luciana da silva souza reino_dissertação_estudos de linguagens_2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS DEPARTAMENTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM ESTUDOS DE LINGUAGENS LUCIANA DA SILVA SOUZA REINO SLOGANS PUBLICITÁRIOS E SENTIDO: UMA ANÁLISE SEMIÓTICA Campo Grande MS Fevereiro-2012

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Page 1: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM ESTUDOS DE LINGUAGENS

LUCIANA DA SILVA SOUZA REINO

SLOGANS PUBLICITÁRIOS E SENTIDO: UMA ANÁLISE SEMIÓTICA

Campo Grande – MS Fevereiro-2012

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LUCIANA DA SILVA SOUZA REINO

SLOGANS PUBLICITÁRIOS E SENTIDO: UMA ANÁLISE SEMIÓTICA Dissertação apresentada para obtenção do título de Mestre ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, sob a orientação do Prof. Dr. Geraldo Vicente Martins. Área de Concentração: Linguística e semiótica.

Campo Grande – MS Fevereiro-2012

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REINO, Luciana da Silva Souza

Slogans publicitários e sentido: uma análise semiótica./Luciana da Silva Souza Reino - 2012 80f.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Departamento de Letras, 2012.

Orientação: Prof. Dr. Geraldo Vicente Martins, Departamento de Letras. 1.Slogan. 2. Sentido 3. Semiótica discursiva I. Título.

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LUCIANA DA SILVA SOUZA REINO

SLOGANS PUBLICITÁRIOS E SENTIDO: UMA ANÁLISE SEMIÓTICA

APROVADA POR: GERALDO VICENTE MARTINS, DOUTOR (UFMS) RITA DE CÁSSIA APARECIDA PACHECO LIMBERTI, DOUTORA (UFGD) MARIA LUCELI FARIA BATISTOTE, DOUTORA (UFMS) Campo Grande, MS, 31 de março de 2012.

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Para meus pais, Valdomiro e Iolanda. Personificação do amor, da dedicação e do carinho.

Para meu irmão, André Luiz. Maninho, meu primeiro amigo.

Para meu marido Lucas Santiago.

Meu amor, meu companheiro, minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Aos professores do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Estudos

de Linguagens da UFMS, que além da transmissão de conhecimento, tiveram

também paciência em lidar com muitas dúvidas dos alunos que, como eu, vieram da

área de comunicação e estavam abraçando novas teorias.

Às secretarias do PPGMEL, pelo carinho e atenção dispensados,

sanando nossas dúvidas sobre os aspectos burocráticos do curso.

Ao professor Dr. Geraldo Vicente Martins, cuja doçura e paciência – que

são tão maiores quanto a inteligência e conhecimento – tornaram possível a

produção deste trabalho.

À professora Maria Emília Borges Daniel, por todas as colaborações,

conselhos, conversas e dicas transmitidos desde o começo das aulas. Seu carinho e

presença são o coração do PPGMEL.

Aos meus amigos de Imperatriz/MA, em especial minha amiga Thaísa

Bueno, que também estudou semiótica discursiva e não me deixou sozinha nas

muitas divagações que fiz sobre o assunto, além de dividir algumas garrafas de

vinho nas horas em que eu precisava parar.

Aos colegas da turma 2010 do mestrado em Estudos de Linguagens,

pelas risadas, conversas, conselhos e lágrimas divididas; especialmente à amiga

Daniela Raffo Scherer.

Aos meus pais, parte do meu corpo e da minha alma, símbolo de amor,

carinho, perseverança, fé e paciência. Não cabe aqui o tamanho da gratidão e do

amor que tenho por eles.

Ao meu irmão, que tanto quanto eu sofreu com a distância dos últimos 12

meses e nunca me deixou desistir deste trabalho.

Ao meu marido, Lucas Santiago, amor da minha vida, por todos os

momentos divididos até aqui: as alegrias e as dores. E pelo futuro que estamos

construindo juntos.

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viver é super difícil o mais fundo

está sempre na superfície

Paulo Leminski

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RESUMO

REINO, Luciana da Silva Souza. (2012) Slogans publicitários e sentido: uma

análise semiótica. Campo Grande: UFMS. (Dissertação de Mestrado)

Este trabalho realizou a análise de dez slogans publicitários, veiculados na grande mídia, para a divulgação das marcas Omo e Coca-cola, com o objetivo de estudar a construção dos sentidos tomando como base o plano de conteúdo dos textos. Tendo em vista que se buscava verificar as relações entre os diversos componentes linguísticos dos slogans, recorreu-se à Semiótica Discursiva como teoria de fundamentação do trabalho, verificando-se como os níveis do percurso gerativo de sentido se articulam. Como o corpus escolhido pertence à esfera do discurso publicitário, buscou-se apoio teórico também nas pesquisas da área de comunicação. Com essa associação, foi possível identificar como se produzem os efeitos de sentido desses textos concisos, mas formas tão importantes na composição do discurso publicitário, descortinando-se a constituição de um modelo de interpretação eficaz para os slogans.

Palavras-chave: slogan; sentido; semiótica discursiva; publicidade; Omo; Coca-cola.

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ABSTRACT

REINO, Luciana da Silva Souza. (2012) Advertising slogans and sense: a analysis

semiotics. Campo Grande: UFMS. (Master Dissertation)

This work conducted an analysis of ten slogans, conveyed in the mainstream media, to publicize the brands Omo and Coca-Cola, with the aim of studying the construction of the senses building upon the plan of the contents are. Given that sought to examine relationships between the various components of language slogans appealed to the discursive semiotics as a theory of reasoning to work, verifying how the levels of the generative routes of meaning are articulated. As the chosen corpus belongs to the sphere of advertising discourse, we sought theoretical support also in the area of communication research. With this association, it was possible to identify how they produce the effects of meaning of these texts concise, but important in the composition of advertising discourse, revealing the constitution of an interpretation model for effective slogans.

Keywords: slogan; sense; discursive semiotics; advertising; Omo, Coca-Cola.

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LISTA DE TABELAS

TABELA 01 – OS SLOGANS DA ANÁLISE ............................................................. 49

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 9

1. TRATANDO DAS TEORIAS ................................................................................. 15

1.1 COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA ......................................................................... 16

1.2 PERSPECTIVAS DO MARKETING.................................................................... 25

1.3 A PROPAGANDA ............................................................................................... 31

1.4 O SLOGAN .......................................................................................................... 33

2. O MÉTODO E OS OBJETOS DE ANÁLISE ......................................................... 36

2.1 O PERCURSO GERATIVO DO SENTIDO .......................................................... 36

2.1.1 NÍVEL FUNDAMENTAL .................................................................................... 38

2.1.2 NÍVEL NARRATIVO.......................................................................................... 40

2.1.3 NÍVEL DISCURSIVO ........................................................................................ 45

3. LENDO OS SLOGANS PELA ANÁLISE SEMIÓTICA ......................................... 48

3.1 OMO .................................................................................................................... 49

3.1.1 OMO FAZ, OMO MOSTRA. .............................................................................. 49

3.1.2 MELHOR QUE OMO SÓ OMO. ........................................................................ 52

3.1.3 SÓ OMO LAVA MAIS BRANCO. ...................................................................... 55

3.1.4 PORQUE NÃO HÁ APRENDIZADO SEM MANCHAS. ..................................... 57

3.1.5 PORQUE SE SUJAR FAZ BEM. ....................................................................... 59

3.2 COCA-COLA ....................................................................................................... 60

3.2.1 GOSTOSO É VIVER... ...................................................................................... 60

3.2.2 ESSA É A REAL ............................................................................................... 62

3.2.3 O LADO COCA-COLA DA VIDA. ...................................................................... 63

3.2.4 VIVA O LADO COCA-COLA DA VIDA. ............................................................. 64

3.2.5 SUA FELICIDADE TRANSFORMA................................................................... 66

3.3 A CONSTRUÇÃO DOS SENTIDOS .................................................................... 67

3.3.1 DO NÍVEL FUNDAMENTAL ............................................................................. 67

3.3.2 DO NÍVEL NARRATIVO ................................................................................... 73

3.3.3 DO NÍVEL DISCURSIVO .................................................................................. 74

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 76

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 79

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INTRODUÇÃO

A razão inicial deste trabalho encontra-se relacionada ao campo de

atuação da pesquisadora, que, inserida na atividade publicitária, buscava meios de

compreender como se organizava a construção de sentido nas mensagens

produzidas para diversos produtos, sobretudo no que se referia aos slogans,

elementos considerados centrais para as campanhas.

O interesse por estes tipos de textos se ampliou quando a pesquisadora

passou a fazer parte do corpo docente de uma instituição de ensino superior em

Dourados/MS, ao ministrar a disciplina de redação publicitária, oportunidade que se

estendeu depois para o município de Campo Grande/MS em outras duas

universidades, que oferecem o curso superior em publicidade e propaganda.

A elaboração dos conteúdos programáticos das disciplinas exigiu a

reunião de diversas técnicas e práticas comuns na produção de textos publicitários,

entre eles os de concepção, criação e justificativa na produção de um slogan. Mas a

maioria dos livros da área de publicidade e propaganda, especialmente os de

linguagem e redação publicitária, tratam sobre a construção frasal do slogan, sua

importância e seu papel no anúncio publicitário. Porém, nenhum deles se aprofunda

em aspectos que tratam dos efeitos de sentido contidos nos breves esquemas de

criação com que são ensinados.

Entre bibliografias específicas sobre o assunto, destacam-se os livros O

slogan, de Olivier Reboul, e A arte dos Slogans, de Luiz Carlos Iasbeck. O primeiro,

com edição de 1975, aborda as origens históricas dos slogans e apresenta muitas

opiniões com poucos argumentos científicos, sobre criação e efeito dos slogans na

comunicação; o segundo, com primeira edição publicada em maio de 2002, dedica-

se ao estudo do slogan e sua criação em propaganda, já com parte de seu parte de

seus objetivos voltados para a construção dos efeitos de sentido, fazendo uso,

porém, da Semiótica da Cultura em suas análises, tomando como objetos slogans

de instituições bancárias.

O slogan é um elemento pragmático de comunicação e resulta de um

trabalho esmerado do destinador sobre a linguagem, que possui como objetivo obter

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uma memorização da mensagem de forma mais rápida e profunda por parte do

destinatário.

Cabe à propaganda informar e despertar interesse de compra/uso de

produtos/serviços, nos consumidores, em benefício de um anunciante1. Conforme

atestam Gabrielli e Hoff (2004), em estudo a respeito de questões relacionadas à

publicidade, no desenvolvimento desse processo que visa a marcar presença junto

ao público, o slogan resume o conceito do produto/serviço/empresa e encontra-se

presente em todas as peças da campanha publicitária, tendo como uma de suas

funções o fazer aderir, o levar o destinatário da mensagem a uma ação.

Já no que se refere ao campo da significação, o slogan deve resumir

características do produto e conter um apelo emocional; precisa resumir todo o

conceito de uma marca de modo que, ao ser lido/visualizado, consiga levar à

presença do destinatário da mensagem toda a informação conceitual da empresa, a

imagem que ela deseja ter no mercado.

Para a pesquisadora, os materiais citados anteriormente não supriam a

carência de teorias ou métodos de análise que pudessem explicar como um texto

tão pequeno suporta a função de representar sentimentos, funções e obrigações de

uma marca. A partir da antiga curiosidade, alimentada pela necessidade do

aperfeiçoamento das teorias oferecidas no ensino de redação publicitária,

principalmente no que se refere aos pequenos textos intrigantes que acompanham

as marcas, a pesquisadora decidiu investigar os efeitos de sentidos profundamente

articulados nos slogans.

Um slogan acompanha o produto ou empresa durante sua vida, podendo

sofrer alterações ao longo do tempo, uma vez que se encontra submetido a

mudanças percebidas no mercado; dessa forma, o conceito de marca, por exemplo,

inicialmente apresentado em um slogan que destaca características específicas do

produto, pode deixar de atender uma necessidade inicial de a significação ir além da

marca; neste caso, a significação deve transcender o produto/serviço/empresa e

procurar elementos fundamentais no público-alvo.

1 Empresa, pessoa ou entidade que se utiliza da propaganda.

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Entre um sem-número de slogans conhecidos e utilizados nas maiores

campanhas publicitárias divulgadas no Brasil, é tarefa difícil escolher qual marca e

seus slogans seriam utilizados para realizar uma análise de como a significação se

constrói no interior do texto. Nesse sentido, as marcas Omo e Coca-Cola foram as

escolhidas em razão de seu desempenho na pesquisa denominada Top of Mind, que

é encomendada pelo Jornal Folha de São Paulo ao Instituto Datafolha, criada em

1991, com objetivo de identificar quais são as principais marcas do Brasil, em

diversos segmentos, de acordo com os consumidores.

Essa duas marcas ocuparam – Omo por 17 anos consecutivos e Coca-

Cola por 16 anos – o posto de marcas mais lembradas pelo consumidor brasileiro.

Em 2009, momento de construção do corpus desta pesquisa, o Datafolha divulgou

os resultados da decida sétima edição de pesquisa. Entre as principais perguntas da

pesquisa, estava “Qual a primeira marca que lhe vem à cabeça?”.

A partir das respostas foram conhecidas as marcas mais lembradas do

Brasil, entre todas as categorias de atuação. As mais citadas formam uma categoria

chamada Top do Top of Mind. A única marca que venceu em todas as edições do

Top do Top, desde quando a categoria passou a figurar na pesquisa Top of Mind em

1993, foi Omo. Coca-Cola esteve também em primeiro lugar por 16 vezes (só não

esteve entre as campeãs em 1999, quando Omo venceu isoladamente). (DataFolha,

2009, não paginado)

Tais marcas apresentam uma trajetória de sucesso mercadológico

acompanhada de campanhas eficientes e emocionalmente inesquecíveis para o

grande público, junto a quem sua lembrança pode ser avaliada graças ao grande

investimento que realizam em campanhas publicitárias, à veiculação sempre

constante nos principais meios de comunicação de massa e à criação de linhas

criativas para suas campanhas publicitárias.

Tanto Omo quanto Coca-Cola contabilizam um considerável número de

slogans, considerando seu tempo de existência (Omo surgiu na Inglaterra em 1940,

vindo para o Brasil em 1957; e Coca-Cola teve sua marca registrada em 1893, nos

EUA). Para o nosso estudo, foram selecionados os cinco últimos slogans de cada

marca, veiculados em campanhas publicitárias brasileiras lançadas entre 2000 e

2009.

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Para fundamentar a análise das diversas questões relacionadas ao

problema, elegeu-se a teoria semiótica discursiva, iniciada por Algirdas Julien

Greimas e, por ele, desenvolvida em parceria com diversos colaboradores ao longo

das últimas décadas.

A semiótica aborda a problemática da comunicação relacionando-a ao

contexto da enunciação, necessariamente pressuposto pelo enunciado; além disso,

tem como preocupação básica descrever e explicar “o que o texto diz e como faz

para dizer o que diz” por meio da construção de sua própria estrutura e da relação

entre suas unidades.

Greimas (1917-1992), a partir de formulações de Ferdinand de Saussure,

Louis Hjelmslev, Vladimir Propp e Claude Lévi-Strauss, começou a trabalhar mais

seriamente na direção de uma teoria do sentido quando elaborou o livro Semântica

Estrutural, obra fundadora da semiótica francesa (também conhecida como Escola

de Paris) publicada em 1966, com base em uma teoria de análise estrutural do texto

por meio do estudo de sua significação.

Para construir o sentido do texto, a semiótica concebe o seu plano do

conteúdo sob a forma de um percurso gerativo. Barros (2005a) explica que a noção

de percurso gerativo do sentido é fundamental para a teoria semiótica, constituindo-

se a partir do mais simples e abstrato rumo ao mais complexo e concreto. Assim,

estudar os slogans compreenderá um esforço do analista para evitar suposições de

sentido ou intenções do texto para trabalhar sobre a organização dos elementos

linguísticos que o compõem.

No percurso gerativo de sentido, encontram-se três etapas, podendo cada

uma delas ser descrita e explicada por uma gramática autônoma, muito embora o

sentido do texto dependa da relação entre os níveis. A primeira etapa do percurso, a

mais simples e abstrata, recebe o nome de nível fundamental ou das estruturas

fundamentais e nele surge a significação como uma oposição semântica mínima. No

segundo patamar, denominado nível narrativo ou das estruturas narrativas,

organiza-se a narrativa, do ponto de vista de um sujeito. O terceiro nível é o do

discurso ou das estruturas discursivas, em que a narrativa é assumida pelo sujeito

da enunciação.

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É importante observar a colocação de Barros (2005a) de que, com a

semiótica discursiva, houve uma mudança de posicionamento frente aos fatos de

linguagem que levou ao aparecimento de propostas teóricas diversas que concebem

o texto, e não mais a frase, como unidade de sentido e que consideram, portanto,

que o sentido da frase depende do sentido do texto.

Embora, inicialmente, o slogan apresente-se muito mais como uma frase,

pode-se dizer que, a partir das relações que mantém com o contexto linguístico das

campanhas e com outros slogans da marca, constitui-se como texto. Nesse sentido,

é importante recuperar a reflexão de Barros a respeito da necessidade de se inserir

o texto no contexto de uma ou mais configurações discursivas que lhe atribuem, no

fim das contas, o sentido:

pode-se caminhar nessa direção e executar a análise contextual, desde que

o contexto seja entendido e examinado como uma organização de textos

que dialogam com o texto em questão. Assim concebido, o contexto não se

confunde com o “mundo das coisas”, mas se explica como um texto maior,

no interior de que cada texto se integra e cobra sentido (BARROS, 2005a,

p. 83).

O slogan publicitário é parte, então, de um contexto, caracterizado pela

campanha publicitária, reforçando uma ideologia comunicativa, materializada nas

peças da campanha, ao mesmo tempo em que ganha status de texto independente,

já que consegue sozinho carregar uma importante mensagem sobre a marca, se

sobrepondo em significação e importância, para o público-alvo, o enunciatário.

