofílicas, já que a mulher, para apresentar a doença,
95
deve ser descendente de um hímen doente (XhY) e de uma mulher portadora
(XHXh) ou hemofílica (XhXh). Como esse tipo de cruzamento é extremamente raro,
acredita-se que praticamente inexistiriam mulheres hemofílicas. No entanto, já
foram relatados casos de hemofílicas, contrariando assim a noção popular de que
essas mulheres morreriam por hemorragia, após a primeira menstruação (a
interrupção do fluxo menstrual deve-se à contração dos vasos sanguíneos do
endométrio, e não à coagulação do sangue).
Figura 3.6: Hemofilia – dois possíveis tipos de casamento, A e B. Fonte: César e
Sezar, 2005.
96
3.3. HERANÇA LIGADA AO SEXO EM DROSÓFILA
Em 1910, Morgan estudou um macho de drosófila portador de olho branco,
originado de uma mutação do olho selvagem, que tem cor marrom avermelhada. O
cruzamento desse macho de olho branco (white) com fêmeas de olho selvagem
originou, na geração F1, apenas descendentes de olho selvagem. O cruzamento de
machos e fêmeas da geração F1 resultou em uma geração F2 constituída por fêmeas
de olho selvagem, machos de olho selvagem e machos de olho branco. A proporção
de moscas de olho selvagem e moscas de olho branco foi de aproximadamente 3:1,
o que permitiu concluir que a característica olho branco era hereditária e
recessiva.
Morgan voltou sua atenção para o fato de não ter nascido nenhuma fêmea
de olho branco na geração F2. Isso indicava que a característica em questão tinha
alguma relação com o sexo dos indivíduos. Na sequência dos experimentos,
Morgan cruzou machos de olho branco com as suas próprias filhas, que eram
heterozigotas em relação à cor do olho. Desse cruzamento, surgiram fêmeas e
machos de olho selvagem, e fêmeas e machos de olho branco, na proporção 1:1:1:1.
Esse resultado mostrou que o caráter olho branco podia aparecer também nas
fêmeas. Como explicar, então, a ausência de fêmeas de olho branco na geração F2
do primeiro cruzamento?
Em 1911, Morgan concluiu que os resultados dos cruzamentos envolvendo
o loco da cor do olho, em drosófila, podiam ser explicados admitindo-se que ele
estivesse localizado no cromossomo X. O macho de olho branco original teria
fornecido seu cromossomo X, portador do alelo recessivo mutante w (Xw), a todas
as filhas que receberam seu outro cromossomo X das mães, portadoras do alelo
selvagem W (XW). As fêmeas da geração F1 seriam, portanto, heterozigotas XWXw.
Já os machos de F1 receberam o cromossomo X das fêmeas selvagens puras (XW).
Sua constituição gênica seria, portanto, XWY.
A hipótese de Morgan foi confirmada pela análise de outros genes de
drosófila, cuja herança seguia o mesmo padrão. Além disso, permitiu também
explicar a herança de genes relacionados com o sexo em outras espécies.
97
Figura 3.7: Esquema de herança ligada ao sexo em drosófila. Fonte:
http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/herancaesexo.php
98
4. HERANÇA RESTRITA AO SEXO
O cromossomo Y possui alguns genes que lhe são exclusivos, na porção
encurvada que não é homóloga ao X. Esses genes, também conhecidos como genes
holândricos, caracterizam a chamada herança restrita ao sexo.
Não há duvidas de que a masculinização está ligada ao cromossomo Y. Um
gene que tem um papel importante nesse fato é o TDF (iniciais de testis-
determining factor), também chamado de SRY (iniciais de sex-determining region
of Y chromossome), que codifica o fator determinante de testículos. O gene TDF já
foi identificado e está localizado na região não-homóloga do cromossomo Y.
Tradicionalmente, a hipertricose, ou seja, presença de pelos no pavilhão
auditivo dos homens, era citada como um exemplo de herança restrita ao sexo. No
entanto, a evidência de que a hipertricose deve-se a uma herança ligada ao Y está
sendo considerada inconclusiva, pois, em algumas famílias estudadas, os pais com
hiperticose tiveram filhos homens com e sem pelos nas bordas das orelhas.
Na herança restrita ao sexo verdadeira: Todo homem afetado é filho de
um homem também afetado; todos os seus filhos serão afetados, e as filhas
serão normais.
5. HERANÇA INFLUENCIADA PELO SEXO
Nessa categoria, incluem-se as características determinadas por genes
localizados nos cromossomos autossomos cuja expressão é, de alguma forma,
influenciada pelo sexo do portador. Nesse grupo, há diversas modalidades de
herança, das quais ressaltaremos a mais conhecida, a dominância influenciada
pelo sexo, herança em que, dentro do par de genes autossômicos, um deles é
dominante nos homens e recessivo nas mulheres, e o inverso ocorre com o seu
alelo. Na espécie humana, temos o caso da calvície.
99
Genótipos Fenótipos
Homem Mulher
CC Calvo Calva
CC’ Calvo Não-calva
C’C’ Não-calvo Não-calva
Outras formas de herança autossômica influenciada pelo sexo são a
penetrância influenciada pelo sexo e a expressividade influenciada pelo sexo.
Na espécie humana, a ocorrência de más formações de vias urinárias apresenta
uma penetrância muito maior entre os homens do que entre as mulheres. Elas,
portanto, ainda que possuam o genótipo causador da anormalidade, podem não vir
a manifestá-la. A expressividade também pode ser influenciada pelo sexo. Um
exemplo bem conhecido é o do lábio leporino, falha de fechamento dos lábios.
Entre os meninos, a doença assume intensidade maior que nas meninas, nas quais
os defeitos geralmente são mais discretos.
Basicamente, há duas evidências que permitem suspeitar de um caso de
herança relacionada com o sexo:
1. quando o cruzamento de um macho afetado com uma fêmea não afetada
gera uma descendência diferente do cruzamento entre um macho não
afetado com uma fêmea afetada;
2. quando a proporção fenotípica entre os descendentes do sexo masculino
forem nitidamente diferentes da proporção nos descendentes do sexo
feminino.
100
GENÉTICA DE TRANSMISSÃO: LIGAÇÃO E MAPAS GENÉTICOS
101
LIGAÇÃO, CROSSING-OVER E MAPEAMENTO GENÉTICO EM EUCARIONTES
INTRODUÇÃO
Neste capítulo, vamos falar um pouco de características genéticas, onde a 2ª
lei de Mendel ou lei da segregação independente não pode ser aplicada.
Como já vimos anteriormente, apesar de algumas características não
apresentarem as proporções mendelianas do di-hibridismo (interação gênica), os
pares de alelos que compõem essas características segregam-se, na hora de formar
os gametas, de forma independente. Isso acontece porque esses pares de alelos se
encontram em pares de cromossomo homólogos distintos, quando ocorre a
meiose, processo de formação de gametas. Na realidade, os pares de cromossomos
homólogos distintos é que se separam de forma independente levando junto os
alelos que neles estão distribuídos. Porém cada par de cromossomos
homólogos possui uma grande quantidade de genes e esses genes na hora de
formar os gametas vão juntos com os cromossomos homólogos, como se fosse uma
única unidade (fig.4.1).
Figura 4.1: Representação esquemática da meiose. No lado direito, distribuição independente:
dois genes em dois pares de cromossomos homólogos diferentes. No lado esquerdo, ligação:
dois genes em um único par de homólogos; sem ocorrência de troca ou crossing-over. Fonte:
Klug et. al., 2010.
102
1. LIGAÇÃO, RECOMBINAÇÃO E CROSSING-OVER
Sutton e Boveri foram os primeiros, em 1903, a levantar a hipótese de que
cada cromossomo era constituído por mais de um gene ou “fator heredit|rio” e que
esses cromossomos no momento de formar os gametas levavam junto os genes.
Então, se os dois pares de alelos que determinam duas características distintas se
encontrarem em um mesmo par de cromossomos homólogos, esses alelos, na hora
da formação dos gametas, irão juntos no mesmo cromossomo, não segregando
independentemente.
Pares de alelos que determinam características diferentes, mas se
encontram em um mesmo par de cromossomos homólogos são ditos em ligação
ou denominados genes ligados.
Morgan e colaboradores foram os primeiros a demonstrarem que o
cromossomo X em Drosophila possuía vários genes. Em seus estudos, foi o
descobridor do fenômeno de ligação no cromossomo X, investigando numerosas
mutações de Drosophila, localizadas nesse cromossomo. Inicialmente, seus
cruzamentos levavam em consideração uma única característica, mas quando
começou a fazer cruzamentos experimentais, considerando duas características
ligadas ao cromossomo X, percebeu que os resultados obtidos em F2 eram bem
diferentes daqueles obtidos, quando ocorria segregação independente, mas
também não era um resultado esperado para genes que estavam em um mesmo
cromossomo. Se os genes estavam localizados em um mesmo cromossomo,
deveriam ser transmitidos juntos e como consequência só seriam formados dois
tipos de gametas, os semelhantes aos parentais. (Cada par de homólogos tem um
cromossomo de origem materna e um de origem paterna, por isso, gametas que
contêm um desses cromossomos são ditos parentais).
