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Mestrado em Economia Monetária e Financeira
Economia dos Intermediários Financeiros
Intermediação Financeira, Mercado de Capitais e CrescimentoEconómico. Que Relação? Um Estudo Empírico
Docente: António Afonso
Celso NóbregaEdmund FreitasJosé Pinheiro
Raquel Ferreira
Dezembro de 2001
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Índice
1) Resumo do estudo (abstract)
2) Introdução
3) Desenvolvimento do sistema financeiro e crescimento económico
§ 3.i) A estrutura do sistema financeiro§ 3.ii) Os intermediários financeiros§ 3.iii) Os mercados de capitais§ 3.iv) Evidência empírica§ 3.v) Outros aspectos influentes no funcionamento dos sistemas
financeiros§ 3.vi) Alguns resultados
4) Estudo empírico sobre a relação entre o desenvolvimento do sistemafinanceiro e o crescimento económico
§ 4.i) Estudo empírico de 25 países com dados painel§ 4.ii) Estudo de cointegração e causalidade à Granger com dados
de cinco países
5) Implicações dos resultados para a política económica
6) Conclusões
7) Bibliografia
Anexos
A Quadro resumo dos aspectos influentes no funcionamento dos sistemasfinanceiros
B Resultados do estudo empírico com dados painel
C Resultados do estudo de cointegração e causalidade à Granger
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1) Resumo (abstract)
Este trabalho analisa a relação entre o desenvolvimento do sistema financeiro e ocrescimento económico. Inclui uma análise da teoria e literatura recente, por um lado, etesta alguns dos pressupostos teóricos avançados por diferentes autores, por outro.Concretamente, usando métodos econométricos e com base em dados de painel para 25países, foi feita uma comparação do impacto do desenvolvimento do sistema financeiro nocrescimento económico em países desenvolvidos e em países em desenvolvimento. Aeficácia de diferentes modelos de organização do sistema financeiro foi analisada e testada,nomeadamente sistemas orientados para a intermediação financeira e sistemas orientadospara os mercados de capitais.Por último, foram usados métodos estatísticos, nomeadamente a cointegração e causalidadeà Granger com base em dados de cinco países, para comprovar a causalidade entre odesenvolvimento do sistema financeiro e o crescimento económico.Os resultados do trabalho empírico apontam para uma maior eficácia dos sistemasfinanceiros orientados para os mercados de capitais enquanto factores de dinamização docrescimento económico. Existem fortes sinais de causalidade entre o desenvolvimento dosistema financeiro e o crescimento económico com potenciais implicações para a políticaeconómica. Os resultados são consistentes com os resultados de estudos recentes sobre estetema.
2) Introdução
Tem-se verificado na literatura económica um aumento do interesse sobre o papel
do sector financeiro no processo de desenvolvimento económico. Os modelos
endógenos de crescimento económico procuram identificar os factores que
potenciam o crescimento, de entre os quais o desenvolvimento e a estrutura do
sistema financeiro.
No entanto, o tema não é novo. Bagehot, um economista inglês do século dezanove
XIX enfatizou o papel do sistema financeiro do seu país no financiamento de
projectos de investimento. Nos anos 60, Hicks argumentou que o desenvolvimento
dos mercados de capitais na Inglaterra foi determinante na concretização da
revolução industrial no início do século XVIII (Hicks, 1969). Começando por
Goldsmith (1969), surgem no último quartel do século XX uma sequência de
estudos teóricos e empíricos que procuram determinar se existe causalidade entre o
desenvolvimento do sistema financeiro e o processo de crescimento económico.
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Utilizando diferentes métodos e dados, estes estudos têm dado consistência à tese de
que, de facto, existe uma causalidade. Segundo Levine (1997), “embora as
conclusões devam ser afirmadas com hesitação, a preponderância do raciocínio
teórico e da evidência empírica apontam para uma relação positiva e de primeira
ordem entre o desenvolvimento financeiro e o crescimento económico.”
Mais recentemente, o debate tem evoluído no sentido de avaliar a adequação das
diferentes estruturas possíveis do sistema financeiro enquanto factores que
potenciam o crescimento económico. Concretamente, autores como Levine (1997),
Allen e Gale (1994), Thiel (2001) e Tsuru (2000), procuram aferir os méritos
relativos de sistemas financeiros que, por um lado, privilegiam a intermediação
financeira e, por outro lado, dão ênfase à desintermediação, nomeadamente para um
papel preponderante dos mercados de capitais.
Este debate surge em parte devido à discrepância entre as taxas de crescimento das
principais economias europeias face à dos Estados Unidos nos anos 90. A
progressiva integração do sistema financeiro europeu e a implementação do Euro
estimulam o debate sobre qual o modelo de organização mais adequado para o
sistema financeiro europeu por forma a que se facilite o processo de integração e o
desempenho económico. O sistema financeiro norte-americano, caracterizado por
uma abundância de estruturas e produtos financeiros, é geralmente considerado o
mais sofisticado a nível mundial. Existe, por isso, um debate sobre se o progressivo
desenvolvimento do sistema financeiro naquele país foi determinante para o seu
sucesso económico.
O objectivo deste estudo é o de analisar a relação entre o desenvolvimento do
sistema financeiro e o crescimento económico nos países desenvolvidos e em
desenvolvimento, à luz do trabalho teórico e empírico já feito nesta área e do estudo
empírico que efectuámos. Procura-se ainda identificar algumas implicações para a
política económica, nomeadamente quanto às medidas que possam resultar em
sistemas financeiros mais adequados para estimular o crescimento económico.
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Na secção 3, é feita uma análise dos mecanismos de transmissão que poderão levar a
uma causalidade entre o desenvolvimento do sistema financeiro e o crescimento
económico. Uma revisão da teoria relevante é feita bem como uma análise dos
resultados de estudos empíricos que visam demonstrar a causalidade à luz de cada
tipo de estrutura financeira. Esta abordagem é seguida dado que permite distinguir
entre os diferentes mecanismos de transmissão associados aos respectivos modelos
de organização do sistema financeiro e uma avaliação comparativa do impacto dos
dois tipos de estrutura.
A secção 4 expõe os resultados e conclusões do estudo econométrico feito para um
conjunto de países.
Na quinta secção, procura-se identificar alguns impactos sobre a política económica,
à luz dos temas desenvolvidos ao longo do estudo e das conclusões do estudo
empírico.
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3) Desenvolvimento do Sistema Financeiro e o Crescimento Económico
3.i) A estrutura do sistema financeiro – intermediação vs. mercado de capitais
Na realidade, diferentes modelos de sistema financeiro coexistem nas economias
modernas. Autores como Allen e Gale (1994, 2000) classificam os sistemas
financeiros de acordo com a seguinte dicotomia: sistemas do “tipo alemão”, nos
quais existe uma predominância da intermediação financeira, e sistemas do “tipo
americano”, nos quais a desintermediação e o papel dos mercados de capitais
predomina. No entanto, existe a consciência de que estas diferenças são relativas e
também de que os sistemas financeiros evoluem ao longo do tempo.
De facto, alguns estudos recentes sustentam a importância da coexistência dos dois
sistemas. Stulz (2000) argumenta que a existência de mercados de capitais
desenvolvidos permite aos bancos, enquanto investidores, limitar a exposição a
determinadas empresas e sectores reduzindo os riscos para o sistema financeiro.
Thiel (2001), para além de avaliar os méritos e defeitos dos dois modelos de
organização, considera que um factor importante para potenciar o papel do sistema
financeiro enquanto causa de crescimento económico poderá ser o grau de
abrangência e complementaridade (completeness) das estruturas existentes. A
coexistência da intermediação financeira e de mercados de capitais desenvolvidos
aumenta a concorrência no sistema financeiro, levando a uma redução de custos de
transação, que poderá aumentar a rentabilidade dos capitais investidos e aumentar o
investimento. Em particular, o autor salienta a importância da capacidade de
evolução e adaptação do sistema financeiro face às necessidades reais da economia,
referindo, por exemplo, a importância do capital de risco para estimular o
investimento em sectores de maior risco/retorno e de elevado potencial de
crescimento.
No resto da secção 3) procedemos ao tratamento de cada um dos sistemas e da
potencial causalidade destas em relação ao crescimento económico.
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3.ii) Os Intermediários Financeiros
A literatura económica associa cinco principais mecanismos de transmissão entre a
intermediação financeira e o crescimento económico, a saber: 1) a alocação eficaz
de recursos; 2) a mobilização das poupanças; 3) a redução de custos de recolha de
infomação; 4) a redução de custos de supervisão de projectos de investimento; 5) a
diversificação de riscos (específicos, de choques externos, inter-geracionais).
o Alocação de recursos
Os intermediários financeiros desempenham um papel importante enquanto
seleccionadores de projectos de investimento. A selecção dos projectos mais
rentáveis resulta da avaliação e selecção de projectos com uma relação risco/retorno
mais favorável. Este processo dá origem a uma melhor alocação de recursos do que
no caso de não haver avaliação e selecção (Greenwood e Javanovic, 1990).
Teoricamente, os recursos dedicados à avaliação de projectos deverão aumentar até
que o custo marginal associado a este processo seja igual ao benefício marginal em
termos de aumento da rentabilidade dos investimentos. O resultado é um aumento
da rentabilidade dos capitais investidos que, por sua vez, poderá dar origem a um
aumento de investimento.
É de referir, no entanto, que alguns autores defendem que o financiamento bancário
pode dar origem, nalguns casos, a investimentos em projectos não rentáveis. Uma
relação de proximidade entre credores e empresas financiadas, poderá reduzir o
custo do capital e dar origem a investimentos para além do conjunto de projectos
rentáveis geridos pelas empresas financiadas (Tsuru, 2001).
Um outro problema é teorizado por Stiglitz (1985), que argumenta que uma subida
das taxas de juro poderá dar origem a problemas de “selecção adversa”. Nestes
casos, o aumento do custo de capital, reduz a rentabilidade de projectos menos
arriscados, levando à selecção por parte dos bancos de projectos com maior risco.
Esta situação, para além de poder por em causa a estabilidade do sistema financeiro,
num caso extremo, poderá resultar no racionamento de crédito a projectos menos
rentáveis e de menor risco.
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o Mobilização de poupanças
Outro mecanismo de transmissão resulta do facto dos intermediários financeiros
terem um papel importante na mobilização de poupanças nas economias. A
mobilização de recursos pelos intermediários financeiros permite investimentos em
maior escala. A mobilização de poupanças permite igualmente o aproveitamento de
economias de escala nos investimentos onde estes existem (Sirri e Tufano, 1995).
