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MESA DE DEBATES DO IBDT DE 17/05/2018 Integrantes da Mesa: Dr. Ricardo Mariz de Oliveira Dr. Fernando Aurelio Zilveti Dr. Salvador Cândido Brandão Dr. Rodrigo Maito da Silveira Dra. Martha Toribio Leão Dr. Fernando Luis Bernardes de Oliveira Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Bom dia a todos. Estamos aqui para mais uma sessão e estamos recebendo uma saudação dos nossos companheiros da Atrial, de Alagoas. Devolvemos o cumprimento também e estamos sempre muito felizes nessa parceria com eles. Primeiro, Pequeno Expediente, Brandão, tem alguma comunicação? Ninguém tem comunicação? Eu só queria comunicar que o professor Schoueri não está presente hoje, infelizmente, porque teve convocação de pauta no Carf e hoje em dia, atualmente, no Carf é muito difícil de se conseguir adiamento ou retirada de pauta, se consegue, mas é difícil e nem sempre é recomendável. Então, a obrigação profissional fez com que ele estivesse ausente hoje. O professor João Bianco estará ausente também nessa semana e na próxima porque está em Portugal dando aula na Universidade do Minho, com a qual até o IBDT tem parceria. O Bianco está lá e não estará presente hoje e na próxima semana. Na próxima semana será a minha, meu dia de ir para a Carf, infelizmente, né? Então, não estarei aqui, mas os demais estarão. Queria também comunicar que nós colocamos na pauta, a pedido do associado Fernando Mariz Masagão, o tema que nós temos sempre... nunca Texto sem revisão dos participantes A presente transcrição apenas visa ampliar o acesso à Mesa de Debates. O INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO TRIBUTÁRIO não recomenda que a transcrição seja utilizada como fonte de referência bibliográfica, dada a natureza informal dos debates, a possível emissão de opiniões preliminares não conclusivas e a falta de revisão.

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MESA DE DEBATES DO IBDT DE 17/05/2018

Integrantes da Mesa:

Dr. Ricardo Mariz de Oliveira

Dr. Fernando Aurelio Zilveti

Dr. Salvador Cândido Brandão

Dr. Rodrigo Maito da Silveira

Dra. Martha Toribio Leão

Dr. Fernando Luis Bernardes de Oliveira

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Bom dia a todos. Estamos aqui para mais uma sessão e estamos recebendo uma saudação dos nossos companheiros da Atrial, de Alagoas. Devolvemos o cumprimento também e estamos sempre muito felizes nessa parceria com eles. Primeiro, Pequeno Expediente, Brandão, tem alguma comunicação? Ninguém tem comunicação? Eu só queria comunicar que o professor Schoueri não está presente hoje, infelizmente, porque teve convocação de pauta no Carf e hoje em dia, atualmente, no Carf é muito difícil de se conseguir adiamento ou retirada de pauta, se consegue, mas é difícil e nem sempre é recomendável. Então, a obrigação profissional fez com que ele estivesse ausente hoje. O professor João Bianco estará ausente também nessa semana e na próxima porque está em Portugal dando aula na Universidade do Minho, com a qual até o IBDT tem parceria. O Bianco está lá e não estará presente hoje e na próxima semana. Na próxima semana será a minha, meu dia de ir para a Carf, infelizmente, né? Então, não estarei aqui, mas os demais estarão. Queria também comunicar que nós colocamos na pauta, a pedido do associado Fernando Mariz Masagão, o tema que nós temos sempre... nunca

Texto sem revisão dos participantes

A presente transcrição apenas visa ampliar o acesso à Mesa de Debates.

O INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO TRIBUTÁRIO não recomenda que a transcrição seja utilizada como fonte de referência

bibliográfica, dada a natureza informal dos debates, a possível emissão de opiniões preliminares não conclusivas e a falta de revisão.

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enfrentado diretamente, mas ele está sempre presente nos nossos debates que é o positivismo. Na verdade, o assunto foi colocado a propósito de um artigo do professor Eros Grau que foi publicado quinta ou sexta-feira passada, dia 12 de maio, sábado. E quem não leu ainda vale a pena ler. A ideia desse debate, exatamente, enfim, a gente enfrentar mais diretamente a questão desses métodos de interpretação de conhecimento da lei. Como no dia 7 de junho, que estava marcado ali, o Schoueri não estará presente, o Schoueri estará fora do Brasil durante o mês de junho, nós vamos adiar isso aqui, porque acho que é um tema que precisa ser discutido com a presença da Mesa integral. Então, estamos adiando para o dia 2 de agosto, que é a primeira sessão de Mesa de Debates do segundo semestre. Estamos encerrando na semana que vem, com grande sucesso, o curso, mais uma vez, graças a Deus, o curso de atualização. Novamente tivemos excesso de inscrições em relação às vagas disponíveis. Em função disso, estamos estudando, inclusive, não se a parte técnica aqui pode nos ajudar, te pedir para dar uma olhadinha na possibilidade de fazer uma... não a distância, né, mas colocar um monitor da sala vizinha do auditório.

Orador não identificado: Estamos conversando isso.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Talvez a gente consiga superar esse problema de falta de espaço, que já existia quando dávamos aulas lá na faculdade, através de colocar os retardatários, na inscrição, numa sala ao lado, assistindo por vídeo, né? Vamos para um momento especial, com a presença da nossa querida Martha Toribio Leão, doutora em Direito e doutora de direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, que apresentou uma tese muito bonita, muito boa e oportuna também, cujo o título sintetizando é: o direito fundamental de economizar tributos. Foi orientado pelo professor Humberto Ávila e teve a banca composta por--

Sra. Martha Toribio Leão: Professor Tercio Sampaio Ferraz Junior, professor Luiz Eduardo Schoueri, professor Roque Antônio Carrazza, professor Ives Gandra da Silva Martins e a professora Misabel Derzi.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Foi aprovada?

Sra. Martha Toribio Leão: Fui.

[risos]

Sra. Martha Toribio Leão: É o que consta.

[risos]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Bom, só a composição da banca mostra o nível do trabalho e a aprovação, sem dúvida nenhuma, não foi protocolar, não. O livro está--

Sra. Martha Toribio Leão: A previsão é que sai em junho, no próximo mês, professor.

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Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Tá bom. Recomendo a todos. Não é uma propaganda comercial, mas, realmente, recomendo a todos que adquiram e leiam o livro. Ela fez a gentileza de me encaminhar o texto por e-mail e eu tive a felicidade de já poder tê-lo lido.

Sr. Salvador Cândido Brandão: [pronunciamento fora do microfone]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Hum?

Sr. Salvador Cândido Brandão: [pronunciamento fora do microfone]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: O quê?

Sr. Salvador Cândido Brandão: [pronunciamento fora do microfone]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Ainda não. Vamos esperar a publicação.

Sra. Martha Toribio Leão: Mas eu mandarei a todos.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Então, passo a palavra à Martha, nós vamos... que é nossa associada, né, importante isso. Nós vamos dar o tempo que ela quiser para fazer, obviamente, um resumo--

Sra. Martha Toribio Leão: Claro.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: São 300 páginas, aproximadamente, a tese. Muito densa, enfrenta vários aspectos, nós vamos dar o tempo que ela quiser, porque vale a pena e vamos reservar espaço para debates. O Fernando Zilveti assumirá a condição de debatedor.

[risos]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Com a palavra.

Sra. Martha Toribio Leão: Obrigada. Bom, primeiro, bom dia a todos, né? Eu queria primeiro fazer um agradecimento ao professor Ricardo Mariz de Oliveira, né? O IBDT tem sido muito importante na minha história, enfim, tem sempre aberto as portas do instituto para que eu apresentasse minhas pesquisas, tem sido sempre muito aberto ao livre debate de ideias, minhas pesquisas, muitas vezes, são um pouco polêmicas, né? Um pouco controversas, mas nunca tive as portas fechadas, muito pelo contrário. Então, essa não é a primeira vez, eu espero sempre que não seja a última, para que... eu sou convidada para falar um pouco sobre a minha pesquisa. Bom, hoje eu vou falar aqui, não vou tomar muito tempo, pretendo falar uns 30 minutos, fazer um resumo, enfim, claro, da minha tese de doutorado, como o professor Ricardo disse, eu defendi em outubro do ano passado. O título da tese é: o direito fundamental de economizar tributos. Então, claro, é um uma tese bastante controvérsia, do ponto de vista da doutrina e da jurisprudência tributária brasileira atuais, não é? Mas uma tese precisa ser controversa para ser uma tese. Então, acho que isso não é um nenhum problema. Claro, que existem muitos doutrinadores, muito

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mais importantes do que eu, que pensam exatamente o contrário e também acho que isso não é nenhum pouco problemático. Acho que, na verdade, o que eu gostaria de fazer é instigar o debate com relação a esses temas que me parecem muito necessários atualmente. Então, eu vou tentar, primeiro, fazer um contexto da doutrina e da jurisprudência hoje, né, hoje, enfim, atuais, para dizer qual foi o incômodo que me surgiu para me levar a essa pesquisa, depois falar um pouquinho sobre a tese a qual ela se contrapõe, né, a ideia de dever fundamental de pagar tributos e aí, depois, explicar alguns dos, vamos dizer assim, dos critérios, dos argumentos que eu utilizei na tese para chegar às minhas duas conclusão que são bastante distintas dessa ideia, talvez majoritária, na doutrina brasileira hoje. Bom, o contexto que me levou a essa pesquisa foi um contexto em que parte da doutrina brasileira, hoje, defende uma certa flexibilização da legalidade, tá? São vários os nomes que são dados a essa teoria, essa corrente, como deslegalização do direito tributário, legalidade líquida, legalidade do pós-moderno. O abandono da ideia de legalidade, para usar um termo como princípio da juridicidade, vários termos correlatos, todos eles querendo dizer, mais ou menos, a mesma coisa. A ideia de que o direito tributário precisaria abandonar aquela noção da legalidade estrita, de formalismo e se abrir mais fortemente à ideia de aplicação, na máxima medida possível, de determinados princípios como: solidariedade, igualdade, capacidade contributiva, todos eles abaixo da ideia maior de justiça fiscal. Ou seja, em nome da promoção de uma maior medida possível desses outros princípios, se clama, vamos dizer assim, um abandono ou pelo menos uma flexibilização desses critérios rígidos que seriam impostos por princípios egoístas, individuais, formais, como: segurança jurídica, legalidade e liberdade, tá? Há até uma contraposição, vamos dizer assim, entre dois tipos de tributaristas, entre o tributarista moderno, o tributarista que estaria alinhado, vamos dizer assim, com as ideias de justiça, com as ideias de solidariedade, com os direitos sociais propriamente ditos e o tributarista tradicional, né? O tributarista que estaria preso a esta legalidade rígida, que seria um formalista por natureza. Essa contraposição me incomodava bastante. Eu tenho um certo problema, vamos dizer assim, uma certa limitação com as premissas dessa teoria, mas nesse contexto de abertura a princípios, de ponderação no âmbito da interpretação dos dispositivos tributários e da aplicação das normas tributárias, o slogan, a ideia de dever fundamental de pagar tributos se ajustou com bastante perfeição, vamos dizer assim, né? Essa ideia que é uma tese, uma tese de doutorado escrita pelo professor José Casalta Nabais, um professor português da universidade Coimbra e, olhem que interessante, o doutorado do professor José Casalta Nabais não é em direito tributário é em ciência políticas, é. E a tese dele é uma tese dividida em duas partes bastante distintas, na primeira parte, a tese da do professor José Casalta Nabais fala da ideia de Estado fiscal. E como esse Estado fiscal deveria ser para ser justo, na concepção do professor José Casalta Nabais. Qual seria a política fiscal que deveria ser adotada em Portugal, com relação ao sistema tributário nacional, para que esse sistema fosse

