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ANJOS DA GUARDA: A CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA E POLÍCIA COMUNITÁRIA. ANÁLISE DA UNIDADE PARANÁ SEGURO-UPS.TRANSCRIPT
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAN
SETOR DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - SCHLA
DEPARTAMENTO DE CINCIAS SOCIAIS DECISO
EMANOELE DE DEUS SAVAGIN
ANJOS DA GUARDA: A CRIMINALIZAO DA POBREZA E POLCIA
COMUNITRIA. ANLISE DA UNIDADE PARAN SEGURO-UPS.
CURITIBA
2014
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EMANOELE DE DEUS SAVAGIN
ANJOS DA GUARDA: A CRIMINALIZAO DA POBREZA E POLCIA
COMUNITRIA. ANLISE DA UNIDADE PARAN SEGURO-UPS.
Trabalho de Concluso de Curso apresentado como
requisito parcial obteno do grau de Bacharel em
Cincias Sociais pela Universidade Federal do Paran.
Orientador: Prof. Dr. Pedro Rodolfo Bod de Moraes
CURITIBA
2014
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EMANOELE DE DEUS SAVAGIN
ANJOS DA GUARDA: A CRIMINALIZAO DA POBREZA E POLCIA
COMUNITRIA. ANLISE DA UNIDADE PARAN SEGURO-UPS.
Trabalho de concluso de curso aprovado como requisito parcial para obteno do grau de
Bacharel no curso de Graduao de Cincias Sociais, Setor de Cincias Humanas, Letras e
Artes da Universidade Federal do Paran, pela seguinte Banca Examinadora:
Presidente de Banca: Prof. Dr. Paulo Roberto Neves Costa
Orientador: Prof. Dr. Pedro Rodolfo Bod de Moraes
Departamento de Cincias Sociais, UFPR.
Membro: Prof. Me. Marcelo Bordin
Membro:
Profa. Ma. Leticia Figueira Moutinho Kulaitis
Curitiba, 05 de dezembro de 2014.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo inicialmente o meu orientador Pedro R. Bod de Moraes que desde o incio
do curso me influenciou no meu segmento de pesquisa e na construo deste trabalho.
Expresso a minha gratido por ter me acolhido to bem no grupo CESPDH, sem dvidas este
crculo foi fundamental para o meu desenvolvimento e do meu trabalho.
Tambm quero estimar o prof.o Dinaldo de Almendra, que me auxiliou em demasia na
construo do trabalho e suas indicaes de leitura foram to proveitosas, que inclusive,
muitas delas entraram na minha lista de obras favoritas.
Quero agradecer a todos os membros do grupo CESPDH, que de forma direta e
indireta me inspiraram nas direes dos estudos, me auxiliaram com relao s fontes e
materiais tericos, em suma, houve um compartilhamento de informaes muito frutfero.
Para alm do contexto acadmico, agradeo meus pais, Rose e Eduilio, que
independentemente das minhas escolhas sempre me apoiaram e se orgulham da minha
trajetria, vocs so a minha luz, minha base e o modelo que um dia eu quero alcanar de
sabedoria.
Agradeo as minhas amigas que tornaram o curso muito mais feliz, em especial a
Anne C. Pellizarro, Jssica de Carvalho, Anni C. Hirami, Anglica de Carvalho e Aline
Souto, tambm ao amigo Eduardo da Silva, obrigada pelas experincias, risadas e tudo mais,
vocs fazem parte de um pedao muito importante da minha vida.
Tambm agradeo e estimo meu melhor amigo, meu amor e meu futuro marido
Marcus Zerma por ter me apoiado incondicionalmente ao longo desta jornada e de muitas
outras, amo voc.
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RESUMO
As polticas de segurana pblica operam com um conjunto de elementos de interveno na
sociedade e construda e ao mesmo tempo construtora de um tipo de controle social. No
bojo deste tipo de interveno h uma srie de contradies acerca de como pensamos na
insegurana a partir da cultura do medo, ou da denominao de pblica enquanto sendo para todos em detrimento do privado. Desta forma, este trabalho tem o intuito geral de problematizar este tipo de poltica, mais especificamente a Unidade Paran Seguro (UPS), que
consiste em uma interveno policial direta e ostensiva em territrios que por alguma
justificativa (mapas do crime, fatores econmicos e geogrficos) necessitem desta interveno. A unidade abordada neste trabalho a pioneira no Paran, situada no bairro
Uberaba em Curitiba. A hiptese da pesquisa consiste em que h uma naturalizao da
criminalizao da pobreza explcita atuando neste tipo de interveno policial. Atravs do
jornal Tribuna do Paran e da Ordem de Operao da Polcia Militar do Paran n 005/2012
que versa sobre a implantao da UPS abarcarei de que forma a associao entre crime e
pobreza configurada e incluo um elemento novo que surgiu ao longo da pesquisa, a concepo de polcia da proximidade atuando nesta interveno. Assim, esses dois elementos
contraditrios se mesclam no trabalho: a criminalizao da pobreza e a polcia comunitria
pelo vis do controle social perverso.
Palavras-chave: criminalizao da pobreza, poltica de segurana pblica, controle social
perverso, Unidade Paran Seguro.
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1 QUANTIFICAO DOS QUADROS APREENDIDOS NO JORNAL
TRIBUNA DO PARAN ACERCA DA UPS 54
TABELA 2 RELAO DOS JORNAIS TRIBUNA DO PARAN COLETADOS NO
PERODO DA IMPLANTAO DA UPS 54
TABELA 3 SISTEMATIZAO DOS RELATOS NO JORNAL TRIBUNA DO
PARAN CONFORME AS CATEGORIAS PROPOSTAS 56
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LISTA DE ABREVIATURAS
PM PR Polcia Militar do Paran
SENASP Secretaria Nacional de Segurana Pblica
SESP PR Secretaria de Estado de Segurana Pblica do Paran
SUSP Sistema nico de Segurana Pblica
TP Tribuna do Paran
UPP Unidade de Polcia Pacificadora
UPS Unidade Paran Seguro
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SUMRIO
INTRODUO.................................................................................................................09
1. CONTROLE SOCIAL E POLTICAS DE SEGURANA PBLICA......................14
1.1.Controle social.......................................................................................................14
1.2.Polticas pblicas: conceituaes introdutrias.....................................................15
1.3.Polticas de segurana pblica...............................................................................18
2. UNIDADE PARAN SEGURO UPS......................................................................29
2.1. UPS do Uberaba....................................................................................................30
2.2. Uberaba.................................................................................................................32
3. ANLISE DE ENQUADRAMENTO DO JORNAL TRIBUNA DO PARAN E
UM EXERCCIO RELACIONAL COM A ORDEM DE OPERAO DA POLCIA
MILITAR N 005/2014................................................................................................36
3.1. Contextualizao da fonte e anlise dos dados ....................................................41
3.1.1. Entrevistas..................................................................................................55
3.2. Ordem de Operao da Polcia Militar do Paran n 005/2012............................57
3.3. Anjos da Guarda: A criminalizao da pobreza ocultada pela retrica do
policiamento comunitrio......................................................................................60
4. CONSIDERAES FINAIS.......................................................................................65
REFERNCIAS ...........................................................................................................68
ANEXOS......................................................................................................................73
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INTRODUO
O presente trabalho tem como objetivo geral problematizar a poltica de segurana
pblica do governo do estado do Paran em conjunto com a prefeitura de Curitiba
denominada de Unidade Paran Seguro (UPS1) que inspirada nas Unidades de Polcia
Pacificadora (UPP) do Rio de Janeiro. A UPS foi implantada no dia 01 de maro de 2012 no
bairro Uberaba contando nos sete primeiros dias de operao com forte aparato policial civil e
militar para preparar o bairro para uma unidade fixa.
