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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
ANDRÉ LUIZ RAUSCH DE SOUZA
DOM PEDRO II E OS PENSADORES FRANCESES: A INFLUÊNCIA DE LOUIS
PASTEUR E VICTOR HUGO NAS IDEIAS DO IMPERADOR
Florianópolis
2018
ANDRÉ LUIZ RAUSCH DE SOUZA
DOM PEDRO II E OS PENSADORES FRANCESES: A INFLUÊNCIA DE LOUIS
PASTEUR E VICTOR HUGO NAS IDEIAS DO IMPERADOR
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel.
Orientador: Prof. Luciano Daudt da Rocha, Me.
Florianópolis
2018
ANDRÉ LUIZ RAUSCH DE SOUZA
DOM PEDRO II E OS PENSADORES FRANCESES: A INFLUÊNCIA DE LOUIS
PASTEUR E VICTOR HUGO NAS IDEIAS DO IMPERADOR
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel e aprovado em sua forma final pelo Curso de Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina.
Florianópolis, 27 de novembro de 2018.
______________________________________________________Professor e orientador Luciano Daudt da Rocha, Me.
Universidade do Sul de Santa Catarina
______________________________________________________Professora Emily Fidelix da Silva, Me.Universidade Federal de Santa Catarina
______________________________________________________Professor Gustavo Tiengo Pontes, Me.Universidade Federal de Santa Catarina
A minha família, que me apoia
incondicionalmente.
AGRADECIMENTOS
A meus amigos, Jessé, Fernanda, Marcus, Camilla, Bruna, Júlia, Amanda,
Lidimara e Agatha, por compartilharem comigo esta jornada de 4 anos.
Ao Me. Luciano Daudt Rocha, meu orientador, por sua paciência e grande
bagagem de conhecimento que me imbuiu a escrever estre trabalho.
A professora Carolina Rubin, por me dar uma base teórica para poder criar de
forma metódica e cientifica.
Aos professores e o Curso de Relações Internacionais da Unisul, por me guiar e
dar um espaço para perseguir o conhecimento.
“O futuro tem muitos nomes. Para os fracos, é o inatingível. Para os temerosos, o
desconhecido. Para os corajosos, a oportunidade.” (VICTOR HUGO, 1862).
RESUMO
Esta pesquisa trata de Dom Pedro II e parte da sua formação intelectual, bem como suas
contribuições para a ciência brasileira que são ainda hoje pouco entendidas. A construção
deste trabalho se apoia, principalmente, no intercâmbio de cartas e ideias entre o Imperador
brasileiro e os pensadores Louis Pasteur e Victor Hugo. O debate sobre tal intercâmbio e
como isto pode ter influenciado o Imperador e a política brasileira será foco deste estudo, que
procura debater como as ideias dos pensadores influenciaram o político brasileiro sobre os
temas ligados à saúde pública, escravidão e pena de morte.
Palavras-chave: Dom Pedro II. Louis Pasteur. Victor Hugo. Diplomacia Pessoal. Política
Externa Brasileira.
ABSTRACT
This research deals with Dom Pedro II and part of his intellectual formation, as well as his
contributions to Brazilian science that are still little understood. The construction of this work
is based mainly on the exchange of letters and ideas between the Brazilian Emperor and the
thinkers Louis Pasteur and Victor Hugo. The debate about this exchange and how it may have
influenced the Emperor and Brazilian politics will be the focus of this study, which seeks to
discuss how the ideas of the thinkers influenced the Brazilian politician on issues related to
public health, slavery and the death penalty.
Keywords: Dom Pedro II. Louis Pasteur. Victor Hugo. Personal Diplomacy. Brazillian
Foreign Policy.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Mapa dos Assuntos da Política Externa das Falas do Trono 1870-1877.17
Figura 2 – Mapa dos Assuntos da Política Externa das Falas do Trono 1870-1877.18
Figura 3 – Diário do Rio de Janeiro – 20 de março de 1876.....................................21
Figura 4 – Jornal Libertador – 1884......................................................................... 47
sumário1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................12
2 POLÍTICA BRASILEIRA NO SÉCULO 19..................................................................20
2.1 PANORAMA POLÍTICO BRASILEIRO NO SÉCULO 19...........................................22
2.2 DOM PEDRO II: ENTRE A VIDA POLÍTICA E A INTELECTUALIDADE..............27
3 DOM PEDRO II E OS PENSADORES FRANCESES.................................................38
3.1 DOM PEDRO II E LOUIS PASTEUR............................................................................39
3.2 DOM PEDRO II E VICTOR HUGO...............................................................................42
4 REFLEXO DO INTERCAMBIO DE IDEIAS NA POLÍTICA BRASILEIRA.........45
4.1 MEDICINA......................................................................................................................45
4.2 PENA DE MORTE E ESCRAVIDÃO............................................................................47
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................51
REFERÊNCIAS......................................................................................................................54
ANEXOS..................................................................................................................................57
ANEXO A – CARTAS ENTRE PASTEUR E D. PEDRO II..............................................58
ANEXO B – DIÁRIO DE VICTOR HUGO – 22 DE MAIO DE 1877..............................78
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho terá como tema central o último Imperador brasileiro, Dom
Pedro II, considerado por muitos um dos maiores Estadistas do Brasil, e sua influência na
estabilidade da nação.
Nota-se ao estudar a história do Segundo Reinado brasileiro um vácuo acadêmico
nos estudos de Relações Internacionais dos anos finais do Império Brasileiro1, em sua maioria
focados mais na erosão do sistema monárquico do que nos assuntos tratados por este em seus
últimos anos antes da Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889. Será objetivo
deste trabalho tratar desta carência, estudando a diplomacia pessoal2 de Dom Pedro II e suas
consequências.
Com a abundância de material biográfico deixado pelo Imperador, como cartas
pessoais, diários de viagens, jornais e periódicos relatando suas expedições, é necessário
delinear o foco central desta revisão histórica, que será o relacionamento do Imperador com
pensadores franceses, como o escritor, pensador e político francês Victor Hugo, e o médico,
químico e cientista Louis Pasteur e quais influências estes tiveram na política da Monarquia
nos anos 1870 e 1880.
Vem se tornando aparente o fato de que o Brasil vive uma era de grande
instabilidade política e econômica. Pouco mais de um ano se passou desde o fim do processo
que afastou Dilma Rousseff da Presidência da República, diariamente se relatam notícias das
intermináveis fases das investigações “Lava Jato” e os vários escândalos que as sucedem,
junto a isto o país vivencia inúmeras crises em empresas nacionais de peso com a Petrobras e
a Eletrobrás, consequentemente desestabilizando a economia da nação e trazendo mais
incertezas para o futuro de nosso país. Somado a isto temos o atual clima agressivo das atuais
lideranças políticas nacionais. Esta instabilidade pode ser refletida nos próprios políticos que
representam o país, para Roberto Romano:
A falência da fé pública e do Estado, no mundo e no Brasil, gera a falta de políticos dignos do respeito cívico. Raras pessoas podem ser vistas como lideranças fidedignas, capazes de orientar as massas que pagam impostos e quase nada recebem em troca.3
1 D. CORONATO, 2013, p. 8.2 Diplomacia pessoal, diplomacia de chefe de estado ou diplomacia presidencial, segundo Alexandra Preto (2006, p. 31) é definida pela condução pessoal de assuntos de política externa.3 R. ROMANO, 2014.
Refletindo da opinião da falta de lideranças de confiança no país e como tal déficit
político pode levar a instabilidade, busca-se uma definição para o que é um grande líder, neste
tema se encontra escrita de Mauro Chaves, que comenta:
Que tinham eles em comum? Uns com nenhum carisma (Adenauer), outros com excesso (De Gaulle), uns de espírito mais democrático que outros, uns mais personalistas, outros menos, de qualquer forma todos eles colocavam a nação acima de quaisquer interesses políticos, grupais ou pessoais. Todos tinham seus partidos e seguiam ou não suas diretrizes partidárias. Mas os verdadeiros estadistas jamais foram sectários, prosélitos extremados de doutrinas ou ideologias, e muito menos lançaram mão de todo o seu poder de chefes de Estado e governo para interferir em favor de sucessores. Acima de tudo, estadistas sempre uniram suas nações, não as dividiram.4
Para o jornalista, o Brasil carece de Estadistas, grandes líderes que colocam a
nação acima de tudo, para unir as forças divergentes do país. Aristóteles em “Politikos”
define que “quando, de acordo com as regras da ciência política, os cidadãos governam e são
governados por sua vez, então ele é chamado de estadista.”5 Desde sua conceituação na
Grécia antiga a definição de Estadista passou por várias permutações em sua interpretação, o
dicionário Houaiss define este atualmente como:
Pessoa versada nos princípios ou na arte de governar. Pessoa ativamente envolvida em conduzir os negócios de um governo ou moldar a sua política; homem de Estado. Pessoa que exerce liderança política com sabedoria e sem limitações partidárias.6
Joaquim Nabuco, um dos grandes diplomatas do Brasil e um dos fundadores da
Academia Brasileira de Letras ao falar de seu pai, Nabuco de Araújo, Barão de Itapuã, relata
“instaurar perante si mesmo o processo do audi alteram partem, o único pelo qual se fôrma o
espirito judicial do verdadeiro estadista.”7 Termo de definição este do ato de “ouvir ambas as
partes”, com imparcialidade, conceito da justiça originário do século 5 A.C. em que na obra
Eumênides, de Aeschylus8, se relata a formação do primeiro tribunal de justiça grego.
As qualidades de estadista em que, como supracitado por Mauro Chaves, “[...]
acima de tudo, estadistas sempre uniram suas nações, não as dividiram”9, parece perdido nas
lideranças modernas brasileiras e é fator que se busca resgatar na história de Dom Pedro II.
4 M. CHAVES, 2010.5 ARISTÓTELES, séc. 5 A.C., p. 3.6 HOUAISS, 2010.7 J. NABUCO, 1898, p. 13.8 AESCHYLUS, séc. 5 A.C., p. 30.9 M. CHAVES, 2010.
Lilia Moritz Schwarcz, em sua biografia de Dom Pedro II “As Barbas do Imperador” o
descreve como tendo as qualidades de um Estadista em vários momentos, relatando:
Com efeito, várias pequenas cenas e um grande poder de dissimulação vão alinhavando a biografia desse monarca, que vivia mais para a representação pública do que para si próprio.10
De acordo com Fred Halliday: “As Relações Interacionais, como todas as áreas do
conhecimento, enfrentam dois perigos: o de considerações factuais desprovidas de reflexões
teóricas, explicativas ou éticas e o de teorização sem o apoio da análise histórica.”11 Será
função deste trabalho, por tanto, apresentar uma análise histórica do Segundo Reinado, mas
com ênfase em sua contextualização explicativa.
Para definição da Política Externa, toma-se de exemplo denominação de Letícia
Pinheiro e Carlos R. S. Milani:
A política externa pode ser entendida e analisada como política pública, semelhante às políticas públicas domésticas. Do ponto de vista conceitual, há autores que definem a política externa como uma junção de comportamentos que traduzem as preocupações de um Estado no plano internacional (Breuning, 2007). Outros a consideram uma linha de ação que seus operadores seguem a fim de apresentar ou modificar uma situação no sistema internacional de modo que este se torne compatível com os objetivos definidos por eles mesmos ou por seus predecessores (Rosenau, 1967 e 1968). Outros ainda a definem como o conjunto de orientações, engajamentos e ações que caracterizam o âmbito nacional de um Estado (Holsti, 2001). Nessas concepções, o que se pode perceber é a concordância em torno da proeminência do Estado como ator preponderante, se não exclusivo, do processo de formulação e implementação da política externa.12
Portanto este trabalho manterá em consideração a proeminência do Estado na
atuação das Políticas Externas, mas terá como foco seus operadores, como atores centrais
deste estudo, o Imperador brasileiro Dom Pedro II, o poeta francês Victor Hugo e o médico
francês Louis Pasteur, tendo como ênfase central a atuação diplomática pessoal do Imperador.
No livro “Modernização, Ditadura e Democracia”, o autor Francisco Carlos
Teixeira da Silva, ao falar do “Brasil no Mundo”, deixa aparente a grande importância do
Chefe de Estado nas relações internacionais do Brasil moderno e os danos que sua deficiência
nesta área pode causar, ao analisar as recentes conferências internacionais sobre o meio-
ambiente, Silva comenta:
10 L. SCHWARCZ, 2016, p. 379.11 F. HALLIDAY, 2007, p. 1312 L. PINHEIRO e C. MILANI, 2011, p. 37.
Na Conferência do Clima, em Copenhague (2009), quando foi armado o impasse pelos Estados Unidos e a China Popular – que não queriam nem metas nem compromissos sobre sustentabilidade, o então presidente Lula (na presença de Dilma) deslocou-se até a Dinamarca e, ao lado de Nicolas Sarkozy, da França, fez um imenso esforço para desbloquear a Conferência e avançar em metas e propostas. A parceria Lula/Sarkozy, eficaz na Dinamarca, não se repetira no Rio de Janeiro sob a forma Dilma/Hollande.13
Destacando, assim, os possíveis danos que a inação ou inépcia de um presidente
nas relações exteriores podem trazer ao país. As qualidades de Dom Pedro II nesta área são
descritas por Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno, no livro “História da Política Externa do
Brasil”:
Nas duas últimas décadas do Império, quando as relações internacionais se ampliavam sob efeito da expansão colonial europeia e dos primórdios do novo imperialismo, Dom Pedro II investiu seu prestígio pessoal, muito elevado tanto na Europa quanto na América, com a finalidade de resguardar o interesse brasileiro no exterior. Usou, para tanto, de seus intensos e permanentes contatos com instituições científicas, cientistas, escritores e membros das famílias reais europeias.14
Sua atuação diplomática em favor do Brasil tinha várias formas, seja nos
discursos proferidos na abertura anual do parlamento, sendo estes proferidos anualmente para
a “Abertura da Assembleia Geral do Império do Brasil” onde o Imperador delineava assuntos
de interesse a nação, conhecidos como “Fala do Trono”15 e encontrados registrados nos
arquivos históricos do Senado brasileiro, ou de suas reuniões com líderes internacionais em
visita oficial ou em suas viagens escolares, especialmente nas últimas décadas da
Monarquia16.
Em uma destas viagens, em 22 de maio de 1877, ocorre uma das visitas mais
famosas do Imperador do Brasil, descrita por Lilia Schwarcz como “o encontro com um
grande intelectual que será largamente reproduzido nos relatos dessa viagem”17, melhor
explicado no livro “Dom Pedro II, Imperador do Brasil”, de coautoria de Benjamin Mossé,
estudioso francês e o Barão do Rio Branco, diplomata brasileiro, em ocasião que o Imperador
vai de encontro ao poeta francês Victor Hugo, relatado em destaque no livro:
13 F. SILVA, 2014, p. 178.14 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 146.15 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 59.16 L. SCHWARCZ, 2016, p. 357.17 L. SCHWARCZ, 2016, p. 378.
