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MEMÓRIA, PATRIMÔNIO E HISTÓRIA: UMA ABORDAGEM PRÁTICA
Monica Zanellato Stanger1
Resumo
O presente artigo relata a experiência e a pesquisa realizada com alunos da 5ª
série do Colégio Estadual Leonardo da Vinci a partir de referenciais teórico
metododógicos pertinentes aos trabalhos de História e Memória. O objetivo do
estudo foi a investigação e reelaboração dos conceitos de História, memória e
patrimônio cultural ensinados em sala de aula na série pesquisada. Para isso,
trabalhouse com os alunos através da coleta e exposição de objetos e
histórias guardadas por suas famílias, e elaboração de um vídeo que serviu e
potencialmente servirá como material didático para novas experiências. Além
do trabalho empírico, fezse a leitura de vários autores e pesquisadores do
assunto que dissertaram a respeito de como os historiadores escrevem a
história, que não é feita só com documentos escritos, mas com símbolos,
objetos, contos, cantos, costumes. O resultado levou à compreensão da
importância do ensino da história e da memória, bem como dos temas
relacionados, tal como o patrimônio cultural, segundo as perspectivas
renovadas das discussões ocorridas na academia nas últimas décadas..
Palavraschave: Patrimônio Cultural. Memória. História. Museu. Artes. Cultura.
Exposição. Objetos. Educadores.
ABSTRACT This article reports the experience and research conducted with students in 5th grade State School Leonardo da Vinci from methodological alstract relevant references to the works of history and memory. The objective of this study was to research and development of concepts of history, memory and cultural heritage, taught in the classroom in the series studied. For that, i worked with students through the collection and exhibition of objects and histories kept by their families, and making a video helped and potentially aull serve as material
1 Professora de História. Formada pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Palmas PR FAFI. Atual Centro Universitário Católico do Sudoeste do Paraná – UNICS. Especialização em Processos Pedagógicos do Ensino Fundamental e professora integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional do Governo do Estado do Paraná.
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for new experiences. Besides the empirical work, there was the reading of various authors and researchers of the subject who spoke about how the historians write history, which is not made only with written documents, but with symbols, objects, stories, songs, costumes. The result led to the understanding of the teaching of history and memory as well as the themes importance of related as cultural heritage, according to the prospects of renewed discussions held at the academy in recent decades.
INTRODUÇÃO
As sociedades nos mais variados tempos buscaram construir sua
identidade, definir seus parâmetros de pertencimento, recorrendo ao passado.
É através da história de nossa vida e das gerações anteriores que são
procuradas as linhas de tradição e as ligações entre presente e passado. Para
traçar essas linhas que dão sentido às histórias cotidianas são necessários
alguns procedimentos ora intencionais e programados, ora espontâneos e
casuais. Os eventos passados se tornam conhecidos somente se alguém
guardou, preservou algum resto, vestígios que possam nos remeter ao
passado e a partir deles escrever e reescrever a História.
Portanto, um povo que não guarda suas histórias, suas memórias, seu
patrimônio, não sabe quem realmente é. Estas memórias estão guardadas em
seu patrimônio cultural que deve ser preservado, restaurado, contado, cantado,
de tal maneira que possa despertar nas pessoas seu real valor para a
construção de sua História.
A questão que norteou a confecção desse estudo é a seguinte: como
conscientizar alunos que a História não é apenas mais uma disciplina que se
estuda na escola, mas que na verdade também é construída por eles, por sua
família e por sua comunidade?
Partindo dessa problemática, buscouse construir um acervo documental
a partir da coleta de materiais diversos dos alunos, no intuito de elaborar
coletivamente o conhecimento acerca da produção da memória e da História.
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A concepção de História é diversa; muitos estudantes consideram o
estudo de tal disciplina chata e sem significado. Porém, se construirmos com
eles novos sentidos para a disciplina ela ganha novos significados e pode se
tornar de grande importância e interesse no cotidiano da escola.
Assim, o presente artigo tem por finalidade construir novos conceitos
sobre o sentido de estudar História, bem como a compreensão de memória,
patrimônio, cultura e a relação que se estabelece entre eles.
Neste prisma, as memórias são de suma importância no sentido de
despertar o interesse nos educandos para que desenvolva o gosto de estudar
História, aprendendo sobre o presente, o passado e o futuro de uma forma
dinâmica, diferente, participativa e ao mesmo tempo prazerosa.
Jacques Le Goff em sua obra História e Memória cita as considerações
de LeroiGorhan sobre o que seriam as memórias:
Não é uma propriedade da inteligência, mas a base, seja ela qual for, sobre a qual se inscrevem as concatenações de atos. Podemos a este título falar de uma “memória específica” para definir a fixação dos comportamentos de espécies animais de uma memória “étnica” que assegura a reprodução dos comportamentos nas sociedades humanas e, no mesmo sentido, de uma memória “artificial”, eletrônica em sua forma mais recente, que assegura sem recurso a um instinto ou à reflexão, a reprodução de atos mecânicos encadeados (LE GOFF apud GORHAN, 2003, p. 269).
Deste modo, a memória, como propriedade de conservar certas
informações, remetenos em primeiro lugar a um conjunto de funções
psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações
passadas, ou que ele representa como passadas. (LE GOFF, 2003).
Portanto, o processo da memória no homem faz intervir não só na
ordenação de vestígios, mas também na releitura desses vestígios,
possibilitando uma análise mais concreta e real do que lhe é apresentado,
podendo inclusive tecer questionamentos e fazer novas ponderações sobre as
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considerações até então efetuadas.
A construção das memórias constitui importante função social, na medida
em que reproduz informações mesmo ante a ausência de dados escritos,
baseandose no estudo de objetos que marcaram o seu acontecimento. (LE
GOFF, 2003).
A maior parte das informações que constituem um determinado fato,
encontrase, via de regra, na memória ativa das pessoas. Estas informações,
após imperativa necessidade de estudo, acabam levando a formação de fatos
históricos. (LE GOFF, 2003).
