maiara patti gaulez - ufscar€¦ · orientação: prof. dr. andrea rodrigues ferro sorocaba 2016 ....
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CAMPUS SOROCABA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA
MAIARA PATTI GAULEZ
EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O PERÍODO
2003-2012
Sorocaba
2016
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CAMPUS SOROCABA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA
MAIARA PATTI GAULEZ
EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O PERÍODO
2003-2012
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Economia para
obtenção do título de Mestre em
Economia.
Orientação: Prof. Dr. Andrea Rodrigues
Ferro
Sorocaba
2016
Gaulez, Maiara Patti
Eficácia do sistema prisional brasileiro: uma análise por meio daabordagem da economia do crime para o período 2003-2012 / Maiara PattiGaulez. -- 2016. 55 f. : 30 cm.
Dissertação (mestrado)-Universidade Federal de São Carlos, campusSorocaba, Sorocaba Orientador: Andrea Rodrigues Ferro Banca examinadora: Adelson Martins Figueiredo, Daniel Ricardo deCastro Cerqueira, Marcelo Justus dos Santos Bibliografia
1. Economia do Crime. 2. População carcerária. 3. System GMM. I.Orientador. II. Universidade Federal de São Carlos. III. Título.
Ficha catalográfica elaborada pelo Programa de Geração Automática da Secretaria Geral de Informática (SIn).
DADOS FORNECIDOS PELO(A) AUTOR(A)
5
AGRADECIMENTO
Agradeço a Universidade Federal de São Carlos pelas conquistas acadêmicas.
Agradeço a CAPES pelo apoio financeiro.
Agradeço a minha orientadora Prof. Dr. Andrea Rodrigues Ferro pelas diretrizes
na condução do meu trabalho.
Agradeço a todos os professores da UFSCar pelas experiências trocadas.
Agradeço ao meu noivo por todo apoio, motivação e contribuições.
Agradeço a minha família, que sempre será a base de tudo.
6
RESUMO
GAULEZ, Maiara. EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA
ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O
PERÍODO 2003-2012. 55 f. – Universidade Federal de São Carlos, Sorocaba, 2016.
O objetivo desta dissertação é quantificar e analisar o efeito marginal da punição por meio
do encarceramento no Brasil, a partir da abordagem da Economia do Crime proposta por
Becker (1968). Essa punição seria eficaz se, a partir dela, fosse possível reduzir a
reincidência criminal e possibilitar a reinserção desses indivíduos na sociedade. Com isso,
o número de crimes não só reduziria pelo indivíduo criminoso que mudará de atividade,
como também, daqueles propensos ao crime ao terem seus incentivos alterados. Dessa
forma, busca-se entender se o aumento no número de presos reduziu a criminalidade,
neste caso investigada por meio da taxa de homicídios. Questiona-se se a pena por
privação de liberdade reduz o número de homicídios no Brasil. O período analisado foi
de 2003 a 2012, em que houve certa estabilidade na taxa de homicídio, mas com
proporção de população carcerária crescente. Este aspecto motivou esta investigação
sobre a referida relação. Por meio de modelos econométricos estimados pelo system
GMM, a variação da taxa da população carcerária mostrou-se estatisticamente
significativa, mas com e valor irrisório do coeficiente como uma determinante na taxa de
homicídio, indicando efeito praticamente inexistente desse tipo de punição em reduzir os
homicídios praticados durante o período.
Palavras-chave: Economia do Crime; População carcerária; Taxa de homicídios; System
GMM.
7
ABSTRACT
The purpose of this master degree thesis is to analyze the marginal effect of punishment
through incarceration for Brazil based on the approach of Economics of Crime proposed
by Becker (1968). This punishment would be effective if it was possible to reduce the
recidivism and if it was possible the reintegration this individuals into society.
Thereat, the number of criminal reduces for two reasons, first some individuals would
change the activity and second some individuals wouldn’t choose this activity, because
their incentives changed. We seek to understand whether the increase in the number of
prisoners has reduced crime (measured by the homicide rate). Therefore, we discuss
whether the penalty of liberty deprivation is the best incentive to reduce the number of
homicides in Brazil. The study period was from 2003 to 2012. During this period, the rate
of homicides was stable while the rate of prison population rose. This is the motivation
for studying the relations among those variables. We adopted econometric models
estimated by the System GMM and their results show that the prison population
coefficient is statistically significant but it has very low magnitude values, pointing out
the ineffectiveness of this kind of punishment in reducing homicides along that period.
Keywords: Economics of Crime; Prison population; Homicide rate; GMM-SYS.
8
LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas no modelo. ......................... 39
Tabela 2– Resultados das estimações por GMM-SYS ................................................... 42
Tabela 3 – Matriz de correlação entre variáveis do modelo ........................................... 54
Tabela 4 – Resultados das estimações EF, EA e GMM-DIF ......................................... 55
LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Síntese da análise dos resultados das estimações por GMM-SYS .............. 44
LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Número e taxa de homicídios no Brasil de 2003 a 2012. ............................ 30
Gráfico 2 – Taxas de homicídio nos estados brasileiros em 2003 e 2012 ...................... 31
Gráfico 3 – Variação da taxa de presos e de homicídio entre 2003 e 2012. ................... 34
Gráfico 4 – Variação da taxa de detenção e de homicídio entre 2003 e 2012. ............... 36
LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Taxa de homicídio nos estados brasileiros em 2003 (esquerda) e 2012
(direita) ........................................................................................................................... 32
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 10
CAPÍTULO 1 – A ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME E SEUS
DESDOBRAMENTOS: UMA REVISÃO DA LITERATURA ................................... 15
CAPÍTULO 2 – ELEMENTOS PARA ANÁLISE EMPÍRICA DA VARIAÇÃO DA
TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO..................... 23
2.1. Metodologia e procedimentos ......................................................................... 24
2.2. A variável dependente: taxa de homicídios ..................................................... 29
2.3. As variáveis explicativas e de controle ........................................................... 33
CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DOS RESULTADOS EMPÍRICOS: O QUE PARECE
EXPLICAR A VARIAÇÃO NA TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE 2003 E 2012? ... 41
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 50
APÊNDICE .................................................................................................................... 54
10
INTRODUÇÃO
O objetivo desta dissertação é quantificar e analisar o efeito marginal da punição
por meio do encarceramento no Brasil, a partir da abordagem da Economia do Crime
proposta por Becker (1968). São objetivos específicos: (1) discutir como a teoria
econômica trata o fenômeno da criminalidade e da punição; (2) investigar as diferentes
formas de se tratar empiricamente os efeitos do encarceramento sobre a criminalidade; e
(3) analisar empiricamente os determinantes da evolução das taxas de homicídio entre as
unidades da federação brasileira.
O crime é um fenômeno estudado por diversas áreas do conhecimento. Na teoria
econômica, seus precursores foram Smijel (1965), Fleisher (1966), Ehrlich (1967) e
Becker (1968) que analisaram o crime como atividade econômica na qual o indivíduo
escolhe alocar seu tempo e recursos entre a atividade legal ou ilegal, de forma a
maximizar sua utilidade esperada. Esta escolha depende de algumas variáveis como o
retorno de cada atividade, as chances de ser pego e condenado, a severidade da punição,
os custos e benefícios psicológicos, caso opte pela atividade ilícita, entre outras variáveis
socioeconômicas e demográficas, justiça criminal e criminógenos, tais como gênero,
idade, desemprego e gasto com segurança, que também influenciam a tomada de decisão
do indivíduo, como evidencia Ehrlinch (1973).
O crime é uma atividade que traz externalidades negativas, não apenas monetários
– como roubo e furtos ou a perda de capital humano, causada por homicídios –, mas
também custos de perda de bem-estar, redução da confiança e da sociabilidade entre
pessoas, efeitos colaterais psicológicos (como traumas pós-violência), desagregação dos
núcleos familiares e dos círculos de convívio etc. A sociedade deve buscar minimizar
esses custos por meio de gastos com segurança, que podem modificar a probabilidade de
11
punição, e de sanção adequada para cada crime, cujos incentivos a cometê-lo são
alterados.
Dentre as punições existentes, Becker argumenta que a melhor forma de
minimizar os custos é por meio de multas, as quais seriam simples transferência de renda.
Assim, o criminoso pagaria todos os danos físicos, materiais e psicológicos da sua vítima.
O problema surge quando o crime é violento ou quando o criminoso não possui a renda
para pagar essa multa. Neste caso, a punição que prevalece é a privação de liberdade. Ele
também argumenta que o período correto para que o criminoso cumpra sua pena
corresponderia ao custo do seu crime, medido em salários que o mesmo receberia se
estivesse trabalhando. Desta forma, ele permaneceria preso durante um período de tempo
equivalente à renda que receberia, exatamente o custo referente ao crime que cometeu.
No Brasil, aproximadamente 70% dos crimes previstos têm como punição a pena
privativa de liberdade (REZENDE, 1999). Punições alternativas, como prestação de
serviço comunitário ou pagamentos de compensação são utilizados apenas em casos no
qual o crime cometido foi sem intenção, no entanto, mesmo estas punições mais brandas
tiveram apenas 25% de seu cumprimento em 20131. Apesar de ser a principal punição
utilizada pela legislação brasileira, a privação de liberdade aparentemente não tem se
mostrado adequado ao objetivo de reduzir os crimes, o que pode ser visto a partir das
taxas criminais do país que crescem todos os anos. Além disso, os custos desse tipo de
punição são extremamente elevados. Em valores de 2006, o custo mensal estimado pelo
Centro de Estudos em Carcerários Aplicados da Universidade de São Paulo era de R$
1.500,00 em presídios das unidades federativas. 2 Em dezembro de 2012, foram
1 Dados retirados da Folha de São Paulo disponível em
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/04/1615765-em-sao-paulo-83-nao-cumprem-penas-fora-da-
prisao.shtml.
2 Dados disponíveis em http://www.gecap.direitorp.usp.br/index.php/noticias/44-custos-da-
prisionalizacao-7-informacoes-basicas-sobre-encarceramento. Acesso em 17 de abril de 2016.
12
registrados no Sistema Penitenciário de Informações do Ministério da Justiça (InfoPen) a
existência de 513.713 presos para 310.243 vagas, apresentando, portanto, um déficit que
chega a 203.470 (equivalente a 1,66 presos por vaga).
Um dos primeiros trabalhos empíricos que buscou entender a relação entre a
punição prisional e o incentivo aos crimes, contra pessoa e contra o patrimônio, foi
publicado por Levitt (1996). Nesse trabalho, o autor estimou, para os estados americanos,
o quanto se reduz a criminalidade quando é retirado um criminoso da rua ao se condená-
lo à prisão. Os resultados mostram que, em média, um criminoso a menos nas ruas
corresponde a uma redução de aproximadamente dez crimes em um ano. Araujo Junior
et al. (2014), por sua vez, analisaram essa relação com dados brasileiros. A partir da
estimação pelo Método Generalizado dos Momentos (GMM) para a taxa de homicídios3.
Seus resultados mostraram uma redução irrisória na taxa de homicídio quando se aumenta
um presidiário no sistema.