Mas, o que deve, acima de tudo, ter alegrado a alta inteligência que preside aos destinos do Brasil, são as palavras que Victor Hugo dirigiu um dia ao seu augusto visitante. Foi na segunda viagem de D. Pedro II. Estava em Paris, e foi fazer, ao rei dos poetas, uma visita de que falaram todos os jornais parisienses. O grande crítico dos reis e dos povos, autor de Les Misérables e de L’Année Terrible, o implacável flagelador de todas as injustiças e tiranias, cantor divino do patriotismo, da filantropia, do progresso e da liberdade, depois de uma longa entrevista com o ilustre príncipe, exclamou:– Majestade, sois o neto de Marco Aurélio!D. Pedro, homem de espírito e coração, prestou, por sua vez, justa homenagem ao gênio do grande poeta.A pequena Jeanne, chamada pelo avô, abraçou o imperador.– Sabes, perguntou-lhe o poeta, que acaba de abraçar uma majestade?– Aqui só há uma majestade; ei-la, – disse D. Pedro, apontando o poeta.Acompanho-o até a porta, disse Victor Hugo ao imperador que se despedia:– Acompanho Vossa Majestade até os limites do meu Império!– O império de Victor Hugo é o Universo! Replicou espirituosamente D. Pedro II, um dos mais fervorosos admiradores das obras do genial poeta.18
O Imperador, segundo relatos, é descrito por Victor Hugo como “neto de Marco
Aurélio” – uma alusão ao Imperador romano entre os anos 161 e 180, filósofo e autor da obra
Pensamentos, clamado por sua sabedoria – em troca intitulou-o como Majestade pois,
segundo Pedro de Alcântara, o universo era seu império. Deste mútuo respeito ambos poeta e
Monarca começam a trocar correspondências, além do Imperador brasileiro traduzir
oficialmente poesias do autor, a cultura francesa terá grande influência na elite brasileira ao
longo do Segundo Reinado, como é mencionado inúmeras vezes por biógrafos do
Imperador19. Influência esta referenciada também no livro de Georges Raeders “Pedro II: e os
sábios franceses”, refletindo-se na literatura brasileira diz que: “Não foi somente sobre Castro
Alves que Victor Hugo exerceu sua influência, mas sobre toda a literatura romântica do
Brasil.”20
Louis Pasteur é outro grande correspondente de Dom Pedro II. Como refletido nas
“Falas do Trono”, o Imperador sempre se preocupou com os surtos crescentes de febre
amarela e outras doenças infecciosas no Império. Após conhecer o médico e cientista francês
Louis Pasteur em 1873, o Imperador convidou-o, várias vezes, em suas correspondências,
para visitar o Brasil e pesquisar sobre a aflição, porém, devido a sua avançada idade, o médico
teve que recusar. Mesmo sem vir ao Brasil, as correspondências entre o médico e o Imperador
trouxeram grandes resultados, como pode ser visto na fundação da Escola de Medicina do Rio
18 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 245-24619 L. SCHWARCZ, 2016, p. 4-75-155-268-276-304-305-306-319-320-357-374-481-492-506-519-550-560-573-595-597-651-659-670-706-709-710-736.20 G. RAEDERS, 1944, p. 32.
para os estudos de micróbio, em 1884, pelo doutor Pereira de Santos, um dos alunos de
Pasteur em seu laboratório em Paris.21
Com isso, chega-se a pergunta de pesquisa deste trabalho: Qual a influência dos
sábios franceses Victor Hugo e Louis Pasteur na atuação de Dom Pedro?
Para responder o objetivo da pesquisa, será traçado como objetivo geral analisar
se a relação entre Dom Pedro II e pensadores franceses impactaram na condução da política
do Segundo Reinado. Para tanto a pesquisa se desdobra em três objetivos específicos, sendo o
primeiro: Debater sobre o panorama político brasileiro do século 19 e a personalidade do
Imperador Dom Pedro II; O segundo: Apresentar e debater documentos que demonstrem o
intercâmbio de ideias entre Dom Pedro II e os pensadores franceses Victor Hugo e Louis
Pasteur; O terceiro: Compreender como este debate influenciou o Imperador Dom Pedro II na
condução da política brasileira, através dos documentos “Falas do Trono” e documentação do
Senado Federal.
Utilizando-se de trabalhos já referidos no assunto, como o livro “Pedro II e os
sábios franceses”, de Georges Raeders, em que se encontra documentação do diário de Victor
Hugo e cartas pessoais entre Dom Pedro II e Louis Pasteur, além de estudos já referidos
anteriormente, pretende-se responder tais objetivos. Será analisado, da mesma maneira, a
biografia de Dom Pedro II e suas posições políticas, utilizando-se de trabalhos já concretos de
autores como o Barão do Rio Branco e a historiadora Lilia Moritz Schwarcz para se chegar a
estes pontos. Parte central deste trabalho será analisar o período Dom Pedro II (1840-1889) e
sua atuação política através da diplomacia pessoal, começando ainda como jovem, além de
sua biografia e o foco dado em sua educação acadêmica. Sua atuação na abertura da
Assembleia Geral no período Regência, por meio de discursos proferidos e intitulados como
“Falas do Trono”, utilizando-se para isto referências ao livro “Fallas do Throno desde o anno
1823 até o anno de 1889 acompanhadas dos respectivos Votos de Graça da Câmara
Temporária”22, obtido na biblioteca online do Senado brasileiro, para assim poder se analisar e
mapear como os grandes acontecimentos internacionais e nacionais se refletem nos discursos
regenciais e do futuro Imperador, além de base de dados online do Senado Federal, em que se
encontrando os “Anais do Império”, onde discursos proferidos por senadores brasileiros desde
1823 estão registrados23.
21 G. RAEDERS, 1944, p. 62-65, 68-69.22 BRASIL, 1889.23 SENADO, (2018).
Com 14 anos, em 23 de julho de 1840, Dom Pedro II vem a se tornar Imperador
de fato. Será continua sua atuação da abertura da Assembleia Geral, por meio de “Falas do
Trono”, ao mapear estes ao longo de seu reinado, se dá possível entender os assuntos de
interesse da nação, seja estes as relações com potências europeias, Estados Unidos e américa-
latina, sua atuação na guerra do Paraguai e suas atuações nas viagens que fez como imperador
e quais reflexões tais atuações tiveram no Brasil. Através de mapeamento feito por Daniel Rei
Coronato (2013), nota-se:
Figura 1 – Mapa dos Assuntos da Política Externa das Falas do Trono 1870-
1877
Fonte: Daniel Rei Coronato (2013, p. 22).
Figura 2 – Mapa dos Assuntos da Política Externa das Falas do Trono 1870-
1877
Fonte: Daniel Rei Coronato (2013, p. 23).
Com isto é possível delinear alguns temas a serem tratados no período do
Segundo Império de maior importância para Dom Pedro II.
Além deste mapeamento será utilizado material bibliográfico em geral, como
livros históricos e de caráter bibliográfico, e documental como periódicos do século 19, além
de diários de viagem e cartas do Imperador.
Para esta análise histórica, recorremos a autoras e autores da História do Brasil e
da História das Relações Internacionais do Brasil, como Caio Prado Júnior, “Evolução
Política do Brasil”, Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno, “História da Política Exterior do
Brasil” e José Flávio Sombra Saraiva e Amado Luiz Cervo, “História das Relações
Internacionais Contemporâneas” e “As Barbas do Imperador” de Lília Moritz Schawrcz.
2 POLÍTICA BRASILEIRA NO SÉCULO 19
Para entender os atos decisórios políticos da época não se pode somente delinear
seus fatos, é necessário contextualizá-los no cenário internacional que levou tais decisões a
serem tomadas. O historiador Caio Prado Junior, no livro “Evolução Política do Brasil”,
apontava para a necessidade de contextualização histórica, ao escrever:
Os historiadores, preocupados unicamente com a superfície dos acontecimentos [...] esqueceram quase que por completo o que se passa no íntimo da nossa história de que estes acontecimentos não são se não um reflexo exterior.24
Para isto é interessante que analisemos o panorama político brasileiro do século
19, as nações que o influenciavam e qual influência exerciam no país, para assim melhor
poder situar as motivações históricas da Política Externa do Brasil da época.
Para Marina Marconi e Eva Lakatos o referencial teórico tem como finalidade
“não apenas um relatório ou descrição de fatos levantados empiricamente, mas o
desenvolvimento de um caráter interpretativo, no que se refere aos dados obtidos.”25 Sendo
assim, este capítulo tem o propósito de esclarecer a forma interpretativa do material científico
levantado para sua produção.
Para iniciarmos este debate, será analisado o sistema internacional desde o
começo do Império (1822), qual sua configuração, prioridades diplomáticas e atores centrais.
Logo após será analisado a era Dom Pedro I (1822-1831), os atores brasileiros, as prioridades
da nação, sua interação com Portugal, Reino Unido e o resto do mundo. Após esta analisa,
será analisada a era Regencial (1831-1840), quem a configurava, suas atuações na política e
academia da época e como contribuíram para a formação do então jovem Dom Pedro II,
passando assim, para a contextualização do Segundo Império (1840-1889). Com
contextualização histórica definida, poderá melhor se analisar a história dos atores centrais
para o estudo, utilizando de vários trabalhos bibliográficos e documentais relacionados a Dom
Pedro II, Victor Hugo e Louis Pasteur, para assim melhor poder entender as suas posições
políticas, obras, criações e vidas, suas correspondências e a influência que os pensadores
franceses têm nas posições do monarca brasileiro.
Com o destaque que os autores dão aos contatos pessoais do Imperador para seu
sucesso, traz-se a importância da história pessoal deste, não somente suas ações, para melhor
24 C. PRADO Jr., 1933, p. 7.25 M. MARCONI e E. LAKATOS, 2003, p. 224.
entender os meios que este líder tivera para obter tais resultados. Portanto, este estudo trará
uma análise histórica da educação destes líderes, desde os tutores de dom Pedro II no período
Regência, quem o acercava em suas viagens diplomáticas representando o Brasil nos finais do
Império e seus contatos nas suas viagens ao exterior nos últimos anos de sua vida.
Seguindo deste tema, o trabalho busca em exímios biógrafos e historiadores
brasileiros, como Lilia Moritz Schwarcz e seu trabalho “As Barbas do Imperador”, exemplos
de atos concretos da prática diplomática de Dom Pedro II a serviço da nação, analisando
assim os atores afetados e quais as repercussões disto, seja em artigos periódicos da época ou
comentários feitos por atores políticos da época.
Lilia Katri Moritz Schwarcz, nascida em 27 de dezembro de 1957 é uma
historiadora e antropóloga brasileira, doutora em antropologia social pela Universidade de
São Paulo, atualmente professora titular, na mesma universidade, da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas e Global Scholar na universidade de Princeton. Seu livro a ser
estudado, “As Barbas do Imperador”, ganhou prêmio Jabuti como Livro do Ano em 1998,
altamente elogiado pelos críticos da época.
Junto a esta será utilizado o trabalho atribuído a Benjamin Mossé, estudioso
francês do século 19, porém, vastamente reeditado pelo Barão do Rio Branco, “Dom Pedro II,
Imperador do Brasil”, livro este que é descrito pela biblioteca digital do Senado como:
Segundo o historiador, Luís Cláudio Villafañe G. Santos, o autor era um rabino e escritor de algum renome na França, mas com pouco conhecimento da realidade brasileira. A solução encontrada pelo camarista do Imperador D. Pedro II, Conde de Nioac, foi convidar o Barão do Rio Branco para auxiliar na elaboração da obra. O Barão foi dela, em realidade, o verdadeiro autor, fato reconhecido pelo próprio Mossé.26
José Maria da Silva Paranhos Júnior, o “Barão do Rio Branco”, nascido em 20 de
janeiro de 1845, no Rio de Janeiro, e falecido em 10 de fevereiro de 1912, foi diplomata,
advogado, geógrafo e historiador brasileiro. Filho do diplomata e político José Maria da Silva
Paranhos, o visconde de Rio Branco, desde jovem teve sua criação voltada para servir a nação
na política e diplomacia, estudou direito nas Faculdades de São Paulo e Recife, além de
diplomata foi promotor e deputado pelo Império. Igualmente foi jornalista e escritor,
escrevendo para o jornal A Nação e o Jornal do Brasil.
Em par disto, será utilizado os inúmeros relatos históricos deixados pelo próprio
Imperador. Utilizando-se dos “Acervos documentais do Brasil inscritos no Registro da
26 SENADO, 2018.
Memória do Mundo”27, disponível online no site da UNESCO, além de outros referenciais
abertos ao público que reúnem o material escrito pelo Monarca, como o Museu Imperial, que
reúne diários de viagem, redigidos diariamente pelo Imperador em suas expedições ao
exterior, buscar referências escritas pelo próprio para descrever seus encontros diplomáticos.
Além destes, materiais periódicos da época, como jornais diários e revistas, como o Diário do
Rio de Janeiro, visto na Figura 1, serão utilizados para explicar a visão e opinião da época, o
quanto necessário.
Figura 3 – Diário do Rio de Janeiro – 20 de março de 1876
Fonte: Diário do Rio de Janeiro (1876, p. 1).28
Fazendo assim, um estudo dentre o possível da biografia do Monarca, as atuações
diplomáticas pessoais do Imperador Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador
Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga, “O
Magnânimo”, buscando analisar o marco histórico que este deixou no país.
2.1 PANORAMA POLÍTICO BRASILEIRO NO SÉCULO 19
O início do Sistema Internacional do século 19 terá grande influência de duas
forças europeias dominantes, a Santa Aliança, liderada pela Rússia e a Quádrupla Aliança, da
Grã-Bretanha. Suas representações no quadro político internacional da época são explicadas
por Amado Cervo e Clodoaldo Bueno como:
Rússia e Grã-Bretanha representavam, em 1815, respectivamente, o sistema arcaico e o moderno das relações internacionais. A Rússia dispunha de forças consideráveis:
27 UNESCO, 2018.28 Amanhã parte para os Estados-Unidos o Sr. D. Pedro II. Hoje e ontem, em cordial recepção, tem estado, por espaço de longas horas, rodeado de seus fiéis súditos, que em multidão enchem os salões do paço que, que se acercam de sua augusta pessoa, que o saúdam respeitosos, que lhe dizem o adeus da despedida, tomados de enternecida saudade, e se retiram, bem dizendo o nome daquele em quem a majestade imperial se manifesta pelos extremos de bondade quase sobrenatural.
