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1 EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE CRUZEIRO DO OESTE/ PARANÁ O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por seu Promotor de Justiça que ao final assina, no uso das atribuições que lhe são conferidas em lei, vem à presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo 129, inciso III da Constituição Federal, no artigo 5º da Lei nº 7.347/85, e demais dispositivos legais inerentes à espécie, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL, COM PEDIDO LIMINAR em face de FRIGORÍFICO FRIGOCRUZ LTDA, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ 08.852.792/0001-34, com número de inscrição estadual 9040803499, situada na Rodovia PR 323, KM 281, s/n, município de Cruzeiro do Oeste/PR, pelas seguintes razões de fato e de direito:

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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE CRUZEIRO DO OESTE/ PARANÁ

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por

seu Promotor de Justiça que ao final assina, no uso das atribuições que lhe são

conferidas em lei, vem à presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo 129,

inciso III da Constituição Federal, no artigo 5º da Lei nº 7.347/85, e demais

dispositivos legais inerentes à espécie, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL, COM PEDIDO

LIMINAR

em face de

FRIGORÍFICO FRIGOCRUZ LTDA, pessoa jurídica de direito

privado, inscrita no CNPJ 08.852.792/0001-34, com número de inscrição estadual

9040803499, situada na Rodovia PR 323, KM 281, s/n, município de Cruzeiro do

Oeste/PR, pelas seguintes razões de fato e de direito:

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DOS FATOS

Conforme se apurou no Inquérito civil protocolado sob o nº

0045.12.000113-1 da 3ª Promotoria de Justiça da Comarca de Cruzeiro do Oeste

(anexo), o réu FRIGORÍFICO FRIGOCRUZ LTDA, foi autuado “por estar lançando

efluentes líquidos tratados, fora dos parâmetros estabelecidos pelo IAP, no corpo

receptor hídrico Córrego I, afluente do Córrego Guarani, oriundo do processo

industrial de frigorífico de abate de bovinos.” (fls. 03/10). A autuação é datada

de 02 de maio de 2012.

Em julho de 2013, em nova informação do IAP, foi

relatado: “Que referida empresa possui Licença de Instalação, com data de

validade até 26/04/2014. Cabe ressaltar que a Licença de Instalação não dá o

direito da empresa estar operando. E informamos que, até a presente data, o

empreendedor não protocolou pedido de Licença de Operação para a

atividade frigorífico e abate de bovinos. Por esse motivo, este

IAP/ERUMU, confeccionou o Auto de Infração Ambiental nº 105579, na

data de 16/07/2013, por ‘funcionamento de atividade potencialmente

poluidora sem o devido licenciamento ambiental do órgão competente –

Licença de Operação, para abate de bovinos’, cuja cópia segue em anexo.

Informamos ainda, que na data de 01/07/2013, este IAP efetuou uma nova

coleta do efluente final, e constatou-se novamente que a empresa vem

operando fora dos padrões estabelecidos, conforme Relatório de Ensaios nº

2485/2013 e Informação Técnica nº 083/2013, em anexo. Constatado a

irregularidade do despejo fora dos padrões estabelecidos pelo órgão ambiental,

este IAP/Umuarama, emitiu novo Auto de Infração Ambiental sob nº 105580

(cópia anexo), com a seguinte descrição ‘lançamento de efluentes líquidos tratados

fora dos parâmetros estabelecidos pelo órgão ambiental competente, conforme

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Informação Técnica nº 083/2013, oriundo do abate de bovinos’. Portanto, resta

comprovado que a empresa Frigorífico Frigocruz Ltda, não sanou as

irregularidades ambientais, no que tange ao despejo de efluentes líquidos fora dos

padrões permitidos, bem como, vem operando sem o devido licenciamento

ambiental, ou seja, Licença de Operação.” (fls. 14/15).

Resta claro que a empresa Frigorífico Frigocruz Ltda está em

funcionamento irregular, em desconformidade com os padrões técnicos

estabelecidos pelo órgão ambiental competente, e causando poluição ambiental. A

atividade por ela desenvolvida, além de irregular, sem a devida Licença de

Operação, está degradando o meio ambiente.

Destaque-se, que há mais de um ano o órgão ambiental de

execução (IAP – UMUARAMA) vem tentando resolver o problema, que não é

solucionado por falta de vontade da empresa ré.