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justo dentro da concepção do professor de justiça, claro? E nessa parte do trabalho ele desenvolve essa ideia de dever fundamental de pagar impostos, dentro de uma noção de que o contribuinte não teria direito de se escusar ao pagamento de tributos na máxima medida possível da sua capacidade econômica, porque isso seria essencial para a redistribuição das riquezas, para justa distribuição dos encargos. Só que olha que interessante, na segunda parte do trabalho do professor José Casalta Nabais, ele trata não desse sistema ideal que ele trata na primeira parte, mas sim, do sistema posto, né, na Constituição Portuguesa com relação ao sistema tributário nacional. E nessa segunda parte, ele trata, exatamente, de todas as limitações constitucionais ao poder de tributar que estão na Constituição Portuguesa. Ao ser importada para o Brasil, essa tese foi importada apenas na sua primeira parte, né, apenas nessa parte sobre uma concepção política fiscal de como o sistema deveria ser para ser justo. E o que é mais, assim, interessante, do ponto de vista da análise, assim, de fora do que aconteceu na doutrina brasileira, é que uma tese de política fiscal de como o sistema tributário português deveria ser para ser justo é importada para Brasil para definir não como o sistema brasileiro deveria ser para ser justo, mas para definir, supostamente, como o sistema tributário brasileiro é, né? Então, os saltos argumentativos que são feitos a partir daqui são saltos bem gritantes, tá? Eu passei um tempo com o professor José Casalta Nabais, já que eu queria criticar, de algum modo, a aplicação da tese dele, achei fundamental passar um tempo em Coimbra entendendo, né, enfim, qual seria a sua doutrina, qual seria suas ideias e se essas ideias podiam ou não ser transferidas, como foram, para a doutrina brasileira. E ele, realmente, tem muitas ideias de lege ferenda, muitas ideias de política fiscal de como ele acredita que o sistema português deveria ser. E ele fala sobre isso de forma muito aberta, né? O problema não é a tese do professor Casalta Nabais, o problema é a forma como essa tese foi importada, em partes, compartimentada e sem verificação de que isso sequer dizia respeito ao como o sistema português de fato era. E serve, hoje, para definir como o sistema brasileiro seria. Então, esse, vamos dizer assim, essa visão, né, enfim, a forma como essa tese foi trazida para o Brasil é muito paradigmática, de um corte que precisa ser feito e que me parece essencial quando se lê esse contexto da doutrina brasileira. Muitas vezes, essa doutrina não faz um corte que é fundamental, no sentido de que não faz um corte entre o direito posto, ou seja, a Constituição que temos hoje, tal como ela foi posta pelo constituinte em 88 e o sistema de como essa doutrina acha que o Constituição deveria ter sido posta para ser justa. Como a Constituição, que essa parte da doutrina entende que seria ideal é muito diferente dessa Constituição que foi posta, ao invés de criticar o direito posto, porque, para mim, isso é um papel da doutrina, criticar a Constituição, as escolhas constitucionais, as escolhas legislativas e dizer porque é que elas deveriam ser diferentes. Não tenho nenhum problema com relação a esse tipo de doutrina, não sou uma realista do ponto de vista da ciência do direito tributário brasileiro. Mas isso, de nenhum modo,

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me parece que permite que se ignore a Constituição tal como ela foi posta e se faça uma confusão entre esses dois âmbitos. Como a Constituição deveria dizer x para ser justa, então, ela diz x, né? É até difícil explicar esse tipo de argumentação, porque essa é a argumentação é tautológica, né? Ela contém na premissa e na conclusão a mesma coisa. Como ela diz x para ser justa, ela deveria dizer x então, ela diz sim, x, tá? Então, é esse contexto doutrinário que influenciou muito fortemente a jurisprudência brasileira e vem influenciando até esse momento, especialmente no âmbito administrativo, quando se trata de casos de planejamento tributário, mas também no âmbito do Supremo Tribunal Federal com uma série de flexibilizações com relação aos direitos e garantias fundamentais dos contribuintes, para usar só um exemplo a questão do sigilo de dados, por exemplo, né, sigilo de dados bancários, que foi mitigada, exatamente com base nesses slogan: ‘de dever fundamental de pagar imposto. Esse cenário, vamos dizer assim, é que me levou à ideia da pesquisa, que me levou a uma ideia de analisar de forma dogmática mesmo, se a Constituição Brasileira permitia esse espaço para esse tipo de doutrina, permitia esse espaço para esse tipo de corrente doutrinária, dessa ideia de flexibilização da legalidade e assim por diante. Eu queria ir atrás não de qual seria, vamos dizer assim, a concepção doutrinária acerca da Constituição, do que é que ela deveria dizer, mas sim, do que é que ela, de fato, disse e como devemos interpretar o que ela, de fato, disse. Esse contexto é que me levou à ideia da pesquisa. E ao olhar para a Constituição, eu fui bastante surpreendida com duas conclusões bastante distintas dessa corrente doutrinária. De um lado, uma conclusão de que sequer podemos falar em dever fundamental de pagar tributos no âmbito do sistema tributário brasileiro, na medida em que temos um sistema em que a própria Constituição define que esse dever só pode ser instituído por meio de lei, portanto, eu não tenho como decorrer diretamente do texto constitucional, uma obrigação de pagar tributos, porque o quê que a Constituição fez foi: definir materialidades, distribuir essas materialidades em forma de competências, ou seja, em forma de faculdades, né, que se exercidas devem, claro, obedecer um sistema de regras sobre o exercício desse poder tributário. Então, esse dever sequer pode ser chamado de fundamental, no sentido de que ele não decorre diretamente da Constituição, ele decorre da lei, portanto, é um dever legal de pagar tributos. E de outro lado, aí sim, bastante chocante para essa outra parte da doutrina, a ideia de que quando se analisa esse sistema que foi delimitado e marcada pelo regrismo pela Constituição de 88, ou seja, marcado por regras rígidas acerca de quais são as materialidades que podem ser utilizadas para a tributação e de como está tributação deve ser exercida, muitas vezes, com limites definidos também por meio de regras, o que se verifica é um espaço de atuação determinado no nível constitucional, no qual, se o contribuinte agir, ele não pode sofrer qualquer tipo de imposição tributária. E ao decorrer isso diretamente da Constituição, eu verifico a existência, então, de um direito fundamental de economizar, de agir com base na sua liberdade,

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de não sofrer nenhum tipo de imposição tributária fora dos limites rígidos definidos pelo texto constitucional. Eu conheço, vamos dizer assim, o caráter bastante polêmico disse, dessa afirmação, né? E eu conheço também, a jurisprudência brasileira, que não segue essa afirmação, né? Mas eu não acho que o fato da jurisprudência brasileira não seguir os direitos e as garantias tal como postas no sistema constitucional, nada dizem com relação a como esse sistema constitucional foi posto e como essas questões deveriam ser julgadas, tá? Então, queria falar de cinco argumentos, enfim, que eu usei ao longo da tese, enfim, que me levaram a essas duas conclusões. Claro, eu vou fazer um resumo bastante singelo das coisas que foram tratadas, mas eu acho que isso ajuda, também, a que vocês entendam qual foi o caminho que a tese seguiu e isso ajuda, claro, ao debate posteriormente. Primeiro lugar, essa ideia de flexibilização da legalidade, de abertura do direito tributário à princípios, né, princípios bastante específicos: solidariedade, capacidade contributiva e igualdade, é uma ideia de que se deveria haver ponderação de princípios ao se interpretar os dispositivos tributários e ao se resolver os casos, especialmente os casos de difíceis de direito tributário. Essa ideia parte de uma premissa de que todos esses princípios, né, que são colocados em duas caixinhas distintas, né, a caixinha dos princípios egoístas, individuais: legalidade, segurança jurídica e liberdade e a caixinha dos princípios sociais, dos princípios coletivos: solidariedade, igualdade e capacidade contributiva e que isso deveria ser colocado numa balança cada vez que se julga um caso de direito tributário. Essa ideia, ela parte de uma premissa de que todos esses princípios são iguais ou pelo menos exerceriam a mesma função no sistema tributário nacional e, nesse sentido, poderiam ser comparados e afastados, quando, supostamente, entrassem conflito que seriam exatamente nesses casos de planejamento tributário. Essa premissa não se sustenta quando se analisa o sistema tributário nacional, tá? A Constituição determinou qual que era a função de cada um desses princípio e essas funções não são comensuráveis no sentido de que não são as mesmas, não podem ser comparadas e não podem, portanto, sequer entrar em conflito para serem afastadas no caso concreto, tá? O princípio da legalidade é um princípio instrumental da Constituição Brasileiro para fins de direito tributário. Isso significa que é apenas por meio de lei e tão somente por meio de lei que os tributos podem ser instituídos. Esses outros princípios que estão aqui, né, esses princípios: solidariedade, igualdade, capacidade contributiva são princípios que marcam o conteúdo da tributação, mas não definem a existência ou não da tributação. O que define a instituição do tributo é a lei e, portanto, esses outros princípios se subordinam à legalidade, nesse sentido instrumental. Essa, vamos dizer assim, é de pronto a primeira questão que precisa ser enfrentada por quem defende essa ideia de ponderação, de flexibilização da legalidade, na medida em que eu tenho uma regra bem clara no sentido de que eu só posso instituir tributos com lei que o estabeleça. A segunda questão é a segunda de se a igualdade serviria como justificativa para retirar, vamos dizer assim, diretamente dela a

