máscaras da cresciumal a partir do resgate das memórias ... · É essa associação entre a...
TRANSCRIPT
“Tá no meio, tá brincando”, entre risos, bexigadas e sustos, o carnaval de
Máscaras da Cresciumal a partir do resgate das memórias de seus foliões.
Marcos Vinícius Rodrigues de Aquino1
Introdução
O carnaval da Fazenda Cresciumal tem suas raízes estabelecidas provavelmente na
década de 1930 e por mais de 70 anos ocorreu no meio rural. Ao longo de décadas, o carnaval
da Fazenda se desenvolveu e incorporou brincadeiras que marcaram gerações de foliões. Dentre
as principais características do carnaval da Cresciumal está a fabricação de máscaras para o
desfile carnavalesco, que até 2006 era realizado na Fazenda e hoje é celebrado na cidade. A
mudança do local do desfile foi uma consequência da venda da Usina e por cinco anos o desfile
foi interrompido, sendo retomado somente 2011. Assim nos interessa compreender como os
foliões passaram a assimilar as transformações e permanências verificadas no modo de celebrar
o carnaval a partir da mudança do local de realização do desfile. A Fazenda Cresciumal, de
propriedade de Francisco Antônio de Souza Queiroz, o Barão de Souza Queiroz, tinha 1.200
alqueires e foi adquirida em 1840 e recebeu a partir da segunda metade do século XIX uma
grande quantidade de imigrantes europeus que passaram a viver nas várias colônias da Fazenda.
O objetivo é apresentar o Carnaval de Máscaras da Fazenda Cresciumal, localizada na cidade
de Leme, interior do estado de São Paulo, a partir das memórias de seus ex-moradores e
participantes do desfile. Com o suporte da história oral, buscamos alcançar dados informativos
do festejo, analisar as experiências de seus participantes e compreender como estes foliões veem
as transformações ocorridas a partir da modificação do local do desfile, que passa do meio rural
para o espaço urbano. O trabalho é também desenvolvido por meio de uma pesquisa
documental, que tem como fonte os antigos jornais da cidade de Leme e o acervo fotográfico
dos ex-moradores da Fazenda. Assim, procuramos intercalar vários tipos de fontes com o intuito
de enriquecer nossa pesquisa, dando a ela uma visão mais ampla do carnaval realizado, o que
dificilmente seria alcançado se utilizássemos somente um tipo de fonte.
O uso da fotografia na reconstituição histórica via história oral
Desde sua invenção, a fotografia se transformou em um importante instrumento de
registro dos mais variados eventos e foi entendida como uma espécie de “espelho do real”, seu
uso provocara em outros tempos a falsa ideia de um registro documental isento de qualquer
1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas,
bolsista CAPES.
2
interferência crítica. Durante décadas, foi amplamente empregada para ilustrar as mais variadas
pesquisas, configurando-se nesta perspectiva como um interessante recurso para se autenticar a
veracidade do trabalho. Todavia, a partir do último quarto do século XX, intelectuais de
diversas especialidades insurgiram-se contra essa visão e a fotografia passou a ser encarada sob
novas perspectivas. Nessa nova abordagem, cientistas sociais evidenciam a fotografia não mais
como uma simples forma de expressão, mas também como protagonista e portadora de uma
narrativa própria que é criada dentro de um contexto social (MARTINS, 2008). Nesse sentido,
a fotografia pode até ser vista como uma reprodução de um recorte de uma determinada situação
real, entretanto sua representação e sua significação vão além do que o próprio fotógrafo em
um primeiro momento imaginaria que fosse.
Para Kossoy, (1998) a fotografia possui um caráter polissêmico e o mais explícito desses
sentidos é o que está expresso na imagem congelada, enquanto as demais significações
permanecem ocultas, invisíveis à um primeiro olhar. Conforme Kossoy, é preciso mergulhar
em seu conteúdo e nas circunstâncias de sua produção. Nesta lógica, adentrar no conteúdo
produzido pela fotografia para decifrar o invisível é um desafio metodológico que os cientistas
que trabalham com expressões visuais devem assumir. Para Martins (2008), é preciso
abandonar definitivamente a ideia de que a fotografia de fato seja um documento objetivo e
realista, pois há nela tensões que compelem as imagens para além do retratado, o que provoca
significados ocultos e não intencionais, posto que toda imagem fotográfica possui algo além do
explícito, já que nenhum fotógrafo, mesmo este sendo um amador, se constitui como um sujeito
passivo diante do que está fotografando.
