mito 7 - marcos bagno
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Mito 7 de Preconceito Linguístico - Marcos BagnoTRANSCRIPT
Fernanda Lima | France TatianaIvana Marins | Lidiana AlmeidaMariana Viana | Nilcea de Jesus
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA – UFBAUNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA – UFBAInstituto de Humanidades, Artes e Ciências Milton Santos – IHAC
BACHARELADO INTERDISCIPLINAR EM SAÚDE | DiurnoDISCIPLINA: Língua Portuguesa, Poder e Diversidade Cultural - LETE43
Profa Lanuza Lima
Salvador, BaMaio 2010
PRECONCEITOPRECONCEITOLINGUÍSTICOLINGUÍSTICO
Marcos BagnoMarcos Bagnowww.marcosbagno.com.br
Mito n° 7
“É preciso saber
gramática para falar e
escrever bem”
QUEM NÃO CONCORDA COM ESSA QUEM NÃO CONCORDA COM ESSA DECLARAÇÃO?DECLARAÇÃO?
Para Cipro e Infante:“A Gramática é instrumento fundamental para o domínio do padrão culto da língua”
MITO OU VERDADE?!?!?!
É muito comum pais de alunos:
Cobrarem de professores ensino dos “pontos” de gramática tal como aprenderam na escola.
Protestarem contra professores e escolas que tentam adotar uma prática de ensino da língua menos
conservadora
Tirarem seus filhos da escola que não adota livro didático que contenha coisas “indispensáveis” como “antônimos”,
“coletivos” e “análise sintática”...
Por que aquela declaração é um mito?
Como diz Mário Perini, “não existe um grão de evidência em favor disso; toda a evidência disponível é em contrário”. Afinal, se fosse assim, todos os gramáticos seriam grandes escritores e os bons
escritores seriam especialistas em gramática.
Os escritores são os primeiros a dizer que gramática não é com eles. Rubem Braga escreveu “Nascer no Cairo, ser fêmea de cupim”.
Carlos Drummond de Andrade: Testemunho de perturbação diante do “mistério” das “figuras de gramática, esquipáticas
(extravagantes)”, “o amazonas de minha ignorância”
Machado de Assis:Machado de Assis:Ao abrir a gramática de um sobrinho, se espantou com sua própria
“ignorância” por “não ter entendido nada”
Celso Pedro Luft:Celso Pedro Luft:“Um ensino gramaticalista abafa justamente os talentos naturais,
incute insegurança na linguagem, gera aversão ao estudo do idioma, medo à expressão livre e autêntica de si mesmo”.
Mário Perini:Mário Perini:Quando justificamos o ensino de gramática dizendo que é para que
os alunos venham a escrever (ou ler, ou falar) melhor, estamos prometendo uma mercadoria que não podemos entregar. Os
alunos percebem isso com bastante clareza, embora talvez não o possam explicitar; e esse é um dos fatores do descrédito da
disciplina entre eles.
Sirio Possenti:Sirio Possenti:A Grécia, antes mesmo de elaborar as primeiras gramáticas do Ocidente, já possuía uma literatura
ampla e diversificada (século II a. C.)
HomeroHomero - A Ilíada e a Odisséia: século VI a. C.
PlatãoPlatão escreveu seus diálogos entre os séculos V e IV a. C, mesma época do dramaturgo ÉsquiloÉsquilo: não
consultaram nenhuma gramática e escreviam e falavam muito bem a sua língua.
Ao longo do tempo: inversão da realidade histórica. Gramáticas feitas para descrever e fixar
manifestações lingüísticas de escritores como “regras” e “padrões”. A gramática normativa:
decorrente, subordinada e dependente da língua.
A gramática: instrumento de poder e de controle. Concepção de que os falantes e escritores da língua é que precisam da gramática (fonte mística invisível que produz a língua “bonita”, “correta” e “pura”).
A língua: subordinada e dependente da gramática. O que não está na gramática normativa “não é
português”.
Não se pode confiar em gramáticas como a de Cegalla: “Este livro pretende ser uma Gramática Normativa da Língua Portuguesa do Brasil, conforme a falam e escrevem as pessoas cultas na época atual”.
Cipro e Infante:A Gramática normativa
estabelece a norma culta, ou seja, o padrão
lingüístico que socialmente é
considerado modelar [...] As línguas que têm forma escrita, como é o caso do português, necessitam da Gramática normativa para
que se garanta a existência de um padrão lingüístico uniforme [...].
Gramática normativa não “estabelece” a norma culta, pois esta existe
como tal. Tarefa de uma gramática: definir,
identificar e localizar os falantes cultos, coletar a língua usada por eles e
descrever essa língua de forma clara, objetiva e com
critérios teóricos e metodológicos coerentes.
Necessitamos hoje no Brasil da descrição detalhada e realista da norma culta objetiva, fruto de coletas confiáveis para que ela sirva de base ao ensino/aprendizagem na escola, e não uma norma inspirada num ideal lingüístico baseado no uso literário, artístico, particular e exclusivo dos grandes escritores.
Um professor de português quer formar bons usuários da língua escrita e falada, e não prováveis candidatos ao Prêmio Nobel de literatura!
A gramática normativa não vai “garantir a existência de um padrão lingüístico uniforme”, que pode chegar a uma certa uniformidade, mas nunca total, pois é usado por pessoas que nunca serão física, psicológica e socialmente idênticas). Ele existe na sociedade, independentemente de haver ou não livros que o descrevam.
Esse mito está ligado à milenar confusão que se faz
entre língua e gramática normativa. Confunde-se o
todo com a parte.
Luiz Carlos Cagliari:A gramática normativa foi
num primeiro momento uma gramática descritiva de um
dialeto de uma língua. Depois a sociedade fez dela um corpo de leis para reger o uso da linguagem. Por sua
própria natureza, uma gramática normativa está condenada ao fracasso, já
que a linguagem é um fenômeno dinâmico e as
línguas mudam com o tempo; e, para continuar
sendo a expressão do poder social demonstrado por um
dialeto, a gramática normativa deveria mudar.
Se não é o ensino/estudo da gramática que vai garantir a formação de bons usuários da língua, o que vai garanti-la?
Lingüistas e pedagogos são praticamente unânimes em combater esse mito.
Recomendações de Bagno:
Sofrendo a gramática, de Mário PeriniPor que (não) ensinar gramática na escola, de Sírio Possenti,Língua e liberdade, de Celso Pedro LuftLinguagem, língua e fala, de Ernani TerraContradições no ensino de português, de Rosa Virgínia Mattos e SilvaGramática na escola, de Maria Helena de Moura Neves