Acerca da trajetria da pesquisa h pontos que preciso figurar que antecederam a
monografia propriamente dita. A UPS tem mais de dois anos de existncia, ou seja, ela ainda
est em atuao. Porm, desde a sua implantao j me interessei pela sua execuo. Tal fato
devido a minha participao no grupo Centro de Estudos em Segurana Pblica e Direitos
Humanos da UFPR desde 2012, mais especificamente em um projeto interno sobre
Discursos e Prticas da Segregao Social2. Assim, neste contexto de experincias no curso o
governador Carlos Alberto Richa anunciou a sua nova medida para conter as adversidades da
segurana pblica no Paran a chamada Unidade Paran Seguro. Desta forma, desde o incio
da operao me interesso pelo desenrolar da mesma e coleto material de variados veculos de
comunicao. Porm, para este trabalho fiz o recorte temporal do primeiro ms, por ter este
carter de novidade e pelo forte aparato policial e miditico que essas intervenes
mobilizam nos primeiros dias de operao, mesmo tendo um discurso de preveno no seu
bojo. Quanto a fonte escolhida, ela se deu justamente pelo atrativo do jornal Tribuna do
Paran ter este lugar no imaginrio curitibano (e inclusive no meu) do espreme que sai
1 A UPS um dos elementos internos do Programa Paran Seguro que foi anunciado em agosto de 2011, que
consiste em um planejamento do governo do Estado do Paran em conjunto com a Secretaria de Estado da
Segurana Pblica, Secretaria de Estado da Famlia e Desenvolvimento Social (SEDS) e Secretaria de
Estado do Planejamento e Coordenao Geral (SEPL) utilizando verbas advindas do Estado, da Unio,
Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) e pelo Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), tendo como objetivo reduzir a criminalidade em Curitiba e regio metropolitana,
tambm no eixo Londrina a Maring e nas fronteiras do Estado promovendo o aumento do policiamento,
renovao do aparato utilizado pelos policiais, reformas e construo de novos batalhes, sedes do IML e
delegacias, criao ouvidorias, dentre outros. (PANAR, 2011) 2 No grupo adentramos em discusses e pesquisas de campo na Vila das Torres, na qual acompanhamos
reunies de uma das associaes de moradores e presenciamos os relatos acerca do cotidiano dos mesmos,
inclusive os que dizem respeito a intervenes policiais. Assim, ao longo desse contato fui delineando os
meus interesses e o primeiro foi acerca da Operao Alvo 1 que ocorreu nesta regio no ano de 2005 que
consistiu em uma interveno policial intensa e ostensiva de forma imediatista, assim, comecei a coletar
notcias acerca da interveno e conectar com as leituras da segregao espacial compartilhadas no grupo
de pesquisa CESPDH. A utilizao da mdia enquanto um objeto/fonte das cincias sociais sempre me
interessou, na medida em que penso que elas tm muitas coisas a nos dizer para alm do habitus da
profisso (porm, sem cair em uma perspectiva determinista, como manipulao, isso causa e efeito e carece de um debate complexo).
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sangue, assim, uma linguagem forte e voltada para aspectos ligados violncia (elementos
que inclusive foram desconstrudos no trabalho, pois no esperava a sutileza do material
jornalstico e nem a forte presena dos direitos proferidos). Em suma, apontei esses elementos
pelas seguintes questes que no sero abordadas neste trabalho, porm, penso no poder
ignorar: 1) a UPS est ativa, logo, atualmente o vis jornalstico ou o discurso dos operadores
do sistema podem ter encaminhado um rumo diferente deste que apontei no primeiro ms de
operao; 2) fiz um recorte acerca de representaes da realidade social atravs de fontes de
papel, porm, estou ciente que h posies dos atores envolvidos que so externalizadas por
outros meios, assim, o que poderia ser fruto de outra pesquisa, a perspectiva dos moradores de
regies que esto ao alcance da UPS, dos policiais envolvidos na operao, em suma, uma
perspectiva dos atores envolvidos; e 3) Quanto a instncia da mdia, ela tambm apresenta
segmentos diversos de pesquisa que dizem respeito a produo e recepo, o que tambm no
o caso deste trabalho, mas no nego a importncia desses elementos, porm, os
componentes que escolhi trabalhar dizem respeito ao texto e conecto com o contexto da
operao e a literatura sociolgica acerca das polticas de segurana pblica amarrando-os3.
No podemos considerar uma poltica pblica de forma dicotmica e monocausal, ou
seja, diretamente apont-la como boa versus m (MACHADO DA SILVA, 2010a). A
complexidade das intervenes diretas em assuntos pblicos so diversas, porm, quando uma
poltica social passa a ser questo de polcia ela est operando com mecanismos de controle
social perverso. (MACHADO DA SILVA, 2010a). A prpria operacionalizao prtica e
conceitual da forma como as polticas de segurana pblica foram conduzidas, aqui no caso
falarei da realidade brasileira de forma sinttica, nos remete a uma srie de paradoxos, como
os mecanismos de segurana sendo vistos pelo vis da ordem produzida pelas instituies
policiais. A insegurana produz e produtora de medo4. Quanto ao elemento de ser pblica,
tambm nos remete a outra contradio, pois, sabe-se que os mecanismos de segurana esto
3
No pretendo fazer uma crtica monoltica acerca da UPS, nem construir um deve ser da Unidade, pois este no o papel das cincias sociais. O que pretendo problematizar um tipo de abordagem acerca das polticas
de segurana pblica que associa crime a pobreza, e se constituindo materialmente no ato de colocar polticas
pblicas em um estatuto de interveno policial.
4 O medo no tem um nico segmento, ele pode atuar de forma a nos alertar. Este medo normal. Porm, h
medo perverso, ele no real e pode se tornar uma patologia. (GLASSNER, 2003). Desta forma, um dos
maiores alicerces do controle social perverso que ser abordado ao longo do trabalho o medo. A
fundamentao do medo exacerbado pode acabar ocultando uma srie de problemas sociais e interesses de
coorporaes econmicas e polticas, este medo sem objeto real acaba passando por uma perspectiva de tentar
concretiz-lo no sentido de achar a fonte dele no outro. (GLASSNER, 200) Dalumeau (1993, apud, MORAES, ALMENDRA, 2012) que desenvolveu um estudo sobre a histria do medo no Ocidente apontou
que a exacerbao do mesmo ao longo do processo histrico estava ligado a esta objetificao do outro, que
eram os: estrangeiros, supostos criminosos e bruxas.
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cada vez mais conectados a elementos privados5, inclusive essas polticas so desenvolvidas
em territrios pobres, logo, este pblico est limitado a um grupo. Desta forma, como as
polticas de segurana pblica so conduzidas h um tipo de controle social operando, que no
caso o perverso. Ele perverso porque forjado por um conjunto de elementos pautados no
medo do outro e na criminalizao da pobreza.