Ao se observar uma fotografia, é possível afirmar que várias outras imagens são
estimuladas e despertadas em nossa memória. De acordo com Leite (1988, p. 85), uma das
condições necessárias para a leitura de uma fotografia seria “conhecer, compreender ou ter
vivido a situação ou condições fotografadas”. Dessa maneira, ao olhar para uma foto, não
olhamos somente para ela, mas sim para a relação estabelecida entre a fotografia e nós. A autora
ainda ressalta que tanto o fotógrafo e fotografado quanto aquele que a contempla posteriormente
e aquele que faz uso da imagem como fonte de informação terão visões distintas da mesma
fotografia, pois analisam o mesmo objeto através de ângulos diferentes. Assim, “o ato de olhar
demonstrou ser uma interação entre características do objeto e a natureza de quem o observa”
(LEITE, 1988, p.85). Nestas circunstâncias, podemos comparar as imagens fotográficas à
imagens que armazenamos em nossa memória. Para Kossoy (1998, p. 42), “fotografia é
memória e com ela se confunde”, assim, todo processo de reconstituição histórica originará
3
uma “criação de realidades”, já que esse processo será todo fundamentado nas imagens
recordadas pelo indivíduo. É essa associação entre a fotografia e a memória que têm
possibilitado a vários pesquisadores analisar os mais diversos aspectos da sociedade. O uso de
fotografias, a partir de adequadas metodologias, tem se constituído como fontes inesgotáveis
para a reconstituição histórica, principalmente se conjugadas a outras fontes de dados. Uma de
suas potencialidades é a de agir como um mecanismo motivador de reconstrução e veiculação
da nossa memória, seja como indivíduos ou como participantes de diferentes grupos sociais
(Von Simson, 1998). Dentro dessa perspectiva, diversos pesquisadores têm feito uso de
metodologias variadas para a obtenção de informações essenciais para o andamento de suas
pesquisas. Há nesse sentido, uma íntima relação entre a fotografia, a História Oral e a memória.
Em nossa pesquisa, adotamos a utilização das imagens fotográficas como meio de alcançar as
memórias dos indivíduos que vivenciaram os festejos carnavalescos, além de procurar
reconstituir a partir de sua análise aspectos do carnaval. Além do uso de imagens fotográficas,
foi realizado uma consulta ao acervo de jornais da Biblioteca Municipal e do Museu da cidade2.
Em virtude de o tema da pesquisa ter se desenvolvido principalmente no meio rural, são raros
os registros feitos por esses periódicos. Os primeiros registros feitos pela imprensa local do
carnaval de máscaras da Fazenda tiveram a princípio início no final dos anos de 1980, quando
uma multidão de pessoas se deslocava da cidade para acompanhar na fazenda o desfile de
máscaras.
Em virtude da escassez de registros documentais, optamos por ouvir os antigos
moradores da fazenda e participantes do desfile de máscaras, para que estes pudessem contribuir
com suas memórias a fim de nos fornecer informações acerca do festejo carnavalesco.
Thompson (1992) indica as potencialidades oferecidas pela história oral como a possibilidade
de registrar as experiências de pessoas, ou grupos sociais, que ficam à margem da história dita
oficial; a capacidade de recobrar memórias de grupos locais ou comunitários; possibilita a
reconstrução do conhecimento histórico a partir de novos olhares ou interpretações além de
favorecer a ampliação do campo de estudo para áreas ou temas até então menosprezados pelas
tradicionais correntes historiográficas. Assim, verifica-se a importância da história oral para
segmentos sociais que não são contemplados pelos meios de comunicação oficiais ou que vivem
à margem do sistema.
2 Os jornais analisados começaram a circular na cidade no ano de 1914, e durante as décadas seguintes vários
destes periódicos deixaram de circular enquanto outros foram surgindo com o tempo. Foram consultados os
seguintes periódicos: O Município, A Notícia, Gazeta Lemense, Folha de Leme, Jornal de Leme, A Tribuna,
Jornal Atual, Correio Regional, Repórter Leme.
4
O importante é não esquecer que a contribuição da história oral é sempre maior
naquelas áreas de obscuridade, seja no estudo das elites, seja das grandes massas.
[...] a obscuridade resulta do desinteresse das fontes oficiais pela experiência
popular, da ausência de documentos, da teia protetora e autodefensiva que se cria
naturalmente em torno dos movimentos populares a partir de suas próprias
lideranças. (ALBERTI, 2013, p. 22)
Para Alberti (2013), a história oral tem a capacidade de reconstruir o fato histórico de
uma maneira mais vívida, pois o narrador carrega em si além de suas memórias suas
reinterpretações desse passado. Assim, o relato construído carrega em si as marcas de seu
tempo. Nesse sentido, a história oral não pretende transpor os fatos históricos de tempos
passados ou experiências vivenciadas para os dias atuais, não se trata simplesmente de resgatá-
los, mas sim de revelar novas visões e diferentes interpretações desse passado.
Segundo Alberti (2013), a história oral tomou emprestado diversos instrumentos
metodológicos e técnicos das outras disciplinas sociais, como também foi capaz de ampliar o
seu conjunto temático. A partir destas breves considerações, entendemos a história oral como
método de ampliação do conhecimento histórico e como fonte para a complementação de outras
fontes, até mesmo porque o historiador, inúmeras vezes, necessita de grande diversidade de
fontes históricas. Segundo Lang (1998), mesmo nos trabalhos em que as fontes orais se
constituem na principal fonte de pesquisa é necessário conjugá-las a outras fontes de dados.
Assim, buscamos conjugar os dados referentes ao carnaval de máscaras da fazenda Cresciumal
obtidos através dos registros feitos pela imprensa local com as fotografias cedidas pelos
participantes e das entrevistas realizadas.
