ministério da saúde mariana saldanha galvÃo simÕes

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Ministério da Saúde Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva Coordenação de Ensino Programa de Residência Médica em Anestesiologia MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES O USO DA TROMBOELASTOMETRIA ROTACIONAL EM ANESTESIA PARA TRANSPLANTE CARDÍACO RELATO DE CASO Rio de Janeiro 2020

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Page 1: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

Ministério da Saúde

Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva

Coordenação de Ensino

Programa de Residência Médica em Anestesiologia

MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

O USO DA TROMBOELASTOMETRIA ROTACIONAL EM ANESTESIA PARA

TRANSPLANTE CARDÍACO – RELATO DE CASO

Rio de Janeiro

2020

Page 2: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

O USO DA TROMBOELASTOMETRIA ROTACIONAL EM ANESTESIA PARA

TRANSPLANTE CARDÍACO – RELATO DE CASO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva como requisito parcial para a conclusão do Programa de Residência Médica em Anestesiologia.

Orientadora: Dra. Anna Lucia Calaça

Rivoli.

Rio de Janeiro

2020

Page 3: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES
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MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

O uso da tromboelastometria rotacional em anestesia para transplante

cardíaco – Relato de Caso

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto Nacional de Câncer

José Alencar Gomes da Silva como requisito parcial para a conclusão do

Programa em Residência Médica em Anestesiologia.

Aprovado em: 30 de janeiro de 2020.

Banca examinadora:

_____________________________

Anna Lucia Calaça Rivoli (Orientadora)

_____________________________

Anna Lucia Calaça Rivoli (Avaliadora)

_____________________________

Sylvio Valença de Lemos Neto (Avaliador)

Rio de Janeiro

2020

Page 5: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

Dedico este trabalho à minha família

e amigos, e, em especial à minha mãe e

meu namorado, pelo apoio e força que me

deram durante todos os momentos da

minha formação. Dedico também a todos

que contribuíram de alguma maneira para

a realização deste projeto.

Page 6: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

Vai chegar a hora em que você irá acreditar que tudo acabou.

Esse será apenas o início.

Louis L’Amour

Page 7: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

RESUMO

GALVÃO, Mariana Saldanha G. Simões. O uso da tromboelastometria rotacional em anestesia para transplante cardíaco – Relato de Caso. Monografia. (Residência

Médica em Anestesiologia) — Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), Rio de Janeiro, 2020. O transplante cardíaco é um procedimento cirúrgico que salva vidas em pacientes com insuficiência cardíaca em estágio terminal. Devido à alta complexidade cirúrgica e doenças preexistentes, esses pacientes apresentam distúrbios hemostáticos de etiologia multifatorial com difícil manejo perioperatório. A detecção rápida e sensível dessas coagulopatias contribui para uma terapia individualizada que otimiza as taxas de sobrevivência. Nesse sentido, testes point-of-care viscoelásticos, como o ROTEM®, têm sido amplamente utilizados para guiar as transfusões alogênicas de produtos sanguíneos, em virtude do seu curto tempo de resposta e da sua capacidade em distinguir a origem do sangramento. Diversos estudos demonstraram redução do número de dias de internação e dos custos hospitalares após a implementação de algoritmos baseados em tromboelastometria. Esse trabalho consiste em um relato de caso de um transplante cardíaco realizado no Instituto Nacional de Cardiologia onde o uso do ROTEM® auxiliou na identificação das causas da perda de sangue, permitindo uma atuação rápida e específica, resultando em um desfecho favorável para o paciente.

Palavras-chave: HEMOSTASIA CIRÚRGICA; TESTES DE COAGULAÇÃO

SANGUÍNEA; TRANSFUSÃO DE SANGUE; TRANSTORNOS DA COAGULAÇÃO

SANGUÍNEA.

Page 8: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

ABSTRACT

GALVÃO, Mariana Saldanha G. Simões. The use of rotational thromboelastometry in anesthesia for heart transplantation – Case Report. Monograph. (Medical Residency in Anesthesiology) — Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), Rio de Janeiro, 2020. Heart transplantation is a surgical procedure that saves lives in patients with end-stage heart failure. Due high surgical complexity and pre-existing diseases, these patients have multifactorial hemostatic disorders with difficult perioperative management. Rapid and sensitive detection of these coagulopathies contributes to an individualized therapy that optimizes survival rates. Thus, viscoelastic point-of-care tests, such as ROTEM®, have been widely used to guide allogeneic blood products transfusions, due their short response time and ability to distinguish the bleeding source. Several studies have shown a reduction in the number of days of hospitalization and hospital costs after the implementation of algorithms based on thromboelastometry. This work consists of a case report of a heart transplant that ocurred in National Institute of Cardiology where the ROTEM® use helped to identify the blood loss causes, allowing a quick and specific action, resulting in a favorable outcome for the patient.

Keywords: BLOOD COAGULATION DISORDERS; BLOOD COAGULATION TESTS;

BLOOD TRANSFUSION; HEMOSTASIS, SURGICAL.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 — Esquema da cascata de coagulação 6

Figura 2 — Produtos originados do sangue 8

Figura 3 — Funcionamento do ROTEM® 12

Figura 4 — Representação gráfica dos parâmetros do ROTEM® 14

Figura 5 — Algoritmo proposto pela força tarefa Essener Runde para o uso

do ROTEM® 17

Figura 6 — Abordagem simplificada baseada nos parâmetros do ROTEM® 17

Figura 7 — Algoritmo proposto por Görlinger para cirurgias cardiovasculares 18

Figura 8 — EXTEM do primeiro ROTEM® 23

Figura 9 — INTEM do primeiro ROTEM® 23

Figura 10 — FIBTEM do primeiro ROTEM® 23

Figura 11 — EXTEM do segundo ROTEM® 24

Figura 12 — INTEM do segundo ROTEM® 24

Figura 13 — FIBTEM do segundo ROTEM® 24

Figura 14 — EXTEM do terceiro ROTEM® 25

Figura 15 — INTEM do terceiro ROTEM® 25

Figura 16 — FIBTEM do segundo ROTEM® 25

Page 10: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 — Valores de referência dos parâmetros para adultos no ROTEM® 15

Page 11: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

LISTA DE ABREVIATURAS

ADP difosfato de adenosina

AT Antitrombina

CCP Complexo Protrombínico

CFT tempo de formação do coágulo

CH Concentrado de hemácias rica em leucócitos

CHD Concentrado de hemácias desleucocitadas

CHL Concentrado de hemácias lavadas

CP Concentrado de plaquetas randômicas

CPAférese Concentrado de plaquetas aférese

CT tempo de coagulação

FT Fator tecidual

IC Insuficiência cardíaca

INR Razão normalizada internacional

INTERMACS Interagency Registry for Mechanically Assisted Circulatory Support

NO Óxido nítrico

PDFs Produtos de degradação da fibrina

PFC Plasma Fresco Congelado

PGI Prostaciclinas

ROTEM® Tromboelastometria rotacional

STOP Search, treat, observe e prevent

TAP Tempo de atividade da protrombina (TAP)

TCA Tempo de coagulação ativada

TEG® Tromboelastografia

TFPI Inibidor da via do fator tecidual

TTPa Tempo de tromboplastina parcial ativada

TXA Ácido tranexâmico

VWF Fator de Von Willebrand

Page 12: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

LISTA DE SÍMBOLOS

α alfa

β beta

€ euro

US$ dólar americano

Page 13: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 1

2 REVISÃO DA LITERATURA ................................................................................. 3

2.1 Hemostasia ................................................................................................................... 3

2.2 Hemocomponentes e hemoderivados ........................................................................... 8

2.3 Testes viscoelásticos ................................................................................................... 10

2.4 Tromboelastometria rotacional - ROTEM® ................................................................... 12

3 RELATO DE CASO ............................................................................................. 20

3.1 Avaliação pré-transplante ............................................................................................ 20

3.2 Manejo anestésico ...................................................................................................... 21

4 DISCUSSÃO ........................................................................................................ 26

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 37

REFERÊNCIAS ................................................................................................... 38

Page 14: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

1

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos houve grandes avanços no tratamento e na monitorização da

insuficiência cardíaca (IC), aumentando a qualidade de vida dos pacientes e sua

sobrevida. O paciente com IC avançada necessita de acompanhamento

multidisciplinar periódico e rigoroso, abrangendo inúmeras avaliações a fim de

detectar se o paciente atende a critérios e em que momento ele deve ser incluído na

fila do transplante.

Outra forma de avaliar o prognóstico de pacientes com IC é pela classificação

Interagency Registry for Mechanically Assisted Circulatory Support (INTERMACS),

que é útil nas avaliações clínica e prognóstica e no momento de indicar terapias para

IC avançada e/ou choque cardiogênico. Ela é dividida em sete categorias, sendo que

os pacientes em estado crítico (INTERMACS 1 e 2) configuram situações em que o

risco perioperatório para transplante é muito desfavorável (BACAL et al., 2018).

Desde 1980 mais de 110 mil transplantes cardíacos já foram realizados no

mundo (BACAL et al., 2018). No Brasil esse número tem crescido nos últimos anos.

Entre 2013 a 2018 houve um aumento de 21,4% dessas cirurgias, contudo isso

representa menos de um quarto da necessidade prevista para o país (ABTO, 2018).

Dentre os desafios enfrentados durante esse tipo de operação pode-se

destacar o alto risco de sangramento perioperatório. Isso se deve a inúmeros fatores

como administração pré-operatória de medicamentos antiplaquetários e

anticoagulantes, hipotermia, anticoagulação com altas doses de heparina,

hemodiluição e uso de circulação extracorpórea. A circulação extracorpórea induz

resposta inflamatória sistêmica com a ativação dos sistemas de coagulação e

fibrinolítico, seguida de coagulopatia temporária causada pelo consumo de fatores de

coagulação (SARRAIS POLO et al., 2018).

Dessa forma, o manejo adequado da hemostasia no período peri e pós-

operatório deve ser realizado de acordo com o novo conceito de “teranóstica” que são

terapias realizadas de acordo com o diagnóstico e necessidade especificas do

paciente. Isso permite minimizar o uso de hemocomponentes e garantir que a

reexploração ocorra apenas nos casos em que realmente ela seja necessária

(GÖRLINGER et al., 2019).