A hiptese inicial deste trabalho era de que a criminalizao da pobreza (COELHO,
2005) opera de forma explicita no Jornal Tribuna do Paran e que haveria um enquadramento
monoltico ligado violncia como inerente s Vilas que constariam no corpo da UPS neste
primeiro ms de implantao. Ao longo da pesquisa outros elementos foram apreendidos
modificando inclusive a hiptese inicial, essa criminalizao da pobreza est operando no
jornal, porm, de forma implcita, velada pelo discurso do chamado policiamento
comunitrio6. Com o surgimento de novos elementos foi necessrio incorporar mais uma
fonte pesquisa, alm dos trabalhos sobre intervenes policiais e o jornal popular, muitas
vezes adjetivado de sensacionalista (conceito que tambm ser problematizado, visto que o
seu isolamento nos leva a uma srie de problemas conceituais e usuais de desvalorizao dos
veculos de comunicao populares). Deste modo, tambm ser utilizado um documento
oficial da Polcia Militar do Paran, a Ordem de Operao n 005/20127 que versa sobre os
objetivos e formas de atuao da primeira UPS, situada no bairro Uberaba em Curitiba.
A partir deste pano de fundo esse trabalho foi dividido em trs partes. Sendo que na
primeira irei discorrer acerca de dois tipos de controle social, segundo a concepo terica
escolhida, o controle social normal que o produtor de ordem advindo da coeso social
(Durkheim, 1978) no excluindo o mbito conflitivo (Gurvitch, 1965) enquanto construtor de
ordem e um segundo tipo de controle que o perverso, este dotado de uma srie de
elementos forjados pautados no medo do outro, este outro o pobre detentor de uma srie de
5 Neste aspecto, apesar da denominao das esferas pblicas e privadas terem sido tradas por diversos autores das cincias sociais, utilizarei das colocaes de Bauman (2010) de que atualmente h uma sobreposio
arbitrria entre as esferas, colocando elementos privados, advindos da insegurana e da transitoriedade atual
em um patamar pblico. 6 Partindo desta mudana de paradigma na minha pesquisa que inicialmente encarei como um problema (no
sentido negativo) foi o que me ajudou a increment-la e ampli-la, assim, tive contato na prtica com as
colocaes de Bourdie (2010), Bateson (1986) e Becker (1999) de que atravs dos erros podemos construir uma boa pesquisa, que o trabalho no feito s de acertos. Foi neste pano de fundo que incorporei um documento oficial a minha fonte. O erro tambm me fez realizar uma abertura das categorias que inicialmente eram de criminalizao da pobreza pelo vis do policiamento, abri para a linguagem da cidade,
dos direitos e dos sentimentos, o que de fato acabei caindo novamente na criminalizao da pobreza, porm,
obtive maior confiabilidade na resposta da minha pergunta.
Foi da que surgiu esse novo problema para a minha pesquisa: via ramificada de abertura retrica para falar de
cidadania e direitos humanos e cada vez mais implcita a linguagem de criminalizao da pobreza. Essa linguagem est l, mesmo velada, est atuando, barrando uma perspectiva de controle social normal.
7 Este documento me foi cedido pelo Oficial da Polcia Militar do Paran, Mestre em Polticas Pblicas pela
Universidade Federal do Paran e docente titular na Academia Policial Militar do Guatup Diego Nogueira.
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estigmas que lhe imputam roteiros tpicos (COELHO, 2005) no plano material e simblico
(BOURDIEU, 2010). Essa concepo de como a sociedade mantm a ordem que
advinda dos elementos primeiros da sociologia fundamental para adentrarmos nas
concepes de polticas pblicas e polticas de segurana pblica, assim, no primeiro
abarcarei algumas concepo de polticas pblicas e de que forma elas podem ser produtoras
de bem-estar e ordem, partindo sinteticamente de que tanto o termo poltica quanto polticas
pblicas esto concatenadas com a interveno direta e o poder social. (DIAS, 2012). Na
sequncia farei uma reflexo acerca das polticas de segurana pblica no Brasil a partir da
Ditadura Militar, tendo como pilar trs tipos de modelos at os dias atuais: o da segurana
nacional (Ditadura Militar), o da segurana pblica (Constituio de 1988) e o da segurana
cidad (mescla-se com o modelo ps-carta de 1988 e a sua publicizao mais atuante emerge
no incio do ano 2000 at os dias atuais). Problematizarei esses trs tipos ideais e adentrarei a
partir de Machado da Silva (2005;2010b) de que forma a segurana pblica no Brasil se
constituiu enquanto o ordenamento do problema da violncia e de que forma uma srie de
elementos da esfera privada foram projetados na esfera pblica a partir de polticas
intervencionistas diretas, que nos afetam at hoje enquanto uma doxa8 da ideia de que o
territrio de pobreza questo de polcia.
A partir deste conjunto de elementos apresentados, na segunda seo deste trabalho
adentrarei nos aspectos gerais da UPS e das caractersticas do bairro que recebeu a primeira
Unidade, o bairro Uberaba, que um territrio extremamente heterogneo acerca de recursos
e classes sociais, sendo dividido no imaginrio social como havendo o Uberaba de Cima e o
de Baixo, ambos possuem fortes disparidades econmicas e a UPS foi instalada no lado do
Uberaba que possui ocupaes irregulares, falta de esgoto, deficincia na coleta de lixo, e
outros elementos que sero apontados no tpico acerca do bairro.
J na terceira seo desta pesquisa abarcarei os elementos da consolidao da hiptese,
assim, a partir de BECKER (2009) sustento que as minhas fontes de pesquisa so uma forma
altamente organizada de falar da sociedade, assim, os dois documentos nos apontam a forma
que vai alm dos aspectos do ofcio (jornalista e o policial) e adentramos em uma leitura de
mundo que externaliza de forma naturalizada a relao entre pobreza e crime e desta forma a
8 Segundo Bourdieu (2010) a doxa um ponto de vista que legitimado pelas estruturas de poder, ou seja, o
ngulo dos dominantes que externalizado e naturalizado no senso comum e nas redes simblicas. Este ponto
de vista universalizado. Assim, Berlatto (2011) aponta que a doxa da segurana pblica no Paran est
fundamentado naquilo que a classe mdia e alta quer ouvir quanto s intervenes do Estado.
Pensando em perspectiva semelhante levanto o trabalho de Almendra e Bod de Moraes (2012) acerca de uma
pedagogia poltica da segurana pblica, assim, h uma srie de formas de pautar a violncia que legitimam a
militarizao do cotidiano enquanto necessria a ordem social e a resoluo do problema da violncia urbana.
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necessidade de polticas pblicas policializadas em reas de pobreza enquanto uma
representao da realidade (BECKER, 2009). O Jornal Tribuna do Paran foi analisado de
forma qualitativa luz do mtodo de anlise de enquadramento, ou os chamados quadros da
experincia social (GOFFMAN, 2012). O recorte temporal de um ms de veiculao do
jornal, contando com panoramas do jornal, relatos de moradores e operadores do sistema.
Como o perodo de recorte no longo foi possvel dividir o jornal em tpicos e refletir
acerca de uma srie de preposio que esto no bojo dos direitos sociais, policializao,
segregao, dentre outros.