Morgan estudou inicialmente as características: cor do corpo (amarelo e
cinza) e cor dos olhos (brancos e vermelhos), ao cruzar uma fêmea mutante de
olhos vermelhos e corpo amarelo, (XbaXba) com um macho selvagem, olhos
vermelhos e corpo cinza (XBAY), obteve em F1 todo as fêmeas de olhos vermelhos e
corpo cinza (XBAXba) e todos os machos de olhos brancos e corpo cinza (XbaY). Ao
103
realizar o cruzamento das fêmeas F1 (XBAXba) com machos F1 (XbaY) a grande
maioria da prole em F2 mostrava o fenótipo parental, olhos vermelhos e corpo
cinza e olhos brancos e corpo amarelo, mas menos de 1% do total de moscas
nasceram com os olhos brancos e corpo cinza e olhos vermelhos e corpo amarelo
(tendo sido chamados de recombinantes por apresentarem uma mistura dos
fenótipos parentais). Depois desses resultados, Morgan e colaboradores realizaram
outros cruzamentos com genes ligados ao X, observando sempre o mesmo padrão
básico, ou seja, uma proporção fenotípica parental alta e uma proporção de
recombinantes baixa, mas sem um padrão definido com relação às proporções
fenotípicas (fig. 4.2).
104
Figura 4.2: Resultados de F1 e F2 do
cruzamento A que envolve as
mutações amarelo (a) e branco (b)
com o tipo selvagem , dados como
foram compilados por Sturtevant.
No cruzamento A, 0,5% das moscas
de F2 (machos e fêmeas)
demonstram fenótipos
recombinantes. Fonte: Klug et.al.,
2010.
105
As questões levantadas após esses resultados foram: O que leva a formação
dos recombinantes? E por que eles aparecem em cada cruzamento em uma
proporção diferente? Baseados em indícios citogenéticos, do pareamento dos
cromossomos homólogos na prófase I da meiose, observados por Janssens e
outros, e do enrolamento entre esses homólogos e surgimento de
quiasmas(fig.4.3) interseções em forma de X, cujos pontos de sobreposição são
evidentes, Morgan propôs que esses quiasmas poderiam representar os pontos de
trocas genéticas (crossing-over). Logo, os recombinantes que surgem são
resultados dessa troca física “de pedaços” entre crom|tides homólogas.
A segunda pergunta foi explicada por Morgan da seguinte forma: se dois
genes estão muito próximos um do outro, terão menos espaço físico entre eles para
permitir quebra e troca de pedaços (crossing-over), assim a possibilidade do
surgimento de recombinantes será menor, ou até não haverá recombinantes;
entretanto se os genes estão mais distantes terão mais espaço físico entre eles e
uma maior chance de que ocorra quebra e crossing-over ou permuta, originando
uma maior possibilidade de recombinantes. (fig.4.4)
Figura 4.3: Foto onde aparecem vários
quiasmas. Tiradas durante meiose em
testículos de gafanhotos. (John
Cabisco/Visuais Unlimited). Fonte:
Griffiths et. al.,2009
106
Dessa forma Sturtevant, colaborador de Morgan, fez o primeiro mapa
genético, do cromossomo X, tomando como base a taxa de recombinação ou de
crossing-over entre os genes. A distância relativa entre os genes é dada pela taxa de
crossing-over ou permuta entre eles.
Outro exemplo de genes ligados estudados por Morgan foi o que afetava a
cor dos olhos (pr, púrpura, e pr+, vermelho) e o tamanho da asa (vg, vestigial, e
vg+, normal) em Drosophila. Como essas características são autossômicas, não foi
necessária a representação dos cromossomos sexuais. Os alelos selvagens pr+ e
vg+ são dominantes e Morgan realizou cruzamentos para obter di-híbridos e
cruzá-los com um duplo recessivo (cruzamento teste). O cruzamento teste é
importante, pois o genitor testador contribui com gametas levando apenas os
alelos recessivos, os fenótipos da prole revelam diretamente os alelos contribuídos
pelos gametas di-híbridos. Assim, a análise pode se concentrar na meiose em um
genitor (o di-híbrido) e, essencialmente esquecer a meiose no outro (o testador).
Em contraste, em um F1 autofecundado, existem dois conjuntos de meiose a
considerar na análise da prole: um no genitor masculino e um no feminino.
Figura 4.4: Dois exemplos de uma
permutação única entre duas cromátides
não irmãs e dos gametas produzidos
subsequentemente. Em (a) a troca não
altera o arranjo de ligação entre os alelos
dos dois genes; formam-se somente
gametas parentais e a troca não é
detectada. Em (b) a troca separa os
alelos, resultando em gametas
recombinantes, que são detectáveis.
Fonte: Klug et. al., 2010.
107
Os cruzamentos de Morgan estão representados a seguir: (existem várias
notações usadas para representar os genes ligados algumas delas são aqui
apresentadas: pr+ vg+/ pr vg ou pr+ vg+//pr vg.)
Obviamente, esses números desviam-se drasticamente da previsão
mendeliana de uma proporção 1:1:1:1. As duas primeiras combinações de alelos
est~o em grande maioria indicando claramente que est~o associadas ou “ligadas”. E
descendem dos gametas parentais. Os que aparecem em menor quantidade (3ª e
4ª combinações) são resultantes da quebra e troca de pedaços (crossing-over) e
são ditos recombinantes.
P pr vg/ pr vg X pr+ vg+/ pr+ vg+
Gametas pr vg pr+ vg+
Di-híbrido de F1 pr+ vg+/ pr vg
Cruzamento
Teste
pr+ vg+/ pr vg X pr vg/ pr vg
Gametas
pr vg
1ª pr+ vg+ pr+ vg+/ pr vg 1339
2ª pr vg pr vg / pr vg 1195
3ª pr+ vg pr+ vg/ pr vg 151
4ª pr vg+ pr vg+/ pr vg 154
2839
108
2. COMO CALCULAR A TAXA DE CROSSING-OVER OU PERMUTA
Considerando os dados do cruzamento teste acima, feito por Morgan,
podemos calcular a taxa de crossing-over entre os genes pr+ e vg+. O primeiro
passo é identificar quais os fenótipos que resultam de gametas recombinantes no
di-híbrido, no caso, os que aparecem em menor número. Nesse exemplo formaram-
se dois fenótipos recombinantes o que tem 151 descendentes (pr+ vg/ pr vg) e o
que tem 154 (pr vg+/ pr vg) descendentes no total de: 151 + 154 = 305
descendentes recombinantes. O segundo passo é calcular a frequência de
recombinação, que será o número total de recombinantes dividido pelo número
total de descendentes: 305 / 2839 ≈ 0,11. Multiplicando-se essa frequência por
100, teremos a taxa de crossing-over ou permuta igual a 11%.
As frequências de recombinantes para diferentes genes ligados variam de O
a 50%, dependendo de sua proximidade. Quanto mais distantes estão os genes,
mais proximamente suas frequências de recombinantes aproximam-se de 50%,e,
em tais casos, não podemos decidir se os genes estão ligados ou estão em
cromossomos diferentes.
Um único crossing gera dois produtos recombinantes recíprocos, o que
explica por que as classes recombinantes são, em geral, aproximadamente iguais
em frequência. E, por conseguinte, os parentais também devem ter iguais
frequências.
3. OS ARRANJOS “CIS” E “TRANS” DOS GENES LIGADOS
O trabalho de Morgan mostrou que os genes ligados em um di-híbrido
podem estar presentes em duas conformações básicas. Em uma, os dois alelos
dominantes ou selvagens se encontram em um cromossomo; e os dois alelos
recessivos ou mutantes, no outro. Esse arranjo é chamado conformação cis. Na
outra, eles estão em homólogos diferentes. Esse arranjo é chamado conformação
trans. (fig. 4.5)
109
A identificação, se os dois genes ligados estão em posição cis ou trans, pode
ser feita analisando nos descendentes de um cruzamento teste (fig.4.6 a e b).
Figura 4.5: Representação
esquemática de duas células uma em
conformação cis e outra em
conformação trans.
Cruzamento
teste
A B / a b X a b / a b
Gametas masculinos
a b
A B A B/a b 40% Parentais
Gametas a b a b/a b 40%
Femininos A b A b/a b 10% Recombinantes
a B a B/ab 10%
Figura 4.6a: Representação de um cruzamento teste, onde os parentais encontram-se
em conformação cis.
110
3. CONSTRUINDO MAPAS GENÉTICOS POR FREQUÊNCIA DE RECOMBINAÇÃO
3.1. TESTE DE DOIS PONTOS
Como já havíamos falado, quanto maior a distância física entre dois genes,
maior a possibilidade de quebra e troca de pedaços entre os cromossomos e,
consequentemente, maior a possibilidade de gametas recombinantes. Já quando
dois genes estão muito próximos, a taxa de recombinação entre eles é quase zero e
não teremos recombinantes. A distância entre dois genes é diretamente
proporcional à taxa de recombinação ou crossing-over, logo, como a taxa de
crossing entre os genes pr+ e vg+ é igual a ≈ 11%, a dist}ncia entre os genes pr+ e
vg+ é igual a 11 UR( ou unidades de recombinação). Outra unidade usada para
expressar a distância entre dois genes é o centimorgan ou morganídeo e a
unidade de mapa genético u.m.. Cada u.m., UR ou cM ou morganídeo
corresponde a 1% da taxa de recombinação.
Esse método produz um mapa linear correspondente à linearidade
cromossômica?
Cruzamento
teste
A b / a B X a b / a b
Gametas masculinos
a b
A b A b/a b 40% Parentais
Gametas a B a B/a b 40%
Femininos A B A B/a b 10% Recombinantes
a b a b/ab 10%
Figura 4.6b: Representação de um cruzamento teste, onde os parentais encontram-se
em conformação trans.
