matéria murilo folha do estado 11/11/12

1
Cuiabá, Domingo 11 de novembro de 2012 l 28 folhadoestado.com.br folha 3 TRANSFORMANDO VIDAS Música instrumental auxilia processo de inserção social Maestro Murilo Alves conta quais os caminhos que a música instrumental tem feito no Estado e fala sobre a importância que a música tem para a sociedade PROTÁSIO DE MORAIS REPORTAGEM LOCAL Folha 3 - Qual a função da música no mundo de hoje? Murilo Alves - Sabe- mos que a música sempre esteve presente nas ações humanas de diver- sas maneiras. Acredito que são inúmeras as funções da música no mundo de hoje. Como arte, posso dizer que continua a lidar com os problemas de seu tempo e cada compositor continua no processo de busca para a efetivação dessa função, basta observarmos os pro- cessos contemporâneos de produção da música de concerto. Por outro lado, muitas são as formas de uti- lização dessa arte. Utilizá-la como ferramenta de inser- ção social é uma delas. Folha 3 - Em rela- ção à formação de pla- teias para a música ins- trumental, tanto na for- mação de público quanto de instrumentistas, qual a situação de Cuiabá/Mato Grosso atualmente? Murilo - Penso que avan- çamos bastante, tanto com as ações educacionais do Insti- tuto Ciranda e da Orquestra do Estado de Mato Grosso, bem como nas iniciativas de outros artistas e grupos musicais atuantes em Mato Grosso, principalmente nas áreas da música popular, música contemporânea de concerto e, naturalmente, na música tradicional de concer- to. Entretanto, há ainda um longo caminho pela frente e penso que nesse processo as ações do Instituto Ciranda continuam sendo essenciais e estratégicas. Na medida em que criamos novas deman- das para essa música, há a natural necessidade de ampli- armos o oferecimento dessa arte, e neste ponto entra a importância de uma escola de música comprometida com a formação de novos músicos e lideres. Hoje é possível perce- ber que as práticas musicais avançaram bastante por aqui, seja na música que ouvimos no bar, nos cerimoniais, nos grupos de música popular e nas bandas e orquestras atu- antes em Mato Grosso. Sem dúvidas, em todas essas rea- lizações temos alunos ou ex- alunos do Instituto Ciranda participando e fazendo a dife- rença. Folha 3 - Em 2013 o Ins- tituto Ciranda – Música e em longo prazo. No começo tínhamos a percepção dos problemas sociais que são comuns a praticamente todas as grandes cidades. Depois, como educadores musicais, visualizamos a possibilidade de trazer, através da práti- ca musical coletiva, novas possibilidades de desenvol- vimento humano em igual- dade de oportunidades a nossas crianças e jovens. Como resultado desses dez anos de atividades ininter- ruptas, nos alegramos ao per- cebermos que proporciona- mos a um grande número de jovens, situações em que vivenciaram momentos de grande crescimento como seres humanos, e isso, segu- ramente, levarão ao longo da vida nas carreiras profissi- onais que escolheram. Da mesma forma nos emocio- namos com os talentos que têm surgido para a música, muitos já formados ou cur- sando uma faculdade de música, alguns já em progra- Protásio de Morais Nascido em Assis Chateaubriand, no Paraná, o maestro Murilo Alves é hoje uma das maiores referências da música instrumental produzida em Mato Grosso. Com incontestável sensibilidade para a música, usa suas habilidades para trans- formar a sociedade em que vive, seja enquanto professor de música da Universidade Federal de Mato Grosso ou no posto de presidente do Instituto Ciranda – Música e Cidadania. Maestro atuante desde 2004, é o regente titular da Orquestra Jovem do Estado de Mato Grosso e coordenador pedagógico da Escola de Artes de Nova Mutum. Ao Folha 3, Murilo discorre sobre os caminhos que a música instrumental persegue no Estado e sobre a importância que a música tem enquanto ferramenta de transformação social. Confira! mas de mestrado e soman- do se a estes, muitos outros em atuação como profissio- nais da área da música. Per- cebemos uma grande mudan- ça do cenário musical mato- grossense. Sobre o futuro, é de vital importância a per- cepção, por parte da socieda- de, da seriedade de projetos como esse para nossas cri- anças e a apropriação desse movimento musical orques- tral como um patrimônio de toda a comunidade. No fim das contas, o retorno positi- vo para a sociedade é muito grande. É com este pensa- mento, com este espírito que imaginamos que continuare- mos a trabalhar, a buscar par- cerias para que cada vez mais crianças e jovens tenham a oportunidade de vivenciar o universo musical orquestral. Folha 3 - Você tem o perfil de maestro edu- cador e idealista, comum ao venezuelano Jose Antó- nio Abreu. O que é pre- ciso para que um proje- to de educação musical tal qual o Sistema Venezuelano de Orquestras, capitaneado por Abreu, alcance resul- tados semelhantes aqui em Mato Grosso? Murilo - O maestro Abreu é realmente um homem notável e todos os envolvidos naquele proje- to são unânimes em desta- car a sua importância para tudo o que o Sistema se tornou. Acredito que hoje, praticamente todos os envol- MUNDO “Sabemos que a música sempre esteve presente nas ações humanas de diversas maneiras” MUDANÇA “Hoje vejo que o poder público, a iniciativa priva- da e a sociedade começam a nos olhar de maneira diferente” vidos em projetos sociais mundo afora buscam inspira- ções nos resultados do Siste- ma Venezuelano de Orques- tras. Jovens que se entusi- asmam com a trajetória de nomes como Gustavo Duda- mel e Edicson Ruiz, grandes nomes da música de con- certo e líderes que buscam se aproximar dos modelos pedagógicos e de gestão ali desenvolvidos. Obviamente no nosso caso também obser- vamos tudo isso, porém, continuamos sempre atentos às demandas e realidades da nossa região, cuidando para preservar os ideais, que são similares, mas adequan- do cada situação à nossa rea- lidade. Por fim, acredito que o amadurecimento de uma ação como a do Instituto Ciranda é um passo essen- cial e que deve ser aguardado pacientemente. Caso contrá- rio, as chances de o inves- timento ser feito e tudo se perder no meio do caminho é muito grande. Hoje vejo que o poder público, a iniciati- va privada e a sociedade de modo geral começam a nos olhar de maneira diferente, começam a perceber que essa causa é também deles. Vejo que essa maturidade começa a aflorar e acho que os pró- ximos anos serão definidores do que seremos no futuro. Acredito que amadurecemos, nas nossas práticas e meto- dologias e também no modo como a sociedade nos enxer- ga. Cidadania completará dez anos de existência. Você pode nos contar sobre os resultados alcançados e aonde o Ciranda ainda pre- tende/ precisa chegar? Murilo - Num proje- to dessa natureza é muito importante o planejamento