55 milhões de habitantes, um milhão em armas e o absolutismo, que permitia aos czares tomar decisões sem consultar ou ter de sofrer as pressões dos grupos sociais. A Grã-Bretanha, por sua vez, contava com os recursos do avanço econômico e devia incorporar nos cálculos políticos as pressões sociais que se manifestavam por meio dos órgãos de classe e das instituições representativas.29
Com grande influência da Inglaterra sob o Brasil, aquela terá sua Política Externa
regida pelos princípios de Adam Smith30, enfatizando o comércio exportador e defendendo a
economia interna e aos interesses europeus sobre a periferia do mundo, explicado, assim, pelo
princípio do “liberalismo” da época, dos tratados de comércio com baixas tarifas para as
nações influentes e dos impostos as nações mais fracas.31
A inserção inicial do Brasil Independente no sistema internacional é vista por
Amado Cervo e Clodoaldo Bueno como um fracasso em vários fatores. Regido pela
motivação de ter sua Independência reconhecida internacionalmente o país cede a vários
tratados desfavoráveis, inicialmente com a transferência do tratado histórico entre Portugal e
Inglaterra, herdando a dívida da nação lusitana para esta.32
Com receios de repetição dos exemplos anteriores de atos de repressão da Santa
Aliança em Nápoles e na Espanha, o país, sem nenhuma fatalidade histórica de ceder aos
ingleses, o faz em tratados comerciais desfavoráveis com esta, sem saber que sua
“recolonização” não era de interesse russo e nunca esteve em perigo deste, pois interesse
econômico internacional da época tendia-se favorável para sua sustentação e deveria ter usado
da possibilidade de alinhamento com a Rússia como motivador para ganhos em tratados e não
como o motivo em si para se evitar através de ditos tratados, estendendo, deste modo, até os
anos de 1840 o alto preço pago para o que achava ser a garantia de sua Independência.33
O Império não teve êxito em promover a imigração em larga escala na maior parte
do período Imperial, a não ser entre 1880 e 1889, quando entraram 450 mil europeus, número
maior que toda a imigração anterior.34
A ação imigrante, porém, esbarrava na imagem escravocrata, de um país inóspito,
com trabalho limitado, campanhas difamatórias pelas companhias emigratórias do Estados
29 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 21.30 Adam Smith (1723-1790), nascido na Escócia, autor de “Uma investigação sobre a natureza e a causa da riqueza das nações”, foi um filósofo e economista britânico e é considerado por muitos o pai da economia moderna, sendo um dos maiores influenciadores pela criação da teoria do liberalismo econômico.31 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 20.32 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 25.33 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 22, p. 24-27.34 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 93.
Unidos, investigações de governos europeus sobre as condições dos colonos no Brasil e a
proibição esporádica da emigração para o Brasil por parte dos governos europeus.35
As relações com as nações platinas é melhor exemplificada com analise dos
meados do século (1851-1876) onde se tem um balanço por um lado bem visto pelo sistema
internacional, com a percepção de estabelecimento de uma hegemonia periférica através dos
acordos e alianças favoráveis à vontade nacional, o uso da força ante os Estados platinos
quando as circunstâncias requeriam, a dependência destes mesmos por intermédio de
empréstimos e dívidas públicas, penetração econômica privada e fornecimento de matéria-
prima destes interditou o surgimento de hegemonia concorrente na região. Porém do outro
lado, as consequências econômicas foram muito negativas, os vários conflitos criados na
região serviram por atrasar a modernização interna e não tiveram resultados que tais métodos
imperialistas esperavam, os empréstimos ao Uruguai não foram honrados e as dívidas do
Paraguai mediante a guerra entre as nações jamais foi liquidada, ao mesmo tempo, tal guerra
contribuiu para fortalecer a Confederação e suscetível República Argentina, única potência
rival na região.36
Nas relações com a maior potência norte do continente, pode-se notar que a
política externa dos Estados Unidos da América desde sua independência já era bem
conhecida pelos diplomatas brasileiros. Enfatizando o isolacionismo e a não intervenção, este
ganhou três novos princípios em 1845. Com a Doutrina Monroe defendiam a expansão
territorial ilimitada, anexação de territórios sem interferência de terceiros e a interrupção da
colonização europeia na América. Com isto o país empreendeu, com seu representante no Rio
de Janeiro, William Trousdale, com tentativa de abertura do Amazonas à navegação e ao
comércio internacional, com o aparente objetivo de ocupação da Amazônia, utilizando-se da
sua estratégia de ação já conhecida dos diplomatas brasileiros da época: penetração
demográfica, provocação, conflito e anexação. A estratégia brasileira contra tal investida foi
de investir na criação de um comércio marítimo nacional e de envio de diplomatas a nação
norte americana para adiar a abertura da navegação, estratégia que teve sucesso, apesar de
pressões inglesas e estadunidenses, tendo se estendido até 7 de dezembro de 1866, quando o
perigo de dominação externa na região já se extinguia.37
35 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 94.36 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 135-137.37 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 111-116.
No clima político doméstico Caio Prado Jr. enfatiza, ao tratar do caráter
discriminatório social no Brasil Império, o funcionamento dos Direitos Políticos na
Constituição de 1823:
Finalmente, o caráter classista do projeto se revela claramente na discriminação dos direitos políticos. Os grandes proprietários rurais, principais responsáveis pela Independência, reservavam-se todas as vantagens políticas dela. Com este fim, adota o projeto uma complicada hierarquia de direitos políticos, que do simples direito de votar nas assembleias primárias (as eleições eram de dois graus) ao de ocupar os assentos do parlamento, vai sucessivamente restringindo o círculo dos cidadãos eles investidos. Excluem-se de todos, isto é, não se consideravam na terminologia adotada, cidadãos ativos os criados de servir, os jornaleiros, os caixeiros das casas comerciais, enfim qualquer cidadão com rendimentos líquidos anuais inferiores ao valor de 150 alqueires de farinha de mandioca. Numa palavra, toda a população trabalhadora do país, os escravos naturalmente incluídos.38
Parte do motivo deste é explicado por Prado Júnior pela falta de coesão dos
escravos, então próximos de 50% da população brasileira, por serem de origens de distantes
localidades, muitas vezes sem falar o mesmo idioma, com grandes rivalidades entre si e com
todos os fatores sociais contra sua mobilização. Privados de qualquer direito, isolados nas
zonas rurais, em condições que exigiam disciplina de rigor sem limites e em um meio que lhes
era estranho. Com tantos fatores contra si, não é de se surpreender que demorou a esta classe
organização para mobilizar-se com alguma força relevante no cenário político do Brasil.39
Na Política Externa do Brasil do século 19 as instituições vigentes não permitiam
a Dom Pedro II conduzir com autonomia pessoal papel de alta relevância, pois se esperava
que este se portasse como parte do Estado, frutos da Constituição de 3 de maio de 1823 que
limitava os poderes de seu pai, como se nota em afirmação de Caio Prado Jr.:
Logo nas primeiras sessões, uma simples frase de D. Pedro na fala do trono, frase em que afirmava “esperar da Assembleia uma constituição digna dele e do Brasil”, foi suficiente para levantar tempestades. E não tarda a retificação. Na resposta declara a Assembleia que “confia que fará uma constituição digna da nação brasileira, de si e do Imperador”, em que referência a D. Pedro era acintosamente colocada em último lugar. Casos semelhantes se repetem amiúde.40
Em reflexo disto, embora com privilégios na atuação da política Internacional, o
Imperador não tinha grande poder decisório, não tendo centralidade absoluta do poder
decisivo, mas também não criou obstáculos para os órgãos envolvidos na área.41
38 C. PRADO Jr., 1933, p. 56.39 C. PRADO Jr., 1933, p. 67.40 C. PRADO Jr., 1933, p. 55.41 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 77.
Lilia Moritz Schwarcz explica bem o funcionamento interno dos poderes
brasileiros do século XIX, escrevendo:
Não se pode acreditar na ideia da centralidade absoluta do Estado e do imperador. Na verdade, a maior parte das grandes decisões da política nacional eram tomadas pelos representantes do Executivo e do Legislativo, além dos conselheiros de Estado, ministros, senadores e deputados. No topo da elite do Império estava o Conselho de Estado: o “cérebro da monarquia”. Criado em 1823 e extinto pela reforma de 1834, o Novo Conselho é reinstaurado em 1841 e permanece até o final do Império. Esse é o “grupo do imperador”; o cargo é vitalício, podendo ser suspenso, pelo monarca, por tempo indeterminado. Já os ministros, de acordo com a Constituição imperial, representavam o Poder Executivo. O imperador era, porém, o titular e tinha total liberdade de escolha. Em 1847, com a introdução da figura do presidente de Conselho, d. Pedro II passou a apenas indicar o presidente, que, por sua vez, nomeava os demais. A interferência e o poder de veto do imperador, aliados à própria formação singular do Ministério brasileiro, levaram a vida dos gabinetes a ser muito curta. Afinal, até 1861 foram seis os ministérios, e após essa data mais sete.Na linha de frente do Império viriam a seguir os senadores. Mais uma vez era o imperador que escolhia os nomes em listas tríplices, obtidas por meio de eleição popular, valendo-se de critérios rígidos: o pretendente à vaga deveria ter idade mínima de quarenta anos e renda de 800 mil-réis anuais. O grande poder dos senadores advinha da vitaliciedade do cargo, que permitiu a alguns de seus membros permanecer no posto por mais de trinta anos. Era no Senado vitalício que o imperador, ainda menino, iria encontrar “as sumidades políticas” da nação. Alguns eram mais ligados ao Primeiro Reinado e ao período das Regências [...].Em um degrau mais baixo na hierarquia do poder estariam os deputados. Estes eram, na opinião de Carvalho, “os mais numerosos e os menos poderosos”, mas o cargo era um passo fundamental para futuros postos de maior evidência. Os requisitos mínimos para eleição eram idade mínima de 25 anos e renda de 400 mil-réis. Os homens da Câmara eram, em geral, de gerações mais recentes. Muitos deles, sobretudo os futuros estadistas do Império [...]. Enfim, aí estava congregada a “elite política” que, nos anos 50, como que observava o amadurecimento do imperador. Nesse momento, contudo, ele fazia parte de uma estrutura na qual era só um elemento evidente, um símbolo a ser exibido. No meio de políticos mais ou menos experientes d. Pedro não era, mesmo, sujeito da cena.42
No quadro diplomático existiam duas forças que se complementavam. Uma que
reunia os moderados, contra o uso da força, superdimensionado à ação diplomática e a
negociação. Outra, realista, liberal conservadora, colocava as decisões acima do destino,
agindo com a vontade da força. A exemplo disto, José Maria Silva Paranhos, o visconde do
Rio Branco, servia por vezes ambas, mesmo que originário do segundo grupo. Sua liderança
na diplomacia brasileira serviu a nação de forma concreta, obtendo resultados como tratados
de livre navegação, limites fronteiriços, tratados comerciais e moralização do Prata,
defendendo a coesão interna.43
Como teoria política vigente no século 19, através de James Monroe em 1817 no
Congresso norte-americano e defendido por Nicolau de Araújo Vergueiro no Brasil, em 1821,
42 L. SCHWARCZ, 2016, p. 167-16943 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 76-77.
era sustentada a ideia de que cabe ao governo, por intermeio da Política Externa, proteger as
manufaturas e criar um mercado interno para suas matérias-primas, erradicando assim a
dependência externa e incentivando a industrialização. Este conceito, porém, não se pode
dizer que fracassou, mas se quer foi de consideração real por grande parte das elites políticas
do Brasil Império.44
A vontade de inovar cedeu diante da percepção de que a situação interna era
suficientemente confortável e por parte daqueles no poder aconselhava-se não arriscar
mudanças profundas, com a alienação das elites políticas em ideologias desviantes, enquanto
as instituições liberais estivessem funcionando bem. Embora o regime dispusesse de força
para sustentar um projeto revolucionário, preferiu acomodar-se a situação de nação
dependente, sepultando o ideal industrial no comodismo ilusório e nas teorias econômicas
liberais, refletido na política econômica do Império. O fracasso não ocorreu por haver
pressões externas incontroláveis, ou até mesmo condição interna que o impedisse, mas sim
pelo abandono em reflexo de uma situação confortável para a elite.45
Nas duas últimas décadas do Império, dos anos 1870 e 1880, o governo brasileiro,
através do Ministério dos Negócios Exteriores teve atuação em que, como relatam Amado
Cervo e Clodoaldo Bueno:
Ostentava em 1882, por exemplo, convites para participar de sete congressos, duas conferências e duas exposições internacionais; para três congressos, uma conferência e oito exposições em 1884. No seio dessa ampliação do horizonte externo, veio enfim a decisão de participar dos congressos pan-americanos, quando se ponderou não mais convir ao Brasil o isolamento tradicional.46
Dom Pedro II, paralelamente, empreendeu três viagens pelo Ocidente (1871, 1875
e 1887) onde o Imperador contribuiu para tornar o país mais conhecido e respeitado no
exterior39 e onde encontrou-se, em 1887, com Victor Hugo, um dos objetos focais deste
estudo.47
44 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 20.45 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 73-77-78.46 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 146.47 A. CERVO e C. BUENO, 2013, p. 146.
2.2 DOM PEDRO II: ENTRE A VIDA POLÍTICA E A INTELECTUALIDADE
Buscando em o que Caio Prado Júnior chama de “o que se passa no íntimo da
nossa história”48 buscaremos em historiadores bibliográficos entender a vida pessoal de Dom
Pedro II, porém com a extensão desta, o atual estudo se focara em nortear esta busca em
assuntos relacionados ao tema tratado, sendo estes vistos com mais relevância em sua
biografia, sua atuação como político e sua formação como intelectual. Para esta busca se
encontram numerosos autores que estudaram a vida de Dom Pedro II49, porém para foco deste
se encontram os autores Lilia Moritz Schwarcz, Barão de Rio Branco e Benjamin Mossé. Esta
delineação central de poucas obras entre tantas pode ser vista como restritiva, porém frisa-se
que outros autores foram levados em conta, mas os livros neste capítulo citado buscarão ser
suficiente para mostrar o panorama político do século 19 e a formação política e acadêmica de
Dom Pedro II.
Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco de Paula
Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga nasceu em 2 de dezembro de 1825, filho do
Imperador brasileiro Dom Pedro I e Dona Maria Leopoldina de Habsburgo, será conhecido
internacionalmente ao longo do século XIX como Dom Pedro II, O Magnânimo e Imperador
do Brasil.50
Por sua descendência matrilinear era neto de Francisco I, Imperador da Alemanha,
Áustria, Hungria e da Boêmia, este filho de Leopoldo II, Imperador da Alemanha, e sobrinho
de Maria Antonieta, esposa de Luís XVI, da França. Sua genealogia chegava, entre figuras
ilustres, aos reis da França, Hungria, Aragão e Castela. Herdeiro dos Bourbon, Habsburgo e
dos Bragança, Dom Pedro II nasceu cercado de misticismo incomum, relatado na epoca a
carregar com si as esperanças de uma nação inteira.51
Desde sua primeira infância o título de “órfão da nação” é dado ao príncipe, visto
os acontecimentos que sucederam seu nascimento.52 Logo após a independência do Brasil,
Dom Pedro I era clamado por sua juventude e virilidade, porém a imagem interna do primeiro
Imperador do Brasil foi ruindo com suas atitudes autocratas. Com a imposição da
Constituição de 1824 que lhe dava poder absoluto, descrito por Lilia Schwarcz:
48 C. PRADO Jr., 1933, p. 7.49 Dentre tais autores, pode se citar como referencial exemplos como: L. Schwarcz (2016), Barão de Rio Branco e B. Mossé (2015), A. Olivieri (2003), Rose Brown (1945), Lothar Hessel e Georges Raeders (1979), Pedro Calmon (1975), Gilberto Freyre (1926).50 L. SCHWARCZ, 2016, p. 64-65.51 L. SCHWARCZ, 2016, p. 65-6652 L. SCHWARCZ, 2016, p. 65.
O poder moderador é a chave de toda a organização política, e é delegado privativamente ao imperador como chefe supremo da nação e seu primeiro representante, para que, incessantemente, vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos”. Contrariando as máximas da época que diziam que “o rei reina, mas não governa”, d. Pedro era investido de um poder maior, acima dos demais, quase absoluto. Como afirmava o artigo 99: “A pessoa do Imperador é inviolável e sagrada. Ele não está sujeito a responsabilidade alguma”.53
Imbuído pelo Poder Moderador o rei reinava e mandava, o que marcou os anos
iniciais do Império com tensão política e medo da restauração, fortalecido pelo tratado de
1825, em que Dom Pedro I manteve sua condição de herdeiro do trono português.54
Já no primeiro aniversário do príncipe Pedro II sua mãe encontrava-se enferma,
falecendo dez dias após a data. Com a fama viril de Dom Pedro I a instabilidade política uniu-
se a suspeitas e boatos de que a mãe de Pedro II, Leopoldina, havia sido “assassinada pelo
ciúme” e que seu pai “conhecido por seu caráter impetuoso, abandonava cada vez mais a
imperatriz, e tornava públicos os seus casos, como fizera a 12 de outubro, ao elevar a
viscondessa de Santos a marquesa.”55
Os voluntarismos políticos de Dom Pedro I levariam à abdicação em 7 de abril de
1831, levando consigo sua filha Dona Maria da Glória, no intuito de recuperar o trono de
Portugal para esta, “deixando para trás o príncipe d. Pedro, com pouco mais de cinco anos, e
as princesas imperiais d. Januária e d. Francisca, todos sob os cuidados do tutor que o
imperador designara: José Bonifácio de Andrada e Silva, seu antigo inimigo político nos
últimos anos”, como descrito por Lilia Schwarcz.56
No mesmo dia da abdicação de seu pai Pedro de Alcântara foi aclamado
“Imperador Constitucional e defensor perpétuo do Brasil”, sob o nome de Dom Pedro II.57
Neste instante instaura-se, então, uma “revolução sem sangue” com esperanças de uma
monarquia constitucional, livre de abusos de poder autoritário, com os 9 anos das Regências.58
Este período de Regências é descrito por Barão de Rio Branco como:
Durante a menoridade de D. Pedro II, governou o Império uma regência. A princípio se compunha dos senadores Marquês de Caravelas e Vergueiro, e do general Francisco de Lima e Silva, até 17 de junho; depois, até 12 de outubro de 1835, ficou constituída pelo mesmo general e pelos deputados Costa Carvalho e Bráulio Muniz.
53 L. SCHWARCZ, 2016, p. 6654 L. SCHWARCZ, 2016, p. 6755 L. SCHWARCZ, 2016, p. 6856 L. SCHWARCZ, 2016, p. 70.57 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 45.58 L. SCHWARCZ, 2016, p. 74.
Entrava o Brasil no período das regências, até 1840, o mais agitado de sua História, o mais perigoso para a vida nacional.59
Com o Reino marcado por incertezas lusitanas e ameaças federalistas, o foco do
pequeno Imperador, porém, era o tedioso cotidiano e regras estritas, propositalmente mantido
afastado de seus súditos. Este período de incertezas é descrito por Lilia Schwarcz:
Durante a menoridade de D. Pedro II, governou o Império uma regência. A princípio se compunha dos senadores Marquês de Caravelas e Vergueiro, e do general Francisco de Lima e Silva, até 17 de junho; depois, até 12 de outubro de 1835, ficou constituída pelo mesmo general e pelos deputados Costa Carvalho e Bráulio Muniz. Entrava o Brasil no período das regências, até 1840, o mais agitado de sua História, o mais perigoso para a vida nacional.60
Com receios da experiência vivida com seu pai, Dom Pedro II tem sua infância
marcada por mestres, horários rígidos, costumes, solidão e conselhos de sua “Dadama”, Dona
Mariana de Werna, do mordomo-mor Paulo Barbosa e de Aureliano Coutinho, o Visconde de
Sepetiba, o monarca é propositalmente “esculpido” o mais diferente possível de seu pai, em
caráter, personalidade e educação, descrito pela autora supracitada:
Com efeito, as imagens constroem um príncipe diferente do antigo monarca d. Pedro I, quase seu anti-retrato: responsável já quando pequeno, pacato e educado. Não se esperava do futuro monarca os mesmos arroubos do pai, tampouco “a má imagem” de aventureiro, da qual d. Pedro I não pôde se desvincular. O novo imperador era um mito antes de ser realidade: seria justo mesmo se não o fosse culto, mesmo sem inteligência criativa, de moral elevada mesmo tendo amantes. Tal qual o rei de Andersen, d. Pedro II estava sendo meticulosamente vestido, e os limites entre o visível e o invisível esfumavam-se no ar.61
Com esta infância, voltada aos estudos, passou-se os anos até 1840, com a criação
do “Clube da Maioridade”, do partido liberal, sem grandes oposições, proposta criada para
pôr fim às instabilidades políticas e rebeliões que caracterizavam grande parte do período
Regência. Vários são relatos históricos, opostos uns aos outros, afirmado que o Imperador em
si apoiou ou não este ato, porém a coroação veio a acontecer em 18 de julho de 1841,
marcando o fim da Regência e início do Segundo Reinado.62
O início do Segundo Reinado é marcado por movimentos militares, liderados
pelo general Luís Lima, mais conhecido historicamente como Duque de Caxias, para pacificar
tentativas de revoluções, como vistas no Maranhão em 1841, em São Paulo e Minas Gerais
59 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 48.60 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 48.61 L. SCHWARCZ, 2016, p. 89.62 L. SCHWARCZ, 2016, p. 92-99
em 1842, Rio Grande do Sul em 1845 e Pernambuco em 1849, instabilidade que causou
grande fortalecimento do partido conservador da época, que alternava-se no poder com o
partido liberal em influência no Império.63 Este período de instabilidade interna é descrito por
Lilia Schwarcz como:
O período que vai de 1841 a 1864 — ano do início da Guerra do Paraguai — representa uma fase importante para a consolidação da monarquia brasileira. Com efeito, as rebeliões regenciais da Bahia, Pará e Maranhão haviam sido debeladas com a ajuda do general Lima e Silva, que na época ganhou o título de barão de Caxias, pelos serviços prestados. Também nesse momento, o Gabinete da Maioridade, composto de Antônio Carlos e Martim Francisco Andrade, anistiaria simbolicamente os rebeldes que se entregaram às autoridades, o que em muito colaborou para acalmar os ânimos e receios gerais. A Guerra dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, continuava sendo, todavia, um ponto crítico em princípios do Segundo Reinado. Assim, em meio a esse ambiente político, ainda, conturbado e da troca sucessiva de partidos no poder, as tentativas de sufocar as rebeliões separatistas acabaram se transformando no grande tema do Império, colocando-se, no final, acima das divisões partidárias.64
Em meio a este clima de instabilidade política, Dom Pedro II era visto focando-se
em seus estudos científicos, limitando-se a “reinar” simbolicamente, cumprindo sua posição
de forma ritual. Paulo Barbosa, seu mordomo, era visto como a figura que o mantinha ativo na
política e economia do Império. Portanto os primeiros anos do Segundo Império, como em
sua infância, o Imperador se mantém distante da imagem de seu pai, cumprindo sua função
somente em momentos de destacada necessidade.65
Para efetivação da maioridade, além da imagem de um homem sábio, também se
viu necessária uma estratégia de casamento, nos anos 40, então, Bento Lisboa é encarregado
de elaborar uma lista de princesas solteiras. A questão de seu casamento foi tratada de forma
pública e privada, ambos pela necessidade do Estado e para os futuros herdeiros da nação. A
noiva encontrada foi Teresa Cristina Maria, princesa das Duas Sicílias, Bourbon e Habsburgo,
sobrinha da rainha da França e irmã do rei de Nápoles, o casamento se consagraria em 3 de
setembro de 1843. Logo após também se casaram as irmãs do Imperador, Dona Francisca
com o príncipe de Joinville, filho de Luís Filipe da França e Dona Januária com o conde
d’Áquila, irmão de Teresa Cristina, mantendo, assim os vínculos com a realeza europeia.66
Em 1845 nasce o primeiro filho do casal, Dom Afonso, porém este vem a falecer
em 11 de junho de 1846, por febre amarela. No mesmo ano nasce Isabel e em 1847
63 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 65-67.64 L. SCHWARCZ, 2016, p.118-119.65 L. SCHWARCZ, 2016, p.119-120.66 L. SCHWARCZ, 2016, p. 126-132
Leopoldina, porém, o casal perde seu quarto filho, Dom Pedro Afonso, em 10 de janeiro de
1850.67
Dom Pedro II, nos anos 50, torna-se um verdadeiro “monarca tropical”, com uma
maior estabilidade política, trazida pelo sucesso do café no mercado internacional, somado a
um Ministério e Câmara conservadores, favoráveis ao Imperador, este pode focar-se em se
tornar um formador de intelectuais e artistas, assumindo uma posição ativa no Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro, mostrando sua predisposição para o mundo acadêmico.68
Os anos 40 e 50 são marcados por leis de mudança estrutural, com a Lei das
Terras de 1850, para o incentivo a imigração, a abolição do tráfico negreiro, por pressão
inglesa e a reforma da Guarda Nacional, enquanto a Guarda fortalecia a posição do Estado, a
Lei das Terras e a Abolição, preparavam o país para o fim do trabalho escravo. Este período
ficou conhecido como a “Era Mauá”, com investimentos na área industrial e financeira, além
do êxito no Prata, os anos 50 se caracterizam pela estabilidade financeira e uma crescente
popularidade do monarca, recebido calorosamente onde quer que fosse no Império, gerando a
política do “ver e ser visto”, estratégia usada pela elite para unificar a nação através do
monarca simbólico.69 Porém este progresso tinha seu preço, como diz Lilia Schwarcz:
A Corte reunia em 1851, de acordo com o Almanak Laemmert a maior concentração urbana de escravos existente no mundo desde o final do Império romano: 110 mil escravos em 266 mil habitantes. Tal volume de cativos levava a uma divisão fundamental: de um lado, a rua do Ouvidor, com seus hábitos requintados e europeus; de outro, uma cidade quase negra em suas cores e hábitos africanos.70
Não somente a escravidão atrasava o progresso no Brasil, a imagem progressiva
emanada pela corte também encontrava obstáculo no fato de aproximadamente 90% da
população do país encontrar-se em zonas rurais, sendo que dos 10% em Zonas Urbanas,
aproximadamente metade encontravam-se em 3 cidades, Rio de Janeiro, Salvador e Recife,
com isto a imagem “europeia” que tentava se emanar para os imigrantes não teve grande
sucesso nesta era.71
Aquém destas questões, o Imperador focava-se em seu projeto cultural, tendo
como modelo o Institut Historique, fundado em Paris em 1834, o Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro, firmado como um centro de estudos e estimulando a vida intelectual,
67 L. SCHWARCZ, 2016, p. 135.68 L. SCHWARCZ, 2016, p. 137.69 L. SCHWARCZ, 2016, p. 141-143.70 L. SCHWARCZ, 2016, p. 162.71 L. SCHWARCZ, 2016, p. 163.