A diversidade de fontes compreendendo documentos escritos, relatos orais e imagens
torna-se fundamental, especialmente pela riqueza que a complementaridade entre as
mesmas pode permitir. Em vários estudos, pudemos constatar como documentos
escritos podiam nos levar aos informantes e ajudar na realização de entrevistas, mas
os informantes com seus relatos nos levaram também a novos documentos, dos quais
muitas vezes eram os únicos possuidores, e à formulação de novas questões. ‘Nesse
processo, o documento escrito e o documento iconográfico, embora pré-existente no
tempo, datados de épocas passadas, só entraram no tempo da pesquisa, isto é, no
tempo presente, através dos documentos orais’ (LANG, 1998, p.16)
O carnaval de Máscaras da Fazenda Cresciumal a partir da visão de seus foliões.
A frase citada no título deste artigo, gritada em alto e bom som por Pistarini3pelas ruas
da cidade durante o desfile de carnaval, esclarece ao público as regras da brincadeira do
3 Antônio Carlos Pistarini é um dos atuais organizadores do desfile de Máscaras da Fazenda Cresciumal e
membro da AMASC (Associação de Máscaras da Cresciumal).
5
carnaval. A tradição das “bexigadas” perdura há décadas e ainda é uma das atrações do
carnaval: para não sofrer com os golpes dos “palhaços bexigueiros” é necessário estar fora da
área destinada ao desfile dos mascarados. Junto às bexigadas, o cortejo segue com outras
brincadeiras onde monstros e demônios dividem com o público a alegria do carnaval.
A origem do carnaval da Fazenda é ainda um assunto contraditório. Muitos dos ex-
moradores afirmam que se trata de uma tradição trazida pelos imigrantes europeus. Com base
nas entrevistas realizadas, foi possível perceber que essa afirmação é permeada de imprecisões.
Seu Cláudio Avanzo,4 ao relatar sobre a origem do festejo, nos confidenciou que seu
pai havia lhe dito que não existia carnaval na Fazenda Cresciumal antes de 1930, data provável,
pois não soube precisar a época. Contudo nos relatou:
Meu pai dizia que começou assim: não tinha carnaval lá! Tinha um pedaço de terra
lá que morava uma família... tinha umas duas, três casas, e era uns 4 km de distância
da Fazenda e chegado o dia do carnaval, pegaram em duas, três pessoas, e saiu como
você vê o carnaval nosso aí. O boi, um burrinho e um palhaço, e vieram até a
Fazenda, eles vieram de carroça, chegou perto da fazenda, se aprontaram e
começaram a descer a colônia vestido dessas máscaras e nunca ninguém tinha visto
isso e ficaram abismado com aquilo! E começou a juntar gente, e aqueles três
brincando e o povo da fazenda atrás! Só que não tinha música, não tinha nada, eles
brincavam assim sabe, e vinha brincando. Isso quem disse pra mim foi meu pai.
Seu Cláudio não soube informar quem seriam essas pessoas. Outra versão sobre a
origem do carnaval foi dada por Seu Geraldo Donizete Petruz, o Gê. Relatando sobre antigas
conversas com seu pai, Gê nos disse “pelo que meu pai, que morreu com noventa e tantos anos
já disse, no tempo de criança dele já tinha. Eu acredito que esse carnaval tem mais de 100 anos”.
Analisando não só os dois depoimentos citados, é possível perceber que a origem do
carnaval na fazenda é um tema controverso, pois há várias versões sobre o seu surgimento,
embora a versão mais esclarecedora seja a do Seu Cláudio. Todavia, alguns elementos comuns
são perceptíveis em seus relatos, como, por exemplo, a presença do boi no carnaval. De acordo
com os antigos foliões, o boi era uma das mais tradicionais brincadeiras do carnaval da Fazenda.
A referência ao boi, pode ser notada em vários outros relatos. José Kilian5, assim descreve:
Tinha uma fantasia que era o boi, que dizem que veio de uma outra fazenda, desculpa,
da outra fazenda não! É a mesma fazenda só que ela era dividida em várias colônias.
E esse cara sabia dessa brincadeira e ele apareceu com um boi. Então uma outra
colônia foi brincar na colônia principal com esse boi.
4 Cláudio Avanzo, 70 anos, descendentes de italianos é uma das antigas lideranças do carnaval, nasceu e viveu
boa parte de sua vida na Cresciumal. Durante mais de 15 anos, organizou o desfile de máscaras na Fazenda. 5 José Kilian, 56 anos.
6
Geraldo Petruz, recorrendo novamente ao que o pai havia lhe dito, afirmou:
[...]o carnaval praticamente começou com o boi! Foi o boi que inspirou o carnaval
na Cresciumal [...] ele sempre falava que foram duas pessoas que, eu não posso
lembrar o nome agora, que um belo dia de carnaval, desceram, fizeram dois bois e
começaram a brincar pra rua! Então aí começou a origem, e o boi virou uma tradição
no carnaval!
Uma outra versão bem mais inusitada nos foi descrita por Hélcio Rezende6:
Se é verdadeiro ou não, não se sabe! Porque naquele tempo, o pessoal tinha gado,
então, às vezes morria gado e ficava no pasto, lá ele sumia! Ficava cabeça e tal, a
carcaça e aí tinha um morador, acho que era um maluco lá que morava numa dessas
colônias chamada Boa Vista e que no dia de carnaval, ele desceu ali pra fazenda [...]