Existe uma distinção no estudo das memórias entre as culturas orais e
culturas escritas, sendo a primeira predominantemente fundada na existência
das etnias ou das famílias, ou seja, dos dados de origem. (LE GOFF, 2003, p.
424).
A segunda por sua vez, busca registrar os acontecimentos mais
relevantes da vida em sociedade, sendo mais exata e concisa, haja vista que
não deixa muitas margens à divagação, produzindo uma constatação mais
precisa no registro da História, armazenando uma maior quantidade de
informações, por tempo considerável. (LE GOFF, 2003, p. 424).
Segundo Jacques Le Goff citando Goody:
[...] a escrita implica também modificações no próprio interior do psiquismo e que não se trata simplesmente de um novo saberfazer técnico, de qualquer coisa comparável, por exemplo, a um processo mnemotécnico, mas de uma nova aptidão intelectual. (GOODY, 1977, p. 108109).
Durante a Idade Média, Tomás de Aquino a partir da doutrina clássica
dos lugares e das imagens, formulou algumas regras mnemônicas, dentre as
quais se destacam:
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1) É necessário encontrar “simulacros adequados das coisas que se deseja recordar” e “é necessário segundo esse método, inventar simulacros e imagens porque as intenções simples e espirituais facilmente se evolam da alma, a menos que estejam, por assim dizer, ligadas a qualquer símbolo corpóreo, porque o conhecimento humano é mais forte em relação aos sensibiliza; por esta razão, o poder mnemônico reside na parte sensitiva da alma”. A memória está ligada ao corpo.2) É necessário, em seguida, dispor “numa ordem calculada as coisas que se deseja recordar de modo que, de um ponto recordado, se torne fácil a passagem ao ponto que lhe sucede”. A memória é razão.3) É necessário “meditar com freqüência no que se deseja recordar”. É por isso que Aristóteles diz que “a mediação preserva a memória, pois “o habito é como a natureza”. (LE GOFF apud TOMÁS DE AQUINO, 2003, p. 499).
A memória, na qual cresce a História, que por sua vez a alimenta, procura
salvar o passado para servir ao presente e ao futuro. Devemos trabalhar de
forma que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos
homens. (LE GOFF, 2003).
Deste modo, ressaltase que a construção das memórias constitui uma
excêntrica forma de dominação, tendo em vista que os grupos dominantes
sempre se valeram da manipulação dos dados que formaram a História da
sociedade para perpetuaremse no poder, fazendo inclusive, desaparecer
importantes fatos e movimentos históricos, capazes de levar o povo a se
organizar contra a forma de domínio a que estão submetidos.
Segundo Peter Burke, o paradigma tradicional da escrita da História
consolidou a necessidade do uso de documentos para a produção do
conhecimento histórico. Uma das grandes contribuições de Leopold von Ranke
foi sua exposição das limitações das fontes narrativas e sua ênfase na
necessidade de basear a História escrita em registros oficiais emanados do
governo e preservados em arquivos. O preço dessa contribuição foi a
negligência de outros tipos de evidência. (BURKE,1992).
Esta afirmação de Ranke enfatiza a necessidade de basear a História em
registros oficiais, e nos leva a refletir sobre “a oficialidade” de tais registros,
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afinal, muitas vezes a História é feita segundo a conveniência de quem a
escreveu, ou para servir como forma de dominação.
Fazse necessário, então a compreensão do que é historia, do que é
documento ou registro oficial, enfim, sobre a História de cada um, da família, do
local em que o individuo está inserido e que com sua vivencia, sua
interferência, vai tecendo sua História e colaborando para a formação da
História da sociedade em que vive.
Neste sentido, de grande importância são as colocações de Lucien
Febvre:
A história fazse com documentos escritos, sem dúvida. Quando estes existem. Mas pode fazerse, deve fazerse sem documentos escritos, quando não existem. Com tudo o que a habilidade do historiador lhe permite utilizar para fabricar o seu mel, na falta das flores habituais. Logo, com palavras. Signos. Paisagens e telhas. Com as formas do campo e das ervas daninhas. Com os eclipses da lua e a atrelagem dos cavalos de tiro. Com os exames de pedras feitos pelos geólogos e com as análises de metais feitas pelos químicos. Numa palavra, com tudo o que, pertencendo ao homem, depende do homem, serve ao homem, exprime o homem, demonstra a presença, a atividade, os gostos e as maneiras de ser do homem. (FEBVRE, 1992, p. 328).
Assim, os historiadores ao se depararem com uma hipótese em que haja
inexistência de documentos escritos, utilizandose dos monumentos
encontrados, elaborarão pesquisas e estudos sobre eles, conferindolhes a
condição de documentos importantes para a construção da História.
Neste aspecto, podese perceber a necessidade de lugares próprios e
adequados a fim de se conservar esses documentos, essas memórias, sem
alterarlhes as características essenciais, para que possam ser apreciados e
analisados pelas futuras gerações, que poderão inclusive, descobrir novas
verdades acerca dos objetos armazenados.
Os museus na atualidade vêm se destacando como um dos locais mais
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propícios ao armazenamento de acervos culturais, tendo em vista que foram
criados exatamente para esta finalidade, sendo abertos ao público, sem fins
lucrativos, possibilitando crescimento de conhecimento e cultura.
Nas palavras de Janine Ojeda, os museus são uma instituição, sem
finalidade lucrativa, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberto
ao público e que realiza investigações que dizem respeito aos testemunhos
materiais do homem e do seu meio ambiente, adquire os mesmos, conserva
os, transmiteos e os expõe, especialmente, com intenções de estudo, de
educação e de deleite (OJEDA, 2008).
Deste modo, os museus e demais espaços de cultura representam um
dos lugares responsáveis pela memória de um povo, encarregados pela
preservação das obras produzidas pela humanidade, com suas histórias, com
os meios próprios que dispõe (LEITE apud CHAGAS, 2006).
O que mantém um museu vivo é a sua relação dinâmica com a
sociedade, portanto, museus não são instituições permanentes, mas práticas
sociais colocadas à serviço da sociedade e seu desenvolvimento. (LEITE apud
CHAGAS, 2006).