Quanto a Ordem de Operao da PM PR n 005/2012 tambm parti da construo de
quadros, utilizando a concepo de Goffman (2012) de que os quadros so recursos
interpretativos que externalizam posies/significaes, porm, por ser um documento
distinto de um jornal, os elementos de operao e apreenso foram outros. Entretanto, assim
como o jornal, o documento da PM confirmou a concepo de que a UPS est pautada no
policiamento comunitrio, ou seja, uma aproximao entre a polcia e o cidado de forma a
construir um mecanismo de confiana e mutualidade, somada a esta concepo temos a
exaltao contraditria de uma competncia tcnica da polcia baseada na guerra.
No ltimo subtpico intitulado Anjos da Guarda: A criminalizao da pobreza
ocultada pela retrica do policiamento comunitrio problematizarei a hiptese central
conectando os elementos apreendidos no jornal e na Ordem de Operao policial. Desta
forma, abarcarei os discursos de criminalizao da pobreza velada pela retrica da polcia da
proximidade. Assim, realizando as pressuposies finais acerca da causalidade entre crime e
pobreza que est presente na mdia, em execues de polticas pblicas e at mesmo em
trabalhos das cincias humanas. Essa causalidade que opera no cerne do imaginrio social
enquanto construtora de roteiros tpicos (COELHO, 2005), que apontam uma previsibilidade
de que reas de pobreza precisam de polcia mesmo quando os anseios so de bem-estar
social, tal previsibilidade sustentada pelo controle social perverso.
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1. CONTROLE SOCIAL E POLTICAS DE SEGURANA PBLICA
1.1.CONTROLE SOCIAL
Segundo a concepo terica adotada h dois tipos de controle social - estou trabalhando
com um tipo ideal9, segundo a concepo weberiana (2003). Atravs desse mecanismo
possvel fazer um recorte de aspectos sociais que na realidade podem atuar mutuamente - o
normal10
e o perverso11
. O primeiro opera com a produo de ordem, no no sentido de um
fundamento de dominao autoritria e nem como ausncia de conflito, e sim de mecanismos
e regras sociais que foram internalizadas ao longo do processo de socializao, advindos,
neste trabalho, da concepo durkheimiana (1978) este tipo de controle opera em uma
sociedade de solidariedade orgnica, na qual a moral do indivduo se estrutura atravs de
laos coletivos. Assim:
(...) indivduos que por terem interesses comuns se associam, no somente para
defenderem esses interesses, para se associarem, para no mais se sentirem perdidos
em meio a adversrios, para terem o prazer de comunga, de no fazerem se no um
com muitos, quer dizer, em definitivo, para levarem em conjunto uma mesma vida
moral. (DURKHEIM, 1978, p. 11).
Para Durkheim (1798) essa ordem moral advm da relao social externalizada nas
instituies e o tipo de solidariedade que opera na sociedade possuem mecanismos inerentes
forma de controle, ento:
9 De forma sinttica, podemos colocar que o tipo ideal um recorte de um modelo mais amplo que fazemos para
fins analticos. Na sociedade esses tipos podem se misturar. (WEBBER, 2003). 10
O conceito de controle social se popularizou nos entendimentos e estudos acadmicos atravs de Ross
(Gurvitch, 1965) ele partiu da indagao sobre o que mantm a ordem na sociedade apontando que um emaranhado de instituies que produzem controle, este socialmente construdo, so as regras que permitem
a vida em comum. Ross foi influenciado pelo pragmatismo americano, que para eles a ordem social advinda do controle social. Porm, a concepo de controle social foi tomando um delineamento nas cincias da sociedade que fosse para alm de uma viso de ordem assim, Gurvitch (1965) aponta que tomemos cuidado em pensar no controle social como manuteno da ordem em moldes conservadores, pois tiramos da
nossa viso o papel das mudanas, conflitos, revolues, etc,. tambm so ingredientes do controle). Outro
exemplo acerca do controle social no como sinnimo de ordem conservadora o de John Dewey que fez uma
anlise das atribuies da escola enquanto formadora moral dos indivduos, assim, apontou que todas as
sociedades elaboram regras que regulam a vida dos indivduos e da sociedade, essas regras no so contrrias a
uma iniciativa/autonomia individual e tem como corolrio um bem-estar da coletividade. (Berlato; Moraes,
2013). Esse apontamento dos pragmatistas fundamental para pensarmos que o controle social no ausncia
de conflito, assim, no esttico nos moldes da ordem conservadora. Desta forma, a ordem uma construo
social que internalizada pelos indivduos e pela sociedade, porm, passvel de reordenamentos fruto das
mudanas e novas necessidades de ordenamento. 11
Outro tipo de apropriao da questo do controle social nos remete a vias negativas, assim, em Foucault (1999;2008), ele produtor de disciplina, vigilncia e punio, negativo em todos os seus aspectos, ou o
termo reduzido manuteno da ordem que foi apropriado pela justia criminal, sendo a manuteno de uma
ordem social caso de polcia. (Berlato; Moraes, 2013)
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(...) na solidariedade mecnica teria o aspecto punitivo mais ressaltado que as
sociedades cuja solidariedade do tipo orgnica. Vale dizer: sob a solidariedade
mecnica teramos regras com sanes repressivas e o predomnio do direito penal, enquanto sob a solidariedade orgnica observaramos regras com sanes restitutivas e predomnio do direito cooperativo (civil, comercial, processual, administrativo e constitucional). (LUKES, apud, MORAES, 2003, p.58)
No controle normal houve uma internalizao das regras, a coero que existe neste
tipo de controle legtima, ou seja, as regras foram aceitas, porm, no de forma consciente,
porque um elemento advindo da relao. J no controle social perverso, ocorre o contrrio.
Este tipo de controle est fundamentado na desigualdade e na manuteno de privilgios, a
materializao do mal. Como aponta BERLATO (2008, p.8): Controle social perverso um
tipo especfico de controle social que, utilizando-se de critrios discriminatrios como
raa/etnia, classe, gnero, idade, indumentria e questes geo-espaciais, funciona atravs de
processos de criminalizao do Outro. No caso deste trabalho, esse outro o pobre,
morador de uma regio de que a chegada da polcia a nica via representativa de uma
suposta promessa de bem-estar social.
No controle perverso a manuteno da ordem caso de polcia e este tipo de
controle que ser abordado neste trabalho, pois polticas de segurana pblica, como a UPS h
o depsito de forte aparato policial, militarizando territrios que so fruto de uma tradio,
assim, esto arraigados na cultura e a sua desnaturalizao um dos objetivos deste trabalho.
Desta forma foi necessrio conceituar controle social, pois levanto a concepo de que h
o controle social normal, que produtor de bem estar e coeso isso seria um dos resultados de
polticas pblicas conectadas com as instituies, no sentido de serem produtoras de anseios
sociais materiais e tambm simblicos. Assim, a prxima seo deste trabalho ir abordar as
conceituaes de polticas pblicas e em um segundo momento adentrarei no problema da
segurana (MACHADO DA SILVA, 2005;2010b) enquanto produtora de polticas de
segurana pblica.
1.2.POLTICAS PBLICAS, CONCEITUAES INTRODUTRIAS.