Ademais, atuar irregularmente, além de trazer prejuízos

imensuráveis ao meio ambiente, faz com que a empresa infratora diminua seus

custos de produção, não investindo em equipamentos e obras que a tornem

regular e evitem os danos ao meio ambiente. Assim, ao se deixar uma empresa

irregular em pleno funcionamento, estará se privilegiando o infrator e punindo

aquele que age corretamente, prejudicando a livre concorrência, o que é

abominado pelo direito.

Deve-se incentivar a atividade legal e regular, e uma das formas

de assim se proceder é, sem sombra de dúvidas, eliminar as formas de atuação

irregular.

Os fatos investigados no Inquérito Civil Público anexo, além de

crimes ambientais (que serão oportunamente investigados na esfera criminal),

caracterizam hipótese de uso nocivo da propriedade, atentado ao Princípio da

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Função Social da Propriedade, além de produzirem danos civis passíveis de

reparação.

DO CABIMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Por se tratar o direito ambiental de um direito transindividual,

sua tutela será exercida por intermédio de Ação Civil Pública, já que os atingidos

pela conduta danosa não podem ser determinados, ou sua determinação é tarefa

assaz penosa.

O artigo 1º da Lei 7.347/85 é claro ao dispor que: “art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: I – ao meio ambiente; (...)”

Para a tutela de interesses desta natureza, a legislação confere

legitimidade a alguns órgãos para propor ação civil pública que vise protegê-los.

Pois bem, a Constituição Federal, em seu artigo 129, inciso III

apregoa:

“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (...) III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.”

Da mesma forma, a Lei nº 7.347/85, que institui em nosso

ordenamento a Ação Civil Pública, confere legitimidade para sua propositura ao

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Ministério Público (artigo 5º, inciso I), à Defensoria Pública (inciso II), à União, aos

Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (inciso III); às autarquias, empresas

públicas, fundação ou sociedade de economia mista (inciso IV); às associações

(inciso V), que esteja constituída a mais de um ano e inclua entre suas finalidades

institucionais a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à

livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e

paisagístico (alíneas ‘a’ e ‘b’ do inciso V).

Portanto, inegável a legitimidade o Ministério Público frente à

defesa de interesses difusos, como também inegável a natureza transindividual do

bem ambiental a ser tutelado no presente caso.

DO DIREITO

A matéria ambiental não é um ramo tão antigo do Direito como

outros. A preocupação com a preservação ambiental é um assunto relativamente

recente, até porque, não há muito tempo, os recursos naturais eram tidos como

inesgotáveis.

Contudo, tal visão vem sendo modificada. A partir do momento

em que o desequilíbrio do meio ambiente passou a causar catástrofes em níveis

alarmantes, a visão mundial e o modo de conceber a preservação ambiental

passaram a ser repensadas, inclusive no Brasil, surgindo leis que vieram para

tutela do meio ambiente.

Dessa forma, a atuação do homem face ao meio ambiente

passou a ser disciplinada para se tornar uma exploração sustentável e ordenada, a

fim de que os ambientes não sofram irreversível esgotamento.

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Segundo o artigo 3º, III, ‘e’ e IV da Lei nº 6.938/81 “Para os

fins previstos nesta Lei, entende-se por: III – Poluição, a degradação da qualidade

ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: e) lancem

matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV –

Poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável,

direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.”

Por sua vez, o artigo 14, § 1º do mesmo diploma legal, está

assim disposto: “Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é

o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou

reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua

atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para

propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio

ambiente.”

A Lei 12.305/2010 é a que trata da Política Nacional de Resíduos

Sólidos. Em seu artigo 3º, XVI, a Lei dispõe:

“Para os efeitos desta lei, entende-se por: XVI - resíduos

sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades

humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou

se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases

contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu

lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso

soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia

disponível”

A lei ainda estabelece como princípios a prevenção e a

precaução (art. 6, I) e a proibição do lançamento de resíduos sólidos em corpos

hídricos (artigo 47, I).

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De modo mais abrangente, a observância da Função Social da

Propriedade, que é a contra face de seu uso nocivo, não é uma faculdade, mas

uma obrigação indeclinável, erigida à categoria de direito fundamental pela

Constituição Federal de 1988 (Art. 5º, XXIII) – a propriedade atenderá a sua

função social.

É com base no princípio da função social da propriedade que se

tem sustentado a possibilidade de restringir o uso dos outrora absolutos direitos

reais, de modo a compatibilizá-los com sua finalidade social, entendendo-se tal

termo em sua acepção ampla, protegendo efetivamente a coletividade.