Para Chagas, os museus não exercem apenas o papel de guarda, mas
têm a vocação de investigar, documentar e comunicarse. Trabalham
permanentemente com o patrimônio cultural integral, ressaltando sua dimensão
educativa, procurando, assim, desenvolver as identidades locais, regionais,
nacionais e intergovernamentais. (LEITE apud CHAGAS, 2006).
Os museus devem representar a sociedade e sua estruturação, onde sua
função mais premente é ser o espaço de comunicação direta com a
comunidade. Esta dinâmica faz do museu um espaço de diversidade sem, no
entanto, jogar fora o velho – mas debruçandose criticamente sobre ele,
fornecendo instrumento para o diálogo permanente. (LEITE apud CHAGAS,
2006).
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Atentese para o fato de que no contexto da nova museologia, surge a
necessidade de se contextualizar os objetos, todavia, não basta contextualizá
los, pois, os objetos ao serem preservados, carregam consigo, no mínimo, o
seu significado inaugural, e devem ser pensados criticamente neste contexto.
(LEITE apud CHAGAS, 2006).
Neste prisma, de buscar reconstruir a História, resgatando a arte,
interpretando um dado momento histórico, muitos historiadores buscam
elaborar museus itinerantes, constituindo, desta forma, um espaço reservado à
cultura.
A historiadora Maria Isabel Leite acompanhou sistematicamente a
proposta educativa da construção de um museu itinerante intitulado “O Brasil
de Portinari”, com exposição de réplicas no Solar Grandjean de Montigny, no
Rio de Janeiro, sendo parte constante da pesquisa utilizada em seu
doutoramento sobre museus, educação e cultura.
A pesquisadora relata em seu trabalho que:
[...] a apreciação das obras não é dom inato – nosso olhar é construído diaadia e essas possibilidades de experiência estética fazem parte de nossa formação cultural. A formação é hoje uma das maiores dificuldade que disparam no campo da educação no Brasil. (LEITE, OSTENTTE, 2006, p.32).
Durante o acompanhamento do projeto, a historiadora ressaltou a
necessidade de um trabalho pedagógico para os monitores, de modo a
envolvêlos, criando uma relaçãointeração com o projeto, de modo a não
ocorrer apenas repetição de fatos.
Enfatizando ainda, que não só nos museus, mas nas escolas e espaços
da cultura, o desenho tem ficado espremido pelo tempo, pela ordem dada, pelo
material, pelas instalações, visto que o prazer de produzir está diretamente
relacionado ao processo e às condições de produção oferecidas.
Assim, os museus itinerantes auxiliam grandiosamente no
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desenvolvimento das artes e da cultura, resgatando o gosto pelo estudo da
História, incentivando as pessoas, os alunos e a sociedade como um todo a
redescobrirem fatos históricos importantes. (LEITE, OSTENTTE, 2006).
A arte se dirige a todos para ser sentida e compreendida: por isso é
democrática, é impacto emocional, confronto de idéias, de História e de
imaginação. (LEITE, OSTENTTE, 2006).
Allana Pessanha de Moraes em sua pesquisa final de curso na
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, através de seu
projeto de extensão “Patrimônio Cultural”, também desenvolveu um projeto de
ação pedagógica com alunos de 6ª, 7ª e 8ª séries do ensino fundamental com
escolas públicas no Município de Campos dos Goytacazes.
A autora realizou um estudo junto aos alunos daquela região, tendo
constatado que 43% dos entrevistados afirmaram nunca ter ouvido falar de
Patrimônio Cultural embora se pudesse perceber certa apropriação do conceito
de patrimônio tradicionalmente usado no Brasil. (MORAES, 2006).
A partir dos estudos realizados, a bolsista de pesquisa em extensão pôde
perceber que é crescente a necessidade de promover uma ação pedagógica
para direcionar os estudantes a entender o conceito de Patrimônio e
reconhecer sua importância, enfatizando que é (re)conhecendo a identidade
cultural que se passa a valorizar e preservar aquilo que reconhece como seu,
de modo que a educação patrimonial deve ser incluída nos currículos
escolares, levando à comunidade escolar ao resgate e preservação do
Patrimônio Cultural. (MORAES, 2006).
Assim, percebese a crescente necessidade de criação de um espaço
reservado à preservação do Patrimônio cultural, e paralelamente uma ação
pedagógica que integre os estudantes a esse projeto. É nesse contexto que se
inserem os museus itinerantes.
Atualmente ir ao museu não é como assistir a um CDROM de obras de
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arte, assim como ir ao cinema é diferente de ver um vídeo ou ir a um teatro não
é o mesmo que assistir a uma encenação de um grupo teatral na escola, de
forma que a experiência indireta com a obra não substitui a experiência direta.
(LEITE, OSTENTTE, 2006).
Outra experiência aqui narrada é da pedagoga Samantha Fernandes da
Silva onde ela conta sobre seu “encontro com Picasso”:
Sai de minha cidade, Biguaçu (SC), para a Oca, no parque Ibirapurera, me encontrar com Pablo Picasso. O emocionante entra nas lembranças que me vieram ao entrar na Oca, ao admirar todas aquelas obras, minha memória me reportou à infância na escola, às obras dos artistas que contemplava e namorava nas revistas (em casa), ao sentimento de paixão pela arte e pelas cores. Eu estava ali deslumbrada, com sentimentos vivos, apesar da escola. (SILVA, 2006, p.157).
A autora utiliza a expressão “apesar da escola”, devido ao trauma
adquirido na infância, na qual os desenhos vinham de forma mimeografada, e
este era o único tempo em que podiam ter contato com o lápis de cor, e ainda
mal apontado, pois apontador era um artigo de luxo. Ela queria uma caixa
cheia de lápis de todas as cores, mas sua iniciativa, sua vontade de criar foi
podada, devido ao fato de apenas alguns lápis terem ponta, e também o
desenho não ser o que ela queria, uma vez que ele já veio pronto.
Percebese então, a necessidade de uma atenção para a arte, para a
cultura de um povo. É relevante que a escola e a sociedade ofereçam
condições para que seja possível o “aprendizado da arte”, estimulando sua
criatividade. Somente assim se formará no educando o respeito pelo patrimônio
cultural, pela memória e pela História de seu povo.