tendo Dom Pedro II presidido a 506 sessões do instituto, entre 1849 e 1889 pode ser atribuído
ao IHGB grande parte da formação de um Imperador estadista, mecenas das artes, fornecendo
financiamento direto a auxílio para poetas, músicos, pintores e cientistas, em um projeto de
fortalecimento cultural do Império.72
A partir dos Anos 60 o Imperador tomou mais interesse pessoal nas questões
políticas do Império, como visto em 1862, com a “Questão Christie”, em que o representante
da Inglaterra na corte, William Dougall Christie criou vários incidentes chocando-se com o
Gabinete de Caxias, porém, por pressões do Imperador, em 1862, um enviado especial inglês
curvou-se perante Dom Pedro II, reconhecendo a culpa inglesa.73
Porém a maior questão, suprapartidária, que tomou a atenção da corte e do
Imperador, nos anos 60, se deu pelas tensões nas fronteiras do Prata. Primeiramente a
instabilidade se deu pela guerra civil do Uruguai, porém com pressões do Brasil e da
Argentina, o país encerra sua guerra interna em 15 de fevereiro de 1865. Mas a instabilidade
na região recomeçaria, com Francisco Solano López entrando em choque com o Império
brasileiro. Em 1864, quando o Império envia uma esquadra para o Uruguai para investigar
supostas violências cometidas contra brasileiros, o governo paraguaio invade Mato Grosso, a
Argentina e investe contra o Rio Grande do Sul.74
Em contraposto a sua fama de estudioso e artista, o Imperador resolve viajar para
a fronteira, surpreendendo todos na corte, “o voluntário número um”, como era chamado,
começa a participar pessoalmente de assuntos políticos internacionais.75 A atenção que o
Imperador teve na Guerra perdurou até seu fim, em 1º de marco de 1870, com a morte de
López II, com vitória das tropas lideradas pelo conde d’Eu, esposo da Princesa Isabel,
herdeira do trono. Esta guerra, que durara mais de 5 anos, custou ao Brasil estimados um
bilhão e meio de francos, além de 50.000 homens mortos no campo de batalha.76
A Imagem do Imperador no pós-Guerra saí ferida, a insistência de perdurar a
guerra até a morte de López fez com que a imagem de “mecenas das artes” se transformasse
em uma de “senhor da guerra”, até mesmo na Europa e Estados Unidos.77
Neste momento há de se considerar a força da Guarda Nacional, com a ascensão
social conquistada por estes, especialmente os libertos negros, os militares negam-se a sua
72 L. SCHWARCZ, 2016, p. 178, 198-199.73 L. SCHWARCZ, 2016, p. 45374 L. SCHWARCZ, 2016, p. 454-457.75 L. SCHWARCZ, 2016, p. 458-76 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 106-124.77 L. SCHWARCZ, 2016, p. 479
posição anterior, de capturar escravos fugidos, tornando-se uma força política a favor da
abolição e da República. Criticado, especialmente pela Junta Francesa da Emancipação, em
1866, pela demora do país em agir na questão abolicionista, Dom Pedro II respondeu:
A emancipação dos escravos, consequência da abolição do tráfico, não é senão uma questão de forma e de oportunidade. Quando as circunstâncias penosas [aqui uma referência à Guerra do Paraguai] em que se encontra o país permitirem, o governo brasileiro considerará objeto da primeira importância a realização daquilo que o espírito do Cristianismo há muito reclama do mundo civilizado.78
Somente em 28 de setembro 1871 que a lei do Ventre Livre é assinada, pela
princesa Isabel, enquanto o Imperador se encontrava a caminho da Europa, ato que pode ter
desgastado a imagem do imperador, para fortalecer sua herdeira, buscando garantir o futuro
dinástico.79
A partir dos anos 70, inspirado em Luís Filipe, da França, o Imperador começa a
se vestir e portar como um “imperador cidadão”, visitava colégios e ginásios, conversava com
visitantes, vestia-se à paisana e começou a planejar viajar para o exterior. Agora irritava-se
com os grandes rituais. Comparado com Luís Filipe, seus laços já eram estreitos, Dona
Francisca, sua irmã, casara-se com o filho do francês, e com o casamento de suas filhas com
netos de Luís Filipe de Orléans, estes laços ficaram ainda mais estreito. Porém, diferente de
sua imagem de cidadão, Dom Pedro II, nesta época, não evitou de usar o Poder Moderador,
destituindo ministérios e dissolvendo Parlamentos, além de manter a estrutura do país
inalterada, permanecendo uma nação agricultora e com grande força de trabalho escravo.80
Esta estratégia funcionou, porém, em mudar sua imagem, agora visto como um
cosmopolita, os anos 70 e o 80 são marcados pelas viagens feitas pelo Imperador ao exterior.
Porém até mesmo sua viagem virou controvérsia, com a proclamação da Terceira República
na França, o Senado liderado por José de Alencar pede que o Imperador adie a viagem, porém
com a morte da princesa Leopoldina, deixando filhos menores para o Imperador cuidar, Dom
Pedro II parte em 25 de maio de 1871 a Europa e ao Oriente Médio.81
É nesta viagem de dez meses que o Imperador começa a usar de sua imagem
como imperador-cidadão, ora para negar e ora para afirmava sua realeza, descrito por Eça de
Queirós:
78 L. SCHWARCZ, 2016, p. 48279 L. SCHWARCZ, 2016, p. 481-48280 L. SCHWARCZ, 2016, p. 492-494.81 L. SCHWARCZ, 2016, p. 537
Um instante de atenção! O Imperador do Brasil, quando esteve entre nós (e mesmo fora de nós), era alternadamente e contraditoriamente — Pedro de Alcântara e D. Pedro II. Logo que as recepções, os hinos, os banquetes se produziam para glorificar D. Pedro II — ele apressava-se a declarar que era apenas Pedro de Alcântara. Quando os horários dos caminhos de ferro, os regulamentos de bibliotecas, ou a familiaridade dos cidadãos o pretendiam tratar de Pedro de Alcântara — ele passava a mostrar que era D. Pedro II.82
Ao retornar ao Brasil, Dom Pedro II fez grande amizade com Gobineau, chefe da
delegação diplomática francesa no país, grande crítico do Brasil, porém detinha igualmente
grande afeto pelo Imperador deste país que criticava. Dom Pedro II não comentava as críticas
de seu amigo, porém queixava-se a este do tédio que tinha com a política, além da vontade de
ser professor e voltar a viajar. É neste momento de sua vida que Gobineau e José de Alencar,
sob pseudônimo de Carlos Eneide, escrevem dois livros baseados em suas percepções do
Imperador, Pléiades e A guerra dos mascates mostrando suas percepções das qualidades deste
de curioso, irritadiço, defensor da liberdade de imprensa, estadista, humanista e detentor do
poder moderador.83
Em 1876, o Imperador planeja sua segunda viagem, entre 26 de março de 1876 e
26 de setembro de 1877. Iniciada nos Estados Unidos da América, na Exposição Universal da
Filadélfia e seguindo para a Europa, passando pela Ásia, África84 e com apreço especial por
Jerusalém.85
Nos Estados Unidos, inaugurou a feira da Filadélfia, e mostrou-se aberto a novas
tecnologias, famosa entre estas, testou o telefone, de Graham Bell e encontrou-se com
Thomas Edison. Visitou escolas, museus e intelectuais, igualmente, foi para a Europa,86 onde
encontrou-se com Victor Hugo, supracitado neste trabalho.
Voltando da segunda viagem, o Imperador começa a investir em uma imagem
progressiva para o Brasil, trazendo com este “progresso”: a pilha, a locomotiva, o telégrafo, o
navio a vapor. No final dos anos 70, início dos anos 80, a burguesia brasileira mostrava
vontade de criar uma Revolução Industrial, finalmente, no Brasil.87
Neste espírito se encontram as Exposições Internacionais, relevando assim o
progresso e a tecnologia, muito atraente para as elites no Brasil, descritas como “orgias da
modernidade”, conceituadas em Londres, as feiras se espalharam pela Europa e América.
82 L. SCHWARCZ, 2016, p. 540.83 L. SCHWARCZ, 2016, p. 548-552.84 L. SCHWARCZ, 2016, p. 552.85 RIO BRANCO e B. MOSSÉ, 2015, p. 234.86 L. SCHWARCZ, 2016, p. 556.87 L. SCHWARCZ, 2016, p. 568-572.
Comparáveis aos Jogos Olímpicos, o Brasil virou presença cativa a partir da terceira, em
1862, com motivação de mudar a imagem do país, mostrando-o mais moderno. Nisto
encontra-se o Imperador, investidor central de várias das amostras, criando um sistema de
amostras regionais, dando a cada província uma chance de representar-se em uma amostra
nacional, onde as melhores seriam selecionadas para representar o Brasil na Exposição
Universal. Até o fim do Império o Brasil participou de todas as feiras, na maior parte sendo o
único país Latino a fazê-lo, com exceção da Argentina em 1889, mostrando o esforço do
Imperador e das elites, nas últimas décadas do Império, de veicular uma imagem modernizada
do Brasil.88
Na última feira participada pela Monarquia, em 1889, Paris construiu um
monumento propício a modernidade da ocasião, a Torre Eiffel. A maior Exposição já
realizada, teve participação garantida do Brasil, boicotada por outras monarquias por ser uma
“exaltação a República”, tal simbologia foi ignorada por Dom Pedro II, para mostrar sua
posição progressista. Com 1600 expositores, foi a maior amostra apresentada pelo Brasil.89
Porém o sucesso da monarquia brasileira no exterior não se refletia mais
internamente. Vários escritores da época relatam uma imagem desgastada, e que seus gastos
com caridade e ciência não mais rendiam adoração ou agradecimento. O descuido com a
imagem tornava aparente a fragilidade do sistema monárquico, até então vinculado a
estabilidade do Reino, com a morte de grandes Estadistas monárquicos, como o duque de
Caxias e o visconde Rio Branco, e com a ascensão dos liberais, esta posição foi cada vez mais
questionada.90
Neste clima, Dom Pedro II parte para sua terceira e última viagem, em 30 de
junho de 1887, com destino a Londres. Marcado por doenças como a anemia e com
decadência física devido a sua idade avançada, levou uma pequena comitiva, com o príncipe
Pedro Augusto, a viagem foi marcada pela fraqueza de Dom Pedro II. Com a impopularidade
de Conde d’Eu, Dom Pedro II até cogitara fazer de seu neto, Dom Pedro Augusto, seu
sucessor, porém o jovem Bragança revelava sinais de insanidade mental, fazendo o Imperador
abandonar seus planos, criando receios nas elites de um Terceiro Reinado nas mãos de um
“estrangeiro”.91
Já no Brasil, as pressões dos Republicanos, com apoio dos Liberais em 1884, e
dos Conservadores em 1888, a lei de 13 de maio livrou 700 mil escravos e representou o fim 88 L. SCHWARCZ, 2016, p. 575-581.89 L. SCHWARCZ, 2016, p. 590-597.90 L. SCHWARCZ, 2016, p. 625-626, 645-646.91 L. SCHWARCZ, 2016, p. 647-653.
dos últimos apoiadores a monarquia, os fazendeiros cariocas, impopularidade reforçada pela
ausência do monarca. Aflito com diabetes e cardíaco, o monarca volta para o Brasil, voltava
enfermo e fragilizado.92
Com embates entre o Partido Republicano e Monarquistas, membros das elites
passaram a pressionar o Exército, liderado pelo marechal Deodoro, a tomar partido contra a
Monarquia. Marechal Deodoro da Fonseca finalmente adere a causa Republicana, prende o
ministro Ouro Preto, porém evita encarar o Imperador, que o esperava em Petrópolis.
Somente um dia após a proclamação da República, em 16 de novembro de 1889, com
constrangimento geral, se decide enviar oficiais subalternos liderados pelo major Frederico
Sólon Sampaio Ribeiro, avisando o banimento da família imperial. Com isso, na madrugada
do dia 17, Dom Pedro II e sua família embarcaram rumo a Europa.93
Na Europa, no dia 28 de dezembro de 1889, falece Teresa Cristina, aos 67 anos. O
exílio de Dom Pedro II inicia-se com sofrimento, isolando-se cada vez mais, acompanhado
somente de seus livros e projetos de tradução. Porém aos poucos volta a suas rotinas de visitar
instituições, escrever e ler poemas e encontrar-se com intelectuais. Em situação financeira
difícil, dependeu de ajuda de amigos, como Nioac, cuja residência em Paris Pedro de
Alcântara morou em 1890 e, posteriormente, mudou-se para um pequeno hotel chamado
Bedford, na rue de l’Arcade, número 17.94
Em dezembro uma pneumonia tomou seu pulmão esquerdo, passando seu 66º
aniversário confinado a seu quarto, cercado por sua filha, netos e amigos, a meia-noite de 5 de
dezembro de 1891, o monarca veio a falecer. Foi velado na França com rituais de Imperador,
enterrado 3 dias depois, em Portugal, ao lado de Teresa Cristina. O retorno dos restos mortais
de Suas Majestades Imperiais, além do fim do banimento da Família Imperial, ocorreria no
centenário da Independência, fazendo com que somente voltassem ao solo brasileiro em 1922,
e mesmo assim sua lápide somente foi inaugurada por Getúlio Vergas em 5 de dezembro de
1939.95
Portanto, com uma visão panorâmica política do Brasil do século 19, em que as
políticas públicas eram mais voltadas para o interesse das elites do que para a população96,
além de um delinear biográfico de Dom Pedro II, este capítulo buscou mostrar o Sistema
Internacional do século 19, o funcionamento interno do Brasil Império, assuntos de maior
92 L. SCHWARCZ, 2016, p. 657-659, 664-666, 93 L. SCHWARCZ, 2016, p. 675, 685-69194 L. SCHWARCZ, 2016, p. 717, 721, 72595 L. SCHWARCZ, 2016, p. 729, 735-736.96 C. PRADO Jr., 1933, p. 56.
relevância a biografia pessoal de Dom Pedro II, sua atuação como político além de sua
formação e recorrente interesse com a formação científica pessoal e do Império, desde sua
infância97 até os anos finais de sua vida98.
97 L. SCHWARCZ, 2016, p. 92-99.98 L. SCHWARCZ, 2016, p. 556.
3 DOM PEDRO II E OS PENSADORES FRANCESES
Desde sua infância Dom Pedro II dedicou-se aos estudos científicos e as artes.99
Fato este confirmado por José Bonifácio, e Dona Maria de Verna, tutores do jovem
Imperador.100 Em seu envolvimento com o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro,101 além
de inúmeros projetos científicos supracitados no capítulo anterior, é impossível negar a
influência que a ciência teve em sua vida.
Para entender esta influência devemos buscar os influenciadores mais diretos.
Georges Raeders escreve:
A primeira missão artística francesa que, na história das relações franco-brasileiras, deverá ser seguida de muitas outras, chegou ao Rio em março de 1816. O francês Ferdinando Denis sem dúvida tinha razão de escreve alguns anos mais tarde: “Se os ingleses foram os primeiros a desenvolver entre os brasileiros o gosto dos melhoramentos industriais, se foram eles que imprimiram sobretudo essa atividade comercial que nós secundamos mais tarde, e cujos resultados colhemos em parte, é a nós sobretudo que cabe o direito de reclamar essa prioridade de iniciação nas artes e nas ciências, que um povo Sempre deve a outro povo, e que para sempre marca época na história de seu desenvolvimento social.102
Este aprendeu francês com Boiret, um emigrado da França de 1789, além deste
outro francês, Louis Alexis Boulanger ser o primeiro mestre do pequeno príncipe. Já com 9
anos de idade Dom Pedro II lê, traduz e escreve tanto o inglês quanto o francês, e estudava
também história e geografia com Felix Taunay, que o descreve como detento de uma
excelente memória.103
A maioridade não modificou estes costumes, com 15 anos continuava dedicando
boa parte do seu dia, entre as 9 horas da manhã e as 2 da tarde, aos estudos, particularmente
de história, direito, latim e grego. Aos 22 anos, em 1947, outros relatos demonstram a mesma
dedicação pelo conhecimento, como relata Alexandre Herculano e o doutor Pedro Calmon. O
mesmo é visto aos seus 30 anos, por Frei Pedro de Santana, além de relatos de que neste ano o
Monarca iniciara sua rotina de manter correspondências com ilustres pensadores da sua época,
como Manzoni e Alexandre de Herculano.104
99 G. RAEDERS, 1944, p. 7.100 G. RAEDERS. 1944, p. 10.101 L. SCHWARCZ, 2016, p. 137.102 G. RAEDERS, 1944, p. 7-8.103 G. RAEDERS. 1944, p. 10.104 G. RAEDERS. 1944, p. 11-12.