O Código Civil, em seu artigo 1228, § 1º, estatui que:

“O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”

Sobre o uso adequado da propriedade discorre o autor Silvio de

Salvo Venosa: “(...) Utilizar a propriedade adequadamente possui no mundo contemporâneo

amplo espectro que desborda para aspectos como a proteção da fauna e flora e para sublimação

do patrimônio artístico e histórico”1

Não há nada mais cristalino, em se tratando de função social da

propriedade, do que seu uso ambientalmente correto e sustentável, já que a

quebra da harmonia natural, que vem assombrando a humanidade na aurora deste

milênio, é algo que fere a todos, indistintamente:

1 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, Direitos Reais, volume 5, 5ª edição. Editora Atlas, in: São Paulo,

2005. pág. 180

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“Nenhum outro interesse tem difusão maior do que o meio ambiente, que,

como é curial, pertence a todos em geral e a ninguém em particular; sua

proteção a todos aproveita, e sua postergação a todos em conjunto

prejudica. É verdadeira res communis omnium”2

Observa-se que o interesse comum na existência e no uso

adequado do meio ambiente está ligado, com forte vínculo, à função social da

propriedade. O interesse social ou coletivo deve sobrepor-se ao interesse individual

e o seu exercício deve estar em consonância com a preservação do meio

ambiente.

A Constituição Federal de 1988, por sua vez, instituiu o meio

ambiente como bem de uso comum do povo:

Art. 225: “Todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem do uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Esta preocupação com o conjunto de relações fez com que se

estabelecesse obrigação de defender o meio ambiente nas três esferas de atuação:

administrativa, criminal e civil.

2 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. 4ª edição revista, ampliada e atualizada. Editora Revista dos

Tribunais, in: São Paulo, 2005. página 931

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DA OBRIGAÇÃO DE PREVENÇÃO e REPARAÇÃO

O Direito ambiental deve ser tratado de acordo com suas

peculiaridades. Dentre elas está o caráter irreversível que os danos ambientais

podem assumir. Assim, além da responsabilidade em se reparar danos

efetivamente causados, deve ser considerada a exigência de se evitar a ocorrência

de danos.

Esta é a razão para a exigência de licenças ambientais de

empreendimentos potencialmente poluidores, para que se possa evitar, controlar

ou amenizar os danos porventura existentes.

No caso em análise, a empresa está funcionando sem a devida

licença ambiental, seu funcionamento está causando efetivo dano ao meio

ambiente e se não for imediatamente interrompida os danos poderão se agravar.

Segundo Paulo Affonso Leme Machado:

“O direito ambiental engloba as duas funções da responsabilidade civil

objetiva: a função preventiva – procurando, por meios eficazes, evitar o

dano – e a função reparadora – tentando reconstruir e/ou indenizar os

prejuízos ocorridos. Não é social e ecologicamente adequado deixar-se de

valorizar a responsabilidade preventiva, mesmo porque há danos ambientais

irreversíveis.”3

A Lei 6.938/81, em seu artigo 4º, VI estabelece: “A política

nacional do Meio Ambiente visará: VI – a preservação e restauração dos recursos

ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente,

concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida.”

3 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 21ª edição. Editora Malheiros. São

Paulo: 2013. pg. 409.

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A empresa Frigorífico Frigocruz Ltda. atua há mais de um ano

sem licença ambiental e vem causando efetivo dano ao meio ambiente. Tais fatos

ficaram demonstrados no Inquérito Civil Público em trâmite perante a 3ª

Promotoria de Cruzeiro do Oeste.

Mesmo após ser autuada por duas vezes pelo Instituto

Ambiental do Paraná, não solucionou o problema e continuou atuando

irregularmente.

A hipótese trata, além do dever objetivo de reparar os danos

causados (princípio da reparação), do dever de evitar danos futuros, em nítida

aplicação do princípio da prevenção.

Desta forma é imperiosa a imediata interrupção das atividades

da empresa Frigorífico Frigocruz Ltda., até que ela se adeque aos padrões exigidos

pelo órgão ambiental, e obtenha a licença de operação, bem como a efetiva

reparação do dano já causado. A coletividade e o meio ambiente não podem

sucumbir face às irregularidades existentes.

DA TUTELA ANTECIPADA

Urgente se mostra a concessão da tutela inibitória antecipada.