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ideia de que eu poderia flexibilizar a legalidade, ou seja, estender, vamos dizer assim, a interpretação a ser conferida no dispositivo tributária, para permitir que pessoas diferentes, mas com capacidades econômicas supostamente parecidas para aquele critério relevante, fossem tributadas da mesma maneira. Essa ideia, ela parte pelo menos de duas premissas equivocadas. Primeiro, a ideia de que a igualdade que é uma garantia, um direito fundamental dos contribuintes no sistema tributário nacional, posto pela Constituição, serviria também ao Estado para justificar a tributação e aí, para usar duas analogias que me parecem muito felizes, uma analogia da professora Misabel Derzi, no sentido de que as garantias fundamentais dos contribuintes são uma via de mão única e não de mão dupla ou uma analogia do professor Humberto Ávila, no sentido de que fazem um escudo do contribuinte e não uma espada na mão do fisco. Isso significa que a igualdade não pode ser usada pelo Estado para justificar a tributação. Gente, até porque, a igualdade que consta no sistema tributário nacional, é uma igualdade legalidade, né? Legalidade isônoma, para usar uma expressão do professor Souto Maior Borges, na ideia de que eu não teria como dividir igualdade e legalidade, porque a igualdade só existe no sistema tributário nacional por meia da lei, dentro da lei. Porque é a lei que vai permitir que todos aqueles tributos, que todos aqueles contribuintes na mesma situação, considerando aquelas características relevantes, sejam tratados exatamente da mesma forma, tá? Então, uma segunda premissa equivocada dessa ideia de que a igualdade serviria para justificar a tributação nesses casos está no fato de olhar a igualdade simplesmente do posto da justiça individual, da justiça do caso concreto, da justiça que vai olhar para as especificidades do caso e dizer aqui é injusto que você não pague, aqui é justo que você pague. Como se decisões arbitrárias, decisões, ad hoc, fossem causar maior justiça geral do que uma igualdade definida por meio de lei, que vai assegurar a todos o mesmo tratamento, tá? Terceiro argumento, a ideia de que solidariedade serviria, vamos dizer assim, para decorrer diretamente uma obrigação tributária ou a menos serviria para flexibilizar a legalidade, parte de um discurso muito motivo emotivo, né? Eu até uso no trabalho uma expressão do Jeremy Waldron feel-good words” quem é contra a solidariedade, né? Quem, em abstrato, é contra a ideia de realizar a justiça fiscal, né? Ninguém é contra essa ideia. Então, esse discurso, ele é carregado de uma conotação bastante emotiva, né, que leva, vamos dizer assim, o interlocutor a, de plano, já concordar com aquelas questões, porque quem vai ser contra a essas questões? Ninguém é contra a solidariedade. A grande questão é que o modo como a solidariedade é aplicada, nesse contexto da doutrina e da jurisprudência brasileira, parte de uma premissa de que a única forma de promover solidariedade é por meia da tributação. Ou seja, eu só poderia promover solidariedade, eu só promoveria solidariedade no seu máximo grau, a partir do momento que eu permitisse a retirar a máxima capacidade econômica de cada contribuinte, tá? Quando se olha para a sistema, tal como posto, no entanto, novamente, a gente não encontra referibilidade com relação a essa premissa no sistema

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tributário brasileiro, né? A solidariedade, ela é, sim, cumprida também por meio da tributação, mas a própria Constituição reconhece que isso, de forma nenhuma, esgota a promoção da solidariedade. Ela é um dos meios, mas não o único meio. Tanto é assim, que não existe uma norma constitucional dizendo que a solidariedade, que o tributo vai ser cobrado, por meio, em razão da solidariedade e sim, por meio, em razão da lei, né? A solidariedade, inclusive, é reconhecida na Constituição como casos em que a não tributação é que vai promover a solidariedade. Um exemplo clássico é a imunidade de entidades beneficentes. O sistema tributário, tal como posto na Constituição, reconhecendo, nesse caso, que a não tributação, ou seja, que a permanência desse dinheiro na iniciativa privada que melhor vai promover a solidariedade naquele caso. Gente, essa ideia de que eu preciso tirar a máxima capacidade econômica dos contribuintes e que essa é a única forma do promover a solidariedade depende de uma relação unívoca que não se verifica na prática. A manutenção de dinheiro na iniciativa privada também é capaz de promover a solidariedade, a geração de empregos, o aumento dos investimentos e assim por diante. Então, não existe essa premissa necessária entre tributação e solidariedade e só tributação e só solidariedade, tá? Então, essa ideia está por traz de quase todas as decisões que constam sobre planejamento tributário, uma ideia de que eu preciso atingir aquela capacidade econômica porque essa é a única forma de preservar a eficácia do princípio da solidariedade, ou seja, como se a única forma de promover a solidariedade fosse por meio da tributação. Quarta questão. Essa ideia de colocar em dois potinhos distintos, vamos dizer assim, esses princípios, de um lado egoístas e esses outros de um lado sociais, traz de volta aquela ideia de prevalência do que seria o interesse público sobre o suposto interesse privado. Mas o que é muito interessante é que para usar esse argumento eu preciso, de algum modo, confirmar que segurança jurídica, legalidade e liberdade são questões de interesse privado e não de interesse público. Eu, realmente, tenho uma certa dificuldade de construir essa premissa quando eu olho para a Constituição Brasileira. Gente, a ideia de que legalidade, segurança jurídica e liberdade são princípios meramente individuais, que não são importantes para ideia de Estado de direito em si, realmente, traz uma nova concepção de Estado de direito, a meu ver, né? E não encontra qualquer tipo de referibilidade, de novo, no sistema tributário constitucional tal como posto, tá? Tanto é assim, que esses princípios são, inclusive, considerados irrenunciáveis por parte do contribuinte, né? Quem trata de parcelamentos, das discussões de parcelamento tributário sabe, se existe exatamente a discussão se o contribuinte poderia renunciar a ideia de legalidade tributária quando adere àquelas condições para ingressar no programa do parcelamento. Porquê, gente? Porque a legalidade, ela é tão importante, tão maior que um indivíduo, ela se relaciona tão fortemente com os direitos fundamentais de todos, com a ideia de Estado de direito, que ela sequer pode ser objeto de renúncia. Então, analisar esses princípios simplesmente da ótica individual, desconsidera tanto a sua concepção objetiva no sistema

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tributário, no sistema de Estado de direito, acima do direito tributário também e, também, a ideia de que esses princípios servem a todos os contribuintes e não a um deles, né, num caso individual. A partir do momento que eu flexibilizo esse princípio para um contribuinte, eu estou flexibilizando e tornando esse princípio mais fraco para todos os outros. Então, não me parece que se possa fazer essa divisão e se possa dizer, a priori, que esses outros princípios tenham uma função mais transcendente, do ponto de vista do individual, que esses que estão aqui. Não encontro argumentos no sistema constitucional que, vamos dizer assim, corroborem essa posição. Então, por fim, quando se olha para o sistema tributário tal como ele foi posto pelo constituinte em 88, o que eu vejo é um sistema marcado pela previsibilidade, um sistema, e tem um texto do professor Ricardo que ele diz exatamente, um sistema em si, formal. Não é a doutrina tributária que é formalista, é o sistema tributário posto pelo constituinte de 88 que é formalista. E cabe à doutrina criticar esse sistema, se não concorda, se, como o professor Schoueri acredita, que esse sistema gera um engessamento que causa muitas dificuldades ao sistema tributário nacional, é uma crítica válida, mas essa crítica não, vamos dizer assim, me leva a conclusão de que eu posso ignorar o sistema, tal como ele foi posto, né? Eu posso criticar esse sistema, mas eu preciso reconhecer nele a forma como ele foi colocado. Existe dois constitucionalistas americanos que eu gosto muito, Laurence Tribe e Michael Dorf que eles dizem que muitos constitucionalistas olham para a Constituição como uma bola de cristal em que vêm o futuro que eles gostariam que existisse e passar, ao invés de interpretar a Constituição, a reescrevê-la, né? Não me parece que isso possa ser feito. Então, quando eu olho para esse sistema marcado por normas de competência rígidas, que trazem materialidades dos tributos que podem ser cobrados e normas com relação ao exercício desse poder tributário, ou seja, limitações ao exercício, ao modo como esse poder tributário vai ser exercido, eu vejo um sistema marcado pela previsibilidade e um sistema do qual o contribuinte tem uma expectativa de, atuando dentro desses limites, não sofrer qualquer tipo de imposição tributária. E ao reconhecer esse espaço, eu conheço a reconstrução de um direito fundamental de economizar tributos, ou seja, da manutenção de uma ideia de liberdade, de preservação do seu patrimônio, desde que, claro, atuando dentro da lei e que há um direito, sim, de optar pela via menos tributada, não há nenhum problema com relação a isso, em si. E aí, ao tomar essa conclusão com relação ao sistema tributário constitucional, tal como ele foi posto, eu parti desse direito fundamental e passei a analisar a legislação brasileira. Porquê, gente? A partir do momento que eu tenho um direito fundamental de economizar tributos, eu tenho uma vedação de que o Poder Legislativo estabeleça como ilegal aquilo que é um direito fundamental, né? Ou seja, tratar como ilegal, de algum modo, numa legislação anti-abuso ou num dever de prestar declarações, né, como foi nossa última tentativa, o simples fato de escolher uma determinada operação porque ela é uma operação menos tributária... menos tributada, né, desculpa, simplesmente porque ela tem uma carga tributária menor, não é um

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ilícito, é o exercício de um direito fundamental. Então, qualquer tipo de legislação no Brasil que causar, vamos dizer assim, que trouxer essa ideia de que essa opção seria ilícita, será uma legislação inconstitucional, porque será uma legislação que irá contra, exatamente, a um direito que foi assegurado pela Constituição. Gente, isso é muito relevante, porque por exemplo, eu passei um tempo na Alemanha estudando com o professor Wolfgang Sschön, um professor do Instituto Max Planck de Munique e ele tem um texto em que ele defende o direito de economizar tributos, mas ele diz expressamente que, na Alemanha, esse direito não é fundamental, esse direito, na Alemanha, é um direito legal, ou seja, o próprio Poder Legislativo pode causar restrições a esse direito, pode alterar esse direito quando considerar necessário, pode fazer essa ponderação. No sistema tributário brasileiro, contudo, ao estabelecer que esse direito é fundamental, porque esses mesmos princípios que o professor Wolfgang Sschön tira do código tributário alemão para criar esse direito, para reconhecer esse direito, no nosso caso estão em cima, estão na Constituição e, portanto, esse direito decorre diretamente da Constituição, eu tiro da competência do Poder Legislativo a escolha por fazer uma ponderação com relação a esse direito, a escolha por limitar esse direito. Foi a própria Constituição que definiu isso. Então, isso não está mais no papel, vamos dizer assim, do Poder Legislativo. Gente, claro que isso pode ser objeto de crítica, né? Eu não tenho nenhum problema com a doutrina que se diz muito insatisfeita com essa escolha constitucional, com sistema rígido, com esse sistema engessado, com esse sistema que não permite atualização, que não vai permitir que eu vá tributar como mercadoria o que eu comprei na nuvem e assim por diante. No entanto, não me parece que daí, da crítica com relação à escolha que foi feita pelo constituinte de 88, eu posso retirar uma conclusão de que eu posso afastar o sistema tal como posto e ignorar... ele, nas suas especificidades, né? A última parte do trabalho analisa a jurisprudência brasileira e reconhece que, de fato, a jurisprudência não reconhece essas garantias fundamentais do contribuinte. Há um descompasso muito grande entre o sistema de garantias que foi colocado pela Constituição de 88 e a concreção, vamos dizer assim, a aplicação dessas garantias no caso concreto. O Brasil vive, realmente, um paradoxo, em que pese, tem um sistema mais protetivo, do ponto de vista constitucional, do seu contribuinte, na prática não vê essas garantias aplicadas, especialmente pelos seus julgadores administrativos e também, né, pelo Supremo Tribunal Federal que vem flexibilizando essas garantias em nome de princípios como a solidariedade. Para usar só uma decisão bastante recente que me causou bastante perplexidade, do Supremo Tribunal Federal, eu ao sei se todos conhecem, mas em dezembro, agora, a ministra Carmen Lúcia, julgando uma liminar, enfim, afastou, na verdade, julgando recursos extraordinário sobre uma liminar que havia sido concedida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro com relação ao aumento de IPTU no município do Rio de Janeiro. Essa lei que alterou o IPTU no Rio de Janeiro trouxe aumentos de até 1000% com relação ao tributo a ser