Do ponto de vista normativo, um sistema penitenciário eficaz deve garantir os
direitos humanos do presidiário, sua integridade física e moral (SARUBBI E
REZENDE,1997), sendo capaz de levar a redenção do preso e, portanto, a sua não
reincidência no crime (NUNES, 2005).
O aumento das taxas de criminalidade no Brasil ocorreu de forma considerável a
partir da década de 80. De acordo com os dados do Departamento de Informática do SUS
(DATASUS), o número de homicídios aumentou mais de 300% da década de 1980 para
2012. Com isso, dentre as principais preocupações dos brasileiros, a segurança ainda é a
3 O foco em homicídio existente nos trabalhos nacionais (e nesta dissertação também), se dá por dois
motivos. O primeiro é que o homicídio é a modalidade criminal cuja punição não permite penas alternativas,
somente o encarceramento prisional. Isto é importante, portanto, quando se quer avaliar a eficácia do
sistema prisional. O segundo motivo é que os dados de crime contra o patrimônio não são uniformemente
disponibilizados entre as diferentes unidades da federação. Todavia, por meio dos dados do Sistema Único
de Saúde (SUS), que são padronizados e centralizados nacionalmente, é possível obter “óbitos por
homicídio”.
13
segunda maior preocupação, ficando atrás apenas da saúde, segundo a pesquisa do
Instituto Datafolha, em agosto de 20144.
Assim sendo, chega-se a seguinte pergunta: a pena por privação de liberdade causa
redução na taxa de homicídios no Brasil? É possível perceber que na última década houve
certa estabilidade na taxa de homicídios, quando comparada a duas décadas anteriores,
enquanto do número de presos aumentou consideravelmente.
São poucas as bases de dados que trazem informação das condições
socioeconômicas dos indivíduos presos, dificultando entender o motivo pelo qual o
criminoso opta por uma atividade ilícita. Faltam também informações oficiais das
condições de cada um dos presídios no Brasil (LEMGRUBER, 2002 e ARAÙJO JUNIOR
et al., 2014). O acesso aos presídios é extremamente restrito à população civil e, em
função disso, são poucos os trabalhos – na área de economia – que buscam entender o
real perfil dos presos – o que os levam a cometer o crime e principalmente, se esse tipo
de pena realmente reduz a criminalidade.
Dessa forma, este trabalho buscou aprofundar na análise da relação entre o número
de presos e a criminalidade ao utilizar outro método de estimação, o system GMM, e ao
incluir outras variáveis importantes na determinação da criminalidade de acordo com a
abordagem de economia do crime proposta por Smijel (1965), Fleisher (1966), Ehrlich
(1967) e Becker (1968).
Os capítulos a seguir estão ordenados de forma a tentar responder aos objetivos
específicos desta pesquisa. No primeiro capítulo faz-se uma breve revisão da literatura,
elucidando os princípios da teoria de economia do crime, que teve origem com a
abordagem de Becker (1968), e seus avanços a partir dos trabalhos subsequentes, em
particular os trabalhos de natureza empírica. No segundo capítulo é apresentada a
4 Notícia disponível em http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2014/08/seguranca-e-2-maior-
preocupacao-dos-brasileiros-segundo-pesquisa.html. Acesso em 3 de novembro de 2014.
14
metodologia e as características e a evolução dos dados que são utilizados nesta
dissertação. No terceiro capítulo são expostos e discutidos os resultados obtidos por meio
de análise econométrica. Por fim, são feitas as devidas considerações finais.
15
CAPÍTULO 1 – A ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME E SEUS DESDOBRAMENTOS: UMA REVISÃO DA LITERATURA
O objetivo deste capítulo é discutir o fenômeno da criminalidade sob a perspectiva
da Teoria Microeconômica, explicando o modelo teórico desenvolvido a partir de 1968 e
as contribuições e questões trazidas ao longo do tempo por trabalhos empíricos que
buscaram mensurar as relações de causalidade propostas teoricamente.
Devido à complexidade que envolve o comportamento criminoso, diversas áreas
do conhecimento, como sociologia, medicina, economia, dentre outras, buscam entender
os determinantes que levam o indivíduo a cometer o crime. Segundo Cerqueira e Lobão
(2004) a discussão econômica sobre criminalidade, até os precursores da teoria de
economia do crime – Smijel (1965), Fleisher (1966), Ehrlich (1967) e Becker (1968),
aparece em Adam Smith que observou que os crimes e a demanda por segurança eram
motivados pelo acumulo de propriedades, William Paley que analisou os fatores
condicionantes das diferenças entre crimes e sanções e Jeremy Bentham que se ocupou
com o cálculo das respostas ótimas dadas pelas autoridades e o comportamento criminoso
(CERQUEIRA e LOBÃO, 2004).
Atualmente, as abordagens que explicam a criminalidade, segundo Cano e Soares
(2010), podem ser divididas em (i) patologias que levam o indivíduo cometer crimes; (ii)
o crime como uma atividade racional, maximizadora de lucro; (iii) o crime como
subproduto de um sistema social deficiente; (iv) o crime como consequência da
desorganização social; (v) o crime como função de fatores situacionais ou de
oportunidade. Esta dissertação se limitará a utilização da abordagem da Economia do
Crime proposta por Becker (1968).
16
Gary Becker introduziu a teoria microeconômica no mencionado fenômeno
social, enxergando a criminalidade como um mercado no qual o indivíduo, que é por
pressuposto um ser racional, escolhe alocar tempo e recursos nas atividades lícita ou
ilícita de forma a maximizar sua utilidade esperada. A utilidade esperada com a atividade
criminosa depende dos ganhos monetários e psicológicos advindos e da capacidade de se
fazer cumprir a lei (law-enforcemet), por meio da probabilidade de apreensão e
condenação e pela severidade da punição adotados por um país ou estado. A utilidade
esperada dos ganhos monetários e psicológicos difere entre as pessoas a depender da
idade, educação, família, entre outros, e é o que classifica o perfil do indivíduo em relação
ao risco (propenso, neutro ou avesso) (BECKER, 1968). A utilidade esperada depende
dos ganhos com a atividade escolhida, no caso a ilegal, e o tempo que se aloca em
atividades de lazer:
𝐸𝑈(𝑋𝑠, 𝑡𝑐) = ∑ 𝜋𝑠𝑈(𝑋𝑠, 𝑡𝑐)𝑛𝑠=𝑎 (1)
Onde, 𝐸𝑈(𝑋𝑠, 𝑡𝑐) é a utilidade esperada dos ganhos de uma dada uma atividade
no espaço 𝑠 e o tempo alocado nas atividades c, 𝜋𝑠é a probabilidade do espaço s.
Por essa razão, é possível entender o crime por meio de uma análise custo-
benefício. O indivíduo pondera os custos e os benefícios atrelados à atividade criminal e
comete o crime caso o segundo seja maior que o primeiro. De acordo com Jorge, Lemos
e Santos Filho (2008), o indivíduo cometeria o crime se:
BMON + BP > Cmat + nw + Cp + θ (F + γ) (2)
17
Onde, BMON é o retorno monetário da atividade criminal, BP é o retorno
psicológico da atividade criminal, Cmat é o custo material para o planejamento e
execução do crime, nw é o custo de oportunidade – devido a perda de rendimento por
parte da atividade lícita que o indivíduo abriu mão em favor da ilícita, Cp é o custo
psicológico da atividade criminal – como medo, culpa, custo moral, etc., θ é a
probabilidade de apreensão e condenação, F é o tipo de punição e γ representa a
condenação efetiva (JORGE et al 2008. p. 19).
Dessa equação é possível deduzir que alterações na probabilidade de apreensão e
condenação, na severidade da punição ou no custo de oportunidade da atividade ilegal
(por meio de mudanças nos salários do mercado de trabalho e da taxa de desemprego)
podem mudar os incentivos a se cometer um crime. Consequentemente, a reincidência
também é influenciada por essas mesmas variáveis. A escolha de cometer o crime após
sofrida uma punição tem menores custo de execução, devido à experiência adquirida com
a atividade criminal (learning by doing), de risco moral e de oportunidade da atividade
ilegal – a reinserção no mercado de trabalho com bons salários é mais difícil em
comparação aqueles que não são punidos (EHRLINCH, 1973 e ARAUJO JUNIOR e
FAJNZYLBERG, 2001b).
A maioria dos trabalhos econômicos que buscam entender a criminalidade têm
como pressuposto a racionalidade por parte do indivíduo que faz a escolha entre a
atividade lícita ou ilícita. No entanto, não são apenas variáveis econômicas, estruturais e
sociais que influenciam a tomada de decisão: crimes contra a integridade da pessoa, como
o homicídio, normalmente são influenciados também por variáveis psíquicas, as quais
não são tratadas explicitamente nos modelos econômicos (EHRLINCH, 1973). Assim
sendo, os crimes poderiam ser divididos em dois grupos: (i) os chamados crimes
lucrativos (ou econômicos), como roubo, tráfico, estelionato e etc., que se encaixam
18
completamente na racionalidade criminal; (ii) os crimes não lucrativos (ou não
econômicos), como homicídio, estupro, tortura, etc. que envolvem principalmente
variáveis psíquicas, mas podem se encaixar, em parte, na racionalidade criminal
(BECKER, 1968). Apenas as variáveis p (probabilidade de apreensão e condenação) e f
(severidade da punição) resultam no mesmo efeito em ambas formas de crimes.
Em um de seus primeiros trabalhos empíricos Ehrlinch (1973) investigou os
componentes das equações simultâneas de oferta e demanda na determinação do crime
para os estados americanos nos anos de 1940, 1950 e 1960. Foram incluídas variáveis
sócio econômicas como rendimento médio das famílias, percentual de famílias que
ganham menos do que o salário médio, população não branca, homens entre 14 e 24 anos,
taxa de desemprego, anos de estudo, taxa de urbanização, entre outras. A investigação da
importância dessas variáveis na determinação da criminalidade e a inserção de outras
características tornou-se a grande motivação dos estudos que vieram a seguir.
A significância estatística e o sinal dessas variáveis mudam muito entre os
trabalhos, a depender do tipo de crime e método de estimação utilizado. No Brasil existem
poucos trabalhos que investigam a diferença na determinação do crime contra pessoa
devido à falta de dados em abrangência nacional e a subnotificação dos boletins de
ocorrência. Beato Filho (1998) analisou os coeficientes de correlação entre as variáveis
socioeconômicas, crimes violentos e roubos em Minas Gerais no ano de 1991 e encontrou
que a correlação é sempre maior em relação ao roubo, ou seja, a influência das variáveis
socioeconômicas é maior em crimes contra o patrimônio, embora também influenciem o
crime contra pessoa. Fernandes e Lobo (2003) tentaram entender essa dinâmica com os
dados da Região Metropolitana de Salvador de 1993 a 1999. De acordo com seus
resultados não existe grande diferença entre os coeficientes encontrados em crimes contra
pessoa e contra o patrimônio.