Estão presentes a fumaça do bom direito, evidenciada pelos documentos juntados

com o Inquérito Civil Público (anexo) e o perigo da demora, já que os danos

ocasionados ao meio ambiente podem assumir caráter irreversível. Sobre o tema,

Paulo Affonso Leme Machado:

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Os danos causados ao meio ambiente encontram grande dificuldade de

serem reparados. É a saúde do homem e a sobrevivência das espécies da

fauna e da flora que indicam a necessidade de prevenir e evitar o dano4

Além disso, a degradação da fauna e da flora no local podem

tomar maiores proporções, considerando os efeitos sinergéticos dos danos

ambientais. Com maestria, discorre acerca do tema Fritjof Capra:

De acordo com a visão sistêmica, as propriedades essenciais de um

organismo, ou sistema vivo, são propriedades do todo, que nenhuma das

partes possui. Elas surgem das interações e das relações entre as partes.

Essas propriedades são destruídas quando o sistema é dissecado, física

ou teoricamente, em elementos isolados. Embora possamos discernir

partes individuais em qualquer sistema, essas partes não são isoladas, e

a natureza do todo é sempre diferente da mera soma de suas partes5

Arremata, o autor, de forma reflexiva:

Em vez de ser máquina, a natureza como um todo se revela, em última

análise, mais parecida com a natureza humana – imprevisível, sensível ao

mundo circunvizinho, influenciada por pequenas flutuações.

Conseqüentemente, a maneira apropriada de nos aproximarmos da

natureza para aprender acerca da sua complexidade e da sua beleza não

é por meio da dominação e do controle, mas sim, por meio do respeito,

da cooperação e do diálogo6

Ficou claro que a empresa Frigocruz está causando dano

ambiental e a sua atividade nociva deve ser interrompida imediatamente.

4 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 11ª Edição, Revista,

Atualizada em Ampliada. Malheiros: São Paulo, 2003. pg 331 5 CAPRA, Fritjof. TEIA DA VIDA, Uma nova compreensão científica dos sistemas

vivos. Tradução de Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Editora Cultrix, 1996. pg. 41 6 Idem, pg. 158.

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Por esse motivo deve ser expedida ordem para interrupção

imediata da atividade irregular. Enquanto não houver adequação aos

parâmetros e exigências estabelecidos pelo órgão ambiental a empresa

ré deve paralisar suas atividades.

Deste modo, o Ministério Público requer seja

determinada, liminarmente, a suspensão imediata das atividades da

empresa, fixando-se multa cominatória no valor de 10 mil reais por dia

de descumprimento, DESTINADO AO Fundo Estadual de Proteção ao

Meio Ambiente.

REPARAÇÃO DO DANO MATERIAL E MORAL COLETIVO

É inegável que a empresa ré vem poluindo o meio ambiente há

pelo menos um ano. Os danos ambientais já causados devem ser reparados. Os

danos estão comprovados com a resolução técnica nº 083/2013 do IAP (fl. 19):

“Este IAP/ERUMU efetuou em 01.07.2013, amostragem no

efluente final líquido sendo lançado ao corpo receptor hídrico utilizado pela

empresa FRIGORÍFICO FRIGOCRUZ LTDA, localizada na cidade de Cruzeiro do

Oeste. O ensaio Analítico Realizado no Laboratório de Físico Química/IAP Toledo –

Relatório se Ensaios nº 2485/2013 (cópia anexa), apontou valor acima do

Padrão estabelecido, considerada a regra em vigor. De acordo com a RESOLUÇÃO

CEMA Nº 070/2009 – ANEXO 7, que estabelece condições e padrões de

lançamento de efluentes líquidos industriais, a DQO – Demanda Química de

oxigênio permitida é de 200 mgO2L¹. A DQO na amostragem coletada apresentou

concentração de 272 mgO2L¹ superior portanto, ao padrão estabelecido pela

legislação vigente.”

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Saliente-se, que a responsabilidade civil ambiental é objetiva,

nos termos do já citado artigo 14, § 1º da Lei 6.938/81. Assim, comprovado o

dano e nexo causal decorrente da atividade exercida, desnecessária a

comprovação de culpa. Neste sentido, Paulo Affonso Leme Machado: “A

responsabilidade civil relativa a todas as atividades concernentes aos resíduos

sólidos é de natureza objetiva ou ‘independentemente da existência de culpa”.7

Destaca-se que, além do dano material a ser reparado após

quantificação pelo IAP, evidente no caso a existência de dano moral coletivo,

tendo em vista que a degradação do meio ambiente atinge interesse difuso da

sociedade, que tem um direito fundamental ao meio ambiente saudável atingido.