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pago, portanto, numa arguição de inconstitucionalidade, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro deu, concedeu a tutela provisória para cessar a eficácia dessa lei até o julgamento final do Tribunal de Justiça, com relação à inconstitucionalidade por violação ao confisco, tá? E num recurso, a ministra Carmen Lúcia diz o seguinte em sua fundamentação para afastar a suspensão, a tutela provisória e determinar que a lei deveria ser aplicada de qualquer modo. “Se eu não manter essa lei os hospitais do Rio de Janeiro não vão poder atender doentes, os hospitais do Rio de Janeiro vão quebrar”. Como eu posso, então, fazer uma análise sobre a legalidade, inconstitucionalidade dessa lei, se do outro lado eu tenho hospitais quebrando, doentes né? Então, isso pode parecer que não tem nada a ver com o tema da minha tese, mas, na verdade, tem tudo a ver, né? A partir do momento que a gente começa a flexibilizar a análise de legalidade e de constitucionalidade que é a análise que os juízes deveriam estar fazendo quando olham questões de direito tributar, para se verificar se isso não vai trazer prejuízos, entre aspas, à arrecadação e se esse prejuízo não vai levar a algum tipo de problema... E olhem como é automático, né? A única forma de receita do estado do Rio de Janeiro é com um IPTU inconstitucional, né? Então, a partir do momento que eu começo a fazer essas flexibilizações, eu entro, me parece, num caminho muito perigoso, né? Num caminho, realmente, em que eu não faço mais controle de legalidade ou controle de inconstitucionalidade, mas controle de justiça, considerando a minha percepção de justiça, considerando a minha percepção de moral, de como o sistema deveria ser para ser justo. O trabalho tenta, então, buscar qual é a concepção de justiça da Constituição, né? Não a minha, não a de qualquer outra doutrina, mas sim, aquela que foi posta pelo sistema constitucional brasileiro em 88 e que me parece, deveria ser respeitada. Eu agradeço, enfim, imagino que vão vir muitas questões para o debate e acho que a intenção de uma tese é exatamente essa, sempre. Obrigada.

[aplausos]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Muito obrigado, Martha, sua exposição foi sucinta e claríssima. Eu tenho a impressão que cobriu todos os... todas as vertentes do seu longo trabalho, não é? É claro que haverá muito debate, muita indagação. Eu queria, antes de passar a palavra adiante, dizer aos colegas lá de Alagoas, da Atrial, Gustavo e demais colegas, se quiserem mandar alguma consideração, alguma pergunta, por favor, nos encaminhe. Eu... só um comentário preliminar, não é nem opinião, mas é um comentário, ninguém nessa sala e ninguém nesse país discute que os tributos estão sujeitos ao princípio da legalidade, né? A legalidade é o básico, né? Sem a legalidade não haveria nem o direito tributário, não haveria as limitações ao poder de tributar, enfim. A legalidade está na base do direito tributário, ninguém discute isso. É curioso também, quando se verifica manifestações na jurisprudência administrativa, afirmações de que há o direito de economizar tributo, de que ninguém é obrigado a escolher o caminho mais... mais oneroso sob o ponto de vista tributário. Ninguém tem a

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coragem, na verdade, de dizer uma teratologia desta, afirma-se isso. Mas a conclusão é contrária a esta afirmação, geralmente acontece exatamente o que citou aí. Então, é curioso, né, você tem um princípio da legalidade, todos os... ninguém discute, ninguém vai afirmar que pode ser cobrado impostos sem lei, mas, no entanto, esta entidade legalidade fica sujeita a interpretações subjetivas, variáveis. Claro, não são opiniões ou palpites, são estudadas e são fundamentadas, mas estão contraditórias. Então, acho que realmente o tema está passando por um momento complicadíssimo, né? Eu não gosto de falar sobre legalidade estrita, legalidade absoluta, tipo cerrado, eu não gosto, acho legalidade é legalidade, legalidade é legalidade. Todos nós aqui aprendemos logo no começo dos nossos cursos de direito, a norma tem uma hipótese, tem uma consequência, é isso que é a legalidade, em todos os ramos e no direito tributário e como no penal ele adquire uma importância fundamental. O que está sendo desafiado hoje, acredito que por situações como essas dos hospitais do Rio de Janeiro, né? Até que ponto você pode dizer que isto continua legal, ainda que seja contrário ao que esteja previsto na norma, uma interpretação minimamente razoável ou até onde não existe uma norma, né? Como na questão do direito à economia do tributo, não existe uma norma que diga não pode economizar. Não existe uma norma geral antielisão no Brasil, então, nós num terreno das opiniões pessoais sobre cada caso. Nós tivemos, alguns anos atrás, aqui, e foi na faculdade de direito, um evento realizado pelo IBDT em que estava presente uma das mais reconhecidas conselheiras do antigo conselho de contribuinte. E desafiada sobre essa questão, ela disse assim, não, muitas vezes a gente sente, ela teve a honestidade de comentar publicamente, a gente sente que é injusto, a gente sente que não pode ser daquele jeito, que tem um abuso. Então, arrumamos uma explicação e a explicação, muitas vezes, é a falta de uma razão econômica não tributária que é, como disse o Marcos Neder algum tempo atrás, é música no ouvido do fisco, porque depende de você achar que não tem razão econômica. Nós debatemos isso no nosso processo, são apresentadas razões substanciais. Eu não digo aquelas desculpas esfarrapadas, mas razões que realmente motivaram decisões administrativas e o tribunal disse que não, não teve modificação econômica, só foi feito para economizar tributo. Bom, ainda que fosse, né, ainda que fosse, onde é que está a norma que proíbe a escolha deste caminho? Bom, eu queria só fazer esse comentário de que todos estão de acordo que existe um princípio na legalidade, a discussão é: o quê que é esse princípio da legalidade, né? Então, eu coloco o assunto em debate, as perguntas podem ser feitas, as opiniões contrárias também. O Fernando fará a primeira intervenção.

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Muito bom. Bom, eu sou meio suspeito para começar a debater essa tese pela forma como eu entendo ser a tese da Martha tão instigante, né? Então, eu também sou suspeito porque eu gosto muito do trabalho, desde que ela começou a fazer aí seus escritos, seus artigos, a sua dissertação de mestrado, que eu também fiz uma resenha e quando eu soube da tese eu fiquei muito animado

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com a tese, gostei muito da ideia, né, a gente até comentou aqui e depois eu, por algum motivo profissional, eu perdi a defesa da tese e fiquei assim, chateado, porque vi que foi uma polêmica também na defesa e eu quis ler. E a leitura, claro, me deu muita satisfação. Eu até falei aqui na semana passada, eu adorei a tese dela. Por que é que eu gostei muito da tese? Porque ela tem o que gente sempre procura nas teses e muitas vezes não encontra. Então, isso é uma crítica que eu sempre faço nas bancas que eu participo e até nas que eu não participo, não tem tese nenhuma, né? E nessa... nesse trabalho da Martha, muito cuidadoso, muito bem escrito, com uma força argumentativa própria da Martha, eu fiquei contente de ler, eu fiquei contente de ler, fiquei muito contente de ler. E, claro, aqui me cabe não ficar adulando a Martha, mas promovendo o debate. E a tese da Martha eu posso dividir em três pedaços, tá Martha? Para a gente tentar encarar esse debate. O primeiro pedaço da tese é em busca de uma tese sobre a liberdade. O primeiro um terço da tese da Martha, ela está procurando, o que é muito na tese, tentando catar, tentando achar uma tese para chamar de sua, né? E a segunda parte da tese, que eu acho muito bacana, é a tese que ela destrói a tese do Casalta Nabais, que a gente já falou muito aqui, então, nem vou perder muito tempo sobre isso, porque não sei se existe um debate aqui, mas eu não tenho muito o que debater nesse assunto. E o terceiro pedaço da tese é praticamente uma aplicação do primeiro pedaço da tese no ataque à interpretação, principalmente dos tribunais administrativos e, claro, também, sobre o planejamento tributário, tem um longo pedaço de planejamento tributário que eu acho muito importante. O primeiro pedaço da tese, que é onde eu vou concentrar minha atenção, foi o que me chamou mais a atenção, primeiro porque há uma pegada pouco usual nas teses, ela sai já batendo, né? Então, ela já começa a tese batendo em posicionamentos que ela entende equivocados, tanto da Justiça comum quanto dos tribunais administrativos. É aqui o primeiro ponto que me chamou atenção. Quando ela coloca os dois assuntos no mesmo balaio, a gente precisa, realmente, ponderar, porque são coisas diferentes. Eu entendo que a crítica que ela faz, inclusive, à decisão polêmica do ministro Fux sobre a questão do seguro saúde, é justamente um gancho para ela falar sobre o que ela está tentando chamar de liberdade de economizar tributos. Mas quando ela fala da justiça administrativa, eu já acho que é impróprio, porque a justiça administrativa, os nossos tribunais administrativos não aplicam o direito, eles são um braço do Poder Executivo e que querem se chamar de tribunal e querem ser chamados de jurisprudência administrativa, quando, na verdade, eles fazem uma revisão de impostos. E ao fazer uma revisão de impostos, eles aplicam teorias que são próprias dos tribunais e que não seriam sequer admissíveis se a gente levasse a sério a justiça administrativa. Então, aqui, eu acho que há um certo desequilíbrio na pegada do que seria liberdade, porque eu acho que aqui, a gente teria que atacar o problema da justiça administrativa como um tribunal que pratica ilegalidades, né? Então, é outra conversa. Então, agora, no que diz respeito a essa polarização que a Martha já disse, a gente está falando talvez de