“quero brincar também!”, diz que ele foi do lado de lá no pasto, catou a cabeça do
boi com um pano lá, um lençol, naquele tempo tinha muito pano de secar arroz, bater
arroz, pra estender feijão na rua, tinha muito disso. Então diz que ele pegou a cabeça
do boi, jogou um pano por cima e foi brincar com o boi! Dizem que foi daí que surgiu
o boi!
Imagem 17
Conforme as informações alcançadas por meio das narrativas dos antigos moradores
da Cresciumal, foi possível perceber que a história do carnaval da Fazenda está ligada à figura
do boi. Desde os primórdios do carnaval até os dias atuais, o boi esteve presente no imaginário
dos foliões como uma tradição, tanto é que nos desfiles que passaram a ocorrer na cidade após
a venda da Fazenda, os antigos foliões deixavam claro sua insatisfação quando nenhum
mascarado aparecia com o boi no desfile. A brincadeira do boi já havia sido registrada no Brasil
nas décadas iniciais do século XIX e sua aparição ocorreu inicialmente no norte e nordeste do
país.
6 Hélcio Rezende, 59 anos, é hoje uma das principais lideranças do desfile de Máscaras da Cresciumal e
Presidente da Associação de Máscaras da Cresciumal. A associação foi criada em 2017 com o intuito de
valorizar e preservar o festejo. 7 Imagem 1: Antigo carnaval na Fazenda, possivelmente na década de 1980, quando as ruas ainda eram de terra.
É possível observar na imagem o susto e o receio da mãe e filho ao sofrerem com as investidas do mascarado.
7
A definição e a dinâmica da brincadeira do boi são marcadas pelas variações regionais,
pois cada grupo imprime ao festejo características próprias, todavia há a presença de diversas
confluências. Assim, cada grupo organiza a brincadeira de acordo com suas especificidades
regionais. Sua origem é permeada de narrativas lendárias e a principal delas está centrada na
lenda da ressuscitação de um boi, que depois de voltar à vida passa a ser festejado
(CAVALCANTI, 2000; 2007).
Ainda não foi possível reconstituir o caminho percorrido pela festa do boi até a
Fazenda, contudo a explicação para esta questão pode ser encontrada no afluxo populacional
que levou até a região migrantes de diferentes regiões do país e da Europa. Da mesma forma
que o boi, a brincadeira da bexigada, uma antiga tradição do carnaval, possui uma origem
incerta. Grande parte dos participantes da pesquisa não soube informar quando a brincadeira
surgiu, mas sempre relataram sua presença nos antigos carnavais. Durante o desfile de máscaras
na Fazenda, os mascarados percorriam alegremente as ruas da colônia enquanto centenas de
pessoas os acompanhavam mantendo uma distância segura, já os mais destemidos procuravam
interagir e provocar os palhaços. Nesse momento, a correria passava a ser a grande diversão do
carnaval. Os bexigueiros saíam em perseguição aos seus provocadores, golpeando-os com
voracidade com suas bexigas infladas de ar. O ataque não era destinado somente àqueles que
provocavam os palhaços, mas também àqueles que se apresentavam distraídos enquanto o
desfile prosseguia. Celso Rezende8, lembra que a brincadeira, de tão popular e empolgante que
era, fora até mesmo incentivada pelo proprietário da Fazenda, o Seu Rui.
Seu Rui adorava! O Seu Rui chamou os palhaços prá ir na sede bater na turma! O
Seu Rui mandava bater mesmo! ‘Bate no pessoal!’, e a bexiga tinha odor, tinha o
cheiro! A bexiga não era recapeada nada! Tem aquele pedaço de carne na ponta!
Era uma coisa assim meio nojenta, entendeu?
Há uma grande semelhança entre os bexigueiros da Fazenda Cresciumal com o bate-
bolas (também conhecidos como clóvis) da cidade do Rio de Janeiro. De acordo com vários
pesquisadores do tema, a origem da palavra clóvis seria uma derivação aportuguesada do termo
clown, “palhaço” 9.
8 Celso Rezende é um dos membros fundadores da Associação de Máscaras da Cresciumal e um dos
organizadores do desfile. 9 Para saber sobre os grupos de bate-bolas, consultar: PEREIRA, Aline Valadão Vieira Gualda. Tramas
simbólicas: a dinâmica das turmas de bate-bolas do Rio de Janeiro. 2008. 183 f. Dissertação (Mestre em Artes)
UERJ/Centro de Educação e Humanidades/Instituto de Artes. Rio de Janeiro.
8
Levando em consideração as falas dos participantes da pesquisa, foi possível perceber
que todos, ao recordarem os antigos carnavais do tempo da sua infância, quando viviam na zona
rural, se referem à constante presença do medo. Rememorando os tempos de criança, Hélcio
Rezende lembra:
É um negócio assim, que amedrontava! Você saía na rua, mas ficava na porta, ficava
cerca assim de 100, 200 metros de distância, hora que saía aquela muvuca, aquelas
bexigas batendo, aquela barulheira, nossa! Era uma correria danada! Você não via
molecada de 8, de 10 anos no meio, mas nem pensar! Todos ficavam um bloco assim,
bem distante e com medo, a hora que um palhaço resolvia marcar reta e vim, nossa
senhora, o pessoal se perdia de medo, muito medo!