Este fenómeno dá origem a um aumento da rentabilidade dos capitais investidos.
o Redução de custos de recolha de informação
Os intermediários financeiros reduzem a duplicação de custos na recolha de
informação associada à avaliação de projectos de investimento. Em vez de cada
investidor ter que obter as competências necessárias para a avaliação de projectos e
proceder à recolha de informação, um número reduzido de intermediários pode
desempenhar este papel por um custo inferior (Levine, 1997).
As relações de longo prazo frequentemente estabelecidas entre intermediários
financeiros e empresas podem levar a reduções adicionais dos custos associados à
recolha de informação. As relações de proximidade reduzem assimetrias de
informação, atenuando as restrições ao financiamento externo e melhorando a
alocação de recursos (Sharpe, 1990).
A redução de custos de transacção que este papel delegado nos intermediários
permite, potencia o processo de desenvolvimento económico. Segundo Greenwood
e Smith (1995), a redução de custos de transacção permite uma melhor
especialização no desempenho de actividades na economia, fenómeno este muito
associado ao desenvolvimento económico. Teoricamente, a especialização de
actividades resulta num maior número de transacções entre agentes (fornecedores,
distribuidores, clientes e intermediários financeiros), que é facilitado pela redução
dos custos de transacção dos diversos serviços prestados pelos intermediários
financeiros (não somente o crédito, como também os meios de liquidação).
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o A redução de custos de supervisão de projectos de investimento
A actuação dos intermediários financeiros resulta na redução de custos de
fiscalização de projectos e respectivos gestores. Em representação dos seus
interesses e, indirectamente, dos seus clientes, os intermediários financeiros
desempenham uma papel de “monitor delegado” (delegated monitor) dos projectos
de investimento (Levine, 1997).
No entanto, como já vimos, Tsuru (2000) argumenta que uma relação de
proximidade entre credores e empresas financiadas poderá ser prejudicial para a
alocação de recursos de forma mais rentável. A existência de tais relações poderão
dar origem a uma ambiente menos competitivo em que o número de oportunidades
para ambas as partes é limitado pelos compromissos e relações assumidas. Este
fenómeno origina barreiras à entrada de novos concorrentes, tendo um impacto
negativo sobre o investimento.
Por outro lado, Dewatripont e Maskin (1995) argumentam que a monitorização e
disciplina pós-financiamento são menos rigorosos por parte dos intermediários, em
comparação com o papel de monitorização desempenhado por agentes nos mercados
de capitais. Com a intermediação poderá haver um incentivo para continuar a
financiar as empresas, mesmo que estas apresentem prejuízos devido à existência de
elevados sunk costs. Tsuru refere-se à crise asiática de 1997/8 para ilustrar este
fenómeno. Segundo este autor, durante esta crise haviam poucos incentivos para os
bancos terminarem projectos não rentáveis, devido aos sunk costs. Este fenómeno,
resultou na acumulação de crédito mal parado que colocou o sistema financeiro à
prova e atrasou o processo de recuperação. Argumenta-se que num sistema
caracterizado pelo financiamento por via do mercado de capitais, o impacto negativo
de uma crise é distribuído por um número elevado de agentes e investidores.
o Diversificação de riscos
Finalmente, a intermediação, contrariamente aos mercados de capitais, permite a
diversificação de riscos associados ao investimento. Ao permitir uma redução do
risco para cada nível de rentabilidade esperado, por via do investimento em
projectos diversificados, a intermediação poderá contribuir para a redução do risco
(Thiel, 2001).
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Mais especificamente, a intermediação permite a partilha de riscos intertemporais (o
risco associado a choques externos com efeitos pluri-anuais). Estes riscos são
diversificados pelos intermediários financeiros através de um processo de gestão de
provisões e reservas no médio e longo prazo (Allen e Gale, 1997).
3.iii) Os Mercados de Capitais
A literatura económica identifica vários mecanismos de transmissão entre o
desenvolvimento dos mercados de capitais e o crescimento económico. Estas teorias
centram-se no papel dos mercados de capitais na redução do risco de liquidez, na
mobilização de poupanças e na alocação eficiente de recursos.
o Redução do risco de liquidez
A existência de mercados de capitais permite a redução do risco de liquidez
associada a investimentos de longo prazo. Os mercados de capitais agregam um
grande número de opiniões divergentes sobre os projectos de investimento,
permitindo, por um lado, a determinação de uma posição ponderada sobre projectos
de longo prazo, e, por outro, a transferência entre investidores dos riscos associados
a este tipo de projectos. A redução de liquidez ajuda a fomentar o investimento em
projectos de longo prazo. Levine (1997) refere a importância dos mercados de
capitais no financiamento de projectos durante a revolução industrial.
Segundo Allen & Gale (1994) os mercados de capitais possibilitam aos investidores
uma intervenção directa na diversificação das suas carteiras de investimento e no
ajustamento da sua exposição ao risco de acordo com o seu grau de aversão ao risco.
Por outro lado, os autores também alertam para o facto de que os mercados de
capitais não são completos na medida em que não há total participação completa:
este sistema não permite a partilha de riscos entre gerações, dado que diferentes
gerações participam no mercado em diferentes momentos (Qi, 1994) e Fulghieri e
Rovelli (1998).
Em termos gerais, a redução de liquidez poderá não levar a um aumento do
investimento, embora eleve a rentabilidade dos capitais devido à redução do risco de
liquidez. Levine (1997) e Lerhavi e Srimvasai (1969) referem que o aumento da
rentabilidade dos capitais poderá reduzir a poupança com efeitos negativos sobre o
investimento.
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o Mobilização de poupanças e alocação de recursos
Um mercado de capitais desenvolvido pode substituir os intermediários financeiros
no papel de mobilização de recursos. A emissão de acções e obrigações representam
fontes alternativas de financiamento para as empresas em relação ao “tradicional”
crédito bancário.
Em particular, alguns autores (v.g. Thiel, 2001) salientam o papel dos mercados de
capitais no financiamento de projectos de maior risco. Já referimos como os
mercados de capitais permitem uma redução do risco de liquidez em projectos de
longo prazo. De forma semelhante, os mercados de capitais são tipicamente mais
aptos, em especial em momentos de maior optimismo económico, a financiar
projectos em novos sectores económicos. Thiel refere a importância dos mercados
de capitais, em particular nos EUA, durante os anos noventa no financiamento das
empresas dos sectores das Telecomunicações, Media e Tecnologia, na elevada taxa
de crescimento dos EUA nos últimos anos.
Por outro lado, o mesmo autor indica que há uma natural preferência por parte das
empresas destes sectores pelo financiamento no mercado de capitais. Thiel
argumenta que as empresas em novos sectores poderão recear a divulgação de
segredos comerciais e industriais se existirem relações privilegiadas com um
número reduzido de intermediários financeiros. Neste caso, estas empresas preferem
uma relação de maior distância para com os investidores (relação arm´s length).
O mercado de capitais permite a adopção de modelos de compensação que
estabeleçam uma relação entre o desempenho operacional e a remuneração de
gestores que poderá gerar uma melhoria do desempenho operacional das empresas e,
consequentemente, aumentando a rentabilidade dos capitais investidos (Diamond e
Verrechia, 1982; Jensen e Murphy, 1990). As empresas podem estabelecer critérios
de compensação de gestores que levem em conta o desempenho das suas acções.
Estas políticas ao contribuírem para uma melhor alocação e gestão de recursos, são
benéficas para aumentar a rentabilidade do capital.
o Redução de custos de supervisão de projectos de investimentos
O mercados de capitais aparenta evidenciar alguma desvantagem em relação em
relação à intermediação financeira em termos de minimização de custos de
supervisão. Teoricamente, o papel de monitorização é desempenhada por numerosos
investidores nos mercados de capitais, enquanto na intermediação financeira este
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papel é delegado num número menor de instituições. No entanto, Levine (1997)
chama a atenção de que a evolução das cotações poderá assumir o papel de monitor.
A evolução das cotações poderá sinalizar aos accionistas a necessidade de
pressionar os gestores à gestão eficiente dos projectos e ajudar os accionistas a
identificar problemas de gestão.
Outro tema associado à alocação dos recursos pelos mercados de capitais é o das
fusões e aquisições. Ao facilitar a transferência das empresas para proprietários que
maximizem o valor dos investimentos, o mercado de capitais gera uma eficiente
alocação de recursos e de factores de produção. No entanto, existem opiniões
divergentes sobre este tema. Segundo Stiglitz (1985), poderão existir perturbações
que desincentivem a realização de aquisições e fusões, nomeadamente, o problema
de free riding, uma situação em que algumas empresas, que não sejam o oferente (a
empresa que pretende adquirir outra), aproveitam o facto deste ter anunciado um
preço ao qual está disposto a adquirir a empresa alvo, para lançar uma oferta a um
preço superior, visto não incorrerem em custos de análise do valor da empresa a
adquirir. Este fenómeno desincentiva a recolha da informação necessária para tomar
decisões sobre operações de concentração, pondo em risco a qualidade da análise
económica que deveria justificar a operação, ou simplesmente, inibe a realização de
operações desta natureza. Outro problema identificado por este autor é a frequente
oposição dos gestores que poderá dificultar a realização de operações de
concentração. Por último, se os accionistas esperam que a operação resulte em
poupanças que levem a uma subida das acções, terão relutância em alienar as suas
posições, impedindo o sucesso destas operações.
Outros autores identificam outras questões que influem sobre os potenciais efeitos
positivos associados às operações de concentração, nomeadamente a possibilidade
de que operações de concentração levem a quebra de acordos entre stakeholders
(agentes interessados na situação económica e financeira das empresas, v.g. clientes,
fornecedores, trabalhadores, governo, etc.). A quebra destes acordos poderá originar
transferências de riqueza entre stakeholders com impactos imprevisíveis e
potencialmente negativos sobre a alocação de recursos.
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3.iv) Evidência Empírica
Nos últimos anos foram publicados vários estudos empíricos que procuram
demonstrar a existência de uma relação efectiva e de primeira ordem entre o
desenvolvimento do sistema financeiro e o crescimento económico.
Os trabalhos de Thiel (2001), Tsuru (2000) e Levine (1997), entre outros, incluem
levantamentos dos estudos mais importantes relacionados com este tema.