As polticas pblicas so reputadas enquanto uma rea de conhecimento inserida na
Cincia Poltica, seus esquemas, autonomia e formas de ser foram tomando delineamentos
distintos ao longo do processo histrico e tambm de sua localizao espacial. Assim, a partir
do meio do sculo XX na Europa os estudos acerca delas tinham uma conexo com o papel do
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Estado. Nos Estados Unidos e no Brasil elas foram pensadas com destaque nas atividades de
interveno dos governos. (DIAS, 2012).
Secchi (2010) tambm aponta que no h uma definio una para poltica pblica,
assim, h segmentos mltiplos inseridos nela, h abordagens estatistas, como sendo a
mquina do Estado a nica responsvel por elas, abordagens multi que englobam o papel da
sociedade civil, de grupos e Ongs como construtora de polticas pblicas, h tambm aquelas
abordagens que afirmam que a omisso de execues tambm uma poltica pblica. Assim,
na viso deste autor h tipos de polticas pblicas e de fato h aquelas que so produzidas pelo
Estado e outras por grupos mltiplos, ou seja, a poltica de Estado no nica, ela um
subgrupo importante de produo de ao. Assim, So os contornos e definio de um
problema pblico que do poltica o adjetivo pblica. ( SECCHI, 2010, p. 4)
De forma sinttica as polticas pblicas representam um campo com caractersticas
interdisciplinares de reas de conhecimento e das cincias aplicadas. Porm, a forma como e
foi vista, inclusive quanto a uma perspectiva ligada ora ao governo, ora ao Estado merece uma
distino. Assim definindo os termos, a poltica corresponde a relaes de poder, - porm,
assim como em outros pases de lngua latina houve um problema na conceituao do termo
poltica no Brasil. Essa questo no operou em pases de lngua inglesa que conseguem
distinguir usando dois termos o politics e o policy. De forma sinttica o politics seria o poder
e o politicy a deciso de ao. (SECCHI, 2010: DIAS, 2012). O termo poltica pblica
(public policy) est vinculado a esse segundo sentido da palavra poltica (ao). Polticas
pblicas tratam do contedo concreto e do contedo simblico de decises polticas, e do
processo de construo e atuao dessas decises. (SECCHI, 2010, p. 1) - o Estado a
prpria mquina permanente, j o governo quem ocupa o Estado e possui o poder. Na
dcada de 1951, atravs de Truman, Lerner e Lasswell que as polticas pblicas foram
tomando forma de um campo disciplinar especfico. J no Brasil, foi no final da dcada de
1970 que os estudos acerca das polticas pblicas tomaram aspectos mais consolidados,
atravs de trabalhos que apontavam a construo histrica das atuaes do governo. (DIAS,
2012).
O termo pblico tambm precisa ser desmembrado, partindo da concepo de que o
pblico opera em oposio ao privado, assim, ele diz respeito ao comum que tambm se
mescla com a ideia de interveno governamental. Desta forma, a poltica pblica levanta que
h uma rea que no pode ser vista como privada e sim que est no seio das aes comuns,
dessarte, no pertence a ningum. (DIAS, 2012). Esta definio mltipla das polticas
pblicas est conectada a metas e planos, outras evocam a perspectiva das decises ligadas a
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17
autoridade, dentre muitas outras, porm, Dias (2012) levanta a ideia de tomarmos cuidado em
confundir o pblico das polticas pblicas com o coletivo, porque as elas so mandatrias e
impositivas (Rodrigues, 2010, p. 18, Apud, DIAS, 2012 p.13) Assim, esta imposio um
elemento coercitivo do Estado, desta forma, h uma legitimao social das prticas
operacionalizadas, mesmo que haja resistncia, acabam tomando formas embasadas em
sanes jurdicas (exemplo, impostos, sinais de trnsito, normas em geral). Assim, Dias e
Secchi apesar de explicitarem a ideia mltipla das polticas pblicas e a sua
interdisciplinaridade, vo contra a uma ideia de que para o segundo as aes criadas por
coeso de grupos sociais que vo alm do Estado, j Dias, vai pelo vis de uma coero do
Estado. Ambas essas perspectivas, apesar de contrrias, sero conectadas ao meu trabalho no
tpico polticas de segurana pblica.
Assim, partindo deste panorama introdutrio aponto que neste trabalho, apesar das
vastas definies, trabalharei com a seguinte definio idealizada de polticas pblicas: a
soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou por meio de agentes, e que
influenciam a vida dos cidados. (PETERS, 1993, p.4. apud Dias, 2012, P.13) quero somar a
esta definio outra, que vai complement-la, a de Bucci (2008, apud, DIAS, 2012) de que as
polticas pblicas tm a funo de concretizar os direitos postos em mbito federal, estadual e
municipal. Assim, parto da colocao de que as polticas pblicas so um mecanismo de
controle social, porm, quando produzem bem-estar dizem respeito ao controle normal. Vale
lembrar que estamos trabalhando com um tipo ideal weberiano (2003) e no que haja polticas
pblicas que atuem apenas com esses elementos, mas quero colocar que ela tem esse papel de
forma normal, de junto com as outras instituies sociais produzir solidariedade no sentido
durkheiniano. Assim, essas polticas que so aes de governos tm como intuito resolver
alguma questo pblica.
Assim, tanto o termo poltica, quanto o termo pblico no tm uma conceituao una,
porm, proponho aqui que o termo poltica seja conectado em sua dimenso de poder e na sua
dimenso de ao, sabendo que visto de forma separada pelos autores abordados12
. J o
termo pblico, tambm fao a distino do coletivo, mas, vamos desmembrar ao longo do
trabalho o paradoxo do pblico em um tipo de poltica pblica: a de segurana, que foi
construda no Brasil a partir de uma srie de contradies, inclusive a que diz respeito ao
12
Na atualidade em que h uma privatizao do pblico, ocorre tambm, o que Bauman (2010) citou a partir de C. Offe, de uma separao entre poder e poltica. Ou seja, o poder est no mercado e em bases neoliberais.
Assim, a mo invisvel dos liberalistas tambm opera na mquina de tomadas de decises, e muitos polticos
invocam a ideia do no h alternativa, ou seja, que no podem fazer determinadas coisas importantes para a populao, pois eles no possuem o poder e que no haja preocupao, pois a mo invisvel do mercado
agora tambm regula a poltica, isso gera o conformismo poltico.
-
18
pblico, pois sua gnese estava em um problema privado que tomou dimenses cotidianas,
nas conversas informais e nos discursos formais. Podemos pensar nos termos das esferas,
como as apontadas por Bauman (2010) de uma sobreposio da esfera privada nos interesses
pblicos de forma arbitrria, pode figurar este tipo de interveno. Os medos perversos no
plano da construo da insegurana no seio do meio privado leva uma srie de aes e ideias
para as construes do espao pblico13
.