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Para conscientização desses problemas o guia europeu de trauma criou a

campanha “STOP the bleeding campaign”, onde STOP é um acrônimo para search

(descubra os pacientes com risco de coagulopatia), treat (trate a coagulopatia assim

que ela se desenvolva), observe (observe a resposta às intervenções) e prevent

(previna a coagulopatia secundária) (GÖRLINGER et al., 2019).

Porém, os testes convencionais de coagulação possuem um longo tempo de

resposta e não são validados para prever e/ou orientar a terapia na hemorragia aguda,

o que inviabiliza seu uso durante procedimentos cirúrgicos (ENGBERINK et al., 2014;

CROCHEMORE et al., 2017).

Por outro lado os testes point-of-care da coagulação, como a

tromboelastografia (TEG®, Haemonetics Corp., Braintree, MA, EUA) e a

tromboelastometria rotacional (ROTEM®, Tem International GmbH, Munich,

Germany), podem auxiliar na diminuição da necessidade de transfusão em cirurgias

cardíacas e consequentemente seus efeitos adversos, pois são capazes de indicar de

maneira específica e em baixo tempo as alterações da coagulação, permitindo um

diagnóstico antecipado e individualizado das anomalias hemostáticas (SHORE-

LESSERSON et al., 1999).

Page 16: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

3

2 REVISÃO DA LITERATURA

Meça o que pode ser medido e torne mensurável o que ainda não pode.

Galileo Galilei

2.1 HEMOSTASIA

A hemostasia compreende os processos que buscam limitar a perda sanguínea

e garantir a fluidez do sangue intravascular. Para isso, ocorre um balanço entre fatores

anticoagulantes e pró-coagulantes, plaquetas, parede endotelial e o sistema de

fibrinólise (HAMID, 2014). Nesse sentido, o endotélio é de fundamental importância

no controle da hemostasia, visto que é responsável por secretar substâncias, como

as prostaciclinas (PGI) e óxido nítrico (NO), que são potentes vasodilatadores com

atividade antiagregante, que confere características não trombogênicas a superfície

interna dos vasos sanguíneos (SILVA & SALDANHA, 2006; CAGNOLATI et al., 2017).

Dessa forma, dentro dos vasos sanguíneos há predomínio dos fatores

anticoagulantes, porém quando há rompimento dos vasos, lesão endotelial, os pró-

coagulantes da área lesionada predominam iniciando a formação do coágulo

(GUYTON & HALL, 2011).

O espaço subendotelial contém colágeno, fator tecidual (FT), fator de von

Willebrand (VWF) e laminina, que são substâncias altamente trombogênicas e

potentes indutores da cascata de coagulação (BERGER et al., 2014).

Em imediata resposta à lesão do endotélio, dá-se início a três processos:

hemostasia primária, hemostasia secundária (coagulação) e hemostasia terciária

(fibrinólise) (LIPPI & FAVALORO, 2018).

A hemostasia primária é o processo inicial desencadeado pela lesão vascular,

no qual ocorre vasoconstricção, alteração da permeabilidade vascular gerando edema

e vasodilatação dos vasos colaterais à lesão. Além disso, ocorrem três etapas que

dão início a formação do plug plaquetário: adesão plaquetária, secreção plaquetária e

agregação plaquetária (CASTRO et al., 2006).

A Adesão plaquetária é resultante da exposição do FVW, que funciona como

uma ponte entre o colágeno do endotélio e os receptores de superfície das plaquetas

(GpIb) (CASTRO et al., 2006).

Page 17: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

4

Já a secreção plaquetária ocorre por intermédio de três tipos de grânulos

contidos nas plaquetas: α, densos e lisossomos. Os grânulos α contém fatores de

coagulação, VWF, fibrinogênio, β-tromboglobulina, fator de crescimento derivado das

plaquetas e outras proteínas. Os grânulos densos possuem ATP, ADP, cálcio e

serotonina. Os lisossomos, contêm enzimas hidrolíticas. Após a adesão ocorre a

secreção plaquetária, havendo degranulação e liberação desses componentes, com

destaque para o cálcio que é essencial para a ativação plaquetária (CASTRO et al.,

2006).

Para a agregação plaquetária as plaquetas secretam tromboxano A2, que se

combina ao ADP, levando a ativação de outras plaquetas e modificando a sua forma,

com o surgimento de pseudópodes. O ADP também induz a ligação da plaqueta ao

fibrinogênio através dos receptores de superfície GpIIb/IIIa. As plaquetas ativadas vão

se unir formando um tampão conferindo resistência ao plug plaquetário inicial. As

plaquetas então, exteriorizam a lipoproteína fator plaquetário 3 que participa de

diversas reações da cascata de coagulação (ROATH & FRANCIS, 1985).

A hemostasia secundária, coagulação, ocorre quando há conversão do

fibrinogênio em fibrina pela enzima trombina, levando a maior estabilidade do plug

plaquetário. Nessa etapa, uma série de reações químicas convertem pró-enzimas em

enzimas, denominadas fatores de coagulação. A ativação desses fatores ocasiona a

formação de trombina, que promove modificações nas moléculas de fibrinogênio,

havendo liberação de monômeros de fibrina na circulação. Esses, por sua vez, são

transformados em um polímero solúvel, fibrina S, que sofre a ação do fator XIIIa e de

íons cálcio, levando a estabilização do plug inicial de plaquetas (FERREIRA et al.,

2010).

Um dos modelos mais clássicos para esse processo denomina-se cascata de

coagulação, introduzido por Davie (1964) e Macfarlane (1964). Esse modelo dividiu o

processo de coagulação em duas vias: via intrínseca e via extrínseca. Na primeira,

todos os componentes estão presentes no sangue, enquanto na segunda é

necessária a presença do fator tecidual 5, uma proteína da membrana celular

subendotelial.

Ambas as vias culminam na via final comum, que ocorre quando há ativação

do fator X (Xa). O mesmo catalisa a conversão da protrombina (uma enzima produzida

pelo fígado) em trombina na presença de íons cálcio. Ela, por sua vez, converte

fibrinogênio em monômeros de fibrina e ativa o fator XIII (XIIIa) que estabiliza a fibrina.

Page 18: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

5

Assim que a trombina começa a se formar, sua ação proteolítica age sobre o fator V,

que é um catalizador no processo de formação de trombina. Isso gera um feedback

positivo acelerando a conversão de mais trombina (SILVA & MELO, 2016).

A via intrínseca se inicia com a ativação do fator XII após o contato com alguma

superfície carregada negativamente, como, por exemplo, o colágeno. Também estão

envolvidos nesse processo o fator XI, a pré-calicreína, e o cininogênio de alto peso

molecular (HMWK). Esse último, é fundamental para que o fator XI e a pré-calicreína

efetuem a adsorção à superfície em que está ligada o fator XIIa, ativando o fator XI

que, por sua vez ativa o fator IX (IXa) (FRANCO, 2001). O fator IXa juntamente com

o fator VIIIa, se ligam a superfície de fosfolipídios das plaquetas, incluindo o FP 3,

através de uma “ponte” de cálcio estimulando a conversão do fator X em Xa.

Na via extrínseca, a coagulação é desencadeada quando os tecidos lesados

liberam o fator tecidual (tromboplastina tecidual). Esse, por sua vez, mediado por íons

cálcio, forma um complexo com o fator VII. Esse complexo atua sobre o fator X (Fator

Stuart), convertendo-o em Xa (TORTORA & DERRICKSON, 2013).

A partir daí ambas as vias seguem para a via comum, onde ocorre a conversão

de protrombina (fator II) em trombina, que estimula a conversão de fibrinogênio em

fibrina.

Esse modelo de cascata foi de fundamental importância para a compreensão

da formação do coágulo in vitro e para a monitorização laboratorial, como no caso de

testes viscoelásticos, por exemplo, o ROTEM®. Contudo, observações clínicas in vivo

demostraram inconsistências nesse modelo (HOFFMAN, 2003). Uma delas, é que o

complexo fator tecidual/fator VII, que inicia a via extrínseca pode ativar também o fator

IX da via intrínseca, outra é o fato de que a trombina é ativadora fisiológica do fator XI

sem necessidade das reações iniciais induzidas pelo contato. A ativação do complexo

tecidual/fatorVII demonstra ser o principal desencadeador do processo de hemostasia

secundária (HOFFMAN, 2001).

A hemostasia terciária, denominada fibrinólise, atua de forma a limitar a

progressão desnecessária da trombose. Em condições normais esse processo atua

de forma simultânea à coagulação, garantindo um equilíbrio dinâmico da hemostasia.

Essa fase ocorre através da lise da rede de fibrina, fibrinogênio, fator V, VIII, XII e

protrombina, pela atuação da plasmina derivada do plasminogênio, formando os

produtos de degradação da fibrina (PDFs), que são retirados da circulação pelo fígado

e pelo reticulo endotelial (TORTORA & DERRICKSON, 2013).

Page 19: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

6

A plasmina é ativada pelo ativador tecidual do plasminogênio, que é secretado

pelo endotélio adjacente a área da lesão. Para evitar uma fibrinólise descontrolada a

antiplasmina presente no plasma liga-se ao excesso de plasmina liberada. Isso é

necessário visto que a plasmina não atua apenas sobre a fibrina, mas também sobre

o fibrinogênio e sobre a fibrina não polimerizada (CAGNOLATI et al., 2017).

Como uma das formas de prevenção da coagulação em um sistema não

lesionado, o glicocálice do endotélio repele as plaquetas e fatores de coagulação. A

proteína ligada a membrana endotelial, trombomodulina (TM), se liga a trombina

lentificando o processo de coagulação e formando um complexo que ativa a proteína

C plasmática, inativando os fatores V e VIII ativados (GUYTON & HALL, 2011).

O processo de hemostasia descrito acima pode ser visualizado

esquematicamente na figura 1, que apresenta a cascata de coagulação pelas vias

extrínseca e intrínseca e os processos anticoagulantes endógenos. As linhas

contínuas representam vias de ativação e as linhas tracejadas demonstram as vias de

inibição.

Fonte: CAGNOLATI et al., 2017

Figura 1 — Esquema da cascata de coagulação

Page 20: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

7

Outros modelos também foram propostos para explicar o processo de

coagulação, dentre eles o modelo baseado nas células da hemostasia, hemostasia

celular. Esse modelo permite um melhor entendimento do processo e apresenta maior

coerência com observações clínicas in vivo. Ele descreve o processo de coagulação

em quatro fases: iniciação, amplificação, propagação e finalização (FERREIRA et al.,

2010).