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formalismo, progressismo, aqueles adjetivos que são muito chatos, né, conservadorismo, então... se a gente usa gravata do IBDT, a gente pode ser chamado de conservador, né, formalista, né? Então, aí começa uma polarização que é sempre ingrata, mas também é comum nas teses, também é comum na discussão científica, porque o ser humano trabalha pelo sistema binário, né, certo, errado, justo e injusto, então, não tem muito o que fazer. Mas essa polêmica aqui, que é a polêmica que eu vejo que está bem clara na tese da Martha é nossa discussão sobre direito formal e direito material. Então, ela assume de cara que ela é torcedora do direito formal. E aí, ela constrói toda uma teoria para sustentar, assim, ela se alicerça no direito formal e diz, daqui ninguém me tira, aqui vai ser difícil. E eu vou procurar no curso das minhas... do primeiro terço de tese, me firmar nesta questão do direito formal, para, então, identificar no direito formal a liberdade. Então, isso eu achei muito interessante e aí, eu vejo coerência nessa posição da Martha, em que pese, eu, claramente, defender o contrário, né? Então, isso não precisa nem falar que a minha defesa é totalmente diferente, até pelo o que eu escrevi, pelo o que eu defendo, mas são duas posições absolutamente científicas, uma formal, uma material. O que é uma nova indagação da minha parte é que nós temos uma Constituição feita em 88, que completa 30 anos em 5 de outubro, é que supostamente era para ser formal. Isso é um detalhe que os jusconstitucionalistas não aceitam, né? Porque eles dizem, não, o que está na Constituição vale. E aí, tem a força argumentativa da Martha que é impressionante. Ela fala: aqui é Constituição, não tem Legislativo. Fora Legislativo, fora Judiciário. Você tem que cumprir o que a Constituição tem. Essa força argumentativa, por um lado, pode até convencer, você fica até: Nossa senhora, de onde veio isso aqui? Que tiro foi esse? Certo? Então, é muito forte isso, porque você pensa que assim, então, vamos lá, então, direito tributário igual a direito constitucional. Quando a gente viu isso, eu estou lembrado até do Brandão Machado e os Anais da Assembleia Constituinte. A gente analisava a constituinte tal como ela foi feita, isso em 86, 87 e falava assim, não tem espaço para criação de novos tributos porque todos os tributos estão aí. Não tem espaço para novas competências porque todas as competências estão aí. Então, não tem o que fazer em matéria de direito tributário. Há pouco espaço. Então, a ideia de Constituição Brasileira foi, realmente, de uma Constituição rígida e a Martha fala isso, ela faz essa explicação, por quê que é que a Constituição Brasileira é diferente da Alemã. Ela recorre ao direito alemão para justificar. Olha, nossa Constituição é rígida, a Constituição alemã não é rígida. E esse é um recurso de retórica que não necessariamente corresponde à realidade. Essa é a primeira provocação que eu faço para a Martha. Ao fazer desta forma, ela, inclusive, sai... assim, esse é um desafio que a gente espera de uma tese, ela sai propondo, dizendo: olha, inclusive devia ter uma lei limitando poder a interpretar, devia ter uma restrição, né, está nas minhas fichas aí uma certa... ponto da tese da Martha devia ter uma lei para falar: escuta, juiz, alto lá, você tem que interpretar só de acordo com que a lei manda. Então, aí fica uma coisa bem interessante. Então, o juiz não poderia

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interpretar por esta força do argumento. E aí, para avançar, ela vai trabalhando com a liberdade e se depara, novamente, com a doutrina alemã. Porque querendo ou não querendo, ela não pode deixar a Alemanha porque a Alemanha está nela, né? A Alemanha está em Martha, né? Porque ela estudou direito alemão. Então, quando ela vai para Alemanha de novo aí aparece o Kirchhof. O Kirchhof que tratou sobre liberdade em diversos trabalhos, alguns até traduzidos, até por nosso Pedro Adamy, nosso querido Pedro Adamy, que vai ter um artigo publicado, até revelar isso... publicar, vai sair, vamos liberar amanhã a Revista de Direito Tributário Atual 39, então, vai ter um artigo do Pedro Adamy nessa revista. Ele traduziu o livro do Kirchhof e o Kirchhof fala sobre liberdade. Só que aí, o Tipke dá um ‘cascudo’ nele, né, e a Martha coloca isso. Só que a Martha, habilmente, ela continua, certo? Ela, quando viu que o Tipke deu um cascudo no Kirchhof, ela falou, opa, deixa eu pular essa parte. Ou seja, ela não omitiu, ela trouxe esse fato e aí, ela passa a trabalhar com o direito alemão que lhe convém, que é justamente o que vai dar força argumentativa para a tese dela. Por que o que é que fez o Tipke, o Tipke falou: escuta, Kirchhof, fica tranquilo aqui, você é um grande constitucionalista, um grande tributarista, inclusive, juiz da corte constitucional alemã. Porém, quando você fala em liberdade, você tem que lembrar o seguinte: o sistema tributário é baseado na igualdade, o centro do sistema tributário alemão é da igualdade. E na igualdade, a liberdade encontra alguma dificuldade de operar. E aí, precisava avançar neste assunto, né? Essa uma provocação que eu faço para a Martha, porque isso tem a relação com o Brasil, só que nesta relação com o Brasil a Martha puxou a sardinha para a lado dela, ou a brasa para a sardinha dela, como vocês preferirem. Ela trouxe, então, a ideia assim, bom eu tenho que tratar de liberdade. Liberdade, no sistema brasileiro, não está tão clara, eu tenho que puxar para a legalidade e ela puxa para a legalidade e aí, ela volta para todo o positivismo clássico brasileiro, clássico, eu não estou dizendo nem se é bom ou ruim, é um positivismo clássico, é um positivismo que eu particularmente gosto e que tem grandes expoentes como o Alberto Xavier. Ela se apoia neste positivismo clássico para dizer assim, o positivismo é sinônimo de liberdade, não há liberdade sem positivismo. E aí, a gente passa para alguns truísmos que a gente precisa tomar cuidado, porque é como se do lado do direito material não existisse legalidade, o que não é verdade. Como se a Constituição brasileira também não desse espaço para aplicação do direito material e não tivesse a cláusula sobre capacidade contributiva na Constituição brasileira. É outra provocação que eu faço para a Martha. Então, veja, quando ela trabalha nisso, ela vai procurando falar de liberdade, legalidade, liberdade legalidade e aí, ela acha um alemão que vai falar sobre liberdade, legalidade e propriedade, porque na Alemanha e ela cita a doutrina corretamente, se desenvolveu essa teoria da liberdade, legalidade e propriedade, porém, para os tributos sobre patrimônio. Ela identifica isso, ela traz esta questão e traz para dizer assim: olha, nós temos uma legalidade relacionada a propriedade, então, a propriedade estaria como um direito fundamental, justificando a liberdade agora

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associada à propriedade. Veja bem, então, aqui, temos uma reestruturação dos direitos fundamentais, veja, ela está procurando direitos fundamentais, encontra o direito fundamental propriedade e o associa a liberdade. Sem a propriedade nós não temos liberdade, sem a legalidade nós não temos liberdade. E com base nisso, ela passa a procurar isso na Constituição Brasileira e, claro, encontra. A liberdade de empresa, né, o direito fundamental de propriedade, para então, dizer assim, olha, nós temos uma restrição total a algo que saia da legalidade, está tudo bem, mas não conseguiu justificar por que é que estão, a Constituição afasta a atividade do Legislativo. Por que é que ela limita tanto o Legislativo? Por que é que o Legislativo não tem tanta liberdade de atuação como tem na Alemanha? E volta a questão dos dois sistemas serem diferentes, o que eu, obviamente, concordo que são sistemas diferentes, mas eles não são, por serem diferentes, com institutos totalmente diversos. Os sistemas até funcionam de forma parecida. O que eu volto a provocar aqui o debate é, neste momento, a Martha vai além, como tem que ser, ela diz: a propriedade serve de dois modos, estou falando de cabeça, talvez eu me engane, mas, de dois modos: um deles é para promover a limitação ao confisco, tributo com efeito de confisco vem, por princípio da propriedade, né, da propriedade privada e dizer: opa, aqui não. Então, esse primeiro serviço. E o outro que aí me chamou a atenção e aí eu desafio a Martha dentro de um debate, obviamente, muito respeitoso e próprio desta Casa, como você sai desta segunda provocação que você mesmo fez? A propriedade servindo para promover a própria propriedade. Então, eu queria entender o que é que foi isso, certo? Como o direito fundamental à propriedade vai promover aí por, assim, a de lege ferenda, a gente estava falando de lege ferenda, Casalta Nabais, a gente precisa lembrar assim que se de lege ferenda, Casalta Nabais não rola, de lege ferenda propriedade, será que rola? É possível esse de lege ferenda? Porque, então, a gente está falando de... prospectivamente, a gente não estava falando sobre direito posto... nesta função que Martha afirma existir no direito fundamental à propriedade. E aí, claro, como a proposta é polemizar, né? Nós temos que seguir adiante. Neste finalzinho aqui, eu diria o seguinte: Martha, é sério que a gente tem um sistema, quando eu digo sério, provocativamente, obviamente, né? Um sistema que não admite a aplicação pela corte constitucional, esquece Carf que não é corte, com todo respeito aos nobres juízes, que não é corte e não vai ser, certo? A não ser que vire em tribunal, certo? É possível que o tribunal constitucional não possa aplicar o princípio da capacidade contributiva no ajuste axiológico modernizante de temas, como você mencionou, de tecnologias ou novas tecnologias de consumo, é isso? Então, ele não vai fazer... fica tudo sem tributação? É isso mesmo que eu entendi da tese? E com isso eu encerro a minha provocação, espero que num tempo aí, suficiente.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Ótimo, Fernando. Obrigado. Eu vou dar a palavra para Martha, né?

Sra. Martha Toribio Leão: É, pois é.

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Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Você vai precisar de duas horas?

[risos]

Sra. Martha Toribio Leão: Espero que não, professor? A banca demorou cinco horas. Bom, primeiro queria agradecer aos elogios do professor Fernando Zilveti também, sempre esteve presente desde o início comigo. Me lembro que o professor fez parte da minha banca de qualificação da minha dissertação de mestrado sobre extra fiscalidade e, desde então, tem sido um ótimo debatedor, porque a gente vive realmente um grenal com relação a posições políticas, sou gremista, né gente, então posso falar de futebol agora. Mas eu queria, até falando sobre a primeira provocação, dizer que eu tentei ao máximo, no trabalho, não ser uma torcedora do direito formal, embora essa seja realmente a minha linha pessoal, mas eu tentei ao máximo que o trabalho buscasse, vamos dizer assim, ser uma torcedora da Constituição, um trabalho pró Constituição e não um pró pós-modernos ou tradicionais, enfim, embora eu seja tradicional dentro dessa divisão estanque, que é claro, né, como qualquer divisão binária, assim, qualquer classificação traz suas limitações. Então, o trabalho tenta ao máximo demonstrar que, no que tange o sistema tributário nacional, claro, que em outras questões a Constituição foi mais aberta, vamos dizer assim, a flexibilizações de direito material, mais aberta à ponderação de princípios, mas no tange ao sistema tributário nacional, não me parece que ela concedeu essa abertura ao Poder Legislativo. Ela fez uma escolha e eu acho que essa escolha poderia ser criticada numa série de, vamos dizer assim, dessa ideia de congelamento, dessa ideia de paralisação, dessa ideia de problemas de atualização, dessa ideia de dificuldade, né, de atualizar o sistema tributário nacional. Mas não me parece que a Constituição tenha sido assim, não tenha resolvido, em parte, esse problema, na medida em que ela traz um artigo específico sobre competência residual. Então, até para já responder a última provocação do professor Fernando Zilveti, se o Supremo Tribunal Federal não pode? Para começar, eu tenho um problema com esse modal deôntico. É óbvio que o Supremo pode tudo, a gente está vendo ele fazendo tudo. Mas se eu acho que ele deve, se eu acho que ele está correto ao fazê-lo, bom, é outra pergunta e eu acho que ele não deve, eu acho que esse é o modal deôntico próprio para tratar de como o Supremo Tribunal Federal tem agido, ele faz isso? Faz, ué, não está flexibilizando o direito penal, flexibilizando prisão em Segunda Instância, flexibilizando sigilo bancário? Está, ele está fazendo tudo isso. Eu não sou, vamos dizer assim, eu não sou cega com relação ao que o Supremo faz, mas eu não sou uma realista, eu não acho que é o que o Supremo faz que define o sistema que temos. Eu acho que o Supremo faz coisas erradas e, ultimamente, muitas coisas erradas, tá? Então, se a pergunta é se ele deveria fazer isso? Não, eu acho que ele não deveria, considerando a Constituição que temos. Mas ele faz? Ele faz, faz coisas erradas. Então, essa questão, por exemplo, da questão dos softwares, essa questão, enfim, da tributação das coisas da nuvem,