Portanto, o presente estudo, pautado nas discussões e nos trabalhos
acima apresentados, pretendeu colaborar para conscientizar os alunos da
importância da disciplina de História, no que concerne a problematização do
tempo presente e à construção da cidadania.
Dessa forma, o objetivo principal do trabalho foi a apropriação do que
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estudaram, e, ao se apropriar destes saberes, considerase que, o aluno possa
ser capaz de enfrentar novos desafios ampliando suas potencialidades e
posicionandose de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes
situações sociais.
Desafiador é fazêlos diferenciar tempo passado de História produzida e
compreender que os elementos históricos interferem no seu cotidiano e no de
sua comunidade. No intuito de desenvolver o interesse dos alunos pela
disciplina e fazêlos compreender que a História está presente em todos os
acontecimentos e que eles próprios ajudam a construir a História da sociedade
em que vivem, buscouse constituir com os alunos da 5ª série, um acervo
documental de objetos, moedas, livros, fotos, diários, filmes, fitas, entre outros
objetos e documentos, desenvolvendo desta forma uma experiência entre os
educandos com a produção da memória e da História.
O artigo traz ainda os passos trabalhados durante a pesquisa, que teve
sua culminância na produção de um vídeo didático, que ira servir como
instrumento ou material didático. A produção do vídeo seguiu todos os passos
da Educação Patrimonial, que são: observação, registro, este representado
pelos alunos por meio de desenhos, exploração ou pesquisa, e apropriação,
onde os estudantes apresentaram um teatro para demonstrar o que
aprenderam.
2 O Colégio Estadual Leonardo da Vinci: o local de implantação do
projeto
O Colégio Estadual Leonardo da Vinci está localizado no bairro Centro
Sul do município de Dois Vizinhos, oferecendo em três turnos (matutino,
vespertino e noturno), as modalidades de: Ensino Fundamental, Ensino Médio,
Ensino Normal e Educação Profissional, com um total de 1.364 alunos.
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O Colégio tem como proposta uma educação que contemple o
desenvolvimento cognitivo, físico, afetivo, social e ético, tendo em vista uma
formação ampla. Faz parte dessa longa etapa a construção de valores e
atitudes que norteiam as relações interpessoais e intermedeiam o contato do
aluno com o objeto do conhecimento. É imprescindível, nesse processo que
valoriza o aprender contínuo e a troca constante entre alunoaluno e aluno
professor, uma postura de trabalho que considera a cooperação, o respeito
mútuo, a persistência e o empenho para superar desafios.
O Colégio é a segunda maior escola do município em número de alunos,
sendo estes provenientes de diferentes espaços, tanto da área urbana quanto
da rural, sendo em sua maior parte da área urbana. Neste contexto existem
várias realidades. Alguns alunos são provenientes de famílias que possuem
certo poder aquisitivo, outros com poder aquisitivo médio e ainda os de famílias
carentes. Independente da realidade social vivida por esses alunos a escola
tornase ponto de encontro, sendo que para muitos é o local que lhes garante
certa renda familiar com a bolsa escola e o programa leite das crianças.
3 Patrimônio Cultural e História: coletando a memória no Município de
Dois Vizinhos.
O início do presente trabalho foi implantado junto aos alunos da quinta
série do Colégio Estadual Leonardo da Vinci explicando aos mesmos o que é
História, por que estudar História. Após essa introdução, os educandos foram
orientados a fazer uma busca da História de suas famílias, de seus
antepassados. Essa atividade propôs a coleta de objetos da família e da
comunidade que pudessem reavivar a memória por meio de restos guardados
em casa.
Os objetos trazidos pelos alunos foram os mais diversos:
livros e cadernos antigos, lousa, utensílios de cozinha, artigos de cama e mesa
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como bordados, tecelagem, também, cestos, moedas, ferramentas utilizadas
na agricultura e criação de animais.
Após a realização da tarefa de catalogação dos objetos montouse uma
pequena exposição em uma das salas de aula do Colégio com os materiais
coletados, de modo que toda a escola pudesse visitar, conhecer e aprender
sobre a História representadas nestes guardados.
O interesse dos visitantes era visível, eles não se cansavam de admirar,
questionar e comentar sobre o que estavam tendo a oportunidade de ver, foi
uma experiência gratificante para os educadores.
O despertar do interesse dos educandos para com o patrimônio
apresentado na exposição reporta às considerações de Luiz A. B. Custodio:
A valorização do patrimonio cultural brasileiro depende, necessariamente, de seu conhecimento. E sua preservação, do orgulho que possuimos de nossa própria identidade. (CUSTÓDIO, 2006, p.12)
Depois da exposição dos objetos foi produzido um vídeo didático com o
resultado obtido. O objetivo da confecção do respectivo vídeo foi disponibiliza
lo como material didático para implementação do projeto por outros
educadores, além de oferecer a oportunidade para que futuramente outras
turmas possam trabalhar com o mesmo conteúdo.
O material didático produzido (vídeo), foi utilizado com os alunos da 6ª
série no ano de 2009 e com os alunos que iniciaram a 5ª série neste mesmo
ano.
Inicialmente as atividades foram implantadas junto às quintas séries do
Colégio Estadual Leonardo da Vinci através de uma enquete sobre o que os
mesmos entendiam por História.
A partir desta primeira enquete chegouse a distintos conceitos acerca
do tema História, sendo as respostas mais triviais:
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“A História é estudar o passado, conhecer o mundo de antigamente, como
eram os países, cidades, enfim o planeta. História conta como era
antigamente” (55%);
“História é como conto de fadas, são coisas que são inventadas” (4%);
“A História estuda o que aconteceu com o passar do tempo. É a relação do
presente e passado da humanidade” (18%);
“História é tudo o que acontece ” (10%);
“Historia é aprender sobre as coisas que aconteceram no pasado e acontecem
no presente” (13%).