A fase de iniciação começa quando há contato do sangue com o fator tecidual

(FT) exposto pelas células da área lesionada. O fator VII combinado ao FT é ativado

(VIIa), formando o complexo VIIa/FT, que ativa pequenas quantidades dos fatores IX

(IXa) e X (Xa). O fator Xa, por sua vez, combina-se ao cofator Va formando a

protrombominase, que transforma a protrombina (fator II) em trombina em quantidade

insuficiente para a formar o coágulo de fibrina, porém esse processo torna-se de

grande importância para a fase de amplificação (MONROE & HOFFMAN, 2009).

A fase de amplificação ocorre a partir da adesão das plaquetas ao colágeno

subendotelial mediada pelos receptores de colágeno GpIa/IIa plaquetários e pelo fator

de von Willebrand (FVW), ativando as plaquetas. A trombina formada pela fase

anterior contribui para a ativação e consequente adesão de mais plaquetas. Ela ativa

o fator XI e parte o FVW liberando o fator VIIIa. As plaquetas ativadas liberam fator V,

que também é ativado pela trombina ou pelo fator Xa. Isso culmina na formação de

fibrina estável, que consolida o tampão plaquetário inicial e resulta na hemostasia

secundária (FERREIRA et al., 2010). Dessa forma, as plaquetas têm agora fatores

ativados Va, VIIIa e IXa em sua superfície, o que dá início ao processo de propagação.

Nessa fase há produção de complexos tenases e protrombinases agrupados

na superfície das plaquetas ativadas. Há formação do complexo tenase, fator VIIIa e

fator IXa, quando o fator esse último se liga ao receptor expressado nas plaquetas

ativadas. Os fatores VIIIa/IXa ativam o fator X, produzindo maior quantidade de fator

Xa diretamente na superfície das plaquetas ativadas. Ele, então, se associa ao fator

Va formando o complexo de protrombinase, que intensifica a produção da trombina.

Por sua vez, ela cliva o fibrinogênio em monômeros de fibrina e também ativa o fator

estabilizador da fibrina, fator XIII, para formar o coágulo de fibrina hemostático (VINE,

2009).

Para controlar o processo de trombose quatro anticoagulantes naturais agem

em diferentes fases do processo, são eles: inibidor da via do fator tecidual (TFPI),

Page 21: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

8

proteínas S e C e antitrombina (AT). O TFPI atua inibindo o complexo VIIa/FT que

atua principalmente na fase de iniciação. Já a proteína C, em associação com a

proteína S, atua inibindo os fatores Va e VIIIa, necessários para a manutenção de

produção de trombina. Ela é ativada pela trombina ligada à proteína transmembrana

trombomodulina (TM) presente na superfície das células endoteliais intactas. O último

anticoagulante é a AT que inibe a ação da trombina e de fatores como o IXa, Xa, XIa

e XIIa, sendo a maior responsável pelo controle das fases de ampliação e propagação

(VINE, 2009; FERREIRA et al., 2010).

Deve-se destacar ainda que a vitamina K, assim como o íon cálcio, é

fundamental para o processo de hemostasia ocorrer adequadamente. Ela atua como

co-fator para síntese hepática de proteínas envolvidas no processo de coagulação,

como os fatores II (pró-trombina), VII, IX e X e as proteínas C, S e Z (inibidoras da

coagulação) (KLACK & CARVALHO, 2006).

2.2 HEMOCOMPONENTES E HEMODERIVADOS

Os hemocomponentes e hemoderivados são produtos distintos. Os

hemocomponentes são obtidos a partir de processos físicos como centrifugação e

congelamento, já os hemoderivados são obtidos por processos físico-quimicos de

escala industrial a partir do fracionamento do plasma, figura 2 (MINISTÉRIO DA

SAÚDE, 2015).

Figura 2 — Produtos originados do sangue

Fonte: Ministério da Saúde, 2015.

Page 22: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

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Os hemocomponentes são frações do sangue obtidas por doação de sangue

total ou aférese (ANVISA, 2014). Eles se dividem em:

1- Concentrado de hemácias: Obtido a partir da centrifugação de uma bolsa de

sangue total, que ocasiona na separação da massa de eritrócitos do plasma.

Dessa forma, ele contém apenas uma pequena quantidade de plasma,

leucócitos e plaquetas.

Tipos:

a) Concentrado de hemácias rica em leucócitos (CH): Obtido pelo processo

de separação do sangue total. Devem ser utilizados em pacientes que serão

transfundidos pela primeira vez, ou que nunca apresentaram reação

transfusional.

b) Concentrado de hemácias desleucocitadas (CHD): Obtido com a retirada de

99,9% dos leucócitos (leucorredução). Essa separação é realizada logo após a

coleta para evitar que haja liberação de citocinas pelos leucócitos durante a

estocagem. Ele é indicado para pacientes politransfundidos, com distúrbios

hematológicos (leucemias / linfomas / hemoglobinopatias), candidatos a

transplante, pediátricos, recém-nascidos como prevenção ao citomegalovírus

e que já apresentaram reação transfusional a concentrado de hemácias.

c) Concentrado de hemácias lavadas (CHL): Obtido a partir da retirada de

99,9% dos leucócitos (leucorredução), além das proteínas plasmáticas. Ideal

para pacientes que apresentaram reação transfusional a proteínas do plasma,

concentrado de plaquetas e crioprecipitado.

2- Concentrado de plaquetas: Obtido a partir da centrifugação do plasma

proveniente de único doador através da doação do sangue total ou por aférese.

a) Concentrado de plaquetas randômicas (CP): Obtido por processo de

separação do sangue total resultando em 50 a 60 ml de plasma.

b) Pool de plaquetas (Pool Buffy Coat): As plaquetas são extraídas da camada

leucoplaquetária de uma bolsa de sangue total, sendo agrupadas em pools de

4 a 5 unidades.

c) Concentrado de plaquetas aférese (CPAférese): Obtido de um doador único.

Esse processo é feito através de um sistema que separa as plaquetas do resto

do sangue com devolução dos demais componentes ao doador, dessa forma

Page 23: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

10

cada doação equivale a 8-10 CP randômicas, além de reduzir o risco de reação

transfusional.

3- Plasma Fresco Congelado (PFC): Preparado a partir do plasma do sangue

composta primariamente de água, 7% de proteínas e 2% de carboidratos e

lipídeos. Ele contém fatores de coagulação, por isso é indicado para tratamento

de pacientes com múltipla deficiência de fatores da coagulação.

4- Crioprecipitado: É a fração insolúvel do plasma a frio. Ele é obtido pelo

descongelamento até 4°C de uma unidade de PFC. É composto por:

Fibrinogênio (150mg); fator VIII (80-120 UI); fator XIII (20 a 30% da quantidade

inicial) e fator de von Willebrand (40 a 70% da quantidade inicial).

Os hemoderivados são produzidos em escala industrial através de processos

físico-químicos onde são retiradas e separadas proteínas específicas, como as

proteínas de coagulação (EBSERH, 2018). Os tipos mais frequentes de

hemoderivados disponíveis no Brasil são:

1- Complexo Protrombínico (CCP): É o conjunto de proteínas que atua na

coagulação sanguínea. Pode ser usado para recuperação de pessoas que

utilizam medicamentos anticoagulantes e apresentam hemorragias.

2- Fatores de coagulação:

a) Fator VIII: Utilizado no tratamento de pessoas com hemofilia A.

b) Fator IX: Utilizado no tratamento de pessoas com hemofilia B.

c) Fator de von Willebrand: Indicado no tratamento da doença de von

Willebrand.

3- Imunoglobulina liofilizada: Hemoderivado de maior consumo no mundo,

empregado em doenças autoimunes infecciosas e deficiências imunológicas.

2.3 TESTES VISCOELÁSTICOS

A monitorização da coagulação com testes point-of-care avaliam as

propriedades viscoelásticas do sangue e propiciam rapidamente uma avaliação

Page 24: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

11

completa e precisa do sistema hemostático. Os testes viscoelásticos mais utilizados

são a tromboelastografia (TEG®) e a tromboelastometria rotacional (ROTEM®), que

avaliam as propriedades trombodinâmicas do sangue durante a formação do coágulo

(ROCHA et al., 2017).

Essa avaliação prediz o risco de sangramento perioperatório e serve de

parâmetro para estabelecer condutas, protocolos, para os distúrbios da hemostasia,

diminuindo a necessidade transfusional de hemocomponentes e assim, a

morbimortalidade relacionada a isso (BOLLIGER & TANAKA, 2013; WAREING, 2017).

Como a viscosidade sanguínea aumenta durante a hemostasia consegue-se

avaliar a cinética da formação do coágulo, resistência e estabilidade, possibilitando o

registro contínuo e quantitativo da dinâmica da formação do coágulo, desde a

formação da fibrina até a lise (LUDDINGTON, 2005).

A diferença principal entre os testes viscoelásticos e os teste de coagulação

convencionais é que esses são realizados em amostra de plasma e não levam em

consideração a avaliação global da coagulação do sangue total.

Os testes viscoelásticos analisam a coagulação na presença de todos os

componentes que participam da hemostasia, o que propicia uma avaliação mais

próxima da realidade do paciente, in vivo (LEVI et al., 2011; CROCHEMORE et al.,

2017).

Além disso, a influência da hipotermia não é mensurada, já que os testes te

coagulação convencionais necessitam ser avaliados a 37°C enquanto que os testes

viscoelásticos podem ser avaliados de 22-42°C, ou seja, na temperatura em que se

encontra o paciente. Dessa forma, testes convencionais da coagulação não analisam

bem distúrbios hemostáticos complexos e multifatoriais (SHEN et al., 2017; ROCHA

et al., 2017).

A tromboelastografia (TEG), primeiro tipo de teste viscoeslástico, foi descrita

pela primeira vez por Hartert (1948), contudo seu uso teve início apenas na década

de 1960, na guerra do Vietnã, para auxiliar na transfusão de hemocomponentes.

Posteriormente, na década de 1980, ela passou a ser utilizada em cirurgias de fígado

e na década de 1990 em cirurgias cardíacas. Em ambos os casos houve redução da

necessidade de transfusão, passando a ser feita de forma mais racional (WALSH et

al., 2016).