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existe competência residual prevista na Constituição e a União poderia exercer essa faculdade sem nenhum tipo de problema, não exerce porque não quer, enfim, porque não há interesse político em fazê-lo. Mas daí eu levar pela capacidade contributiva a extensão dos conceitos e aí, é claro, aí a gente tem uma diferença com relação a eu acreditar que a Constituição traz conceitos, né, e o professor Fernando Zilveti acreditar que o Constituição é mais fluída, no sentido de que traz tipos, né, traz notas, todas elas renunciáveis, em alguma medida, com relação às características típicas. Então, como eu acredito que a Constituição traz conceitos nas normas de competência e ela mesma já reconheceu que ela tinha uma limitação e, por isso, previu a competência residual, eu acho que é na competência residual que isso deveria estar. Eu, realmente, assim, não é que em nenhum momento o trabalho diz que o juiz não cabe interpretar, né? Enfim, eu sou uma positivista presumida, né? Enfim, não tenho nenhum problema com isso, mas eu acho que a norma só existe após a interpretação dos dispositivos tributários. O que me parece é que existe, em virtude desse sistema de previsibilidade, desse sistema formal colocado pela Constituição Brasileira, existe uma vinculação muito maior ao sentido preliminar do texto, né? A gente tem palavras que foram sendo objeto de consenso ao longo do tempo, ao longo da atuação, ao longo das constituições pela doutrina, pela jurisprudência. E esse sentido preliminar do texto vincula muito fortemente o julgador tributário, tá? Porque nesse sistema a gente tem uma abertura muito menor a outros tipos de argumentos de interpretação, como argumentos finalísticos também, o que não significa que eu estou defendendo que esses argumentos não tenham razão de ser. Eu escrevi um trabalho sobre extra fiscalidade no meu mestrado, né? Ou seja, tenho o pleno reconhecimento de que nesses casos em eu não estou falando de normas que restringem direitos fundamentais, mas sim de normas que promovem direitos fundamentais, ou seja, questões de imunidade, por exemplo, é lógico eu tenho uma abertura muito maior a esse outro tipo de argumento. Mas quando se trata de norma sobre a incidência tributária, ou seja, normas que diretamente restringem direitos fundamentais, sim, me parece há um espaço muito menor para a atuação do juiz com relação a outros argumentos que não argumentos institucionais, ou seja, argumentos literais, argumentos sistemáticos e assim por diante, ou seja, argumentos ligados à escolha àquilo que foi objetivado no próprio texto. O professor Fernando me fez uma... vamos dizer assim, uma provocação bem forte com relação à capacidade contributiva, né? Por quê que eu reconheço a legalidade na Constituição e não reconheço o papel da capacidade contributiva? Eu reconheço o papel da capacidade contributiva, eu só acho que o papel que foi atribuído à capacidade contributiva pelo texto constitucional, de novo, é um papel de graduação dos tributos e não um papel de instituição. Eu não posso decorrer diretamente da ideia de capacidade contributiva à ideia de instituição de tributos, porque a mesma Constituição que disse que a capacidade econômica serviria para graduar os impostos pessoais, disse que não haveria nenhum tipo de tributo sem lei que o estabelecesse.

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Então, eu não posso, vamos dizer assim, supervalorar o papel da capacidade contributiva e diminuir o papel da legalidade, né? O professor Ricardo começou dizendo: ah, ninguém dúvida da legalidade, né? Mas é muito interessante isso, porque, por exemplo, o trabalho do professor Marco Aurélio Greco, né, que enfim, que tem uma defesa bastante numa linha de direito material com relação às restrições ao planejamento tributário, é um trabalho que expressamente diz o seguinte: legalidade não é princípio no sistema tributário brasileiro. Então, assim, ele sequer...

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Como uma limitação.

Sra. Martha Toribio Leão: É uma limitação. Jamais se deu esse papel material, jamais se deu esse papel de princípio ao direito, direito à legalidade, né? Enfim. Então, assim, realmente essa doutrina, muitas vezes, embora não fale, está nas entrelinhas essa ideia de flexibilização da legalidade. Mas o que me parece, assim, e, realmente, não há no sistema brasileiro um imposto sobre a capacidade contributiva, muitas pessoas vão ficar muito tristes ao dizer isso, mas não existe esse imposto. E me parece que é esse imposto que muitas vezes é aplicado. Concordo plenamente com a crítica do professor Fernando Zilveti de que, realmente, tratar da jurisprudência administrativa é bater num espantalho, muitas vezes muito fácil, porque, realmente, o que é aplicado em muitas decisões do Carf é muito longe do direito que a gente tem, né? Mas, assim, o trabalho não poderia deixar de reconhecer essa jurisprudência, porque no caso do planejamento tributário, a gente tem esse cenário muito específico em que, por razão da série de parcelamentos tributárias e da agressividade dessas autuações sobre planejamento tributário, o que a gente tem é esses casos não sendo levados ao Poder Judiciário. Então, tudo o que gente tem de julgamento de planejamento tributário, restringe-se à esfera administrativa e mais, esses julgamentos vão ficando, vão permanecendo, porque a gente não leva essas discussões ao Poder Judiciário, porque não confia no Poder Judiciário, porque o Poder Judiciário vai demorar 20 anos para julgar, porque é muito caro ter um processo tributário, a partir do momento que eu faço o depósito a Fazenda Pública sequer está interessada em ganhar um processo, ela não precisa mais, ela já tem acesso ao dinheiro, desde então. Então, essas séries de razões, vamos dizer assim, levam ao fato de que a jurisprudência que a gente tem sobre planejamento tributário é essa, é uma jurisprudência que... a gente pode falar, a gente poderia falar em jurisprudência ou não, vamos dizer assim, o conjunto de discussões que a gente tem sobre esse tema é essa do âmbito administrativo, tá? Então, não é que o trabalho não conhece, vamos dizer assim, o papel da capacidade contributiva. Eu acho a capacidade contributiva essencial para o sistema tributário nacional. Eu só não acho que ela tenha a função de definir a existência ou não do tributo, porque ela não é uma condição necessária e suficiente para a tributação. Ela é uma condição necessária, mas ela não é uma suficiente, ela não esgota a necessidade de lei e de uma lei que, a meu ver, deveria ser interpretada no seu sentido preliminar, em razão da

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violação direta a direitos fundamentais. Com relação a essa ideia da propriedade, de fato, o trabalho traz uma doutrina alemã que trata de direitos de propriedade como um direito fundamental, mas não por causa do direito de propriedade em si, mas também por causa da relação entre liberdade e fazer o que eu quiser, tomar as decisões mais importantes da minha vida, envolve, em seu núcleo duro, também, tomar as decisões sobre o meu patrimônio. As decisões sobre o que fazer com os meus bens fazem parte do núcleo duro do meu direito de liberdade, na linha que foi seguida pelo trabalho, né? Uma linha do professor Isaiah Berlin, principalmente, de liberdade positiva e negativa, de liberdade também num viés de tomar as decisões principais sobre a sua própria vida, né? Claro que isso depende de uma concepção com relação a se propriedade é ou não um direito fundamental, mas eu acredito que a Constituição tomou essa decisão, a Constituição reconheceu um viés econômico, reconheceu que vivemos num mundo capitalista e que a busca por liberdade econômica é um direito fundamental tanto da pessoa física como da pessoa jurídica. E, por isso, assim, não me parece que seja a minha defesa com relação a como eu gostaria que o sistema fosse, não acho seja lege ferenda aqui, na medida em que foi uma decisão da própria Constituição de definir esses direitos como fundamentais.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Eu queria fazer dois ou três comentários rapidíssimos, sem nenhuma pretensão científica aqui, como foi colocado pelos meus dois companheiros de Mesa aqui, acho que o Rodrigo quer falar alguma coisa também, mas eu sou muito prático, eu queria só fazer algumas observações. Com relação à Casalta Nabais, eu vejo que as pessoas jogam a expressão que é o título, né, sem aprofundar. Há um dever fundamental, é, inclusive, o acórdão do Fux, é direito fundamental de pagar tributos, acabou. Como se isso tivesse como sobreprincípio, um dogma, né?

Sra. Martha Toribio Leão: Como se fosse um guarda-chuva, né?

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: É, não sei, então, eu acho que, realmente, uns dos méritos do trabalho, como existem outros, é exatamente dissecar um pouquinho, desmistificar esse mito de que existe um dever fundamental, assim, pairando no ar. Com relação à capacidade contributiva, vocês conhecem o Alair Martins? É um que saiu na revista Forbes essa semana. É o homem mais rico do Brasil.