A partir deste contexto, passouse a trabalhar com o texto: “Enterrando
os Mortos, Desenterrando os Vivos” (Brasil uma História em construção, José
Rivair Macedo; Mariley W. Oliveira, p.7, 1986), (livro didático), que aborda de
forma clara e objetiva a concepção de História, relatando o diaadia de um
menino de 11 anos que questionou seu professor sobre o porque de estudar
História.
O autor relata que o garoto ao voltar para sua casa pretende esquecer
da Escola Tiradentes onde estuda, mas passa pela Rua Princesa Izabel, pela
Praça Sete de Setembro, que por sua vez, fica na Rua D. Pedro II.
Desta forma, os alunos foram percebendo que o passado se faz
presente no seu cotidiano, e, que este passado foi construído por pessoas que
já não vivem, mas que deixaram muitos traços como herança e que isto ainda
repercute na vida atual. Compreenderam assim, que nós também estamos
construindo a nossa História aos produzirmos e guardarmos nossos restos de
vida, tais como os objetos trazidos para a exposição.
Após este trabalho, procedeuse nova enquete junto aos alunos para
que novamente escrevessem o que entendiam por História.
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Algumas respostas:
“A História é cada dia que passa, ela está com a gente, nós fazemos parte da
história”;
“A História é o resumo das coisas que aconteceram no passado e que tem
influência no presente”.
“Nós gostamos de estudar História. Com ela podemos entender os fatos que
acontecem ao nosso redor”.
Percebeuse na segunda enquete que mesmo os que não escreveram,
entenderam o significado do ensino de História.
Neste contexto, oportuno destacar as considerações de Fernand Braudel
acerca do que é História:
[...] o conhecimento histórico alarga a compreensão do homem enquanto ser que constrói seu tempo. E a reflexão histórica, estudando o que os homens foram e fizeram, nos ajuda a compreeder o que podemos ser e fazer. Assim, a história é a ciencia do passado e do presente, um e outro inseparáveis. (BRAUDEL, 1997, p.10)
Denotase que os conceitos criados pelos alunos após um breve estudo
sobre o que é História assemelhase ao conceito criado pelo renomado
historiador.
Retomando alguns conceitos de História formulados pelos alunos nas
enquetes, no intuito de inserir os conceitos de patrimônio e memória no mesmo
contexto, passouse a seguinte pergunta: “Qual a relação das respostas que
vocês deram anteriormente com patrimônio e memória? São a mesma coisa?”
Algumas respostas:
“Eu acho que é a mesma coisa, pois a nossa memória é nossa História”.
“A memória é o que lembramos do passado”.
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“História são as coisas que aconteceram, e memória é o que guardamos”.
Novamente se fez necessário trabalhar com os novos conceitos
apresentados, uitlizandose para tanto o auxílio de textos, vídeos, slides e
também comentando sobre o vídeo produzido com os objetos coletados,
ressaltando que aqueles objetos, documentos, fotos, vestuários, dentre outros,
faziam parte do patrimônio e da memória da nossa comunidade.
Percebeuse então que os educandos entenderam esses conceitos,
quando convidados a novamente escrever ou falar o que entendiam sobre
patrimônio e memória, proferiram respostas como:
“A História usa a memória, e que é as coisas que fizeram parte de nossa vida,
coisas que nossos antepassados guardaram e preservaram”.
“A História se faz pela memória de nossas famílias, comunidades, pelos
objetos guardados e pelo patrimônio histórico e cultural.
O método utilizado para que os alunos pudessem compreender e
apreender os novos conceitos foi tomado com base no ensinamento de Maria
de Lourdes Parreira Horta:
A metodologia da Educação Patrimonial pode levar os professores a utilizarem os objetos culturais na sala de aula ou nos próprios locais onde são encontrados, como peçaschaveno desenvolvimento dos currículos e não simplesmente como mera ilustração das aulas. (HORTA, 1999, p. 09).
Para dar continuidade aos trabalhos realizados com os educandos,
utilizouse o texto: “Respeito à nossa História e ao nosso Patrimônio”, (História
em Documento: Imagem e Texto, Joelza Ester Rodrigues, p.23, 2002). O
referido texto relata que a História faz parte de nossa vida, que convivemos
com ela diariamente, mostrando que traços do passado permanecem no
cotidiano, e, conhecêlos a fundo significa criar condições para entendermos
melhor o nosso próprio presente.
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Uma pessoa que perde a memória, perde ao mesmo tempo a
consciência de sua identidade, dos vínculos que mantém com outras pessoas,
do sentido de sua vida.
De forma semelhante, uma sociedade que desconhece a sua História
(memória coletiva), desconhece também as suas origens, desenvolvimento e
capacidade de viver coletivamente, podendo ser manipulada com maior
facilidade.
Neste prisma, denotase a importância da Memória e do patrimônio na
História, na medida em que guardam traços da cultura de um povo, preservam
objetos, guardam reliquias, e ajudam a compreender o processo de construção
da História.
A memória pode ser individual ou coletiva. Individual é quando a pessoa
traz consigo acontecimentos que foram importantes, que interferiram em sua
vida particular. Coletiva, é quando essa memória passa a ser construída
coletivamente, quando é partilhada por uma comunidade, cidade, estado, país,
etc.
Da memória também fazem parte os objetos guardados, festas
populares, danças, folclore, monumentos etc, que por sua vez, representam o
Patrimônio Cultural de uma comunidade.
Podese entender como Patrimônio Cultural um bem que seja importante
para uma pessoa ou mesmo para um grupo de pessoas, uma riqueza recebida
como herança, documentos antigos, monumentos, pois relatam a história da
sociedade em que se vive, trazendo recordações do passado, fazendo com
que seu povo possa se sentir unido por um sentimento comum.
Assim, quando se fala em patrimonio, falase também de História,
memória e identidade; conceitos estes que estão interrelacionados, mas que
se modificam com o passar do tempo.
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No intuito de ressaltar a importância da História, da memória e do
patrimônio no contexto de uma sociedade buscouse retomar os conceitos
trabalhados inicialmente com os alunos, promovendose um novo debate sobre
História, memória e patrimônio.