Page 25: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

12

2.4 TROMBOELASTOMETRIA ROTACIONAL - ROTEM®

A tromboelastometria rotacional, ROTEM®, foi descrita em por Calatzis (1996)

como uma derivação do método de tromboelastografia. Ela possui menor interferência

vibratória que o TEG®, além de diferenças nas técnicas de medição do coágulo

(JACKSON et al., 2009).

A tecnologia ROTEM®, figura 3, utiliza 340µl de sangue em uma cuba cilíndrica

pequena, onde um pino plástico é mergulhado e submetido a um movimento rotacional

com curso 4° 45 min a cada seis segundos aplicando-se uma força constante. Com a

formação das pontes de fibrina no início da coagulação a resistência à rotação do pino

aumenta progressivamente. Essas alterações de resistência são detectadas por sinal

ótico, que produz um traçado gráfico. Ressalta-se que o sistema é capaz de avaliar

quatro amostras de forma simultânea enquanto o TEG® apenas duas (WHITHING &

DINARDO, 2013).

Figura 3 — Funcionamento do ROTEM®

Fonte: ZAMPER et al., 2017.

O sistema ROTEM® possui diferentes testes que podem ter seus resultados

analisados de forma conjunta para um diagnóstico mais preciso. Os testes EXTEM,

FIBTEM e APTEM avaliam a via extrínseca, enquanto os testes INTEM e HEPTEM

avaliam a via intrínseca (LIER et al., 2013). As características de cada teste estão

descritas abaixo:

Page 26: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

13

EXTEM: Utiliza como reagente o fator tecidual recombinante e fosfolipídios.

Dessa forma, estimula a via extrínseca da coagulação, principalmente os

fatores VII, X, V, II e o fibrinogênio (GÖRLINGER et al., 2016a).

FIBTEM: Derivado do EXTEM, adiciona-se como reagente, além do fator

tecidual recombinante, a citocalasina D, que bloqueia completamente a

atividade plaquetária. Sendo assim, o teste analisa exclusivamente os efeitos

do fibrinogênio na coagulação (WHITHING & DINARDO, 2013).

APTEM: Derivado do EXTEM, adiciona-se, além do fator tecidual

recombinante, um reagente antifibrinolítico, permitindo avaliar hiperfibrinólise

(GÖRLINGER et al., 2016a).

INTEM: Ativa a via intrínseca, utilizando com reagente o ácido elágico. Ele

estimula os fatores I, II, VIII, IX, X, XI, XII e von Willebrand (CROCHEMORE et

al., 2017).

HEPTEM: Os testes EXTEM, FIBTEM e APTEM já são feitos por padrão com

heparinase, contudo o teste INTEM não. Para avaliar a influência de possível

heparina residual no INTEM é realizado o teste HEPTEM, que é igual ao teste

INTEM, porém com a adição do reagente de heparinase (LIER et al., 2013).

Além desses, também existem outros testes como o ECATEM, que contém a

ecarina como reagente e NATEM que não utiliza reagente. Também existem

combinações desses testes, como o denominado PLTEM, que é calculado através da

diferença entre os valores obtidos pelo EXTEM e o FIBTEM e indica a parcela de

contribuição das plaquetas na coagulação (JI et al., 2015).

Os cinco principais parâmetros do ROTEM® (FIG. 4), são: tempo de coagulação

(CT), tempo de formação do coágulo (CFT), ângulo α, conjunto de parâmetros

relacionados a amplitude do coágulo (amplitude do coágulo pós 5 (A5), 10 (A10) e 20

minutos (A20) e máxima formação do coágulo (MCF) e o conjunto de parâmetros que

avaliam fibrinólise como lise máxima (ML) e percentual de lise após 30 minutos do CT

(LI30).

Page 27: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

14

Figura 4 — Representação gráfica dos parâmetros do ROTEM®

Fonte: DURAJ et al., 2015.

O CT é o tempo do início do teste até a formação de um coágulo de 2 mm de

amplitude. Reflete a velocidade da geração de trombina e a atividade dos fatores de

coagulação (GÖRLINGER et al., 2016a). O prolongamento do CT do EXTEM pode

indicar deficiência dos fatores da via extrínseca vitamina K-dependentes (VII, IX, X) e

protrombina (II), e pode ser corrigido com administração de concentrado de complexo

protrombínico (CCP) ou plasma fresco congelado (PFC) (TANAKA et al., 2012). Se há

prolongamento de CT no INTEM e HEPTEM, pode haver deficiência de fatores da via

intrínseca (VIII, IX, XI, XII). Se CT do HEPTEM estiver normal há influência de

heparina na amostra. Se CT do INTEM e EXTEM prolongados há falência global de

fatores de coagulação, que pode ser corrigida com PFC (ROCHA et al., 2017).

O CFT é o período de tempo que a amplitude da firmeza do coágulo aumenta

de 2 até 20 mm, o que depende da taxa de geração da trombina, da concentração de

fibrinogênio, da função plaquetária e da polimerização da fibrina (ROCHA et al., 2017).

O ângulo α compreende ao ângulo formado pela tangente aos 2 mm de

amplitude e reflete rapidez da produção de trombina e da ligação cross link entre

pontes de fibrina (LIER et al., 2013). Quanto mais agudo, mais hipocoagulável; quanto

mais obtuso, maior a tendência a hipercoagulabilidade (GÖRLINGER et al., 2016a).

O α, igualmente ao CFT, reflete a cinética da formação do coágulo, que

depende da atividade do fibrinogênio e das plaquetas. Na agudização do α também

Page 28: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

15

deve-se realizar o FIBTEM na busca de diferenciar entre deficiência plaquetária e

deficiência de fibrinogênio (ROCHA et al., 2017).

Os parâmetros de amplitude MCF, A5, A10 e A20, indicam amplitude do

coágulo e se correlacionam com o número e função plaquetárias, concentração de

fibrinogênio, atividade do fator XIII e polimerização da fibrina (GÖRLINGER et al.,

2012).

Os parâmetros de lise, LI30 e ML, indicam o percentual de diminuição do

coágulo em relação à MCF. Quando ML > 15% em 1h ou LI30 alargados podem

demonstrar hiperfibrinólise (DEKKER et al., 2014).

Os valores de referência do ROTEM® para os parâmetros citados acima estão

descritos na tabela 1.

Tabela 1 — Valores de referência dos parâmetros para adultos no ROTEM®

Fonte: Tradução de GÖRLINGER et al., 2016a.

Há ainda um módulo de dois canais, denominado ROTEM® platelet, que pode

ser agregado ao ROTEM® convencional e possibilita a avaliação da função de

agregação plaquetária, através de agregometria por impedância. Seu princípio de

funcionamento baseia-se na mudança da impedância entre dois fios colocados dentro

de uma cubeta devida à agregação plaquetária (GÖRLINGER et al., 2016a).

O tempo de análise é de 6 minutos e são registrados três parâmetros: A6,

amplitude após 6 minutos (medida em ohm - Ω), que mede a extensão da agregação

após a ativação seletiva; MS, máxima taxa de variação da curva de agregação em

TESTE CT (s) CFT (s)

α (º) A10

(mm) A20

(mm) MCF (mm)

LI30 (%)

ML (%) em 1h

EXTEM 38-79 34-159 63-83

43-65 50-71 50-72 94-100 <15

FIBTEM - - - 7-23 8-24 9-25 - -

APTEM Comparar com o EXTEM. Uma melhor formação do coágulo APTEM, comparado com EXTEM, demonstra in vitro efeito de drogas antifibrinolíticas (ex.: ácido tranexâmico).

INTEM 100-250

30-110 70-83

44-46 50-71 50-72 94-100 <15

HEPTEM Comparar com o INTEM. Uma melhor formação do coágulo no HEPTEM comparado com INTEM indica a presença de heparina ou substâncias semelhantes na amostra.

Obs.: Os valores de referência podem variar em cada país, ou até mesmo entre os hospitais. Portanto, os valores indicados na tabela são apenas para orientação, sendo recomendado estabelecer valores específicos para cada hospital.

Page 29: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

16

Ohm/min, que mede a quão rápido ocorre a agregação após a ativação seletiva das

plaquetas; AUC, área abaixo da curva em Ohm.min, que mede o volume de agregação

durante todo o teste e indica de forma geral a função plaquetária (PETRICEVIC et al.,

2016).

Nessa ativação seletiva três reagentes podem ser utilizados como ativadores:

ARATEM (ácido araquidônico), que avalia a cicloxigenase (COX) e permite

avaliar efeito de bloqueadores dela, como o ácido acetilsalicílico e o

diclofenaco (SCHARBERT et al., 2009). Ele permite também avaliar a

inibição/ausência dos receptores GPIIb/IIIa;

ADPTEM (difosfato de adenosina - ADP), que estimula os receptores de ADP

das plaquetas e permite avaliar as drogas antiplaquetárias, como o clopidogrel.

Além disso, a ativação via ADP também ativa uma mudança de forma nos

receptores GPIIb/IIIa, permitindo assim avaliar também o efeito de drogas que

agem sobre esses receptores como eptifibatide (PETRICEVIC et al., 2016);

TRAPTEM (peptídeo-6 ativador do receptor da trombina), que ativa as

plaquetas via receptor de trombina, o que também causa ativação dos

receptores GPIIb/IIIa, porém ele é pouco sensível a bloqueadores da COX.

Adicionalmente, por ser um poderoso ativador plaquetário, ele indica o máximo

potencial de agregação plaquetária desde que não existam inibidores

GPIIb/IIIa no sangue (RANUCCI et al., 2016).

Portanto, esse módulo resolve uma das principais limitações do ROTEM®

tradicional, a impossibilidade de avaliar adequadamente os efeitos dos fármacos

antiplaquetários (CORREDOR et al., 2015).

Para facilitar e padronizar a interpretação dos resultados do ROTEM® no

período perioperatório foram desenvolvidos algoritmos de conduta. O algoritmo

desenvolvido pela força tarefa Essener Runde (FIG. 5), utiliza os resultados dos testes

INTEM, EXTEM, HEPTEM, FIBTEM e APTEM e permite diagnosticar deficiências nas

vias intrínseca e extrínseca, de atividade plaquetária, efeitos da heparina e

hiperfibrinólise (LIER et al., 2013).