111
Sturtevant previu que, em um mapa linear, se 5 UR. separam os genes A e ,
B, enquanto 3UR. separam A e C, então a distância que separa B e C deve ser de
8UR. ou 2UR.. Sturtevant viu que sua previsão era correta. Em outras palavras, sua
análise sugeriu fortemente que os genes estão dispostos em alguma ordem linear,
tornando as distâncias aditivas. A representação gráfica de um mapa é mostrada na
figura 4.7:
Logo, para se poder construir o mapa gênico entre os genes A, B e C usando
o teste de dois pontos (determinação da distância usando um cruzamento teste
com um di-híbrido) seria necessário o conhecimento também da distância (= taxa
de recombinação entre os genes) entre os genes B e C. Caso a distância entre os
genes B e C fosse de 8UR a sequência dos genes seria CAB caso a freqüência entre B
e C fosse de 2UR teríamos a sequência de ACB.
Figura 4.7: Uma região
cromossômica contendo três genes
ligados. Como as distâncias de
mapa são aditivas, o cálculo das
distâncias A—B e A-C nos deixa
com duas possibilidades
mostradas para a distância B-C.
Fonte: Griffiths et. al.,2009
112
3.2. TESTE DE TRÊS PONTOS
Quando o mapeamento é feito levando-se em conta as taxas de
recombinação em um cruzamento teste com um tri-híbrido, chamamos esse teste
de três pontos.
Vamos calcular a distância e a sequência de 3 genes usando como exemplo o
experimento feito por Bridges e Olbrycht., que cruzaram machos tipo selvagem de
Drosophila com fêmeas homozigotas para três mutações recessivas - cerdas scute
(sc), olhos echinus (ec) e asas crossveinless (cv). Em F1, nasceram fêmeas
heterozigotas para as três características, (elas herdaram um cromossomo X do
macho com as três características selvagem e um dos cromossomos X da fêmea
com as três características mutantes recessivas) e machos hemizigotos recessivos
(na herança ligada ao cromossomo X o macho só herda um cromossomo X, o da
fêmea, nesse caso, recessiva para as três características). Assim o entrecruzamento
entre machos e fêmeas F1 equivale a um cruzamento teste.
Entrecruzando fêmeas F1 com machos F1 obtiveram em F2 oito tipos de
fenótipos diferentes, todos expressando os gametas produzidos pela fêmea, sendo
dois deles semelhantes aos fenótipos parentais e seis deles recombinantes. Os
parentais como sempre aparecem em uma proporção bem maior. Os
recombinantes em uma proporção bem menor, cada um representando um tipo
diferente de cromossomo com crossing. (fig.4.8)
Para entender quais crossings estavam envolvidos na produção de cada tipo
de recombinante, devemos primeiro determinar como os genes são ordenados no
cromossomo.
113
3.2.1. DETERMINAÇÃO DA ORDEM DE GENES
Existem três possíveis ordens de genes:
1. sc—ec—cv
2. ec—sc—cv
3. ec—cv—sc
Outras possibilidades, tais como cv – ev – sc, são as mesmas que uma dessas, pois
as pontas esquerda e direita do cromossomo não podem ser distinguidas. Então,
como determinar a ordem?
A sequência dos procedimentos é o seguinte:
1º. definimos os recombinantes; que são seis, 4 com maior
freqüência e 2 com menor freqüência;
2º. definimos os que apresentam crossing duplo; no caso, os que
aparecem com menor frequência, já que é necessário que
Figura 4.8: Cruzamento de três
pontos de Bridges e Olbrycht com os
genes ligados ao X sc (cerdas scute),
ec (olhos echinus) e cv (asas
crossveinless) em Drosophila. Fonte:
Snustad, D.Peter; Simmons, Michael
J.,2008.
114
ocorram dois crossing ao mesmo tempo, o que resulta na
probabilidade de ocorrer o 1° e o 2º(P(1º) x P(2º));
3º. observamos nos duplos recombinantes, qual dos três genes
apresenta uma mudança em relação aos parentais; por exemplo:
os parentais são, nesse caso, sc ec cv e o outro sc+ ec+ cv+ , os
duplos recombinantes, sc ec+ cv e o outro sc+ ec cv+, o gene nos
recombinantes que mudou de lugar em relação aos parentais foi
o gene ec+, logo, o gene do meio é o ec+;
4º. a ordem correta do gene é sc ec cv.
3.2.2. Calculando a distância
Tendo estabelecido a ordem dos genes, podemos agora calcular as
distâncias entre os genes adjacentes (fig.4.10).
1st. Escolhemos dois genes adjacentes, sc e ec e identificamos as
classes recombinantes entre eles. (sc ec+ cv+), (sc+ ec cv), (sc ec+
cv) e (sc+ ec cv+).
2º. Somamos os números de descendentes de cada fenótipo
recombinante selecionado e dividimos pelo número total de
descendentes achando assim a frequência de recombinação
entre os dois genes(163+130+1+1=295)/ 3248=0,091).
3º. Achada a frequência, multiplicamos por 100 para achar a
distância entre os dois genes. (0,091x100= 9,1centiMorgan).
4º. O mesmo processo é repetido entre os genes ec e cv e achamos a
frequência de 0,105 que multiplicado por 100 dá uma distância
de 10,5 centiMorgan(cM).
A distância entre os dois genes extremos, sc cv , pode ser calculada
somando-se as distâncias entre cada um dos pares adjacentes: 9,1+10,5=19,6cM.
Dessa forma, o mapa pode ser assim representado (fig. 4.9):
115
Figura 4.10: Cálculo das distâncias de mapa genético dos dados de Bridges e Olbrycht. A distância entre
cada par de genes é obtida estimando-se o número médio de crossings.Fonte: Snustad, D.Peter; Simmons,
Michael J.,2008.
Também podemos obter esta estimativa calculando o número médio de
crossings entre estes genes:
Parentais: (1158+1455)= 2613/3248=0,805
Recombinantes com 1 só crossing:163+130+192+148= 633/3248=0,195 x
(1) = 0,195.
Recombinantes com 2 crossing: 1+1= 2/3248= 0,0006 x (2)= 0,0012.
Logo: parentais +recombinantes com 1 crossing + recombinantes com 2
crossing = 0,196
Figura 4.9: Mapa de Bridges e
Olbrycht de sete genes ligados ao X
em Drosophila. As distâncias são
dadas em centiMorgans. Incluindo a
representação dos três genes
calculados no problema. Fonte:
Snustad, D.Peter; Simmons, Michael
J.,2008.
116
3.2.3. INTERFERÊNCIA E COEFICIENTE DE COINCIDÊNCIA
Um teste de três pontos tem uma vantagem importante em relação a um
teste de dois pontos: ele permite a detecção de crossings duplos, permitindo-nos
determinar se as trocas em regiões adjacentes são independentes umas das outras.
Por exemplo, um crossing na região entre sc e ec ocorre independentemente de
um crossing na região entre ec e cv ? Ou um crossing inibe a ocorrência de outro
próximo?
Para responder a tais perguntas, devemos calcular a frequência esperada de
crossings duplos, com base na ideia de independência. Podemos fazer isso
multiplicando as frequências de crossing de duas regiões cromossômicas
adjacentes. Por exemplo, entre os genes sc e ec no mapa de Bridges e Olbrycht, a
frequência de crossing era (163 + 130 + 1 + 1)/3.248 = 0,091, e, entre ec e cv , ela
era (192 + 148 + 1 + 1)/3.248 = 0,105. Se for suposta independência (aplica-se a
regra do produto das probabilidades), a frequência esperada de crossings duplos
no intervalo entre sc e cv seria portanto de 0,09 1 x 0,105 = 0,0095. Podemos agora
comparar essa frequência com a frequência observada, que foi de 2/3.248 =
0,0006. Crossings duplos entre sc e cv foram muito menos frequentes do que o
esperado. Esse resultado sugere que um crossing inibiu a ocorrência de outro
próximo, um fenômeno chamado interferência. A intensidade da interferência
geralmente é medida pelo coeficiente de coincidência, c, que é a proporção entre a
frequência observada de crossings duplos e a frequência esperada:
c = Frequência observada de crossings duplos/ frequência esperada de
crossings duplos = 0,0006 / 0,0095 = 0,063
O nível de interferência, simbolizado por I, é calculado como
I = 1 - c = 1 – 0,063 = 0,937.
Como nesse exemplo o coeficiente de coincidência é próximo de zero, seu
menor valor possível, a interferência foi muito forte (I é próximo de 1). No outro
extremo, um coeficiente de coincidência igual a um significaria nenhuma
interferência; isto é, significaria que os crossings ocorreram independentemente
uns dos outros.
117
Muitos estudos mostraram que a interferência é forte em distâncias de mapa
menores que 20 cM; assim, crossings duplos raramente ocorrem em curtas regiões
cromossômicas. Entretanto, em regiões grandes, a interferência enfraquece a
ponto de crossings ocorrerem mais ou menos independentemente. A força da
interferência é, portanto, uma função da distância de mapa.
118
GENÉTICA MOLECULAR: ESTRUTURAS DOS ÁCIDOS
NUCLEICOS
119
ESTRUTURA DOS ÁCIDOS NUCLEICOS
INTRODUÇÃO
Vimos que diversos genes estão distribuídos ao longo das moléculas de DNA
que constituem os cromossomos de um organismo. Cada cromossomo é, por sua
vez, formado por uma única molécula de DNA, associada a proteínas. Assim, a
molécula de DNA é a resposta do enigma da vida! Iremos, neste capítulo, estudar a
estrutura dos ácidos nucleicos buscando compreender como moléculas químicas
guardam informações biológicas tão valiosas.
1. ÁCIDOS NUCLEICOS
Em 1869, o pesquisador Johann Friedrich Miescher isolou, pela primeira
vez, do núcleo de células, moléculas grandes que chamou de nucleínas.
Posteriormente, comprovada a natureza ácida das nucleínas ,estas passaram a ser
denominadas ácidos nucleicos.