Constatouse que, apesar de alguns alunos ainda terem dúvidas sobre
os conceitos que foram amplamente estudados, a maioria foi capaz de
assimilar e abstrair o que representam estes conceitos para eles, assim como a
importância do ensino de História, ademais de ter despertado a consciência da
necessidade de preservação de tudo aquilo que faz parte do Patrimônio
Cultural da sociedade em que vivem.
O projeto realizado também possibilitou aos alunos levar até suas
famílias o valor dos objetos que preservaram e a importância de continuar
preservando e valorizando este material que faz parte de suas histórias,
ressaltando que hoje vivemos em uma época em que tudo tem um período útil
muito curto, sendo descartado, trocado e estes que foram a base dos atuais,
são desprezados com muita velocidade pela sociedade atual que valoriza o
novo, o top de linha.
O conhecimento é uma reconstrução dos fatos a partir das fontes
históricas, ou seja, é o nosso pensamento de hoje tentando alcançar o modo
de pensar e viver de outros tempos e de outros povos.
Tudo o que nos permite perceber alguma coisa a respeito de como era
a vida em uma certa época tornase um documento histórico. Até a memória
das pessoas pode ser considerada como um documento.
Os documentos e as lembranças de nossa História formam o patrimônio
histórico e artístico nacional. Este representa a maior riqueza de um povo, pois
nele está contida sua memória, sua cultura, seu modo de pensar e de agir,
abrange o patrimônio material e imaterial.
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O patrimônio material é representado por obras arquitetônicas,
urbanísticas, objetos, artefatos, sítios arqueológicos e outros, já o patrimônio
imaterial são os costumes, saberes, relações sociais e simbólicas.
Denotase deste modo, que patrimônio abrange bens que de certo modo
são importantes para toda a humanidade, conforme ressalta a historiadora
Lúcia Lippi Oliveira:
Ao falarmos de patrimônio, estamos lidando com história, memória e identidade, conceitos interrelacionados cujos conteúdos são definidos e modificados ao longo do tempo. A noção de patrimônio confundese assim com a de propriedade herdada. O processo pelo qual se forma um patrimônio é o de colecionar objetos, mantendoos fora do circuito das atividades econômicas, sujeitos a uma proteção especial. (OLIVEIRA, 2008, p. 114).
Para Lúcia Lippi Oliveira os chamados patrimônios históricos e artísticos
têm, nas modernas sociedades a função de representar simbolicamente a
identidade e a memória de uma nação. O pertencimento a comunidade
nacional, é produzido a partir da idéia de propriedade sobre um conjunto de
bens: relíquias, monumentos, cidades históricas entre outros.
4 – Patrimônio Cultural e História: implementação pedagógica através das
quatro etapas da educação patrimonial observação, registro, exploração
e apropriação
Buscando uma inovação junto às salas de aula, na tentativa de despertar
o interesse dos alunos nas aulas de História e, sobretudo no que se refere ao
conteúdo patrimônio cultural, História e memória, foi dado prosseguimento ao
projeto de implementação pedagógica no Colégio Estadual Leonardo da Vinci,
através da produção didática de um vídeo que contou com a participação dos
educandos, professores e pela própria comunidade.
O vídeo didático de implementação do projeto PDE, cujo titulo é História e
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Educação Patrimonial: coletando a memória do município de Dois Vizinhos, foi
produzido a partir de uma exposição de materiais coletados com alunos de 5ª
séries do Colégio Estadual Leonardo da Vinci, e expostos nos moldes de uma
exposição de museu itinerante.
A confecção do vídeo didático tinha por finalidade fazer com que os
educandos realizassem as quatro etapas da Educação Patrimonial:
observação, registro, exploração e apropriação.
Durante o período em que foi assistido o Vídeo, foram feitas as paradas
necessárias para explicar e comentar com os alunos os fatos que envolviam o
vídeo, em cada uma de suas etapas, ressaltandose que os alunos ficaram
atentos a todas as etapas do mesmo.
Na primeira etapa que consistente em observação, os educandos
reconheceram colegas que apareceram nas filmagens, identificaram objetos,
momento este em que diziam: “este objeto tem lá na minha casa”, “a minha avó
tem um ferro de passar igual a esse”, e assim por diante. Também
questionavam sobre objetos que não conheciam e que passaram a conhecer.
Aproveitando o momento questionouse aos educandos, se em suas
famílias se guardava algum objeto antigo ou bens que estes consideravam
importantes. Entre várias respostas a mais relevante foi a de uma aluna que
comentou que em sua família existe um bem (objeto) que eles consideram um
patrimônio para a família e tem quase 70 anos, vai passando de geração em
geração, e consiste em um par de brincos de ouro, que era da bisavó, passou
para a avó, atualmente pertence a mãe da aluna e um dia a mãe passará para
ela.
Segundo a educanda Andressa Dias, o brinco lembra muitas gerações
(parentes antigos), tendo mencionado que a mãe comentou que aquele objeto
vale muito mais que o dinheiro pode pagar: é uma riqueza familiar que guarda
muitas lembranças.
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As palavras da educanda nos remetem ao ensinamento dos historiadores
Pedro Paulo Funari e Sandra C. A. Pelegrini:
Hoje, quando falamos em patrimônio, duas idéias vêm a nossa mente. Em primeiro lugar pensamos nos bens que transmitimos aos nossos herdeiros e que podem ser materiais, como uma casa ou uma jóia, com valor monetário determinado pelo mercado. Legamos, também, bens de pouco valor comercial, mas de grande significado emocional, como uma foto, um livro autografado ou uma imagem religiosa do nosso altar doméstico. Tudo isso pode ser mencionado em um testamento e constitui o patrimônio do indivíduo. (FUNARI; PELEGRINE,, 2006, p. 9).
Assim, os brincos de ouro que pertencem à família de Andressa Dias,
representam um patrimônio familiar com valor inestimável e que foi sendo
passado de geração para geração.
Após a etapa de observação do vídeo, passouse a próxima etapa que
consiste no Registro. Nesta etapa os educandos representaram o que viram no
vídeo através de desenhos, sendo que estes desenhos foram os mais variados,
alguns fizeram um ou dois desenhos, outros fizeram representações de vários
objetos, e ainda teve aqueles que representaram seguindo praticamente toda a
seqüência do vídeo inclusive com cenas de pessoas utilizando os materiais
utilizados na exposição em seu cotidiano.