Contudo, nem sempre todos os testes estão disponíveis, dessa forma também

foram desenvolvidos, algoritmos como o proposto por Morcom (2018), figura 6, que

utiliza apenas os três testes mais comuns, EXTEM, INTEM e FIBTEM e os parâmetros

CT, MCF e LI30. Ele também tem a vantagem de ser uma rotina simples e de fácil

memorização.

Page 30: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

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Figura 5 — Algoritmo proposto pela força tarefa Essener Runde para o uso do

ROTEM®

Fonte: CROCHEMORE et al., 2017.

Figura 6 — Abordagem simplificada baseada nos parâmetros do ROTEM®

Fonte: Tradução de MORCOM, 2018.

Há também os algoritmos baseados em evidências específicos para cirurgias

cardiovasculares, como o apresentado por Görlinger et al. (2019) (FIG. 7). Esse

algoritmo utiliza como índice padrão a amplitude máxima do coágulo após 5 minutos

(A5), o que proporciona uma rápida análise dos resultados.

Page 31: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

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Figura 7 — Algoritmo proposto por Görlinger para cirurgias cardiovasculares

1- Checar condições básicas: Temp. > 35°C; pH > 7.3; Cai2+ > 1 mmol/L; Hb ≥ 7 g/dl.

2- Intervenções simultâneas: máximo de três intervenções ao mesmo tempo (em primeira

análise e sangramento grave). Máximo de duas intervenções ao mesmo tempo (em segunda

análise e sangramento moderado a grave). Apenas uma intervenção ao mesmo tempo (na

segunda análise ou posterior e sangramento leve a moderado).

Page 32: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

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3- Cálculo da dose de fibrinogênio (g): diferença para a meta no A5FIB (mm) × peso (kg) / 160.

Fator de correção (140–160 mm kg/g) depende do volume atual de plasma. 10 U

crioprecipitado ≈ 2 g concentrado de fibrinogênio.

4- Cirurgia cardiovascular: Checar função plaquetária com ROTEM® platelet (ADPTEM e

TRAPTEM) após desmame da circulação extracorpórea e a reversão da heparina com

protamina: A5EX 23–30 mm ou ADPTEM ≤ 35 Ω min: 1 pool ou aférese de plaquetas. A5EX 15–

22 mm ou (ADPTEM ≤ 35 Ω min e TRAPTEM ≤ 45 Ω min): 2 concentrados de plaquetas. A5EX

< 15 mm: 2 concentrados de plaquetas + reposição de fibrinogênio.

5- Se o concentrado de complexo protrombínico de 4 fatores não estiver disponível: 10–15 ml

PFC /kg ou 45 (−90) μg rFVIIa /kg (se o paciente está normotérmico, com pH > 7.3, Cai 2+ > 1

mmol/L, A5EX ≥ 30 mm, e A5FIB ≥ 9 mm mas PFC não é efetivo para diminuir CTEX ≤ 80 s e

CTHEP ≤ 280 s).

Fonte: Tradução de GÖRLINGER et al., 2019.

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20

3 RELATO DE CASO

O caso a seguir ocorreu no Instituto Nacional de Cardiologia - Rio de Janeiro.

O Instituto Nacional de Cardiologia é um hospital público de alta complexidade que

realiza diversos tipos de procedimentos em cardiologia, sendo o único a efetuar

cirurgia de transplante cardíaco de forma gratuita no estado.

Trata-se de um paciente do sexo masculino; com 66 anos de idade, classificado

como ASA-PS4 pelo Physical Status Classification System; pesando 65 Kg e com

altura de 1,60 m e Índice de Massa Corpórea (IMC) de 25,4 kg/m², foi eleito para

realização de transplante cardíaco ortotópico devido a insuficiência cardíaca

biventricular grave, com status funcional classe IV baseado nos critérios da New York

Heart Association, causada por cardiomiopatia isquêmica advinda de infarto agudo do

miocárdio em 1997 e 2014.

Seu histórico médico inclui cirurgia de revascularização do miocárdio em 1997,

angioplastia coronária transluminal percutânea em 2018, doença renal crônica,

hipotireoidismo, hiperuricemia e doença pulmonar obstrutiva crônica por tabagismo

intenso com carga tabágica de 84 maços/ano interrompido há 22 anos.

Em 5 de fevereiro de 2019, foi admitido no Instituto Nacional de Cardiologia do

Rio de Janeiro com insuficiência cardíaca descompensada perfil clínico-

hemodinâmico categoria B (“quente e úmido”). Apesar do tratamento com diurético, o

paciente evoliu para a categoria C (“frio e úmido”) com sinais de baixa perfusão,

necessitando de suporte inotrópico com dobutamina, sendo classificado como

INTERMACS 3.

Os medicamentos diários utilizados pelo paciente no momento da admissão

incluíam ácido acetilsalicílico 100 mg; clopidogrel 75 mg; sinvastatina 20 mg;

amiodarona 100 mg; bisoprolol 2,5 mg; alopurinol 100 mg; levotiroxina 75 µg;

hidralazina 50 mg (25 mg 2x/dia); mononitrato de isossorbido 40 mg (20 mg 2x/dia);

trimetazidina 70 mg (35 mg 2x/dia); furosemida 20mg e clonazepam 2mg.

Houve a disponibilização de um coração para transplante proveniente de um

doador compatível, do sexo masculino, com 42 anos, altura de 1,74 m e peso de 70

kg, previamente saudável, diagnosticado com morte encefálica após perfuração por

arma de fogo, sem infecções e ecocardiograma normal.

3.1 AVALIAÇÃO PRÉ-TRANSPLANTE

Page 34: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

21

Foi realizada uma avaliação pré-transplante na qual o paciente foi submetido a

uma série de exames para garantia dos critérios de elegibilidade para transplante

cardíaco, que incluíram avaliações clínicas, laboratoriais, imunológicas,

hemodinâmicas, psicológicas e sociais. O ecocardiograma transtorácico mais recente

mostrou aumento das quatro câmaras cardíacas; FE Teicholz 11,92%; disfunção

sistólica grave do ventrículo esquerdo, com acinesia inferior, apical e septal. Átrios

esquerdo e direito aumentados; válvula aórtica espessada com regurgitação leve;

valva mitral com regurgitação grave; valva tricúspide com regurgitação grave e PSAP

estimada de 57 mmHg. A avaliação da resistência vascular pulmonar mostrou

hipertensão arterial pulmonar grave, porém responsiva ao nitroprussiato de sódio.

3.2 MANEJO ANESTÉSICO

O paciente foi admitido na sala de operação com infusão contínua de

dobutamina (12,8 µg/kg/min) por meio de um cateter central de inserção periférica,

mantida durante todo o ato anestésico.

Após a monitorização não invasiva e a instalação de colchão térmico o paciente

foi levemente sedado com 2 mg de midazolam e 50 µg de fentanil. A artéria radial

esquerda foi então puncionada para monitoração invasiva da pressão arterial e a veia

jugular interna direita cateterizada com cateter de duplo lúmen e cateter Swan-Ganz

(CCombo V; 8,5 French, Edwards Lifesciences®, Irvine, CA, EUA), sob orientação de

imagem ultrassonográfica, para monitorização da pressão venosa central e medições

do débito cardíaco (monitoração Vigilance®, Edwards Lifesciences, Irvine, CA, EUA),

respectivamente.

Utilizou-se como antibiótico para profilaxia 1 g de vancomicina e 1 g de

meropenem. A indução ocorreu de forma hemodinamicamente estável utilizando

etomidato (11 mg), fentanil (200 µg) e rocurônio (60 mg); em seguida foi realizada a

intubação endotraqueal após a primeira tentativa por laringoscopia direta (Cormack-

Lehane 2) com inserção de tubo endotraqueal nº 8.0. A manutenção do plano

anestésico foi feita com oxigênio, ar ambiente e isoflurano em ventilação mecânica

ajustada para o modo controlado por volume.

Uma sonda ecocardiográfica transesofágica foi inserida para avaliar a função e

confirmar a retirada de ar do enxerto cardíaco no final da circulação extracorpórea.

Page 35: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

22

Metilprednisolona 500 mg e basiliximab 20 mg foram administrados antes da

incisão cirúrgica, além de infusão contínua de milrinona (2,46 µg/kg/min) e

vasopressina (0,02 U/kg/min), tituladas durante a cirurgia.

O ácido tranexâmico foi utilizado com dose de ataque de 20 mg/kg e infusão

contínua de 5 mg/kg/h até o final do procedimento. A linha de base do tempo de

coagulação ativada foi de 110s.

Realizou-se esternotomia sem intercorrências e estabeleceu-se circulação

extracorpórea após a administração de heparina 30.000 UI e um TCA de 552s. O

manejo anestésico durante a circulação extracorpórea foi mantido com infusão de

propofol por TCI, hipotermia a 32°C e transfusão de um concentrado de hemácias. O

transplante cardíaco foi realizado pela técnica bicaval e, ao final da anastomose, foi

inserido um marcapasso epicárdico temporário. O tempo total de bypass foi de 85

minutos e o tempo de pinça de 115 minutos. O paciente foi desmamado da circulação

extracorpórea após reaquecimento a 36,5 °C e suporte de dobutamina 12,8 µg/kg/min,

vasopressina 0,03 U/kg/min, milrinona 0,77 µg/kg/min e noradrenalina 0,37 µg/kg/min,

apresentando persistente disfunção do ventrículo direito à ultrassonografia.

Foram administrados 1.000 UI de concentrado de complexo de protrombina,

fibrinogênio 4g e uma aférese plaquetária, além da protamina 350 mg para o

tratamento de distúrbios previstos da hemostasia após a circulação extracorpórea.

Apesar dessas condutas e do TCA pós–protamina normal de 124s, o cirurgião

apresentava dificuldades em realizar a hemostasia.

Realizou-se tromboelastometria rotacional (ROTEM®) que não evidenciou

alterações nos testes INTEM, EXTEM e FIBTEM, figuras 8, 9 e 10 respectivamente.

O tempo de coagulação (CT) do EXTEM, figura 8, encontrava-se no limite superior da

normalidade, podendo indicar o início da deficiência de fatores de coagulação da via

extrínseca. Optou-se então, por administrar outra aférese plaquetária, já que o

ROTEM® utilizado não avalia bem disfunção trombocítica por não ter o módulo

ROTEM® platelet. A hemostasia satisfatória foi atingida permitindo o fechamento do

esterno. Nesse momento, a disfunção do ventrículo direito era parcialmente

controlada com a manutenção da infusão inotrópica e vasopressora e o uso de óxido

nítrico inalado a 50 ppm. Albumina, gluconato de cálcio, três concentrados de

hemácias e sistema de transfusão autóloga (Cell Salvage®) também foram utilizados.