Sobre o dano moral coletivo, ensina Carlos Alberto Bittar Filho:

"Consiste o dano moral coletivo na injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou

seja, na violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em

dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa

comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente

injustificável do ponto de vista jurídico. Tal como se dá na seara do dano moral individual, aqui

também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-se responsabilizar o agente pelo

simples fato da violação (damnum in re ipsa).

Ocorrido o dano moral coletivo, que tem um caráter extrapatrimonial por

definição, surge automaticamente uma relação jurídica obrigacional que pode ser assim

destrinchada:

a) sujeito ativo: a coletividade lesada (detentora do direito à reparação); b)

sujeito passivo: o causador do dano (pessoa física, ou jurídica, ou então coletividade outra, que

tem o dever de reparação); c) objeto: a reparação - que pode ser tanto pecuniária quanto não-

pecuniária.

7 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 21ª edição. Editora Malheiros. São

Paulo: 2013. pg. 667

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Para a perfeita compreensão da matéria, podem ser citados dois exemplos

bem claros de dano moral coletivo:

a) o dano ambiental, que não consiste apenas e tão-somente na lesão ao

equilíbrio ecológico, afetando igualmente outros valores precípuos da coletividade a ele ligados, ou

seja, a qualidade de vida e a saúde; b) a violação da honra de determinada comunidade (a negra, a

judaica, etc.) através de publicidade abusiva."8

Complementando a assertiva, afirma Francini Imene Dias

Ibrahin: “É de grande importância ressaltar que a ação civil pública inicialmente versava, apenas,

acerca dos danos materiais causados ao meio ambiente, consumidor e aos bens e direitos de valor

artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Após, a Lei 8.844/1994 (denominada Lei

Antitruste), que alterou o art. 1.º da Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), ampliando o seu

objeto, acabando com qualquer dúvida existente, passou a abranger a responsabilidade do infrator

pelos danos morais causados a quaisquer dos valores e direitos transindividuais amparados pela

referida legislação, entre estes o dano moral ambiental”9.

Assim, considerando que a reparação ambiental deve ser plena,

esta deve atender, além da reparação do dano material verificado, (obrigação de

fazer), a inibição da continuidade da atividade degradadora (tutela inibitória e de

remoção do ilícito – não fazer), e a indenização dos danos residuais e coletivos,

como vem sendo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça:

AMBIENTAL. DESMATAMENTO. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA (INDENIZAÇÃO). POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DA NORMA AMBIENTAL. 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta com o fito de obter responsabilização por danos ambientais causados pelo desmatamento de área de mata nativa. A instância ordinária considerou provado o dano ambiental e

8 BITTAR, Carlos Alberto. Coletividade também pode ser vítima de dano moral.

Disponível em: http://www.conjur.com.br/2004-fev-

25/coletividade_tambem_vitima_dano_moral. Acesso em: 31/07/2013. 9 Francini Imene Dias Ibrahin, Danos Morais Ambientais Coletivos – Revista de Direito Ambiental,

vol. 58, p. 134, 2010.

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condenou o degradador a repará-lo; porém, julgou improcedente o pedido indenizatório. 2. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido de que a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente permite a cumulação de obrigações de fazer e indenizar. Precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ. 3. A restauração in natura nem sempre é suficiente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, o dano ambiental causado, daí não exaurir o universo dos deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum. 4. A reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração). 5. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização não é para o dano especificamente já reparado, mas para os seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios, com destaque para a privação temporária da fruição do bem de uso comum do povo, até sua efetiva e completa recomposição, assim como o retorno ao patrimônio público dos benefícios econômicos ilegalmente auferidos. 6. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, com a devolução dos autos ao Tribunal de origem para que verifique se, na hipótese, há dano indenizável e para fixar eventual quantum debeatur. (REsp 1180078/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 28/02/2012)

Assim, o Ministério Público requer a condenação da empresa à

reparação dos danos causados, tanto o material, a ser apurado pelo órgão

ambiental competente - INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ, quanto o moral

coletivo, a ser fixado por este Juízo em favor do Fundo Estadual de Meio

Ambiente.