No início do século XX, foram identificados dois tipos de ácidos nucleicos: o
ácido desoxirribonucleico (DNA) - presente apenas nos núcleos das células - e o
ácido ribonucleico (RNA) – encontrado tanto no núcleo
como no citoplasma. Em 1912, Phoebus Levine e
Walter Jacobs concluíram que o componente básico dos
ácidos nucleicos eram polímeros de nucleotídeos que,
por si só, são moléculas complexas formadas por: um
açúcar; uma base e um ácido fosfórico.
Figura 5.1: Johann Friedrich Miescher (1844-1895).
Fonte: http://www.fml.tuebingen.mpg.de/fml/miescher.htm/
120
1.1. NUCLEOTÍDEO
Os nucleotídeos são unidades básicas formadoras dos ácidos nucleicos. No
DNA, o açúcar do nucleotídeo é uma pentose denominada 2’desoxirribose. A
denominaç~o 2’desoxirribose indica que a estrutura padr~o da ribose foi alterada
através da substituição do grupamento hidroxila (-OH) ligado ao átomo de carbono
2’ por um hidrogênio (-H). Assim, no RNA, o açúcar é uma ribose.
É importante saber que a numeração dos carbonos é utilizada para indicar
quais posições no açúcar, outros componentes do nucleotídeo são ligados. Os
números s~o chamados de “um linha”, “dois linha” e assim por diante, para
distinguir os átomos de carbono no açúcar dos átomos de carbono e nitrogênio na
base nitrogenada.
Figura 5.2: Estrutura da ribose presente no RNA
e desoxiribose presente no DNA.
Fonte:http://medicina.med.up.pt/bcm/trabalhos/2
005/Interac%87%C6o%20DNA%20prot/DNA.htm
121
As bases nitrogenadas são estruturas de anel simples - pirimidina - ou
duplo, - purina - ligadas ao carbono 1’ do açúcar. No DNA, as purinas, adenina (A) e
guanina (G) e as pirimidinas, citosina (C) e timina (T), podem ser ligadas nessa
posição. Quando uma das bases está ligada à ribose, o nucleosídeo resultante
reflete o nome da base.
Os nucleosídeos são formados quando uma base se liga a um açúcar. Este,
por sua vez, é convertido a nucleotídeo através da ligação de um grupamento ácido
fosfórico ao carbono 5’ do açúcar. Até três grupamentos fosfato independentes
podem ser ligados por meio da ligação anidro, rica em energia.
Além de serem os blocos de construção doa ácidos nucleicos, os
nucleotídeos desempenham funções, como: molécula energética (ATP, GTP, etc.),
coenzima (coenzima A, nicotinamina adenina de nucleotídeo (NAD+) e a flavina
Figura 5.3: Estrutura dos quatro nucleotídeos do DNA.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
122
mononucleotídeo (FMN) e na transmissão de sinais químicos como segundo
mensageiros.
Figura 5.4: Representação esquemática da função do cAMP (Adenosina Monofosfato
cíclica) como segundo mensageiro. Fonte: Ucko, 1992.
123
1.2. POLINUCLEOTÍDIOS
Para que os nucleotídeos formem um ácido nucleico, ou polinucleotídeo,
forma-se uma ligaç~o diéster fosfato entre o carbono 3’ de um nucleotídeo com o
carbono 5’ de outro. O RNA na célula normalmente consiste de uma cadeia
polinucleotídica única formada por açúcares interligados a grupos fosfato com
diferentes bases emergindo da cadeia.
Uma descoberta importante para a elucidação da organização estrutural do
DNA é o fato de que ela não existe como uma cadeia única, mas como cadeias
duplas complementares, ligadas entre si por ligações de hidrogênio entre bases
complementares. As bases púricas e pirimídicas de cada cadeia polinucleotídica
localizam-se dentro da dupla hélice, em planos paralelos entre si, e
perpendiculares ao eixo da hélice. Devido a sua forma molecular das bases
Figura 5.5: Representação esquemática da função do cAMP (Adenosina
Monofosfato cíclica) como segundo mensageiro. Fonte: Ucko, 1992.
124
nitrogenadas, a adenina pode interagir somente com a timina (ou uracila) e a
guanina interage apenas com a citosina, constituindo assim o pareamento de
bases. Dessa forma, se a sequência de pares de bases de um filamento for
conhecida, automaticamente se conhece a outra.
Figura 5.6: Modelo simplificado da estrutura helicoidal do DNA. (a) Os bastões representam pares de bases, e as fitas representam os arcabouços açúcar-fosfato das duas cadeias de polaridade inversa. (b) Um diagrama químico preciso da dupla hélice de DNA, desenrolado para mostrar os arcabouços açúcar-fosfato (azul) e degraus de pares de bases. Os arcabouços correm em sentidos opostos; as pontas 5’ e 3’ são
denominadas pela orientação dos átomos de carbono 5’ e 3’ dos anéis de açúcar. Cada par de bases tem uma base purina, adenina (A) ou guanina (G), e uma base pirimidínica,
timina (T) ou citosina (C), conectadas por ligações de hidrogênio (linhas tracejadas).
Fonte: Griffiths et al., 2008.
125
As duas fitas da hélice de DNA ocorrem em sentido antiparelelo e se
enrolam em forma de uma hélice dextro-orientada, isto é, se as ligações diéster
fosfato v~o do carbono 5’ de um nucleotídeo ao 3’ do nucleotídeo seguinte (5’ 3’)
na primeira fita, v~o de 3’ a 5’ (3’ 5’) na outra cadeia. Em consequência disso, em
cada extremidade da molécula, uma das cadeias polinucleotídica termina em 3’ e a
outra em 5’.
A distância entre as bases em uma molécula de DNA é de 0,34 nm, e cada
volta completa da hélice contém 10 nucleotídeos. A dupla hélice é estabilizada por
interações hidrofóbicas entre os anéis aromáticos planos das bases, que estão
orientados no centro da hélice. Nessa estrutura, a desoxirribose e o ácido fosfórico
localizam-se na periferia da molécula em contato com a água intracelular. Os
grupos fosfóricos, com carga negativa, permitem a interação do DNA com
proteínas básicas e outras moléculas eletricamente positivas.
Figura 5.7: Diferentes representações da dupla hélice de DNA. O diagrama em fita
(a) destaca o empilhamento de pares de bases, enquanto o modelo compactado
(b) mostra os sulcos maior e menor. Fonte: Griffiths et al., 2008.
126
A hélice pode ser desnaturada pelo calor, alterações no pH ou por agentes
químicos como a ureia e a formamida. A desnaturação pelo rompimento da ligação
de hidrogênio ocorre inicialmente nas ligações A-T, sendo as ligações C-G mais
resistentes, por estarem unidas por três ligações de hidrogênio.
Devido ao tamanho e complexidade da molécula de DNA, esta encontra-se
altamente condensada dentro da célula. No genoma humano, essas cadeias
polinucleotídicas possuem centenas de milhões de nucleotídeos variando de 50
milhões de pares de base, no cromossomo 21, até 250 milhões de pares de base no
cromossomo 1.
Figura 5.8: Complementariedade das bases.
Duas ligações de hidrogênio entre a
Adedina e a Timina e TrÊs Ligações de
hidrogênio entre a Guanina e a Citosina.
Fonte: Harper, 2006.
127
2. O ÁCIDO RIBUNUCLEICO (RNA)
Os ribonucleotídeos contêm as bases adenina, guanina, citosina e a base
pirimidina uracil (U) em vez de timina presente nas moléculas de DNA. A uracila
forma ligações de hidrogênio com a adenina da mesma forma como faz a timina.
Porém, as bases de U são capazes de se ligar às bases de G. As duas ligações de
hidrogênio que podem formar-se entre U e G são mais fracas do que as que se
formam entre U e A. A capacidade de U ligar-se tanto com a A quanto com a G é um
fator importante que permite ao RNA formar estruturas extensas e complexas,
muitas das quais vitais aos processos biológicos.
Figura5.9: Estrutura dos quatro nucleotídeos do RNA. Fonte: Griffiths et al., 2008.
128
Em todos os organismos procariotas e eucariotas, são descritas três
principais classes de moléculas de ácido ribonucleico: o RNA mensageiro (mRNA),
o RNA de transferência ou transportador (tRNA) e o RNA ribossômico (rRNA).
Entre estes as moléculas de mRNAs são as mais heterogêneas em tamanho e
estabilidade. Os mRNAs transmitem a informação genética armazenada na
sequência de nucleotídeos de um gene do DNA cromossomal para a síntese de
proteínas, servindo como um modelo no qual uma sequência específica de
aminoácidos é polimerizado para formar uma molécula de proteína específica, o
produto final do gene.
A ligação do código genético dos genes e o código de aminoácidos das
proteínas estão ligados, molecularmente, através do ácido ribonucleico (RNA). O
DNA dirige a síntese e a sequência do RNA, O RNA dirige a síntese e a sequência
dos polipeptideos e especifica as proteínas que estão envolvidas na síntese e no
metabolismo do DNA e do RNA. Esse fluxo de informação é chamado dogma central
proposto por Francis Crick, em 1958, em sua conferência intitulada “On Protein
Synthesis”, apresentada { Sociedade de Biologia Experimental.
Figura 5.10: Principais moléculas de RNA. O rRNA e o tRNA são os
produtos finais da expressão de seus genes; o mRNA sofre o segundo
estágio da expressão gênica chamado tradução. Fonte: Brown, 1998.
129
O tRNA é uma peça chave envolvida na tradução do mRNA. É produzido por
genes que se concentram em regiões específicas dos cromossomos e variam em
tamanho entre 74 e 95 nucleotídeos. As moléculas de tRNA são adaptadores para a
tradução das informações na sequência dos nucleotídeos do mRNA em
aminoácidos específicos, capturando aminoácidos livres na célula e conduzindo-os
até os ribossomos, onde serão incorporados nas proteínas que estiverem sendo
sintetizadas.