Sra. Martha Toribio Leão: É.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Tem uma capacidade... Não, não vai anotar nada, por favor. Tem uma capacidade contributiva inesgotável, inesgotável, só que ele simplesmente tem tanto direito, ele não faz nada, ele não faz fato gerador nenhum, né? Agora, você imagina a guerra de hienas que haveria se os municípios, o município onde ele reside, o município onde tem patrimônio os estados onde o patrimônio dele está distribuído, até quem sabe fora do país, né, e a União, baseados somente nessa capacidade contributiva inesgotável, quisesse

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cobrar imposto. Como você mencionou, não existe imposto sobre a capacidade contributiva. Eu pergunto: qual dos poderes públicos cobraria imposto sobre esse Herivelto, só porque ele é riquíssimo, né? Se ele não fizer nenhum fato gerador previsto em lei, né? E a última questão que eu queria colocar aqui, ainda dentro dessa proposta não científica. Nós tivemos aqui em São Paulo essa semana ou semana passada, uma coisa horrorosa, um desabamento de um prédio. Em decorrência do que nós temos, onde viviam sem-teto, né, era um prédio invadido, e nós temos famílias, dezenas ou centenas, não sei, de famílias morando na praça. Por que é que ninguém fala em solidariedade social, nesse momento, com relação a essa situação? Fala-se em solidariedade social com relação a planejamento tributário, só, né? Como você colocou a pouco aqui, é só da tributação que vem os recursos para o Estado, né? Será que a solidariedade social não obrigaria o Poder Público, seja lá qual for, a acudir de imediato, não é ficar fazendo cadastro, é acudir de imediato essas pessoas. E será que eu que, felizmente, tenho uma casa onde eu tenho dois cômodos vazios, um porque eu guardei para os meus filhos ou netos me visitarem de fim de semana e outro porque era onde morava minha sogra que faleceu, então, hoje, eu tenho dois cômodos vazios, será que eu não tenho a obrigação de colocar duas famílias nesses cômodos, né? E pergunto: será que o Estado pode chegar para mim: olha, Ricardo, você solidariedade social que está lá no preâmbulo da Constituição, você por favor... por favor, não, você vai receber essas famílias. E olha, outra coisa, você não vai só colocá-los no seu teto, você vai dar comida, você vai dar transporte, porque eles não têm nada, eles não têm nada mesmo. O que me parece é que todas essas evoluções que se dizem modernas acabam sendo motivos, né, para justificar mais posições ideológicas ou políticas do que realmente científicas. Não é que eu sou contra o que o Fernando colocou, de modo que eu não quero que você me conteste, porque eu só estou fazendo observações aqui livremente, não estou nem me fundamentando em conceitos jurídicos ou princípios jurídicos. Assim, depois, o Rodrigo Maito pediu a palavra, não sei se alguém quer fazer pergunta. Nós estamos caminhando para mais 20 minutos.

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Dentro dessa tão instigante tese da Martha, acabou escapando uma outra inquietação. Ela fala em diversas passagens sobre a previsibilidade e que realmente incomoda, porque esse debate direito de formal e direito material, ele não é ideológico, né, deixar bem claro. Nem é ideológico, nem é grenal ou Corinthians contra o Palmeiras, né? Ainda bem que eu não sou corintiano nem palmeirense, né?

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Nesse ponto nós somos...

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Nós somos.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Concordes, inteiramente.

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Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Mas o que me chama a atenção e é muito interessante na tese da Martha é que ela sustenta que a gente precisa ter previsibilidade. A previsibilidade é um dos corolários da segurança jurídica, que também estamos todos de acordo e ela sustentada que a previsibilidade pela legalidade é possível, fora da legalidade, ela não é viável, né? Até tem uma passagem que você citou o Souto Maior Borges, falando sobre igualdade, em que ele trabalha muito... e o Souto Maior Borges é um craque, né? Ele trabalha muito com a legalidade, a igualdade e a estrutura do sistema tributário. Mas o que me pega e aí, claro, eu estou puxando a sardinha para a meu lado, é que na aplicação, em 30 anos, né, que até eu escrevi um artigo recentemente sobre isso, em 30 anos da Constituição, e muito provocado pelo Ricardo sobre o Imposto de Renda, não me consta que a aplicação da capacidade contributiva para a renda, para a realização da renda tenha gerado imprevisibilidade, ao contrário, se nós analisarmos as posições das cortes superiores sobre renda nos últimos 30 anos, o que nós temos é previsibilidade. E aí, que o nosso sistema fica parecido com o alemão. Por que é que na Alemanha a gente não está com esse debate em pauta esse debate que a Martha trouxe? Porque na Alemanha a corte constitucional confere previsibilidade, confere segurança jurídica e aplica o direito material. O Estado de direito material é aplicado na Alemanha, largamente, e não o Estado de direito formal. A gente está falando, veja, a gente está falando de quase um século daqui a pouco, mas vamos constar, desde o código tributário alemão, 77, até hoje, com cláusulas gerais anti-abuso, combate ao planejamento tributário, isso exportado para a União Europeia, na Corte Europa de Justiça, o que a gente tem é previsibilidade. Então, eu não consigo entender por que é que a gente associa o Estado de direito material a imprevisibilidade, no Brasil, para não falar de outros sistemas. E se a gente for para outros sistemas, da mesma forma, o que se tem é previsibilidade. Há uma certa modificação natural, graças às cortes constitucionais, graças aos avanços socioeconômicos, em que determinados momentos, como a gente fala no ISS, o ISS sobre bens móveis não foi aceito, depois foi aceito, depois voltou a ser não aceito. Agora, tem aí uma certa distensão sobre o que existia antes, está mais flexibilizado, eu concordo, mas ele não está flexibilizado a ponto de gerar tanta insegurança jurídica nas cortes superiores. Então, eu não estou vendo e olha que eu estou procurando, eu não estou vendo no Supremo uma insegurança jurídica em matéria tributária. E esse exemplo da Carmen Lúcia é uma má decisão. Eu tenho decisões boas, decisões ruins, mas imprevisibilidade eu não tenho. E eu também... agora, eu tenho erros, posso dizer, tenho erros. Quando fala em dever fundamental de pagar tributos assim meio jogado, eu vejo um erro, mas juiz erra, só que é jurisprudência. Então, isso é uma um problema que não afeta a doutrina.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Não é que os meus clientes que não juristas dizem a respeito da nossa jurisprudência de segurança jurídica, ninguém sabe o quê que vai acontecer. Todo mundo sabe aquele velho ditado, né, cabeça de juiz etc. Mas eu vou passar a palavra para a Rodrigo Maito.

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Sr. Rodrigo Maito da Silveira: Bom dia a todos. Eu cumprimento a Martha pelo trabalho dela, muito oportuno. E a sistematização do conhecimento é uma forma de avançar e da gente poder, justamente, tentar encontrar soluções para esses problemas e este é um problema que a gente está vivenciando no Brasil, eu diria até que no mundo, né? A gente tem também, no âmbito da tributação internacional, a gente fala em moralidade ou ética na tributação. Aqui no Brasil não é diferente, obviamente, com cores sempre mais fortes, que é uma característica da nossa realidade. Alguns comentários que eu gostaria de fazer, que eu não tive ainda a oportunidade de ler o seu trabalho que me parecem, talvez, até corroborar, algumas perspectivas diferentes que corroboram a sua tese. Um deles é a segurança jurídica, qual que é o papel do direito? O papel do direito é conferir segurança jurídica, é o mais importante princípio de direito. Se não tivermos um mínimo de apego ao formalismo e aceitarmos esta flexibilização, estamos dando para o Poder Judiciário, em última instância o Supremo Tribunal Federal, a chave de toda a vida social, só de que uma maneira além do que deveria. Aí, eu trago também, o princípio da tripartição dos poderes. Essa discussão toda sobre ativismo judicial, ela passa por a gente analisar, sim, qual é o papel do Supremo, admitir que o Supremo... a última palavra do Supremo, o Supremo diz o que o direito é, é um tanto quanto perigoso. Eu até não concordo muito com essa ideia de que o Carf, que os tribunais administrativos não... eles aplicam direito, eles aplicam direito. Se eles revisam os lançamentos tributários e dizem o que seria a sua interpretação sobre o direito, eu entendo, sim, que há a aplicação do direito e essa jurisprudência tem que ser levada em consideração. Basta a gente pensar num caso aí de redução de capital que está prevista na lei e que, muitas vezes, é tida como um planejamento tributário para pagar menos imposto sobre o ganho de capital numa eventual alienação futura dos bens devolvidos aos seus respectivos sócios. Exemplos não faltam, basta a gente, obviamente, analisar e isso traz insegurança, né? Isso traz insegurança, por isso, que eu acho que o tema ele é extremamente importante. Então, eu só faço esses comentários e concluo aqui, sem prejuízo, obviamente, de a Martha concordar o discordar, enfim, fique à vontade para, em linha com os outros comentários anteriores aí, me parece que falta também na discussão envolvendo esse tema, na linha até do que o Ricardo trouxe, de uma análise um pouco mais ampla. Por que defender solidariedade de uma maneira cega sem olhar para o outro lado da equação? Eu não vejo... até agora eu não encontrei no âmbito acadêmico, ou mesmo jurisprudencial, talvez alguma outra decisão muito tímida, uma análise um pouco mais séria no sentido de: os recursos são utilizados? Os recursos da arrecadação tributária são utilizados de forma adequada, responsável, observando todos os princípios constitucionais que são aplicáveis à atividade do gestor público? Me parece que isso até corrobora a necessidade de apago ao formalismo, porque dizer que os hospitais no Rio de Janeiro não vão ter recursos para se manter, então seria necessidade validar aquela lei inconstitucional de cobrança do IPTU, me parece ser um argumento

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muito frágil, né, quer dizer, então, vamos... se é para flexibilizarmos a aplicação da legalidade, então vamos fazer a lição completa. Vamos olhar para o direito como um todo, não vamos ter daquela ideia ultrapassada, na minha visão, de que o direito tributário acaba no recolhimento do imposto e vamos olhar, sim, para a aplicação dos recursos e saber se, de fato, se justiça uma interpretação tão ampla, né, em nome dessas... como você colocou lá, palavras bonitas, né? Quer dizer, ninguém é contra a solidariedade, mas será que ela se justifica na nossa realidade, né? Então, eu só finalizo colocando esses pontos aí, que eu acho que são fundamentais para um debate mais amplo e completo do tema. E agradeço, obviamente, também, à sua participação aqui hoje.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: O Rodrigo, seus pontos, eu vou pedir para a Martha fazer o comentário que quiser, mas nós temos duas... duas intervenções via Youtube. Um do LG Carvalho, ele faz dois comentários é uma pergunta. Os comentários são: parece, de fato, não haver uma imposição da solidariedade aos particulares. E acrescenta, ademais, Nabais defende que só há dever fundamental quando a Constituição Federal assim o impõe expressamente. Bom, são os dois comentários dele. Mas ele faz uma pergunta: a solidariedade, ele se refere ao art. 3º da Constituição, é, de fato, um princípio? Não seria apenas uma meta ou um mandamento dirigido ao Poder Público? E o Pedro Schoueri faz uma pergunta, a seguinte: haveria, então, uma vedação à norma anti-abuso que limite o benefício de tratados, caso o principal propósito seja economizar tributos? Bom, você entendeu a pergunta, né? Acho que ela precisaria ser um pouquinho dissecada, mas dá para entender. E o Fernando quer fazer mais uma colocação para você comentar. Nós vamos ter que finalizar, infelizmente.

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: É uma pergunta rápida aqui. Você falou numa determinada página do teu trabalho, que eu não me lembro mais aqui, mas acho que é na, sei lá, acho que eu vou ver depois... ah, é 55.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Não,57.

[risos]

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Mas é que ela está com tudo aí...

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: É Mesa de Debate aqui.

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Mas, enfim, é que ela falou... só para a gente afinar esse conceito que eu achei interessantíssimo, ela falou assim: “o direito tributário convive mal com as cláusulas gerais e conceitos indeterminados”, né? Isso me chamou a atenção, porque a gente tem cláusulas gerais principalmente no imposto de renda, que eu estava falando aqui, né? O que é esse mau convívio? Me explica bem, o que é que você entendeu como esse mau convívio?

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Ótima pergunta.