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23

Fonte: A autora

Fonte: A autora

Fonte: A autora

Antes de deixar a sala de cirurgia, a equipe observou que o dreno mediastinal

apresentava sinais de sangramento remanescente e optou por reabrir a esternotomia

para revisar a hemostasia. Sangramento difuso foi encontrado e um segundo

ROTEM®, figuras 11, 12 e 13, foi realizado. Desta vez, o CT do EXTEM, figura 11,

Figura 8 — EXTEM do primeiro ROTEM®

Figura 9 — INTEM do primeiro ROTEM®

Figura 10 — FIBTEM do primeiro ROTEM®

Page 37: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

24

encontrava-se prolongado e a lise máxima (ML) estava acima do limite da

normalidade, demonstrando deficiência de fatores extrínsecos da coagulação e

hiperfibrinólise, respectivamente.

Figura 11 — EXTEM do segundo ROTEM®

Fonte: A autora

Figura 12 — INTEM do segundo ROTEM®

Fonte: A autora

Figura 13 — FIBTEM do segundo ROTEM®

Fonte: A autora

Uma dose extra de ácido tranexâmico e CCP foi administrada para realizar

hemostasia, com o último ROTEM®, figuras 14, 15 e 16, indicando resultados normais.

Page 38: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

25

O tórax foi novamente fechado e o paciente foi transferido para a unidade de

pós-operatório sedado, intubado, em uso de óxido nítrico inalado, e de infusões de

dobutamina, milrinona, vasopressina e noradrenalina.

Fonte: A autora

Fonte: A autora

Figura 16 — FIBTEM do segundo ROTEM®

Fonte: A autora

Figura 14 — EXTEM do terceiro ROTEM®

Figura 15 — INTEM do terceiro ROTEM®

Page 39: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

26

4 DISCUSSÃO

A monitorização perioperatória da coagulação é fundamental para estimar o

risco de sangramento, diagnosticar deficiências causadoras de hemorragia e guiar

terapias hemostáticas durante procedimentos cirúrgicos de grande porte, como

transplante cardíaco (CROCHEMORE et al., 2017).

Estudos demonstram que sangramento massivo, reexploração mediastinal e

transfusão de hemoderivados alogênicos são preditores independentes de

morbimortalidade após esses procedimentos (BOLLIGER & TANAKA, 2013;

CORREDOR et al., 2015; PETRICEVIC et al., 2016; BOLLIGER & TANAKA, 2017).

Nesse cenário, devido as patologias prévias, os pacientes geralmente

apresentam maior risco de trombose vascular associada a doença vascular

ateromatosa, fibrilação atrial, stents coronários mecânicos implantados. Por esse

motivo terapias antiplaquetárias e antitrombóticas muitas vezes são prescritas para

pacientes no pré-operatório (TANAKA et al., 2012).

Em relação ao intraoperatório, esses pacientes são anticoagulados com

heparina para prevenir formação de trombos pela circulação extracorpórea ou pela

anastomose vascular. Alterações inerentes a cirurgia como hemorragia e

hemodiluição diminuem os fatores de coagulação circulantes e inibidores.

Na conclusão da cirurgia, a anticoagulação com heparina requer uma reversão

imediata usando protamina para estabelecer hemostasia (formação do coágulo).

Terapia antifibrinolítica com ácido tranexâmico ou ácido aminocaproico são

comumente usadas como agentes profiláticos para diminuir o sangramento durante o

bypass cardiopulmonar (TANAKA et al., 2012).

Por esses motivos, várias causas hematológicas podem contribuir para o

aumento do sangramento perioperatório, incluindo dupla terapia antiplaquetária,

diminuição dos níveis trombina devido a anticoagulantes orais, hipofibrinogenemia,

heparina residual, hiperfibrinólise, circulação extracorpórea prolongada e parada

cardíaca hipotérmica profunda (KIKURA et al., 2006; BOLLIGER & TANAKA, 2013;

BOLLIGER & TANAKA, 2017).

Pode-se observar que equilibrar o risco de trombose contra hemorragia é uma

das tarefas mais difíceis para os médicos que estão envolvidos no cuidado

perioperatório de um paciente cardiopata que irá se submeter a uma cirurgia com

Page 40: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

27

necessidade de circulação extracorpórea. Sendo assim, o manejo do sangramento

em cirurgia cardíaca compreende uma interação entre o cirurgião, o anestesista e o

perfusionista clínico (BOER et al., 2018).

Sangramento excessivo durante e após cirurgia cardíaca tem incidência de

cerca de 20% (PETRICEVIC et al., 2016). Em casos complexos de circulação

extracorpórea, frequentemente é necessária a transfusão de plasma alogênico e

produtos plaquetários para obter hemostasia (TANAKA et al., 2012). Contudo,

transfusões de eritrócitos, produtos de plasma e hemoderivados têm sido associadas

a eventos adversos graves que aumentam a mortalidade e morbidade, como

infecções nosocomiais e sepse devido a imunomodulação associada a transfusão,

lesão pulmonar aguda, complicações tromboembólicas, insuficiência renal,

sobrecarga cardíaca associada a transfusão, contaminação bacteriana e disfunções

de órgãos, além de aumento de custos (TANAKA et al., 2012; LIER et al., 2013;

HUFFMYER et al., 2016; BOLLIGER & TANAKA, 2017).

Dessa forma, uma rápida avaliação e manejo da função hemostática é crucial

para que a reposição de fluidos e sangue possam ser realizadas sem atrasos e nas

quantidades corretas (TANAKA et al., 2012).

O monitoramento convencional da coagulação durante e após o bypass

cardiopulmonar envolve um processamento sequencial, pelo qual vários os testes são

enviados ao mesmo tempo, mas seus resultados ficam disponíveis após intervalos de

tempo diferentes (WILLIAMS et al., 2017).

Além disso, testes convencionais da coagulação, como o tempo de atividade

da protrombina (TAP), razão normalizada internacional (INR), tempo de

tromboplastina parcial ativada (TTPa) e taxa de conversão do fibrinogênio pelo

Método de Clauss possuem valor preditivo positivo limitado e não são validados para

prever e/ou orientar a terapia na hemorragia aguda, porém têm sido amplamente

utilizados para este fim (LIER et al., 2013; CROCHEMORE et al., 2017; SOH et al.,

2017).

Outro problema no caso de cirurgias que envolvem circulação extracorpórea é

que a alta concentração de heparina durante esse período dificulta o uso desses teste,

sendo assim, TAP e TTPa são pedidos somente após a neutralização da heparina,

portanto, esses resultados não estão disponíveis quando os sangramento ocorre logo

após a administração de protamina (WILLIAMS et al., 2017).

Page 41: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

28

Portanto, esses testes são insatisfatórios no contexto dinâmico do

intraoperatório, pois demandam tempo (45-90 min), não avaliam a função plaquetária,

são incapazes de avaliar a interação entre células e elementos hemostáticos, pois são

determinados a partir do plasma (não no sangue total) e necessitam ser realizados

em temperatura de 37°C, situação que muitas vezes não representa a temperatura

real do paciente (TANAKA et al., 2012; BOLLIGER & TANAKA, 2013; ENGBERINK et

al., 2014; MALLETT, 2015; BOLLIGER & TANAKA, 2017; CROCHEMORE et al.,

2017).

Dessa maneira, houve um aumento do interesse nos testes point-of-care

hemostáticos viscoelásticos, como TEG® e ROTEM®, na última década (BOER et al.,

2018).

A principal vantagem desses testes é determinar de forma rápida (5-10 min)

exatamente quais deficiências estão ocasionando a coagulopatia possibilitando a

terapia direcionada e individualizada dos componentes hemostáticos, reduzindo a

perda de sangue e evitando transfusões desnecessárias (TANAKA et al., 2012;

BOLLIGER & TANAKA, 2013; ENGBERINK et al., 2014; WITHING & DINARDO, 2014

CORREDOR et al., 2015; BOLLIGER & TANAKA, 2017).

Deve se ressaltar que a fisiopatologia do sangramento perioperatório é

complexa e nem sempre pode ser tratada adequadamente apenas por ressuscitação

hemostática baseada em proporção (conceito 1: 1: 1), pois essa estratégia não corrige

a coagulopatia, apenas proporciona mais tempo para a identificação do motivo do

sangramento (coagulopatia e/ou cirúrgico) e para a realização das intervenções

hemostáticas adequadas (GÖRLINGER et al., 2019).

Assim, alguns centros estão usando uma abordagem híbrida, começando com

um conceito de transfusão baseado em razão até que os dados de coagulação da

tromboelastometria estejam disponíveis e permitam uma terapia hemostática

direcionada (GÖRLINGER et al., 2019).

Nesse sentido, foram desenvolvidos algoritmos como um elo entre o

diagnóstico ROTEM® e terapia hemostática personalizada (“abordagem teranóstica").

Esse conceito é cada vez mais aceito e, assim que os dispositivos e drogas se

tornarem disponíveis em quantidade e de forma abrangente, pode substituir a

“reanimação por controle de danos”, onde transfusões preemptivas de plasma fresco

congelado (PFC) e concentrados de plaquetas são realizadas de acordo com a

necessidade de eritrócitos (TANAKA et al., 2012; LIER et al., 2013).

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29

Com o crescente número de publicações sobre o tema esses algoritmos

mudaram de baseados em experiências para baseados em evidências. (CORREDOR

et al., 2015; GÖRLINGER et al., 2016b; GÖRLINGER et al., 2019).

Com base nessas evidências, a implementação dos algoritmos guiados por

ROTEM® é altamente recomendada pelas diretrizes para o manejo de sangramento

perioperatório grave da Sociedade Europeia de Anestesiologia, diretriz europeia

atualizada para tratamento de hemorragia e coagulopatia após traumas graves e as

diretrizes práticas atualizadas para o manejo perioperatório do sangue da Sociedade

Americana de Anestesiologistas (GÖRLINGER et al., 2016b).

Sendo assim, o teste viscoelástico se tornou uma parte essencial dos

protocolos / algoritmos multimodais. Eles geralmente consistem em um conjunto

predeterminado de diagnósticos e intervenções destinadas a reduzir a perda de

sangue e requisitos de transfusão. Em particular, intervenções terapêuticas altamente

eficazes com concentrados de fatores de coagulação como concentrado de

fibrinogênio e CCP, devem ser guiadas por tromboelastometria (GÖRLINGER et al.,

2016b).