1.3. POLTICAS DE SEGURANA PBLICA
Este subtpico tem o intuito de apontar como a segurana foi pensada no cenrio
brasileiro14
a partir da Ditadura Militar15
. Assim, temos rupturas e novos elementos que foram
incorporados no imaginrio social que influenciaram na forma como hoje tratamos uma
chamada poltica de segurana pblica. O que chamo aqui de imaginrio social vai alm de
um conjunto de ideias de forma monoltica, ele complexo e ramificado, representado por um
conjunto de ideias e aes acerca de si e da relao com os outros, assim, h uma srie de
normatizaes construdas e construtoras desses imaginrios que lhe conferem relaes
comuns. O imaginrio social possui o pano de fundo das ideias compartilhadas, e ele tem o
estatuto de dar legitimidade a aes. (TAYLOR, 2010)
O imaginrio social no a mesma coisa que teoria social, como aponta Taylor (2010):
13
Bauman (2010) remota Idade Clssica para desenvolver a classificao das esferas. O Oikos era o crculo
do domstico/privado, j a Eclsia era o local do exerccio poltico, os gregos tinham uma esfera
intermediria de comunicao entre essas duas, era o espao da gora, a esfera cujo papel principal no era
manter o pblico e o privado separados, mas garantir um movimento ativo e contnuo entre eles. a gora, a
terceira esfera intermediria, que une, mas constri limites entre os extremos. Este espao de luta, dilogo,
cooperao e compromisso. Este terceiro espao de articulao entre as esferas opera para que uma no se
sobreponha a outra, ela um espao para desenhar limites que foram construdos de forma coletiva. Quando
h uma valorizao intensa e unilateral da eclsia/poltico pode ocorrer uma supresso do indivduo, exemplo
,os regimes fascistas, nazistas e as ditaduras comunistas na URSS, tendo a ideologia como sustentculo de
suas premissas, porm, assim que o poder conquistados h a supresso da ideologia e tambm a censura de
que exista uma ideologia na sociedade. Por outro lado quando ocorre a supervalorizao do Oikos/privado
temos os interesses particulares guiando todos os segmentos da sociedade. Fenmeno que o autor apresenta
que opera atualmente, que ao longo do processo histrico foi se desenvolvendo uma valorizao do
individual, os segmentos neoliberais abraam uma srie de pressupostos que condizem com essa
individualizao e quebras dos laos sociais. 14
Chamei de cenrio brasileiro, porm, o recorte de levantamento bibliogrfico diz respeito ao Rio de Janeiro e
a So Paulo. No nego as particularidades inerentes a cada regio e o contexto mltiplo, isto foi apenas um
panorama introdutrio partindo principalmente de Machado da Silva (2009;2010) que estudou a fundo a
segurana pblica no Rio de Janeiro. O mesmo autor aponta que a cidade carioca passou ao longo da histria
um elemento forte de construo do imaginrio sobre violncia e criminalidade e tambm como laboratrio de execuo de aes acerca desses aspectos.
15 Sei que h os aspectos importantes anteriores ditadura, mas, fiz este recorte com o intuito de poder me aprofundar em um paradigma que est mais prximo da atualidade. Assim, me aprofundarei no perodo ps
Ditadura.
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H importantes diferenas entre imaginrio social e teoria social. Adoto o termo
imaginrio (1) porque a minha focagem incide no modo habitual como as pessoas
imaginam o seu ambiente social, e isto no se expressa, muitas vezes, em termos tericos, mas apoia-se em imagens, narrativas e lendas. Acontece tambm que (2) a
teoria , com frequncia, a posse de uma pequena minoria, ao passo que aquilo que
interessante no imaginrio social a sua partilha por largos grupos de pessoas, se
no toda a sociedade. O que leva a uma terceira diferena: (3) o imaginrio social a
compreenso comum que possibilita prticas comuns e um sentido de legitimidade
amplamente partilhado. (p.31)
Assim, o imaginrio social alimentado por lendas, imagens e narrativas e
constitudo por panos de fundo das aes ao qual ele legitima. Porm, teorias podem
contribuir para a construo de imaginrios sociais e vice versa, eles nascem de teorias
restritas a determinados grupos e alcanam o senso comum.
Assim como os moldes em que imaginamos a manuteno da ordem pelo vis policial
enquanto uma construo social (por isso a utilizao de um aporte terico que pesquisou essa
construo) os termos de apreenso da favela (antes da existncia do prprio termo houve
uma construo do que ela e uma homogeneizao dos aspectos dos moradores, produzindo
sua imagem virtual) enquanto um problema pblico uma construo que Valladares
(2005) colocou nos termos de inveno, ou seja, um conjunto de elementos que ao longo da
histria foram delineando os termos, o imaginrio e as aes. Posies de mdicos,
engenheiros, jornalistas, membros da igreja catlica no incio do sculo XX no Brasil
apontaram as favelas como um problema de ordens variadas conforme os segmentos que
apontaram, podendo ser uma disfuno de higienizao, ou de oposio intrnseca cidade, e
at mesmo de ordem moral. A interveno nesses locais advindas de rgos pblicos e
privados impulsionou uma srie de pesquisas destinadas aos fins que as instituies
contratantes almejavam. Coloquei esta elucidao, pois, muitos elementos que esto presentes
no imaginrio social acerca da criminilazao da pobreza tambm tiveram um aporte da teoria
em sua construo, ao longo do trabalho encontraremos termos como: profilaxia,
limpeza, dentre outros que esto no bojo de uma viso higienista que no Brasil remota ao
final do sculo XIX e incio do sculo XX. (VALLADARES, 2005)
A concepo naturalizada de que territrios de pobreza necessitem de forma intrnseca
de forte aparelho policial, mesmo que seja para falar de assuntos que dizem respeito
infraestrutura e bem-estar social constitui um tipo de imaginrio social, assim, essa concepo
o pano de fundo que legitima a ao (a poltica de segurana pblica). Desta forma, um
tipo de leitura de mundo que como veremos nos relatos apresentados no jornal e na
sistematizao da ordem de operao policial, tem o mesmo pano de fundo (um consenso
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partindo de atores distintos jornalista, policiais, operadores da UPS e moradores). Porm, o
intuito aqui no cair em uma concepo monoltica de que as ideias fazem as prticas, na
verdade ambas atuam mutuamente e so passveis de mudanas.
Fiz essa ressalva acerca da diferenciao entre imaginrios e teorias para frisar que
utilizo neste trabalho o aporte terico de anlise de atuao do controle social perverso e
polticas pblicas. Porque apreendi que este o pano de fundo da situao, porm, no
percebido pelas fontes de pesquisa nesses termos, pois esses termos so tipos ideais de
pesquisa da sociedade. A partir disso adentrarei na maneira como a segurana pblica foi
construda no Brasil e de como a percepo da sociedade (tratarei em termos de imaginrio
social) somada forma como foram conduzidas as polticas esto pautadas em um paradigma
de criminalizar grupos.
Assim, FREIRE (2009) faz um estudo acerca dos paradigmas da segurana no Brasil
desde o perodo da ditadura militar at os dias atuais e elenca trs dos principais paradigmas
da segurana no Brasil, sendo eles: a segurana nacional (ditadura militar), segurana pblica
(fortalecimento ps Carta de 1988) e a segurana cidad (adquirindo maior visibilidade a
partir de 2000 em boa parte da Amrica Latina). A autora coloca que esses trs paradigmas
influenciaram a construo de polticas pblicas e tambm a percepo social acerca da
violncia. Esses paradigmas no so isolados e monolticos, ambos possuem caractersticas
mltiplas, porm, h aspectos marcantes que acabam os definindo, tambm no significa que
um exclua o outro, eles podem coexistir, pois so processos que mudam conforme o contexto
e o local.