19
Recentemente, as pesquisas buscaram investigar se essa inconstância dos
resultados encontrados entre os trabalhos se deve a diferença na influência das variáveis
socioeconômicas a depender do ciclo de vida do indivíduo, assim como já sugerido, mas
não testado por Ehrlinch (1973). Um desse trabalhos foi o de Araújo Junior e Fajnzylber
(2001a). Seus resultados mostram que a importância dessas variáveis na determinação da
escolha entre a atividade legal e ilegal mudam a depender do estágio de vida do indivíduo.
A relação da idade com a taxa de homicídio mostrou-se em forma de "U" invertido, sendo
o seu máximo atingido entre 30 e 32 anos. Em relação as variáveis socioeconômicas, a
renda, o desemprego e a desestrutura familiar (representada por famílias chefiadas por
mulheres solteiras) é positiva em relação a criminalidade. A renda mostrou-se significante
apenas na faixa de idade entre 27 e 29 anos, o desemprego tem influência até 41 anos de
idade e a desestrutura familiar é importante até os 32 anos. A variável de justiça criminal,
representada pela taxa de policiais, não pode ser analisada corretamente devido ao fato
de sua fonte de obtenção subidentificar os policiais dentre a população ocupada5. Outro
trabalho que segue nessa direção é o de Andrade e Lisboa (2000), que também criaram
coortes para analisar a influência das variáveis socioeconômicas na taxa de homicídio ao
longo do ciclo de vida dos indivíduos em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, entre
1981 a 1997. No entanto, não encontraram um padrão comum da frequência do homicídio
entre as coortes e os estados no período estudado. As variáveis econômicas mostram
comportamento cíclico, com sinais esperados e maiores significâncias estatísticas nas
idades mais jovens.
Um dos primeiros trabalhos que buscou entender a correlação entre número de
presos e criminalidade foi o de Levitt (1995). Detectou um efeito de simultaneidade
5 O número de policiais foi retirado das informações de atividades de trabalho das Pesquisas Nacionais
por Amostra de Domicílio. Apesar da pesquisa ser considerada representativas a nível estadual, a variável
de atividade de trabalho não é representativa por apresentar um número muito grande de atividades com
pequena amostra para cada uma delas.
20
(endogeneidade), entre as taxas de diversos crimes e o número de presos. Para resolver
esse “problema” ele introduziu no modelo a variável instrumental “variação no valor da
superlotação dos presídios sob supervisão da Corte dos Estados Unidos”, o que reduziu o
viés na estimação dos coeficientes pelo método dos MQO (Mínimos Quadrados
Ordinários). As elasticidades encontradas foram -0,423 e -0,321 para crimes violentos e
contra o patrimônio, respectivamente. A variável “número de policiais” apresentou sinal
positivo, mas estatisticamente não significativo. Renda per capita e desemprego tiveram
resultados diferentes em função do tipo de crime: em crimes violentos, “renda” mostrou-
se significativa, enquanto “desemprego” não; no caso de crimes contra propriedade, o
resultado foi inverso. Com esse trabalho Levitt concluiu que a liberação de um preso, nos
presídios analisados, aumenta, em média, quinze crimes por ano, sendo dessa forma, a
punição por privação de liberdade é eficaz nos Estados Unidos.
Gainsborough e Mauer (2000) analisaram os dados dos Estados Unidos na década
de 90, em um período que a taxa de aprisionamento crescia, enquanto as taxas de
criminalidade se reduziam. Segundo esses autores, os estados que tiveram maior aumento
no número de presos não foram aqueles que tiveram maior redução na criminalidade,
dessa forma, eles concluem que o aumento na taxa de presos se deve principalmente a
mudanças em decisões policiais: aumento de presos por tráfico de drogas, sentenças mais
longas (o que aumentou o número de presos, enquanto a taxa de detenção reduziu nesse
período) e o aumento de presos sobre custódia. Para os autores, a redução da taxa de crime
se deve à melhora das variáveis socioeconômicas (renda e taxa de desemprego), redução
do tráfico de drogas e novas abordagens de policiamento, como a redução no porte de
armas de fogo.
21
Bandyopadhyay, Bhattacharya e Han (2010), em trabalho mais recente,
contribuíram para a análise da influência da taxa de encarceramento na redução da
criminalidade ao estimarem seu modelo a partir do Método Generalizado dos Momentos
(GMM, na sigla em inglês), que permitiu a utilização de variáveis endógenas sem
provocar viés na estimação. Os resultados encontrados a partir dos dados das áreas
policiais da Inglaterra e do País de Gales entre 1992 e 2008 foram robustos, sendo que a
elasticidade estimada de crimes contra o patrimônio em relação ao aumento da população
carcerária foi de -0,27 e de crimes contra pessoa foi de -0,21. Em seu modelo também foi
incluída a variável “taxa de detenção”, para entender a influência da probabilidade de
aprisionamento e condenação na redução da criminalidade, apresentando sinal esperado
e significância estatística.
Araujo Junior et. al (2014) publicaram um dos trabalhos mais recentes sobre o
efeito do encarceramento. Os autores analisaram a taxa de homicídio dos estados
brasileiros entre 2005 e 2010, comparando os resultados por meio dos estimadores de
dados em painel por Efeito Fixo, Efeito Aleatório e GMM, sendo o último mais robusto.
A taxa de população carcerária apresentou, como esperado, uma relação negativa com a
taxa de homicídio, porém, o coeficiente encontrado foi muito pequeno, próximo de zero,
não sendo possível identificar se essa variável realmente influência a taxa de homicídio.
A taxa de homicídio defasada (“inércia criminal”) tem uma relação positiva na taxa de
homicídio corrente e é significativa a 10%. A taxa de gasto com policiamento também foi
significativa com sinal negativo, isto é, quanto maior o gasto com policiamento menor a
criminalidade. A inércia criminal tem se mostrado importante na determinação da
criminalidade: ela representa o quanto do crime atual é explicado pelo crime passado,
podendo captar a dificuldade de se deixar a atividade ilícita e da reinserção do indivíduo
no mercado de trabalho (após ser preso), além da própria reincidência criminal.
22
Portanto, o que se percebe neste capítulo é que, embora inovadora, a abordagem
proposta por Becker (1968) traz grandes desafios empíricos, a começar pela construção
das variáveis proxy da probabilidade de punição e do efeito dúbio da renda em relação ao
crime. Por outro lado, ele pode ajudar na compreensão desse fenômeno com outro ponto
de vista, o que permite auxiliar no entendimento dos determinantes da escolha do ínvido
pela atividade ilícita e na elaboração de políticas de combate ao crime.
23
CAPÍTULO 2 – ELEMENTOS PARA ANÁLISE EMPÍRICA DA VARIAÇÃO DA TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO
Este capítulo tem como objetivo apresentar o modelo proposto por Becker (1968)
e Ehrlich (1973), assim como os procedimentos metodológicos e as especificações
utilizadas na análise empírica. Também se ocupará em apresentar as variáveis utilizadas,
suas especificações e respectivas bases de dados.
O modelo proposto nesta pesquisa busca entender o efeito marginal da pena por
privação de liberdade na redução da criminalidade, ou seja, quanto um preso a mais no
sistema penitenciário brasileiro reduz a taxa de homicídios, variável proxy da
criminalidade.
Existem relativamente poucos trabalhos que investigaram essa problemática no
mundo e, principalmente, no Brasil. Além disso, os resultados encontrados divergem em
relação aos determinantes da criminalidade, como mencionado anteriormente. Portanto,
esta dissertação busca aprofundar esta investigação ao utilizar outros métodos de
estimação, diferente do proposto por Levitt (1996), e a outras especificações, diferente
das apresentadas por Junior et al. (2014). Esse trabalho agrega contribuição ao utilizar o
estimador GMM-SYS, que melhora os instrumentos quando os dados utilizados
apresentam N grande e t pequeno, e ao inserir um proxy para a variável probabilidade de
apreensão de condenação, que é muito importante na determinação da escolha do
indivíduo entre a atividade legal e ilegal.
Os dados aqui utilizados estão dispostos em forma de painel, contendo os 26
estados brasileiros e o Distrito Federal no período de 2003 a 2012 (10 anos). A escolha
desse período se deve a limitação da disponibilidade dos dados. Os dados da população
penitenciária, que são obtidos do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias
24
(InfoPen), tem sua série iniciada em 2003 e se estende até 2012 (informação mais atual
encontrada durante o período desta pesquisa).
2.1. Metodologia e procedimentos
Como exposto anteriormente, no modelo proposto por Becker (1968) e Ehrlich
(1973), o indivíduo escolhe alocar seu tempo e recursos na atividade legal ou ilegal a
depender de condições socioeconômicos, demográficos, de justiça criminal e
criminógenos, de forma a maximizar sua utilidade esperada. Porém a utilidade esperada
não pode ser mensurada por ser não observável, dessa forma, o produto da escolha tomada
pelo indivíduo, que são os registros dos crimes (no caso desse trabalho representado pelo
crime de homicídio), pode ser utilizado como proxy da oferta agregada dos crimes
cometido pelos delinquentes.
Por outro lado, a “demanda” dos crimes pela sociedade (isso porque o crime é
visto como uma atividade, apresentando demanda e oferta) pode ser explicada pela
especialização dessa atividade ao longo do tempo, com ganhos de produtividade e com
baixa probabilidade de apreensão e condenação (fatores de ampliação da procura). A
demanda agregada é inserida no modelo através do crime defasado, da seguinte forma:
tx_hom𝑖,𝑡 = 𝛼tx_hom𝑖,𝑡−1 + β1presos𝑖,𝑡 + θ𝐱𝑖,𝑡 + ε𝑖𝑡 com |𝛼| < 1 (3)
Onde
ε𝑖𝑡 = η𝑖 + ν𝑖,𝑡 (4)
Em que tx_homi,t é a taxa de homicídio em logaritmo no local i no período
t, presosi,t, é a taxa da população carcerária (variável explicativa de interesse do modelo),
𝐱i,t é a matriz composta por variáveis explicativas de controle, ηi é o efeito fixo de estado
e νi,t são os erros aleatórios. Pressupõe-se que
25
E[η𝑖] = E[ν𝑖,𝑡] = E[η𝑖ν𝑖,𝑡] = 0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑖 = 1,… ,𝑁 𝑒 𝑡 = 2, … , 𝑇 (5)
O procedimento metodológico inicia-se com a estimação dos dados em painel pelo
modelo de Efeito Fixo e Efeito Aleatório, sem a inclusão da variável dependente defasada.
Os resultados dessas estimações são apresentados no apêndice. Para verificar a existência
de características sociais, culturais, políticas, entre outras, que são não observáveis e
estáveis ao longo do tempo entre os estados foi utilizado o teste de Hausman. O resultado
do teste de Hausman indica que a melhor especificação é de efeito fixo, corroborando
com os estudos com dados brasileiros que não refutaram, até então, a hipótese da
existência de efeitos fixos não observados. Dessa forma, as estimações desses modelos
tiveram o intuito verificar a necessidade de considerar o efeito fixo nos modelos
dinâmicos.