Nesse sentido, por meio do percurso gerativo de sentido, simulacro

metodológico que a semiótica desenvolveu para mostrar como a significação vai se

construindo no interior do texto, pode-se analisar o slogan e entender como ele se

estrutura a partir de seu plano de conteúdo, na busca de um entendimento maior de

seu caráter inteligível (cognitivo).

A proposta deste trabalho consistiu em buscar entender como se operam

estas diversas possibilidades, por meio dos estudos fundamentados na semiótica

discursiva. O objetivo não foi encontrar uma fórmula de criação dos slogans ou um

modelo engessado para a apreensão do sentido nestes textos publicitários, mas

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entender como aquele jogo de palavras consegue criar um texto tão compacto, mas

tão rico em sentidos e capacidade comunicativa. E também, colocar este elemento

tão importante na comunicação da sociedade atual, sob os estudos de uma ciência

complexa e que tem ampliado a compreensão dos mais diversos textos: orais,

escritos ou sincréticos.

Além disso, o ensino de redação publicitária carece de mais reflexões

sobre a importância do slogan e teorias que facilitem os processos de criação e

desenvolvimento de campanhas publicitárias eficientes e de slogans inesquecíveis.

Diante do exposto, elegeu-se, como objetivo geral deste trabalho, o de

interpretar e entender como se opera o sentido do slogan publicitário, tendo como

objeto os slogans criados para as marca Omo e Coca-Cola, e, como objetivos

específicos, os de verificar a aplicabilidade da semiótica discursiva ao estudar o

discurso dos slogans das marcas Coca-Cola e Omo; analisar, por meio daquela

teoria, os elementos que tornam os slogans eficazes no campo do discurso

publicitário.

O texto desta dissertação se organiza em três partes: a primeira trata das

teorias relacionadas à pesquisa, que tratam das relações entre comunicação e

semiótica, entre publicidade e marketing e de como se articula a comunicação

publicitária e, dentro dela, o slogan. A segunda parte expõe os principais aspectos

do percurso gerativo do sentido, eleito como método de análise desta pesquisa. A

terceira parte apresenta o corpus selecionado e, em seguida, as análises feitas por

meios do método de análise do percurso.

Além das três partes, o texto final comporta esta introdução, que as

precede, e as considerações finais, que as seguem. Por fim, apresentam-se, nas

referências, as obras consultadas durante a realização da pesquisa.

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15

1. TRATANDO DAS TEORIAS

No início deste capítulo, que expõe as relações entre comunicação e

semiótica, cumpre lembrar que o discurso publicitário é um dos diversos objetos do

vasto campo de estudos das ciências da comunicação. No interior de um grande

conjunto de teorias que estudam a comunicação, a semiótica se destaca como uma

teoria de análise de diversos tipos de textos.

Num primeiro momento será tratada a natureza da pesquisa em

comunicação. Depois, concentramo-nos em expor as relações entre comunicação e

semiótica, com destaque para a semiótica de Greimas. A partir daí, mostraremos a

estreita relação que se pode estabelecer entre a pesquisa em comunicação e a

semiótica discursiva.

A publicidade é forma de comunicação utilizada pelas sociedades com

caráter persuasivo evidente; mesmo se mais relacionado a instituições e marcas, o

discurso que a publicidade produz se mescla ao discurso das sociedades, tomando

parte na construção de processos culturais e ajudando a demarcar movimentos

sociais.

É importante também, para este estudo, mostrar a publicidade em sua

inserção em outro processo de natureza social, o marketing. É por meio das ações e

estratégias de marketing que a comunicação publicitária é posta em movimento nos

veículos, nas conversas e influencia outros discursos.

Não pretendemos aqui abordar todas as fases e aspectos do marketing,

porque não é o objetivo principal deste trabalho, mas não se pode deixar de tratar da

comunicação publicitária nesse contexto, já que estamos tratando de textos

produzidos por marcas de conhecimento notório e que fazem uso excessivo de

estratégias de marketing, recheadas de discursos publicitários.

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16

1.1 COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

Para melhor entender como se processam os estudos da comunicação e

a formação das teorias que dela se ocupam, precisamos trabalhar “a partir de uma

análise das disciplinas que estudam o processo de comunicação” (MARTINO, 2001,

p. 25). Santaella e Nöth (2004) afirmam que o aparecimento e expansão dos meios

de comunicação de massa transformaram a comunicação em um problema a ser

pensado, despertando a curiosidade e formando objetos de estudo para diversas

ciências. Entende-se, então, que o que delimita os estudos em comunicação não

são apenas os fenômenos que a compõem, mas também esse complexo de

diferentes áreas do conhecimento que intervém na discussão do que se produz

nessa área e de como ela se constrói.

Assim, as teorias da comunicação são consideradas plurais, porque são

formadas por questões vindas do interesse de diversas ciências. Armand e Michèle

Matellard explicam que

a história das teorias da comunicação é a história das separações e das diversas tentativas de articular ou não os termos do que frequentemente surgiu sob forma de dicotomias e oposições binárias, mais do que níveis de análise. Invariavelmente, em contextos históricos diversos, sob formulações variadas, essas tensões e antagonismos, fontes de exclusão, não deixaram de se manifestar, dividindo escolas, correntes e tendências (1999, p.10).

Os estudos da comunicação começaram, então, a partir da relação desta

com outros saberes constituídos, formando um arcabouço teórico oriundo de várias

ciências. Apesar de muitas vezes não partilharem dos mesmos princípios, ou

enfocarem a comunicação sob diferentes pontos de vista, as teorias da comunicação

formam um grande campo de estudos, atravessado principalmente pela

interdisciplinaridade. Esta é uma, senão a maior, característica das teorias da

comunicação: reunir uma “síntese de saberes” (MARTINO, 2001, p. 31) e de

interesses específicos de disciplinas independentes que são diferentes e

heterogêneos; apontar “inúmeras facetas da comunicação” (SANTAELLA; NÖTH,

2004, p. 23).

Page 20: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

17

O recorte dado por cada teoria leva ao questionamento de qual seria o

principal objeto da pesquisa em comunicação. Fiorin (2004) defende que a

comunicação é a “ação dos homens sobre outros homens, criando relações

intersubjetivas e fundando a sociedade” (p.14). Para ele, isso estende o objeto dos

estudos da comunicação a uma gama de fenômenos, indo da conversação cotidiana

à internet.

Santaella e Nöth (2004) também observam que a rapidez na evolução dos

fenômenos comunicacionais, que vem se dando desde os anos 1920, permite

chegar a um consenso de que não há “um objeto” e sim “objetos” de estudo na

comunicação e reforçam esta afirmação:

O aumento de complexidade da comunicação abriu caminho à consciência crescente de seu estatuto transdisciplinar e da inexistência de uma estrutura explicativa única ou de objetos previamente recortados para a diversidade fenomênica da comunicação (SANTAELLA; NÖTH, 2004, p. 22).

Entretanto, muitas teorias que foram elaboradas para explicar os

processos e objetos da comunicação possuem um caráter mecanicista e linear, “não

examinam relações sócio-histórias e ideológicas da comunicação e não tratam da

reciprocidade” (BARROS, 2005b, p. 51). Outras, presas apenas aos efeitos, limitam

o estudo da comunicação a aspectos negativos das mudanças que os meios de

comunicação podem efetuar nas sociedades. Essas teorias não só limitam a

importância social e científica da comunicação, como também deixam de considerar

os processos de construção do sentido, além de deixar de lado o uso da linguagem,

os aspectos históricos, sociais e ideológicos dos indivíduos e grupos.

A visão mecanicista pode ser exemplificada por um campo de estudos

que se destacou entre os anos de 1920 e 1960, nos Estados Unidos, denominado

Mass Communication Research, composto por abordagens diversas (engenharia de

comunicações, psicologia, sociologia) preocupadas com aspectos operacionais dos

meios de comunicação.

Nesse contexto, um modelo do processo da comunicação foi apresentado

pelos engenheiros Claude Shannon e Warren Weaver, criado com a intenção de

Page 21: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

18

sistematizar o processo da comunicação numa perspectiva técnica, formando um

modelo linear, muito utilizado posteriormente por diversas outras teorias:

1) A fonte 2) O transmissor 3) O sinal 4) O receptor 5)O destinatário

Já no campo das teorias críticas, observa-se no mesmo período, na

Europa, o surgimento da Escola de Frankfurt, que se ocupou da crítica aos meios de

comunicação. Os teóricos dessa escola viam os meios de comunicação como

propagadores de uma ideologia imposta pelas classes dominantes (que estariam no

comando dos meios) às classes populares, que consomem as mensagens

produzidas pelos meios, empregando técnicas de persuasão e manipulação das

mensagens que colocariam em relevo o papel central de uma ideologia de

dominação.

Destaca-se, no período em tela, a idéia de indústria cultural, a qual pode

ser definida, de forma sucinta, como “o reforço de normas não discutidas, do

encorajamento do conformismo social e da marginalização do debate sobre

questões vitais da sociedade” por meio das mensagens produzidas nos meios de

comunicação de massa (COELHO, 1980, p. 30). Apesar de também ser criticada

pelo caráter excessivo de suas críticas e de seu cunho negativo, as afirmações da

Escola de Frankfurt ainda hoje ressoam fortemente nos estudos sobre o papel das

mídias na sociedade.

O portfólio de teorias da comunicação se estende muito além do que foi

exposto, mas, para fins de exemplificação, expusemos apenas algumas para

demonstrar que muitos destes estudos não dão conta da significação dos produtos e

reflexos gerados no âmbito da comunicação, que não seria possível senão mediada

pela linguagem e, consequentemente, por meio da produção de textos.

Muitas teorias baseiam-se em um universo alheio à significação, ficando

presas ao processo quase material de composição da comunicação, indo

diretamente aos efeitos negativos e positivos sobre indivíduos e grupos. Mas quem

produz os textos são estes indivíduos e grupos, com suas vivências, experiências e

anseios, todos reunidos em seus universos de signos, de catálogos de experiências

culturais e sociais.

Page 22: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

19

Entre as teorias que acabaram por adentrar o espaço dos estudos da

comunicação, destacam-se ainda as semióticas. Esse plural deve-se ao fato de que,

em diferentes partes do mundo, grandes pesquisadores fizeram o uso do termo para

representar suas teorias, com bases metodológicas vindas de inspirações bem

diferentes, mas que possuíam em comum o interesse no ambiente discursivo, nos

textos e mensagens, e seus significados e sentidos, aspectos que ficavam relegados

ao segundo plano da pesquisa em comunicação, pela carência de interesse de

alguns pesquisadores e de bases metodológicas que dessem conta de tais

questões.

As principais correntes semióticas que abordam a problemática da

comunicação em seus estudos são a semiótica discursiva e narrativa, ou de linha

francesa, desenvolvida por A. J. Greimas; a semiótica americana ou peirciana,

fundada pelo filósofo e matemático Charles Sanders Peirce; e a da Escola de Tartu,

também conhecida como semiótica da cultura, cujo principal expoente é o russo Yuri

Lótman.

Essas três matrizes de estudos semióticos tiveram as bases de sua

origem quase que sincronicamente no período entre o final do século XIX e meados

do século XX. Santaella e Nöth enfatizam que “as relações entre comunicação e

semiótica são íntimas”, porque além de se colocarem como mais uma teoria

disponível, com visões diferentes e específicas, as teorias semióticas são também

“instrumento de criação, apontamento, direcionamento do objeto a ser estudado.

Criando também métodos de análise que enriquecem e podem ser vistos como uma

evolução dos estudos já realizados.” (2004, p. 40).

Não pretendemos tratar dos interesses de cada uma das propostas

semióticas, porém, em um trabalho no qual textos publicitários são o objeto a ser

estudado, é importante lembrar de teorias que possam ser confundidas com a

adotada. A semiótica discursiva, além de estar relacionada ao programa de pesquisa

a que se vincula este trabalho, apresenta-se como uma teoria do texto, o que a

coloca como um método pertinente de análise da construção dos sentidos em

slogans publicitários. A aplicação do seu método de análise aos produtos midiáticos,

especialmente àqueles oriundos da comunicação publicitária, permite compreender

a teoria semiótica de Greimas como um importante método de análise.

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20

Juremir Machado da Silva, ao falar sobre o pensamento contemporâneo

francês, lembra que muitos intelectuais partilharam pontos de vista sobre mídia e

comunicação, mas que eles se dividiram em grupos diversos, com ideias e conceitos

divergentes. Por essa razão, para ele, não haveria dúvidas de que nunca houve uma

escola francesa que tratasse da comunicação (2001, p. 171-172).

Por outro lado, Armand e Michèle Matellard apontam o Centro de Estudos

das Comunicações de Massa (CECMAS) como uma escola francesa surgida na

década de 1960, por iniciativa de Georges Friedmann, com o objetivo de remediar o

atraso da pesquisa francesa na área. Destacam-se neste grupo Edgar Morin e

Roland Barthes e também outros pensadores franceses que participaram da

publicação criada pelo grupo, a revista Communications, entre eles Greimas,

linguista lituano que, como já se informou, viria a desenvolver uma semiótica

discursiva.

A semiótica discursiva, doravante somente semiótica, durante seu

desenvolvimento, demonstrou ser uma teoria capaz de estudar os discursos

oriundos da comunicação, aplicando seu modelo teórico para o entendimento da

construção dos sentidos nas mensagens. Nascida no interior dos estudos da

linguagem, com influência considerável das idéias saussurianas, a semiótica é uma

das teorias, ainda em evolução, capazes de complementar os estudos da

comunicação dos diversos gêneros de discursos. Os estudos da linguagem

apontaram novos caminhos, em especial no que se refere à produção dos sentidos

que ocorrem nos processos de comunicação.

Foi a partir de Ferdinand de Saussure e seus estudos sobre a

especificidade da língua, instaurando uma das principais rupturas nos estudos

linguísticos, que estudos sobre o sistema como instrumento de comunicação se

tornaram possíveis. No início do século XX, pouco antes de começarem as

discussões sobre a comunicação e seus objetos, Saussure iniciou seu trabalho de

construção daquilo que viria a ser conhecido como linguística moderna.

Para ele, “o fato linguístico é imperceptível e indeterminável sem a

adoção prévia de um ponto de vista linguístico”, apontando um caminho diferente de

outros domínios científicos, para os quais o objeto precede o ponto de vista (2006, p.

25), pois, na base de seus estudos, postulou que o ponto de vista vem antes do

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21

objeto. Mendes conclui que "a adoção de um ponto de vista específico, seja o

linguístico, seja o comunicacional, remete-nos a um ponto de vista que precede toda

e qualquer perspectiva analítica: o da linguagem." (2006, não paginado)

A afirmação de Saussure de que a língua é essencialmente um

instrumento de comunicação constituiu-se como uma das grandes rupturas do

linguista francês. Assim, a linguagem verbal passa a ser considerada, então, matéria

do pensamento e veículo da comunicação social. Petter explica que

assim como não há sociedade sem linguagem, não há sociedade sem comunicação. Tudo que se produz como linguagem ocorre em sociedade, para ser comunicado, e, como tal, constitui uma realidade material que se relaciona com o que lhe é exterior, com o que existe independentemente da linguagem (2005, p. 11).

Essa visão saussuriana dos fatos da linguagem influenciaria Greimas,

que, ao determinar que a semiótica tem por objeto o texto/discurso, entendido em

seu aspecto global e por meio da análise de diversas questões, determina a

perspectiva da imanência como central para a teoria, uma vez que parte do

pressuposto de que o texto é um “todo de significação” que oferece, nele e por si

mesmo, as condições necessárias para sua leitura.

Na semiótica, o termo discurso também aparece empregado como

sinônimo de texto. Greimas e Courtés complementam a questão, ao afirmarem que:

(...) o termo texto é tomado como sinônimo de discurso (...) Os dois termos – texto e discurso – podem ser empregados indiferentemente para designar o eixo sintagmático das semióticas não-linguísticas: um ritual, um balé podem ser considerados textos ou discursos (2008, p.503).

Os textos criados pelos meios de comunicação são produtos de

linguagens e, conforme esclarece Fiorin, não existe nenhuma razão para que, nessa

condição, deixem de seja examinados pelas teorias linguísticas e semióticas:

Portanto, se os meios de comunicação podem ser estudados do ponto de vista da significação, uma teoria semiótica deve poder ser empregada no seu estudo, já que a Semiótica se propõe como teoria da significação. O

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sentido gerado por um filme não é diferente daquele criado por um romance. O que distingue um objeto do outro é apenas a forma de manifestar essa significação, é o plano da expressão. No entanto, as teorias semióticas modernas estão buscando analisar as diferentes manifestações possíveis da significação e, portanto, não são alheias a nenhuma forma de exprimir o sentido (2004, p. 14).

É importante ressaltar a distinção entre os objetos a que se refere Fiorin.

Para a semiótica, um texto pode ser um livro, um edifício, um quadro, uma música,

um anúncio publicitário, uma matéria jornalística, um espetáculo de dança.

Materialmente, o que os diferencia está determinado no plano de expressão, quer

dizer, em sua natureza material e na manifestação de seu conteúdo.

A busca semiótica pelo sentido é feita pela proposição de uma análise

imanente: buscar as leis que regem o discurso subjacente ao objeto textual. É no

plano do conteúdo que se desenvolve o percurso da significação, gerador do sentido

do texto, dividido em etapas não exatamente claras, mas pressupostas em seu

interior, nas quais o analista deve buscar as principais articulações entre os níveis

para encontrar o sentido de um texto. Seu instrumental de análise, um simulacro

metodológico denominado percurso gerativo de sentido, mostra como a significação

se constrói no interior do texto.

Como o texto tem um plano de expressão (em que reside a materialidade)

e um de conteúdo (lugar do conceito), sendo o primeiro bastante flexível, visto que

há diferentes planos de expressão para um mesmo de conteúdo (por exemplo, as

obras de Shakespeare, que saíram da literatura para o teatro, o cinema e a

televisão), a ênfase dos semioticistas, em um primeiro momento, recaiu sobre este

último, devido a sua estabilidade que propiciava uma análise mais segura do texto.