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DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA

A Ação Civil Pública é o instrumento processual que busca

facilitar a deflagração de demandas para a tutela adequada e efetiva dos

interesses difusos, coletivos, individuais homogêneos e individuais indisponíveis.

Para viabilizar o acesso pleno à justiça, a lei cria mecanismos de

facilitação da demonstração dos direitos, em benefício dos vulneráveis (ainda que

apenas tecnicamente).

É certo que o Código de Defesa do Consumidor faz parte do

sistema processual coletivo, trazendo avanços legislativos e estendendo

instrumentos processuais. Conforme ensinamentos de Fiorillo, Abelha e Nery:

“a relação entre o Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Ação Civil

Pública possui cunho visceral, pois suas regras processuais se aplicam aprioristicamente a toda

ação coletiva, formando um sistema processual coletivo. Desta forma, é perfeitamente possível a

aplicação da inversão do ônus da prova em sede de qualquer ação coletiva, nestas incluídas

aquelas para a tutela do meio ambiente, pois a inversão do ônus da prova é regra de natureza

processual e todas as regras processuais do Código de Defesa do Consumidor e da Lei de Ação Civil

Pública devem ser aplicadas na tutela de outros direitos difusos e coletivos conforme arts. 1.º, IV, e

21 da Lei 7.347/1985". Concluem os autores que "a extensão dessa aplicação é imperativo

inelutável, que não pode ser olvidado"10

Assim, a inversão do ônus da prova, prevista no Código de

Defesa do Consumidor, por se norma processual, deve alcançar a proteção dos

demais direitos difusos e coletivos, por meio do diálogo de fontes. O Superior

Tribunal de Justiça vem reconhecendo a existência do microssistema coletivo,

como se observa pelo seguinte julgado:

10

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha; NERY, Rosa Maria de Andrade.

Direito processual ambiental brasileiro: ação civil pública, mandado de segurança, ação popular, mandado

de injunção. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 142.

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ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LITISCONSORTES. PRAZO EM DOBRO PARA APRESENTAÇÃO DE DEFESA PRÉVIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LIA. UTILIZAÇÃO DOS INSTITUTOS E MECANISMOS DAS NORMAS QUE COMPÕEM O MICROSSISTEMA DE TUTELA COLETIVA. ART. 191 DO CPC. APLICABILIDADE. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. 1. Os arts. 21 da Lei da Ação Civil Pública e 90 do CDC, como normas de envio, possibilitaram o surgimento do denominado Microssistema ou Minissistema de proteção dos interesses ou direitos coletivos amplo senso, no qual se comunicam outras normas, como o Estatuto do Idoso e o da Criança e do Adolescente, a Lei da Ação Popular, a Lei de Improbidade Administrativa e outras que visam tutelar direitos dessa natureza, de forma que os instrumentos e institutos podem ser utilizados para "propiciar sua adequada e efetiva tutela" (art. 83 do CDC). 2. A Lei de Improbidade Administrativa estabelece prazo de 15 dias para a apresentação de defesa prévia, sem, contudo, prever a hipótese de existência de litisconsortes. Assim, tendo em vista a ausência de norma específica e existindo litisconsortes com patronos diferentes, deve ser aplicada a regra do art. 191 do CPC, contando-se o prazo para apresentação de defesa prévia em dobro, sob pena de violação aos princípios do devido processo legal e da ampla defesa. 3. Recurso especial não conhecido. (REsp 1221254/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 13/06/2012)

Além disto, o próprio princípio da precaução, verdadeiro pilar do

direito ambiental, fundamenta, também, a inversão do ônus da prova, já que em

caso de haver dúvida sobre a potencialidade lesiva de determinada conduta ao

meio ambiente, esta deve ser impedida. Neste sentido transcreve-se recente

decisão do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL E DIREITO AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO DE USINA HIDRELÉTRICA. REDUÇÃO DA PRODUÇÃO PESQUEIRA. SÚMULA Nº 7/STJ. NÃO CABIMENTO. DISSÍDIO NOTÓRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO INCONTESTE. NEXO CAUSAL. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CABIMENTO. PRECEDENTES. 1. Não há falar, na espécie, no óbice contido na Súmula nº 7/STJ, haja vista que os fatos já restaram delimitados nas instâncias ordinárias, devendo ser