Em seguida, foram estimados os modelos dinâmicos. Estes permitem a inserção
da variável dependente defasada, que é importante por motivos teóricos, mencionados
anteriormente – a aprendizagem e a reincidência – e estatísticos, devido a existência de
efeito autoregressivo de ordem 1, i.e., AR(1), na série de homicídio. Além disso, permite
a utilização de variáveis endógenas no modelo. Os estimadores mais indicados no caso
de modelos dinâmicos são os estimadores Diference GMM (ARELLANO e BOND,
1991) e System GMM (ARELLANO e BOVER, 1995 e BLUNDELL e BOND, 1998).
O método de estimação, sugerido por Arellano e Bond (1991), o Diference GMM,
propõe que se utilize variáveis defasadas pelo menos em dois períodos como instrumento
para o modelo de primeira diferença. O modelo de primeira diferença possibilita que o
efeito fixo, η𝑖, da equação 3, seja eliminado o que acaba com a correlação entre η𝑖 e a
variável dependente, de acordo com o procedimento sugerido por Anderson e Hsiao
26
(1981). Segundo Windmeijer (2000), para amostras finitas a estimação em dois estágios
é mais eficiente do que em um estágio.
∆tx_homi,t = α∆tx_homi,t−1 + β1∆pesosi,t + 𝜃∆𝑿𝑖,𝑡 + ∆ν𝑖,𝑡 (6)
Além das condições 5 e 6, pressupõe-se, para a condição inicial, tx_hom𝑖,1, que
E[tx_homi,1ν𝑖,𝑡] = 0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑖 = 1,… ,𝑁 𝑒 𝑡 = 2,… , 𝑇 (7)
Para simplificar a descrição da estimação do Diference GMM vamos considerar
um modelo AR(1) geral dado por
𝑦𝑖,𝑡 = 𝛼𝑦𝑖,𝑡−1 + η𝑖 + ν𝑖,𝑡 (8)
A estimação pelo Diference GMM apresenta 𝑚 = 0,5(T − 1)(T − 2) condições
de momentos lineares 𝛼
E[tx_homi,t−s∆ν𝑖,𝑡] = 0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑡 = 3,… , 𝑇 e 𝑠 ≥ 2 (9)
Podemos escrever a equação acima da forma restrita
E[𝐙𝑖′�̅�𝑖] = 0 (10)
27
Onde �̅�𝑖 é um vetor (𝑇 − 2) de (∆𝑣𝑖,3, ∆𝑣𝑖,4, … , ∆𝑣𝑖,𝑇 e 𝐙𝑖 é a matriz 𝑚 x 𝑁(𝑇 −
2) de instrumentos dada por (foram omitidos os subscritos i)
𝒁𝑖 = [
𝑦𝑖 0 0 ⋯ 0 ⋯ 00 𝑦1 𝑦2 ⋯ 0 ⋯ 0. . . ⋱ . ⋯ .0 0 0 ⋯ 𝑦1 ⋯ 𝑦𝑇−2
]
O Diference GMM minimiza a distância quadrática de (�̅�′𝐙𝐀𝑁𝒁′�̅�) por alguma
matriz 𝐀𝑁. Onde 𝒁′ é uma matriz 𝑚 x N(T − 2), �̅�′ é um vetor N(T − 2). A estimação
de 𝛼 é dada por
�̂�𝑑𝑖𝑓 = (�̅�−1′ 𝐙𝐀𝑵𝒁′�̅�−1)
−1�̅�−1′ 𝐙𝐀𝑵𝒁′�̅� (11)
Posteriormente, Blundell e Bond (1998) demonstraram que o estimador Diference
GMM tem propriedades fracas quando a variável dependente é aleatória, pois os níveis
passados guardam pouca informação sobre as mudanças futuras da variável, tornando os
instrumentos, que são as variáveis defasados, fracos. Nesses casos o System GMM
(ARELLANO e BOVER 1995) é mais eficiente ao utilizar mais defasagens como
instrumentos para 𝑦𝑖,𝑡. Assumindo que
E[∆tx_hom𝑖,2η𝑖] = 0 (12)
Com 𝑇 − 2 condições de momentos, tem-se
E[∆tx_hom𝑖,𝑡−1𝜀𝑖𝑡] = 0 para𝑖 = 1,… ,𝑁 𝑒 𝑡 = 3,… , 𝑇 (13)
28
Sendo possível usar a primeira diferença das variáveis como instrumentos para as
equações em nível. A estimação System GMM é análoga a descrita anteriormente,
utilizando a nova matriz de instrumento, dada por
𝒁𝑖+ =
[ 𝑍𝑖 0 0 ⋯ 00 ∆𝑦2 0 ⋯ 00 0 ∆𝑦𝑖3 ⋯ 0. . . ⋯ 00 0 0 ⋯ ∆𝑦𝑖,𝑇−1]
A consistência das estimações dos modelos dinâmicos são testadas a partir do teste
de Sargan que analisa a validade do conjunto dos instrumentos utilizados e o teste
Arellano-Bond para identificar existência de autocorrelação serial nos erros
(ARELLANO e BOND, 1991), a existência de autocorrelação implicaria que a taxa de
homicídio defasada em 𝑡 − 2 é endógena ao erro em 𝑡 − 1, fazendo com que ∆𝜀𝑖𝑡 ≠
0, ou seja, os instrumentos sejam inválidos. Não rejeitar a hipótese nula no teste de Sargan
e de Arellano-Bond (para a primeira e segunda ordem) indica que os instrumentos são
robustos e que não existe autocorrelação serial nos erros.
Os resultados obtidos através da estimação do Diference GMM, que não é o
estimador mais indicado para o modelo apresentado, e os dados utilizados encontram-se
no apêndice e os resultados do System GMM são apresentados e discutidos no capítulo
seguinte. As diferentes especificações apresentadas utilizam o GMM-SYS em dois
estágios com correção para heterocedasticidade e uso de controle de efeito fixo no tempo.
As variáveis consideradas endógenas são a taxa de homicídio defasada, taxa de população
carcerária e a taxa de detenção, as demais variáveis não tem sustentação teórica para
serem tratadas como endógenas.
29
2.2. A variável dependente: taxa de homicídios
A escolha da variável taxa de homicídios por 100 mil habitantes como proxy para
criminalidade ocorre por dois motivos. Primeiro, pelo homicídio ser a modalidade
criminal cuja punição não permite penas alternativas, somente o encarceramento
prisional, e segundo por existirem dados de abrangência nacional e periodicidade desse
tipo de crime (o que não ocorre com o crime contra o patrimônio).
Existem duas grandes fontes de dados que reportam os crimes ocorridos: (i)
boletins de ocorrência (BO) registrados pela polícia civil em cada unidade da federação
e (ii) certidões de óbitos registradas pelos Institutos Médico Legal e disponibilizada pelo
Ministério da Saúde através do Sistema de informações de Mortalidade (SIM).
A primeira fonte possui informações de todos os tipos de crimes, como roubo,
furto, homicídio e etc. No entanto, esses dados não estão disponíveis em âmbito nacional
e sua forma de registro pode variar entre as unidades da federação. Outro problema
encontrado é a subnotificação dos BO, pois nem todos os crimes são reportados. É por
esse motivo que a maioria dos trabalhos científicos brasileiros utiliza as informações
advindas da segunda fonte, que só reporta o crime de homicídio. As informações do SIM
são disponibilizadas com abrangência nacional, seguem padrão de coleta e registro de
dados internacional (CID) e apresentam menor subnotificação (PIQUET e
FAJNZYLBER, 2001; JORGE, LEMOS e SANTOS FILHO, 2008).
No período de análise desse trabalho, 2003 a 2012, a taxa de homicídio variou
muito pouco entre os anos (menos de 1%), a menor taxa foi em 2005 e a maior em 2012,
de 25,8 e 29,1, respectivamente. O Gráfico 1 ilustra o comportamento número e da taxa
de homicídios no período.
30
Gráfico 1 – Número e taxa de homicídios no Brasil de 2003 a 2012.
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do TCU e DATASUS.
Apesar das taxas de homicídio brasileiras não terem variado muito ao longo da
década de 2000, ficando próxima de 27 por 100 mil habitantes, sendo importante
mencionar a redução da taxa de homicídio de 2003 a 2015, que teve grande influência
devido a Lei 10.826 de Desarmamento. Por meio do Gráfico 2 é possível perceber que a
variação da violência entre os estados não permaneceu constante. Houve aumento tanto
do limite superior quanto do limite inferior da taxa de homicídios entre os estados de 2003
para 2012. A maior taxa passou de 55,3 para 64,3 mortos por cem mil habitantes, um
aumento de 16,8%, e a menor taxa de 11,8 para 12,7, um aumento de 7,8%. Alagoas, que
antes encontrava-se na sexta posição, passou a ser o estado mais violento, com o aumento
da sua taxa de homicídio em 81,5%, enquanto Pernambuco, que em 2003 era o estado
mais violento, em 2012 passou a ocupar a décima posição, ao apresentar redução de 33%
dessa modalidade de crime (ver Figura 1).
24
25
26
27
28
29
30
42
44
46
48
50
52
54
56
58
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
Ta
xa
Mil
ha
res
N° de homicídios Taxa de Homicídio
31
Gráfico 2 – Taxas de homicídio nos estados brasileiros em 2003 e 2012
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do TCU e DATASUS.
10
12
13
14
16
17
17
18
18
20
21
21
24
25
25
26
29
30
32
34
34
35
36
36
39
50
53
55
0 20 40 60
Piaui
Santa Catarina
Maranhao
Rio Grande do Norte
Bahia
Tocantins
Paraiba
Rio Grande do Sul
Amazonas
Ceara
Minas Gerais
Para
Acre
Sergipe
Goias
Parana
Brasil
Roraima
Mato Grosso do Sul
Distrito Federal
Mato Grosso
Amapa
Alagoas
Sao Paulo
Rondonia
Espirito Santo
Rio de Janeiro
Pernambuco2003
13
15
17
22
23
26
27
27
27
28
29
30
33
33
34
35
36
36
37
37
40
42
42
42
45
45
47
65
0 20 40 60 80
Santa Catarina
Sao Paulo
Piaui
Rio Grande do Sul
Minas Gerais
Maranhao
Tocantins
Mato Grosso do Sul
Acre
Rio de Janeiro
Brasil
Roraima
Parana
Rondonia
Mato Grosso
Rio Grande do Norte
Distrito Federal
Amapa
Pernambuco
Amazonas
Paraiba
Para
Sergipe
Bahia
Ceara
Goias
Espirito Santo
Alagoas
2012
32
Figura 1 – Taxa de homicídio nos estados brasileiros em 2003 (esquerda) e 2012
(direita)
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do TCU e DATASUS.
Sete estados ficaram menos violentos. São Paulo foi o principal, saiu da quinta
posição para vigésima sexta, com redução de 57,8% na taxa de homicídio, seguido por
Rio de Janeiro - que saiu da segunda posição para décima oitava, com redução de 46,2%
-, Pernambuco - já mencionado anteriormente -, Mato Grosso do Sul - que saiu da décima
posição para vigésima, com redução de 16,2% -, Rondônia - que saiu da quarta posição
para décima quarta, com redução de 15,2% -, Espírito Santo - que apesar de ter subido
uma posição, de terceiro para segundo, apresentou redução de 7%, e Mato Grosso - que
saiu da oitava posição para décima quarta, com redução de 0,6%.