Ressalto que no estou tratando um paradigma como sinnimo de poltica pblica,
desta forma, Um paradigma no uma poltica pblica. Os paradigmas so crenas, valores e
conceitos que predominam no governo e na sociedade em determinada localidade e em
determinado perodo. (FREIRE, 2009, p.50). J a partir da concepo adotada neste trabalho
uma poltica de segurana pblica :
Uma poltica de segurana supe, necessariamente, confiana generalizada nas
instituies, de modo a sustentar e expressar a legitimidade da atuao destas, e tal
condio deve basear-se em um conjunto de polticas que combine, ao mesmo
tempo, o controle e a preveno das prticas definidas como ilcitas (isto , a
garantia de manuteno da ordem pblica pela coero juridicamente fundamentada)
e a proteo social (isto , a ampliao das condies de exerccio da
cidadania).(MACHADO DA SILVA, 2010, p.37)
O modelo de Segurana Nacional o paradigma da poca da ditadura militar (1964-
1985), na qual o Estado suprimiu todos os direitos polticos e sociais na medida em que com
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auxilio direto das foras armadas e de rgos criados para atuarem na represso e punio de
aes que fossem contrrias a ordem imposta e no sucumbir aos inimigos do Estado que
inicialmente era o comunismo, porm, se consolidou como sendo qualquer pessoa que fosse
contra o sistema vigente. (FREIRE, 2009). A atuao acerca da segurana estava
fundamentada na:
Doutrina de Segurana Nacional e Desenvolvimento, formulada pela Escola Superior de Guerra (Oliveira, 1976, p.34-35). Esta doutrina foi moldada em torno do conceito de Segurana Nacional, definido ento como a habilidade de um Estado
garantir, em determinada poca, a obteno e manuteno de seus objetivos
nacionais, apesar dos antagonismos ou presses existentes ou potenciais.
(FREIRE,2009, p.51).
O Estado com o auxilio das Foras Armadas poderia recorrer a qualquer meio para
combater o inimigo do Estado.
O segundo modelo proposto, que aponto aqui ser um dos que est mais prximo do
meu objeto e em conexo com o terceiro o da Segurana Pblica, a Constituio de 1988
(BRASIL, 1988) define segurana pblica no artigo 144 como sendo: dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos - exercida para a preservao da ordem pblica e da
incolumidade das pessoas e do patrimnio, atravs dos seguintes rgos: (i) Polcia Federal;
(ii) Polcia Rodoviria Federal; (iii) Polcia Ferroviria Federal; (iv) Polcias Civis; (v)
Polcias Militares e Corpos de Bombeiros Militares16.
Assim, h uma ruptura com o modelo anterior, incorporando a ideia de que a
Segurana Pblica um dever de todos, porm, listam apenas instituies policiais como
responsveis pela segurana nas instncias internas do pas, cabendo as Foras Armadas a
externa. Neste contexto houve a descentralizao administrativa, separando as competncias
federais, estaduais e municipais. A segurana pblica passa a ser caracterstica dos estados
como administradores da polcia civil e militar. Para Freire (2009) essa fragmentao teve
dois aspectos contrrios, um positivo na medida em que dando autonomia aos estados e outro
negativo na medida de uma falta de comunicao entre eles, visto que os elementos de
criminalidade e violncia ultrapassam fronteiras. O mecanismo de articulao entre os estados
foi criado em 1995 a qual:
Secretaria de Planejamento de Aes Nacionais de Segurana Pblica, transformada
em 1997 em Secretaria Nacional de Segurana Pblica (SENASP). No decreto de
sua criao, estabelecido que cabe SENASP assessorar o Ministro de Estado da
16
BRASIL, Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponvel em: < http://www.leffa.pro.br/textos/abnt.htm> Acesso em: 20 set. 2014.
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Justia na definio e implementao da poltica nacional de segurana pblica, e,
em todo o territrio nacional, acompanhar as atividades dos rgos responsveis
pela segurana pblica. (FREIRE, 2009, p.52)
Outro foi o SUSP, um Sistema nico de Segurana Pblica com o objetivo de integrar
as gestes. Assim, esses dois rgos contam com o Fundo Nacional de Segurana Pblica, o
qual passa recursos conforme os projetos apresentados pelo estado. (FREIRE, 2009.)
No perodo ps Ditadura Militar no Brasil houve o enfoque no debate acerca da
importncia dos direitos civis e polticos. Desta forma houve uma mudana no enquadramento
geral dos conflitos, passando de uma perspectiva econmica para a poltica (no sentido de
dominao). No que o elemento da importncia dos direitos sociais tenha desaparecido dos
debates e anseios polticos na dcada de 1980, mas,
(...) a remoo do entulho autoritrio (isto , o fim da legislao de exceo
introduzida no ordenamento jurdico brasileiro, bem como a supresso do
corporativismo que, desde o governo Vargas, impregnava a legislao trabalhista e
sindical e a representao de grupos econmicos nos aparelhos estatais) passou a ser
vista como condio suficiente para promover sua garantia e universalizao.
(FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005, p.6)
Assim, os autores referidos apontam que a questo do desenvolvimento no foi
extinguida, porm, ela sai de um vis econmico e adentra em um discurso jurdico-
institucional. (SILVA, 1995, apud, FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005).
Dessarte, esse elemento foi um dos componentes da forma como foram realizadas as polticas
de segurana pblica aps a reabertura poltica brasileira, uma desvinculao do aparato
econmico, porm, contraditoriamente sempre fazendo referncia pobreza.
Na construo da Constituio de 1988 houve esforos em agregar liberdades
individuais, polticas e uma universalizao dos ditos direitos sociais. Os direitos polticos e
civis foram aprovados sem muitos embates, apesar de na prtica no operar da forma que foi
exposta, mas os direitos sociais tiveram empecilhos, mesmo estando presentes na
Constituio a sua aplicabilidade e uma generalidade que no diz respeito universalizao.
(FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005).
Com a retomada das eleies no Brasil houve uma formulao da questo dos direitos
humanos que seria a juno entre as liberdades democrticas (direitos civis e polticos) e os
direitos sociais. Porm, esses elementos esto vinculados estritamente a um discurso jurdico.
Essa era a forma que, no bojo da redemocratizao brasileira, assumia a perspectiva
igualitria e includente que marcou a ideologia dominante do desenvolvimentismo durante
boa parte da industrializao brasileira. (FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA.
2005, p.6).
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Foi neste cenrio de adoo da perspectiva dos direitos humanos, que Brizola foi eleito
governador do Rio de Janeiro em 1982, ele era um estatutrio dos direitos dos presos, j em
So Paulo, a bandeira do direito dos presos foi levantada pela Igreja Catlica. Porm, a capital
de So Paulo foi tomada por projetos e polticos conservadores que operavam em nome da
manuteno da ordem. (FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005).