O medo que as crianças tinham dos bexigueiros e dos outros mascarados pode ter várias
explicações: desde a ameaçadora brincadeira das bexigas, como também a própria feição e
ornamentação das fantasias. As assustadoras máscaras de monstros e demônios eram sempre
elaboradas com enormes chifres, grandes bocas com dentes pontiagudos, além de machados ou
facões com pinturas que simulavam sangue. Um aspecto que contribuiu para a manutenção
desse medo foi o fato de viverem em um ambiente rural e a maioria das crianças estudarem na
escola da própria fazenda. Desta forma, o contato com o mundo exterior à Fazenda era quase
inexistente, os passeios e visitas à cidade eram raros. Uma outra questão a ser lembrada é que
nas décadas de 60 e 70, as famílias que viviam no campo geralmente não tinham acesso ao
aparelho televisor, assim a maioria das crianças não tinha contato com imagens de monstros e
demônios, figuras hoje tão comuns nos filmes e jogos eletrônicos que atualmente atraem o
interesse de crianças e jovens.
Celso Rezende lembra também que os mais velhos alimentavam o medo das crianças
com suas histórias de assombrações.
Eu lembro quando era criança! Eu mesmo tinha muito medo! Não só eu! Toda
criançada tinha medo! Era uma fazenda onde não tinha muita luz, os velhos tinham
aquelas, vamos dizer, as lendas deles, né? O modo de pensar deles, o que eles
acreditavam. Muitos velhos falavam de assombração, de lobisomem, e a gente
acreditava nisso! Por isso que quando saía esse carnaval talvez a gente associava a
isso, às lendas que eles contavam! Então passava um medo muito grande prá gente.
A gente associava talvez a saci... não era uma festa como hoje, ela era uma coisa
assustadora, prá nós, não era uma festa! Era uma coisa que provocava medo!
9
Imagem 2 Imagem 310
É importante destacar o mistério que envolvia a máscara, pois eram feitas às escondidas,
somente os próprios foliões é que tinham conhecimento sobre as máscaras, nem mesmo
parentes próximos tinham acesso. Caso alguém soubesse de alguma informação que pudesse
ser usada para identificar o mascarado, devia guardar segredo para não ser perseguido e atacado
pelos bexigueiros.
Era proibido, simplesmente era proibido! Eu posso até saber que é você que tá lá!
Você não podia falar o nome... Se ouvisse, mandava pegar, bater com bexiga, não
tinha conversa não! Era proibido! (Hélcio Rezende)
Com o passar do tempo, além do boi e dos palhaços bexigueiros, outros personagens
são criados como por exemplo o “lateiro”, que amarrava em um arame dezenas de latinhas. Seu
objetivo era arrastar no chão suas latas para fazer barulho e avançar rumo aos participantes do
desfile. Havia também o “pintor”, ou o “barrigudo”, como alguns a ele se referiam. Este
carregava um pequeno pote com uma espécie de tinta feita com urucum, ou do pó de carvão
misturado com trigo e água, ou até mesmo com lama. O mascarado, ao perceber que seu alvo
estava disperso, logo tratava de passar no rosto da vítima um pincel encharcado com a “tinta”.
Outro famoso personagem, que também causava grande alvoroço no desfile era o linguiceiro.
Esse personagem, tinha preso à sua fantasia uma pequena “mesa” na qual havia um penico
cheio de cerveja, ou outro tipo de bebida, que ficava exposto com uma linguiça mergulhada. A
brincadeira consistia em passar a linguiça embebida na cerveja na boca dos mais distraídos.
Conforme Seu Cláudio, a brincadeira da “mesinha” começou por volta da década de 60 e foi
uma criação de um antigo morador da Fazenda, o Seu Benedito Ossuna.
10 Observe o Palhaço bexigueiro flagrado momentos antes do início do desfile. Apesar da simples fantasia, ele
carrega junto a sua cintura um palhacinho, além de duas bexigas de boi infladas, que seriam usadas, no momento
do desfile, para atacar os participantes.
10
Imagem 311
As máscaras e todo o restante das fantasias, sempre foram confeccionadas pelos
próprios foliões. Contudo, antigamente eram bem mais simples do que são hoje. Ao relembrar
as histórias contadas por Geraldo Petruz12, Hélcio Rezende destacou: “sabe aquelas folhinhas
de calendário antigo, que era aquela folha resistente, grossa, resistente. Então, ele falou que o
pessoal fazia, cortava no formato do rosto, furava o olho, o nariz, amarrava e saía para rua”.
Essas rústicas máscaras seriam depois pintadas e enfeitadas com fitas ou qualquer
outro material decorativo como lenços e chapéus. É possível que esse tipo simples de máscara
tenha sido utilizado na Fazenda até por volta dos anos 50. A partir desta década, uma nova
técnica começa a ser utilizada pelos foliões para a criação de suas fantasias. A técnica consistia
no uso da argila para se fazer um molde da face e logo, em seguida, várias camadas de papel
eram sobrepostas a ele. Após estar seca, essa máscara estaria pronta para ser pintada e decorada
de acordo com a criatividade de cada folião. Uma pequena dúvida se apresentava nesse
momento: como a nova técnica chegou até a Fazenda? Nas várias conversas realizadas com os
antigos moradores, a maioria desconhecia como ou quem havia introduzido esta técnica.