Porém, as maiores variações entre esses anos ocorreram no sentido do aumento
da violência. A Bahia apresentou aumento de 160% na taxa de homicídio: passou de
vigésimo terceiro estado mais violento para quinto – sua taxa de homicídio era de 16,1
em 2003 e em 2012 passou para 41,9. Outros estados que tiveram aumento considerável
foram Rio Grande do Norte - com aumento de 148%, saiu da vigésima quarta posição
para a décima terceira -, Paraíba - com aumento de 128,7%, saiu da vigésima posição para
33
a oitava -, Ceará - com aumento de 121,7%, saiu da décima oitava posição para a quarta
- e Amazonas - com aumento de 103,3%, saiu da décima nona posição para nona.
2.3. As variáveis explicativas e de controle
As variáveis explicativas e de controle utilizadas no modelo estão divididas em
quatro blocos: determinantes socioeconômicos, demográficos, justiça criminal e
criminógenos. Em relação aos determinantes socioeconômicos foram utilizadas as
variáveis de renda e desigualdade, obtidas por meio da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios (PNAD) e do Censo Demográfico de 2010, ambas realizadas pelo IBGE.
Para o determinante demográfico será empregado o percentual da população masculina
jovem de cada estado, também obtido através dessas fontes. Com relação aos
determinantes de justiça criminal, foram utilizadas a taxa de população carcerária por 100
mil habitantes, uma proxy para punição (número de presos em relação ao número de
criminosos) e a variável taxa de policiais por 100 mil habitantes, retirados do InfoPen. Já
como determinante criminógeno adotou-se a taxa de óbitos por uso de álcool e drogas por
cem mil habitantes obtidos através DATASUS. A seguir são detalhadas todas as variáveis
explicativas utilizadas nesse modelo:
(1) Taxa de População Carcerária: esta variável é construída pela razão entre o
número de presos e a população total do estado por 100 mil habitantes. É esperado que,
mantendo-se a sentença constante para qualquer tipo de crime, um aumento exógeno da
criminalidade resultará em um aumento proporcional da população carcerária.
Durante o período analisado, o número absoluto de presos aumentou 114%, a taxa
de encarceramento por cem mil habitantes foi de 135 em 2003 para 265,8 em 2011 (ver
Gráfico 3). O crescimento do número de presos foi bem maior do que o aumento no
número de homicídios, de apenas 2%. A partir dos dados disponíveis, não é possível
separar o número de presos por tipo de crime cometido, o que seria mais indicado para a
34
estimação do modelo. Esse fato limita de forma considerável a análise empírica da
eficácia do sistema prisional.
Gráfico 3 – Variação da taxa de presos e de homicídio entre 2003 e 2012.
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do InfoPen e DATASUS.
Os estados que apresentaram maior aumento na taxa de encarceramento foram
Minas Gerais, Goiás e Espírito Santo, que não são os mesmos que apresentaram maior
crescimento na taxa de homicídio. Não parece existir uma relação direta entre os estados
que tiveram aumento na taxa de homicídio com variações na taxa de encarceramento no
mesmo período de tempo, como também, no período anterior, ou seja, o aumento da
criminalidade hoje influenciando mudanças na população presa amanhã. Isto pode ser
explicado pelo aumento no número de presos por outros crimes que não homicídio.
É importante ressaltar que as informações disponibilizadas pelo InfoPen são
informações compiladas pelos órgãos de segurança pública, ou seja, não há garantia de
-100%
0%
100%
200%
300%
400%
500%
600%
700%
Acr
e
Ala
go
as
Am
apá
Am
azo
nas
Bah
ia
Cea
rá
Dis
trit
o F
eder
al
Esp
irit
o S
anto
Go
ias
Mar
anhão
Mat
o G
ross
o
Mat
o G
ross
o d
o s
ul
Min
as G
erai
s
Par
á
Par
aíb
a
Par
aná
Per
nam
bu
co
Pia
ui
Rio
de
Jan
eiro
Rio
Gra
nd
e d
o N
ort
e
Rio
Gra
nd
e d
o S
ul
Ron
dôn
ia
Rora
ima
San
ta C
atar
ina
São
Pau
lo
Ser
gip
e
To
canti
ns
variação da taxa de presos 2003/2012 variação da taxa de homicídio 2003/2012
35
que, entre os estados, os registros utilizam a mesma forma de metodologia ou
classificação das informações. Além disso, existem "saltos" nas informações de um ano
para o outro que não são justificados6.
(2) Taxa de Detenção: essa variável é construída pela razão entre o número de
presos e o número de crimes cometidos, nesse caso, homicídios, em um dado período de
tempo para cada estado, como mostrado a seguir:
detencãoi,t =nº de presos
nº homi,t−1 (5)
Onde nº homi,t−1 é o número de homicídios no estado 𝑖 defasado em um e dois
períodos de forma ad-hoc.
A taxa de detenção representa, de acordo com o modelo proposto, a probabilidade
de apreensão e condenação do crime, uma das variáveis relacionada aos custos do crime
– quanto maior a probabilidade desta, maior o custo de escolha da atividade ilegal. Esse
custo está relacionado ao quanto o criminoso deixará de ganhar, em termos monetários,
tanto na atividade legal quanto ilegal, no período que estiver preso; ao risco moral,
sofrimento causado a ele mesmo, família e amigos; e a dificuldade da reinserção no
mercado de trabalho com salário compatível após o cumprimento da punição.
O aumento da punição reduz a criminalidade por dois motivos: primeiro, por
simplesmente retirar o criminoso da rua, impossibilitando-o, temporariamente, de
cometer outros crimes; em segundo lugar, por aumentar o custo do crime. Esses dois
efeitos não podem ser separados, o que dificulta o entendimento da real influência dessa
variável na redução da criminalidade (EHRLINCH 1973 e 1975).
6 Por exemplo, Mato Grosso possuía 6.802 presos em 2003 depois reduziu para 4.684 em 2004 e subiu
novamente para 7.221 em 2005. Assim como Santa Catarina, que em 2003 tinha 6.693 presos, em 2004
passou para 13.016 e em 2005 reduziu novamente para 9.570.
36
A probabilidade de punição também aumentou no período de referência em 9.7%,
entre 2003 e 2011 (ver Gráfico 4), porém, isso se deve ao fato de que houve pouco
aumento no número de homicídios (7,3% entre 2001 e 2009) enquanto o número de presos
aumentou consideravelmente (114%). Os estados que apresentam maiores taxas de
detenção são Acre, com taxa de 21,5, e Santa Catarina, com taxa de 19,9. Aqueles que
mais aumentaram a probabilidade de punição foram São Paulo, que passou da taxa de
punição de 6,3 em 2003 para 32,6 em 2011 e Minas Gerais, que foi de 2,3 para 12,5.
Gráfico 4 – Variação da taxa de detenção e de homicídio entre 2003 e 2012.
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do InfoPen e DATASUS.
(3) Renda: a renda considerada nesta dissertação é a renda média dos domicílios
por estado, que foi corrigida pelo IPCA a valores de 2014. De acordo com a teoria, existe
um efeito duplo dessa variável, o primeiro representa o custo de oportunidade da atividade
legal, que tem uma relação inversa com o crime, ou seja, quanto menor a renda que o
indivíduo pode aferir no mercado legal, maior é o incentivo a escolha pela atividade
-100%
0%
100%
200%
300%
400%
500%
Acr
e
Ala
go
as
Am
apá
Am
azo
nas
Bah
ia
Cea
rá
Dis
trit
o F
eder
al
Esp
irit
o S
anto
Go
ias
Mar
anhão
Mat
o G
ross
o
Mat
o G
ross
o d
o s
ul
Min
as G
erai
s
Par
á
Par
aíb
a
Par
aná
Per
nam
bu
co
Pia
ui
Rio
de
Jan
eiro
Rio
Gra
nd
e d
o N
ort
e
Rio
Gra
nd
e d
o S
ul
Ron
dôn
ia
Rora
ima
San
ta C
atar
ina
São
Pau
lo
Ser
gip
e
To
canti
ns
variação da taxa de detenção 2003/2012 variação da taxa de homicídio 2003/2012
37
ilegal. O segundo efeito é o pay-off do crime, e apresenta uma relação direta com a
criminalidade, isso porque, quanto maior for a renda por parte das vítimas, em uma dada
região, maior a criminalidade (ARAUJO JUNIOR E FAJNZYLBER, 2001b). O resultado
final depende de qual dos efeitos é mais forte, o que pode ser influenciado pela proxy
escolhida.
Aparentemente, os estados com maior renda média dos domicílios são aqueles que
apresentam menor taxa de criminalidade, ou seja, o efeito esperado é uma relação inversa
entre a renda e a criminalidade, a partir dos dados utilizados.
(4) Desigualdade de Renda: adotou-se o Índice de Gini como indicador de
desigualdade. Foi inicialmente introduzida no modelo para lidar com o efeito duplo da
renda, pois controlaria a correlação contrária entre renda e criminalidade, fazendo com
que esta mostrasse apenas o efeito do ganho com o crime (FLEISHER, 1966). No entanto,
a variável por si só tem efeito sobre a criminalidade ao indicar a proximidade
(convivência no mesmo território) de indivíduos com rendimentos muito diferentes
(FAJNZYLBER, LEDERMAN E LOAYZA 1999). De qualquer forma, é esperada uma
relação direta, quanto maior a desigualdade, maior a criminalidade.
(5) Taxa de desemprego: a taxa de desemprego é a razão entre o número de
desempregados e a PEA (população economicamente ativa) e é inserida no modelo com
uma defasagem. Segundo Freeman (1994), o desemprego tem efeito defasado no tempo
no aumento da criminalidade, em seu trabalho ele testou o efeito dominante dessa variável
ao inserir no modelo a taxa de desemprego em 𝑡 e em 𝑡 − 1, obtendo sinal negativo no
momento corrente e positivo no momento defasado, o que demonstra a existência de
defasagem na influência dessa variável no aumento da criminalidade.
De qualquer modo, o desemprego também tem efeito ambíguo. Um aumento em
sua taxa reduz a possibilidade de ganho com a renda do mercado legal, o que diminui o
38
custo de oportunidade da atividade ilícita e aumenta a criminalidade. Por outro lado, esse
aumento causa redução da renda local, o que diminui os ganhos com a atividade ilegal e
reduz a criminalidade (EHRLINCH, 1973).
(6) Utilização de álcool e drogas: como proxy para essa variável foi utilizado o
número de mortes ocasionadas pelo uso de álcool e drogas registradas no SIM por cem
mil habitantes, com base na metodologia criada por Cerqueira (2014)7. O aumento do
número de pessoas que ingerem álcool e drogas e a facilidade em obtê-los parece ser uma
das principais razões que mantém elevada a taxa de criminalidade, principalmente a taxa
de crimes violentos, durante os anos 2000 (CERQUEIRA 2014).