Segundo Barros (2005a, p. 12), um texto define-se de duas formas que se

complementam: pela organização ou estruturação, que faz dele um “todo de

sentido”, e como objeto da comunicação que se estabelece entre um destinador e

um destinatário. Assim, o estudo do texto com vistas à construção de seus sentidos

só pode ser visto como o exame tanto dos mecanismos internos quanto dos fatores

contextuais ou sócio-históricos de fabricação do sentido.

A semiótica tem como preocupação básica descrever e explicar “o que o

texto diz e como faz para dizer o que diz” (BARROS, 2005a, p.11), por meio da

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construção de sua própria estrutura e da relação entre suas unidades. Sua primeira

preocupação é explicitar as condições de apreensão e da produção do sentido,

condições estas inseridas no texto, não aquelas de quando o texto foi feito, do autor

de carne e osso, suas razões pessoais ou psicológicas. Dessa forma, a semiótica

terá que reunir todos os conceitos que, mesmo sendo eles próprios indefiníveis, são

necessários para estabelecer a definição da estrutura elementar da significação do

discurso.

A semiótica é um projeto científico em curso. Está longe de ser uma teoria

acabada e engessada em si mesma. Desde sua origem, configurada por meio da

união de diferentes, porém complementares, fontes teóricas, ela se refaz a cada

análise feita com suas bases. Indo além do modelo linear de Shannon e Weaver, ela

identifica os sujeitos da enunciação e destaca a importância dos dois “lados” da

comunicação, classificados como emissor e receptor por aquele modelo linear.

Também considera os valores históricos e sociais inscritos no texto, sem se perder

em discussões de caráter puramente ideológico ou de uma manipulação unilateral.

Os estudos semióticos apontam outros pontos de vista para a pesquisa em

comunicação.

A teoria semiótica procura apontar a necessidade de situar a

comunicação no quadro mais amplo das atividades humanas, as quais se

desenvolvem segundo dois eixos principais:

- o da produção ou da ação do homem sobre as coisas: por meio do qual

o homem transforma a natureza;

- o da comunicação ou da ação do homem sobre outros homens: criadora

das relações intersubjetivas, fundadoras, por sua vez, da sociedade.

No atual estágio das sociedades de consumo, a comunicação publicitária

tornou-se uma das mais importantes formas de comunicação, influenciando outros

discursos como o didático, o jornalístico, o literário, entre outros, e funcionando

como uma referência, senão um modelo a ser seguido. Tal lugar de destaque deve-

se a algumas características do seu fazer, da sua função e finalidade.

Harris e Seldon (apud VESTERGAARD; SCHRODER, 2004, p. 3) definem

propaganda como notícia pública, “destinada a divulgar informações com vistas à

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24

promoção de vendas de bens e serviços negociáveis”. A comunicação publicitária é

transmissora de valores e crenças num discurso claramente manipulador, universo

onde habitam os enunciados que marcam um tipo tão rico e sempre fomentador de

discussões e teorias sobre manipulação de massa, mas que nunca deixou de

assumir seu caráter de comunicação planejada e persuasiva. Assim concebido, o

discurso publicitário é um campo fértil em elementos para os estudos semióticos.

A comunicação publicitária diferentemente da jornalística, da de

entretenimento ou da comunicação pessoal, apresenta-se, desde sua concepção,

como uma comunicação planejada, com um sujeito claro, compreendido como a

marca que anuncia e se apresenta nos anúncios.

Greimas, em importante observação, afirmam que nunca há ausência de

intenções no discurso, seja de qual natureza ele for. Mesmo a afirmação prévia de

uma “isenção perante fatos e informações” num discurso já antecipa uma proposta

de manipulação; de antemão, já há a intenção de manipular. Assim, para a semiótica

discursiva, toda comunicação é de natureza manipuladora.

Aquele que se dirige ao outro sempre tem a intenção de ser ouvido e

compreendido, enquanto o outro que ouve também precisa demonstrar o

entendimento da mensagem para que a comunicação se faça; essa demonstração já

representa que a manipulação ocorreu. Aqui o sentido de manipulação está muito

distante daquele da escola de Frankfurt, que trata de intenções manipulatórias feitas

de um grupo econômico-social para outro, que visa a “incutir e estimular”

comportamentos padrões e modificar as sociedades. O sentido de manipulação

apresentado pela semiótica é aquele que faz parte de qualquer discurso, que é

inerente à própria comunicação, porque esta só é possível quando o indivíduo

compreende e aceita o que o outro comunica.

E a elaboração de uma mensagem de comunicação sempre tem uma

intenção. Se é inegável o papel cultural que a comunicação publicitária assumiu nas

sociedades modernas, a análise semiótica proporciona uma visão mais ampla da

estruturação dos sentidos, sem transformar a manipulação numa proposta negativa

da comunicação, mas classificando-a como essencial e inerente a qualquer tipo de

comunicação.

Page 28: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

25

A publicidade tem como principal objetivo a adesão ao que ela comunica.

Essa adesão se apresenta não só pela compreensão do que é dito no discurso, mas

pelo reconhecimento das marcas, pela compra dos produtos oferecidos, pela

lembrança que as pessoas mantêm dessas marcas e seus produtos.

A publicidade faz uso de estratégias retóricas e estilísticas, da repetição,

da exploração de imagens e textos em conjunto, mas o espaço que a publicidade

tem na sociedade atual nos mostra que sua capacidade de manipulação vai além de

recursos estilísticos, construindo-se no conhecimento adquirido sobre o que é e o

que pensa o público dos anunciantes e a clara ideia do que cada marca quer ser

para seu público.

Para a construção dessa percepção, a publicidade, além de ser um dos

componentes do universo comunicacional em que estão imersos os homens,

também compõe técnicas mercadológicas capazes de identificar o que é necessário

para uma empresa comunicar, como ela identifica seu público e como se faz o

caminho para chegar até ele.

Veremos a seguir como isso acontece.

1.2 PERSPECTIVAS DO MARKETING

Ainda que a origem dos termos propaganda e publicidade seja diferente,

eles são empregados basicamente como sinônimos. É interessante, então, apontar

a origem destes termos e a intersecção de seus significados, que aconteceu graças

às semelhanças entre as atividades relacionadas a eles, uma vez que ao longo

deste trabalho ambos os termos são usados indistintamente.

Propaganda é um termo que se define como a propagação de princípios e

teorias, tendo sido introduzido pelo Papa Clemente VII, em 1597, quando fundou a

Congregação da Propaganda, com o objetivo de propagar a fé católica pelo mundo.

Propagare deriva do latim e quer dizer mergulhar, plantar. Por fim, acabou

configurando-se como um conceito que remete ao processo de implantar, incutir

uma ideia, uma crença na mente alheia (SANT‟ANNA, 1999, p. 75). Já publicidade

Page 29: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

26

deriva do termo em latim publicus, designando a qualidade do que é público. Ainda

segundo Sant‟Anna (idem), trata-se do ato de vulgarizar, de tornar público um fato,

uma ideia.

A intersecção entre os dois termos se dá na caracterização do “tornar

público”. Entretanto, é fácil notar que atualmente a publicidade cumpre um papel

bem mais complexo do que simplesmente tornar público um produto, uma ideia ou

um serviço, já que o principal objetivo de seus textos é despertar emoção no

leitor/consumidor, mediante certas estratégias que visam a convencê-lo e seduzi-lo.

Ambos os termos vêm sendo utilizados para definir o conjunto de atividades que

visam a divulgar idéias, empresas e produtos por meio de criação de campanhas

publicitárias, veiculadas em diferentes meios de comunicação e em materiais de

divulgação.

A publicidade pode, então, ser vista sob dois aspectos: o primeiro deles é

ser um dos principais recursos utilizados pelo marketing, este entendido como um

complexo processo que abrange estratégias administrativas, logísticas e

comunicacionais para alavancar o reconhecimento de ideias, marcas e o lucro de

empresas. Em segundo lugar, a publicidade é entendida como uma atividade

independente, como um dos objetos mais estudados nas pesquisas de

comunicação, geradora de imenso conteúdo, composta por mensagens ricas em

criatividade, às vezes com uma produção quase artística. É instrumento de

divulgação de marcas, produtos e ideias, por meio de um discurso que, ao longo do

tempo, tornou-se único e que criou regras próprias em sua produção.

Neste tópico, serão abordados alguns aspectos gerais sobre a

publicidade e sua importância para as marcas2, qual o papel daquela nas estratégias

de marketing e como se desenvolve o discurso publicitário.

A publicidade constitui um vasto corpus a ser observado; além do uso

conjunto de sons e imagens, é composta por textos curtos e diretos, porém

altamente polissêmicos, fazendo uso de inúmeros recursos estilísticos capazes de

encantar, conquistar e de refletir os anseios não só da ideia que se procura

representar, como também do público a que se dirige. A partir desse entendimento, 2 Quando utilizado, o termo “marca” será empregado durante o trabalho como sinônimo de empresas

e/ou produtos e instituições.

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27

busca-se compreender o slogan como instrumento de representação de marcas e

um dos elementos mais importantes da comunicação publicitária.

A cada cinco anos, a AMA3 atualiza o conceito de marketing. A história do

marketing revela que, desde a década de 1960 até os dias atuais, diversas

orientações e técnicas de mercado foram desenvolvidas e aplicadas para a

lucratividade das empresas, e que cada uma delas possuía um foco específico para

os esforços de marketing. A mudança deste foco configura também modificações

nos conceitos e na função do marketing para as marcas e as empresas.

O conceito inicial era de que o marketing era uma atividade de

comercialização, com base no conceito de troca. Com o passar do tempo, houve

mudança no enfoque das funções do marketing, que variam de acordo com as

mudanças sofridas pelas marcas, pelas economias e pelas sociedades. Desde o

foco na elaboração do produto, passando pela preocupação apenas com a sua

produção, do conhecimento das necessidades dos clientes, dos segmentos de

mercado, até chegar à fase que reúne partes de todos esses interesses.

Assim, a atual definição abrange diversos setores da sociedade, que

fazem uso das estratégias de marketing não apenas para a venda de produtos e

serviços, mas também para divulgação de ideias. Segundo a AMA, a última

definição - redigida em 2008 - trouxe pela primeira vez o papel não-comercial do

marketing (incluindo, pela primeira vez o valor em sua definição), descrito, então,

desta forma: “marketing é a atividade, conjunto de regras e processos para criar,

comunicar, entregar e trocar ofertas que têm valor para os consumidores, clientes,

parceiros e sociedade em geral” 4 (tradução nossa).

Para Churchill Jr e Peter, marketing voltado para o valor “é uma

orientação para se alcançar objetivos desenvolvendo valor superior para os clientes,

que se apóia em vários princípios e pressupostos sobre aqueles” (2007, p. 10).

Philip Kotler defende que o marketing é elemento tão importante para as pessoas

3 Em todo o mundo, os estudos e pesquisas desenvolvidos sobre marketing têm como base a

definição fornecida pela AMA – A American Marketing Association é uma associação profissional americana envolvida na prática de ensino e estudo de marketing em todo o mundo. Em 1935, a National Association of Marketing Teachers, uma predecessora da American Marketing Association, concebeu a definição original para o marketing. A AMA revisita a definição de cinco em cinco anos. A próxima revisão está prevista para 2012. 4 “Marketing is the activity, set of institutions, and processes for creating, communicating,delivering,

and exchanging offerings that have value for customers, clients, partners, and society at large.”

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quanto para as empresas, o que humaniza seu papel, e afirma que: “marketing é um

processo social por meio do qual pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que

desejam com a criação, oferta e livre negociação de produtos e serviços de valor

com outros” (2005, p. 30).

O conceito dos 4P‟s, desenvolvido por Jerome McCarthy5 em 1960

(CORRÊA, 2004, p. 67), é considerado o conceito-chave do marketing atual e vem

sendo amplamente utilizado e aprimorado pelos estudiosos da área. Este conceito,

também chamado de mix de marketing, condensou as principais premissas do

planejamento de marketing nos seguintes itens: produto, preço, ponto de venda e

promoção. Este último, segundo Corrêa (2004, p. 68), graças ao crescimento da

atividade e percepção de sua importância, também foi dividido em diferentes áreas

de atuação. Em razão disso, o item promoção também compôs um mix, chamado de

comunicação de marketing, sendo dividido em quatro aspectos: propaganda,

promoção de vendas, relações públicas e venda pessoal. É por meio deste processo

que

as organizações buscam informar seu público e influenciar suas atitudes e comportamento de compra. A comunicação de marketing eficaz pode aumentar as vendas ou lucros ou ajudar a realizar outros objetivos, como tornar as pessoas cientes sobre a organização e seus produtos, formar imagens positivas, identificar clientes potenciais, formar relações de canal e reter clientes (Churchill Jr; Peter, 2007, p. 467).

Vê-se que, no tocante às atividades de marketing, a propaganda é um

dos vários aspectos de atuação. É por meio da propaganda que as empresas

expõem seus produtos e os valores que compõem a marca. A propaganda deve

informar e despertar interesse de compra/uso de produtos/serviços nos

consumidores, em benefício de um anunciante (empresa, pessoa ou entidade que

se utiliza da propaganda). Ela recebe maior destaque entre os elementos do mix,

sendo muitas vezes confundida com toda e qualquer ação de marketing; é a parte

facilmente percebida pelo mercado, quando a marca expõe seus produtos e

serviços, fazendo uso de linguagem apropriada ao seu público nos meios de

comunicação que o público consome.

5 Jerome McCarthy (Edmund Jerome McCarthy) foi professor de marketing da Universidade Estadual

de Michigan nos EUA. Ele é autor de diversos livros considerados as bases das teorias de marketing.

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29

Para Churchill Jr. e Peter (2007, p. 467), entretanto, cresce cada vez mais

a preocupação das empresas com o brand, ou seja, com a imagem que elas

transmitem ao público-alvo e qual o valor embutido nessa imagem. Branding é um

termo de língua inglesa de uso recorrente no âmbito mercadológico que, em linhas

gerais, significa o conjunto de ações ligadas à administração das marcas (Martins,

2000, p.77).

Esse conjunto de expressões e ações que caracteriza o branding

determina a imagem da marca para o público, uma imagem construída sobre um

conjunto de valores, sentimentos e atributos que constituem um catálogo de

qualidades de uma instituição, empresa, serviço ou produto. Uma marca é

reconhecida quando o público se lembra dela e atribui valor ao que ela representa

como produtos e serviços, reconhecendo a qualidade da atuação da empresa ou

instituição detentora da marca, alcançando maiores chances de consumo por ser

mais facilmente lembrada e por já ser familiar ao público-consumidor.

A imagem de marca, portanto, é entendida como um conteúdo construído

na dinâmica do mercado, como uma síntese do universo de experiências do público

com as formas de expressão da marca. A esse respeito, Sousa assevera:

O desenvolvimento da marca ocorre através de sua relação com o mercado como um todo, considerando os concorrentes, os distribuidores, os revendedores e, mais especificamente, os consumidores. Essa relação é determinada por tudo aquilo de que a marca dispõe para consumo, produtos, serviços e também as peças publicitárias, o merchandising, etc. porque esses últimos também são dispostos ao consumo (2001, p. 55).

Churchill Jr. e Peter afirmam ainda que “a função prioritária da

propaganda de negócios é informar os clientes potenciais sobre os produtos e

persuadi-los ou lembrá-los para que os comprem” (2007, p. 472). Quando se fala em

comunicação publicitária, fala-se também da “construção” de uma imagem de marca,

entendida aqui como uma imagem mental, um pensamento ou opinião formada junto

aos públicos-alvo das empresas, ultrapassando a função de informar e vender, para

chegar à função de criação e manutenção de imagens positivas e de ideologias das

marcas.

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30

Para um produto mudar a sua marca ou uma marca mudar suas formas

de apresentação, são necessárias estratégias de marketing eficientes para que haja

a transferência dos valores anteriormente atribuídos e também a incorporação dos

valores propostos por novas concepções ideológicas. A imagem de marca é

dinâmica, sendo reforçada ou renovada a cada contato do público com os produtos,

serviços ou expressões da marca. Isso exige uma constante administração dos

modos de aparição de tudo que está ligado, em especial seu plano de marketing,

para garantir a continuidade e o desenvolvimento de uma imagem positiva, de

acordo com os propósitos da empresa.

Para construir a marca como um sinal forte e positivo, dentre outras

medidas, é preciso associá-la constantemente com experiências, percepções e

sentimentos positivos ao consumidor e, assim, garantir sua propagação e reputação

no mercado, porque “a base do brand equity é a memória do consumidor”

(MARTINS, 2000, p. 199).

A propaganda, dentre outras ações de mercado, visa, em primeiro lugar,

promover a constante interação entre as marcas e os valores do sistema cultural,

pois, por meio da propaganda, são acionadas formações discursivas instaladas na

memória do consumidor e buscam uma naturalização, para tornarem-se referências

ideológicas.

O contexto do mercado e a sociedade são cruzados por renovações

culturais e tecnológicas, mudando a todo momento os conceitos de qualidade e

relevância de marcas e produtos. Sousa acredita ainda que “os modismos também

alteram o gosto e as exigências do consumidor e, constantemente, ampliam suas

expectativas” (2001, p. 47). Tudo isso torna o mercado muito dinâmico, exigindo

rapidez nas reiterações da marca.

A construção de mensagens de caráter sincrético (anúncios com texto,

som e imagem), diferentes recursos estilísticos e a escolha correta dos veículos nos

quais serão exibidas as mensagens publicitárias criam um ambiente favorável para a

lembrança de uma marca por parte de seu público-alvo. Ainda segundo Churchill Jr.

e Peter, no seu sentido mais amplo de comunicação, “a propaganda é um

instrumento de ação do marketing, sendo uma das formas pela qual ele pode ser

aplicado” (2007, p.72).