Da nossa parte, pretendemos fazer um resumo destes estudos em termos dos dados,
modelos, métodos e conclusões obtidos.
Goldsmith (1969) foi dos primeiros economistas a realizar um estudo econométrico
sobre a relação entre o desenvolvimento económico e o desenvolvimento financeiro.
O estudo revelou que existe um paralelismo entre desenvolvimento financeiro e
desenvolvimento económico. No entanto, o trabalho revelou algumas lacunas, de
acordo com Levine (1997) e Thiel (2001). Em particular, o estudo não se debruçou
sobre a direcção da causalidade, nomeadamente se o crescimento económico é
influenciado pelo desenvolvimento do sistema financeiro ou vice versa.
Nos últimos anos, os estudos têm abordado um número crescente de variáveis
associadas ao desenvolvimento do sistema financeiro em particular, explorando a
importância dos mercados de capitais – e não apenas relacionados com o sector
bancário – para o crescimento económico.
No final dos anos noventa, vários estudos foram feitos usando essencialmente três
tipos de métodos econométricos, a saber: a) regressão de dados cross section (v.g.
King e Levine (1993), Levine e Zervos (1998)); b) regressão de dados painel (v.g.
Bassanini et al (2001), Leahey et al (2001)); e, c) análise de cointegração e
causalidade Granger (v.g. Rousseau e Wachtel (1998), Shan et al (2001)).
Os estudos econométricos com base em dados cross section procuram estabelecer
uma relação entre variáveis que são representativas do desenvolvimento do sistema
financeiro (v.g. crédito concedido, capitalização bolsista, volume transaccionado em
bolsa, margens de intermediação financeira, entre outros) e o crescimento
económico, tipicamente representado pelo crescimento do Produto Interno Bruto, a
Formação Bruta de Capital Fixo ou a produtividade dos factores de produção.
Normalmente, estes estudos incluem dados de um número elevado de países.
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A maior parte destes estudos encontram uma relação entre, pelo menos, algumas das
variáveis representativas do desenvolvimento do sistema financeiro e as variáveis
dependentes. No caso de King e Levine (1993), os coeficientes das variáveis
explicativas (passivos líquidos em percentagem do PIB, crédito bancário dividido
por depósitos e créditos do banco central, passivo do sector privado não financeiro,
passivo total do sector privado em percentagem do PIB) são estatisticamente
significativas numa regressão em relação ao crescimento real do PIB per capita. Um
dos problemas destes estudos é a dificuldade em comprovar estatisticamente o
sentido da causalidade com resultados de regressões cross section.
Os estudos econométricos que usam dados painel são os mais recentes, talvez
devido à complexidade do tratamento estatístico das regressões. As aplicações
estatísticas (v.g. TSP, etc.) só recentemente incluíram funcionalidade nos seus
programas que permitem o tratamento destes dados. A utilização de dados painel
permite estudar a relevância da relação, quer ao longo do tempo quer através de
múltiplas entidades (países neste caso), entre o desenvolvimento financeiro e o
crescimento económico. Tal como no caso dos estudos cross section, estes estudos
têm identificado uma relação estatisticamente significativa entre variáveis
representativas do desenvolvimento do sistema financeiro e o crescimento
económico.
Os testes de cointegração e causalidade Granger procuram determinar o sentido da
causalidade entre agregados do sistema financeiro e o crescimento económico.
Usando métodos estatísticos, têm-se provado que o sentido da causalidade corre –
nalguns casos unicamente - do desenvolvimento do sistema financeiro para o
crescimento económico (Rousseau e Wachtel (1998), Shan et al (2001), entre
outros). Uma limitação destes estudos é que têm sido realizados com dados de um
número relativamente reduzido de países.
Neste trabalho, optámos por usar dois métodos – um estudo econométrico com
dados painel – e um estudo de cointegração e causalidade Granger, como se
apresenta mais à frente.
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3.iv) Outros aspectos influentes no funcionamento dos sistemas financeiros
Importa também discutir que tipos de factores se identificam, a uma escala
microeconómica, passíveis de afectar a eficiência da interligação entre sistemas
financeiros e desenvolvimento económico. A importância destes reside no
enriquecimento da interpretação de resultados macro ao nível mais fundamental e
desagregado da interacção entre os vários agentes económicos envolvidos no estudo
em questão. Em particular, vários autores têm, recentemente, sublinhado a
importância da correcta compreensão desses mecanismos na abordagem ao
problema. É o caso de Carlin e Mayer (1999) e Levine, Loayza e Beck. Nestes
estudos identificam-se vários factores que interagem para criar diferenças a nível
micro e macroeconómico que podem ser significativas na explicação de diferentes
taxas de crescimento económico, em países ou áreas económicas com diferentes
características.
Embora o nosso estudo não continue esta abordagem num plano econométrico,
parece-nos oportuna a discussão desses factores, como base para eventuais críticas
aos nossos próprios resultados ou ainda como vector possível de abordagem em
estudos futuros.
O estudo mencionado de Carlin e Mayer procura clarificar se diferentes estruturas
nos sistemas financeiros, diferentes tipos de propriedade do capital privado
(nomeadamente, empresas) e diferentes legislações podem criar (des)vantagens
comparativas que influenciem o tipo de actividade económica de países ou
agrupamentos de países similares, assim lançando uma ponte para uma melhor
interpretação do porquê de diferentes taxas de crescimento económico nesses alvos
de estudo.
a) Concentração e dispersão de propriedade nas empresas
Franks e Mayer (1998) já tinham reportado marcadas diferenças na concentração de
propriedade: “O Reino Unido e os Estados Unidos possuem amplos sectores da
economia cotados em bolsa, com dispersão da propriedade num grande número de
investidores. No caso do Reino Unido, os grupos accionistas dominantes são
constituídos por investidores institucionais; nos Estados Unidos, por investidores
individuais. Em contraste, a França e a Alemanha possuem menos sectores da
economia cotados em bolsa. Mais significativamente, até as maiores companhias
cotadas possuem pelo menos um accionista com quota superior a 25% ou,
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frequentemente, uma posição maioritária. Este fenómeno surge geralmente
associado a investidores institucionais ou a famílias.” Laporta, Lopez-de-Silanes e
Shleifer (1998), também reportam este aspecto.
Noutro artigo, Carlin e Mayer (1999b), acrescentam que “actividades que requerem
um grau muito elevado de investimento irreversível por parte dos accionistas, em,
por exemplo, formação de capital humano ou informação sobre mercados de
clientes, beneficiam de estruturas accionistas mais concentradas e de maior
compromisso, do que com uma estrutura de propriedade dispersa”. No entanto, o
comprometimento atrás referido implica, quase sempre, uma menor flexibilidade. É
desta forma que a concentração de propriedade surge mais associada a actividades
com margem para investimentos de continuidade (imitativos) ou de inovação
incremental, e que a dispersão de propriedade surge mais próxima de actividades
que requerem um grau mais elevado de mudança (por exemplo, a adopção de
tecnologias de diferente geração). Podem discutir-se as vantagens e desvantagens de
cada sistema de propriedade mas o que parece ser evidente é que cada um fomenta o
desenvolvimento em eixos distintos, o primeiro em actividades bem consolidadas ou
tradicionais e, o segundo, numa inovação talvez mais próxima ao state-of-the-art.
Entre as vantagens e desvantagens dos sistemas de propriedade discutidos, podemos
identificar as seguintes:
- Algumas possíveis vantagens dos sistemas de propriedade concentrada:
maiores compromissos com o passado, o que pode, nalguns casos, conduzir a
modelos de gestão mais focados no médio/longo prazo e não rentáveis no curto
prazo, com favorecimento à obtenção de rentabilidade em investimentos
avultados na formação bruta de capital fixo, na expansão a novos mercados, ou
na adopção de tecnologias mais eficientes; maior estabilidade na condução da
gestão e menor vulnerabilidade a operações de aquisição por terceiros; se
associados a um sistema financeiro em que as entidades bancárias assumam o
papel de fonte principal de financiamento externo, a oportunidade de realização
de projectos que podem não ser rentáveis no curto prazo, mas que o podem ser
no médio/longo prazo.
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- Algumas possíveis desvantagens dos sistemas de propriedade concentrada:
eventual menor capacidade de resposta a mudanças súbitas nas estruturas de
mercado; maior resistência a mudanças de fundo como investimentos em
tecnologias de grande potencial inovador mas não inteiramente testadas ou
comprovadas.
Em particular, é de salientar que este tipo de estrutura de propriedade surge
associada, em países como a França ou a Alemanha, a sistemas bancários fortes,
assumindo uma posição preponderante na estrutura dos sistemas financeiros,
particularmente no caso alemão. Isto pode ser relevante na medida em que a
tendência natural desses agentes institucionais será o da minimização do risco
relativo aos créditos concedidos; o risco de investimentos de continuidade ou em
inovação incremental é geralmente baixo a moderado enquanto o risco do
investimento em I&D ou em tecnologias radicalmente diferentes será
tendencialmente maior.
- Algumas possíveis vantagens dos sistemas de propriedade dispersa: maior
reactividade face às mudanças dos mercados de produtos ou serviços, o que
pode assegurar maiores níveis de competitividade; menor resistência às
mudanças ou a reestruturações, por ausência de compromissos passados ou
presentes com blocos accionistas de dimensão suficiente; maior facilidade no
financiamento de projectos de I&D ou no emprego de tecnologias mais
inovadoras e até menos testadas.
- Algumas possíveis desvantagens dos sistemas de propriedade dispersa: maior
transparência (sociedades cotadas), logo maior vulnerabilidade a operações de
aquisição hostis; gestão tendencialmente mais focada no curto prazo e na
obtenção rápida de resultados, o que pode dificultar a aposta em projectos mais
complexos, que exijam um apoio sustentado no tempo e com retornos não
imediatos;
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b) Distintas estruturas financeiras
Dewatripont e Maskin (1995) salientam o facto da descentralização de sistemas
financeiros com múltiplos bancos imporem maiores restrições orçamentais do que
sistemas mais centralizados ou com menor número de bancos. Apresentam como razão
para isso o facto dos bancos em sistemas mais descentralizados não possuírem os
recursos adequados ao refinanciamento de projectos de investimento que não sejam bem
sucedidos no curto prazo. Os sistemas com múltiplos bancos são portanto superiores ao
imporem maiores restrições financeiras a projectos ineficientes, mas podem incorrer
numa perspectiva que privilegia quase unicamente o curto-prazo, ao apoiar
deficientemente projectos eventualmente lucrativos no longo prazo. Acrescentamos que,
no limite, um sistema com múltiplos bancos, com um número de bancos a tender para o
infinito, se aproximará funcionalmente de um mercado de capitais, na forma como
financia os projectos.