No dia 4 de julho de 1888 Mossé descreve um banquete em Paris em honra a
emancipação, glorificada na imprensa francesa como “a mais bela glorificação do Brasil”, em
um brinde feito por Goblet, Ministro dos Negócios Estrangeiros, em honra a Dom Pedro II, é
relatado por Mossé:
Ele não libertou somente o corpo em todo o seu reinado, trabalhou para a emancipação das inteligências, desenvolvendo a instrução pública [...]. Poderia este príncipe liberal e tão esclarecido deixar de ser amigo da França? Em todas as épocas de sua vida o imperador D. Pedro II deu-nos prova de estima e simpatia [...]. Estuda com curiosidade infatigável as obras e as instituições francesas [...] enfim, honra nosso país [...]. Por nossa parte, nós nos felicitamos por esta ocasião de testemunhar-lhe nosso respeito. A República Francesa [...] admira acima de tudo aqueles que se tornam benemérito de seu povo e procuram a glória nas obras da paz, de progresso e de civilização!105
Doutor Pedro Calmon relata que em sua viagem ao Egito o Imperador escreveu
que era filho espiritual da França, comentando também que Dom Pedro II sempre se inclinou
para os estudos da cultura, letras e política francesa.106
Será, portanto, foco deste capítulo buscar grandes influenciadores do Imperador
dentre esta cultura que o Imperador tanto estudou, com o intuito de entender quais as raízes de
seus pensamentos críticos, tão louvado entre seus pares.
Para isto se usará de metodologia Bibliográfica e Documental, resgatando cartas
trocadas entre Louis Pasteur e Dom Pedro II, além de partes de Diários de Victor Hugo,
encontrados no mesmo livro, que relatam os encontros entre o autor e o Imperador,
documentações encontradas no livro de autoria de Georges Raeders, “Dom Pedro II e os
Sábios Franceses”107. Grande parte dos arquivos históricos deste capitulo e o próximo estão
baseados em trabalhos feitos por Georges Raeders (1890-1980), autor nascido na França,
escritor de vários livros em português e Sócio Correspondente da Academia Brasileira de
Letras entre 1969 e 1980, na “Cadeira 11”. Seu livro “Dom Pedro II e os Sábios Franceses”
teve somente 180 exemplares produzidos em sua produção original de 1944, portanto grande
parte do conteúdo utilizado neste estudo se encontrará disponível em anexo no fim do
trabalho.
105 N. RAPHANELLI, 2012, p. 300106 G. RAEDERS. 1944, p. 11-12.107 O livro “Dom Pedro II e os Sábios Franceses”, de Georges Raeders, faz parte da Coleção Brasiliana, produzida entre 1931 e 1993 pela Companhia Editora Nacional, no qual foi parte de debate na época por possível caráter político demasiado, portanto especula-se que o material encontrando no livro pode ter sido selecionados, possivelmente retirando da coletânea cartas que não condissessem com a opinião dos autores, portanto é possível que material contrariante a este trabalho possa existir.
Além disto se buscará em trabalhos acadêmicos a obra e vida de Victor Hugo e
Louis Pasteur, para melhor explicitar a importância destes nas suas áreas de atuação.
3.1 DOM PEDRO II E LOUIS PASTEUR
Georges Raeders comenta sobre o conhecimento inicial de Dom Pedro II as obras
de Louis Pasteur quando diz:
O Imperador do Brasil tinha aceito prazerosamente, em 1842, o título de membro correspondente do Instituto de França, classe de Academia de Ciências.Foi provavelmente durante uma das sessões da Academia, sessões que gostava de assistir, nas suas visitas à França, que se avistou, pela primeira vez, com o entusiasta Louis Pasteur.108
A partir de 1873 o Imperador mostrou seu desejo de conhecer o sábio francês em
seu laboratório e, a partir de 1880, é demonstrado o intercâmbio de correspondências entre
Dom Pedro II e o cientista, visto por parte das cartas do Imperador um foco na moléstia da
febre amarela, introduzida no Brasil em outubro de 1849, por um navio norte americano
procedente de Nova Orleans. Deste ocorrido, milhares de brasileiros viriam a falecer
anualmente da moléstia e é de prioridade do Imperador achar cura para a aflição. Até
considerando que isto afetava, inclusive, a política de imigração do país, abalada pelos relatos
dos estragos da febre amarela no território brasileiro.109
Georges Raeders disponibiliza em seu livro “Pedro II e os sábios franceses” 17
cartas entre o Imperador e o médico francês110, estas cartas, por dificuldade de acesso serão
disponíveis em Anexo no trabalho, com tradução referencial, quando relevante, do autor ou de
George Raeders, daquelas aqui abordadas.
A primeira carta do Imperador para o médico, datada em 11 de setembro de 1880
pode se notar a temática de intercâmbio científico pretendido pelo Imperador, introduzindo a
Louis Pasteur o médico brasileiro dr. Fort, com pedido de que este estude com Pasteur seus
métodos de tratamento, explicando que "o Dr. Fort espera voltar ao Rio no próximo ano e ele
quer estudar a febre amarela com a sua metodologia que o levou a tantas descobertas tão úteis
à humanidade”111, tentando buscar trazer os inováveis métodos de pesquisa sobre doenças
infecciosas e imunologia criados por Louis Pasteur.
108 G. RAEDERS, 1944, p. 63.109 G. RAEDERS, 1944, p. 63-64.110 G. RAEDERS, 1944, p.137.111 G. RAEDERS, 1944, p.137.
Nesta documentação pode-se ver a intenção desde o início das correspondências
do Imperador de buscar conhecimento para o Brasil sobre a enfermidade, febre amarela,
buscando o mais consagrado médico de sua época, já famoso por seus estudos com a doença
da raiva, no intuito que este ensine o jovem médico brasileiros, doutor Fort, sua metodologia,
para aplicá-la aos estudos médicos no Brasil.
Louis Pasteur prontamente responde ao Imperador, recebendo e acolhendo o
jovem médico brasileiro, mostrando vontade de resolver o problema de seus colega, porém
lamenta que sua idade avançada não permite viajar ao Brasil, mas mostrando disposição de
guiar o estudioso Imperador a pesquisas que o possam ajudar, dizendo: “Se eu fosse mais
jovem e mais válido, eu iria, senhor, pedir hospitalidade por um ano ou dois na sua linda
nação e eu tentaria o estudo científico dessa terrível doença procurando por seu micróbio”.112
Nesta carta de Pasteur a Dom Pedro II, datada 15 de novembro de 1880, o acolhimento ao
doutor Fort, em que Pasteur diz “dar direções no que estavam a seu alcance”113, em uma
espécie de intercâmbio científico do século 19, mostra mais uma vez exemplo do
envolvimento do Imperador brasileiro em fomentar avanço da ciência do Império.
Em várias das correspondências entre o médico francês e o Imperador brasileiro
se demonstra a vontade de Pasteur de vir a Brasil, porém, segundo o médico, sua saúde não o
permitiria. Em certa ocasião, descrita em carta de 7 de julho de 1882, Pasteur é informado de
uma crise de febre amarela no Senegal, este até tenta buscar em embarcações vinda de
Senegal pacientes com a doença, para poder estudá-la, a pedido do Imperador brasileiro,
mesmo na França. Mas o médico não tem sucesso, escrevendo: “Aguardei vários navios do
Senegal na esperança de novos casos. Felizmente para a humanidade e talvez infelizmente
para a ciência, não se repetiram.”114
As cartas entre o Imperador e o médico continuam a demonstrar o avanço da
medicina nos anos 1880, com a criação de centros de tratamento e pesquisa no Brasil. Dom
Pedro II continua a se manter atualizado sobre as técnicas médicas de Pasteur, além de
continuar a enviar estudantes de medicina brasileiros para estudar com Pasteur, servindo, o
Imperador, como intermédio entre a comunidade cientifica brasileira e o médico francês.
Como mostra uma carta de Dom Pedro II, de 14 de outubro de 1884:
Tradução e interpretação de Georges Raeders:
112 G. RAEDERS, 1944, p. 139.113 G. RAEDERS, 1944, p. 138.114 G. RAEDERS, 1944, p. 67.
D. Pedro não desanimava de atrair Pasteur ao Brasil e em 14 de outubro de 1884 lhe escrevia: “O dr. Pereira dos Santos, portador de uma das minhas cartas, e que trabalhou no vosso laboratório, acaba de fazer a instalação de um laboratório na Escola de Medicina do Rio para o estudo de micróbios. É de grande interesse para o meu país, que poderá dever-vos a vida de elevado número dos seus habitantes, se vierdes ao Rio dar a vossa opinião sobre estudos feitos aqui sobre a febre amarela.Aqui encontrareis culturas feitas com o maior cuidado para o exame do assunto. Ainda que não venhamos a dever-vos a descoberta da vacina contra essa moléstia, vossa visita constituiria motivo de grande influência para o desenvolvimento cientifico no Brasil. A estime que me inspirais já é assaz conhecida e sabeis qual o meu interesse pela ciência. Será grande jubilo acolher-vos na medida de vosso merecimento.”115
Mais cartas são trocadas, em que Pasteur até cogita vir ao Brasil, em 22 de
setembro de 1884. quando sugere ao Imperador, ao falar de seu método de profilaxia da raiva,
que este já havia utilizado para imunizar cachorros, porém o médico não tinha confiança de
utilizar o método em humanos, sugeriu, então, usar criminosos que estariam para ser punidos
à morte, para serem cobaias aos métodos de Pasteur:
Tradução e interpretação de Georges Raeders:A escolhe entre a morte iminente e um experimento que consistiria em inoculação preventiva da raiva para tornar a constituição de um indivíduo refrataria à mesma. A vida do condenado seria poupada em caso de sucesso, de que estou persuadido.116
Porém o Imperador brasileiro, em 10 de outubro de 1884 explica que ele comutara
toda pena de morte, o que torna a proposta de Pasteur inviável:
Tradução e interpretação de Georges Raeders:Como talvez seja de vosso conhecimento, no Brasil a pena de morte é suavizada pelo soberano. Se a vacina contra a raiva não é de efeito incontestável, que iria preferir a morte duvidosa a outra quase irrealizável? Ainda em caso contrário, como consentir num suicídio possível ou antes provável?117
Assim continuaram as cartas entre os dois, o Imperador tentando convencer o
médico a viajar para o Brasil, e o médico atualizando-o em técnicas de tratamentos
imunológicos. Após o Imperador ser banido para a Europa e refugiar-se em Paris, os laços de
amizades com Pasteur tornaram-se ainda mais estreitas, sendo o Imperador brasileiro sempre
bem-vindo no Instituto Pasteur.118
115 G. RAEDERS, 1944, p. 68-69.116 G. RAEDERS, 1944, p. 70117 G. RAEDERS, 1944, p. 147118 G. RAEDERS, 1944, p. 75.
3.2 DOM PEDRO II E VICTOR HUGO
O Primeiro encontro entre o autor francês e o Imperador pode ser visto no diário
do próprio autor francês, tirado do livro de Georges Raeders, que pode ser visto em integra
nos Anexos deste estudo. Vários autores descrevem tal encontro como um dos grandes
destaques das viagens do Imperador, nesta ocasião Victor Hugo, ao apresentar Dom Pedro II a
seu neto, como “Vossa Majestade”, Dom Pedro II diz ao jovem: “Meu filho, há apenas uma
majestade aqui, é Victor Hugo.” Tal encontro impressiona tanto o autor francês que este
descreve o Monarca brasileiro como neto de Marcus Aurélio, uma alusão ao sábio Imperador
romano, que reinou entre os anos 160 e 180.119
Esta ocasião marca o início de uma troca de cartas entre o Imperador e o autor que
será parte da analise deste trabalho, porém sem as cartas em si disponíveis, será analisado no
“Capítulo 4” a repercussão desta, através de Anais do Senado e outros documentos.
É inegável a influência que o pensador Francês tem na sociedade brasileira. Muito
engajado politicamente, ele mostra sua crítica a assuntos da época, como a pena de morte,
como forma de exemplificar suas posições políticas, defendidas em suas correspondências, é
visto uma de suas cartas a Lord Parlmeston em 11 de fevereiro de 1854:
Je mets sous vos yeux une série de faits qui se sont accomplis à Jersey dans ces dernières années. Il y a quinze ans, Caliot, assassin, fut condamné à mort et gracié. Il y a huit ans, Thomas Nicolle, assassin, fut condamné à mort et gracié. Il y a troisans, en 1851, Jacques Fouquet, assassin, fut condamné à mort et gracié. Pour tous ces criminels la mort fut commuée en déportation. Pour obtenirces grâces, à ces diverses é poques, il a suffi d`une petition des habitants de l`île. [...] Maintenant quittons Jersey et venons à Guernesey. Tapner, assassin, incendiaire et voleur, est condamné à mort. A l`heure u`il est, monsieur, et au besoin les faits que je viens de vous citer suffiraient à le prouver, dans toutes les consciences saines etdroites la peine de mort est abolie; Tapner condamné, un cri`élève, les pétitions se multiplient; une, qui s`appuie énergiquement sur le principe de l`inviolabilité de la vie humaine, est signée par six cents habitants les plus éclairés de l`île. [...] Les pétitions vous sont remises, monsieur. Vous accordez un sursis. En pareil cas, sursis signifie commutation. L`île respire; le gibet ne sera point dressé. Point. Le gibet se dresse. Tapner est pendu. Après réflexion. Pourquoi?120121
119G. RAEDERS, 1944, p. 40.120 L. SILVA, 2016, p. 169.121 Em tradução de Luiz Eudásio Capelo Silva:Eu coloco sob vossos olhos uma série de fatos que ocorreram em Jersey nesses últimos anos. Há quinze anos, Caliot, assassino, foi condenado à morte e, depois, agraciado. Há oito anos, Thomas Nicolle, assassino, foi condenado à morte e, depois, agraciado. Há três anos, em 1851, Jacques Fouquet, assassino, foi condenado à morte e, depois, agraciado. Para todos esses criminosos a morte foi comutada em deportação. Para obter essas graças, nessas diversas épocas, foram suficientes uma petição dos habitantes da ilha. Agora, saiamos de Jersey e vamos a Guernesey. Tapner, assassino, incendiário e ladrão, é condenado à morte. Nessa situação em que ele está, senhor, e sendo os fatos que acabo de lhe citar o suficiente para lhe provar, em todas as consciências sanas e direitas a pena de morte está abolida. Tapner condenado, um grito surge, as petições se multiplicam; uma, que se apoia energicamente no princípio da inviolabilidade da vida humana, está assinada por mais de seiscentos dos
Nesta ocasião Victor Hugo defende a abolição da pena de morte, mostrando
exemplos de comutação da pena, por vontade popular, apelando a consciência do Lorde, para
que fizesse o mesmo por Tapner, um assassino confesso.