Figura 5.11: Estrutura em fita simples da molécula de RNA. Fonte: Harper, 2006.
130
A síntese e o processamento da molécula de tRNA podem ser descritos em
quatro etapas:
1. Inicialmente, o tRNA é transcrito pela RNA polimerase III. O produto de
transcrição, o pré-tRNA, contém sequências de RNA complementar, nas
extremidades 5 'e 3'. Essas sequências adicionais são removidas do transcrito
durante o processamento. Os nucleotídeos adicionais à extremidade 5' são
removidos por um RNA incomum, contendo enzima ribonuclease P (RNase P).
Figura 5.12: Síntese e processamento do tRNA. Fonte: http://www.ewa.cz/pages1/813.htm
131
2. Alguns precursores tRNA contêm um íntron localizado na região do anticódon.
Esses Íntrons são separados durante o processamento do tRNA.
3. Todos os tRNAs maduros contêm o CCA trinucleotide em suas extremidades 3'.
Essas três bases não são codificadas pelo gene tRNA. Em vez disso, esses
nucleotídeos são adicionados durante o processamento do pré-transcrição tRNA. O
fim da enzima responsável pela adição da CCA-tRNA é transferase nucleotidil.
4. tRNAs maduros podem conter até 10% de outras bases do que o habitual
adenina (A), guanina (G), citidina (C) e uracila (U). Essas modificações da base são
introduzidos no tRNA, na fase de processamento final. A função biológica da
maioria das bases é desconhecida, o processo de tradução parece normal em
mutantes e faltam às enzimas responsáveis pela modificação das bases.
Já um ribossomo é uma estrutura nucleoproteica citoplasmática que atua
como a maquinaria para a síntese de proteínas a partir dos moldes de mRNA. Os
genes para rRNA ficam concentrados nas regiões dos cromossomos nas quais se
formam os nucléolos. Nos ribossomos, as moléculas de mRNA e tRNA interagem
para traduzir uma informação específica da proteína - molécula transcrita a partir
de um gene. Durante a síntese proteica, muitos ribossomos são associados com
uma molécula de mRNA em um conjunto chamado de polissomos.
2. IMPORTÂNCIA MÉDICA DOS NUCLEOTÍDEOS
Análogos sintéticos das purinas, pirimidinas, nucleosídeos, nucleotídeos
possuem inúmeras aplicações na medicina clínica. Seus efeitos tóxicos refletem
tanto a inibição de enzimas essenciais para a síntese de ácidos nucleicos ou sua
incorporação em ácidos nucléicos com consequente rompimento da base de
emparelhamento. Oncologistas empregam 5-fluoro-ou 5-iodouracil, 3-
deoxiuridina, 6-tioguanina e 6-mercaptopurina, 5 - ou 6-azauridine, 5 - ou 6-
azacytidine, e 8-azaguanina, que são incorporada no DNA antes da divisão celular,
no tratamento de vários tipos de câncer. O alopurinol, um análogo das purinas, é
132
usado no tratamento da hiperuricemia e gota, devido a sua ação inibitória na
biossíntese de purinas e sobre a atividade da xantina oxidase. Por outro lado, a
azatioprina, metabolizada a 6-mercaptopurina, é empregada durante o transplante
de órgãos, para suprimir a rejeição imunológica.
133
GENÉTICA MOLECULAR:
DUPLICAÇÃO DO DNA
134
DUPLICAÇÃO DO DNA
INTRODUÇÃO
A estrutura da molécula de DNA permite a transferência da informação
genética de uma célula para as células filhas e de uma geração para a seguinte. O
DNA das diversas espécies difere principalmente na sequência das bases
nitrogenadas. Uma sequência pequena contendo doze nucleotídeos de
comprimento pode gerar 412 = 16777216 sequências diferentes. Assim, o
mecanismo de duplicação ou replicação do DNA, que iremos observar neste
capítulo, é extremamente eficiente, o que garante a integridade do material
genético.
1. DUPLICAÇÃO
O mecanismo pelo qual uma molécula de ácido desoxirribonucleico (DNA)
faz uma cópia de si mesmo é denominado duplicação. O arranjo estrutural da
molécula de DNA permite a sua duplicação pela separação dos dois filamentos
moldes “original”, seguidos pela síntese de novos filamentos complementares
“cópias”. Estes filamentos consistem em uma fita da hélice original e uma fita nova,
complementar à primeira – no processo denominado duplicação semiconservativa.
A duplicação do DNA é assincrônica em todos os cromossomos, ou mesmo
dentro de um único cromossomo. A síntese do DNA ocorre ao longo de cada
cromossomo iniciando em centenas a milhares de regiões, denominadas origens de
replicação, em tempos diferentes da fase S do ciclo celular. A replicação é
extremamente complexa e envolve 20 ou mais enzimas além de outros fatores que
constituem o sistema DNA replicase.
135
Figura 6.1: Modelo semiconservativo da replicação do DNA proposto por Watson e Crick. Os
filamentos parentais, mostrados em azul, servem como moldes para a polimerização. Os
filamentos recém-polimerizados, mostrados em amarelo, têm sequências de bases que são
complementares a seus respectivos moldes. Fonte: Griffiths et al., 2008.
136
O primeiro passo para a replicação do DNA começa com o reconhecimento
de um ponto de iniciação e desdobramento da dupla hélice realizado pelas enzimas
denominadas topoisomerases. Como os dois, filamentos originais estão
firmemente ligados por ligação de hidrogênio, faz-se necessária a ação das
proteínas SSP (single strand proteins), que mantêm os filamentos separados
enquanto se processa a replicação. A DNA-polimerase polimeriza os nucleotídeos
sequencialmente para formar uma nova fita de DNA. Porém, essa enzima não
consegue iniciar a síntese das novas fitas de DNA sem o auxílio de um iniciador
(primer) de RNA, porque ela só é capaz de adicionar nucleotídeos a um
polinucleotídeo preexistente no sentido 5’ 3’, o que significa que os filamentos
molde precisam ser lidos no sentido 5’ 3’.
Figura 6.2: Representação do primer de RNA sintetizado a partir do molde de DNA.
Fonte: Harpe, 2006.
137
Os primers da fita descontínua (leagging) são sintetizados pela ação de uma
RNA-polimerase especial, a primase, enquanto os primers do DNA contínuo
(leading) são produzidos pela RNA polimerase que normalmente sintetiza RNA na
transcrição. Ambas as enzimas utilizam como molde os filamentos de DNA
separados nas origens de replicação. Nos dois casos, a DNA polimerase forma um
filamento de DNA que contém um pequeno seguimento de RNA, removidos
posteriormente das moléculas de DNA recém sintetizadas.
A teoria de que o DNA descontínuo 3’ 5’ era sintetizado em pedaços foi
constatada pela bióloga molecular Tuneko Okazaki em estudos realizado em
colaboração com Reiji Okazaki, em 1968.
Identificaram trechos curtos de DNA entre
100 e 1000 nucleotídeos de comprimentos
associados à sua replicação – os fragmentos
de Okazaki. No filamento descontínuo, a DNA
polimerase sintetiza o DNA até certa distância
antes de encontrar o primer na ponta 5’ do
fragmento de Okazaki seguinte. A ligação dos
fragmentos ocorre pela ligação fosfodiéster
catalisada pela enzima DNA ligase.
Apesar de sua complexidade, a replicação do DNA é altamente precisa.
Estima-se que ocorre apenas um erro na replicação de 109 pares de bases. Essa
precisão é devido à especificidade da DNA polimerase que é capaz de conferir às
bases a medida que as adiciona ao filamento de DNA. Essa enzima confere as bases
adicionadas e remove imediatamente uma base errada, antes que a síntese do
filamento continue.
Além da DNA polimerase, o processo de replicação envolve a participação
de várias enzimas e cofatores:
Figura 6.3: TuKeno Okazaki.
Fonte:http://mujeresdeciencias.blogia.com/2007/082801-tuneko-okazaki-1933-.php
138
DNA helicase: são enzimas que se ligam à fita simples de DNA, próximo à zona de
replicação e se movem na direção da fita dupla, forçando as fitas se separarem e
provocando um desenrolamento. Assim que as fitas se abrem, as proteínas
desestabilizadoras se ligam à fita simples;
Proteína de ligação do DNA de fita simples - single strand binding protein: Essas
proteínas, denominadas de proteínas desestabilizadoras da hélice, ligam-se à fita
simples de DNA, mantendo-as separadas;
DNA topoisomerase: um problema de superdobramento ocorre à medida que as
fitas se separam. As enzimas DNA topoisomerase são responsáveis pelo
mecanismo para remover o superdobramento;
Primase: é a enzima responsável por sintetizar primer. As DNA polimerases não
conseguem iniciar a síntese de uma fita complementar de DNA através de um
molde completamente composto de fita simples. Elas necessitam de
oligonucleotídeo iniciador, denominado primer, que é na realidade uma região
curta de aproximadamente 10 nucleotídeos de comprimento, com um grupo
hidroxila livre no carbono-3’, que serve como primeiro aceptor de um nucleotídeo;
DNA ligase: a enzima responsável por realizar a junção entre os fragmentos de
DNA (fragmentos de Okazaki) sintetizados na fita atrasada; entre outras proteínas.