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revista nesta instância somente a interpretação dada ao direito para a resolução da controvérsia. Precedentes. 2. Tratando-se de dissídio notório, admite-se, excepcionalmente, a mitigação dos requisitos exigidos para a interposição do recurso pela alínea "c" "quando os elementos contidos no recurso são suficientes para se concluir que os julgados confrontados conferiram tratamento jurídico distinto à similar situação fática" (AgRg nos EAg 1.328.641/RJ, Rel. Min. Castro Meira, DJe 14/10/11). 3. A Lei nº 6.938/81 adotou a sistemática da responsabilidade objetiva, que foi integralmente recepcionada pela ordem jurídica atual, de sorte que é irrelevante, na espécie, a discussão da conduta do agente (culpa ou dolo) para atribuição do dever de reparação do dano causado, que, no caso, é inconteste. 4. O princípio da precaução, aplicável à hipótese, pressupõe a inversão do ônus probatório, transferindo para a concessionária o encargo de provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente e, por consequência, aos pescadores da região. 5. Agravo regimental provido para, conhecendo do agravo, dar provimento ao recurso especial a fim de determinar o retorno dos autos à origem para que, promovendo-se a inversão do ônus da prova, proceda-se a novo julgamento. (AgRg no AREsp 206.748/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2013, DJe 27/02/2013)

No mesmo sentido defende Édis Milaré: “a ausência de certeza científica

absoluta não deve servir de pretexto para procrastinar a adoção de medidas efetivas visando a

evitar a degradação do meio ambiente. Vale dizer, a incerteza científica milita em favor do

ambiente, carregando-se ao interessado o ônus de provar que as intervenções pretendidas não

trarão conseqüências indesejadas ao meio considerado. 'O motivo para a adoção de um

posicionamento dessa natureza é simples: em muitas situações, torna-se verdadeiramente

imperativa a cessação de atividades potencialmente degradadoras do meio ambiente, mesmo

diante de controvérsias científicas em relação aos seus efeitos nocivos."11

11

MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2. ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2001. p. 119.

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DOS PEDIDOS

Diante do todo o exposto, requer-se de Vossa Excelência:

I – A concessão de medida liminar impondo ao demandado

obrigação de não fazer (artigo 461, CPC), consistente na interrupção do

funcionamento de sua atividade enquanto não obtiver a devida licença

ambiental (licença de operação) e enquanto não se adequar aos padrões

de emissão de efluentes líquidos fixados pelo órgão ambiental

competente;

II - A citação do Réu, com o permissivo do artigo 172,

parágrafo 2º do CPC, para responder e acompanhar os termos da presente, sob

pena de serem considerados como verdadeiros os fatos narrados na inicial;

III – A inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 21

da Lei nº 7347/85 c/c artigo 6º, VIII, da Lei nº 8078/90;

IV - A condenação do réu, no sentido de reparar todos os

danos ambientais ocorridos, materiais a serem apurados pelo órgão

ambiental (IAP) e morais coletivos;

V - Caso não haja o cumprimento da liminar e da sentença por

parte do Requerido, requer-se a cominação de multa diária no valor de 10

mil reais por dia de descumprimento, como dispõe o artigo 11 da Lei nº

7.347/85, em favor do Fundo Estadual do Meio Ambiente;

VI – Sejam julgados procedentes os pedidos da presente ação,

em todos os seus termos, condenando-se o Réu ao ônus da sucumbência e demais

cominações legais, inclusive honorários, este último a ser recolhido ao Fundo

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Especial do Ministério Público do Estado do Paraná, criado pela Lei Estadual nº

12.241, de 28 de julho de 1998 (DOE nº 5302 de 29 de julho de 1.998);

VII – Seja oficiado à Delegacia de Polícia local, requisitando a

instauração de inquérito policial para apuração da prática do crime previsto no

artigo 54, § 2º, V da Lei 9.605/98;

VIII– As intimações do Ministério Público dos atos e termos

processuais, na forma especial prevista no artigo 226, § 2º, do Código de Processo

Civil;

IX – Protesta-se ainda pela produção de todos os meios de

prova que se fizerem necessárias, como prova pericial, documental e testemunhal;

Requer-se, por fim, desde logo, a dispensa do pagamento de

custas, emolumentos e outros encargos, nos termos do artigo 18 da Lei nº

7.34785.

Dá-se a causa o valor de 100.000,00 (cem mil reais).

Termos em que, Pede Deferimento

Cruzeiro do Oeste, 06 de agosto de 2013.

Marcelo Bruno Marques Promotor de Justiça