Huang e Xu (1998) focam o mesmo fenómeno que Dewatripont e Maskin mas a partir
de uma perspectiva de grau de incerteza, por oposição ao período de gestação dos
projectos. Estes autores prolongam a análise aos sistemas de estrutura de propriedade
salientando que sistemas de elevada dispersão de propriedade têm também a
característica de imporem maiores restrições orçamentais focando-se nos resultados de
curto prazo para a tomada de decisão sobre o refinanciamento de projectos. Ao invés,
quando os riscos são mais baixos, então investidores únicos oferecem financiamento a
menores custos.
Sistemas com múltiplos bancos e de propriedade dispersa surgem assim associados a
indústrias que dão mais relevo à I&D enquanto que sistemas mais concentrados surgem
mais próximos a níveis de risco mais baixos ou a investimentos imitativos. O último
tipo de estruturas parece ser mais vulgar em fases mais iniciais de desenvolvimento,
enquanto que sistemas com múltiplos bancos ou de grande diversidade de estrutura
surgem associados a fases mais avançadas de desenvolvimento que requerem
investimentos mais intensivos em I&D de alto risco.
19
No patamar de análise, a da dinâmica de desenvolvimento dos sistemas financeiros, é
interessante notar que Allen e Gale (1995) recorrem da decisão de países como o Japão
e a França de se moverem dos sistemas financeiros em que os bancos têm maior
importância, em direcção a sistemas mais baseados nos mercados de títulos. Esta
decisão levanta a questão se sistemas mais assentes em mercados de capitais propiciam,
de facto, maiores estímulos ao desenvolvimento económico no longo prazo.
Existem portanto alguns indícios que tornam válida a questão de tentar saber se os
mercados de capitais constituem a melhor opção para o desenvolvimento económico,
pelo menos a partir de um determinado ponto de desenvolvimento, apesar de
apresentarem desvantagens ao nível da vulnerabilidade das poupanças das famílias, e,
portanto, de constituírem uma eventual pior solução ao nível do bem-estar social.
c) Assimetrias de informação
Carlin e Mayer (1999b) salientam o papel importante dos bancos na monitorização de
investimentos pelas economias de escala geradas na dimensão e pela redução de custos
na reunião de informação. Por outro lado, como salienta Allen (1993) os sistemas
financeiros onde o mercado bolsista é mais importante oferecem a vantagem de agregar
diferentes opiniões sobre projectos e investimentos em curso, sendo portanto superiores
na promoção de investimentos em relação aos quais existe maiores diferenças de
opinião quanto ao sucesso esperado (maior risco, maior período de gestação e/ou maior
incerteza).
Nos sistemas financeiros baseados mais preponderantemente nos mercados de capitais,
existe portanto pelo menos, uma simetria de informação induzida pelo próprio sistema
através da agregação de opiniões distintas mas concorrentes para um mesmo foco de
investimento, fenómeno que pode não acontecer ao mesmo nível noutros tipos de
sistemas, nomeadamente no caso alemão.
d) Estruturas de suporte legislativo
Laporta, Lopez-de-Silanes, Shleifer e Vishny (1997) argumentam que a natureza e
operação dos sistemas financeiros se relacionam com diferentes graus de protecção aos
investidores. As regras legais variam sistematicamente de país para país, mas as
principais agrupam-se entre os países de tradição legal inglesa, francesa, alemã ou
escandinava. Os países de tipo common law da tradição Inglesa protegem mais os
accionistas e os credores, em geral. Os países de tradição legal francesa são os que
menos protegem os accionistas e credores, e os países de tradição alemã e escandinava
20
situam-se no meio termo entre os de tradição legal inglesa e francesa. O colonialismo
(onde se incluem os descobrimentos portugueses) e os fenómenos imperialistas como a
expansão do império Napoleónico, foram os factores relevantes à expansão destes
diferentes sistemas a inúmeros países no mundo, factos de natureza globalizante que os
tornam importantes para análise.
Laporta et al., sublinham que uma maior protecção legal de accionistas e credores apela
menos à necessidade da concentração de propriedade, aumentando o acesso das
empresas ao financiamento externo e reduzindo os custos de capital (maior eficiência).
Também Tsuru (2000) faz algumas observações relativas à possível importância da
origem legal no desenvolvimento e diferenciação dos sistemas financeiros. Segundo
Tsuru, entre os países da OCDE, os que são de origem legal francesa são os que
possuem a pior qualidade legal em termos de protecção dos accionistas, credores,
cumprimento das leis e requisitos contabilísticos. Segundo o mesmo autor, os países de
origem legal inglesa possuem as leis mais favoráveis à protecção de accionistas,
enquanto os países de origem legal alemã as melhores leis relativamente à protecção dos
credores e os países de origem legal escandinava aqueles onde o cumprimento das leis é
mais rigoroso, sendo igualmente o lote de países com requisitos mais exigentes relativos
à informação contabilística divulgada pelas empresas.
e) Qualidade da informação de domínio público e eficiência dos sistemas jurídicos
Levine, Loayza e Beck salientam num dos seus artigos que a eficiência do sistema
judicial ao fazer cumprir as leis em tempo útil parece ser ainda mais importante que a
estrutura formal dos diferentes sistemas legais. Países com maior eficiência no
cumprimento das leis relativas à protecção de credores tendem a possuir sistemas
financeiros mais desenvolvidos do que países onde o cumprimento da lei é menos
vigoroso. Para além disso, mostram que a divulgação de informação
contabilística/financeira rigorosa é importante para o desenvolvimento financeiro.
Países onde as empresas publicam informação detalhada e rigorosa sobre o seu estado
financeiro têm tendência a aparecer associados a sistemas financeiros mais
desenvolvidos do que países onde a informação publicada é insuficiente, pouco
detalhada ou de menor credibilidade.
21
Afirmam Allen e Gale (1995) que a disponibilidade e acessibilidade à informação
geram um mercado para o controlo de empresas que não existe em sistemas mais
“blindados” ou “opacos” típicos de alguns países na Europa Ocidental. Se, num cenário
de informação empresarial mais acessível, uma empresa chega à conclusão de que outra
empresa que lhe pode ser útil está, a um determinado momento, sub-avaliada, pode
tentar adquirir essa empresa, mesmo perante o desacordo da administração visada por
essa operação de compra. Como referem Allen e Gale, a existência e facilidade de
acesso à informação ajudam as empresas a tomar melhores decisões de investimento,
sobre, por exemplo, a entrada num determinado ramo industrial ou a opção pela não
entrada. Este papel de alocação rápida de informação, mais presente em sistemas
financeiros baseados nos mercados de capitais e em países onde a concentração de
propriedade é dispersa, é visto como uma das funções mais importantes desses tipos de
sistemas, sendo também através dessa faceta que são transferidas para as empresas as
pressões para mudanças radicais de curto prazo que por vezes a adaptação rápida ao
mercado exige.
A existência de um mercado dinâmico de controlo corporativo influencia certamente os
padrões de crescimento de empresas e afecta a sua tomada de decisões estratégicas,
sendo mais um elemento diferenciador que pode “especializar” o crescimento
económico num eixo distinto por comparação a sistemas onde esta oportunidade é
dificultada ou muito reduzida (onde não existe um mercado tão liberal de controlo
corporativo).
3.v) Alguns resultados
Como complemento ao que foi exposto no ponto 3.iv, fazemos uma breve revista a
alguns autores e procedemos à apresentação de alguns resultados concretos.
Carlin e Mayer (1999a)
Os autores acima foram os primeiros, em 1999, a levar a cabo estudos empíricos sobre a
relação entre a composição da actividade económica e o tipo de sistemas financeiros,
empresariais ou legislativos em vigor. Para analisar a hipótese de que diferentes
sistemas poderiam favorecer indústrias com diferentes características, examinaram a
relação entre tipos de sistemas, a natureza das diferentes indústrias e os níveis de
actividade dessas indústrias nos países de análise.
22
Para tal, utilizaram uma amostra constituída por 14 países da OCDE e 27 grandes
indústrias entre os períodos de 1970 e 1995.
Entre outros resultados, encontraram:
• Uma correlação positiva entre a capitalização de mercado/PIB e as exigências
dos padrões contabilísticos
• Uma correlação positiva entre os elos banco-empresa (medidas pelo grau de
participação bancária em empresas não-financeiras) e a razão do crédito
privado/PIB
Por contraste descobriram ainda correlações negativas entre:
• As exigências dos padrões contabilísticos e a razão de crédito privado/GDP
• As exigências dos padrões contabilísticos e a concentração de propriedade
• A concentração de propriedade e o tamanho do sector bancário
Segundo afirmam Carlin e Mayer, os seus resultados são consistentes com as teorias de
Dewatripont e Maskin (1995) e Huang Xu (1998), que sustentam que sistemas de
mercado estão associados ao maior crescimento de indústrias dependentes de
financiamento através do mercado de capitais e que realizam maiores investimentos na
especialização e formação de recursos. Concentrações de propriedade surgem assim
associadas ao crescimento em indústrias que requerem menores investimentos de
especialização/formação de recursos.
Porém, o tipo de conclusões varia quando se começam a considerar países em diferentes
fases de crescimento económico.
Uma análise levada a cabo em 4 países menos desenvolvidos (seleccionados por menor
PIB per capita em 1970 que os 14 países analisados por Carlin e Mayer) mostra nesse
caso que elevados níveis de concentração de propriedade estão associados a menores
taxas de crescimento em indústrias mais dependentes de financiamento externo e
investimentos em especialização/formação.
De acordo com Huang e Xu (1998) e mesmo Gerschenkron’s (1962), as mais baixas
restrições/controlo orçamentais associadas a maior concentração de propriedade agem
como potencial desvantagem para as indústrias dos países em desenvolvimento. O papel
dos bancos nas fases iniciais do desenvolvimento parece também ser um dado a
considerar, de acordo com Huang e Xu (1998b). Existe evidência de maiores taxas de
crescimento em indústrias cujo financiamento externo depende mais dos bancos, em
23
países em desenvolvimento. Este fenómeno não se verifica em países mais
desenvolvidos.