A tarefa seguinte era escolher um objeto para a produção de um texto. A
escolha foi bem diversificada, sendo que os objetos mais escolhidos para o
texto foram: ferro de passar; máquina de datilografar; ferramentas agrícolas,
moedas, mas o que despertou o interesse e a curiosidade foi a Lousa que
conta com mais de 70 anos, e era utilizada na escola pelos alunos quando não
existiam cadernos, sendo que as crianças escreviam nos dois lados da lousa e
após apagavam tudo para escrever novamente.
Com a produção do texto concluída, fezse um circulo com professor e
alunos, comentandose sobre vários objetos antigos que estes conheciam ou
passaram a conhecer. A discussão contribuiu para a percepção da importância
22
que esses objetos tinham para o povo da época e também que são importantes
para a História do presente.
Foi possível perceber que o objetivo da atividade foi alcançado, os alunos
comentaram que gostaram muito das aulas de História, pois, conheceram e
aprenderam muitas coisas que desconheciam, mencionando que as aulas
ficaram mais atrativas, podendose inclusive constatar que alguns alunos
passaram a ter um sentimento de identidade com essa diversidade cultural.
Com a atividade de Exploração, os alunos pesquisaram sobre os objetos
que haviam escolhido nas atividades anteriores, buscando maiores dados em
livros, internet e outros, sendo que tiveram acesso as mais variadas
informações, prosseguindose com a organização de um seminário com a
finalidade de ressaltar as diferenças entre o conhecimento que tinham e o que
passaram a ter após a pesquisa e seminário.
Na aula seguinte passouse a atividade de Apropriação. Em grupos os
alunos escreveram pequenas encenações das peças de teatro sobre os
objetos estudados, foram escritas e montadas três pequenas encenações
sobre os brinquedos, o uso das moedas e com os materiais envolvendo a
educação.
No momento das encenações sobre os objetos estudados, um grupo
optou pelos brinquedos que apareceram no vídeo, de modo que para a
realização do teatro que envolveu esses brinquedos, precisouse retomar a
exposição realizada no ano de 2008, quando havia sido iniciado o trabalho de
coleta de objetos antigos, surgindo a oportunidade de realizarse uma interação
de disciplinas, na medida em que se aproveitou os brinquedos confeccionados
pelos alunos orientados pela professora de Artes.
Os educandos com ajuda dos pais estavam confeccionando brinquedos
antigos para que os pais relembrassem sua infância e para que seus filhos
aprendessem um pouco sobre as brincadeiras, diversões, e infância dos
23
mesmos.
Também foi organizado um teatro de fantoches intitulado “Como
Brincavam Meus Avôs”, onde os alunos fizeram uma pesquisa sobre
brinquedos e brincadeiras da época de avós. Na encenação, os fantoches
(alunos) conversavam com seus avôs sobre os brinquedos antigos,
questionandoos a respeito desses brinquedos: como eram adquiridos? De que
maneira brincavam? Como eram fabricados?
As crianças ficaram maravilhadas com o teatro, pois além de perceber as
diferenças do jeito de brincar, e se divertir de antigamente com o agora,
puderam brincar e experimentar sensações desconhecidas até então.
A outra encenação foi sobre o tema Educação com o título: “A Escola de
Meus Avôs”, onde os alunos representaram como era a escola no tempo de
seus avôs, enfatizando que naquela época não existiam cadernos e os que
tinham eram costurados a mão e usados somente para fazer avaliações.
Os alunos se utilizaram de folhas de cadernos e com o auxilio de seus
pais costuraram as mesmas. Depois levaram para a escola onde encenaram a
“educação brincando de escolinha”; alguns usavam os cadernos costurados,
outros os livros antigos e também a lousa, pequeno objeto do tamanho de uma
folha de papel pequena, onde se escrevia e após apagavase para que fosse
possível escrever novamente.
O teatro encenando a educação de seus avôs foi o mais admirado pelo
grupo, pois perceberam as dificuldades de se estudar quando não havia livros,
cadernos, canetas, lápis, e outros objetos que são tão familiares aos mesmos,
mas que antepassados não conheceram quando estudaram.
A terceira encenação foi feita por um grupo que optou pelas moedas
antigas, representando a peça “O Comércio”. Na encenação os pais pediram
aos filhos que fossem até o armazém comprar mantimentos para o uso
cotidiano, como alimentos e outros. Destacouse na apresentação o tempo em
24
que os produtos eram vendidos a granel, e, pesados na hora na presença do
freguês, em balanças muito diferentes das que conheciam. Também se usaram
da matemática fazendo contas do dinheiro que levaram, de quanto gastaram e
o que sobrou.
Depois das apresentações, pediuse aos alunos que escrevessem o que
aprenderam com as peças teatrais apresentadas, se gostaram e o que
pensavam a respeito dos objetos antigos que conheceram bem como a
maneira que vivia as pessoas que se utilizavam deles.
As respostas foram as mais diversas, porém percebeuse que todos
entenderam, e aprenderam o sentido e a importância de conhecer e preservar
os objetos antigos que pertenceram às suas famílias, bem como a necessidade
de preservar a cultura e o Patrimônio Cultural de um povo.
Da Educação Patrimonial, ressaltase que foi possível perceber através
dos relatos dos alunos, o valor que descobriram no ato de estudar História, e
que esta disciplina representa para os mesmos algo de grande significado, pois
é através da História que entendemos a vida.
A seguir transcrevese o relato do texto da aluna Kamile A. Freitas que
vem representar o que significou este estudo:
Antes eu achava que estudar História era a coisa mais chata que havia, e que todas as coisas velhas deveriam ser jogadas fora. Agora compreendo e amo estudar História. Conhecer objetos que eu nem imaginava que existiram foi muito importante, até pergunto para outras pessoas se eles tem objetos antigos, pois estou sempre curiosa em conhecer mais, pena que em nossa cidade não exista museu. Também falo para estas pessoas que a gente deve guardar estes bens que são muito valiosos, e que nunca devemos esquecer nossos costumes e valores. (Kamile A. Freitas).