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31

Por outro lado, a propaganda se desenvolve para além de suas funções

mercadológicas em favor de produtos e serviços. Durante a criação da mensagem

publicitária, alguns métodos linguísticos e técnicas de escrita são usados

repetidamente e este conjunto de características acaba por configurar uma

linguagem da propaganda. Segundo Martins (1997, p. 33), algumas habilidades e

técnicas linguísticas em uso de anúncios e textos da propaganda acabaram

rotulando uma “linguagem publicitária”.

Ainda segundo este autor, a mensagem publicitária moldou-se por

adequação, seguindo normas da língua falada, afastando-se da norma culta e

aproximando-se da coloquialidade para buscar a adesão, criar familiaridade com os

costumes, vivências e sentimentos do destinatário. A propaganda “aumenta em

eficiência, adaptando-se ao mercado e transformando-se conforme a evolução da

sociedade consumidora, como também da mídia e dos produtos” (MARTINS, 1997,

p. 41).

1.3 A PROPAGANDA

Para Hoff e Gabrielli (2004, p. 16), a comunicação publicitária tornou-se

uma das mais importantes formas de comunicação das sociedades, indo além de

sua função primeira de divulgar e vender produtos e serviços. Criada por

encomenda e executada (produzida) por profissionais especializados, trata-se de um

processo planejado, que precisa convencer, envolver, sensibilizar e seduzir o

consumidor a fim de levá-lo ao objetivo final.

Por ser uma mensagem dirigida para grupos específicos – público-alvo,

para os profissionais de comunicação –, dos quais se estudam o comportamento, as

expectativas, as necessidades e tendências, é possível construir mensagens

adequadas à visão de mundo do público-alvo e, por consequência, bastante

persuasivas. O elevado grau de persuasão se justifica pela proliferação de produtos

com poucas diferenças marcantes; na concepção dos publicitários, a propaganda é

o diferencial.

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32

A comunicação publicitária geralmente se organiza em uma campanha. A

campanha publicitária é um conjunto de peças, criadas para divulgar um produto ou

serviço, que atendem ao mesmo objetivo de comunicação. Cada material criado a

partir da mesma solução criativa é considerado uma peça da campanha. Cada peça

tem características que devem ser seguidas e devem obedecer a uma das regras

básicas da comunicação publicitária: a linha criativa.

Linha criativa é o conjunto de ideias, estratégias, recursos e linguagens

empregados em uma campanha e que devem ser respeitados em sua aplicação em

todas as peças que a compõem. Isso quer dizer que as peças devem manter uma

isotopia, criar uma “linha de raciocínio” na qual cada peça lembra e fortalece a outra,

aumentando a capacidade de lembrança e identificação por parte do público,

formando uma parceria imbatível com os processos de repetição e redistribuição das

peças,

a repetição tem duas funções. Uma delas é ampliar as possibilidades de recepção e de apreensão do conteúdo da mensagem, já que há sempre elevados custos a se considerar na criação e veiculação de uma peça ou de uma mensagem para persuadir e conduzir o consumidor/interlocutor à ação proposta na comunicação (SANT‟ANNA, 1999, p. 88).

Para Martins (1997, p.41), a eficácia da mensagem publicitária depende

do ajuste a três fatores na composição da mensagem:

- ao mercado: com seu nível sociocultural, necessidades básicas, hábitos

e poder aquisitivo;

- aos veículos de comunicação: com seus códigos específicos, seu

alcance de audiência e receptividade;

- ao produto/serviço: objeto da mensagem, suas características, utilidade,

desempenho, custos e aceitação do público.

Para Sandmann (1997, p. 13), a propaganda deve valer-se de meios

estilísticos, que façam o público prestar atenção no texto; “a linguagem da

propaganda enfrenta o maior dos desafios: prender, como primeira tarefa, a atenção

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33

do destinatário”. Não só prender a atenção, mas também realizar mudanças no

modo de ver produtos e ideias. Assim, a comunicação publicitária

produz-se mediante a elaboração de narrativas que operam afetando os modos de apreensão do mundo, como orientadores – não normativos, mas sugestivos – das condutas. A eficácia dessa comunicação não ocorre com base num argumento convincente, mas numa retórica que, postulando realidades, opera de modo performático (ALVES, 2003, p.205).

Escrever um anúncio publicitário é produzir tecnicamente um texto capaz

de “provocar mudança de opiniões e de sentimentos nos leitores e persuadi-los a

assumir comportamentos novos em relação a determinado produto ou serviço”

(Sant‟Anna, 1999, p. 14).

1.4 O SLOGAN

Um dos componentes da comunicação publicitária que se destaca neste

processo é o slogan; parte da campanha de propaganda, constitui-se em uma

máxima sobre o produto ou o fabricante que, mais do que as outras informações,

deve ser facilmente lembrada (CHURCHIL; PETER, 2007, p. 479). Tem a finalidade

de chamar a atenção, destacar qualidades e características do produto, recordar

marcas ou imagens de uma instituição.

O termo slogan não é proveniente do inglês. Sua origem é gaélica, língua

do povo céltico: sluagh-ghairm, que significava, na velha Escócia, “o grito de guerra

de um clã”. O inglês adotou o termo em meados do século XIX, em divisa de um

partido, e, a seguir, referindo-se a uma palavra de ordem eleitoral (REBOUL, 1975,

p. 7); foram os americanos que lhe deram sentido comercial.

O slogan deve resumir, de forma direta, a mensagem que se deseja

transmitir; uma palavra a mais pode destruir o efeito desejado. São duas as funções

do slogan: a adesão, ou seja, pela força da repetição deve ocorrer a memorização e,

como consequência, a lembrança na hora da decisão de compra; a associação à

Page 37: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

34

informação ou identificação, seja do produto, do serviço, ou do segmento em que a

empresa atua (LUPETTI, 2003, p. 29).

O slogan acompanha o produto ou empresa ao longo de sua vida

comercial, podendo sofrer alterações ao longo do tempo, submetido que se encontra

a mudanças percebidas no mercado; dessa forma, o conceito de marca, por

exemplo, inicialmente apresentado em um slogan que destaca características

específicas do produto, pode deixar de atender uma demanda que deseje uma

significação que vá além da marca; neste caso, a significação deve transcender o

produto/serviço/empresa e procurar elementos fundamentais no público-alvo. O

slogan é um importante elemento da comunicação publicitária. É notório o poder que

ele tem de carregar o que é uma marca/empresa/produto e, ao mesmo tempo, a

capacidade que tem de envolver o público-alvo.

Alguns procedimentos na elaboração de um slogan sugerem a existência

de fórmulas ou modelos de elaboração, porém não existem fórmulas precisas para a

criação de um slogan eficiente, e também não existem conclusões precisas sobre o

porquê de sua efetividade. A criação de um slogan para as marcas implica em

trabalhar com palavras: significados e sonoridades. A escolha das palavras e a

forma de combiná-las vai da significação do texto ao uso de recursos sonoros e

visuais, um jogo entre conteúdo e forma, visando a efeitos característicos.

Não basta somente elaborar um slogan interessante e tentar associá-lo à

marca. Isso é necessário, mas não é suficiente, uma vez que o slogan também deve

ser coerente com a personalidade da marca, estando previamente em sintonia com

algum universo de valores do consumidor. Assim, o slogan terá a função de

sintetizar, relembrar, atualizar e reforçar uma relação que foi sendo previamente

construída entre os consumidores e a marca.

Reboul aponta três principais papéis do slogan: fazer aderir, prender a

atenção e resumir (1975, p. 11-39). Ele considera o slogan uma fórmula concisa e

marcante, facilmente repetível, polêmica e frequentemente anônima, destinada a

fazer agir as massas tanto pelo seu estilo quanto pelo elemento de autojustificação,

passional ou racional que ela comporta. Reboul aponta como uma das principais

características do slogan um sentido sempre explícito.

Page 38: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

35

Ele acredita que o slogan não faz referência à propaganda devido à sua

origem histórica, porque há slogans que não são nem comerciais nem políticos, mas

ideológicos. Mas podemos discordar de Reboul e seguir o exemplo da definição de

marketing, que já não é mais a mesma desde sua elaboração, graças às mudanças

que o mercado faz de seu uso. Mesmo o que Reboul chama de slogan ideológico

nasce na característica do fazer aderir, do propagar uma ideia, o que nos lembra

que a propaganda nasceu com fins comerciais.

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36

2. O MÉTODO E OS OBJETOS DE ANÁLISE

2.1 O PERCURSO GERATIVO DO SENTIDO

A semiótica, como a concebeu Greimas, tenta determinar as condições

em que um objeto se torna objeto significante para o homem. Herdeira das

concepções de Saussure e de Hjelmslev, avança da ideia de linguagem como

sistema de signos para a de sistema de significações, ou melhor, de relações, pois a

significação decorre da relação.

Para Barros (2002, p. 13), falar da significação é falar do sentido negativo,

decorrente do postulado saussuriano da “diferença”. Uma grandeza semiótica

qualquer é, então, uma rede de relações e nunca um termo isolado. O enfoque

semiótico procura organizar o texto como uma totalidade de sentido e determinar o

modo de produção desse sentido, isto é, compreender como o texto se estrutura

para dizer o que diz.

A análise semiótica vê a construção do sentido por meio de um percurso,

uma rede de relações que identifica e organiza o sentido depreendido do texto e

organizada em níveis. Estes se constroem a partir de estruturas profundas e

abstratas, nas quais se inicia a construção do sentido do texto, passa pelo nível em

que se organiza a narrativa sob o ponto de vista de um sujeito, e chega ao nível das

estruturas discursivas, em que se concretizam as bases abstratas, elevando o

sentido rumo à superfície, mais próximo à manifestação.

As estruturas profundas são as estruturas mais simples que geram as

estruturas mais complexas. A maior complexidade deve ser entendida também como

uma “complementação” ou um “enriquecimento” do sentido, porque novas

articulações são introduzidas a cada etapa do percurso e a significação nada mais é

que articulação. É assim que se considera o trabalho de construção do sentido, da

imanência à aparência, como um percurso gerativo.

É preciso entender o percurso gerativo como um percurso elaborado para

dar conta do conteúdo do texto, anterior à manifestação linguística e independente a

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37

ela. O nível propriamente semiótico, imanente, compreende o percurso gerativo todo

e distingue-se do nível linguístico (ou pictórico, gestual, etc.) aparente, que se situa

fora do percurso gerativo e em que se reconhecem as estruturas textuais (BARROS,

2002, p. 15). O texto deve ser compreendido em diferentes instâncias de abstração

nas quais, por consequência, são determinadas as etapas entre a imanência e a

aparência e elaboradas descrições autônomas de cada um dos patamares de

profundidade estabelecidos no percurso gerativo, dos quais se fala a seguir.

O primeiro deles é o nível fundamental, instância mais profunda, simples

e abstrata, em que são determinadas as estruturas elementares do discurso e a

significação como uma oposição semântica mínima. O segundo é o nível narrativo,

no qual se organiza a narrativa do ponto de vista de um sujeito, e trata dos valores

inscritos nos objetos. Por fim, há o nível discursivo, mais próximo da manifestação

textual, em que a narrativa é assumida pelo sujeito – ou sujeitos – da enunciação.

São momentos diferentes de articulação do sentido, cada um deles a ser descrito e

explicado por uma gramática autônoma, embora o sentido do texto dependa da

relação entre os níveis. Estas gramáticas - fundamental, narrativa e discursiva – são

formadas, cada uma, por dois componentes: uma sintaxe e uma semântica,

conforme explica Fiorin:

cada nível é dotado de uma sintaxe, entendida como o conjunto de mecanismos que ordena os conteúdos, e de uma semântica, tomada como os conteúdos investidos nos arranjos sintáticos, sendo que a segunda tem uma autonomia maior que a primeira, o que implica a possibilidade de investir diferentes conteúdos semânticos na mesma estrutura sintática (2009, p. 21).

Para realizar uma análise semiótica, é preciso saber como se dá o

desenvolvimento de cada etapa do percurso e as relações entre a sintaxe e a

semântica de cada nível. É o que veremos a partir daqui.

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38

2.1.1 NÍVEL FUNDAMENTAL

O nível fundamental comporta as estruturas elementares; nele, os

sentidos do texto são vistos, primeiramente, como uma categoria ou oposição

semântica mínima. Para descobrir a oposição de base, é preciso analisar quais

elementos que compõem o texto estão em oposição determinada por um traço

semântico em comum. Esses elementos formam a categoria de base de um texto e

dão sustentação a toda a análise.

Por exemplo: se um texto trata de questões relacionadas à vida, pode-se

postular que sua categoria semântica de base encontra-se na relação vida/morte;

isso é possível porque ambos apresentam um traço semântico comum, do estar ou

não vivo. Os termos opostos de uma categoria semântica mantêm entre si uma

relação de contrariedade, unidos por traços comuns, estabelecendo uma relação de

pressuposição recíproca: vida faz sentido ao pressupor a morte; a felicidade, a

infelicidade; o usufruto, o desperdício, etc.

No nível fundamental, a sintaxe explica as primeiras articulações

semânticas e as operações sobre elas efetuadas. O sentido nasce da

descontinuidade, da ruptura, da percepção da diferença. Ainda no nível fundamental,

é preciso estabelecer as operações sintáticas que põem em movimento as relações

de oposição.

Essas relações não acontecem diretamente entre os termos opostos,

mas, antes, devem passar pelas operações lógicas de negação e de asserção,

devendo a relação manifestar sua dupla natureza de conjunção e de disjunção; “se a

negação serve essencialmente para produzir termos contraditórios, a asserção é

capaz de reunir os termos situados no eixo dos subcontrários” (GREIMAS;

COURTÈS, 2008, p. 474). Ao aplicar uma operação de negação a cada um dos

contrários, obtêm-se dois contraditórios; cada um deles implicará o termo contrário

daquele de que é contraditório e, para distingui-los dos outros dois contrários, são

chamados de subcontrários.

A semântica do nível fundamental abriga as categorias de base e a

valorização axiológica dos termos que as compõem. As categorias semânticas são

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39

organizadas por um quadrado que organiza logicamente os termos da categoria,

conforme explicam Greimas e Courtès:

compreende-se por quadrado semiótico a representação visual da articulação de uma categoria semântica qualquer. A estrutura elementar da significação, quando definida – num primeiro momento – como uma relação entre ao menos dois termos, repousa apenas sobre uma distinção de oposição. (2008, p.400)

As operações lógicas de negação e de asserção, que veremos se articularem

no quadrado semiótico podem ser exemplificadas assim, ainda usando como

exemplo a categoria vida/morte:

Vida Morte (contrários)

Não-vida Não-morte (subcontrários)

Assim, a semântica do nível fundamental se apresenta como um

inventário de categorias sêmicas cuja representação sintagmática é garantida pelas

operações sintáticas. As categorias semânticas podem ser axiologizadas na

instância das estruturas fundamentais pela projeção, sobre o quadrado que as

articula, da categoria tímica /euforia/ versus /disforia/. São elas que imprimem os

valores negativos ou positivos, determinando se a relação de um termo é de

conjunção ou de disjunção.

O termo aplicado à marca /euforia/ é considerado valor positivo; já o

aplicado à /disforia/ é visto como um valor negativo. Em um texto, esses valores

axiológicos não são pré-determinados pela análise; ela oferece o caminho para

reconhecê-los, mas eles estão inscritos no texto.

Os termos da categoria semântica são, dessa forma, investidos de

valores axiológicos, e não apenas valores descritivos, e surgem, em relação à

semântica narrativa, como valores virtuais, ou seja, não relacionados ainda a um

sujeito. A atualização só ocorre na instância superior da semântica narrativa, quando

tais valores são assumidos por um sujeito. A categoria tímica /euforia/ vs. /disforia/,

para Greimas, está por detrás, ou melhor, de acordo com a metáfora do percurso

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40

gerativo, por baixo das organizações modais que definem as paixões (BARROS,

2002, p.25).

Fiorin (2009, p.24) enfatiza que a semântica e a sintaxe do nível

fundamental representam a instância inicial do percurso gerativo, responsável por

tentar explicar os níveis mais abstratos da produção, do funcionamento e da

interpretação do discurso.

2.1.2 NÍVEL NARRATIVO

O nível narrativo é a etapa do percurso em que se constroem as

estruturas narrativas. Nele, no lugar das operações lógicas vistas no nível

fundamental, ocorrem as transformações narrativas executadas por um sujeito. Aqui

entram em cena sujeito e objeto: as categorias semânticas fundamentais convertem-

se em valores dos sujeitos e são introduzidos nos objetos com os quais o sujeito se

relaciona.

No nível narrativo, a sintaxe direciona o fazer, uma espécie de

representação das ações do homem no mundo e das suas relações com o outro,

buscando mostrar e analisar como a especificidade de cada texto pode ser

contemplada por um modelo mais genérico e previsível, e não, como acreditam

alguns, criar uma camisa-de-força, uma fôrma, em que devam obrigatoriamente

entrar os mais diversos discursos.

Neste patamar do percurso, o ponto central é a narratividade, que se

define como uma transformação pela qual passa o sujeito, situada entre dois

estados sucessivos e diferentes. Isso significa que deve ocorrer uma narrativa

mínima, a qual comporta um estado inicial, uma transformação e um estado final.

Como transformação de conteúdo, a narratividade é um componente da teoria do

discurso e deve ser entendida como a sucessão de estados e de transformações,

responsável, nessa instância, pela produção do sentido.

Parte-se de duas concepções complementares de narratividade: a)

transformação de estados, de situações, operada pelo fazer transformador de um

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41

sujeito, que age no e sobre o mundo em busca de certos valores investidos nos

objetos; b) sucessão de estabelecimentos e de rupturas de contratos entre um

sujeito e outro, de que decorrem a comunicação e os conflitos entre sujeitos e a

circulação de objetos-valor.