Ao pesquisar nos antigos jornais da cidade, encontramos uma reveladora fotografia
que abriu novas perspectivas para a pesquisa. A imagem retratava o carnaval realizado em
Leme, no ano de 1951. O mais instigante era a semelhança entre as máscaras usadas pelos
foliões da cidade com a descrição das máscaras feitas pelos moradores da Cresciumal. A partir
do registro fotográfico foi possível chegar à Jacintho Fiocco. O Senhor Jacintho Fiocco, que
fora um grande carnavalesco e durante os anos de 50 e 60, abrilhantou o carnaval de rua, ao
desfilar com suas criações pela cidade. Sua atuação foi de extrema importância para a
consolidação do carnaval popular na cidade, no referido período.
11 Linguiceiro em ação. É possível perceber as pessoas tapando a boca com as mãos, tentando evitar que sejam
vítimas da brincadeira, enquanto o folião a oferece a linguiça a um homem. 12 Geraldo Petruz, ou Seu Dado, falecido em 2017, nasceu e viveu toda a vida na Fazenda Cresciumal, era pai de
Geraldo Donizete Petruz, o Gê.
11
Imagem 413
Devido ao grande número de imigrantes que se estabeleceram na cidade e nas fazendas
da zona rural, é viável a ideia de que existisse algum contato entre os moradores da Cresciumal
e o Seu Jacintho. Nesse sentido, seria possível afirmar que a técnica do uso de argila e papel
picado tenha sido repassada aos moradores da Cresciumal. Um dos filhos do senhor Jacintho
Fiocco, presente na fotografia citada, Seu Florindo Fiocco14 nos confidenciou em uma conversa
informal que o pai emprestava as máscaras para os amigos da Fazenda Cresciumal. Sobre quem
seriam esses amigos Seu Florindo não soube relatar. Durante a entrevista com o Seu Cláudio
Avanzo, para nossa surpresa, ele também relatou a mesma história. Quem havia ensinado o
pessoal da Cresciumal a fazer as máscaras a partir da técnica do papel machê foi o senhor
Jacintho: “Essas máscaras partiram daqui de um senhor da cidade, o Fiocco”. Indagado sobre
como ele tinha conhecimento desse fato, Seu Cláudio narrou: “Eu era moleque e ouvi falar do
Fiocco, no tempo do Francisco Santoro, ele que organizava e começou a aprender com o Fiocco.
Aí depois passou prô meu tio Eugênio, do meu tio passou pra mim...”. Embasados na fala de
Seu Cláudio, podemos apontar Francisco Santoro, um dos primeiros organizadores do carnaval
da Fazenda, como o aprendiz da técnica ensinada pelo senhor Jacintho Fiocco. Vale ressaltar
que mesmo antes da técnica ensinada pelo Seu Jacintho Fiocco, os moradores da Cresciumal
comemoravam o carnaval segundo suas condições e possibilidades. Com a nova técnica, os
foliões da Fazenda puderam imprimir ao carnaval características próprias, não só com máscaras,
mas com a introdução das brincadeiras já mencionadas.
13 Jornal A Notícia, 21 de fevereiro de 2014, seção “Especial Carnaval 2004”. A fotografias foram tiradas em
dois momentos: na primeira, o fotografo procurou retratar os presentes com suas máscaras, já na segunda, o
grupo, era fotografado sem as máscaras. O senhor Jacintho Fiocco é o primeiro da esquerda para a direita, ao seu
lado, encontra-se o filho Florindo Fiocco. 14 Seu Florindo Fiocco, 82 anos é o único filho vivo do Senhor Jacintho Fiocco.
12
Imagem 515
O uso de material alternativo para o acabamento das máscaras e fantasias se tornou
uma das características do carnaval da Cresciumal, pois por morarem na zona rural, não
gozavam de facilidades para a compra de requintados materiais decorativos. Assim, utilizavam
na decoração de suas máscaras materiais de seu cotidiano, como roupas velhas, chapéus,
materiais retirados da própria natureza, cascas de árvore, folhas de bananeiras, palhas e cordas
desfiadas, enfim, materiais que eram facilmente encontrados na Fazenda. Celso Rezende,
lembra com entusiasmo do tempo das antigas fantasias:
Aquela roupa feita de palha de milho! Inclusive, aquela que era natural era mais legal
ainda. Porque ela ficava da cor da palha! E tinha uns que eles pintavam de vermelho,
de preto! O palheiro fica uma máscara cheia, o cara fica grande! Ela faz barulho!
Dá muito trabalho prá costurar toda aquela palha. O pessoal usava corda! Desfiava
a corda, que não ficava igual ao palheiro! Mas nem chega aos pés! O palheiro que
foi fantástico! Sempre foi o melhor!
Com o passar do tempo e com a facilidade de encontrar outros materiais, as máscaras
foram tomando outras feições. Atualmente, os artesãos utilizam diversos materiais na confecção
das máscaras, como por exemplo esponja expansiva, tecidos aveludados, pelúcias, plástico
derretido, massa de biscuit, fibra de vidro, mas é importante frisar que o uso desses materiais
não implicou no abandono dos materiais alternativos, pois ainda hoje o uso de palha de milho,
corda desfiada e as folhagens são uma das marcantes características das máscaras criadas.