Em resumo, Carlin e Mayer descrevem de que forma sistemas mais baseados nos
mercados de capitais e propriedade dispersa surgem mais associados a actividades de
risco mais elevado do tipo I&D, onde a imposição de maiores restrições/controlo
orçamentais se verifica. Os sistemas mais apoiados na estrutura bancária e aqueles onde
existe grande concentração de propriedade surgem por sua vez mais associados a
investimentos de mais longo prazo e de natureza mais imitativa, já que os
compromissos para com blocos accionistas ou gestores é superior, o que tende a
moderar o grau de mudança imposto.
Sistemas orientados para o mercado estão igualmente associados a maiores
crescimentos de indústrias mais dependentes de financiamento externo ou indústrias
altamente especializadas, sendo o veículo desse crescimento o esforço desenvolvido em
I&D. Ao invés, maiores concentrações de propriedade surgem associadas ao maior
crescimento de indústrias em países menos desenvolvidos, mas não em países
desenvolvidos e, para esse caso, o veículo desse crescimento já não assenta na I&D.
Este tipo de resultados tem um potencial impacto na definição de políticas. Em
particular, podem querer implicar que não existe necessariamente uma política
financeira dominante e que possa ser aplicada por igual a todas as economias ou a todas
as indústrias. O que pode ser indicado para uma determinada economia pode também
não ser indicado para outra. O que é mais apropriado para uma economia mais rica em
I&D pode ser completamente desadequado a uma economia de natureza mais imitativa.
Thorsten Beck, Ross Levine e Norman Loayza
Levine et al. referem que “os países que mais eficientemente impõem o cumprimento
das leis, tendem a possuir sistemas financeiros mais avançados que países onde esse
cumprimento é menos eficiente”.
Levine et al. concluem com o seguinte: “Países com leis que dão uma elevada
prioridade aos credores das firmas, associados a sistemas legais que reforçam o efectivo
cumprimento dessas leis e que possuem critérios contabilísticos capazes de fazer as
empresas produzir informação comparável e de alta qualidade para o uso de
intermediários financeiros, tendem a possuir intermediários financeiros mais
desenvolvidos”.
24
4) Estudo empírico sobre a relação entre o desenvolvimento do sistema financeiroe o crescimento económico
4.i) Estudo empírico de 25 países com dados painel
o Introdução
Neste ponto do trabalho pretendemos provar, com base em dados recolhidos para vários
países referentes ao período 1960-1999, a importância do sector finaneiro na explicação
do crescimento económico. Para tal, como já foi referido anteriormente, recorremos a
uma estimação usando dados de painel e a um estudo de causalidade utilizando análise
de cointegração e de causalidade à Granger.
O propósito desta forma de organização é o de dar, numa primeira fase, uma ideia geral
acerca da relevância do sector financeiro como factor explicativo do crescimento
económico nos países desenvolvidos, por um lado, e nos países em desenvolvimento,
por outro, e, numa segunda fase, de provar para um grupo de países tomados
individualmente que essa relação de causa-efeito efectivamente existe.
o As variáveis
À luz do referido em pontos anteriores (ver secção 3.i), podem definir-se dois
subsectores dentro do sector financeiro, o dos intermediários financeiros e o do
mercados de capitais. As variáveis escolhidas servem como proxi à dimensão destes,
nomeadamente, a capitalização bolsista e o crédito concedido a privados,
respectivamente.
o Os países
A escolha de países é pacífica. Foram introduzidos na análise os países dos três grandes
blocos mundiais, EUA, Japão e EU, que designaremos por países desenvolvidos, e
alguns países em desenvolvimento. Fazem então parte da análise empírica os 25 países
apresentados no Quadro I.
Quadro I – Países
Países DesenvolvidosÁustria
AlemanhaBélgica
DinamarcaEspanha
EUA
GréciaHolandaIrlandaItáliaJapão
LuxemburgoPortugal
Países em DesenvolvimentoArgentina
BrasilCoreia
FilipinasÍndia
Malásia
25
FinlandiaFrança
Reino UnidoSuécia
MéxicoTailândia
o Dados painel
Usando um conjunto alargado de observações foram estimadas várias regressões1, cuja
utilidade é a de explicar, para um conjunto diferenciado de países, o efeito do sistema
financeiro como um todo e de cada instrumento caracterizador de cada subsistema no
produto interno bruto, tentando justificar os diferentes valores assumidos pelos
coeficientes. Os dados são apresentados em valores constantes em USD para 19952.
Para isso teremos por base a seguinte equação:
LnPIBit=âi +áLn Xit +ãLn Zit + uit
Xit – Valores assumidos pelas Variáveis proxi do desenvolvimento do sector financeiro no momento t nopaís i.
Foi utilizado um modelo do tipo log-linear, usando como variável explicativa o
desfasamento da variável dependente (Zit), visto terem sido alcançados resultados de
uma forma geral mais satisfatórios, nomeadamente no que concerne aos valores
assumidos pelo R2 e R2 ajustado. Por outro lado, dados os objectivos propostos para este
ponto, consideramos esta modelização satisfatória.
A modelização com base em dados de painel permite aferir se os vários países
considerados têm todos a mesma variável dependente (pooled), ou seja, partem todos do
mesmo patamar, se existem de facto diferenças entre eles e que esta não seja
correlacionada com as variáveis explicativas (efeitos aleatórios) ou ainda se, havendo
diferenças, existe uma correlação entre a variável dependente e a constante (efeitos
fixos). Este último caso é o mais utilizado pelo econometristas por admitir na sua
modelização que variáveis explicativas importantes foram omitidas.
Os principais resultados alcançados são a seguir apresentados.
1 Utilizou-se para o efeito o TSP, versão 4.5, 1999.2 A Fonte dos dados sobre o PIB e Crédito Privado é o World Economic Indicators (2001) do BancoMundial, complementado por dados retirados do International Financial Yearbook (1998, 1999, 2000) doFundo Monetário Internacional.
26
o Impacto do crédito no produto
Quadro III
Países Desenvolvidos Países em Desenvolvimento
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
âi
0.084(3.746)**
0.262(4.988)**
0.721(2.605)**
0.018(-0.043)
Á-0.004
(-1.498)0.011
(2.007)*-0.126
(-3.274)**0.037
(0.169)0.218
(4.159)**0.069
(0.069)*
Ã1.003
(282.647)**0.951
(110.157)**1.004
(190.176)**0.969
(58.557)**0.857
(30.005)**0.93
(45.037)**
R2 0.999 0.999 0.999 0.981 0.982 0.980
F3 - 12,140** - - 4,408** -
Teste Hausman4 - -77.453**
(2)5 - -15.104**
(2)
*, ** rejeita-se a hipótese nula (coeficiente igual a zer) a 10% e 5% de significância, respectivamente.
Começando pela análise do testes efectuados constata-se que, de acordo com a
estatística F, os efeitos individuais de cada país, traduzidos na constante, não são todos
iguais como o admitido no modelo pooled, mas sim diferentes, como o assumido no
modelo de efeitos fixos. A interpretação que retira-se deste teste é a de que as
especificidades de cada país são importantes na explicação do crescimento do produto,
pelo que não devem ser ignoradas. Por outro lado, o teste de Hausman indica que,
comparativamente com o modelo de efeitos aleatórios, o modelo de efeitos fixos é
preferível. A diferença fundamental dos dois modelos é que o de efeitos fixos, é valido
para modelos em que estão omissas algumas das variáveis importantes e considera a
existência de autocorrelação entre a constante com a matriz X6 (valores proxi do
desenvolvimento do sector financeiro). Este resultado é, de acordo com Johnston e
DiNardo (1997), o mais realista pois é pacífico admitir-se que, além das características
de cada país serem importantes, estas encontram-se correlacionadas com as variáveis
explicativas, por estarem omissas no modelo alguns factores explicativos.
3 Testa na hipótese nula o modelo pooled contra o modelo que efeitos fixos.4 Testa na Hipótese nula o modelo de efeitos aleatórios contra o modelo de efeitos fixos.5 Graus de liberdade da distribuição da Qui-quadrado.6 Vide Jonhson e DiNardo (1997).
27
Comparando agora os valores dos coeficientes da variável proxi do desenvolvimento do
sector financeiro, é de notar que, para os países em desenvolvimento este assumem
valores superior. A justificação pode residir no facto da capacidade de crescimento
destes países ser superior, ou seja, o impacto do desenvolvimento dos intermediários
surta um maior efeito no produto.
Denota-se igualmente que a 5% de significância o crédito não é considerado uma
variável pertinente na explicação do produto dos países desenvolvidos.
o Impacto da capitalização bolsista no produto
Quadro IV
Países Desenvolvidos Países em Desenvolvimento
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
âi0.111
(4.719)**0.129
(3.374)**1.459
(2.746)**4.597
(6.327)**
Á0.692
(6.462)**0.014
(6.080)**0.082
(0.008)**0.099
(5.044)**0.205
(9.532)**0.178
(8.796)**
Ã0.99
(657.48)**0.944
(62.335)**0.988
(470.522)**0.851
(28.385)**0.557
(12.308)**0.652
(16.832)**
R2 0.999 0.999 0.999 0.962 0.978 0.95
F - 3,3642** - - 9,9931** -
Teste Hausman - -9.3859**
(2)- -
17.328**(2)
*, ** rejeita-se a hipótese nula (coeficiente igual a zero) a 10% e 5% de significância, respectivamente.
Seguindo o mesmo critério do adoptado no caso anterior escolheu-se o modelo de
efeitos fixos. Dos resultados apresentados verifica-se que também no que se refere à
capitalização bolsista o coeficiente é superior para os países em desenvolvimento. A
interpretação é semelhante à avançada para do crédito: a uma variação percentual da
capitalização bolsista, o produto destes países reage mais, comparativamente com os
países desenvolvidos, visto partirem de um patamar inferior.
Contrariamente ao verificado no caso do crédito, esta variável é significativa na
explicação do produto tanto nos países desenvolvidos como nos países em
desenvolvimento.
28
o Impacto do crédito e da capitalização bolsista no produto
Quadro V
Países Desenvolvidos Países em Desenvolvimento
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
âi0.108
(3.756)**0.135
(3.097)**0.27
(0.4354)1.266
(1.146)
á1 (Crédito)0.003
(0.694)0.008
(1.375)0.003
(0.726)0.112
(3.169)**0.378
(2.996)**0.219
(3.847)**
á2 (CapitalizaçãoBolsista)
0.006(5.690)**
0.016(6.491)**
0.008(5.631)**
0.137(6.187)**
0.176(7.762)**
0.181(9.419)**
Ã0.99
(216.864)**0.913
(48.819)**0.985
(179.325)**0.746
(17.090)0.471
(9.119)**0.553
(12.310)**
R2 0.999 0.999 0.999 0.966 0.981 0.96
F - 3,471** - - 9,812** -
Teste Hausman - -16.425**
(3)- -
14.351**(3)
*, ** rejeita-se a hipótese nula (coeficiente igual a zer) a 10% e 5% de significância, respectivamente.