Upload: jorge-mendes

Post on 17-Jul-2015

194 views

Category:

News & Politics


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Matéria Murilo Folha do Estado 11/11/12

Cuiabá, Domingo 11 de novembro de 2012 l 28 folhadoestado.com.br

folha3

TRANSFORMANDO VIDAS

Música instrumental auxilia processo de inserção social

Maestro Murilo Alves conta quais os caminhos que a música instrumental tem feito no Estado e fala sobre a importância que a música tem para a sociedade

PROTÁSIO DE MORAIS REPORTAGEM LOCAL

Folha 3 - Qual a

função da música no mundo de hoje?

Murilo Alves - Sabe-mos que a música sempre esteve presente nas ações humanas de diver-sas maneiras. Acredito que são inúmeras as funções da música no mundo de hoje. Como arte, posso dizer que continua a lidar com os problemas de seu tempo e cada compositor continua no processo de busca para a efetivação dessa função, basta observarmos os pro-cessos contemporâneos de produção da música de concerto. Por outro lado, muitas são as formas de uti-lização dessa arte. Utilizá-la como ferramenta de inser-ção social é uma delas.

Folha 3 - Em rela-

ção à formação de pla-teias para a música ins-trumental, tanto na for-mação de público quanto de instrumentistas, qual a situação de Cuiabá/Mato Grosso atualmente?

Murilo - Penso que avan-çamos bastante, tanto com as ações educacionais do Insti-tuto Ciranda e da Orquestra do Estado de Mato Grosso, bem como nas iniciativas de outros artistas e grupos musicais atuantes em Mato Grosso, principalmente nas áreas da música popular, música contemporânea de concerto e, naturalmente, na música tradicional de concer-to. Entretanto, há ainda um longo caminho pela frente e penso que nesse processo as ações do Instituto Ciranda continuam sendo essenciais e estratégicas. Na medida em que criamos novas deman-das para essa música, há a

natural necessidade de ampli-armos o oferecimento dessa arte, e neste ponto entra a importância de uma escola de música comprometida com a formação de novos músicos e lideres. Hoje é possível perce-ber que as práticas musicais avançaram bastante por aqui, seja na música que ouvimos no bar, nos cerimoniais, nos grupos de música popular e nas bandas e orquestras atu-antes em Mato Grosso. Sem dúvidas, em todas essas rea-lizações temos alunos ou ex-alunos do Instituto Ciranda participando e fazendo a dife-rença.