A narratividade concretiza-se por meio de um programa narrativo,

considerado a unidade operatória elementar da sintaxe narrativa. O que define um

programa narrativo são as transformações de estado, quer dizer, as mudanças na

relação entre sujeito e objeto ou entre um sujeito e outro sujeito. É importante neste

momento inicial em que tratamos do nível narrativo trazer o esclarecimento de Fiorin:

“não se pode confundir sujeito com pessoa e objeto com coisa. Sujeito e objeto são

papéis narrativos que podem ser representados num nível superficial por coisas,

pessoas ou animais” (2009, p. 29).

Os textos são compostos por um ou mais programas narrativos,

classificados em dois tipos. O programa narrativo principal de um enunciado é

chamado programa de base; é ele que abrange todo o texto e contém a ideia central

da narrativa. Já os programas narrativos pressupostos e necessários aos de base

são chamados programas de uso.

Greimas e Courtés esclarecem que os programas narrativos de uso “são

em número indefinido, ligado à complexidade da tarefa a cumprir”, que é a de operar

as transformações de estado que auxiliam ou dificultam o programa de base; “no

nível discursivo os programas narrativos podem estar explícitos ou permanecer

implícitos: sua explicação é uma exigência da sintaxe narrativa de superfície” (2008,

p. 389-390).

Na sintaxe narrativa, há dois tipos de enunciados elementares:

- enunciados de estado: que estabelecem uma relação de junção

(disjunção ou conjunção) entre sujeito e objeto. Havendo dois tipos de enunciados

de estado, há também duas espécies de narrativas mínimas: a de privação e a de

liquidação de uma privação. Na primeira, ocorre um estado inicial conjunto e um

estado final disjunto; na segunda, o contrário, um estado inicial disjunto e um final

conjunto.

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42

- enunciados de fazer: que efetuam a passagem de um estado a outro, ou

seja, de um conjuntivo a um disjuntivo e vice-versa. O objeto da transformação é,

portanto, um enunciado de estado. Os dois tipos de enunciado, de estado e de fazer,

marcam no discurso a diferença entre estado e transformação, cujo reconhecimento

e distinção constituem o primeiro trabalho da análise narrativa.

Todo enunciado que rege outro enunciado é um enunciado modal, e o

regido, um enunciado descritivo. No programa narrativo, o enunciado de fazer é um

enunciado modal, que “modaliza” o enunciado de estado descritivo. É preciso,

porém, lembrar que os enunciados de estado também podem ser enunciados

modais.

Fiorin (2009, p. 29) ressalta que os textos são uma série de enunciados

de estado e de fazer, passando de narrativas mínimas a complexas; o que organiza

tal série, tornando a narrativa complexa, é uma estrutura canônica que compreende

quatro fases: a manipulação, a competência, a perfórmance e a sanção.

Na manipulação, um sujeito age sobre o outro. É relevante, antes de

expor a importância deste aspecto da estrutura canônica para o percurso,

apresentar a afirmação de que “o percurso gerativo do sentido prevê um percurso

anterior ao fazer (transformação de estado) que corresponde justamente à

modalização do sujeito operador, a qual ocorre sempre numa relação entre sujeitos”

(LARA; MATTE, 2009, p. 24).

É na fase da manipulação que se instauram as modalidades que

virtualizam, que estabelecem o sujeito; as modalidades do querer e do dever-fazer,

que permitem constituir o sujeito da narrativa. A manipulação trabalha com a

persuasão ao articular o fazer persuasivo (do destinador-sujeito que oferece valores

modais ou descritivos desejados ou temidos) e o fazer interpretativo (do destinatário-

sujeito).

Na fase de competência, o sujeito que vai realizar a transformação central

da narrativa é dotado de um saber ou poder fazer. A competência também modaliza

o sujeito, mas não mais no nível do querer ou dever, mas em tornar possível o fazer,

isto é, está focada no saber-fazer e no poder-fazer.

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43

No que se refere à dotação de competência semântica, esta deve ser

entendida como um contrato fiduciário, em que o destinador, graças a um fazer

persuasivo, busca a adesão do destinatário; pretende-se fazer que este, ao exercer

o fazer interpretativo que lhe cabe, creia ser verdadeiro o objeto apresentado, o

discurso do outro e o próprio destinador. Há estreita vinculação entre a confiança e a

crença, o que permite falar em contrato fiduciário. A confiança entre os homens

fundamenta a confiança nas palavras deles sobre as coisas e o mundo e,

finalmente, a confiança ou a crença nas coisas e no mundo.

A atribuição de competência modal ao sujeito, para levá-lo a fazer,

constitui a manipulação propriamente dita e pressupõe o contrato fiduciário acima

referido. Tal manipulação consiste na doação de valores modais, cuja organização

determina a competência do sujeito. A confiança estabelecida entre os sujeitos é, na

maior parte das vezes “(...) um contrato imaginário, um simulacro. Os simulacros não

têm fundamento intersubjetivo, embora determinem, mesmo assim, as relações

entre sujeitos” (BARROS, 2005a, p. 50).

A perfórmance é a fase em que se dá a transformação (mudança de um

estado a outro) central da narrativa. A perfórmance é o momento da transformação,

da mudança, quando um sujeito opera sobre outro que sofre a junção (disjunção ou

conjunção).

A manipulação do destinador distingue-se, pelos critérios vistos, da ação

do sujeito: o sujeito, pela perfórmance, altera estados, faz ser, e simula a ação do

homem sobre as coisas do mundo; o manipulador transforma o sujeito, ao modificar

suas determinações semânticas e modais, ou seja, faz-fazer, e representa a ação do

homem sobre o homem.

O destinador manipulador segue um percurso que se inicia como

estabelecimento do contrato, para, em seguida partir para a manipulação

propriamente dita; é o momento dos investimentos persuasivos e da interpretação. E

seu percurso se encerra no momento da recusa ou da aceitação do contrato.

(BARROS, 2002, p. 38)

Na sanção, ocorre a constatação de que a perfórmance se realizou e,

consequentemente, o reconhecimento do sujeito que operou a transformação. É na

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44

fase da sanção que ocorrem as descobertas e as revelações, são atribuídas as

recompensas e os castigos (FIORIN, 2009, p. 29-31). A sanção pode ser positiva ou

negativa, dependendo de como se desenvolveu a competência do sujeito

manipulado.

As transformações podem ser pressupostas e as fases da estrutura

canônica podem ser ocultas ou mesmo não se realizarem. Tais fases, que regem a

narrativa complexa, pressupõem uma relação anterior entre sujeitos, um contrato

que permanece entre a tensão e o relaxamento de forma flexível, conforme se

articulam as fases da estrutura canônica.

Cumpre ressaltar: as fases não se encadeiam numa sucessão temporal

explícita apenas, mas também por relações de pressuposição lógica. Quando se

reconhece que uma transformação se realizou, a sua realização está pressuposta na

constatação. Assim, as fases da sequência canônica na narrativa não precisam

estar necessariamente arranjadas conforme sua descrição; algumas podem ficar

ocultas e são recuperadas a partir de pressuposição; além disso, algumas narrativas

não se realizam completamente e, ainda, podem relatar, preferencialmente, uma das

fases. As narrativas podem conter também mais de uma sequência canônica.

A comunicação entre sujeitos ocorre por meio de objetos de valor que

circulam entre eles e que os constituem como sujeitos. Barros, ao tratar da questão,

afirma que:

É preciso, assim, rever as noções e as denominações de “emissor” e de “receptor” da comunicação, pois, nessa perspectiva, os sujeitos da comunicação não podem mais ser pensados como caixas vazias de emissão e de recepção de mensagens. (2005b, p. 48)

Barros (2002, p. 36) classifica os sujeitos como Competentes, tanto o

destinador quanto o destinatário, porque possuem qualidades que permitem que se

comuniquem. Nessa perspectiva, trata das chamadas qualidades modais: o querer,

o dever, o saber e o poder fazer, as quais, ao dotarem os sujeitos da competência

citada pela autora, permitem que eles se comuniquem, a partir de valores

decorrentes das relações históricas, sociais e ideológicas.

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45

Para persuadir e interpretar, é preciso comparar os conhecimentos,

valores e crenças que fundam a competência semântica dos sujeitos, com aqueles

que estão em jogo na comunicação, por meio de estratégias mudam historicamente,

de cultura para cultura:

Os conhecimentos, crenças, sentimentos e valores dos sujeitos são resultantes de outras tantas relações de comunicação-manipulação-interação anteriores e vão-se modificando e construindo, portanto, outros sujeitos a cada nova relação de comunicação (BARROS, 2005b, p. 49-50).

A partir daqui podemos verificar os elementos que dão concretude e

aproximam o enunciado da manifestação.

2.1.3 NÍVEL DISCURSIVO

No nível discursivo, as formas ainda abstratas do nível narrativo são

revestidas de termos concretos; é nesse nível que se produzem variações de

conteúdos narrativos invariantes. O percurso gerativo é composto de níveis de

invariância crescente, porque um patamar pode ser concretizado pelo patamar

imediatamente superior de diferentes maneiras, isto é, o patamar superior é uma

variável em relação ao imediatamente inferior, que é uma invariante (FIORIN, 1999).

Barros (2005a, p. 123) esclarece que o nível discursivo é o patamar mais

superficial do percurso, e o mais próximo da manifestação textual; as estruturas

discursivas são mais específicas e mais complexas semanticamente que as

estruturas narrativas e as fundamentais; e as estruturas narrativas convertem-se em

estruturas discursivas quando assumidas pelo sujeito da enunciação.

A análise discursiva opera sobre os mesmos elementos que a análise

narrativa, mas retomando aspectos que tenham sido postos de lado, como as

projeções da enunciação no enunciado, os recursos de persuasão utilizados pelo

enunciador para manipular o enunciatário ou a cobertura figurativa dos conteúdos

narrativos abstratos.

No nível discursivo, encontra-se uma sintaxe que trabalha com as

projeções da enunciação no enunciado. A enunciação projeta no enunciado os

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46

atores, e as coordenadas de tempo e de espaço de sua realização. Essa projeção

se dá por meio dos mecanismos de debreagem e embreagem, que determinam

como as categorias de pessoa, espaço e tempo são construídas no enunciado.

Esses mecanismos são classificados de acordo com a relação que

estabelecem com as pessoas, os tempos e os espaços. Se num enunciado são

projetados os atores, espaços e tempos da enunciação pressuposta (eu/tu – aqui –

agora), diz-se que a debreagem é enunciativa. Aqui a intenção é produzir efeitos de

sentido de subjetividade e parcialidade. Já na debreagem enunciva os atores,

espaços e tempos do enunciado são ocultos (ele – lá – então), diz-se que é

enunciva, buscando produzir efeitos de objetividade e imparcialidade.

O outro mecanismo de projeção, a embreagem, decorre da suspensão

das oposições de espaço, tempo e pessoa. Ela acontece, por exemplo, quando se

emprega a terceira pessoa no lugar da primeira, para ressaltar o papel social do

enunciador e afastar os efeitos de subjetividade.

Fiorin (2009) explica, então, que existem dois níveis de concretização das

estruturas narrativas: a tematização e a figurativização. Se a concretização parar no

primeiro nível, teremos textos temáticos; se vier até o segundo, teremos textos

figurativos. Os primeiros são compostos predominantemente de temas, isto é, de

termos abstratos.

Figuras são os termos presentes no texto que remetem ao mundo real:

cor, altura, dançar, brincar, lavar, sujeira, etc.; já temas são categorias que

classificam e organizam os elementos figurativos: amor, vergonha, alegria,

satisfação, etc. Os textos são construídos em articulações entre figuras e temas;

alguns textos possuem em seu nível discursivo mais figuras, o que o torna um texto

figurativo; por meio das figuras presentes, é possível depreender o tema que trata o

discurso.

Lara e Matte (2010, p. 70) apontam uma perspectiva a partir desse

conhecimento, a de analisar a forma como as culturas abordam determinados

assuntos por meios das ligações entre os temas e figuras que transitam entre os

discursos produzidos em diversos momentos históricos. Esse caminho também

aponta outro, o da noção de isotopia, que é definida pela “recorrência de categorias

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47

sêmicas ao longo de um texto, sejam elas temáticas (abstratas) ou figurativas”

(LARA; MATTE, 2010, p. 70).

Tal recorrência estabelece um plano de leitura para os textos, é o que

demonstra os valores que estão inscritos nele, determinando a interpretação do

texto por ele mesmo. Lara e Matte (2010, p. 81) observam que figuras e temas são

construções culturais: uma figura pode representar diferentes temas em diferentes

épocas sociais e culturais, ou variar de uma cultura para outra. As autoras ainda

defendem que a observação é muito importante para situar a análise temático-

figurativa em termos culturais, o que garante a eficácia da análise no momento de

apontar, corretamente, quais são os temas e as figuras de um texto e o que eles

representam.

Para a semiótica, a verdade é um efeito do discurso e resulta de uma

interpretação. Afirma Barros que o enunciador propõe um contrato que estipula

como o enunciatário deve interpretar a verdade do discurso:

O reconhecimento do dizer-verdadeiro liga-se a uma série de contratos de veridicção anteriores, próprios de uma cultura, de uma formação ideológica e da concepção, por exemplo, dentro de um sistema de valores, de discurso e seus tipos. O contrato de veridicção determina as condições para o discurso ser considerado verdadeiro, falso, mentiroso ou secreto, ou seja, estabelece os parâmetros, a partir dos quais o enunciatário pode reconhecer as marcas da veridicção. A interpretação depende, assim, da aceitação do contrato fiduciário e, sem dúvida, da persuasão do enunciador para que o enunciatário encontre as marcas de veridicção do discurso e as compare com seus conhecimentos e convicções, decorrentes de outros contratos de veridicção, e creia, isto é, assuma as posições cognitivas formuladas pelo enunciador. (2002, p. 94)

É a partir desse vasto campo de conhecimento e de prática que partimos

para as análises que irão revelar como se engendram os sentidos em slogans

publicitários. Tal pesquisa se dá por meio de um corpus selecionado a partir de

slogans das marcas Omo e Coca-Cola, como veremos a seguir.

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48

3. LENDO OS SLOGANS PELA ANÁLISE SEMIÓTICA

O percurso gerativo de sentido é o instrumental de análise empregado na

interpretação dos slogans que compõem o corpus desta pesquisa.

Desde 1991, o Instituto Datafolha e o Jornal Folha de São Paulo realizam

anualmente a pesquisa Top of Mind, que visa a identificar as marcas mais

lembradas em todo o Brasil, em diversos seguimentos (DataFolha, 2009, não

paginado).

Os dados colhidos desde então servem para mensurar a força que as

grandes marcas possuem junto aos consumidores, para medir os resultados das

ações de comunicação delas; consequentemente, eles servem também como

importante instrumento para o desenvolvimento de novas ações de marketing e

propaganda. Em 1993, foi criada a categoria Top do Top, que busca saber qual

marca é a mais lembrada no ano pelo consumidor brasileiro, independentemente de

categoria.

A marca Coca-Cola figura na lista das marcas mais lembradas desde a

criação da categoria e apenas em 1999 ela não compôs a lista; já a marca de sabão

em pó Omo permanece entre as primeiras desde o início.

As marcas apresentam uma trajetória de sucesso mercadológico

acompanhada de campanhas eficientes e inesquecíveis para o grande público, junto

a quem sua lembrança pode ser avaliada graças ao grande investimento que

realizam em campanhas publicitárias, à veiculação sempre constante nos principais

veículos de comunicação de massa e à criação de linhas criativas para suas

campanhas publicitárias.

Em sua história, ambas as marcas apresentaram diversos slogans. O

número significativo de slogans registrados pelas marcas ao longo do tempo exige

um recorte para fins deste estudo. A delimitação do corpus compreende os slogans

apresentados pelas marcas em campanhas publicitárias veiculadas no período entre

2000 e 2009, período durante o qual, de um modo ou de outro, a pesquisadora

esteve envolvida com estudos que dariam origem ao projeto deste trabalho. Assim, a

partir dos elementos teóricos, serão analisados cinco slogans de cada marca:

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49

Omo

1.Omo faz, Omo mostra.

2.Melhor que Omo só Omo.

3.Só Omo lava mais branco.

4.Porque não há aprendizado sem

manchas.

5.Porque se sujar faz bem.

Coca-Cola

1.Gostoso é viver...

2.Essa é a real.

3.O lado Coca-Cola da Vida.

4.Viva do lado Coca-Cola da Vida.

5.Sua felicidade transforma.

Tabela 01 – Slogans da Análise

3.1 OMO

3.1.1 OMO FAZ, OMO MOSTRA.

No primeiro slogan, verifica-se, inicialmente, a depreensão de sua

categoria semântica de base. A observação dos elementos do texto permite inferir

dois conteúdos: um primeiro que trata de competência e incompetência; e um

segundo que trata de atividade e passividade.

Uma vez que os termos da categoria devem ser organizados como uma

oposição, apresentam-se as categorias dispostas da seguinte forma:

Competência Incompetência

Não-competência Não-incompetência

Atividade Passividade

Não-passividade Não-atividade

Há uma relação entre as duas categorias que poderia, num primeiro olhar,

permitir apenas a identificação de termos relacionados à atividade e à passividade.

Entretanto, no momento em que a análise passa ao trabalho de marcação tímica dos

Page 53: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

50

elementos dessa categoria, verifica-se a necessidade de apontar outros elementos

semânticos presentes na construção do texto. Assim, se este se articula sobre uma

estrutura elementar que trata da ação a ser realizada pelo sujeito, também revela um

outro sentido, que é o de ela se apresentar como uma ação superior a de outros, os

quais não possuem a capacidade de efetivá-la.

Na primeira categoria, é eufórico o termo atividade, que implica em ação,

somada à disposição de mostrar. Não é uma atividade qualquer que se expõe; trata-

se de uma ação superior, que demanda uma competência responsável por

demonstrar que se pode fazer melhor.

Se se pensar nos interesses que se encontram subjacentes a todo

discurso publicitário, pode-se inferir que esse discurso pressupõe que as atividades

aconteçam motivadas pela necessidade de demonstrar alguma coisa superior,

melhor que outras. A comunicação publicitária produz discursos com o objetivo de

atender à necessidade das marcas de divulgar o que fazem e oferecem, em

mercados povoados de concorrentes que fazem o mesmo.