A disseminação da cocaína foi um dos fatores significativos para o aumento da
criminalidade, principalmente no homicídio de jovens, nos anos 80, nos Estados Unidos
(GROGGER E WILLIS 1998). No Brasil, existem muitos trabalhos que discutem essa
questão nas áreas de ciências sociais, psicologia e ciência política, contudo, poucos
trabalhos analisam a questão do ponto de vista da abordagem de economia do crime
proposta por Becker. Beato Filho et al. (2001), investigaram a influência do mercado de
drogas em Belo Horizonte, MG, preocupando-se com sua espacialização em aglomerados
(clusters) com alto uso de drogas e a violência. Seus resultados mostram que o tráfico de
drogas aumenta a violência sistêmica, o que gera maiores taxas de homicídio. A influência
do tráfico na criminalidade é extremamente alta por interferir diretamente na escolha pela
atividade ilegal. A atratividade dos ganhos fáceis e ascensão social no meio de
convivência induzem o aumento de "gangues" por onde ele passa (SHIKIDA e BORILLI,
2007 e SCHAEFER E SHIKIDA, 2009).
7 As subcategorias utilizadas do CID-10 são: F100-109, F110-119, F120-129, F140-149, F160-169, F190-
199, R780-789, T400-409, T438-449, X420-429, X450-459, X620-629, Y150-Y159, Y900-Y909 e
Y911-Y919.
39
Logo, é esperado que quanto maior a taxa de uso de drogas e álcool maior a
criminalidade.
(7) Proporção de homens jovens na população: é o número de homens entre 15 e
29 anos dividido pelo total da população. Praticamente todos os trabalhos que testam
empiricamente o modelo de economia do crime controlam a variação da taxa de
homicídio pelo sexo e/ou pela idade. A incidência da ocorrência de crimes é maior sobre
a população de homens em idade "jovem" tanto por parte dos indivíduos que cometem o
crime, quanto por suas vítimas (ANDRADE E LISBOA 2000, ARAÚJO JUNIOR E
FAJNZYLBER, 2001a). Dessa forma, espera-se que quanto maior a proporção de homens
jovens na população, maior a criminalidade.
É interessante notar, a partir da Tabela 1, a grande heterogeneidade entre os
estados brasileiros de algumas variáveis utilizadas no tempo e no espaço.
Tabela 1 – Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas no modelo.
Variável Dimensão Média Desvio-
padrão Mínimo Máximo
Taxa de Homicídios overall
28,92
11,71 10,19 71,39
between 10,35 12,03 54,62
within 5.,60 9,02 47,09
Taxa de Pop. Carcerária overall
199,87
117,93 29,31 513,79
between 107,54 51,33 412,89
within 52,25 48,01 391,23
Taxa de Detenção overall
8,26
5,51 1,03 32,63
between 4,89 1,67 20,42
within 2,68 (3,40) 22,94
Uso de álcool e drogas overall
3,67
1,80 0,43 8,75
between 1,67 0,85 6,76
within 0,74 0,69 5,88
Desigualdade de Renda overall
0,51
0,03 0,41 0,59
between 0,03 0,44 0,56
within 0,02 0,44 0,57
Homens Jovens overall
14,71
1,02 11,78 17,84
between 0,85 12,52 16,01
within 0,58 12,97 16,54
40
Variável Dimensão Média Desvio-
padrão Mínimo Máximo
Taxa de desemprego overall
9,40
2,51 3,38 16,64
between 1,96 5,34 13,48
within 1,61 3,84 14,71
Renda overall
2555,46
862,19 209,17 6236,96
between 818,93 1660,67 5550,56
within 308,49 618,78 3316,87
Fonte: elaboração própria a partir dos dados das fontes citadas.
Espera-se que as variáveis taxa de homicídio defasada, uso de álcool e drogas,
desigualdade de renda e homens jovens, apresentem coeficientes com sinal positivo, e as
variáveis taxa de população carcerária e taxa de detenção, apresentem coeficiente com
sinal negativo. As variáveis taxa de desemprego e renda possuem relação ambígua com a
criminalidade, como descrita anteriormente, podendo apresentar sinal positivo ou
negativo. Os resultados obtidos através do procedimento metodológico descrito neste
capitulo encontram-se a seguir.
41
CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DOS RESULTADOS EMPÍRICOS: O QUE PARECE EXPLICAR A VARIAÇÃO NA TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE 2003 E 2012?
Neste capítulo são apresentados os resultados obtidos pelas estimações
econométricas e os respectivos testes de hipóteses. Aqui se confronta os resultados
esperados e os resultados obtidos, cuja análise permite inferir sobre os determinantes da
variação das taxas de homicídios entre as unidades da federação entre 2003 e 2012.
Os resultados empíricos variam muito de pesquisa para pesquisa, a depender da
especificação do modelo, do tipo de dado (cross-section, séries de tempo ou painel) e do
método de estimação, como exposto na literatura discutida ao longo dos Capítulos 1 e 2.
A existência de viés de variável omitida (que ocorre devido a complexidade
multidimensional desse fenômeno), a ausência de dados e, por vezes, a necessidade de
limitação da inclusão de variáveis explicativas em consequência do baixo número de
graus de liberdade, podem viesar os parâmetros estimados.
A inclusão da taxa de homicídio defasada pode ajudar no entendimento da
criminalidade a longo prazo e a controlar possível dinâmica na geração dessa variável.
Os modelos GMM permitem não apenas a inclusão da variável dependente defasada
como também, a utilização de variáveis explicativas endógenas ao modelo. O modelo
dinâmico estimado através do System GMM tona os instrumentos utilizados mais
consistentes.
Os resultados das especificações utilizadas estimadas a partir do GMM-SYS são
apresentados na tabela 1. Os testes de Sangan e de Arellano-Bond (autocorrelação de
primeira e segunda ordem indicam que os instrumentos utilizados são válidos. A
especificação GMM incluí todas as variáveis descritas no capitulo 2, a GMM2 elimina da
estimação a taxa de detenção, devido a autocorrelação encontrada entre a taxa de
42
população carcerária essa variável (a matriz de correlação encontra-se no apêndice), e,
por fim, o GMM3 elimina a taxa de detenção e a taxa de desemprego em t da estimação,
por essa segunda mostrar-se altamente correlacionada com a taxa de desemprego em 𝑡 −
1.
Tabela 2– Resultados das estimações por GMM-SYS
Variável dependente: taxa de
homicídios por cem mil habitantes GMM-SYS GMM-SYS2 GMM-SYS3
Taxa de Homicídios (t-1) 0.7021 *** 0.6825 *** 0.8031 ***
(4.39) (5.03) (6.94)
Taxa de Pop. Carcerária -0.0001 -0.0001 ** -0.0001 ***
(0.26) (1.97) (2.58)
Taxa de Detenção -0.0055
(0.26)
Uso de álcool e drogas -0.0013 -0.0049 -0.0049
(0.12) (1.08) (1.1)
Desigualdade de renda 1.3295 *** 0.9066 ** 0.3785 *
(2.85) (2.03) (1.72)
Homens jovens -0.0052 -0.0146 -0.009
(0.31) (1.01) (0.7)
Taxa de desemprego𝑡 0.0025 0.0059 *
(0.49) (2.03)
Taxa de desemprego𝑡−1 0.0064 0.0039 0.0035
(1.32) (1.04) (1.23)
Renda -0.0001 ** -0.0001 ** -0.0001 *
(1.97) (2.19) (1.79)
Teste de Sangan 1 1 1
Teste AR(1) 0.0099 0.0161 0.0088
Teste AR(2) 0.3306 0.3107 0.5002 Fonte: Elaboração própria por meio do software Stata 12.1.
Notas: Estimativa em dois estágios com correção paa heterocedasticidade e uso de controle de efeito fixo
no tempo. As variáveis instrumentais são a taxa de população carcerária e a taxa de detenção. Os
resultados entre parênteses representam o desvio-padrão e os asteriscos a estatística do p-valor (* p <
0,10, ** p < 0,05 e *** p < 0,01).
Como observado, algumas variáveis não se mostram estatisticamente
significativas, ao nível de 10% a taxa de homicídio defasada, a desigualdade de renda, e
a renda são significativas em todas as especificações.
Os resultados obtidos do coeficiente da inércia criminal variaram entre 0,68 e
0,80, segundo Fajnzylber, Lederman e Loaya (1999), que pesquisaram essa variável para
de 45 países, obtiveram como resultados que o crime defasado varia entre 0,5 e 0,9, ou
43
seja, entre 50% a 90% do crime atual tem influência do crime passado. Dessa forma, os
resultados encontrados neste trabalho se encontra dentro do intervalo esperado e é
compatível com as evidências empíricas internacionais.
A variável taxa de população carcerária, variável de interesse desse trabalho,
apresentou significância a 10% nos modelos GMM-SYS2 e GMM-SYS3, quando retirada
a variável taxa de detenção. O sinal encontrado foi o esperado, no entanto, não é possível
afirmar que um aumento no número de presos reduz a taxa de homicídio devido ao baixo
valor do coeficiente encontrado, no qual o valor zero encontra-se dentro do intervalo de
confiança.
A desigualdade de renda apresentou sinal esperado e com coeficiente com valores
elevados, comparados de forma relativa às outras variáveis, esta demonstra alta influência
na determinação das variações na taxa de homicídio. Por outro lado, a variável renda
apresentou baixo valor do coeficiente encontrado, repetindo o ocorrido com a variável
taxa de população carcerária (o valor zero está incluído no intervalo de confiança), e sinal
negativo, representando o custo de oportunidade do mercado de trabalho.
A seguir, são comparados, na medida do possível, os resultados encontrados nesta
pesquisa com outros trabalhos que buscaram estimar a influência do aumento do número
de presos na redução da criminalidade. A dificuldade de comparação se deve as diferentes
metodologias utilizadas e as diferentes bases de dados.
Levitt (1996), foi um dos primeiros trabalhos a analisar essa relação, a diferença
das variáveis utilizadas (retiradas do censo carcerário dos EUA) e a estimação por
variável instrumental, dificulta muito a comparação. Seus resultados mostram que o
aumento da população carcerária reduz todos os tipos de crimes nos estados americanos
entre 1971 e 1993. Os coeficientes encontrados foram -0,4 para crimes violentos e -0,3
para crimes contra o patrimônio. Posteriormente, Shekita (2015) analisou os dados dos
44
EUA entre 2000 e 2013, reproduzindo a metodologia utilizada por Levitt (1996), e obteve
resultado distinto, a variável de população carcerária não se mostrou estatisticamente
significativa.
Os trabalhos que se aproximam do método de estimação utilizado nesse trabalho,
são o de Bandyopadhyay, Bhattacharya e Han (2010) e Araujo Junior et al. (2014). O
primeiro analisou os dados da Inglaterra e do País de Gales entre 1992 e 2008. Seus
resultados, obtidos por meio da estimação GMM-DIF, mostraram alta influência do
aumento da população presidiária na redução do crime, as elasticidades encontradas
foram de -0,27 para crimes contra o patrimônio e -0,21 para crimes contra pessoa.