139
Figura 6.4: Representação molecular de forquilha de replicação. A topoisomerase e a helicase desenrolam e abrem a dupla hélice na preparação para a replicação do DNA. Quando a dupla
hélice está desenrolada, as proteínas de ligação a um só filamento impedem que a dupla hélice se reconstitua. A ilustração é uma representação do chamado modelo trombone (denominada
por sua semelhança a um trombone devido à alça do filamento de replicação descontínua) mostrando como os dois cernes catalíticos do replissomo são vistos interagindo para
coordenar os vários eventos da replicação dos filamentos leading e lagging.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
140
GENÉTICA MOLECULAR:
TRANSCRIÇÃO
141
TRANSCRIÇÃO
INTRODUÇÃO
O que difere os polinucleotídeos das diferentes espécies é a ordem em que
as bases estão arranjadas em cada fita de DNA. A descoberta de que os genes
formam um código genético foi um dos mais importantes acontecimentos
científicos da época. Em 1958, Francis Crick postulou que a informação biológica
contida no DNA de um gene é primeiramente transferida ao RNA e depois à
proteína. Sendo o fluxo de informação unidirecional, as proteínas não podem por si
só orientar a síntese de RNA, e o RNA não pode orientar a síntese de DNA, com
exceção de alguns vírus de RNA. Iremos neste capítulo compreender como as
informações armazenadas na molécula de DNA são transcritas na célula.
1. GENE
Um gene é um seguimento de uma molécula de DNA que contém o local de
início e fim da síntese de uma molécula de RNA. Sequências de pares de bases
nitrogenadas que indicam o início dos genes são denominadas regiões
promotoras; as que indicam o fim dos genes, sequências de término de
transcrição. A maioria dos genes é interrompida por uma ou mais regiões não
codificantes. Essas sequências intercalares, denominadas íntrons, são inicialmente
transcritas em RNA no núcleo, mas não estão presentes no RNA mensageiro
(RNAm) no citoplasma. Assim, apenas as sequências codificantes, os éxons,
carregam a informação da sequência de aminoácidos de uma proteína.
142
Os íntrons estão presentes não apenas em genes que codificam proteínas,
mas também em alguns genes de rRNA e até mesmo genes tRNA, sendo removidos
durante o processo de transcrição do mRNA. A remoção de íntrons e união dos
éxons é denominada splicing. O número e o tamanho dos íntrons variam de gene
para gene e de espécie para espécie. Por exemplo, o tamanho médio de um intron
em mamíferos é de cerca de 2000 nucleótidos, enquanto que em média o tamanho
do exon é de cerca de 200 nucleotídeos. Assim, a maior porcentagem do DNA em
mamíferos codifica introns; exons, não. Um exemplo clássico em seres humanos é o
do gene da distrofia muscular de Duchenne que possui 79 exons e 78 introns,
distribuídos por 2,5 milhões de pares de bases. Entretando, quando unidos os
éxons, o mRNA resultante apresenta 14.000 nucleotídeos entre 2,5 milhões de
pares de base não codificantes.
1.1. snRNA
Após a descoberta de éxons e íntrons, os cientistas voltaram sua atenção
para o mecanismo de splicing do RNA. O processamento splicing é uma operação
complexa realizada pelos spliceossomos, que são conjuntos de proteínas e
moléculas de snRNA (pequenos RNAs nucleares). Essa maquinaria enzimática
reconhece sinais no RNA nascente que especificam os locais de corte. Os íntrons
Figura 7.1: Representação esquemática do DNA de organismos superiores. As regiões que codificam proteínas (éxons) estão separadas por (íntrons) por regiões que não estão
presentes no mRNA final. Fonte Ucko, 1992.
143
quase sempre começam com GU e terminam com AG, que é precedido por um
trecho rico em pirimidinas.
1.2. iRNA
A descoberta do mecanismo conhecido como RNA de interferência, que
permite “silenciar” genes com precis~o, rendeu aos biólogos norte-americanos
Andrew Fire e Craig Mello o Prêmio Nobel de Medicina de 2006. O iRNA funciona
como mecanismo de defesa contra vírus que têm código genético em forma de
fitas duplas de RNA. Além de atuar no controle da expressão genética, trata-se de
uma importante ferramenta de pesquisa que poderá dar origem a novos
tratamentos para condições ligadas a características genéticas.
2. A TRANSCRIÇÃO
A transcrição de genes codificantes pela RNA polimerase é iniciada
anteriormente ao gene, na região promotora – pequena sequência de
nucleotídeos reconhecida pela polimerase II (como por exemplo, o TATA boxe – 5’-
TATAAAT-3’) – situada geralmente cerca de 25 nucleotídeos antes da sequência a
ser transcrita. Existem vários tipos diferentes de promotor encontrados no
genoma humano, com diferentes propriedades regulatórias que especificam o
padrão de desenvolvimento, bem como os níveis de expressão de um determinado
gene em tecidos diferentes.
A síntese do transcrito prim|rio de mRNA ocorre no sentido 5’ 3’,
enquanto o filamento do gene transcrito é lido no sentido 3’ 5’ com relaç~o {
estrutura desoxirribose fosfodiéster. Durante o processo de alongamento da
transcrição, a RNA polimerase percorre a molécula de DNA desenrolando a dupla
hélice, enquanto liga sequencialmente ribonucleotídeos { extremidade 3’ da
molécula crescente de RNA.
144
Como o RNA sintetizado corresponde tanto em polaridade quanto em
sequência de bases (substituindo Timina por Uracila) ao filamento 5’ 3’, essa fita
de DNA não transcrita é denominada codificante ou com sentido. Já o filamento
3’ 5’ transcrito é denominado n~o-codificante ou sem sentido. A transcrição
continua incluindo íntrons e éxons do gene, além da posição no cromossomo que
eventualmente corresponde { ponta 3’ do mRNA.
O transcrito primário de RNA é processado pela adição de uma estrutura
química “cap” na ponta 5’ do RNA e uma clivagem na ponta 3’ em um ponto
específico, ao final da informação codificante. Essa clivagem é seguida pela adição
de uma cauda poliA na ponta 3’ do RNA. O cap - 7-metilguanosina que está ligado
ao ribonucleosídeo através de uma ponte contendo 3 fosfatos. Está envolvido no
reconhecimento do mRNA pela maquinária de tradução, além de estabilizar o
mRNA, impedindo o ataque de 5'-exonucleases.
Figura 7.2: A sequência de mRNA é complementar ao filamento-molde de DNA do qual ele é transcrito e, portanto, corresponde à sequência não molde (exceto em que o RNA
tem U onde o DNA tem T). Essa sequência é do gene para a enzima 3-galactosidase. Fonte: Griffiths et al., 2008.
145
A cauda poliA parece aumentar a estabilidade do RNA poliadenilato
resultante. O ponto de poliadenilação é especificado em parte pela sequência
AAUAAA, ou por uma sequência semelhante a esta, em geral encontrada na parte 3’
não traduzida do RNA transcrito. Essas modificações pós transcricionais ocorrem
no núcleo, assim como o processamento do RNA. O mRNA é transportado então
para o citoplasma, onde ocorre a tradução.
Figura7.3: Representação esquemática da estrutura cap (metilguanosina) e das proteínas nucleares (CBP80 e CBP20) envolvidas no complexo de ligação cap durante
a transcrição do mRNA.
Fonte: http://www.ewa.cz/pages1/813_soubory/end.gif
146
Figura 7.4: Representação esquemática do complexo de poliadenilação. Fonte: http://www.ewa.cz/pages1/813_soubory/end.gif
147
GENÉTICA MOLECULAR:
TRADUÇÃO
148
TRADUÇÃO
INTRODUÇÃO
A informação genética é armazenada no DNA por meio de um código, no
qual a sequência de bases adjacentes determina a sequência de aminoácidos no
polipeptídeo codificado. A síntese de proteínas ocorre nos ribossomos, complexos
macromoleculares constituídos por RNA ribossômico (18S e 28S) associados a
proteínas ribossomiais. Mas para que a informação contida nos nucleotídeos seja
traduzida em uma proteína específica, a célula necessita decifrar o código genético
presente no mRNA. Assim, neste capítulo iremos compreender o mecanismo de
tradução e como ocorrem as mudanças pós-traducionais.
1. O CÓDIGO GENÉTICO
A chave para a tradução é um código que relaciona aminoácidos específicos
à combinação de três bases adjacentes ao longo do mRNA. Por sua vez, o código
genético consiste em um conjunto de três nucleotídeos (trinca) que indicam um
aminoácido X. Um código de três letras de quatro diferentes bases (Adenina;
Timina; Citosina; e Guanina) pode reproduzir 64 aminoácidos. Como existem 20
aminoácidos presentes nas proteínas dos seres humanos e 64 possíveis códons, a
maioria dos aminoácidos é especificada por mais de um códon. Por isso o código
genético é dito como degenerado. Por exemplo, a base na terceira posição da trinca
pode ser uma purina (A ou G), ou uma pirimidina (T ou C) ou, em alguns casos,
qualquer uma das quatro bases sem alterar a mensagem codificada.
149
Os códons, UGA, UAA ou UAG, são denominados finalizadores ou sem
sentido porque marcam o término da tradução da molécula de mRNA. Por outro
lado, a tradução é sempre iniciada em um códon AUG que especifica o aminoácido
metionina. Porém, normalmente esse aminoácido (amino-terminal, pois é o
primeiro a ser adicionado à cadeia polipeptídica) é removido antes que a síntese
da proteína seja completada. Apenas os aminoácidos metionina e triptofano são
especificados apenas por um único códon.
Figura 8.1: O código genético designa os aminoácidos especificados por cada códon. Fonte: Ucko, 1992.
150
2. A FUNÇÃO DO tRNA
Há pelo menos 20 tipos de moléculas de tRNA em cada célula,
correspondentes a cada um dos 20 aminoácidos necessários para a síntese de
proteínas. Embora os tRNA apresentem sequências nucleotídicas especificas, essas
moléculas possuem muitas características em comum. A estrutura primária, isto é,
a sequência de nucleotídeos de todas as moléculas de tRNA gera uma estrutura
secundária em duas dimensões como um trevo.