O objetivo do discurso publicitário não é o de apenas mostrar o que faz

uma marca; a ampliação dos mercados exigiu a construção de discursos que não

mais “avisam” o que as marcas oferecem, mas que demonstrem porque, entre tantas

outras semelhantes, uma merece ser escolhida. Além disso, tal discurso pretende

conduzir o público para a percepção dessa superioridade e capacidade: qual, dentre

tantas marcas que oferecem o mesmo benefício, irá chamar mais atenção ao

demonstrar que pode fazer mais e melhor do que a similar?

No enunciado “Omo faz, Omo mostra”, manifesta-se uma narrativa

mínima: de um estado inicial de inércia e desconhecimento passa-se para um

estado final do realizado e de sua revelação. A transformação se dá claramente no

texto; o estado inicial e o final subjazem e são recuperados pelo exercício de

análise. No nível das transformações, a ideia principal da narrativa se encontra no

sujeito que se apresenta como capaz de fazer alguma coisa e que reafirma isso.

No nível narrativo, precisamos depreender as algumas instâncias que estão

pressupostas. A manipulação não é clara, mas é pressuposta pela afirmação de que

o sujeito “faz e mostra”; o mostrar é quase uma espécie de sanção à performance

Page 54: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

51

implicada no fazer. O destinatário é manipulado por um destinador transcendente.

Por sua vez, assim manipulado, o destinatário não possui outro caminho a não ser

realizar a ação, entrar em conjunção com o objeto desejado – o qual, nesse

enunciado, se encontra totalmente pressuposto: não há como saber o que é feito.

Destaca-se, na estrutura canônica que organiza este enunciado, a perfórmance e a

transformação decorrente dela; porém, não fica claro a quem ela afeta.

A competência do sujeito que realiza é reforçada pelo enunciado uma vez

que ele parece não precisar apresentar maiores argumentos para afirmar sua

capacidade, porque, além de simplesmente se dispor a fazer (sem medo da sanção

negativa, porque não apresenta nenhuma explicação), ainda quer mostrar do que é

capaz. Pelo enunciado, infere-se também a percepção de que fazer e mostrar

constitui-se como uma ação importante para o sujeito. Assim, mesmo não ficando

claro na afirmação qual é, afinal, a competência do sujeito, esta é valorizada quando

ele realiza sua performance e mostra o que faz.

No terceiro momento da análise semiótica, chega-se ao nível mais

superficial, o do discurso. É aqui que se identifica a projeção dos sujeitos da

enunciação por meio de termos que os concretizam.

Nesse sentido, identifica-se um enunciador delegado – composto pelos

produtores do anúncio – que se instalam no discurso por meio do mecanismo de

debreagem actorial enunciva: a figura Omo representa um ele, recurso empregado

para conferir ao enunciado objetividade, buscando alcançar um efeito de sentido

final de que aquilo que se expressa, no enunciado, constitui uma verdade absoluta,

inquestionável, a partir do seu próprio conteúdo.

Contudo, ao se verificar a categoria de tempo no discurso, parece que

existir uma contradição, uma vez que se identificam elementos no enunciado que

apontam para uma temporalidade enunciva: a ação posta no presente, “faz/mostra”.

Logo se constata que a contradição é apenas aparente, pois o presente a que tais

formas remete é um presente atemporal, recurso utilizado com a pretensão de

reforçar o efeito de verdade criado pela debreagem enunciva, ao se considerar que

o enunciado não vale apenas para o tempo específico em que se simula essa

enunciação.

Page 55: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

52

É o que se nota também na categoria do espaço; por esta, o slogan não

pertence a um anúncio ou a um lugar, atribuindo-se o sentido de que a ação do

sujeito se realiza em um espaço objetivante do lá, de modo que, onde quer que tal

ação seja realizada pelo sujeito, “ela faz acontecer”.

Como o slogan é um texto curto, um percurso temático principal se

destaca e está relacionado à posição mercadológica do sabão Omo. O produto

demonstra (age) o que faz ao seu público e que isso é o que mais importa para a

marca na sua relação com o público: necessidade de que o sujeito seja ativo, para

poder ter algo a mostrar. Isso, pelo menos, durante o período em que utiliza este

enunciado como seu lema mercadológico, antes de substituí-lo por outro.

3.1.2 MELHOR QUE OMO SÓ OMO.

Se o slogan anterior se apresentou com uma ação, este se apresenta

como uma simples afirmação, da qual se extraem as categorias de base que

sustentam o pequeno texto.

Dessa forma, percebe-se uma “exclusividade da competência”, o caráter

de ser único e de ser melhor naquilo que faz; depreendem-se, dessa leitura, duas

categorias:

Superioridade Inferioridade

Não-inferioridade Não-superioridade

Singularidade Pluralidade

Não-pluralidade Não-singularidade

Em um primeiro momento, os elementos presentes no texto (“melhor

que”) apresentam uma comparação, demonstram tratar de algo que é superior, e

esta última característica chama atenção para outra dinâmica importante para a

construção do texto, a de que essa superioridade não é dividida, não tem como

Page 56: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

53

comparar porque ela é única, singular. Assim, sustentam a construção do sentido

deste texto, respectivamente, os termos superioridade e singularidade.

Ambos são qualificados como termos eufóricos, porque no texto se

apresentam como valores positivos. Não interessa, por exemplo, o valor semântico

não-superioridade, que podemos chamar também de “mediano”. . Ao enunciado só

interessa o valor de ser superior. Além disso, reforça-se a superioridade ao

apresentar o valor de comparação, inscrito na oposição singular versus plural. O

mercado poderia ter outras marcas de sabão, mas nenhuma supera Omo.

Inicialmente, a dificuldade encontrada nesta análise deve-se ao fato de o

texto do slogan não possuir um verbo. Assim, de início, parece, considerando-se

uma perspectiva gramatical mais restrita, não haver um sujeito que desenvolve a

ação; também não há o sujeito a quem ele deveria dirigir a sua ação. Mas o slogan

“Melhor que Omo só Omo” é, sim, uma frase, é um enunciado capaz de comunicar,

uma vez que se apresenta como um conjunto de palavras que forma um enunciado

coerente, responsável por transmitir uma ideia, dispensando-se a exigência da

presença de um sujeito ou de um verbo.

Nesse sentido, ainda que, ao explicar a sintaxe narrativa em semiótica,

Barros lembre que esta “não é uma sintaxe de sujeito-predicado, como as da

gramática gerativa ou da sintaxe distribucional, mas uma sintaxe semelhante à de

Tesnière ou Fillmore, em que o núcleo é o „verbo‟, que define a relação entre

actantes” (2002, p.31), deve-se deixar claro que há sempre a possibilidade, de

recorrendo-se ao exercício de pressuposição, recuperar essa relação entre os

actantes.

Assim, o que estabelece a narratividade do texto é a sucessão de estados

e de transformações, responsável, nessa instância, pela produção do sentido. É na

sintaxe narrativa que se analisa esta sucessão responsável pela produção dos

sentidos, e o que viabiliza os estados e as transformações é a relação entre os

actantes presentes no enunciado.

Em suma, embora sem o verbo, não possamos ver claramente quem são

os actantes envolvidos nas ações implicadas pelo enunciado, podemos trabalhar no

campo das pressuposições lógicas e tentar encontrar os actantes do enunciado.

Page 57: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

54

Como não temos um verbo de ação, nem um verbo de estado, vamos

pressupor o momento anterior à criação do texto analisado. Podemos pressupor um

momento de comparação entre sujeitos, onde Omo está sendo comparado com

outro sabão em pó. Dessa forma, visualizaremos o nosso slogan como parte

recortada de um enunciado maior, que provavelmente se iniciou com uma pergunta:

existe sabão em pó melhor do que Omo? Com essa pressuposição, encontramos

nosso verbo e podemos identificar nossos actantes.

Num nível estritamente discursivo, a pressuposição ajudaria a completar a

análise, mas se considerarmos o contexto em que o slogan se insere, sabemos que

o sujeito que enuncia é a marca Omo e isso não fica claro no enunciado que

produzimos. Para transportarmos isso para a análise, transformamos então a nossa

pressuposição não em uma pergunta, apenas reforçamos a afirmação: “Não existe

melhor sabão em pó do que Omo: melhor que Omo, só Omo”. Com esta construção,

identifica-se um sujeito.

Temos, portanto, uma narrativa mínima, um enunciado de estado, já que

não há ação aparente no texto. Este é conduzido por um sujeito que pretende

convencer outro de que Omo é o melhor sabão em pó. Aqui a manipulação não se

encontra num querer ou fazer alguma coisa, mas pretende levar o outro destinatário

a um crer.

Nesse contexto, o objeto de valor é a crença que se sustenta em um

poder fazer e um fazer a partir do qual o sujeito se constrói. O destinatário encontra-

se disjunto desse conhecimento, e modaliza-se no enunciado pela ação/afirmação

feita pelo sujeito-destinador, que modaliza um crer. Quem realiza a transformação

central, a afirmação de que Omo é o melhor sabão, é o destinador, que possui

competência, fundamentada num saber prévio; um saber que não dá margem a

dúvidas.

Com verbo ou sem o verbo, o slogan apresenta o mesmo mecanismo de

debreagem actorial enunciva utilizado em “Omo faz, Omo Mostra”, que confere

objetividade e expressa como uma verdade absoluta demonstrada no enunciado.

Sob a máscara do recurso enuncivo empregado no enunciado, porém, instalam-se

marcas enunciativas, quando se apresentam marcas de um julgamento de valor,

como em “melhor” e “só”. Assim, procura-se manter, no texto objetivo, um aspecto

Page 58: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

55

subjetivo, que objetiva reforçar a presença do produto anunciado e de sua

importância no slogan.

Sobre a organização do tempo, ainda que não haja, efetivamente, um

verbo que demonstre a instância da enunciação pode-se postular também a

existência de um presente atemporal pressuposto - “Melhor que Omo, só Omo (é)”,

ajudando a garantir o efeito de verdade presente no texto.

O tema reafirmado no slogan é o da superioridade do produto em relação

aos outros. O texto não possui outras figuras, a não ser o próprio Omo, que além de

ser tomado como sujeito da ação, apresenta-se como o objeto que concretiza as

invariantes do nível narrativo e materializa a superioridade e a singularidade

identificadas nas instâncias mais profundas.

3.1.3 SÓ OMO LAVA MAIS BRANCO.

No terceiro slogan de Omo, percebemos traços de singularidade

encontrados também no slogan anterior. Mas, dessa vez, extraímos apenas uma

categoria de base, semelhante àquela que trata de singularidade/pluralidade, mas

que se diferencia semanticamente por alguns detalhes pertinentes: exclusividade x

ordinarismo.

Exclusividade Ordinarismo

Não-ordinarismo Não-exclusividade

O que estabelece uma verdadeira categoria semântica é a relação de

contrariedade. A princípio, a categoria de base acima apresentada pode gerar

dúvidas sobre os traços semânticos que as tornam contrárias, então é preciso

esclarecer quais pontos conectam estes termos.

A exclusividade possui dois significados próximos, porém distintos: um

que trata de capacidade e poder de exclusão; outro que trata do que é especial,

Page 59: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

56

único e restrito. Se estabelecermos uma relação contrária entre exclusivo e

inclusivo, esta se dará apenas no que diz respeito à capacidade de incluir ou excluir,

deixando a oposição ao que é único e restrito incompleta. Se tomarmos estas

últimas características na busca pelas oposições básicas, veremos que elas se

opõem ao que é comum, medíocre e frequente. O que é ordinário trata do habitual,

daquilo que todos, igualmente, possuem, características contrárias ao que é

especial, único, ao que é exclusivo.

O uso dessa categoria semântica como base na construção de textos

publicitários é muito comum. Em um mercado povoado de marcas e empresas

oferecendo o mesmo serviço, as marcas precisam chamar a atenção do consumidor

por meio da oferta de elementos diferenciais, que vão da qualidade ao preço, isto é,

de valores abstratos a valores concretos.

Os valores abstratos têm poder de lembrança e permanência maior do

que a transitividade da alteração de preços. A exclusividade é característica daquele

que tem poder de excluir os outros, que possui força de realizar a exclusão, além de

ser algo especial e restrito; caracteriza o que é único e incomparável. O que é

ordinário envolve o conjunto, trata do que é comum e pouco notável. Nossa

categoria de base se forma, então, recorrendo a outros vocábulos, pela oposição

entre o único e o comum.

Este slogan é um enunciado de fazer. Há um sujeito que realiza a ação,

relacionada a outros programas narrativos pressupostos, O destinatário é

modalizado na manipulação pelo destinador; aqui a relação não se estabelece

apenas no querer, mas também no crer. O objeto-valor visado na perfórmance é o

atributo de lavar mais branco.

Já no nível discursivo, mais uma vez, Omo é uma das figuras que

concretizam os termos abstratos do texto, é ele que veste a qualidade de ser

exclusivo, dessa vez dividindo o espaço do enunciado com outra figura: o branco.

Essas figuras concretizam o tema da eficácia, do que é ser eficaz, além da posse

exclusiva dessa capacidade.

Também vemos se repetir o emprego da debreagem actorial enunciva,

em que a pessoa aponta para um actante do enunciado, mais uma vez figurativizado

Page 60: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

57

por Omo. Repete-se, igualmente, a inserção de traços enunciativos, ao se

reproduzirem termos de natureza qualificativa, como “só” e “mais branco”, a

recuperar juízos de valor construídos na instância de enunciação. A identificação do

tempo, no nível discursivo desse slogan, mantém a proposta dos outros para se criar

um efeito de verdade, já que o verbo está num presente atemporal.

O tema do slogan diz respeito à superioridade de Omo, figurativizada pela

expressão “mais branco” e pelo “lavar” que a pressupõe.

3.1.4 PORQUE NÃO HÁ APRENDIZADO SEM MANCHAS.

Um detalhe da análise deste slogan se destaca antes mesmo de

chegarmos à fase discursiva, comumente trabalhada após a descrição das duas

primeiras fases do percurso. Aqui, a figura Omo não se insere mais no enunciado.

Houve uma clara mudança das articulações internas e profundas no texto do slogan,

e vamos investigar por meio do percurso como ela aconteceu.

Primeiramente, percebe-se que os valores anteriores, sempre ligados à

qualidade e eficiência, não se fazem mais presentes. Da observação dos

componentes desse slogan, podemos inferir uma categoria de base que trata da

aquisição de conhecimento, a articulação principal deste texto está no aprendizado.

Construímos, então, a categoria de base:

Conhecimento Ignorância

Não-ignorância Não-conhecimento

Mesmo sendo construído a partir de uma negação, nesse enunciado, o

termo conhecimento é o de valor eufórico, é ele que recebe a qualificação positiva

no texto.

Observa-se que o enunciado trata de aprendizado; este se relaciona a

atividades que devem ser realizadas para alcançar algum tipo de saber; por meio do

aprendizado se adquire experiência, e ele pode ser visto também como um processo

Page 61: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

58

contínuo de soma de experiências, as quais se tornam possíveis graças aos

diversos momentos que o compõem. Trata-se de um processo que pressupõe uma

construção semântica maior, faz parte do universo de construção do conhecimento;

o fim último de uma situação de aprendizado é o conhecimento que se adquire por

meio dele.

Não há no texto nenhuma referência ao não-conhecer, à ignorância, mas,

na construção das categorias de base, podemos depreender que a construção do

sentido do texto é feita sobre uma categoria que nega a ignorância e afirma o

conhecimento.

Para realizar a análise no nível narrativo, é preciso verificar os elementos

do texto para buscar seus os actantes. Pelo enunciado, resta evidente que há um

sujeito que precisa passar pelo aprendizado, aprender algo ainda que marcado

pelas manchas que acompanham esse processo. Manipulado por um querer-fazer, o

destinatário adquire competência modal que torna possível o fazer, a transformação

central da narrativa.

Verifica-se, portanto, que a perfórmance fica pressuposta pelo percurso

indicado: ao sujeito que deseja entrar em conjunção com o conhecimento, é preciso

arriscar a passagem pelo vale das manchas. Estas não são negativas, ao contrário:

são parte inseparável do processo e, pode-se dizer, servirão como prova da ação

realizada.

No nível discursivo, a afirmação é de novo construída com base na

debreagem enunciva de atores, aproveitando-se da impessoalidade construída a

partir do emprego da forma verbal “há”, indicando que o “conselho” serve para

qualquer pessoa. Já no que se refere ao tempo, o mesmo verbo, de novo em uma

espécie de presente atemporal, sugere que se trata, também, de uma verdade válida

para qualquer tempo: o aprender é sempre acompanhado pelas manchas.

Page 62: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

59

3.1.5 PORQUE SE SUJAR FAZ BEM.

Nesse slogan, apresentam-se correlacionadas duas diferentes categorias

semânticas, que são construídas a partir dos termos sujeira/limpeza e bem/mal. A

afirmação, a exemplo do slogan anterior, apresenta-se como a resposta a uma

pergunta e, mais à frente, poderemos supor qual sua origem.

Abaixo, seguem os termos mencionados e seus subcontrários dispostos

no quadrado semiótico:

Sujeira Limpeza

Não-limpeza Não-sujeira

Bem Mal

Não-mal Não-bem

Ao aplicar a qualificação semântica ao termo sujeira, este recebe, no texto

analisado, uma qualificação eufórica, assim como o termo bem, presente na outra

categoria encontrada.

Já no segundo nível da análise, o slogan “Porque se sujar faz bem”

caracteriza-se como um enunciado de fazer. Assim, o texto do slogan caracteriza-se

como uma liquidação de privação porque pressupõe que o sujeito está disjunto com

o bem-estar e torna-se conjunto a ele ao sujar-se; também mostra que o sujeito, ele

mesmo, é capaz de proporcionar a conjunção com o objeto sujeira. Então, a busca

do bem-estar caracteriza o programa de base, que contém a idéia central do slogan,

do sentir-se bem; e o sujar-se se caracteriza como um programa de uso, que auxilia

na realização do programa de base.