Folha 3 - Em 2013 o Ins-tituto Ciranda – Música e

em longo prazo. No começo tínhamos a percepção dos problemas sociais que são comuns a praticamente todas as grandes cidades. Depois, como educadores musicais, visualizamos a possibilidade de trazer, através da práti-ca musical coletiva, novas possibilidades de desenvol-vimento humano em igual-dade de oportunidades a nossas crianças e jovens. Como resultado desses dez anos de atividades ininter-ruptas, nos alegramos ao per-cebermos que proporciona-mos a um grande número de jovens, situações em que vivenciaram momentos de grande crescimento como seres humanos, e isso, segu-ramente, levarão ao longo da vida nas carreiras profissi-onais que escolheram. Da mesma forma nos emocio-namos com os talentos que têm surgido para a música, muitos já formados ou cur-sando uma faculdade de música, alguns já em progra-

Protásio de Morais

Nascido em Assis Chateaubriand, no Paraná, o maestro Murilo Alves é hoje uma das maiores referências da música instrumental produzida em Mato Grosso. Com incontestável sensibilidade para a música, usa suas habilidades para trans-formar a sociedade em que vive, seja enquanto professor de música da Universidade Federal de Mato Grosso ou no posto de presidente do Instituto Ciranda – Música e Cidadania. Maestro atuante desde 2004, é o regente titular da Orquestra Jovem do Estado de Mato Grosso e coordenador pedagógico da Escola de Artes de Nova Mutum. Ao Folha 3, Murilo discorre sobre os caminhos que a música instrumental persegue no Estado e sobre a importância que a música tem enquanto ferramenta de transformação social. Confira!

mas de mestrado e soman-do se a estes, muitos outros em atuação como profissio-nais da área da música. Per-cebemos uma grande mudan-ça do cenário musical mato-grossense. Sobre o futuro, é de vital importância a per-cepção, por parte da socieda-de, da seriedade de projetos como esse para nossas cri-anças e a apropriação desse movimento musical orques-tral como um patrimônio de toda a comunidade. No fim das contas, o retorno positi-vo para a sociedade é muito grande. É com este pensa-mento, com este espírito que imaginamos que continuare-mos a trabalhar, a buscar par-cerias para que cada vez mais crianças e jovens tenham a oportunidade de vivenciar o universo musical orquestral.

Folha 3 - Você tem o perfil de maestro edu-cador e idealista, comum ao venezuelano Jose Antó-nio Abreu. O que é pre-ciso para que um proje-to de educação musical tal qual o Sistema Venezuelano de Orquestras, capitaneado por Abreu, alcance resul-tados semelhantes aqui em Mato Grosso?

Murilo - O maestro Abreu é realmente um homem notável e todos os envolvidos naquele proje-to são unânimes em desta-car a sua importância para tudo o que o Sistema se tornou. Acredito que hoje, praticamente todos os envol-

MUNDO

“Sabemos que

a música sempre esteve

presente nas ações humanas

de diversas maneiras”

MUDANÇA

“Hoje vejo que o poder público,

a iniciativa priva-da e a sociedade começam a nos

olhar de maneira diferente”

vidos em projetos sociais mundo afora buscam inspira-ções nos resultados do Siste-ma Venezuelano de Orques-tras. Jovens que se entusi-asmam com a trajetória de nomes como Gustavo Duda-mel e Edicson Ruiz, grandes nomes da música de con-certo e líderes que buscam se aproximar dos modelos pedagógicos e de gestão ali desenvolvidos. Obviamente no nosso caso também obser-vamos tudo isso, porém, continuamos sempre atentos às demandas e realidades da nossa região, cuidando para preservar os ideais, que são similares, mas adequan-do cada situação à nossa rea-lidade. Por fim, acredito que o amadurecimento de uma ação como a do Instituto Ciranda é um passo essen-cial e que deve ser aguardado pacientemente. Caso contrá-rio, as chances de o inves-timento ser feito e tudo se perder no meio do caminho é muito grande. Hoje vejo que o poder público, a iniciati-va privada e a sociedade de modo geral começam a nos olhar de maneira diferente, começam a perceber que essa causa é também deles. Vejo que essa maturidade começa a aflorar e acho que os pró-ximos anos serão definidores do que seremos no futuro. Acredito que amadurecemos, nas nossas práticas e meto-dologias e também no modo como a sociedade nos enxer-ga.

Cidadania completará dez anos de existência. Você pode nos contar sobre os resultados alcançados e aonde o Ciranda ainda pre-tende/ precisa chegar?

Murilo - Num proje-to dessa natureza é muito importante o planejamento