O segundo trabalho de Araujo Junior et al. (2014), um dos únicos estudos
realizados com dados brasileiros, encontrou significância estatística no coeficiente da
taxa de população carcerária para os estados brasileiros, entre os anos de 2005 e 2010,
com coeficiente de -0,026, o que, segundo os autores, representa baixa eficácia do sistema
prisional brasileiro. Como a fonte dos dados de população carcerária utilizados no
trabalho desses autores é a mesma deste trabalho, seus dados apresentam as mesmas
limitações encontradas nessa pesquisa: não é possível separas os presos por tipo de crime
e o a confiabilidade do número de presos reportados é duvidosa.
O Quadro 1 apresenta o resumo da análise dos resultados obtidos.
Quadro 1 – Síntese da análise dos resultados das estimações por GMM-SYS
Variável A que se refere Sinal
Esperado
Sinal
Obtido Comentário
Taxa de homicídios defasada Inércia da criminalidade. + + Significativa.
Taxa de população carcerária Probabilidade de punição. - - Significativa
em alguns
casos.
45
Variável A que se refere Sinal
Esperado
Sinal
Obtido Comentário
Taxa de Detenção Probabilidade de punição. - - Não
significativa.
Uso de álcool e drogas O aumento do número de
pessoas que ingerem álcool
e drogas e a facilidade em
obtê-los parece ser uma das
principais razões que
mantém elevada a taxa de
criminalidade
+ + Não
significativa.
Desigualdade de renda Indica a proximidade
(convivência no mesmo
território) de indivíduos
com rendimentos muito
diferentes
+ + Significativa.
Homens jovens Perfil demográfico mais
provável de cometer delito.
+ - Não
significativa.
Taxa de desemprego O desemprego tem efeito
ambíguo. Um aumento em
sua taxa reduz a
possibilidade de ganho com
a renda do mercado legal, o
que diminui o custo de
oportunidade da atividade
ilícita e aumenta a
criminalidade. Por outro
lado, seu aumento causa
redução da riqueza de um
dado local, o que diminui
os ganhos com a atividade
ilegal e reduz a
criminalidade.
+ - + Não
significativa.
Renda Maior custo de
oportunidade por um lado,
porém renda maior pode se
relacionar com patrimônio
acumulado maior
(benefício monetário).
+ - - Significativa.
O efeito do
custo de
oportunidade
predominou.
Fonte: elaboração própria
As variáveis socioeconômicas e de punição têm efeito menor do que o esperado
(ou mesmo estatisticamente nulo). Por outro lado, a inércia apresenta-se estatisticamente
significante e com grande magnitude, trazendo a seguinte conclusão: “quanto mais se
mata mais se tende a matar”. Ou seja, o ambiente social, ao se tornar mais violento, produz
efeitos deletérios que vão além do momento presente – eles afetam o futuro.
46
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve como objetivo principal analisar o efeito marginal de um preso
sobrea criminalidade, representada pela taxa de homicídio, no Brasil, no período 2003 a
2012, por meio da abordagem da Economia do Crime proposta por Becker (1968). No
primeiro capítulo foi feita a revisão da literatura, descrevendo os princípios da teoria de
economia do crime e seus avanços empíricos a partir dos trabalhos aplicados
subsequentes. No segundo capítulo foram apresentados os procedimentos metodológicos
e a evolução dos dados utilizados nas variáveis dependente e explicativas dos modelos.
No terceiro capítulo foram expostos e discutidos os resultados obtidos por meio da análise
econométrica efetuada.
O problema da criminalidade é um dos grandes obstáculos atuais para o
desenvolvimento socioeconômico do país. As pesquisas empíricas realizadas até o
presente parecem indicar que o aumento do número de presos reduz a criminalidade,
principalmente em países desenvolvidos como os Estados Unidos e Inglaterra. Entretanto,
para o Brasil, essa relação é pouco significativa ou, ao menos, ainda não é clara
(particularmente no caso de homicídios).
Os resultados encontrados apresentaram significância estatística e sinal esperado
para a variável taxa de população carcerária nas especificações GMM-SYS2 e GMM-
SYS3, no entanto, o intervalo de confiança, dos coeficientes encontrados, incluiu o zero.
As variáveis taxa de homicídio defasada, a desigualdade de renda e a renda mostraram-
se estatisticamente significativas.
Dessa forma, é possível levantar algumas conjecturas acerca dos dados e do
sistema criminal nacional, em particular para os homicídios dolosos, além da própria
aplicação deste tipo de modelagem econométrica para o caso brasileiro:
47
(i) A baixa influência da variável taxa de população carcerária pode ocorrer devido
à utilização do número total de presos como proxy, os dados existentes não permitem
discriminar o tipo de crime, dessa forma, a comparação é feita entre os homicídios
cometidos e os indivíduos presos por todo tipo de crime. O “descasamento” entre a
variação no número de presos e a variação da taxa de homicídios entre os estados
corrobora com a possibilidade de o aumento no número de presos estar ocorrendo por
condenações devidas a outros crimes que não o homicídio. A inexistência de pesquisas
sobre a população carcerária inviabiliza o entendimento das condenações por tipo de
crime, o entendimento das condições socioeconômicas dos criminosos e suas motivações.
Pode-se dizer que está é a maior limitação para o estudo da eficácia do sistema prisional
brasileiro;
(ii) A Existência de alta correlação entre a taxa de população carcerária e a taxa
de detenção demonstra a necessidade de se criar uma melhor proxy para a probabilidade
de apreensão e condenação. Além disso, as duas variáveis apresentam restrições: o
número de presos, retirado do InfoPen são reportados pelos diretores dos
estabelecimentos penais, podendo apresentar diferença de metodologia entre os estados,
em alguns casos não são reportados o número de presos encarcerados nas unidades
policiais; a taxa de detenção foi criada misturando-se uma variável de fluxo, número de
homicídios, com uma variável de estoque, número de presos. A falta de dados melhores
e com maior diversidade limita a análise dos resultados apresentados nesta e em outras
pesquisas.
(iii) A alta importância da inércia criminal, cuja variação explica entre 70% a 80%
da variação da criminalidade corrente, pode demonstrar, em parte, o viés de variável
omitida. Essa variável também representa a alta reincidência ou a demora na resposta da
mudança de políticas de combate ao crime. De qualquer forma, a redução na importância
48
dessa variável depende de mudanças das leis penais e da política de segurança pública. A
existência da sensação de impunidade pode ser um dos grandes fatores para o aumento
da taxa de homicídios;
(iv) Pessoas que são presas têm dificuldade de conseguirem emprego por causa da
ficha criminal, do baixo nível de escolaridade formal e da pouca experiência profissional.
Altos níveis de reincidência mostram que a punição como privação de liberdade não foi
eficaz em desencorajar a criminalidade. As políticas públicas têm mostrado pouco suporte
para a educação das crianças, programas de aconselhamento e tratamento para ex-
criminosos (GAINSBOROUGH E MAUER, 2000 p. 26);
(v) O encarceramento maciço implica custos econômicos e sociais, de acordo com
o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2014, 1.26% do PIB brasileiro, em 2013,
foi destinado ao gasto com segurança, isso sem contar o gasto privado e as perdas
advindas do crime. Os recursos empregados com segurança pública necessitam melhor
gestão, de modo que o encarceramento possa reduzir a criminalidade.
Em suma, os resultados obtidos nesta dissertação indicam que, apesar de suas
limitações, o aumento no número de presos não reduziu o número de homicídio nos
estados brasileiros durante o período estudado. Todavia, é necessário levar em
consideração as limitações discutidas (limitação dos dados, da construção das variáveis e
da necessidade de incorporar outras variáveis que influenciam na determinação da
criminalidade)3e. Infelizmente a limitação imposta pelo tipo de dados disponibilizado
pelas autoridades brasileiras e pelos graus de liberdade necessários à estimação impedem
de se adicionar mais e melhores variáveis explicativas ou de controle no modelo estimado.
Entretanto, é a partir de trabalhos desta natureza e da respectiva divulgação pública que
se explicita a necessidade de melhoria na qualidade de informação a respeito dos delitos,
dos processos e dos criminosos capturados e encarcerados. Não há base de dados
49
sistematizada e comparável sobre tipo de crime, perfil socioeconômico do criminoso,
penalidades impostas etc. Esse passo é um dos vários necessários para que o sistema
criminal brasileiro seja mais efetivo e que a sensação de impunidade e de que “o crime
compensa” seja minimizada no país.
50
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, M. e LISBOA, M. Hopeless life: homicide in Minas Gerais, Rio de
Janeiro and São Paulo:1981 to 1997. Belo Horizonte, Mimeo, 2000.
ARAUJO JUNIOR, A. F., PEREIRA, D. M. P. B., SHIKIDA, C. D. e SHIKIDA, P. O
efeito do encarceramento sobre as taxas de homicídio no Brasil. Revista do Instituto
de Direito Brasileiro Ano 3, n. 9, 2014.
ARAUJO JUNIOR, A. e FAJNZYLBER, P. O que causa a criminalidade violenta no
Brasil? Uma análise a partir do modelo econômico do crime: 1981 a 1996. Texto para
discussão n.162 CEDEPLAR, 2001a. Disponível em: <
http://www.cedeplar.face.ufmg.br/pesquisas/td/TD%20162.pdf> Acesso em 12 out.
2014.
ARAUJO JUNIOR, A. e FAJNZYLBER, P. Violência e criminalidade. In LISBOA, M.
e MENEZES FILHO, N. (orgs). Microeconomia e Sociedade no Brasil. Rio de Janeiro:
Contracapa / FGV, 2001b.
ARELLANO, M. e BOND, S. Some tests of specification for panel data: monte carlo
evidence and an application to employment equations. Review of Economics Studies,
v. 58, n.2, p. 277-297, 1991.
BANDYOPADHYAY, S., BHATTACHARYA, S. e HAN, L. Determinants of Violent
and Property Crimes in England and Wales: A Panel Data Analysis. 2010.
Disponível em <file:///C:/Users/Maiara/Downloads/SSRN-id1691801.pdf> Acesso em
15 out. de 2015.
BEATO FILHO, C. Determinantes da criminalidade em Minas Gerais. Revista
Brasileira de Ciências Sociais, v.13, n.37, 1998.
BEATO FILHO, C., ASSUNÇÃO, R. M., MARINHO, F. C., REIS, I. A. e ALMEIDA,
M. C. M. Conglomerados de homicídios e o tráfico de drogas em Belo Horizonte,
Minas Gerai, Brasil de 1995 a 1999. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.17,
n.5, p. 1163-1171, 2001.
BECKER, G. S. Crime and punishment: an economic approach. Journal of Political
Economy, v.76, n. 1, p. 169-217, 1968.
BLUMSTEIN, A. Youth violence, guns and illicit-drugs industry. Journal of Criminal
Law and Criminology. v. 86, n. 1, p. 10-36, 1995.
CAIRES, F. O. e CHAVES, C. M. O. Economia do crime: uma análise econômica das
variáveis que levam um indivíduo a optar pelo crime. Vitória da Conquiata, XII
Semana de Economia UESB, 2013. Disponível em <
http://www.uesb.br/eventos/semana_economia/2013/anais-2013/i02.pdf>. Acesso em
nov. de 2014.