Diversos estudos comparando algoritmos baseados nos testes convencionais

da coagulação e baseados na tecnologia ROTEM® foram realizados demonstrando a

superioridade dos testes viscoelásticos na predição de sangramento e da sua

etiologia, implicando e redução de custos relacionados a transfusão sem estar

associado a um aumento da incidência e eventos tromboembólicos (GÖRLINGER et

al., 2016b).

A principal vantagem clínica dos protocolos institucionais de transfusão guiados

por ROTEM® é que o tratamento pode ser iniciado mais precocemente (até 25 minutos

antes) e de maneira mais direcionada do que se utilizasse exames de coagulação

convencionais, como consequência, menos sangue é perdido havendo menor risco

de coagulopatia dilucional devido a menor infusão contínua de cristaloides ou coloides

que pode ocorrer enquanto o paciente aguarda os resultados do teste. Diante disso,

há redução da necessidade de transfusão do uso de medicações hemostáticas em

geral, refletindo na diminuição da mortalidade em 30 dias (SHORE-LESSERSON et

al., 1999; BOLLIGER & TANAKA, 2013; BOLLIGER & TANAKA, 2017; CORREDOR

et al., 2015; BACAL et al., 2018; GÖRLINGER et al., 2019; KUIPER et al., 2019; LEE

et al., 2010; LIER et al., 2013;).

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30

Outras Ensaios clínicos randomizados comprovaram que, em cirurgia cardíaca,

esses protocolos são capazes de minimizar eventos adversos trombóticos e

tromboembólicos, além de diminuírem a necessidade de reexploração e o tempo de

médio de permanência hospitalar em 4 dias (THEUSINGER et al.,2009; LIER et al.,

2013; GÖRLINGER et al., 2016b; BACAL et al., 2018; SARRAIS POLO et al., 2018;

KUIPER et al., 2019)

Por outro lado, houve um aumento no uso de ácido tranexâmico, observado

como uma fonte alternativa mais condensada de fibrinogênio em comparação com

plasma fresco congelado. O uso intraoperatório de fibrinogênio foi 0,3 g maior no

grupo do ROTEM® (VASQUES et al., 2016). Enquanto isso, o uso de DDAVP e de

fator VII recombinante ativado diminuíram para quase nenhum, e o uso de

concentrados de plaquetas permaneceu inalterado (KUIPER et al., 2019). Scniecinski

(2018) concluiu que o uso de testes viscoelásticos reduz o risco de receber uma

transfusão de plaquetas em aproximadamente 30%.

A relação custo-benefício da terapia guiada por ROTEM® também foi

comprovada por várias avaliações de tecnologias em saúde e análises

farmacoeconômicas, Kuiper et al. (2019) demonstrou economia potencial de € 4.800

(US$ 5.630) por paciente. (LUDDINGTON, 2005; GÖRLINGER et al., 2016b; KUIPER

et al., 2019).

Apesar dos testes viscoelásticos apresentarem baixos valores preditivos

positivos para sangramento em cirurgia cardíaca, eles possuem valor preditivo

negativo próximo a 100% nos modelos estatísticos, ou seja, valores normais

praticamente excluem a coagulopatia como causa do sangramento. Nesse sentido,

alterações na tromboelastometria não devem ser corrigidas na ausência de

sangramento (DAVIDSON et al., 2008; BOLLIGER & TANAKA, 2013; ENGBERINK et

al., 2014; BOLLIGER & TANAKA, 2017).

Outro dado importante confirmado por diversos estudos é o papel central do

fibrinogênio para o sangramento após a cirurgia cardiovascular, pois é diluído e

consumido rapidamente durante e após a circulação extracorpórea. Karkouti et al.

(2013) demonstraram que um nível de fibrinogênio após circulação extracorpórea

abaixo de 2 g / L, que corresponde a um A5FIB <9 mm (A10FIB <10 mm), está

associado a uma probabilidade significativamente aumentada de transfusão de ≥ 5U

glóbulos vermelhos (GÖRLINGER et al., 2019).

Page 44: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

31

Ranucci et al. (2016) demonstraram que a reposição de fibrinogênio em cirurgia

cardíaca é muito eficaz para interromper o sangramento em pacientes com

hipofibrinogenemia, mas que uma reposição maior que um A5FIB de 16 mm

(correspondente a uma concentração plasmática de fibrinogênio de cerca de 3 g/L)

não mostra qualquer melhoria adicional.

Com objetivo de tornar o diagnóstico ainda mais rápido, outros estudos

comparam protocolos baseados em valores iniciais da firmeza do coágulo (A5 e A10)

no FIBTEM, EXTEM e PLTEM são igualmente capazes e confiáveis em identificar a

máxima firmeza do coágulo (MCF) e, portanto, podem ser utilizados elucidar as

causas da coagulopatia em relação aos protocolos baseados no A10 e MFC,

possibilitando a identificação mais precoce da sua etiologia. (GÖRLINGER et al.,

2012; ENGBERINK et al., 2014; KELLY et al., 2018).

Apesar disso, o parâmetro ROTEM® A5 ainda não é aprovado pela FDA, e por

isso os algoritmos para os EUA são baseados no A10, enquanto A5 é usado como

parâmetro de firmeza do coágulo no resto do mundo para acelerar a tomada de

decisões. A diferença entre A10 e A5 para FIBTEM é geralmente 1 mm e para EXTEM,

APTEM, INTEM e HEPTEM 9–11 mm (GÖRLINGER et al., 2016b).

Por outro lado, a adoção desses algoritmos deve ser feita de forma criteriosa,

uma vez que GÖRLINGER et al. (2016a) indica que os intervalos de referência

ROTEM® podem variar de país para país e até de hospital para hospital. Scniecinski

(2018) demonstrou que esses valores variaram significativamente entre os estudos

utilizados em sua metanálise. A revisão da Cochrane realizada por Hunt et al. (2015),

igualmente conclui que ainda há uma grande dúvida sobre os limiares.

Outro problema dos testes viscoelásticos é a não intercambialidade entre eles.

Isto é devido ao uso de diferentes ensaios e ativadores de coagulação, bem como o

uso de diferentes nomenclaturas. Dessa forma, algoritmos para intervenções

hemostáticas baseadas em uma tecnologia não são diretamente transferíveis para

outra (ZAKY, 2017).

Além disso, é essencial que a implementação dessa tecnologia venha

acompanhada de um treinamento técnico e de interpretação adequados, com

colaboração interdisciplinar e que o equipamento esteja sujeito a padrões de

qualidade (GÖRLINGER et al., 2019; KUIPER et al., 2019).

Do ponto de vista dos testes deve se destacar que apesar da literatura indicar

que os testes da via extrínseca EXTEM e FIBTEM possam ser utilizados durante a

Page 45: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

32

circulação extracorpórea com altos níveis de heparina circulantes (até 6UI/mL), Gertler

et al. (2011) demonstrou que concentrações acima de 2 UI/mL ocasionam alterações

dos resultados do FIBTEM. Relatórios recentes propõem o uso do sistema ROTEM®

para corrigir as deficiências de coagulação adquirida mesmo quando o paciente ainda

está em bypass com alta concentrações de heparina. No entanto, os autores

observaram uma variabilidade significativa ao longo do tempo na tromboelastometria

durante circulação extracorpórea. Altas concentrações de heparina, como 7 UI / ml,

podem ser a causa da variabilidade observada. Valores ótimos preditivos para

sangramento em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca com circulação

extracorpórea foram identificados como MCF do FIBTEM < 8 mm (GERTLER et al.,

2011).

O diagnóstico clínico de hipocoagulabilidade pode ser alcançado em tempo

hábil usando tromboelastometria. Contudo, a utilidade do ROTEM® no diagnóstico de

trombofilia ou hipercoagulabilidade ainda é uma questão de debate. Contagem de

plaquetas e nível de fibrinogênio afetam fortemente a firmeza do coágulo; portanto,

pacientes com trombocitose ou hiperfibrinogenemia são frequentemente

categorizadas como "hipercoagulável”. Trombofilias adquiridas e hereditárias, como

fator V de Leiden e deficiências de AT, proteína C e proteína S não podem ser

detectadas pelas modalidades atuais de ROTEM®, por esse motivo idealmente

deveriam ser avaliadas antes da cirurgia usando testes de triagem adequados

(WILLIAMS et al., 2017).

A administração pré-operatória de agentes antiplaquetários, como a aspirina e

antagonistas do receptor P2Y12, é um padrão de tratamento em pacientes

coronarianos, no entanto seus efeitos determinam aumento do sangramento pós-

operatório e nas transfusões de plaquetas. Uma grande limitação dos testes TEG®/

ROTEM® padrão é a insensibilidade aos efeitos dessas drogas (RANUCCI et al.,

2016).

Essa limitação é causada pela geração de altas quantidades de trombina nos

sistemas do teste viscoelástico que mascaram os efeitos desses medicamentos,

estimulando as plaquetas através da via receptor de trombina. Como a trombina é o

ativador mais forte das plaquetas, a inibição de outras vias não afeta os resultados

dos testes viscoelásticos na presença de grandes quantidades de trombina

(GÖRLINGER et al., 2016b).

Page 46: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

33

Contudo, esse problema pode ser contornado com a adoção de testes de

agregometria por impedância, como o módulo ROTEM® platelet (TEM Innovations,

Munique, Alemanha), que pode ser adicionado ao ROTEM® padrão, tornando-o

sensível aos efeitos de drogas antiplaquetárias, protamina e circulação extracorpórea

na função plaquetária (SCHARBERT et al., 2009; PETRICEVIC et al., 2016).

A interrupção de tienopiridinas e ticagrelor antes da cirurgia cardíaca é

altamente recomendada por todas as diretrizes existentes. Porém, estudos apontam

uma grande variabilidade interindividual na taxa de recuperação da reatividade

plaquetária (RANUCCI et al., 2016). Nesse sentido, ROTEM® platelet pode ser útil

para detectar no pré-operatório defeito residual da função plaquetária causado por

medicamentos, a fim de reduzir o tempo de espera até a cirurgia após interrupção dos

agonistas do receptor ADP. Esse modo tem especial importância em pacientes que

serão submetidos à circulação extracorpórea, como ocorre no transplante cardíaco,

pelas disfunções plaquetárias decorrentes de terapia antiplaquetária, comorbidades e

efeitos da própria circulação extracorpórea na alteração da hemostasia (SCHARBERT

et al., 2009; PETRICEVIC et al., 2016).