De acordo com Luiz Silva, outro tema engajado por Victor Hugo é a escravidão,
em 1826 o escritor publica o livro Bug-Jargal que tem como personagem principal um negro
envolvido nas revoluções escravas na ilha de Santo Domingo. Victor Hugo pode não ter a
condição do negro no século XIX como sua pauta política central, mas é inegável que através
de seus escritos sobre a liberdade humana, o escritor defende a igualdade de todos, inclusive
dos negros.122
Portanto é possível ver, em cartas e obras de Victor Hugo, que este é engajado
politicamente com lideranças mundiais em favor de temas de seu interesse, neste caso
estudado, refletido nos temas da Pena de Morte e a Escravidão.
É possível notar, com a exposição deste capítulo, a interação de Dom Pedro II
com os pensadores franceses, Louis Pasteur e Victor Hugo, mostrando assim os assuntos que
estes tratavam em suas correspondências pessoais. Este intercâmbio de ideias também
demonstra os recorrentes interesses do Imperador, não voltados para sua vida pessoal, mas
nos assuntos de importância ao Império, como visto na insistência do tratamento da febre
amarela, em suas cartas com Louis Pasteur.
mais esclarecidos habitantes da ilha. [...] As petições são enviadas, senhor. Você concorda com um recurso. Em casos semelhantes, recurso significa comutação. A ilha respira. A forca não será montada. A forca é montada. Tapner é pendurado. Após reflexão. Por que?122 L. SILVA, 2016, p. 141-142.
4 REFLEXO DO INTERCAMBIO DE IDEIAS NA POLÍTICA BRASILEIRA
Com a utilização de documentação concreta, este capítulo trará repercussões
tangíveis entre o intercâmbio de ideias de Dom Pedro II e suas ações, buscando nos discursos
das “Falas do Trono”123 sua atitude diante tópicos discutidos anteriormente, como a medicina
e a pena de morte, e em discursos proferidos no Senado, acessados nos Anais do Império, 124
em que tal intercâmbio é reconhecido por políticos da época, além de busca nas próprias
cartas e discursos do Monarca em que o Imperador demonstra o resultado destas discussões
acadêmicas em suas políticas.125 Também será buscado em periódicos do século XIX,
acessados na Biblioteca Nacional Digital, se é possível demonstrar alguma repercussão disto
na sociedade brasileira.126
Este capítulo, portanto, será Bibliográfico e Documental, buscando livros e
documentos que reflitam de forma tangível refletir as atitudes e ideias demonstradas
previamente.
4.1 MEDICINA
Doenças epidêmicas são parte do foco dos discursos do Imperador brasileiro em
diversas ocasiões, nas “Falas do Trono” é possível encontrar menções da febre amarela cinco
vezes: em 1850, 1880, 1883, 1884 e 1885; a varíola é mencionada três vezes: em 1883, 1884 e
1885; já a cólera é mencionada três vezes, em 1885, 1887 e 1888.127 Como contemporâneo do
médico francês que o aconselha no assunto, e por sua reconhecida introdução tardia em sua
vida ao tema da medicina, é possível notar-se uma grande evolução do domínio e
conhecimento do Imperador sobre o assunto, especialmente comparando a primeira menção
nos discursos para o Senado com sua última.
A primeira menção de tratamento a uma epidemia nas Fala do Trono pode ser
vista em 1850, ocasião que discursa o Imperador:
Algumas cidades do nosso litoral; e especialmente as da Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco, têm sido assaltadas nestes últimos meses de uma febre epidêmica. Os estragos da enfermidade, que aliás não estão em proporção com o terror que têm
123 SENADO, 1889.124 SENADO, 2018.125 G. RAEDERS, 1944.126 SENADO, 2018.127 SENADO, 1889, p. 463. 802, 832, 837-839, 845, 863, 866, 874.
causado, afligem profundamente meu coração. Graças a Deus vai diminuindo o mal, e espero ele sua Divina misericórdia que, ouvindo nossas preces, arrede para sempre do Brasil semelhante flagelo. O meu governo tem empregado todos os meios ao seu alcance para acudir aos enfermos necessitados.128
Na ocasião é possível ver a falta de domínio do assunto, sem se quer saber o
verdadeiro nome da doença, no caso a febre amarela, e sem dar qualquer solução ao flagelo, o
Imperador simplesmente profere a Divina misericórdia. Nesta ocasião, ano de 1850, o
Imperador ainda teria 22 anos pela frente antes de ler um artigo de Louis Pasteur, e 8 anos
mais para começar a trocar cartas com o médico129, que lhe confere grande conhecimento no
assunto. Reflexo disto se dá na última ocasião em que o Imperador discursa diante o Senado
sobre uma epidemia:
A epidemia do cholera-morbus, que infelizmente se manifestou em alguns Estados Sul-Americanos, invadiu a cidade de Corumbá, donde estendeu-se a outros pontos da província de Matto-Grosso com pouca intensidade e duração. As medidas tomadas pelo Governo para prevenir a invasão do flagelo, por via marítima e pela fronteira da província de S. Pedro do Rio Grande do Sul, têm produzido o desejado efeito, O estado sanitário na capital do Império e nas províncias continua a ser lisonjeiro. Ser-vos-ão presentes os estudos, que decretastes para saneamento desta cidade, afim de que possais resolver, como convém, sobre tão importante assumpto.130
Nesta ocasião, o Imperador define o nome científico da doença, “cholera-
morbus”, mostra conhecimento do modo com que a epidemia se contrai, na ocasião referindo
ao estado sanitário da capital do Império e, com aparente controle do Estado ante a situação,
discursa a favor de medidas efetivas para o fim da epidemia, mostrando assim, grande
controle e conhecimento da doença.
Analisando as cartas entre Dom Pedro II e Louis Pasteur, é possível ver conselho
por parte do sábio francês para criação de um centro de imunidade da raiva no Brasil,
explicando como isto estava sendo feito na França e sugerindo o mesmo para o Imperador, em
carta de 2 de março 1882, Louis Pasteur denota ao Imperador brasileiro que ele havia
apresentado a Academia de Ciência um comunicado com resultados favoráveis a aplicação de
um método de profilaxia de raiva, começou, então, a planejar a criação de um estabelecimento
de produção de vacina antirrábica em Paris, notando que este poderia abastecer a Europa e
América do Norte, mas seria necessário de um estabelecimento similar na América do Sul.
128 SENADO, 1889, p. 463.129 G. RAEDERS, 1944, p. 63.130 SENADO, 1889, p. 847-848.
Já as cartas de 14 de abril de 1888 e 28 de novembro de 1888, mostrando o
resultado obtido de tal sugestão, em que, segundo Georges Raeders, “Pasteur exprimira
satisfação ao saber por intermédio do próprio Imperador que o Instituto Antirrábico do Rio se
achava em funcionamento e que oito pessoas tinham sido vacinadas.”131
Na carta de Dom Pedro II, o Imperador respondia com satisfação sobre o
estabelecimento, com 12 fotografias do Instituto e dados estatísticos apresentados a Academia
de Ciência.132 Mostrando, assim, que o direito intermédio do Imperador agiu, após sugestão de
Pasteur, para incentivar o Estado a construir tal estabelecimento.
Mesmo depois da morte do Imperador, sua influência e relacionamento com
Pasteur continuava a dar frutos para a comunidade científica brasileira. Georges Raeders
conta que, em 1900, 10 jovens médicos brasileiros chegavam ao Instituto Pasteur em Paris,
porém, muito tarde para inscrição naquele ano letivo, que já se encontrava preenchido. Porém
o líder entre os jovens pediu uma entrevista com o presidente do estabelecimento, dr. Roux. E
Ao chegar no escritório do presidente, este se encontrava ao lado de um busto do Imperador
Dom Pedro II, e explicou ao jovem que o Imperador brasileiro foi o primeiro investidor do
Instituto, com 100.000 francos, necessários para a fundação do centro, e que ele sempre seria
grato pelo Imperador, portanto, naquele ano a turma de medicina do Instituto teve 110 alunos,
fazendo uma exceção para os 10 brasileiros, e não somente, o líder entre os jovens era o
doutor Afrânio Peixoto, futuro influente médico, político e membro da Academia Brasileira
de Letras do Brasil,133 mostrando assim, os frutos colhidos pelo Brasil dos interesses
acadêmicos do imperador, mesmo anos após sua morte.
4.2 PENA DE MORTE E ESCRAVIDÃO
As influências de Victor Hugo podem ser vistas mais indiretamente, porém não
menos importante, na opinião já formada de Dom Pedro II. Como o autor francês já escrevia
livros aclamados internacionalmente desde sua adolescência, não é possível notar uma
mudança de discursos após o contato entre ambos, mas sim um alinhamento de ideias, como
visto em discurso de Dom Pedro II em 1871, que este diz “o governo brasileiro considerará
objeto da primeira importância a realização daquilo que o espírito do Cristianismo há muito
131 G. RAEDERS, 1944, P. 74.132 G. RAEDERS, 1944, P. 74.133 G. RAEDERS, 1944, P. 75-77.
reclama do mundo civilizado”134 referindo-se ao abolicionismo como uma necessidade ética
do “espírito do Cristianismo”.
Outra forma de influenciar a visão das elites brasileiras da época de Victor Hugo
se dá nas interações com políticos da época, ocasiões como a vista no jornal Libertador, de
1884, em que quando Ceará e Amazonas declararam lei para libertar seus escravos, Victor
Hugo, a pedido de políticos locais, que pediam uma crítica ao Imperador, este declarou-se
favorável ao movimento, dizendo: “Eis aí uma grande nova: A escravidão é o homem
substituído no homem pelo animal. [...] Daí horríveis consequências.” Porém, a pedido dos
políticos brasileiros que clamavam a Victor Hugo para que criticasse a atitude privativa de
Dom Pedro II sobre assuntos políticos e econômicos de tal natureza, Victor Hugo diz: “O
Brasil tem um Imperador; este Imperador é mais que um Imperador, é um homem. Continue.
Nós o felicitamos e o horamos.” Tal comunicação pode ser vista na figura 4:
Figura 4 – Jornal Libertador – 1884
Fonte: Libertador, 1884.135
134 L. SCHWARCZ, 2016, p. 481-482.135 “Uma província do Brasil acaba de declarar abolida a escravidão. Eis aí uma grande nova: A escravidão é o homem substituído no homem pelo animal; o que pode ficar de inteligência humana nessa vida animal de homem pertence ao senhor, segundo sua vontade e seu capricho. Daí horríveis consequências. O Brasil aboliu a escravidão com um golpe decisivo. O Brasil tem um Imperador; este Imperador é mais que um Imperador, é um homem. Continue. Nós o felicitamos e o horamos. Antes do fim do século a escravidão terá desaparecido da terra. A liberdade é a lei humano. Constatamos com uma palavra a situação do progresso; o barbarismo recua; a
Portanto, é possível ver que Victor Hugo não somente influência nos políticos
brasileiros à visão libertadora, mas também honra o Imperador, contrariando as vontades dos
Republicanos, que esperavam duras críticas a Dom Pedro II, tirando, assim, espaço para
movimento político que venha a denegrir sua imagem.
Outro momento de interação política, em que o Imperador em si não está presente,
porém a influência de Victor Hugo é reconhecida, pode ser visto nos Anais do Senado, no ano
de 1879, onde o senador Silveira de Motta, defensor da pena de morte, mostra sua insatisfação
com o cenário criado pelo Imperador, que comutava toda sentença de pena de morte proferida
pela justiça da época, fazendo o Senado discutir sobre a necessidade de criação de mais
cárceres permanentes.136
Mesmo retirando-se o debate ético sobre a Pena de Morte, pode se ver, nesta
situação, quando o Senador busca argumentos para criticar a posição, progressista para a
época, do Imperador, este não se contém em reconhecer que esta é, em grande parte,
influenciada pela interação cultural do Monarca com o pensador francês, ao dizer: “Como não
hei de dizer que é o sistema do poder moderador, que é a influência de Victor Hugo, que tem
dado lugar a comutação em todos os outros casos de pena última?”137
Este reconhecimento também é visto em artigos acadêmicos contemporâneos, que
reforçam a ideia da influência de Victor Hugo na construção da opinião política de Dom
Pedro, doutor André Santos escreve, em seu artigo, “A Lei da Morte”:
D. Pedro II era avesso à pena de morte, e sobre ela muito escreveu em seus diários. Tal assunto foi motivo, inclusive, de encontro com o escritor Victor Hugo. Como não podia ser veementemente contra as leis de seu país, pois era um soberano constitucional, fez grande uso das prerrogativas impostas sobre si pelo Poder Moderador.138
civilização avança.”136 O SR. SILVEIRA DA MOTTA [...] Senhores, a prisão celular, segundo os criminalistas que têm estudado e observado seus efeitos, é uma morte lenta; produz, ou a alienação mental ou o suicídio, por mais que se estendam os meios de evitá-lo; portanto é uma pena cruel, mais cruel do que a morte na Guilhotina. Declaro que me retiro da tribuna mais triste do que entrei nela, porque o nobre presidente do conselho não me deu, nem ao menos, as duas únicas esperanças com que eu contava para tranquilizar os nossos fazendeiros e afastá-los do exercício da justiça do povo. O nobre presidente do conselho continua a insistir, justificando o mau sistema da comutação, atribuindo-a a falta de provas. A outra Idea, que o nobre presidente do conselho oferece, é a da prisão celular, que não serve absolutamente, que não pode exercer ação alguma sobre a imaginação daqueles em que ela deve influir; e, portanto, tenho razão. Como não tem sido por sistema, quando, salvo um ou outro caso raríssimo, não se tem dado uma só execução? Deu-se ultimamente um caso de execução em Campos por certas circunstancias, por ter sido crime estrondoso. Mas afora este, como não hei de dizer que é sistema do poder moderador, que é a influência de Victor Hugo, que tem dado lugar a comutação em todos os outros casos de pena última? 137 SENADO, 1879.138 A. SANTOS, 2010, p. 6.
Demonstrando, nestas ocasiões, como Dom Pedro II poderia utilizar de seu poder
Moderador para exercer sua vontade “Hugoana” progressista, mesmo quando o sistema
judiciário e penal insistia em manter leis contrárias à sua vontade.