Nos anos 90, centenas de pessoas da cidade começaram a visitar a Fazenda no carnaval
e alguns diretores da Usina começaram a ver com outros olhos as brincadeiras realizadas, que,
para evitar conflitos, tiveram de ser adequadas à nova realidade, já que o carnaval deixara de
ser comemorado somente pelos moradores da Fazenda. Aos poucos, a atuação do linguiceiro
começou a ser entendida como grosseira e anti-higiênica e em vez de passar a linguiça na boca
15 Fotografia retirada na Fazenda Cresciumal durante o desfile de carnaval em 2001. A cena congelada apresenta
em primeiro plano uma fantasia cujo acabamento é todo feito com folhagens, já ao fundo, é possível também
identificar em outras fantasias, o uso de materiais alternativos como cordas e palha de milho desfiadas.
13
das pessoas, deveria somente ameaçar fazê-lo. Até mesmo o bexigueiro, teria que conter o seu
ímpeto de ataque. No entanto, mesmo com as recomendações feitas, as brincadeiras não
desapareceram e em algumas situações, foram ignoradas. Jefferson Rezende16 nos contou como
acontecia os carnavais desse período:
Eu lembro quando tinha a corda sim no local... A gente saía do campo e da saída do
portão até em frente a venda tinha uma corda. Só que mesmo assim o pessoal pulava
né? Hoje, se você vai fazer na cidade não pode. Os caras não deixam mesmo! Eu
nunca vi ninguém saindo da corda! Já na fazenda não! Mesmo eles falando: “não
pode passar”, mas sempre tinha alguém... eu lembro que meu irmão, sempre pulava
a corda. Ela saía de palhaço, pulava a corda, ia dentro da venda, ele ia lá e brincava
com a pessoa, mas dava uma bexigadazinha de leve assim, né? Agora, sempre tinha
aquele cabeça fraca, que ia lá, saía, pulava a corda, mas em vez de dar uma
bexigadazinha na pessoa, descia o cacete.
Celso Rezende, também lembra de como ocorriam os antigos carnavais na Fazenda,
mesmo com a delimitação do espaço, e compara com o desfile que hoje é realizado na cidade:
Existia um espaço pequeno, onde existia uma corda, que as máscaras passavam pra
se apresentar, porque ali os jurados ficavam naquele espaço, prá poder julgar as
máscaras! Mas, depois, da colônia prá cima, não tinha mais corda não! Aí apanhava!
Só que o pessoal já não era tão bruto, quanto o pessoal de antigamente! Hoje em
Leme não! Hoje em Leme já tem a corda, porque é uma avenida né? O pessoal quer
assistir, hoje é mais uma apresentação! Não é aquela bagunça que era antes! Que
todo mundo apanhava! Antigamente era uma coisa, entre aspas, desorganizada! Era
uma bagunça! Quem táva ali, apanhava, não tinha regras, não tinha nada!
Esse conjunto de regras ficou mais visível a partir da mudança do local do desfile,
quando parte da Fazenda foi arrendada e a usina de cana-de-açúcar foi vendida. Então, a partir
de 2005 a maior parte dos trabalhadores foi dispensada e teve que se deslocar para a cidade. É
importante destacar que a venda da propriedade implicou na suspensão do desfile de máscaras
por cerca de 5 anos. A perda não só do espaço de convivência, mas também de “seu” carnaval
deixou os moradores da fazenda surpresos.
Houve uma grande preocupação das pessoas! “O que vai ser de nós?”, porque
ninguém esperava! Ninguém esperava! Então a cabeça já começou a ficar quente!
Perda dos amigos, todo mundo ia se deslocar prá lugares diferentes! Ia acabar toda
aquela “família,” onde havia jogo de malha, aquela vendinha onde o pessoal se
reunia, a gente tocava violão, cantava, tomava cerveja! Então, quando falou de
vender, houve aquela decepção, aquela tristeza do pessoal! É o fim da fazenda, todo
mundo vai embora, não tem mais carnaval! Assim como não tem mais festa junina,
não tem outras coisas! Não tem aquela reunião dos amigos! Vai se dispersar e talvez
a gente não se encontre mais... A vida mudou totalmente! (Celso Rezende)
16 Jefferson Godoy de Rezende, 29 anos, nascido na Fazenda Cresciumal, é um dos maiores entusiastas do
desfile de máscaras, suas máscaras são constantemente premiadas.