51
CERQUEIRA, D. R. de C. Causas e consequências do crime no Brasil. Rio de Janeiro:
33° Prêmio BNDES de Economia, 2014.
CERQUEIRA, D. R. de C. e LOBÃO, W. Condicionantes sociais, poder de polícia e
setor de produção criminal. Rio de Janeiro: IPEA - Textos para Discussão n° 975, 2003.
CERQUEIRA, D. R. de C. e LOBÃO, W. Determinantes da criminalidade:
arcabouços teóricos e resultados empíricos. Revista de Ciências Sociais, Rio de
Janeiro, vol. 47, n°2, p.233-269, 2004.
CHARKEN, J. M. e CKAIKEN, M. R. "Drugs and predatory crime". In WILSON, J. Q.
e TONRY, M. Drugs and Crime. ed. Crime and justice v.13, p. 203-241, Chicago,
1990.
COUTO, V. A. et al. O tempo do processo de homicídio doloso em cinco capitais,
2014. Disponível em < http://pt.slideshare.net/justicagovbr/pesquisa-srj-
tempoprocessso> Acesso em 05 jun 2015.
CANO, I. e SOARES, G. D. As teorias sobre as causas da criminalidade. Rio de
Janeiro: IPEA, 2002. Mimeo.
DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA DO SUS. Estatísticas vitais. Acesso em jan.
2015.
DEZHBAKHSH, H., RUBIN, P. H. e SHEPHERD, J. M. Does capital punishment have
a deterrent effect? New evidence from post-moratorium panel data, 2003. Disponível
em: <http://www.cjlf.org/deathpenalty/DezRubShepDeterFinal.pdf> Acesso em 12 out.
2014.
EHRLICH, I. Participation in illegitimate activities: a theoretical and empirical
investigation. Jornal of Political Economy, v. 81, p.521-563, 1973.
EHRLICH, I. The deterrent effect of capital punishment: a question of life and death.
The American Economic Review, v. 65, n. 3, p.397-417, jun. 1975.
FAJNZYLBER, P., LEDERMAN D. e LOAYZA, N. Inequality and crime. World Bank
mimeo, 1999).
FERNANDES, J. e LOBO, L. F. A criminalidade na região metropolitana de
salvador. Porto Seguro, ANPEC- XXXI. Encontro Nacional de Economia, 2003.
Disponível em <http://www.anpec.org.br/encontro2003/artigos/D26.pdf>. Acesso em
ago 2014.
FLEISHER, B. M. The effect of income on delinquency. American Economic Review,
v.66, p.118-137, 1966.
FREEMAN, R. B. Crime and the job market. National Bureau of Economic Research,
working paper n. 4910, 1994
GAINSBOROUGH, J. e MAUER, M. Diminidhing retourns crime and incarceration
in the 1990s. Disponível em
52
<http://www.sentencingprojetc.org/doc/File/Incarceration/inc_diminishingreturnes.pdf>
Acesso em 12 out. 2014.
GREENE, W. H. Econometric analyses. ed.3, New Jersey, Pretice-Hall, 1997.
GROGGER, J. e WILLS, M. The introduction of crack and cocaine and the rise in
urban crime rates. National Bureau of Economic Research, working paper n. 6353,
1998. Disponível em < http://www.nber.org/papers/w6353.pdf>. Acesso em 26 de out.
de 2015.
HSIANO, C. Analyses of panel data. ed. 2, Cambridge: Cambridge University Press,
2003.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA, Censo demográfico
2000. atualização jun. 2015.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA, Censo demográfico
2010. 2012.
JORGE, M. A., LEMOS, A. e SANTOS FILHO, E. P. Economia do crime: um retrato
da violência no Município de Aracaju. São Cristóvão: UFS, Aracaju: Fundação Oviêdo
Teixeira, 2008. 146 p.
KATZ, L., LEVITT, S. D. e SHOUSTOROVICH, E. Prison conditions, capital
punishment, and deterrence. American Law and Economics Review vol. 5, n. 2, p. 318-
343, 2003.
LEMGRUBER J. Controle da criminalidade: mitos e fatos. Revista Think Tank. São
Paulo, ano 5, n.15, p. 3-20, jun./ago. 2002.
LEVITT, S. D. The effect of prison population size on crime rates: evidence from
prison overcrowding litigation. The Quarterly Journal of Economics. Vol. 111, n. 2, p.
319-351, 1996.
MARQUES JUNIOR, K. A renda, desigualdade e criminalidade no Brasil: uma
análise empírica. Porto Alegre: XV Encontro de Economia da Região Sul, 2012.
Disponível em http://www.pucrs.br/eventos/encontroeconomia/?p=aprovados.
MARVELL, T. e MOODY, C. Prison population growth and crime reduction. Journal
of Quantitative Criminology. 10, p. 109-140, 1994.
NUNES, A. O Modelo Norte Americano de Punir. 2005. Disponível em <
http://www.adeildonunes.com.br/paginas/not-
artigos.php?cont=noticias&cod=48Artigos>. Acesso em: 07 nov. 2014.
OLIVEIRA, C. Criminalidade e o tamanho das cidades brasileiras: um enfoque da
economia do crime. Natal: ANPEC- XXXIII. Encontro Nacional de Economia, 2005.
Disponível em http://www. Anpec.org.br/encontro_2005.htm.
PIQUET, L. e FAJNZYLBER P. "A criminalidade nas regiões metropolitanas do Rio de
Janeiro e São Paulo: determinantes da vitimização e políticas públicas". In
53
FAJNZYLBER, P. LEDERMAN, D. LOAYZA, N. Crimen y Violencia em America
Latina, 2001.
REZENDE, A. C. Sistema prisional no Brasil em crise. Ha solução para isso?
Disponível em:
<http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=1416&>. Acesso
em: 19 set. 2014.
SANTOS, M. J. Dinâmica temporal da criminalidade: mais evidências sobre o efeito
"inércia" nas taxas de crimes letais nos estados brasileiros. Foz do Iguaçu: ANPEC-
XXXVII Encontro Nacional de Economia, 2009. Disponível em
<http://www.anpec.org.br/revista/vol10/vol10n1p169_194.pdf>. Acesso em 12 ago.
2015.
SARUBBI, A. e REZENDE, A. C. F. Sistema prisional na Europa. Modelo para o
Brasil. Peritas, Campinas, 1997.
SECRETARIA DE DECLARAÇÃO DE GENEBRA. Disponível em
<http://www.genevadeclaration.org/fileadmin/docs/Leaflet/GD_leaflet_Portuguese.pdf>
. Acesso em 19 de set. de 2014.
SISTEMA PENITENCIÁRIO DE INFORMAÇÕES DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA.
Sistema Integrado de Informações Penitenciárias. Acesso em jan. 2015.
SCHAEFER, G. J. e SHIKIDA, P. F. Economia do Crime: elementos teóricos e
evidencias empíricas. Revista da Associação Mineira de Direiro e Economia, 2009.
Disponível em <file:///C:/Users/Maiara/Downloads/7-26-1-PB.pdf> Acesso em 3 de out.
de 2015.
SHEKITA, N. The effect of prison populations on crime rates: revisiting Steven
Levitt's conclusions. 2015. Disponível em < http://economics-
files.pomona.edu/GarySmith/Econ190/Econ190%202015/Nathan%20Shekita.pdf>
Acesso em 3 out. de 2015.
SHIKIDA, P. F. A. e BORILLI, S. P. Economia do crime: Estudo de caso nas
penitenciárias paranaenses. 2007. Disponível em
<http://www.ufrgs.br/ppge/pcientifica/2007_06.pdf> Acesso em 12 out. 2014.
SMIGEL, A. L. Does crime pay? Na economic analysis. Dissertação de mestrado,
Columbia Universit, 1965.
UNODC. Global Study on Homicide. Vienna, 2013. Disponível
em <http://www.unodc.org/documents/data-and-
analysis/statistics/GSH2013/2014_GLOBAL_HOMICIDE_BOOK_web.pdf> Acesso
em 22 jun. de 2015.
WOOLDRIEDGE, J. M. Introdução à econometria: uma abordagem moderna. São
Paulo, Pioneira Thomson Learning, 2006.
WOOLDRIEDGE, J. M. Econometric analysis of cross section and painel data.
Cambridge, MIT Press, 2002.
54
APÊNDICE Tabela 3 – Matriz de correlação entre variáveis do modelo
Taxa de
Homicídios
Taxa de
Pop.
Carcerária
Taxa de
Detenção
Uso de
álcool e
drogas
Desigualdade
de renda
Homens
jovens
Taxa de desemprego
𝑡
Taxa de
desemprego𝑡−1
Renda
Taxa de Homicídios 1
Taxa de Pop. Carcerária 0.0494 1
Taxa de Detenção -0.4118 0.777 1
Uso de álcool e drogas 0.1445 0.0043 -0.0598 1
Desigualdade de renda 0.0678 -0.2162 -0.2828 0.1804 1
Homens jovens -0.1159 -0.1137 -0.0961 -0.3323 0.3043 1
Taxa de desemprego𝑡 0.2814 -0.148 -0.3337 -0.1038 0.3681 0.2632 1
Taxa de desemprego𝑡−1 0.2642 -0.1014 -0.2921 -0.0935 0.3261 0.253 0.7866 1
Renda 0.0011 0.5312 0.4522 0.2341 -0.1582 -0.4347 -0.0558 0.0012 1 Fonte: elaboração própria por meio do software Stata 12.1
55
Tabela 4 – Resultados das estimações EF, EA e GMM-DIF
Variável dependente: taxa de
homicídios por cem mil habitantes EF EA GMM
Taxa de Homicídios (t-1) - - 0.6338 ***
- - (2.93)
Taxa de Pop. Carcerária 0.0005 0.0010 *** 0.0010
(1.65) (3.06) (0.12)
Taxa de Detenção -0.0163 *** -0.0238 *** -0.0014
(3.78) (4.69) (0.32)
Uso de álcool e drogas 0.0337 0.0213 *** -0.0086
(4.39) (2.8) (0.67)
Desigualdade de renda -0.1691 -0.0738 0.3014
(0.46) (0.23) (1.00)
Homens jovens -0.0166 -0.0170 * -0.0167
(1.62) (1.66) (1.41)
Taxa de desemprego𝑡 0.0053 0.0030 0.0033
(1.19) (0.86) (0.73)
Taxa de desemprego𝑡−1 0.0039 0.0025 0.0029
(0.79) (0.56) (0.74)
Renda 0.0001 ** 0.0001 ** 0.0001
(2.61) (1.98) (1.34)
Teste de Hausman 0,000
Teste de Sangan 1
Teste AR(1) 0.0051
Teste AR(2) 0.6271 Fonte: Elaboração própria por meio do software Stata 12.1.
Notas: ¹ Todas os coeficientes foram estimados de forma robusta para heterocedasticidade.
² Os resultados entre parênteses representam o desvio-padrão e os asteriscos a estatística do p-
valor (* p < 0,10, ** p < 0,05 e *** p < 0,01).