Com isto, nota-se nos reflexos das correspondências entre Dom Pedro II e os
sábios franceses, em especial entre Dom Pedro II e Louis Pasteur, através de análise das
“Falas do Trono”, um grande avanço do conhecimento de Dom Pedro II na forma como este
retratava as grandes doenças da época.139 Grande influência de Louis Pasteur é notável,
também na criação do Instituto Antirrábico do Rio, além do intercâmbio de cientistas
brasileiros que estudaram sob Louis Pasteur, e posteriormente contribuíram para o avanço
cientifico da saúde brasileira.140 Por parte de Victor Hugo, com sua carta ao jornal Libertador,
de 1884, ao tratar da libertação de escravos no Ceará e Amazonas, podemos ver o respeito que
este demonstra publicamente pelo Imperador brasileiro,141 além de sua influência reconhecida
no Senado na forma como o Imperador tratava assuntos como a pena de morte.142
139 SENADO, 1889, p. 463, 847-848.140 G. RAEDERS, 1944, p. 74-77.141 LIBERTADOR, 1884, p. 1.142 SENADO, 1879.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil desde o Império passou por 7 reformas constitucionais, em pouco mais
de um século de República, sendo estas em 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1969 e 1988. A
instabilidade política e econômica não é nenhuma novidade para uma nação que vivenciou
uma recente Ditadura Militar, historiadores nacionais que passaram pelos anos 80 das
inflações, dos planos monetários, dos protestos como os Caras Pintadas e da crise
constitucional que gerou a formação da constituição de 1988 não se surpreendem com o
retorno a inquietação e incerteza no cenário político, social e econômico do país.
Porém, nascido em 1988, o autor deste trabalho até o presente só detinha
experiência com tais temas em livros de história. Fazendo 18 anos no ano 2006, seu
envolvimento de fato em debates políticos se deu com a eleição democrática que reelegeu
Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República. Nesta ocasião, participando de
discussões políticas com familiares e amigos sobre o assunto, assistindo debates dos
pensadores da época, lendo propostas e matérias de opinião em periódicos, foi neste ano que
realmente começou o envolvimento político deste.
Muitos são os analistas políticos que frisam o partidarismo extremante dos líderes
brasileiros de hoje, a rigidez de suas políticas e seus orgulhosos discursos em que combatem o
dito “inimigo”, mas para tanto esquecem que tais “inimigos” são somente outros políticos
brasileiros, sem os quais a colaboração das partes ficará cada vez mais inviável a
governabilidade da nação.
Neste tema se procura por um entendimento da necessidade de Estadistas para o
país e busca-se na história do país grandes exemplos destes, são muitos estes na história de
nossa jovem nação, mas poucos se destacam tanto quando Dom Pedro II.
Conhecido como um sábio escolar, o Imperador liderava muitas vezes de forma
conciliatória aos partidos, tentando mantê-los coesos e focados, por mais que discordassem
em ideologia partidária, em prol da ordem e do progresso da Nação. É para entendimento
desta proeza que este estudo se focou no período final do Segundo Reinado, quando Dom
Pedro II mais exerceu sua influência política no Estado, como foi visto anteriormente, muitas
vezes o Imperador se mantinha aquém dos afazeres do Reino, preferindo manter-se ocupado
com suas buscas culturais, mas nestas utilizando de sua diplomacia pessoal para trazer
benefícios ao Império como um todo.
Ao tratar de uma monarquia, em teoria, é de se esperar inquietação do homem
comum, com perda de direitos civis e censura de ideias para coibir o pensamento iluminista e
a vontade democrata de liberdade, tal período deveria ser um de absolutismo, despotismo e
tirania, porém neste período, com grande ênfase nas 2 últimas décadas, o país vê grandes
ganhos de liberdades, com a constituição de 25 de março de 1821, a extinção do tráfico de
escravos em 1850, o Ventre-Livre em 1871 e, em 13 de maio de 1888, a Lei Áurea abolindo
definitivamente vil prática, além da insistência do monarca em deter a Pena Capital, através
do poder Moderador. Não há como negar que os ideais iluministas e republicanos franceses
afloraram no Brasil Império.
Com o objetivo de debater sobre o panorama político brasileiro do século 19 e a
personalidade do Imperador Dom Pedro II, este trabalho mostrou o cenário político brasileiro,
explicando o funcionamento do governo brasileiro, fatores que influenciaram a política
externa do século e a vida de Dom Pedro II, focando em seus interesses políticos e
acadêmicos.
Ao demonstrar e debater documentos que demonstrem o intercâmbio de ideias
entre Dom Pedro II e os pensadores franceses Victor Hugo e Louis Pasteur, além de buscar
como isto influenciou o Imperador, foi encontrado nas cartas de Louis Pasteur e Dom Pedro II
evidencias que mostram o interesse crescente do Imperador na medicina nas décadas finais de
sua vida, além de grande influência deste para fomentar os avanços científicos da medicina no
Brasil. Com o diário de Victor Hugo, além de discursos de políticos da época e do próprio
Dom Pedro II, mostra-se a visão progressista do Imperador, referente a pena de morte e
escravidão, reconhecidamente influenciada por Victor Hugo.
Na opinião do autor, neste governo ao estilo de déspota esclarecido às modas
brasileiras, a influência iluminista e ganhos cíveis se atribui em grande parte pela importação
no século 19 da cultura francesa por parte das elites brasileiras e em especial do Imperador
Dom Pedro II, moldando, assim, importantes setores da sociedade brasileira do século 19. É
da influência destes pensadores na alta sociedade brasileira e das consequentes comunicações
entre as partes que este estudo buscou demonstrar a influência que os pensadores franceses
tiveram no pensamento do Imperador brasileiro, explorando no entendimento deste esclarecer
seus reflexos nas políticas públicas e na sociedade brasileira do Segundo Reinado.
Dom Pedro II mostrou-se, na análise de suas correspondências, um Chefe de
Estado em grande parte despido de arrogância intelectual. Nas Falas do Trono é visto
exemplos de que, quando este aprendia informações novas, há uma notável mudança de
tratamento que este dá ao assunto. Na vida pessoal, este vivia mais para o público que para o
privado, com experiências de vida pessoal que o levavam a pensar no público, buscando o
conhecimento e sempre abrindo portas para jovens brasileiros que trazem soluções a
problemas vivido pelo Brasil da época.
Porém o tema tratado neste trabalho ainda pode trazer futuros estudos, quando
comparado com a abundância de material existente a ser analisado sobre a diplomacia pessoal
do Imperador. No livro de Georges Raeders “Pedro II e os sábios franceses” é possível
analisar a interação de Dom Pedro II com várias outras figuras influentes de sua época, como
Arthur de Gobineau, Ernest Renan, Lamartine, George Sand, entre outros. Nos documentos
pessoais do Imperador, se encontram interações deste com vários outros pensadores, como em
sua viagem aos Estados Unidos da América, em que este tem contato com Graham Bell e
Thomas Edison, entre outros grandes cientistas americanos, na feira da Filadélfia de 1876. A
busca pelo entendimento da diplomacia pessoal de Dom Pedro II, como visto neste trabalho,
se concretizou em trazer grandes benefícios para Brasil e ainda pode ser uma área com
grandes oportunidades para futuros estudos.
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ANEXOS
ANEXO A – Cartas entre Pasteur e D. Pedro II
143
143Tradução do Autor:“D. Pedro II Para PasteurRio, 11 de setembro de 1880.Senhor,Você conhece Dr. Fort, professor livre da Escola de Paris melhor do que eu, mas ele me pediu uma carta de introdução para que você converse com ele, e eu a escrevo contando apenas com a maneira como você me recebeu em seu estudo. O Dr. Fort espera voltar ao Rio no próximo ano e ele quer estudar a febre amarela com a sua metodologia que o levou a tantas descobertas tão úteis à humanidade. Acabei de ler novamente a sua carta de 9 de agosto, na Academia de Ciências e por favor fale-me de sua pesquisa sobre infecções e teoria dos fermentos, se lhe for disponível. Eu só reivindico meu amor pela ciência e as boas relações que tive com você em Paris. O curso da anatomia do sistema nervoso feito pelo Dr. Fort me interessou muito. Seu talento e sua longa prática fazem tudo entender com a maior facilidade. Por favor, acredite na sinceridade dos seus sentimentos muito carinhosos, D. Pedro Alcântara.”
144
144 Tradução do Autor:“Pasteur para D. Pedro II.Paris, 15 de novembro de 1880.Senhor,Estou muito honrado de receber a carta de sua majestade, recebi o Dr. Fort, que eu ansiosamente dei direções que estavam ao meu alcance para estudar a sua proposta sobre a febre amarela.Se eu fosse mais jovem e mais válido, eu iria, senhor, pedir hospitalidade por um ano ou dois na sua linda nação e eu tentaria o estudo científico dessa terrível doença procurando por seu micróbio, se é que existe um, o que é muito provável. Estes são, antes de qualquer outro cuidado, as causas a serem descobertas. A profilaxia vem em seguida com mais frequência. Veja o que acontece com o carbúnculo. Agora que sua etiologia é conhecida, o que é mais simples que a aplicação do soro profilático?Se os produtores interessados o querem, em 10 ou 15 anos o mal será apenas uma memória, uma curiosidade de laboratório. Nós vamos pegar os germes em uma garrafa de cultura.Gostaria de poder enviar à vossa majestade as minhas publicações destes últimos anos e destes últimos meses, desde que me dediquei ao conhecimento das causas das doenças transmissíveis; infelizmente, não os separei em documentos. Você os encontrará nos relatórios da Academia de Ciências, que contêm todos eles.A Academia, tendo a honra de contar Sua Majestade entre seus membros, deve dirigir-se a todos as suas publicações. Mais tarde, quando reunir o conjunto de estudos, o que espero fazer, o que eu teria feito se soubesse de vosso interesse. Para ir sem ter que me debruçar sobre as coisas adquiridas, vou apressar-vos a homenagear a primeira cópia da obra.Majestade permitam-me, senhor, para enviar a você a mais recente publicação de Claude Bernard sobre fermentação, etc. Você vai encontrar o eco de um forte interesse de sua Majestade durante seus estudos em Paris e críticas de tentativa de não menos do que seus antecessores de a teoria da geração espontânea.Eu sou, com o maior respeito, senhor, da vossa majestade o mais humilde e mais dedicado servo.L. PASTEUR (do Instituto).”
145
145 Tradução e interpretação de Georges Raeders:“D. Pedro não desanimava de atrair Pasteur ao Brasil e em 14 de outubro de 1884 lhe escrevia: “O dr. Pereira dos Santos, portador de uma das minhas cartas, e que trabalhou no vosso laboratório, acaba de fazer a instalação de um laboratório na Escola de Medicina do Rio para o estudo de micróbios. É de grande interesse para o meu país, que poderá dever-vos a vida de elevado número dos seus habitantes, se vierdes ao Rio dar a vossa opinião sobre estudos feitos aqui sobre a febre amarela.Aqui encontrareis culturas feitas com o maior cuidado para o exame do assunto. Ainda que não venhamos a dever-vos a descoberta da vacina contra essa moléstia, vossa visita constituiria motivo de grande influência para o desenvolvimento cientifico no Brasil. A estime que me inspirais já é assaz conhecida e sabeis qual o meu interesse pela ciência. Será grande jubilo acolher-vos na medida de vosso merecimento.”
146
146 Tradução e interpretação de Georges Raeders:“A escolhe entre a morte iminente e um experimento que consistiria em inoculação preventiva da raiva para tornar a constituição de um indivíduo refrataria à mesma. A vida do condenado seria poupada em caso de sucesso, de que estou persuadido.”
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147 Tradução e interpretação de Georges Raeders:“Como talvez seja de vosso conhecimento, no Brasil a pena de morte é suavizada pelo soberano. Se a vacina contra a raiva não é de efeito incontestável, que iria preferir a morte duvidosa a outra quase irrealizável? Ainda em caso contrário, como consentir num suicídio possível ou antes provável?
ANEXO B – Diário de Victor Hugo – 22 de maio de 1877
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Fonte: Pedro II e os Sábios Franceses (1944, p. 38).
148 Tradução: “22 de maio, 9h00. Visita do Imperador do Brasil, longa conversa, muito nobre espírito, ele viu em uma mesa “l’Art d’être grand-père”, eu ofereci a ele, com dedicatória e ele me disse: “O que você vai escrever?” Eu disse: “Dois nomes, o seu e o meu.” Ele disse para mim: “É o que eu ia pedir.” Então escrevi: “A Dom Pedro de Alcântara, Victor Hugo” Ele me disse: “E a data?” Então acrescentei, 22 de maio de 1871.” Ele pediu por um desenho, então lhe fiz um do “château de Vianden.” Dei a ele e ele me disse: “A que horas você janta?” Eu respondi: Às oito horas.” Ele disse: “Eu virei um dia para levar você para jantar.” Eu respondi: “O dia que você quiser, será bem-vindo.” Ele encheu Georges e Jeanne de carícias. Ele me disse ao entrar: “Tranquilize-me, sou um pouco tímido.” Falando de reis e imperadores, ele diz: “Meus colegas. Um momento.” Ele disse: “Meus direitos...” Ele se recuperou: “Não tenho direitos, só tenho poder ao acaso. Eu tenho o exemplo para sempre. Progresso e Liberdade.” Quando Jeanne entrou, ele me disse: “Tenho uma ambição. Por favor, me apresente a senhorita Jeanne.” Eu disse à Jeanne: “Jeanne, eu apresento a você o Imperador do Brasil.” Jeanne limitou-se a dizer em voz baixa: “Ele não tem terno.” O imperador lhe disse: "Me dê um beijo, senhorita.” Ela avançou sua bochecha. Ele riu: “Mas, Jeanne, jogue seus braços em volta do meu pescoço.” Ela o abraçou em seus braços. Pediu-me uma fotografia e a dele prometeu a mim. Ele me deixou às onze horas. Ele falou comigo de uma maneira tão grave e inteligente que, ao nos separar, eu disse a ele: “Senhor, você é um grande cidadão.” Mais um detalhe. Ao apresentar Georges para ele, eu disse a ele: "Senhor, eu apresento meu neto a vossa majestade.” Ele disse Georges: “Meu filho, há apenas uma majestade, é Victor Hugo.”23 de maio. Ponho minha foto (onde está Georges e Jeanne) em um envelope com a inscrição: “Para aquele cujo antepassado é Marcus Aurélio”, e enviei para o Grand Hotel, onde hospeda-se Dom Pedro. e eu disse: "Dê isso para o imperador do Brasil.”29 de maio. Ao caminho de casa, encontrei o Imperador do Brasil que veio para jantar comigo. Ele estava acompanhado pelo Visconde do Bom Retiro, ele me apresentou: “Eu lhe trazer meu amigo senhor Bom Retiro é um homem muito distinto.” O Imperador me deu a sua fotografia assinada Pedro de Alcântara datada 22 de Maio de 1877. Nós e os nossos convidados fomos a Vacquerie terça-feira. Para a sobremesa, brindava ao meu ilustre anfitrião, brindava a mim mesmo, conversamos até a meia-noite, à meia-noite em que terminamos e retiramo-nos à uma da manhã.”
Fonte: Pedro II e os Sábios Franceses (1944, p. 39).
Fonte: Pedro II e os Sábios Franceses (1944, p. 40).