Seguindose com a seqüência de atividades envolvendo o vídeo, chegou
se a atividade 05, na qual os educandos deveriam responder as seguintes
questões: “Será que o pesquisador da História/o historiador para escrever a
25
respeito dos temas que estudamos na disciplina de História faz estes
exercícios que fizemos? Como se escreve a História?
As respostas foram unânimes em responder que sim, e muito
responderam que os historiadores fazem, além disso, muito mais, porque eles
precisam ler, analisar, compreender, para realmente saber sobre os
acontecimentos passados.
Com relação à pergunta: “como se escreve a História?”, foram obtidas
respostas como: “com o uso dos documentos escritos, não escritos,
testemunhos orais, pesquisas e outros”.
Usandose o conteúdo do livro didático procurouse esclarecer um pouco
mais sobre esse assunto, enfatizando que os historiadores procuram descobrir
o que realmente aconteceu no passado e tentam explicar os motivos que
levaram a vida de homens e mulheres a mudar tantas vezes ao longo dos
séculos.
Os historiadores criam perguntas, indagações para eles mesmos tentaram
responder e assim compreender melhor o passado de uma comunidade,
sociedade e do mundo. Os historiadores precisam trabalhar como um detetive
que precisa através de testemunhos orais e materiais, recontarem uma cena da
qual ele não participou.
Em seu estudo, os historiadores utilizam diferentes tipos de documentos
(fontes históricas), que podem ser escritos, iconográficos, orais e materiais
entre outras. A análise das fontes históricas envolve além do historiador, o
trabalho de arqueólogos e paleontólogos.
Portanto a História está constantemente sendo reelaborada, pois sua
interpretação depende de quem a interpreta, das fontes consultadas e da forma
como a fonte é analisada.
Após análise e compreensão das fontes selecionados os profissionais da
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pesquisa discutem o significado dessas mudanças e permanências, bem como
suas relações com o modo de vida dos seres humanos atuais, não esquecendo
que as interpretações dos fatos históricos dependem da realidade na qual os
historiadores estão inseridos e de sua visão de mundo.
Para finalizar as atividades referentes ao vídeo didático, utilizouse
o texto: ”Trecho do Livro Política, século IV a.C.” de Aristóteles extraído do livro
didático: História Hoje, de Oldimar Pontes Cardoso, pg. 100.
No texto, Aristóteles fala da importância do planejamento na construção
das cidades gregas. Segundo ele, a cidade deve estar ligada ao interior, o mar
e todo seu território. Deve ser erguida num local onde seja protegida de ventos
e frio e que dificulte o ataque de inimigos e, antes de tudo, que tenha águas ou
cisternas para armazenálas.
Após a leitura do trecho indagouse aos alunos: “como você imagina que
alguém tenha escrito tal História?”
As respostas foram praticamente as mesmas da atividade 05: através
observações, de pesquisa, de fatos narrados e escritos, ainda segundo eles,
Aristóteles pesquisou sobre a cidade e fez análise dos lugares para saber
como ela deveria ser construída.
O objetivo dessa atividade era fazêlos perceber que o texto de Aristóteles
é um Documento, ou seja, uma fonte histórica, deixada por esse filósofo que
viveu em tempos passados e que é por meio desses documentos históricos
que o historiador aprende sobre o passado, produz um conhecimento histórico,
e escreve a História sobre um passado que ele investigou, pois uma fonte
histórica tornase um documento a partir do momento em que o historiador o
estuda.
Precisouse retomar constantemente com os alunos, como se dá a
produção do conhecimento; ou seja, como ele é produzido a partir do trabalho
de um pesquisador que tem como objeto de estudo, as ações e as relações
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humanas praticadas no tempo, bem como os sentidos que os sujeitos lhes
deram, de modo consciente ou não.
Para estudar as ações e relações humanas, o historiador adota um
método de pesquisa de forma que possa problematizar o passado e buscar,
por meio de documentos e perguntas, respostas às suas indagações. A partir
disso, o pesquisador produz uma narrativa histórica cujo desafio é contemplar a
diversidade das experiências políticas, econômicas, sociais e culturais.
Para a produção do conhecimento histórico, é essencial que os alunos
compreendam as diferentes interpretações de um mesmo acontecimento, a
necessidade de ampliar o universo de consultas para entender melhor os
diferentes contextos e a importância do trabalho do historiador e da produção
do conhecimento histórico para a compreensão do passado e as interferências
presentes e futuras.
Neste contexto, o projeto conseguiu realizar com êxito seu objetivo, na
medida em que tornou as aulas de História mais atrativas e conseguiu atrair a
atenção dos alunos, fazendoos compreender o significado de patrimônio
cultural, memória e História.
CONCLUSÃO
Para que os alunos fossem capazes de elaborar um conceito de História,
memória e patrimônio cultural trabalhouse durante alguns meses, construindo
um acervo documental, partindo da coleta de materiais diversos, feita pelos
educandos juntamente com a professora. Coletaramse além de objetos,
também testemunhos da História das famílias de Dois Vizinhos.
A seguir montouse uma exposição nos moldes de um museu itinerante
aberto à visitação e produziuse um vídeo que foi disponibilizado como material
didático para que educadores e outras turmas possam trabalhar com o mesmo.
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Os alunos envolveramse na pesquisa, bem como em todos os passos do
trabalho. O interesse deles foi visível e percebeuse que ao construírem este
material sentiramse realizados.
O trabalho foi fundamentado teoricamente em diversos historiadores o
que possibilitou a construção da relação entre a teoria e a prática.
Portanto, o objetivo do trabalho foi alcançado, proporcionando aos
educandos a apropriação dos conceitos tratados nesse artigo. O envolvimento
dos alunos contribuiu para que eles compreendessem a importância do ensino
da disciplina de História, valorizassem as memórias dos antepassados, bem
como seus objetos e a importância que estes tiveram na vida dessas pessoas,
conseqüentemente, proporcionando às crianças a valorização e o respeito pelo
patrimônio cultural, pela memória e pela História.
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