Colocando numa única regressão o crédito e a capitalização bolsista algumas
considerações interessantes podem ser tecidas. Antes de avançar com a interpretação
dos valores importa salientar que, atendendo aos valores assumidos pelos testes F e de
Hausman, o modelo apreciado é o de efeitos fixos.
Agora, olhando para as estimativas dos coeficientes constata-se que os valores
assumidos para os países emergentes são superiores para as variáveis explicativas do
desenvolvimento do sector financeiro.
Para os países desenvolvidos verifica-se igualmente que o crédito não é considerado
significativo na explicação do produto. Isto poderá dever-se à existência de um conjunto
de outros factores mais importantes na explicação do produto. Thiel (2001) alerta para o
facto do crédito não ser exclusivamente utilizado em investimento produtivo, podendo
ser aplicado em projectos sem impacto significativo no crescimento económico. O
mesmo autor refere que a capitalização bolsista está fortemente correlacionada com o
valor dos capitais angariados nos mercados, via ofertas públicas de venda e aumentos de
capital. É assim possível que estes fundos sejam aplicados em investimentos produtivos
em sectores de elevado potencial de crescimento, conforme teorizado por Carlin e
Mayer, e Thiel.
29
o De acordo com as características de cada sector financeiro
Recorrendo ao agrupamento, proposto por Tsuru (2000), dos países cujos sistemas
financeiros são determinados pelos diferentes sistemas legais identificados por La Porte
et. al (1997) e referidos na secção 4, fez-se uma nova classificação dos países com base
na predominância dos intermediários financeiros ou do mercado de capitais no sistema
financeiro. Com esta divisão, apresentada no Quadro VI, pretende-se validar o impacto
das diferentes estruturas do sistemas financeiro na eficácia do desenvolvimento do
sistemas financeiro como factor explicativo do crescimento económico.
Quadro VI
Países com sistemas orientados para aintermediação financeira
Alemanha
Áustria
Bélgica
Espanha
Finlândia
Grécia
Índia
Itália
Portugal
Países com sistemas orientados para o
mercado de capitais
EUA
Malásia
México
Reino Unido
30
o Impacto do crédito no produto
Quadro VII
Países com sistema orientado para aintermediação financeira
Países com sistema orientado para oMercado de Capitais
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
âi0.271
(8.114)**0.505
(8.138)**0.517
(3.291)**0.441
(1.786)
á10.008
(3.147)**-0.011
(-2.083)*-0.006
(-1.607)-0.003
(-0.221)0.022
(0.876)0.013
(0.632)
ã0.984
(403.63)**0.983
(140.513)**0.988
(210.55)**0.986
(82.908)**0.961
(55.409)**0.972
(64.322)**
R2 0.999 0.999 0.999 0.998 0.998 0.998
F - 8,253** - - 5,07** -
Teste Hausman - -28.981**
(2)- -
1.5274(2)
*, ** rejeita-se a hipótese nula (coeficiente igual a zer) a 10% e 5% de significância, respectivamente.
o Impacto da capitalização bolsista no produto
Quadro VIII
Países com sistema orientado para aintermediação financeira
Países com sistema orientado para oMercado de Capitais
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
PooledEfeitosFixos
EfeitosAleatórios
âi0.115
(2.35)**0.137
(1.849)*0.515
(2.176)*0.961
(2.151)*
á10.007
(3.479)**0.014
(3.769)**0.008
(3.615)**0.013
(0.811)0.101
(3.505)**0.0356(1.676)
ã0.989
(352.475)**0.932
(31.681)**0.989
(269.834)**0.969
(48.62)**0.675
(8.973)**0.931
(30.706)**
R2 0.999 0.999 0.999 0.995 0.996 0.995
F
Teste Hausman - -4.007
(2)- -
13.934**(2)
*, ** rejeita-se a hipótese nula (coeficiente igual a zer) a 10% e 5% de significância, respectivamente.
31
Da análise dos quadros VII e VIII retira-se que o crédito é um factor pouco
preponderante para a explicação do crescimento económico e, tendo em conta o valor
que o coeficiente assume para os países com sistemas baseados no sector bancário,
poderá mesmo ter impactos negativos. Isto poderá dever-se a algumas ineficiências já
abordadas em pontos anteriores deste trabalho, nomeadamente as criadas a partir de
relações de longa data entre o sector bancário e as empresas.
No que concerne à Capitalização Bolsista, é notório que esta tem efeitos positivos na
economia permitindo que os países, principalmente aqueles cujos sistemas estão mais
orientados para o Mercado de Capitais, ganhem uma grande dinâmica.
Importa salientar que, para os casos do impacto do crédito em países com sistemas
orientados para o Mercado de Capitais e do impacto da Capitalização Bolsista para
países com sistemas orientados para o sector bancário, deveria ser utilizado, como
consequência das estatísticas assumidas pelo teste de Hausman, o modelo de efeitos
aleatórios. Contudo, dada a interpretação avançada para os três tipos de modelização e
visto que os resultados apresentados pelo TSP implicam que algumas reservas devam
ser tidas em consideração na análise das estatísticas de teste, considerou-se pertinente
continuar a avaliar o modelo de efeitos fixos.
o Conclusões
Deste ponto do trabalho algumas conclusões gerais podem ser tiradas à luz dos
resultados obtidos. Em primeiro lugar, pode dizer-se que países em desenvolvimento
têm toda a vantagem em apostar no desenvolvimento do sistema financeiro pois este
traz-lhes grandes benefícios, maiores dos que se observariam em países com um grau de
desenvolvimento económico e do sistema financeiro superiores. Em segundo lugar
retira-se que o crédito, enquanto proxi da dimensão dos intermediários financeiros, é
menos importante como factor explicativo do crescimento económico
comparativamente com a capitalização bolsista. Dos dados poder-se-ia concluir que os
países, quer desenvolvidos, quer em desenvolvimento, têm toda a vantagem em não
apostar na intermediação mas sim no desenvolvimento dos seus mercados de capitais,
adoptando medidas adequadas para os dinamizar.
32
Face às conclusões supramencionadas alguns comentários devem ser avançados tendo
em consideração a exposição teórica discutida em pontos anteriores. No que respeita à
incapacidade do crédito explicar o crescimento económico, o caso da Alemanha, já
debatida, põe em causa os resultados aqui apresentados. De facto, este caso demonstra
que é possível ter-se um sistema orientado para a intermediação financeira e ser, ceteris
paribus, uma das economias com maiores taxas de crescimento do produto. É
importante salientar, no entanto, que outros factores poderão contribuir para o
desenvolvimento de países como a Alemanha, tal como a evolução do ensino, a saúde e
o crescimento da população, independentemente do contributo do desenvolvimento do
sistema financeiro.
33
4.ii) Estudo de cointegração e causalidade à Granger com dados de cinco países
o Introdução
No Estudo anterior, em dados de painel, foi-nos possível identificar alguma evidência
de correlação entre as variáveis indicativas de desenvolvimento financeiro e o
crescimento económico. No entanto, esta análise não nos permite ter uma visão da
dinâmica das variáveis ao longo do tempo, nem consegue identificar o sentido da
causalidade entre elas, isto é, se é o desenvolvimento do sistema financeiro a causar as
variações do PIB, ou se é o inverso . Com vista a tentar responder a estas questões,
procedemos a um estudo de cointegração das variáveis e a um teste de Causalidade à
Granger, seguindo a abordagem realizada por Rousseau e Wachtel (1998). Nesta análise
consideramos os países: Portugal, Estados Unidos da América, Japão, Alemanha, Brasil
e Malásia. A escolha de Portugal prende-se com motivos óbvios. A Alemanha, EUA e
Japão foram escolhidos por serem as três maiores economias do Mundo e em particular
para comparar o sistema de Intermediação alemão com o de Mercado dos EUA. O
Brasil e a Malásia são dois países emergentes, pelo que com a sua inclusão pretende-se
aferir a consistência dos resultados entre países desenvolvidos e países em
desenvolvimento.
o Dados
As variáveis utilizadas como medidas da intensidade financeira são o crédito doméstico
ao sector privado (C), em representação da intermediação financeira, e um indicador do
mercado accionista (Acc) que alternou entre a capitalização bolsista e o volume de
transacções no mercado accionista consoante a disponibilidade do dados para os
diversos países.
A variável utilizada como indicador do crescimento económico é o PIB em USD,
deflacionado a preços constantes de 1995. Utilizou-se também, para melhor especificar
o modelo, a massa monetária (M2), na medida em que o que se pretende, de acordo com
Rousseau e Wachtel, é identificar as flutuações no produto que não se devam à variação
da moeda. O M2 encontra-se também em USD e deflacionado a preços constantes de
1995.
As séries referentes ao presente trabalho referem-se, em geral, ao período 1960-1998,
exceptuando o indicador do mercado de capitais, para o qual obteve-se dados apenas
desde a década de 80, e a Alemanha, para a qual obteve-se séries apenas desde 1971.
34
Todas as variáveis entram no modelo através dos seus logarítmos.
o Análise da estacionaridade e cointegração
Duas ou mais variáveis dizem-se cointegradas quando combinações lineares de séries
não estacionárias são estacionárias. Conceptualmente, indica que as diferenças entre as
séries temporais têm uma média e uma variância que são constantes, o que significa que
as séries “acompanham-se” ao longo do tempo, ou seja, têm uma tendência estocástica
comum. Para efectuar a análise de cointegração é necessário previamente verificar se as
séries são não estacionárias e que têm a mesma ordem de integração7. Para tal é
efectuado o teste de Dickey-Fuller, cujos resultados estão patentes no quadro seguinte.