Vários estudos, incluindo uma metanálise, demonstraram que a incorporação

do teste da função plaquetária nos algoritmos de gerenciamento de transfusões pode

ter valor na predição de requisitos excessivos de transfusão e na orientação de

intervenções hemostáticas, estando associada a redução na perda de sangue e na

necessidade de transfusão. (PETRICEVIC et al., 2016; RAMAN et al., 2015;

GÖRLINGER et al., 2019)

Publicações, como a de Huffmyer et al. (2016), concluíram que há fraca a

moderada correlação entre contagem de plaquetas e sua contribuição real na

formação de coágulos, ressaltando a importância da análise da função plaquetária na

avaliação da coagulação. Já, o ROTEM® platelet possui alto valor preditivo negativo

(92%) ajudando a excluir a disfunção plaquetária como a razão do sangramento, no

caso de resultados normais no ensaio ativado por ADP. Por um lado, o sangramento

nesses casos geralmente é multifatorial e a análise da função plaquetária não pode

descartar o sangramento cirúrgico, bem como o sangramento coagulopático devido à

hiperfibrinólise, baixo fibrinogênio ou geração prejudicada de trombina. Por outro lado,

baixa contagem de plaquetas ou disfunção plaquetária podem ser compensadas por

altos níveis de fibrinogênio. Portanto, se ocorrer sangramento excessivo em pacientes

com função plaquetária acima do valor de corte que delineia a tendência ao

Page 47: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

34

sangramento, deve-se considerar o teste viscoelástico e uma causa cirúrgica de

sangramento e o tratamento hemostático direto (PETRICEVIC et al., 2016).

Apesar do aumento do uso dos testes viscoelásticos o tempo de coagulação

ativado (TCA) é ainda o exame Point of Care mais comum para hemostasia

intraoperatória. Ele é usado para monitorar o efeito anticoagulante da heparina não

fracionada e orientar sua adequada neutralização pela protamina após o desmame da

circulação extracorpórea. Embora o TCA seja amplamente utilizado para esse fim, ele

é o teste hemostático menos sensível para detectar anticoagulação residual da

heparina, além de outros distúrbios hemostáticos que podem levar a sangramento

excessivo após circulação extracorpórea (PETRICEVIC et al., 2014).

Nos centros que utilizam uma proporção de 1: 1 entre a dose primária de

heparina e a dose de protamina administrada para reversão da heparina, uma

overdose de protamina pode ser o motivo mais frequentemente de um prolongamento

indescritível do TCA. Por outro lado, a overdose de protamina não está associada

apenas a um TCA indevidamente prolongado (inibição da ativação do fator V), Razão

CTIN / CTHEP ≤ 1, mas também com uma inibição significativa e de longa ação da

função plaquetária.

Os ensaios clínicos randomizados confirmaram que uma overdose de

protamina está associada a um aumento significativo na perda de sangue, nas

necessidades de transfusão e na necessidade de reoperação após cirurgia cardíaca.

Portanto, uma proporção de 1: 1 entre a dose primária de heparina e a dose de

protamina não deve ser utilizada, sendo mais prudente a adoção de uma proporção

de heparina para protamina de 1: 0,6-0,8 (GÖRLINGER et al., 2019).

Petricevic et al. (2014) concluíram que o INTEM, mas não o TCA, é útil na

predição da tendência ao sangramento após administração de protamina após o

desmame da circulação extracorpórea e por isso, pode ser usado como teste de

primeira linha na triagem de possível distúrbio hemostático após a administração de

protamina (ZAKY, 2017).

Existem várias vantagens do INTEM sobre o TCA. Metz & Keats (1990)

descobriram que manter um valor mínimo de TCA durante a circulação extracorpórea

não era necessário se uma dose intravenosa de 300 UI/ kg de heparina fosse

administrada antes da circulação extracorpórea. Enquanto Murray et al. (1997)

mostraram que o TCA não é muito sensível às baixas concentrações de heparina que

podem estar presentes após a reversão da protamina. Já Mittermayr et al. (2005),

Page 48: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

35

descreveram o ROTEM® como uma ferramenta valiosa para o gerenciamento de

heparina-protamina. Utilizando o parâmetro CT, os autores mostraram que

tromboelastometria pode ser usada para distinguir os efeitos do excesso de heparina

daqueles do excesso de protamina. Galeone et al. (2013) mostraram que o TCA não

era capaz de detectar atividade residual da heparina, enquanto a tromboelastografia

com e sem heparinase permitiu o diagnóstico de rebote da heparina.

Desse modo o uso concomitante do INTEM e HEPTEM revela baixas a

moderadas concentrações de heparina, permitindo detectar e prevenir o excesso de

protamina resultante de administração adicional de protamina resultante de

administração empírica ou baseada em TCA (ZAKY, 2017).

No entanto, nenhuma associação foi observada entre a concentração de

heparina, TCA e parâmetros de tromboelastografia com sangramento pós-operatório

e necessidade de transfusões de sangue e de componentes sanguíneos

(PETRICEVIC et al., 2014).

Aliado ao uso do ROTEM®, novas abordagens têm sido recomendadas para

reduzir o sangramento perioperatório de pacientes em cirurgia cardíaca, incluindo uso

de fármacos profiláticos, como ácido tranexâmico, ácido ε-aminocapróico e aprotinina,

implementação de sistemas de sangue autólogo (p. ex.: Cell Salvage®), além da

interrupção precoce de antiagregantes plaquetários e antitrombóticos e hemodiluição

normovolêmica aguda (BOLLIGER & TANAKA, 2013; BOLLIGER & TANAKA, 2017;

BACAL et al.,2018).

Em relação aos antifibrinolíticos, a aprotinina, apesar de ser um dos agentes

mais eficazes testados até o momento, tem um alto risco de levar a anafilaxia (2,8%

na reexposição) e por esse motivo não é mais utilizada nos EUA desde 2011

(WILLIAMS et al., 2017).

Um estudo prospectivo demonstrou que a administração profilática do ácido ε-

aminocapróico reduz o volume de drenagem mediastinal em 30% e não aumenta o

risco de anafilaxia com repetidas exposições, mas pode não ser potente o suficiente

para reduzir o risco de transfusão de sangue em cirurgia cardíaca (KIKURA et al.,

2006).

O ácido tranexâmico é cada vez mais utilizado durante grandes cirurgias com

o objetivo de reduzir sangramentos excessivos, requisitos de transfusão e

reexploração (SHARMA et al., 2017). Um estudo comparativo entre esses agentes

demonstrou maior mortalidade em 30 dias com aprotinina (6%) em comparação ao

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36

ácido tranexâmico (3,9%) ou ácido ε-aminocapróico (4%) (SHARMA et al., 2017).

Outro estudo demonstrou que a utilização do TXA no transoperatório de cirurgia de

revascularização miocárdica reduz o risco de sangramento na dose de 50 a 100 mg/kg

de peso, porém com risco de convulsão. (BACAL et al., 2018).

Em contrapartida, Sharma et al. (2017), indicaram resultados contraditórios

sobre o uso do TXA, demonstrando que em pacientes de risco médio submetidos à

cirurgia cardíaca, o TXA mostrou uma série de efeitos nos tempos de coagulação do

ROTEM®, nos níveis de fibrinogênio e na amplitude do coágulo. Depois da

esternotomia, o TXA levou a tempos prolongados de formação do coágulo, indicando

menor geração de trombina e polimerização da fibrina. Após a circulação

extracorpórea e a cirurgia, o TXA levou à diminuição da força do coágulo (EXTEM) e

após a administração de protamina, levou a trombocitopenia aguda.

Portanto, o uso de testes viscoelásticos associados a outras medidas para

contenção do sangramento massivo está crescendo em todo mundo em diferentes

contextos médicos e, apesar do debate, o seu uso associado a protocolos de manejo

hemostático têm se mostrado uma boa ferramenta para auxiliar no tratamento dessas

desordens.

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37

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pacientes submetidos a cirurgias cardíacas que envolvem circulação

extracorpórea, como transplantes cardíacos, estão entre os mais complexos do ponto

de vista da hemeostasia. O porte cirúrgico e a necessidade altas doses de heparina

são fatores de risco para hemorragias. Além disso, muitos pacientes fazem uso prévio

de medicamentos anticoagulantes que nem sempre estão completamente

neutralizados no momento da incisão.

Dessa forma, o uso de hemocomponentes e hemoderivados torna-se

necessário na maioria dos casos. Porém, transfusões alogênicas devem ser feitas

com parcimônia, visto que, caso realizadas em grandes quantidades, levam o risco de

complicações aumentando a morbimortalidade. Com o intuito de diminuir esse

consumo, abordagens “teranósticas” têm sido incentivadas por diferentes entidades,

como as sociedades americanas e europeias de anestesiologia e a sociedade

australiana de trauma.

Contudo, esse tipo de conduta só é possível caso a origem da hemorragia seja

rapidamente identificada e corrigida. Um obstáculo para isso é o alto de tempo de

resposta dos testes convencionais da coagulação e suas limitações em situações de

altas concentrações de heparina. Por outro lado, os testes viscoelásticos, como

ROTEM®, tem um baixo tempo de resposta, de 5 a 10 minutos, e podem ser utilizados

mesmo com altos níveis séricos de heparina o que os torna a ferramenta ideal para

esses momentos.

Estudos em diferentes locais indicaram que o uso do ROTEM® durante cirurgias

cardíacas possibilitou a diminuição do consumo de produtos do sangue, resultando

em ganhos para os pacientes, além de contribuir para a diminuição dos custos

hospitalares.

No caso descrito o uso do ROTEM® foi fundamental para diagnosticar a causa

da hemorragia, o que permitiu uma conduta adequada, garantindo um desfecho

favorável do quadro.

Portanto, os testes viscoelásticos estão se firmando como a principal

ferramenta diagnóstica e guia transfusional em pacientes com sangramento ativo

grave devido a praticidade, reprodutibilidade e custo-efetividade.

Page 51: Ministério da Saúde MARIANA SALDANHA GALVÃO SIMÕES

38

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