Figura 8.2: Representação esquemática da síntese do tRNA. Fonte: Brown, 1998.
151
Como o código do mRNA é escrito em grupos de três nucleotídeos, a
tradução se efetua graças ao tRNA capaz de "ler" o código do mRNA. As moléculas
de tRNAs possuem um grupo de três nucleotídeos chamado "anticódon",
constituída por sete nucleotídeos. Eles são complementares a um códon do mRNA
correspondente a um aminoácido transportado pelo tRNA. Como a degeneração do
código genético reside principalmente no último nucleotídeo do código em trincas,
sugere-se que o pareamento entre este último e o nucleotídeo correspondente do
anticódon não é estritamente uma regra.
Como não há afinidade de ácidos nucleicos presentes nas moléculas do
tRNA para os grupos funcionais específicos de aminoácidos, o reconhecimento
dessa molécula ocorre por meio de uma proteína capaz de distinguir tanto o tRNA
quanto o aminoácido específico. O processo de reconhecimento e ligação de cada
um dos 20 aminoácidos é realizado por um grupo de enzimas denominado
aminoacil-tRNA sintetase. Durante o processo de reconhecimento, é formado um
intermediário ativado de aminoacil-AMP que, em seguida, reconhece um tRNA
Figura 8.3: Representação esquemática das moléculas individuais de tRNA específicas para aminoácidos
diferentes. Fonte: Brown, 1998.
152
específico. Esse processo é extremamente preciso, sendo a taxa de erro inferior a
10-4. O aminoácido permanece ligado ao seu tRNA específico em uma ligação éster
até que é polimerizado em uma posição específica - 3’ - na síntese de um
polipeptídeo.
2. OS RIBOSSOMAS
Os ribossomas foram originalmente caracterizados por sua taxa de
sedimentação e, por essa razão, seus nomes são derivados de seus coeficientes de
sedimentaç~o em Svedberg (S) “unidade”, o que é uma indicação do tamanho
molecular dessas estruturas macromoleculares. Em procariontes as subunidades
pequena e grande são designadas 30S e 50S, respectivamente, que quando
associadas formam uma partícula 70S. Ao contrário, em eucariontes as
subunidades pequena e grande são denominadas 40S e 60S, formando o ribossomo
Figura 8.4: Representação da reação envolvida na aminoacilação de um tRNA. Fonte: Brown,1998.
153
80S. Embora os ribossomas eucarióticos sejam maiores e mais numerosos, os
componentes e as etapas de síntese proteica são universalmente semelhantes.
Os ribossomas são o local onde o mRNA e aminoacil-tRNA se reúnem
durante a tradução da mensagem genética em todos os tipos de células. Além de
fornecer o suporte estrutural para o processo de decodificação, o ribossomo se
contém no centro catalítico responsável pela formação da ligação peptídica, o
chamado centro peptidil transferase. Os ribossomas foram descobertos no início
dos anos 1940, mas seu papel na síntese de proteínas logo se tornou aparente,
mais de uma década depois. O nome "ribossomo" foi dado a essas moléculas em
1958.
Figura 8.5: Um ribossomo contém uma subunidade grande e outra pequena. Cada subunidade contém rRNA de tamanhos variados e um conjunto de proteínas. Existem
duas principais moléculas de rRNA em todos os ribossomos. (a) Ribossoma procarioto; (b) Ribossoma eucarioto.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
(a) (b)
154
4. TRADUÇÃO
Uma vez no citoplasma da célula, o mRNA produzido a partir do DNA é
reconhecido pelo ribossoma que se liga a sua extremidade 5’. A subunidade
pequena do ribossomo (40S nos eucariontes) então se move ao longo do mRNA até
alcançar um códon iniciador e começar a tradução. O códon iniciador é a primeira
trinca AUG que a subunidade pequena encontra, à medida que "escaneia" a
molécula de mRNA.
Figura 8.6: Representação esquemática do início da tradução em eucariontes. O complexo de iniciação forma-se na ponta 5’ do mRNA e o percorre no sentido de 3’ à procura de um códon de início. O reconhecimento do código de início dispara a montagem do ribossomo completo e a dissociação dos fatores de iniciação (não mostrados). A hidrólise de ATP fornece energia para ativar o processo de varredura.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
155
Formado o complexo de iniciação, a subunidade grande do ribossoma pode
se fixar. Para tanto, uma molécula de ATP é hidrolisada, liberando a energia
necessária para a síntese do polipeptídeo. Dessa união, resultam dois sítios de
ligação: as moléculas de tRNA – um sítio peptidil “amino terminal” ocupado no
momento pelo tRNAmet – códon de iniciação; e o sítio aminoacil “aminoterminal” –
posicionado sobre o segundo códon.
Figura 8.7: Representação esquemática da etapa de alongamento. Um complexo ternário consiste em um aminoacil-tRNA ligado a um fator EF-Tu que se liga ao sítio A. Após seu
aminoácido juntar-se à cadeia polipeptídica em crescimento, um fator EF-G liga-se ao sítio A enquanto empurra os tRNA e seus códons de mRNA para os sítios E e P.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
156
Ambos os sítios do ribossoma estão ocupados tRNAs aminoacilados, e os
dois aminoácidos estão em contato direto. A etapa posterior é a formação de uma
ligação peptídica entre o grupamento carboxila da metionina e o grupamento
amino do segundo aminoácido. Essa reação é catalisada pela peptidiltransferase. O
ribossomo então desliza ao longo do mRNA através de três nucleotídeos, de modo
que o tRNA ligado a um aminoácido entre no sítio peptidil, liberando o tRNAmet,
permitindo que o sítio Aminoacil fique livre.
O terceiro tRNA aminoacilado entra no sítio aminoacil, e o ciclo de
alongamento da cadeia polipeptídica é então repetido. Durante a síntese proteica,
mais de 80 ribossomas movem-se pela molécula de mRNA ao mesmo tempo,
estando cada um em um estágio diferente, formando um complexo denominado
polissoma.
Figura 8.8: Representação esquemática do processamento seqüencial da molécula de mRNA durante a tradução.
Fonte: http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Citologia2/AcNucleico9.php
157
A finalização da tradução ocorre quando um códon finalizador (UAA, UAG
ou UGA) entra no sítio aminoacil. Em seguida, fatores de liberação clivam o
polipeptídeo completo, em um processo que envolve o gasto de energia na forma
de GTP, e as subunidades 40 S e 60 S se disossiam.
Figura 8.9: Representação esquemática do termina da tradução. A tradução é terminada quando os fatores de liberação reconhecem os códons de fim no sítio Aminoacil (A) do ribossomo.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
158
5. MUDANÇAS PÓS TRADUCIONAIS
A maioria das proteínas passa por modificações pós transducionais. A
estrutura tridimensional específica de cada proteína é determinada pela própria
sequência de aminoácidos. Duas ou mais cadeias polipeptídicas, codificadas pelo
mesmo gene ou por genes distintos, podem se combinar para formar um único
complexo proteico final.
Figura8.10: Formação da estrutura quaternária da hemoglobina. A molécula de hemoglobina é um tetrâmero formado por duas cadeias de alfa-globina e
duas cadeias de beta-globina ligadas por interações não covalente.
Fonte: http://www.biocristalografia.df.ibilce.unesp.br/xtal/texto_hb.php
159
Os produtos proteicos também podem ser modificados quimicamente. Mais
de 300 modificações podem ocorrer nos aminácidos das cadeias polipeptídicas,
após a sua tradução. Duas das alterações mais comuns são a fosforilação e
ubiquitinação.
5.1. FOSFORILAÇÃO
Um grupo de enzimas denominadas quinases é capaz de ligar grupos fosfato
aos grupos hidroxila dos aminoácidos serina, treonina e tirosina, enquanto que as
enzimas chamadas fosfatases removem esses grupos fosfato das proteínas. Como a
adição e remoção de grupos fosfato atuam como um interruptor reversível no
controle de uma variedade de eventos celulares, incluindo a ativação e/ou
inativação de enzimas específicas.
Figura 8.11: Fosforilação e desfosforilação de proteínas. As proteínas podem ser ativadas pela ligação enzimática de grupos
fosfato aos grupos laterais de seus aminoácidos e inativar a remoção desses grupos fosfato. Fonte: Griffiths et al., 2008.
160
5.2. UBIQUITINAÇÃO
O mecanismo de ubiquitinação envolve a adição de uma proteína
denominada ubiquitina ao resíduo de lisina de uma proteína alvo, que será
posteriormente degradada em um complexo denominado proteasomo. A
ubiquitina é uma proteína que contém 76 aminoácidos, presente nos organismos
eucariontes, estando altamente conservada em plantas e animais. As principais
classes de proteínas que são metabolizadas por ubiquitinação apresentam uma
meia vida curta, como as que participam do ciclo celular, ou são proteínas
danificadas ou transformadas.
Figura 8.12: Ubiquitinação. FIG. 9.23 São mostradas as principais etapas na degradação de proteínas mediada pela ubiquitina. A ubiquitina
primeiro é conjugada a outra proteína e, então, degradada pelo proteassomo. A ubiquitina e os oligopeptídeos são então reciclados.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
161
6. DESTINO DAS PROTEÍNAS
Em eucariotos, as proteínas são sintetizadas nos ribossomos localizados no
citoplasma. No entanto, algumas dessas proteínas acabam no núcleo, em organelas
como as mitocôndrias, e outras ainda ancoradas à membrana interna ou externa,
ou secretadas em vesículas. O direcionamento das proteínas ocorre por meio uma
sequência curta “peptídeo líder” na sua extremidade amino-terminal. Por exemplo,
proteínas de membrana apresentam, geralmente, um peptídeo lider de 15 a 25
aminoácidos, que as direciona para os canais na membrana do retículo
endoplasmático onde a sequência final é clivada por uma peptidase. A partir do
retículo endoplasmático, a proteína é direcionada para seu destino final.