Portugal EUA Alemanha Japão Malásia Brasil
Nível 7,6249 10,0259 6,2500 8,1927 11,7118 6,4872
1ª Diferença -2,2313** -2,0617** -2,3233** -1,9779** -1,9894** -2,4834**
Nível 4,4701 7,1056 4,7694 2,4173 6,6971 1,0568
1ª Diferença -3,8169** -2,2664** -4,1772** -1,8032* -3,7876** -5,0315**
Nível NA 3,8689 2,3809 1,3925 1,4125 0,3739
1ª Diferença NA -2,4507** -3,0209** -2,7290** -2,3752** -2,7689**
Nível 4,4532 6,9729 3,3113 3,8877 12,5524 1,4747
1ª Diferença -2,9889** -1,6286* -2,264** -3,1579** -1,7848* -5,8485**
Massa Monetária
(M2)
Teste de Dickey-Fuller (DF)
PIB
Crédito
Mercado
Accionista
**Rejeição a 5% *Rejeição a 10% Valores Críticos Obtidos a partir das Tabelas de Mackinon.
Como podemos observar, para um teste a 10%, existe evidência de que todas as
variáveis são integradas de ordem um, na medida em que é necessário diferenciá-las
apenas uma vez para se tornarem estacionárias.
Podemos assim passar ao teste de cointegração. Como já foi mencionado, um conjunto
de séries são cointegradas se partilham uma mesma tendência estocástica. É esta
tendência que pretendemos testar de seguida, para as séries do PIB, da Massa
Monetária, e de cada uma das séries da intensidade financeira. Para tal é utilizada a
abordagem de Johansen (1991), que identifica o número de relações de cointegração
que existe entre um conjunto de séries. As relações de cointegração dão-nos o equilíbrio
7 De acordo com a teoria econométrica, se uma variável é integrada de ordem (d) e outra de ordem(s),uma combinação linear das duas é integrada de ordem (d-s).
35
de longo prazo das variáveis, isto é, os valores para os quais a variáveis convergem no
longo prazo.
Tendo como modelo VAR inicial:
∑ ++==
−k
ititit eXX
1βµ
A abordagem de Johansen começa por reparametrizar aquele modelo deixando-o com a seguinteformulação:
∑−
=
−− +Π+∆Γ+=∆1
1
k
i
tktitit eXXX µ
Em que X é a matriz das variáveis do modelo. A metodologia de Johansen consiste emtestar se a matriz Π tem uma característica menor que o número de variáveis domodelo.
Os resultados desta estimação estão no quadro seguinte.
r = 0 r <= 1
Crédito 33,2602** 14,6232
Merc. Accionista NA NA
Crédito 13,922 2,001
Merc. Accionista 33,654** 14,516
Crédito 27,2991* 6,1889
Merc. Accionista 17,3250 4,2138
Crédito 28,7649* 5,6504
Merc. Accionista 32,4587** 8,0315
Crédito 27,0180* 6,2789
Merc. Accionista 9,3008 9.3008
Crédito 45,3144** 8,53169
Merc. Accionista 25,1639 11,0508Malásia
1, -1.0098, 0.5568
NA
Japão1, -9.4501, 3.1320
1, -1.4456, -0.3766
Brasil1, 2.6268, -0.4623
NA
EUANA
1, -5.0817, -1.3067
Alemanha1, -2.3308, -0.6993
NA
Teste do Traço Vectores Cointegrantes
Portugal1, -0.3615, -0.9179
NA
**Rejeição a 5% *Rejeição a 10% Valores Críticos dados pela tabela A1 em Johansen and Juselius(1990).
36
Portugal, Alemanha, Brasil e Malásia parecem não evidenciar qualquer relação de
cointegração entre a variável do mercado accionista e as variáveis fixas do nosso
modelo (PIB e M2). Os EUA e o Japão para um teste do traço a 5%, a hipótese nula de
não haver relação de cointegração (r = 0), é rejeitada, o que já não se verifica quando a
hipótese nula é a de existir um vector de cointegração (r <= 1). O vector de cointegração
nos dois casos apresenta um coeficiente da variável financeira que é negativo, pelo que
se utilizarmos o vector na forma de equação de longo prazo temos:
23067.10817.5 MMAccYEUA +=23766.04456.1 MMAccYJapão +=
Isto é, o produto depende positivamente da variável do mercado accionista, o que era
um resultado esperado. Aumentos desta variável e da variavel monetária, imprimem um
aumento no produto por forma a que a relação de longo prazo se mantenha. Para o caso
particular dos EUA, significa que, ceteris paribus, aumentos da variável do mercado
accionista de 1%, imprimem aumentos de 5.1% no produto, de modo a preservar a
relação de equilíbrio.
No que se refere à cointegração da outra variável, o Crédito, podemos observar que
existe cointegração para todos os países à excepção dos EUA. Em relação ao Brasil
verificamos que o coeficiente do Crédito na relação de longo prazo é negativa, o que
evidencia que o Crédito influencia negativamente o PIB, na relação de longo prazo. Este
resultado não é consistente com o facto de existir uma relação de cointegração, pelo
que, como o teste de cointegração é positivo apenas para 10%, o resultado mais
provável é não existir a pretensa relação para este país.
As equações de equilíbrio de longo prazo para esta variável são os seguintes:
29179.03615.0 MCYPortugal +=26993.03308.2 MCYAlemanha +=
23132.04501.9 MCYJapão −=25568.00098.1 MCYMalásia −=
37
o Modelização com Vector de Correcção dos Erros
Verificámos a existência de algumas relações de Cointegração para os países em relação
às variáveis indicativas do desenvolvimento do sistema financeiro. Isto significa que
estas variáveis partilham no longo prazo uma mesma tendência que o PIB e o M2. No
entanto, no curto prazo, existem desvios das variáveis em relação a essa tendência, que
deverão ser corrigidos para que a relação de longo prazo se mantenha. Esta dinâmica
pode ser modelizada por um modelo com vectores de Correcção dos Erros (MCE) em
que os vectores utilizados são os vectores cointegrantes calculados anteriormente. Um
modelo com MCE apresenta-se da seguinte forma:
ttt eTCEXY ++∆+=∆ λµ
Em que o TCE (Termo Corrector do Erro), não é mais do que a equação de equilíbrio de longo prazo:
1221111 ,, −−− −−= ttt XXYTCE δδ
Esta equação representa o erro ou desvio que a variável endógena tem em dado
momento em relação ao equilíbrio de longo prazo. O coeficiente associado a este TCE,
deverá ter sinal negativo, por forma a que, se por exemplo o desvio for positivo exista
um mecanismo que "puxe" a variável endógena de novo para a relação de longo prazo.
Por outro lado, este coeficiente mede, de certa forma, a velocidade de ajustamento da
variável endógena a desvios em relação ao equilíbrio de longo prazo. Os valores dos
coeficientes e os respectivos testes de significancia (p-values) encontram-se no quadro
que se segue.
38
Malásia0.0525 NA
(0,000) NA
Brasil0.0054 NA
(0,000) NA
Japão-0.002 -0.0129
(0,000) (0,000)
Alemanha-0.0025 NA
(0,006) NA
EUANA -0.0017
NA (0,002)
(Significância) (Significância)
Portugal-0.0391 NA
(0,000) NA
TCE-Crédito TCE-MercadoCoeficiente Coeficiente
Como podemos ver pelo quadro anterior, Portugal é o país que apresenta o maior
coeficiente em termos absolutos, denotando uma maior velocidade de ajustamento aos
desvios do curto prazo. O Brasil e a Malásia apresentam um coeficiente positivo, que
acaba por não ser explicável, visto que, perante desvios positivos, a variável endógena
ajusta-se positivamente, não havendo assim reversão para a média.
o Causalidade à Granger
Até agora, nada na nossa análise indica o sentido da causalidade existente entre as
variáveis financeiras e o produto. Sabemos apenas que estas variáveis encontram-se
correlacionadas e que partilham a mesma tendência estocástica. Pode existir duas
leituras: ou as variáveis financeiras influenciam (causam) o produto ou é este que
influencia as primeiras. Para tal é efectuado um teste de Causalidade à Granger. Para
testar se a variável financeira causa o PIB, temos os seguintes VAR, em níveis:
393837262524131211 −−−−−−−−− ++++++++= tttttttttt MCPIBMCPIBMCPIBPIB βββββββββ
393837262524131211 −−−−−−−−− ++++++++= tttttttttt MMAccPIBMMAccPIBMMAccPIBPIB βββββββββ
39
O teste de causalidade à Granger consiste em testar a nulidade conjunta dos coeficientes
associados aos desfasamentos das variáveis indicativas do desenvolvimento do sistema
financeiro. Para determinar se é o PIB que causa à Granger as variáveis financeira,
temos os seguintes modelos:
393837262524131211 −−−−−−−−− ++++++++= tttttttttt MMAccPIBMMAccPIBMMAccPIBC βββββββββ
393837262524131211 −−−−−−−−− ++++++++= tttttttttt MMAccPIBMMAccPIBMMAccPIBMAcc βββββββββ
No quadro seguinte encontram-se os níveis de significância (p-values) para o teste F
correspondente.
Crédito Causa PIB Mercado Causa PIB
PIB Causa Crédito PIB Causa Mercado
Crédito Causa PIB Mercado Causa PIB
PIB Causa Crédito PIB Causa Mercado
Crédito Causa PIB Mercado Causa PIB
PIB Causa Crédito PIB Causa Mercado
Crédito Causa PIB Mercado Causa PIB
PIB Causa Crédito PIB Causa Mercado
Crédito Causa PIB Mercado Causa PIB
PIB Causa Crédito PIB Causa Mercado
Crédito Causa PIB Mercado Causa PIB
PIB Causa Crédito PIB Causa Mercado
Nível de
Significância do
Teste F
Nível de
Significância do
Teste F
Portugal0.1027 NA
0.6358 NA
EUA0.4608 0.0349
0.1839 0.164
Alemanha0.8594 0.1176
0.5181 0.0451
Japão0.0502 0.7751
0.1356 0.1943
Brasil0.2503 NA
0.5589 NA
Malásia0.1401 NA
0.1438 NA
Como podemos observar pelo quadro anterior, existe evidência, para um teste a 10%, de
que em Portugal o Crédito Causa á Granger o PIB, isto é, valores passados do Crédito
têm poder explicativo em relação ao nível do produto do presente. Igualmente em
relação ao Crédito o Japão, para um teste a 5% causa à Granger o PIB.
40
Em relação à variável do mercado de acções, existe evidência de que cause o PIB para
os EUA (a 3%) e curiosamente também para a Alemanha, para um teste a 11% de
significância. Por outro lado, para a Alemanha, o PIB causa à Granger o mercado
accionista para um teste a 5%.