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Sra. Martha Toribio Leão: Bom, gente, vamos lá então. Primeiro a questão, primeira colocação do professor Fernando Zilveti de que ele não vê uma insegurança jurídica na jurisprudência tributária. Eu vou usar só dois exemplos para dizer porque que é que eu não concordo com isso, claro que são exemplo mais gerais. Primeiro, a mudança de orientação do Supremo Tribunal Federal com relação ao sigilo de dados bancários, né? Havia uma decisão já em recurso extraordinário com repercussão geral de dez anos atrás, com a alteração da composição isso foi trazido de novo à pauta pelo ministro Dias Toffoli e, com base no guarda-chuva, para usar, né, para a expressão, o slogan, a ideia de dever fundamental de que isso, tudo deve ser flexibilizado em nome da promoção desses princípios, inclusive em nome de diretrizes internacionais das quais o Brasil sequer é signatário, se flexibilizou essa regra constitucional bastante clara. Então, primeira, assim, alteração muito clara de jurisprudência. Segundo, a questão do tipo, conceito, serviço, né? Ministro Fux, só para usar um exemplifico, ano retrasado, disse, né, enfim com base nessa decisão do conceito de serviço para planos de saúde que seria um tipo constitucional, que deveria ser interpretado de acordo com capacidade contributiva, com interpretação econômica e assim por diante e ano passado, ao julgar a questão do ICMS na base de cálculo de PIS/Cofins, disse que há um conceito de faturamento e que dentro desse conceito de faturamento não entra o ICMS. Então, assim, isso para mim é um exemplo claríssimo de insegurança jurídica, né? Um mesmo ministro julgando o mesmo tipo de questão dá duas decisões completamente distintas e a gente não sabe agora na terceira o que é que ele dizer.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Posso acrescentar mais uma? Nessa mesma decisão--

Sra. Martha Toribio Leão: Claro.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Do ISS esse diz que o art. 110. Eu vou falar aqui o que me recordo de cabeça, não foi com essas palavras, o art. 110 do CTN não exerce papel nenhum.

Sra. Martha Toribio Leão: Isso.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Só que alguns meses antes decidindo o ICMS sobre o leasing internacional ele diz que o 110 exerce o papel e decidiu em função do art. 110.

Sra. Martha Toribio Leão: Então, se isso não é insegurança jurídica, né, assim, eu realmente não sei o que é? –Porque, a mim, realmente, a mudança de composição, aliás, eu acho que o Supremo deveria parar de julgar, né? Os próximos quatro anos nós vamos ter quatro mudanças de ministros e a mudança de composição determina uma mudança de orientação. Então, realmente isso traz uma certa dificuldade com relação à insegurança jurídica, a falta de previsibilidade, eu realmente não vejo essa previsibilidade na jurisprudência tributária brasileira.

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Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Martha só um aparte, eu falei sobre a renda.

Sra. Martha Toribio Leão: Ah, tá? Não, claro--

Sr. Fernando Aurelio Zilveti: Esse tema, acho que todo mundo está de acordo. Os erros de um juiz que a já apontou, você apontou muito bem, são erros. Geram uma insegurança jurídica? Sem dúvida. Mas como corte constitucional, corte constitucional, no que diz respeito à renda, exclusivamente, eu, particularmente, eu não vi, nos últimos 30 anos, uma imprevisibilidade em relação à renda. Se é que existe, eu gostaria até de saber.

Sra. Martha Toribio Leão: Não, eu concordo com relação à renda, até porque, com relação à renda o Supremo tem dito de forma muito reiterada que há um conceito no sentido de acréscimo patrimonial, mas eu tenho até dificuldade de que parte da doutrina não ia concordar com isso, né? Mas o Supremo tem dito e diz reiteradas vezes, que há um conceito de renda no sentido de acréscimo patrimonial e essa parte da doutrina, muito provavelmente, acha que essa decisão está errada, né? Schoueri, por exemplo, né? Meu querido orientador de mestrado. Bom, com relação às questões do professor Rodrigo Maito eu agradeço, enfim, claro, aos elogios do trabalho, concordo plenamente, né? Tem um trabalho do professor Murphy, do professor Nagel, que trata exatamente dessa visão míope com relação à tributação, né? Que a gente olha, muitas vezes, como se o dinheiro arrecadado fosse jogado no mar, né? A gente não olha para a tributação como um todo, a gente não olha para o gasto público, a gente faz uma análise bastante enviesada, assim, bastante parcial do quê que acontece com a tributação. E exatamente, eu acho que a solidariedade, ela não se esgota na tributação, a tributação é uma das formas de promover a solidariedade, mas não é a única. E, inclusive, quando se vai para a filosofia do direito, enfim, para o conceito de solidariedade social, se verifica que há, inclusive, uma restrição a essa ideia de solidariedade forçada, porque a solidariedade deveria ser aquilo que se faz voluntariamente pelo outro, essa ideia de ajudar o outro de forma voluntária.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Tem a pergunta do Carvalho.

Sra. Martha Toribio Leão: Sim, se a solidariedade é um princípio.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Se é uma meta ou um princípio.

Sra. Martha Toribio Leão: Não, eu acho que pode ser uma meta e pode saber um princípio ao mesmo tempo, não tenho nenhum problema com relação a isso. Acho sim, que é um objetivo fundamental do sistema brasileiro posto na Constituição de 88, está entre os objetivos fundamentais, mas eu acho que é sim um princípio, no sentido de que se deve adotar medidas que promovam o máximo possível esse princípio. O que não significa, de nenhum modo, que isso serve a

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legislador tributário ou a intérprete da disposição tributária de interpretar sempre com base naquilo que ele acha que melhor vai promover a solidariedade. Até porque, isso dependeria daquela premissa de que a solidariedade é melhor promovida pela transferência do dinheiro na iniciativa privada para o público, o que eu não acho que se sustenta, tá?

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Só para... só especificar um pouquinho mais a questão colocada, se é meta ou se é objetivo ou se é princípio, o título 1 da Constituição, tem o título: Princípios Fundamentais. O art. 1º se refere que a República Federativa do Brasil constituída pelo Estado democrático que tem como fundamentos, certos, blá, blá, blá. E a art. 3º coloca: constituir objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, tais, tais e tais, inclusive, promovendo o bem-estar de todos, né?

Sra. Martha Toribio Leão: Mas a ideia--

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: A solidariedade aparece no preâmbulo, está certo? Então, da onde que se coloca topograficamente e por natureza essa ideia?

Sra. Martha Toribio Leão: A natureza normativa, me parece, que seria de princípio mesmo, mas dentro de uma concepção, que eu adoto, de princípio naquele sentido aristotélico, de que princípio é fundamento, né? Então, na verdade, essas duas palavras acabam se confundindo dentro desse conceito de que princípio é aquilo que está na base, é o alicerce, é o fundamento. Então, realmente, me parece que sim, seria reconstruída como um princípio. Claramente não é como eu regra, né? Isso a gente não tem nenhuma dúvida, porque não diz a forma de promoção, não esgota as formas de promoção, não diz o caminho que tem que trilhar, diz qual é o objetivo a ser atingido que é uma sociedade mais solidária. Depois a pergunta do Pedro Schoueri, bom, professor Schoueri não veio aqui hoje, mas Pedro está representando a família, de longe. O professor Schoueri me mandou um e-mail dizendo que estava muito chateado que não ia estar aqui, mas o professor Schoueri, não se preocupe, fez muitas perguntas na minha banca e eu tive que responder todas elas, tá? Então, o Pedro pergunta se isso levaria, se a minha conclusão levaria a vedação de uma norma anti-abuso, né? Basicamente é essa a pergunta. O trabalho trata exatamente dessa questão. Me parece que se essa norma anti-abuso trouxesse uma consideração da ilegalidade da escolha menos tributária, menos tributada, ou seja, se a razão extra tributária única para a realização de uma operação fosse considerada uma ilicitude, sim, eu acho que haveria um problema de constitucionalidade. Mas isso não significa que eu não ache que não há um espaço para uma norma geral anti-abuso. Eu acho que seria muito valido que uma norma geral anti-abuso existisse no Brasil para definir, pelo menos, standard de provas no direito tributário, porque a gente não tem essa definição clara e eu acho que isso causa muitos problemas, no sentido da Fazenda Pública considerar que quem cabe provar que não fez aquilo que está sendo

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imputado é o contribuinte e não a Fazenda Pública. E aí, o uso como exemplo aqui a legislação anti-abuso italiana, bastante recente, né, de 2015 que traz standard de prova, na Alemanha também, há na legislação standard de prova para a autoridade fazendária e eu acho que isso seria muito válido no Brasil e uma norma geral anti-abuso poderia fazer isso. Além disso, trazer uma maior especificação, uma maior concretude dessas questões que a gente já tem o Código Tributário Nacional, né? Dissimulação, simulação, abuso na ideia geral, que tipo de... a qualificação da multa seria em que tipo de situação? Trazer uma maio concretude com relação a essas questões que já foram trazidas pelo CTN. E por fim, o professor Fernando Zilveti me pergunta o que é que quis dizer com convive mau com cláusulas gerais. Eu quis dizer no sentido de que... claro que existem cláusulas gerais, claro que existem diferentes concretudes de conceitos na própria Constituição. Existem conceitos mais abertos e conceito mais fechados, né? E eu acho que o direito tributário convive mau com essas cláusulas tão abertas, na medida que isso leva à interpretação muitos variadas com relação, tanto do âmbito administrativo como no âmbito judicial, do que deve ser feito. Considerando esse sistema de previsibilidade, dentro desse sistema de previsibilidade, a gente tem uma dificuldade de lidar com essas cláusulas tão abertas, com princípios. Daí, inclusive, a preferência por regras na própria Constituição quando trata do direito tributário. Eu sei que, né, eu queria falar muito tempo, mas eu também não quero esgotar o tempo, né? Enfim, passar muito do meu tempo. Obrigada.

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Eu agradeço à Martha, especialmente. Agradeço a presença de todos, a participação das Mesa, das pessoas que estão fora do recinto, mas que participaram também, mas eu queria agradecer pessoalmente e, principalmente, a você, foi uma... um tema importantíssimo e foi apresentado com bastante clareza, tanto é que permitiu divergências, ponderações e debates. Eu tenho certeza que quando a sua tese vier a público, através do livro, vai produzir muito mais controvérsia e provavelmente respostas, né? Em outros trabalhos doutrinários

Sra. Martha Toribio Leão: Tomara.

[risos]

Sr. Presidente Ricardo Mariz de Oliveira: Queria confirmar, então, que o trabalho que está... o tema que está colocado: o lado da liberdade de interpretação, do Fernando Mariz Masagão será no dia 2 de agosto de 2018, não no dia 7/6, porque durante o mês de junho o Schoueri não estará presente e acho que é um tema que... Na verdade, a gente tem tratado disso aqui nas entrelinhas de todos os tópicos que temos discutido, mas é um tema que precisaria a Mesa estar completa. Então, ficará para a primeira sessão do segundo semestre, no mês de agosto. E os outros assuntos continuam da pauta. Muito obrigado pela presença e nos encontramos na semana que vem.

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Revisado por: F.L.B.D.O.