Há uma inversão do usualmente esperado, de que a limpeza que

proporciona o bem-estar, porque, no slogan, a sujeira assume esse papel. Nesse

caso, a limpeza está presente só que pressuposta na ação de Omo. Há inicialmente

uma valorização da sujeira e do bem que ela proporciona. Este bem-estar é

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60

pressuposto nas ações que levem à sujeira, como brincar, divertir-se, comer, entre

outras atividades cotidianas que podem provocá-la. Omo valoriza esta sujeira,

porque nela está pressuposto o bem-estar buscado; já a limpeza virá posteriormente

com o trabalho de Omo.

No nível discursivo, os esquemas narrativos são assumidos pelo sujeito

da enunciação e este os converte em discurso. Nesse slogan, a pessoa é instalada

por meio de uma debreagem enunciva, uma vez que a forma verbal “sujar-se”

aponta para uma pessoa do enunciado, actante indeterminado, mas que pode ser

tomado como qualquer um disposto a sujar-se. No que se refere ao tempo, o

presente em “faz”, tempo constante na publicidade, permite que se construa o efeito

de valor e de verdade permanente para a ideia que o slogan pretende veicular.

Quanto à temática, o slogan apresenta como tema a questão do bem-

estar e de como ele pode ser experimentado, ao expor uma das formas de fazer isso

(se sujar); concretiza o tema a figura da sujeira, presente na expressão “se sujar”,

mesmo que não haja a exposição de elementos concretos, que mostrem como é ou

de que tipo de sujeira se trata. A sujeira, de certa forma, pode assumir um papel de

elemento figurativo porque representa algo do mundo natural, porém é inespecífico,

ficando pressuposto, e de certa forma livre, que o destinatário deve escolher e

entender de qual tipo de sujeira valer-se para figurativizá-la.

3.2 COCA-COLA

3.2.1 GOSTOSO É VIVER...

O primeiro slogan da Coca-Cola a ser analisado propõe o desafio de

realizar uma análise do percurso gerativo num texto mais curto ainda do que aqueles

que analisamos até agora.

A categoria de base que sustenta este texto está relacionada ao viver.

Construímos, então, o quadrado:

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61

Vida Morte

Não-morte Não-vida

A vida é eufórica e a morte é disfórica. Disfórica e distante; não há espaço

nesse enunciado para a lembrança do outro termo que compõe a categoria de base.

A marca Coca-Cola não elabora, nesse slogan, nenhum grande trabalho de

construção da significação, não escolhe uma base complexa ou mais elaborada para

construir-lhe os sentidos, mas transforma o termo vida no destaque desse texto.

Encontra-se, no slogan, um enunciado de estado. Há um sujeito

pressuposto que diz que “gostoso é viver”. O “viver” é objeto valor do enunciado,

vivido de forma prazerosa, e o sujeito já se encontrado em conjunção com esse

objeto. Podemos pressupor que o que levou o sujeito a entrar em conjunção com a

vida, o objeto de valor, foi um enunciado de fazer pressuposto, realizado por um

sujeito que possibilitou a conjunção, um sujeito que, no nível discursivo, será

concretizado por Coca-Cola.

No nível discursivo, o tema aparente é viver a vida de forma prazerosa,

mas o enunciado trata desse tema apenas afirmando esta necessidade; não se

apresenta nenhuma figura que dê concretude à afirmação. Ainda no nível discursivo,

a conjugação do verbo ser no presente confere à vida um valor

permanente/absoluto, praticamente condicionado e inseparável de vivê-la de um

jeito gostoso.

Este slogan se apresenta na forma sintática indireta (Gostoso é viver), quando

o usual é a forma direta (viver é gostoso/é gostoso viver), enfatizando uma qualidade

do viver, já que este pode ser percebido de diversas formas: bom, ruim, gostoso,

desagradável, etc. A forma indireta produz um efeito de sentido de escolha, já que

entre tantas coisas que podem ser classificadas como gostosas, a vida é posta em

destaque como aquilo que é mais gostoso.

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62

3.2.2 ESSA É A REAL

O segundo slogan da Coca-Cola selecionado para esta análise apresenta

uma articulação entre os termos real e imaginário.

Realidade Imaginário

Não-imaginário Não-realidade

Para chegar a essa construção, é preciso refletir sobre qual o sentido de

realidade para este texto. O real trata da existência de algo, da presença de algo no

mundo das coisas, de maneira concreta e perceptível. Para se opor a esse termo

categoria, é preciso um termo que apresente características contrárias ao real, mas

seja a ele ligado pela mesma natureza semântica. O imaginário é a percepção da

existência de algo, mas apenas em pensamento; o que é do imaginário é abstrato

pode até ser descrito e falado, mas não está concretizado, não está no mundo real.

Mas, a princípio, apresentam-se dificuldades para encontrar o objeto

desse enunciado. O que é real? O que é “essa” para qual o sujeito aponta e afirma

que é real? O que vemos aqui é apresentação de um enunciado de estado, que

apresenta uma constatação de uma coisa que é “a real”; isso que é classificado

como real é o objeto de valor com o qual o sujeito da narrativa se encontra em

conjunção.

Num quadro de pressuposições, já se considerando a cena enunciativa,

pode-se prever um sujeito afirmando que alguma coisa é “a real”, visando a, desse

modo, persuadir o enunciatário de que, somente em companhia de Coca-cola, terá

condições de adentrar essa realidade.

No que diz respeito às projeções das categorias enunciativas, verifica-se

a presença de uma debreagem actorial enunciva, pela qual a terceira pessoa,

representada pelo pronome essa, domina o enunciado. Já a percepção do tempo

concretiza um presente constante, relacionando-se a um agora que permanece, pois

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63

sua relação com o presente se renova a cada momento em que o enunciado é

repetido, por meio de um recurso enunciativo.

3.2.3 O LADO COCA-COLA DA VIDA.

O terceiro slogan da marca de refrigerantes em análise apresenta

características semelhantes ao segundo slogan da marca Omo. Temos aqui uma

frase sem verbo e que, a primeira vista, não nos oferece caminho para encontrar os

actantes que a enunciaram; o que não significa, conforme esclarecimento anterior,

que não é possível realizar a análise semiótica.

Diferentemente do slogan de Omo que realizava uma afirmação, este

parece ser mais uma definição, um apontamento. Por meio da observação dos

elementos do enunciado, pode-se depreender a categoria semântica vida/morte, em

um quadrado construído conforme segue:

Vida Morte

Não-morte Não-vida

O slogan parece apontar para um lado da vida. Para fortalecer o

estabelecimento dos sentidos de base desse slogan, é preciso observar os termos

eufóricos e disfóricos vistos a partir do quadrado, que irão auxiliar a compreender o

nível narrativo. O termo vida é que recebe os valores positivos, consequentemente,

o valor negativo se aplica à morte.

Se o slogan se apresenta como a indicação de um lado da vida,

pressupomos a existência do outro. Não caberia aqui dizer “direito” ou “esquerdo”,

porque o uso o do termo lado parece representar algo além de quesitos de

lateralidade, referindo-se a aspectos gerais da vida, diversas facetas dela, seus

vários lados para vivência. Não é possível, no nível narrativo, depreender

exatamente qual é o lado oposto ao apresentado. Pode-se supor, por meio da

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64

construção feita na categoria de base apresentada, que o outro lado representa um

aspecto negativo, em que morte e não-vida são os valores disfóricos.

No nível discursivo, destaca-se a figurativização do lado da vida que é

apontado pelo enunciado. Coca-Cola é a figura principal do discurso, ao materializar

um lado da vida pode ser o mais valorizado da vida.

Essas observações servem de base para a análise que vem a seguir, em

que o lado Coca-Cola da vida passa a fazer parte de um enunciado no qual, já a

partir da observação do nível discursivo, há a instauração de pessoa e tempo.

3.2.4 VIVA O LADO COCA-COLA DA VIDA.

Em “Viva o lado Coca-Cola da vida”, a categoria de nível fundamental que

podemos perceber é usufruto versus desperdício. O slogan se apresenta como a

definição de algo; poderíamos supor que seria do que é o produto Coca-Cola.

Contrapor usufruto/desperdício é perceber a existência de algo a ser consumido,

aproveitado e, partindo dessa observação, podemos extrair também a oposição vida

versus morte e felicidade versus infelicidade. Viver o lado bom da vida em oposição

ao lado mau, à morte, ao não viver, ao não usufruir. Vida faz sentido ao pressupor a

morte, a felicidade, a infelicidade, o usufruto, o desperdício.

Vida Morte

Não-morte Não-vida

Usufruto Desperdício

Não-desperdício Não-usufruto

No slogan da Coca-Cola, usufruto, vida e felicidade são eufóricos e

desperdício, morte e infelicidade são disfóricos. O slogan, especialmente, como

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65

parte do discurso persuasivo publicitário carrega valores da marca, valores que

devem ser compreendidos pelo público. Em “Viva o lado Coca-Cola da Vida”,

percebe-se, claramente, o lado eufórico dos termos até aqui percebidos, porque é

para se viver um lado apenas, o lado Coca-Cola da vida, ser feliz e aproveitá-lo.

O slogan caracteriza-se como uma narrativa mínima. Ao convidar o

público, por meio do slogan, para que “viva o lado coca-cola da vida”, o enunciado

efetiva a marca realiza um enunciado de estado, procurando estabelecer uma

relação de disjunção de liquidação da privação entre o sujeito (pressuposto no

enunciado: você (o público) deve viver...) e o objeto, o lado Coca-Cola da vida, a

felicidade. O sujeito está em disjunção com o objeto, com a vida; pressupõe-se que

ele não vive, não conhece este lado, então ele e é convidado, por meio do lado

Coca-Cola deste objeto, a entrar em conjunção com ele.

A análise possibilita a pressuposição algumas fases no slogan “Viva o

lado Coca-Cola da vida”. Antes, observamos claramente a fase de manipulação; o

sujeito Coca-Cola age sobre o público, pretendendo levá-lo a querer viver o lado

Coca-Cola da vida. Neste caso podemos colocar dois conceitos de Coca-Cola: ela

como sujeito e ela como objeto (a felicidade, o usufruto, materializado no “lado

Coca-Cola da vida”).

A fase de competência é pressuposta, porque se pressupõe que o sujeito,

o público, é dotado do poder de consumo, de viver e de usufruir. As fases de

perfórmance e sanção poderiam ser constatadas numa esfera além do texto,

pressupondo o programa narrativo maior que o slogan estaria inserido, no caso a

peça/campanha publicitária, ao apresentar elementos que demonstram as fases de

perfórmance e sanção.

Do slogan “Viva o lado Coca-Cola da vida” podemos extrair o tema “viver

o lado bom de algo”. Os termos que dão concretude a este tema são “o bom” e

“Coca-Cola” que são utilizados na invariante: viver algum aspecto da vida; podemos

ainda condensar num tema mais geral ainda, que é “viver a vida”. Num espaço tão

pequeno, o slogan conseguiu traçar um breve, mas bem construído percurso

temático, que não seria identificável somente em uma análise de superfície, mas

graças à identificação das outras fazes do percurso.

Page 69: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

66

O slogan opera com um verbo no imperativo (viva), o qual supõe uma

perspectiva futura para o sujeito efetivar essa vivência, implica também a presença

do destinatário (tu), conduzindo-o a fazer parte da mensagem que veicula e

inserindo-o, como ator.

3.2.5 SUA FELICIDADE TRANSFORMA.

Duas categorias de base podem ser extraídas da análise desse slogan:

Felicidade Tristeza

Não-tristeza Não-felicidade

Mudança Conservação

Não-conservação Não-mudança

No primeiro quadrado, o termo valorizado positivamente no enunciado é a

felicidade, o que, consequentemente caracteriza a infelicidade como disfórica. No

segundo, aplicamos o valor eufórico ao termo mudança.

No nível narrativo, percebe-se que o destinador busca modalizar o

destinatário por meio da constatação que se enuncia; é como se essa afirmação já

fosse suficiente para mover o sujeito para a ação. O destinatário é modalizado com

um saber, com o conhecimento e a certeza de que o estado de espírito que o

acompanha pode transformar.

Dessa transformação, pode-se pressupor a passagem de um estado

inicial de disjunção com a felicidade e, portanto, de conjunção com a tristeza, para

um final conjunto com a alegria e com o viver. O certo é que se reforça a importância

do sujeito destinatário ao afirmar que é ele que pode transformar a vida, as coisas,

por meio de sua felicidade.

Page 70: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

67

No nível discursivo, a categoria de pessoa é projetada por meio de uma

debreagem actorial cujo estatuto é bastante ambíguo, uma vez que o pronome

“sua”, responsável por identificar a pessoa no enunciado, tanto pode ser atribuída ao

ele (de quem se fala) como ao tu (com quem e fala): no primeiro caso, teríamos uma

pessoa enunciva; no segundo, enunciativa. Esse procedimento, aliado ao caráter

sintético do slogan, amplia a margem de interpretação do texto pelo enunciatário.

Quanto à categoria de tempo, a exemplo dos demais slogans analisados,

projeta-se o presente, por meio de uma debragem enunciativa, a apontar sempre

para a condição de permanência e duratividade da ação implicada no verbo.

3.3 A CONSTRUÇÃO DOS SENTIDOS

Desmembrar os elementos que edificam a construção dos sentidos em

slogans amplia os caminhos que podem ser trilhados para compreender de que

forma marcas e empresas articulam os sentidos na elaboração de seus lemas

mercadológicos.

Os slogans aqui analisados – extraídos de pesquisa realizada no contexto

sócio-econômico da sociedade brasileira – apresentaram diversos aspectos comuns

e determinantes na formação de seus significados e, ao mesmo tempo, a análise

possibilitou encontrar quais diferenças foram essenciais para justificar as

substituições que as marcas fizeram de um slogan por outro.

Vejamos a seguir, neste segundo momento da análise, quais são estes

aspectos.

3.3.1 DO NÍVEL FUNDAMENTAL

Aproveitando que o primeiro nível do método de análise proporciona a

exposição dos termos básicos de significação do texto, podemos montar uma

simples tabela para reunir os elementos eufóricos identificados nos slogans, para

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68

que possamos melhor visualizar as transformações ocorridas e auxiliar no que será

tratado.

Vejamos, primeiro, os elementos eufóricos das categorias do sabão em

pó Omo:

Omo:

1. Atividade/competência

2. Superioridade/singularidade

3. Exclusividade

4. Conhecimento

5. Sujeira/bem(bem estar)

Durante muito tempo, Omo desenvolveu suas campanhas com base na

qualidade que seria proporcionada por ele e pela superioridade que o sabão

afirmava ter frente à concorrência.

Como primeiro sabão em pó do Brasil, teve uma larga vantagem em

relação às marcas posteriores, numa época em que se associava a propaganda às

demonstrações públicas da eficiência do produto, feitas por todo o Brasil.

Os slogans desta pesquisa estiveram presentes em suas campanhas

entre os anos 2000 e 2009. Os três primeiros slogans da análise representam

diversos valores ligados a Omo, e que carregaram traços semânticos que

corroboram as demonstrações públicas que Omo descreve em sua história.

Conforme vimos anteriormente, é na semântica do nível fundamental que

se encontram as categorias de base e onde estão os valores axiológicos dos termos

de um texto. Quando se fala de valores axiológicos, trata-se de valores virtuais, ou

seja, valores que “resultam da articulação semiótica” (GREIMAS E COURTÉS, 2008,

p. 252) que constitui parte do universo de um coletivo de atores, no nosso caso o

público-alvo, que serão concretizados e atualizados no nível narrativo.

Para Greimas, o ser humano não se relaciona com as categorias sem

nelas imprimir sua marca sensível, sua afetividade. As categorias que compõem os

discursos são construções semânticas portadoras de valores que podem ser

marcados como disfóricos ou eufóricos. Daí a importância de visualizar as

oposições, para ver quais caminhos os valores podem assumir dentro de um

discurso.

Page 72: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

69

Os valores positivos de Omo, inicialmente, foram concentrados em suas

próprias qualidades, partindo de “dentro pra fora”, falando de seu caráter único e

superior como sabão em pó, se mostrando sempre disposto a fazer e mostrar essa

característica. Aqui também se revelam os valores de base, e também os do

marketing, quando este se concentrava mais no produto do que no consumidor, em

como convencer o consumidor com uma argumentação baseada em aspectos mais

figurativos e concretos.

Porém, a partir do quarto slogan apresentado nesta análise, Omo

modificou a construção de suas bases e passou a valorizar outros termos, construiu

novas relações semióticas que revelaram valores alheios às suas próprias

qualidades e mais voltados ao sentimento de seu público-alvo. Ao valorizar o bem-

estar e o conhecimento, concentrou a importância de seu discurso não mais para

potencialidades de Omo, mas para a liberdade de viver, aprender e “se sujar” que

seu público já estaria “autorizado” a ter, já que o conhecimento da superioridade e

exclusividade de Omo já estaria fixado.

Isso ocorreu porque os valores de que tratavam as categorias de base

dos três primeiros slogans já podiam ser consideradas como valores ideológicos

permanentes. Greimas e Courtés tratam da relação entre axiologia e ideologia e,

entre outros aspectos, apontam a última como “uma estrutura actancial que atualiza

os valores que ela seleciona no interior dos sistemas axiológicos” (2008, p. 253).

Além disso, os autores lembram que ideologia é uma busca permanente de valores,

materializada na estrutura actancial que deve ser recorrente nos discursos

ideológicos. Em relação a Omo, uma vez que os valores axiológicos que tratavam de

seus atributos práticos já estariam finalmente atualizados – fato explicado pela

presença recorrente de Omo entre as marcas mais lembradas do Brasil – abriu

caminho para Omo explorar novos valores em sua “conversa” com seus públicos,

mediada pela propaganda.