O resultado para a Alemanha acaba por ser contraditório com a realidade percepcionada
da importância da Intermediação financeira na economia germânica. Por outro lado, esta
análise vem confirmar a importância do mercado accionista na economia norte
americana.
o Conclusão
A partir desta análise, pudemos confirmar a correlação (através da cointegração) que
existe entre as variáveis financeiras e o produto, que já no estudo de dados de painel nos
foi possível verificar.
Foi-nos possível aferir da dinâmica a que estão sujeitas as variáveis em análise. Portugal
é o país, de entre os países em análise, que apresenta um ajustamento mais rápido do
PIB quando este desvia-se da sua relação de longo prazo.
Para o Brasil e Malásia não foi possível tirar conclusões, dados os resultados
incoerentes que a análise econométrica desenvolveu.
Foi-nos possível também aferir do sentido de causalidade entre as variáveis indicativas
do desenvolvimento do sistema financeiro e o PIB. Para Portugal e Japão foi possível
encontrar evidência de causalidade à Granger do crédito sobre o PIB, embora para
diferentes níveis de significância dos testes. Em relação à variável do mercado
accionista, esta apresenta causalidade à Granger no caso dos EUA e da Alemanha. No
caso dos EUA trata-se de um resultado que confirma a importância do mercado na
economia, enquanto que no caso da Alemanha, esta causalidade surge-nos como uma
surpresa, ainda para mais quando não existe evidência para o mesmo acontecer para a
variável da intermediação financeira. É de notar que a causalidade à Granger permite
apenas comprovar a causalidade de variáveis explicativas desfasadas. Existindo
causalidade, é provável que esta seja mais forte para variáveis explicativas
contemporâneas, fenómeno que não nos foi possível testar.
Por fim, esta análise peca por não possibilitar a observação das relações para os países
em desenvolvimento escolhidos, Brasil e Malásia.
41
5) Implicações dos Resultados para a Política Económica
Os resultados do estudo empírico apontam para uma maior eficácia dos sistemas
financeiros orientados para mercados de capitais enquanto factores de dinamização do
desenvolvimento económico (ver secção 5). Estes resultados são válidos quer para
países desenvolvidos, quer para países em desenvolvimento.
Tendo isto em conta, existem implicações para política económica, nomeadamente
quanto à oportunidade de estimular o desenvolvimento dos mercados de capitais.
Sem extravasar o âmbito deste trabalho indicámos algumas políticas que poderão
estimular o desenvolvimento dos mercados de capitais.
Com efeito, os governos poderão considerar a implementação de políticas fiscais que
estimulem o investimento em títulos cotados em bolsa. Por outro lado, poderão ser
tomadas medidas que facilitem o processo de cotação em bolsa (por exemplo, através da
redução de taxas e emolumentos associados ao processo de dispersão de capital em
bolsa ou benefícios fiscais, entre outros).
Outra política que poderá ser seguida para estimular o mercado de capitais passa pela
adopção de um programa de privatização de empresas estatais.
Por outro lado, existem outras medidas, mais qualitativas, mas igualmente importantes
que podem ser usadas para estimular o desenvolvimento dos mercados de capitais,
conforme referido por La Porta et al e Tsuru. Refere-se nomeadamente à implementação
de legislação para proteger os interesses e direitos dos investidores, a existência de
supervisão eficaz do mercado de capitais e a adopção de normas contabilísticas que
promovam a transparência e consistência da informação financeira. Por último,
podemos referir ainda a importância de um sistema jurídico eficiente na resolução de
conflitos e aplicação das leis de protecção dos investidores.
Como ressalva, deve-se ter em conta que medidas adequadas para uma economia
poderão não o ser para outras economias, ou seja, existe um risco associado à
generalização de conceitos e políticas que poderão não ser adequadas sem a devida
adaptação às circumstâncias e modelos de organização vigentes nos diferentes países.
42
6) Conclusões
Este trabalho analisa a relação entre o desenvolvimento do sistema financeiro e o
crescimento económico. Inclui uma análise da teoria e literatura recente, por um lado, e
testa alguns dos pressupostos teóricos avançados por diferentes autores, por outro.
Concretamente, usando métodos econométricos e com base em dados de painel para 25
países, foi feita uma comparação do impacto do desenvolvimento do sistema financeiro
no crescimento económico em países desenvolvidos e em países em desenvolvimento.
A eficácia de diferentes modelos de organização do sistema financeiro foi analisada e
testada, nomeadamente sistemas orientados para a intermediação financeira e sistemas
orientados para os mercados de capitais.
Por último, foram usados métodos estatísticos, nomeadamente a cointegração e
causalidade à Granger com base em dados de cinco países, para comprovar a
causalidade entre o desenvolvimento do sistema financeiro e o crescimento económico.
Os resultados do trabalho empírico apontam para uma maior eficácia dos sistemas
financeiros orientados para os mercados de capitais enquanto factores de dinamização
do crescimento económico. Existem fortes sinais de causalidade entre o
desenvolvimento do sistema financeiro e o crescimento económico com potenciais
implicações para a política económica. Os resultados são consistentes com os
resultados de estudos recentes sobre este tema.
43
6) Bibliografia
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• Thiel, Michael, Finance and Economic Growth - a review of theory and theavailable evidence, Economic Papers 158, European Commission, 2001
• Tsuru, Kotaro Finance and Growth, Economics Department Working Papers,OCDE, 2000
Anexo A - Aspectos influentes no funcionamento dos sistemas financeiros
Factores
Diferenciadores
Estados Unidos da
América
Reino Unido França e Alemanha
a) Concentração
de propriedade
Dispersão da equidade
nas empresas por
investidores individuais
Dispersão da equidade
nas empresas por
investidores institucionais
Concentração da equidade
em grandes blocos
accionistas detidos por
famílias ou instituições
b) Fulcro do
sistema
financeiro
Mercado de capitais;
grande dimensão no
sector de empresas
cotadas
Mercado de capitais;
dimensão considerável no
número de empresas
cotadas
Sistema bancário
concentrado; pequeno mas
crescente sector cotado
c) Assimetria de
Informação
Maiores valores
disponíveis para
investimentos que não
requerem singularidade
de opinião face ao
sucesso; tendência a
menores assimetrias na
informação
Maiores valores
disponíveis para
investimentos que não
requerem singularidade
de opinião face ao
sucesso; tendência a
menores assimetrias na
informação
Maior tendência para
investimentos imitativos, de
risco baixo ou moderado;
maior intervenção dos
bancos na gestão das
empresas e na
monitorização de
investimentos
d) Suporte
legislativo
Tradição common law;
maior protecção geral a
accionistas e credores
Tradição common law,
maior protecção geral a
accionistas e credores
Protecção moderada ou
baixa a accionistas e
credores
f) Qualidade da
informação
Os requisitos
contabilísticos são mais
extensos e concorrem na
libertação de informação
rigorosa, detalhada e
colocada em domínio
público regularmente (i.
Contabilistica e
financeira)
Os requisitos
contabilísticos são mais
extensos e concorrem na
libertação de informação
rigorosa, detalhada e
colocada em domínio
público regularmente (i.
Contabilistica e
financeira)
Existe menor
disponibilização de
informação rigorosa ao
exterior, que permita a
outros agentes delinear com
precisão a situação
contabilística e financeira da
empresa
Concentração de
propriedade -
influências
A natureza dispersa da
propriedade torna mais
fácil a aposta em grandes
inovações tecnológicas
ou de conceitos, na
abordagem a projectos
candidatos a
financiamento
A natureza dispersa da
propriedade torna mais
fácil a aposta em grandes
inovações tecnológicas
ou de conceitos, na
abordagem a projectos
candidatos a
financiamento
Um maior comprometimento
da gestão e uma relação de
poucas vias com
intermediários financeiros
reduz o risco potencial dos
projectos propostos a
financiamento (maior
comedimento na
apresentação de projectos)
Fulcro do sistema
financeiro –
influências
A natureza do mercado
de capitais permite o
financiamento de
projectos mais arriscados,
mesmo ao longo de
períodos de tempo que
podem superar o mero
curto prazo
A natureza do mercado
de capitais permite o
financiamento de
projectos mais arriscados,
mesmo ao longo de
períodos de tempo que
podem superar o mero
curto prazo
É mais provável uma
tendência para apoio aos
investimentos de risco
reduzido ou moderado e de
natureza imitativa; menor
estímulo sistemático da I&D
Assimetrias de
informação -
influências
Menores assimetrias na
informação sobre
empresas e projectos
gera um grau de
credibilidade
eventualmente mais
propício ao investimento;
é mais fácil existirem
vários investidores para
um mesmo projecto
Menores assimetrias na
informação sobre
empresas e projectos
gera um grau de
credibilidade
eventualmente mais
propício ao investimento;
é mais fácil existirem
vários investidores para
um mesmo projecto
Apenas os intermediários
financeiros relativamente
aos quais a empresa
depende tendem a possuir
uma informação mais
completa; a probabilidade de
existir mudanças frequentes
nos investidores diminui, já
que o custo de oportunidade
dessa mudança aumenta
Suporte
legislativo -
influências
Uma maior protecção dos
accionistas e investidores
aumenta a propensão ao
financiamento e
compensa graus de risco
mais elevados
Uma maior protecção dos
accionistas e investidores
aumenta a propensão ao
financiamento e
compensa graus de risco
mais elevados
Sendo a protecção a
accionistas e investidores
mais moderada a reduzida,
os intermediários financeiros
têm maior sensibilidade ao
risco o que pode concorrer
para menores investimentos
em I&D
Qualidade da
informação -
influências
Sendo melhor e regular a
informação libertada
pelas empresas existe
maior vulnerabilidade a
aquisições hostis (o
mecanismo de selecção
tende a ser portanto mais
rápido); a maior eficiência
do sistema legal torna
possível uma maior
confiança e suporte para
operações de
investimento, mesmo
quando o risco é mais
elevado
Sendo melhor e regular a
informação libertada
pelas empresas existe
maior vulnerabilidade a
aquisições hostis (o
mecanismo de selecção
tende a ser portanto mais
rápido); a maior eficiência
do sistema legal torna
possível uma maior
confiança e suporte para
operações de
investimento, mesmo
quando o risco é mais
elevado
A relativa opacidade das
empresas face à maioria dos
restantes agentes
económicos tende a ocultar
a situação real e rigorosa da
empresa, o que impede mais
interferências imediatas com
novos intermediários para
além daqueles de que as
empresas dependem mais
directamente quando
necessitam de
financiamento externo