14
Em 2011, por iniciativa da Secretaria da Cultura de Leme e de suas antigas lideranças
carnavalescas, o desfile foi retomado. Além da mudança de local, outras transformações se
mostravam ainda mais visíveis. Enquanto os foliões detinham um amplo espaço na Fazenda
para desfilarem e se divertirem, na cidade o espaço era demarcado e se limitava a percorrer
algumas quadras da rua central. Outra grande alteração foi a imposição de regras para as
brincadeiras. Como afirmamos anteriormente, algumas regras começaram a ser estabelecidas
já na Fazenda, mas ainda assim as brincadeiras ocorriam dentro de seu espaço original e sem
maiores problemas, havia ali uma margem para burlar as orientações, conforme os relatos
citados. Já na cidade, os mascarados tiveram que respeitar efetivamente as regras. “As regras
que nós repassamos foi o seguinte: tem uma corda, quem quiser assistir vai ficar lá fora
assistindo. Quem quiser adentrar, e participar, tá de livre e espontânea vontade!’. Vai levar
bexigada? Vai!” (Celso Rezende). E assim se desenvolve o desfile de máscaras da Cresciumal,
os que preferem acompanhar à distância o monstruoso e alegre desfile dos mascarados ficam à
margem da corda que delimita o espaço de segurança, já aqueles que preferem participar
diretamente do desfile e interagir com os foliões adentram esse espaço destinado aos
fantasiados.
Considerações finais
Ao fazer uso das imagens fotográficas foi possível perceber a relação próxima entre o
recurso imagético e o processo de reconstrução das memórias carnavalescas, assim as imagens
se consolidam como instrumentos de orientação de memórias individuais e coletivas expressas
pelos mais diversos grupos sociais. Durante as entrevistas, procuramos apresentar diversas
fotografias que retratavam diferentes aspectos do carnaval da Fazenda, pois desta forma
esperávamos que as imagens fotográficas estimulassem suas rememorações. Um ponto
importante a ser destacado foi a percepção que os moradores da fazenda, tinham de seu passado,
principalmente das relações culturais e sociais que foram construídas por décadas no ambiente
rural. Durante as entrevistas, foram vários os aspectos de sua história que os ex-moradores da
fazenda procuraram valorizar.
Com relação ao desenvolvimento do carnaval da Fazenda, entendemos que esse
ocorria inicialmente de maneira simples e dentro de suas reais possibilidades até o contato com
as máscaras produzidas por Jacintho Fiocco. A partir desse momento, novas possibilidades
artísticas e culturais se abriram para os moradores da Fazenda. Já na cidade, o falecimento do
senhor Jacintho resultou na decadência do popular carnaval de máscaras, enquanto que na
Fazenda ocorreu o inverso. Em virtude da ampla e sólida rede de parentela e vizinhança, o
15
carnaval se concretizou. Nessa perspectiva, os moradores e foliões da Fazenda Cresciumal
desempenharam uma valiosa função, pois agiram como guardiões deste festejo carnavalesco.
Conseguiram manter viva a tradição das máscaras e fantasias de carnaval por décadas, e ainda
mais: desenvolveram novas técnicas, passaram a usar outros materiais para a produção das
máscaras, criaram outros personagens, deram uma nova dinâmica ao carnaval com a introdução
de outros elementos. Sem a paixão e o envolvimento de vários destes amantes do carnaval, é
possível imaginar que talvez essa celebração não existisse mais, à semelhança de outras formas
de se brincar o carnaval que com o tempo foram sendo abandonadas por inúmeros motivos.
Referências bibliográficas
ALBERTI, Verena. Manual de História Oral. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2013. 3ª edição.
CARNICEL, Amarildo. Fotografia e inquietação: uma leitura da imagem a partir da relação
fotógrafo-fotografado. In.: RESGATE. Revista Interdisciplinar de Cultura. Campinas/SP:
2002, nº 11, p. 41-54.
CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro. "O Boi-bumbá de Parintins, Amazonas:
breve história e etnografia da festa." História, Ciência e Saúde. Manguinhos, vol. VI
(suplemento), p. 1019 - 1046. Rio de Janeiro: Fio Cruz, 2000.
______. Brincando de Boi: antropologia dos Bois-Bumbás de Parintins/Amazonas.
Ciência Hoje. Revista da SBPC. Agosto, 2007. pp. 18-25.
CHINALIA, Nelson. Fotojornalismo: a manipulação visual da notícia. In.: RESGATE. Revista
Interdisciplinar de Cultura. Campinas/SP: 2002, nº 11, p. 115-122.
DELGADO, L.A.N. História oral e narrativa: tempo, memória e identidades. História Oral, v.
6, 2003, p. 9-25.
LANG, Alice Beatriz da Silva Gordo; CAMPOS, Maria Christina Siqueira de Souza;
DEMARTINI, Zeila de Brito Fabri. História oral e pesquisa sociológica: a experiência do
CERU. [S.l: s.n.], 1998.
LEITE, Miriam Lifchitz Moreira. A fotografia e a Ciências Humanas. In.: BIB, Rio de Janeiro,
nº 25, 1º semestre de 1988, p. 83-90.
MARTINS, José de Souza. Sociologia da Fotografia e da Imagem. São Paulo: Editora Contexto,
2008.
KOSSOY, Bóris. Fotografia e memória: reconstituição por meio da fotografia. In.: SAMAIN,
Etienne (org). O Fotográfico. São Paulo: Hucitec, 1998, p. 41-47.
SAMAIN, Etienne (org). O fotográfico. São Paulo: Hucitec, 1998.
THOMPSON, P. A voz do passado - História oral. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
VON SIMSON, Olga R. de Moraes. Imagem e Memória. In.: SAMAIN, Etienne (org). O
fotográfico. São Paulo: Hucitec, 1998, p. 21-34.