Além de assimilar permanentemente sua superioridade, o público

consumidor também sofreu mudanças ocorridas na sociedade; com o passar de

tantos anos, desde a inserção de Omo no mercado até a atualidade, a sociedade

brasileira viveu muitas transformações, tanto internas quanto aquelas que dividiu

com o resto do mundo.

Page 73: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

70

Na década de 1950, Omo encontrou um Brasil que estava saindo da vida

rural para descobrir as cidades. O espaço das mulheres fora dos limites do lar ainda

era uma pretensão que poucas se arriscavam a ter. Entre as atividades que a

mulher deveria desempenhar bem, além de ser mãe e esposa, estava a de cuidar do

lar e da casa com afinco. Lavar roupas era sinônimo de árduo trabalho, não só em

manter as roupas limpas, mas livres de sujeiras permanentes, lindamente passadas

e engomadas. Uma roupa bem limpa era a prova de um bom desempenho como

dona de casa.

Omo mirou suas estratégias de inserção no mercado nessas usuárias em

potencial, que desconheciam o sabão vendido em pó, e a capacidade que ele tinha

de diminuir o trabalho e aumentar o desempenho.

No início da década de 1990, Omo estabeleceu o reconhecimento deste

público, ao se tornar uma das marcas mais lembradas e usadas pelas famílias

brasileiras. Os anos revelaram que tanto o produto quanto a sociedade evoluíram.

Valores mudaram, novas pretensões e metas de vida emergiram. As mulheres

conquistaram mais espaço e ampliaram ainda mais seu leque de responsabilidades.

Além de continuarem tendo de dar conta do lar, precisavam cuidar dos filhos,

identificar-se com uma profissão e auxiliar (ou mesmo assumir) o sustento da casa

por meio dessa profissão, conquistas materiais e pessoais que revelavam uma

sociedade preocupada com outros valores.

Outro aspecto que sofreu modificações é o de que, enquanto as crianças

de antigamente sofriam castigos por sujar a casa ou por encardir as roupas na rua

ou na escola, as atividades lúdicas atuais estão cada vez mais diversificadas: tinta,

terra e comida fazem parte da brincadeira e do aprendizado. A escola não é mais

espaço para castigos e sim para estímulos; há o aprendizado por meio de jogos e

brincadeiras que sujam.

Até aqui a descrição tratou de valores sociais, que foram se

transformando com o passar das décadas, cada momento tomando emprestado o

que há de melhor do anterior e buscando novas vivências, novos parâmetros.

Mas as categorias de base que articulam este processo, que estão na

base da geração do sentido, são também fator importante na determinação dos

valores expostos num anúncio publicitário.

Page 74: Luciana da Silva Souza Reino_Dissertação_Estudos de Linguagens_2012

71

As categorias dos três primeiros textos revelam valores materiais, de

ordem prática, de estabelecer uma superioridade de Omo para garantir esses

valores. A partir do momento em que essas categorias mudam, são trocadas por

aquelas que valorizam a visão do público e Omo se coloca como coadjuvante, já que

se considera parte do catálogo de valores já estabelecidos na sociedade.

Já a marca Coca-Cola conquistou a preferência, e lembrança do

consumidor brasileiro, articulando categorias de base bem diferentes. Primeiro

porque, é óbvio, trata-se de um produto completamente diferente de sabão em pó.

Em segundo lugar, sua inserção no mercado brasileiro ocorreu bem antes de Omo.

Além disso, a bebida não está associada a nenhum aspecto elementar da vida

prática, não marca, essencialmente, uma diferença nas ações cotidianas.

Suas categorias de base se articulam, partindo do que foi extraído das

análises, sobre elementos distantes de questões práticas e bem mais próximas de

valores abstratos, de sentimentos e sensações. Vejamos os elementos eufóricos de

suas categorias:

Coca-Cola:

1. Vida

2. Realidade

3. Vida

4. Vida

5. Felicidade/mudança (transformação)

Entre os slogans analisados, três foram elaborados a partir da valorização

do termo vida, exposto nos quadrados das análises e articulado juntamente com seu

termo contrário, a morte.

Além de ser uma das marcas mais lembradas, Coca-Cola pode ser

considerada uma bebida de públicos diversificados. Seu consumo não é restrito a

uma faixa etária, já que qualquer pessoa, sem maiores restrições alimentares, pode

beber. Porém, por meio da análise da categoria de base vida/morte, vimos que a

marca Coca-Cola procura manter em seu discurso publicitário os sentidos que

remetam a um viver constante. É como se renovasse sempre seu discurso, porque

mesmo mudando as articulações, a modalização dos sujeitos e a apresentação dos

objetos, seu discurso apresenta em suas bases a valorização da vida, do prazer e

da felicidade, reafirmando a juventude.

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72

Na categoria de base que trata de realidade/imaginário também

predomina a valorização de algo ligado à vida. Mesmo sem demonstrar

completamente qual é o objeto “real” para que aponta, pressupomos que se trata da

Coca-Cola, não só porque pronome e artigo são femininos, mas também por se

tratar de uma pressuposição que leva em consideração o contexto: o slogan é

vinculado à marca em anúncios publicitários de qualquer suporte.

Como a passagem de um elemento a outro das categorias somente se

realiza por meio das relações que os tornam contrários, antes de chegar ao termo

imaginário é preciso passar pelo termo não-imaginário e, então, encontrar a

realidade. Tais termos estão unidos por traços que determinam, de um lado, o que

pode ser pensado e falado, mas que ainda não está realizado e, de outro, o que está

concretizado, que está presente, que pode ser sentido.

Coca-Cola é a concretização do que estaria apenas no imaginário. O

slogan construído a partir dessas bases é cercado temporalmente por outros que

têm vida como seu valor positivo. Apontar o que é real, especialmente no slogan,

pode demonstrar apenas uma “licença” temporária do uso da articulação vida/morte,

porém mantendo-se uma relação com algo que faz parte da vida, no universo das

coisas imaginárias e no universo das coisas reais.

Na categoria de base encontrada no último slogan analisado, a felicidade

que transforma também pode ser considerada um “gancho” com o termo eufórico

vida, tão bem utilizado nos três outros slogans. Os termos de base dessa categoria

irão se destacar ainda mais no nível narrativo, no momento em que são identificados

os sujeitos que irão colocar os termos em movimento no enunciado.

Os valores axiológicos de Coca-Cola parecem se apresentar como um

catálogo do que já faz parte de valores bem arraigados na sociedade. Viver a vida

não é um processo estático, é constante movimento. Esse movimento trata de

interesses objetivos e práticos de sobrevivência, mas também de aspectos que

determinam como se deve sentir a vida, em meio aos processos de sobrevivência.

As categorias do refrigerante Coca-Cola refletem a intenção da marca em colocar o

público em movimento, o que acontece na articulação entre sujeitos, já no nível

narrativo. Não basta “apenas” viver, é preciso viver de um jeito gostoso, transformar

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73

o mundo com a felicidade e viver o lado bom das coisas, concretizado por Coca-

Cola.

3.3.2 DO NÍVEL NARRATIVO

No nível narrativo, em que os valores virtuais vistos no nível fundamental

se tornam valores para sujeitos, as marcas exploraram diversos tipos de articulação

entre sujeitos e objetos. O que antes era virtualizado em termos abstratos, passa a

ser atualizado e realizado na relação entre sujeitos e entre estes e os objetos

modais e de valor do texto.

Assim, ambas as marcas trabalham tanto com enunciados de estado

quanto os de fazer. Os enunciados de fazer são predominantes nos slogans de Omo

e marcam primeiramente a intenção de colocar em movimento objetos que tratam de

sua qualidade e eficiência. O enunciado de estado apresentado em “Melhor que

Omo só Omo” só vem a reforçar o slogan anterior que se apresentava como uma

ação, e posteriormente foi substituído por outro enunciado de fazer, que reforçou

mais uma vez o aspecto prático de Omo. Já nos dois últimos slogans, que

apresentaram toda uma nova estrutura de base, Omo também faz uso de

enunciados de fazer, só que, dessa vez, centrados num fazer relacionado ao

destinatário.

Enquanto Omo e sua capacidade eram objetos de valor nos três primeiros

slogans, nos dois últimos, ausenta-se da descrição desses objetos abrindo caminho

para objetos que tratam de alegria, da felicidade, do bem estar e do aprendizado,

que envolvem processos que sujam.

Por outro lado, os slogans da Coca-Cola são, em sua maioria, enunciados

de estado, apresentando um sujeito que já se encontra em conjunção com o objeto

de valor, revelando instâncias pressupostas que realizaram essa conjunção. Entre

eles, “Viva o lado Coca-Cola da vida” se apresentou como único enunciado de fazer,

se apresentando como uma frase imperativa, reforçando os estados conjuntivos dos

slogans anteriores.

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74

A comunicação é um jogo de persuasão. Esse jogo é realizado por meio

da narratividade que se articula dos discursos; é o “simulacro do fazer do homem no

mundo” (BARROS, 2002, p. 28). A autora ainda complementa que é no nível

narrativo que buscamos como “descrever e explicar as relações e funções do

espetáculo, assim como em determinar seus participantes”.

Pela comunicação, visa-se firmar um contrato fiduciário, uma relação de

fé e confiança. No nível narrativo, se estabelece uma espera fiduciária, destinador e

destinatário mantêm uma relação fundamentada na confiança. O que sustenta as

relações apresentadas nos slogans, entre os sujeitos dos enunciados é um contrato

imaginário

“em que o destinador, graças a um fazer persuasivo, busca a adesão do destinatário. Pretende fazer com que o destinatário, ao exercer o fazer interpretativo que lhe cabe, creia ser verdadeiro o objeto apresentado, o discurso do outro e o próprio destinador. Há estreita vinculação entre a confiança e a crença, o que permite falar em contrato fiduciário. A confiança entre os homens fundamenta a confiança nas palavras deles sobre as coisas e o mundo e, finalmente, a confiança ou a crença nas coisas e no mundo”. (BARROS, 2002, p. 37)

As narrativas que formam os textos constituem-se como sucessão de

estados e de transformações; sucessão de estabelecimentos e de rupturas de

contratos, mas é a não ruptura dos contratos que mantém a estabilidade da

comunicação entre os sujeitos. É a partir desse contrato que se constrói um contrato

de veridicção.

3.3.3 DO NÍVEL DISCURSIVO

O nível discursivo é o que recebe maior destaque no discurso publicitário,

por estar mais próximo da manifestação. Se considerarmos os elementos de

superfície que compõem o nível discursivo e a riqueza da figurativização dos temas

escolhidos, encontramos o grande chamariz da comunicação publicitária. O uso das

figuras de pensamento e de linguagem e a adjetivação excessiva são mesmo parte

da efetividade de um bom anúncio.

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75

Só percebemos essa superfície claramente porque em suas bases as

marcas procuraram demonstrar não só suas pretensões como destinadores do

discurso, mas também quais valores eram importantes para o destinatário, seus

consumidores.

Entre os elementos que constituem o parecer verdadeiro no nível

discursivo, estão as operações de inserção de pessoas, espaços e tempos no

discurso e na visualização dos temas e das figuras que concretizam o texto.

Todos os textos apresentam o mesmo mecanismo de projeção de

pessoa: a debreagem actorial enunciva. Todos pretendem manter o discurso em

terceira pessoa, de certa forma, garantindo o discurso impessoal, mas indicando

claramente que o produtor do discurso são as marcas.

Outro aspecto muito importante é a projeção do tempo em todos os

slogans. O tempo é projetado para simular o presente constante, para criar o efeito

de verdade permanente. Não interessa a uma marca dizer o que ela foi ou teria sido,

interessa falar de um presente constante, um presente que se repetirá no amanhã e

que só mudará a partir de outras articulações de sentido, mas que, provavelmente,

também serão apresentadas num tempo presente permanente.

A análise dos slogans reforça a afirmação de Fiorin que “os estudos do

espaço ocupam uma posição secundária” (2005, p. 258). Essa categoria,

diferentemente das categorias de pessoa e de tempo que são necessárias para o

processo de discursivização, pode passar despercebida porque um discurso pode se

realizar sem dar nenhuma indicação de seu espaço. Nossos slogans não

apresentam nenhum elemento que demonstre a projeção do espaço do enunciado,

que pressupomos se realizar em cada anúncio, em que serão veiculados, ou a cada

momento em que são lembrados.

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76

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No momento em que se retomam os objetivos iniciais da pesquisa para

confrontá-los aos resultados obtidos, é importante ressaltar o caráter de permanente

abertura e ampliação dos interesses que motivaram este trabalho, já que ele envolve

a relação entre duas grandes teorias, comunicação e semiótica, que nunca se

apresentam fechadas ou limitadas, mas que mantém seu conjunto de práticas e

teorias científicas, permanentemente, abertos para a inserção de outros saberes.

A publicidade é parte importante da grande área da comunicação. Seus

discursos despertam curiosidade por conta de seu caráter altamente persuasivo e do

estabelecimento de “regras” ou de “normas” que facilitam a persuasão. Porém,

poucas teorias ultrapassam o limite dessas regras e tentam encontrar as

articulações mais profundas da construção destes discursos; uma delas é a

semiótica discursiva, teoria de que se utilizou o modelo metodológico de análise foi

utilizado neste trabalho.

O objetivo principal deste trabalho foi buscar a compreensão de como se

constroem e organizam os sentidos em slogans publicitários. Eles fazem parte dos

fenômenos comunicacionais e culturais da sociedade, porque ultrapassam os limites

do anúncio publicitário, passando a serem falados e usados pelo público como forma

de lembrança permanente das marcas. A produção publicitária concentra seus

esforços em criar slogans rápidos, curtos e que ainda consigam carregar muitos

sentidos. Este é um trabalho muito complexo que vai além de simples regras

gramaticais adaptadas; assim, é preciso passar os slogans pelo crivo de uma teoria

que explique como os sentidos se articulam de maneira a chegar ao caráter

persuasivo que lhes dão personalidade.

Por meio das análises apresentadas, tornou-se possível interpretar e

entender as operações de sentidos que navegam nas profundezas pequenos textos.

O resultado das análises possibilitou que se interpretasse a presença de

determinados termos linguísticos na superfície do texto, como o porquê do uso dos

tempos verbais no presente e a recorrência de certas figuras, e ainda auxiliou na

interpretação os temas subjacentes nos slogans. Foi possível também entender os

aspectos mais profundos, mais arraigados em questões históricas, humanas e

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77

mercadológicas de que o slogan faz uso antes mesmo de se ocupar dessa

superfície.

A pesquisa revelou que não é apenas a organização dos elementos de

superfície a mais importante na construção de um slogan eficiente. As articulações

de base são cruciais, porque catalogam os valores axiológicos que podem organizar

os elementos ideológicos vistos na superfície, além de oferecer um rico universo

semântico de possibilidades de combinação, ao apresentar quadrados ricos e

complexos, a despeito do tamanho dos slogans. Além dos aspectos profundos, a

pesquisa mostrou o crescimento do sentido do texto quando assumidos por

destinatários ora ocupados em levar o destinador à conjunção com os objetivos de

valores positivos, ora já apresentados em conjunção com seus objetos de valor.

A escolha das marcas Omo e Coca-Cola, feita com base em dados de

natureza quantitativa, mostrou-se uma excelente escolha qualitativa, pois possibilitou

a visão dos efeitos de sentido presentes em slogans de marcas totalmente

diferentes, com objetivos e públicos diversos, mas que apresentam o importante

traço comum de serem as marcas mais lembradas pelos brasileiros.

E isso não acontece ao acaso. Poder-se-ia falar do caráter repetitivo da

propaganda, uma de suas principais características na divulgação de marcas e

produtos. Mas a repetição de textos vazios de sentido não se sustentaria por muito

tempo; somente textos elaborados em meio à tensão, afinidade e conhecimento

entre as marcas e público-alvo poderiam manter-se permanentes. Os sentidos mais

profundos conseguem alcançar os anseios dos consumidores, por meio da série de

articulações que trabalham no interior do texto, percorrendo um percurso de

construção e articulação de níveis que entrelaçam todos os aspectos importantes

para a elaboração de textos eficientes.

Foi possível perceber que o simulacro metodológico do percurso gerativo

de sentido pode facilmente ser aplicado aos textos publicitários, especialmente

slogans de diferentes marcas, associando a análise tanto a um interesse de buscar

a compreensão dos sentidos, como método facilitador nos processos de criação de

slogans.

É importante dizer que este trabalho não se encerra nesta pesquisa, mas

auxilia a encontrar outros caminhos da análise da construção de sentidos nos

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78

slogans, seja com foco maior no nível discursivo, seja com foco no nível narrativo.

Pode auxiliar também em pesquisas futuras que tratem do slogan inserido no

contexto do anúncio, abrindo caminho também para os estudos de semiótica

discursiva que tratam de textos sincréticos. Pode, ainda, ajudar no trabalho de novas

técnicas de criação de slogans, contribuindo para apresentar a elaboração de

programas de base como pontos de partida para a construção de slogans, o que,

muitas vezes, se apresenta um dos trabalhos mais difíceis para o redator

publicitário.

Por fim, é importante ressaltar o relacionamento harmonioso entre

campos distintos. A semiótica discursiva mostrou-se metodologia adequada de

análise e compreensão dos processos da comunicação, pois pode atender a outras

partes dos estudos da comunicação, interessados em compreender a natureza dos

discursos, e não somente criticá-los ou rotulá-los indiscriminadamente.

O discurso publicitário se mostrou um rico catálogo de textos para

se aplicar o modelo metodológico da semiótica, numa relação que não só

possibilita desvendar as intenções dos textos publicitários, como também

estreitar relações entre as pesquisas em comunicação e semiótica discursiva.

Por fim, este trabalho constituiu-se como mais uma busca de

contribuir para os caminhos que tornam a semiótica discursiva acessível a

pesquisadores e profissionais da área da comunicação, os quais encontram,

nela, um instrumental adequado para tratar dos sentidos nos textos com que

trabalham.

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79

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