Figura 8.13: Representação da incorporação de sequências de sinal que marcam as proteínas que serão secretadas pela célula.
Fonte: Griffiths et al., 2008.
162
GENÉTICA MOLECULAR:
MUTAÇÃO E MECANISMO DE REPARO
163
MUTAÇÃO E MECANISMO DE REPARO
INTRODUÇÃO
A molécula de DNA serve como um modelo para a transcrição das
informações em RNA e para a replicação da informação em moléculas de DNA filha.
Mesmo sendo altamente específico, o processo de replicação gera erros que, em
sua maioria, são corrigidos pela DNA polimerase, porém alguns erros não são
detectados. Além disso, o DNA pode ser danificado ou alterado de uma maneira
que afeta sua sequência de bases.
1. MUTAÇÃO
Uma mutação é uma alteração na sequência de nucleotídeos de uma
molécula de DNA, que pode ocorrer dentro de um gene ou em regiões intergênicas.
Se uma mutação ocorre em uma região intergênica, ela provavelmente será
silenciosa e não terá efeito na célula. Entretanto, se uma mutação ocorre em um
gene, ela pode alterar o produto gênico e gerar uma alteração observável no
organismo: isso é chamado de uma mudança no fenótipo. O fenótipo de um
organismo é um conjunto de características observáveis, em contrapartida, o
genótipo é sua constituição gênica. Um organismo que apresenta o fenótipo usual
para a espécie é chamado tipo selvagem; um organismo cujo fenótipo foi alterado
por mutação é chamado mutante.
164
1.1. TIPOS DE MUTAÇÕES
1.1.1. MUTAÇÃO NA SEQUÊNCIA DE NUCLEOTÍDEOS DO DNA
1.1.1.1. MUTAÇÃO PONTUAL
Trata-se da substituição de um nucleotídeo por outro. Ela pode causar a
substituição de um aminoácido por outro na sequência polipeptídica. Pode ainda
ser classificada como mutação pontual de transição, se a substituição for de uma
Figura 9.1: Representação do gene. Fonte: Brown, 1998.
165
purina e/ou pirimidina por outra (Adenina Guanina; Guanina Adenina;
Timina Citosina; Citosina Timina), ou mutação pontual de transversão, se a
alteração for de uma purina para uma pirimidina ou vice-versa.
1.1.1.2. MUTAÇÃO POR INSERÇÃO OU DELEÇÃO
Mutações graves envolvem a inserção ou deleção de um par de
nucleotídeos ou mesmo de grandes trechos de DNA. Estas são conhecidas como
mutação por "deslocamento", uma vez que elas fazem que o DNA seja lido
incorretamente. Esse tipo de mutação é geralmente letal porque resulta na síntese
de proteína completamente diferente.
1.1.1.3. MUTAÇÃO POR INVERSÃO
Esse tipo de mutação ocorre pela excisão de uma parte da dupla hélice
seguida de sua reinserção na mesma posição, mas em orientação inversa.
1.2. MUTAÇÃO EM UM GENE
Seja pontual, de inserção, deleção ou inversão, uma mutação será
silenciosa, se ocorrer em uma região intergência. Mas, quando ocorre em uma
sequência codificante do DNA, pode gerar diferentes consequências:
1.2.1. MUTAÇÃO SILENCIOSA
Ocorrerá quando a mutação pontual se der no nucleotídeo da terceira
posição de um códon que, devido à redundância do código genético, dificilmente
irá alterar o aminoácido codificado no local da mutação.
166
1.2.2. MUTAÇÃO DE SENTIDO TROCADO
Trata-se também de uma mutação pontual, porém com a alteração do
aminoácido codificado, por ocorrer principalmente no primeiro ou segundo
nucleotídeo de um códon. Se a mutação afetar um aminoácido essencial para a
estrutura ou função da proteína, esta será inativada, levando a um fenótipo
mutante.
1.2.3. MUTAÇÃO SEM SENTIDO
Essa é uma mutação de ponto que altera o códon original para um códon
finalizador, resultando em um gene que codifica um polipeptídeo incompleto. Na
maioria dos casos, a mutação altera a atividade da proteína, resultando em um
fenótipo mutante.
1.2.4. MUDANÇA NA MATRIZ DE LEITURA
Ocorre pela inserção ou deleção de bases que levam à leitura incorreta dos
códons adiante da mutação, produzindo, geralmente, um fenótipo mutante.
1.3. AGENTES MUTAGÊNICOS
Danos causados ao DNA por agentes físicos e químicos podem ser
classificados em quatro tipos: I. Alteração de uma única base (por exemplo: pela
desaminação da adenina em hipoxantina ou desaminação da citosina em uracil); II.
Alteração de duas bases (por exemplo: luz UV que pode causar a dimerização de
pirimidinas adjacentes); III. Ruptura dos filamentos de DNA (por exemplo: na
oxidação por radicais livres); IV. Ligação cruzada (por exemplo: entre moléculas
de DNA e proteínas, como as histonas).
Mutações podem também resultar de meios artificiais, como as causadas
por radiações ionizantes, como raios X ou gama. Quanto maior a dosagem, maior a
167
probabilidade de ocorrer uma mutação genética. Os raios cósmicos e outras
radiações podem causar lesões diretas no DNA, como modificação das bases, ou
ruptura dos filamentos e, indiretamente, induzindo a produção de íons
superóxidos.
O DNA sofre a ação de agentes químicos produzidos pela própria célula.
Calcula-se que os íons H+ e a alteração térmica sejam responsáveis pela perda de
aproximadamente 10000 bases púricas por dia, em cada célula do organismo
humano. Entretanto, para proteger seu DNA entre outras moléculas, as células
desenvolveram vários sistemas de proteção. Os íons superóxidos, por exemplo,
são inativados pela ação da superóxido dismutase. Os íons H+ são neutralizados
pelos reguladores ácido-base, enquanto que as oxidações intracelulares são
reduzidas pela ação do NADPH2, glutation e pela vitamina E. A presença do
pigmento melanina nas células da epiderme constitui em um mecanismo de
defesa contra os raios ultravioleta, capazes de danificar a estrutura do DNA.
Certas substâncias conhecidas como agentes químicos mutagênicos que
incluem agentes alquilantes tais como os compostos do tipo
ClCH2CH2N(R)CH2CH2Cl (onde R é o radical alquila), um "gás mostarda"
nitrogenado usado durante a guerra, pode reagir nitrogênio das bases do DNA. O
ácido nitroso, HNO2, remove grupos amina (transformando, por exemplo,
citidina em uridina). Moléculas com estruturas semelhantes às das bases, como
5-bromouracila, um análogo sintético da timina, podem tornar-se parte da
molécula do DNA, mas não formarão pontes de hidrogênio da maneira como o
fazem as bases que estão sendo substituídas.
Uma doença dita de origem genética pode resultar da alteração na
sequência de aminoácidos de uma proteína, decorrente de uma mutação no DNA.
O erro quando hereditário é transmitido de pais para filhos. Doenças
moleculares tendem a aparecer em grupos raciais particulares, por causa dos
casamentos entre pessoas do mesmo grupo. Na anemia falciforme, que ocorre
principalmente entre os negros, ocorre uma mutação pontual pela substituição
da timina pela adenina, que gera a substituição do ácido glutâmico pela valina,
168
num certo ponto da tradução. Curiosamente, portadores de anemia falciforme
são imunes à malária, doença que aflige os países subdesenvolvidos.
2. MECANISMO DE REPARO
A manutenção da integridade da informação da molécula de DNA é de
extrema importância para a sobrevivência de um organismo em particular, bem
como para a sobrevivência da espécie. O reparo do DNA é realizado de modo geral
em duas fases: a primeira, específica para cada tipo de mutação, consiste na
identificação da mutação e da remoção por meio de endonucleases do seguimento
alterado; na segunda fase, o seguimento removido é substituído pela sequência
correta de nucleotídeos.
O reparo por excisão de bases envolve enzimas que são capazes de
reconhecer danos comuns, a exemplo da desaminação (remoção do grupo -NH2)
da citosina, que ocorre espontaneamente na presença de água, gerando uma
uracila. Enzimas denominadas uracila DNA glicosilases removem a uracila
presente na molécula de DNA clivando a ligação glicosídica da base com o açúcar,
resultando em um sítio apurínico. Posteriormente, uma endonuclease corta o
polinucleotídeo adjacente à posição danificada, uma fosfodiesterase remove o
nucleotídeo sem base, uma DNA polimerase preenche o espaço e por fim a DNA
ligase une o filamento reparado.
169
Por outro lado, o reparo por excisão de nucleotídeos é mais comum entre a
maioria dos organismos, sendo iniciado por uma enzima capaz de originar quebras
unifilamentares na molécula de DNA. Em seguida, O seguimento contendo o
nucleotídeo danificado é removido, juntamente com algumas bases adjacentes. O
espaço vazio é preenchido por uma DNA polimerase, sendo o reparo concluído
pela ação da DNA ligase.
Figura 9.2: Reparo por excisão de base.
Fonte: Brown, 1998.
170
Durante o processo de replicação do DNA, ocorre um mecanismo de reparo
de mau pareamento das bases, que irá identificar e corrigir o erro na fita recém-
sintetizada, e não no filamento parental.
Figura 9.3: Reparo por excisão de nucleotídeo. Fonte: Brown, 1998.
171
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