O governo Brizola era pautado por uma srie de polticas acerca dos direitos humanos
em suas polticas de segurana pblica, isso o auxiliava em uma perspectiva da consolidao
das questes trabalhistas no Brasil, somando a isso projetos e intervenes que se
posicionavam acerca dos moradores da favela como agentes dignos e da necessidade de infra-
estrutura nessas reas. Foram nestas circunstncias, somada a crescente visibilidade das
favelas cariocas que foi a fora e ao mesmo tempo a fraqueza de Brizola. Ele era
apontado como o homem que governava apenas para o lumpesinato e esqueceu o resto da
cidade. Este fato em um contexto to complexo que era o Brasil no ps 64 tem muito a dizer
como foram conduzidas posteriormente as polticas de segurana pblica. (FRIDMAN;
LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005).
Assim, as camadas mais favorecidas socialmente tiveram reaes acerca dos discursos
e aes de Brizola:
Esses, j h algum tempo, vinham se ressentindo da expanso do crime violento
(comum, no poltico), que no mais se restringia aos espaos urbanos pauperizados
e, por isso mesmo, afetava profundamente suas rotinas cotidianas, gerando medo e
insegurana. Adicionava-se a isso o medo e a insegurana experimentados pelas
prprias camadas populares, tambm submetidas, j quela poca, criminalidade
violenta. Entretanto, at o governo Brizola, o crime comum violento no chegava a
se constituir em um problema pblico. Ele permanecia objeto de comentrios
privados, que expressavam descontentamento e certa ansiedade ainda difusos, como
foi sugerido anteriormente. Nessas condies, a simples meno a direitos de presos
e criminosos e/ou a oposio explcita ao vigilantismo (Pinheiro, 1982, p.18) tradicional conduta brutal das foras policiais diante de suspeitos de origem popular
, peas importantes do discurso e da atuao brizolista, se apresentavam como uma afronta para significativos setores da opinio pblica. (FRIDMAN; LEITE;
MACHADO DA SILVA. 2005, p.8-9).
A ideia da possibilidade/proposta de um tratamento igualitrio para todos os
indivduos virou doxa de policiais, da classe mdia e da mdia, como se fosse algo impossvel:
Essa crtica com frequncia era travestida de lamentao: a polcia agora tem que chamar o
vagabundo de cidado. (FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005, p.9) Assim,
havia a ideia veiculada pela mdia, de que o governo Brizola criava/sustentava bandidos.
Desta forma, a proibio de invaso massiva da polcia foi apontada pela mdia na poca
como extraterritorialidade de fato, assim, como se fosse um combinado entre governo e a
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comunidade para que as favelas ficassem sob o domnio dos traficantes, ou seja, no seria
mais mantida pelo Estado. Deste modo, essa generalizao unilateral comeou a operar de
forma normatizadora no imaginrio social. (Rodrigues, 2995, apud, FRIDMAN; LEITE;
MACHADO DA SILVA. 2005).
Desta forma uma ideia arraigada no apenas no senso comum, mas tambm nos
criadores/executores de polticas pblicas de que direitos so incompatveis com aes de
segurana pblica fica cada vez mais slida, inclusive um dos elementos que levou Brizola a
perder as eleies em 1987, para Moreira Franco que prometeu cessar a violncia no Rio de
Janeiro em 6 meses. (FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005).
No incio da dcada de 1990 houve o fortalecimento da ideia de um problema da
segurana pblica como causa unilateral de uma desordem da cidade, na medida em que
crescia a violncia fsica, no apenas em quantidade, mas tambm em visibilidade. Assim, a
crtica aos direitos humanos era pautada na ideia de que no era possvel governar para os
favelados e deixar a cidade, conforme as metforas em guerra. (FRIDMAN; LEITE;
MACHADO DA SILVA. 2005).
Em suma, o processo de desnatruralizao do debate acerca da forma como eram
tratados os desvios de conduta veio a tona em uma cenrio poltico na dcada de 1980 e incio
da de 1990, isso coincidiu com a abertura poltica ps ditadura, polarizao partidria e
valorizao de um discurso jurdico-institucional. Assim, houve um debate diverso no sentido
de que alguns problematizavam a violncia institucional e outros criticavam o crescimento da
violncia.
Uma vez que cada um desses campos via o outro como inimigo, armou-se uma
forma militarizada de prosseguir o debate em torno da ampliao dos direitos civis
que, em ltima instncia, o que est em questo nessas disputas. A insegurana e o
medo passaram a pautar o debate sobre a expanso da cidadania. Tal discusso
tornou pblico o sentimento de insegurana e de medo relacionado desorganizao
da vida cotidiana, privada, do conjunto da populao. Gera-se, assim, um crculo
vicioso em cujo epicentro esto demandas pela recomposio da ordem social, as
quais fecham o foco dos conflitos sociais na espiral de violncia policial e
criminal. (FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA SILVA. 2005, p.10).
Foi neste conjunto de elementos presentes no governo de Brizola que o medo, que era
estatuto de conversas privadas entrou no debate pblico, inclusive na construo de polticas
pblicas. Na dcada de 1994 os fenmenos da bala perdida advinda de disputas entre
traficantes que iam para alm dos limites da favela, e os arrastes constituram um dos
sustentos para a linguagem da guerra urbana. Essa quebra da rotina cotidiana nas cidades,
na dcada de 1990 houve uma srie de experincia de segurana pblica, assim o evento ECO
-
25
92 que teve as foras armadas atuando na segurana, chacinas como as de Acarai (1990) e da
candelria (1993) como exemplos de uma tentativa de resolver os problemas de
segurana, assim com a ideia de que a supresso da violncia s seria possvel suprimindo os
indivduos que supostamente a comete, o que de fato no produziu o efeito esperado, at
mesmo legitimando grupos de extermnios policiais. (FRIDMAN; LEITE; MACHADO DA
SILVA. 2005).
A ideia de suprimir a violncia de forma rpida e eficiente estava impregnada nas
agendas polticas, em promessas de campanha e em projetos de governo. Neste conjunto de
elementos que a cidade do Rio de Janeiro teve a construo no imaginrio social, no apenas
da sua regio, mas em um aspecto nacional de representar como uma espcie de exemplo de
violncia urbana, do que as cidades poderiam tornar a ser e inclusive de laboratrio para aes
imediatistas para acabar com o crime. Em concluso, a dimenso da Segurana Pblica
neste paradigma passa o elemento de prevenir e controlar a violncia que era papel das foras
armadas para as instituies policiais e o discurso de proteger os interesses nacionais muda
para a proteo do patrimnio e da integridade dos indivduos.
Voltando aos modelos propostos por Freire (2009), o ltimo o da Segurana Cidad,
que ser pertinente para analisar a Ordem de Servio da Polcia militar 005/2012 que discursa
a partir dos termos de segurana cidad e policiamento comunitrio. Desta forma:
A perspectiva de Segurana Cidad surge na Amrica Latina, a partir da segunda
metade da dcada de 90, e tem como princpio a implementao integrada de
polticas setoriais no nvel local. O conceito de Segurana Cidad comea a ser
aplicado na Colmbia, em 1995 e, seguindo o xito alcanado naquela localidade na
preveno e controle da criminalidade, este passa a ser adotado ento por outros
pases da regio. (FREIRE, 2009, p.52).
Assim, esse paradigma parte do pressuposto de que a violncia no possui uma nica
causa, ela multifacetada, assim, h a proposio de polticas pblicas atuando no controle e
na preveno de forma integrada em um contexto local. A autora aponta que este paradigma
tem que articular diferentes instncias da sociedade e diferentes polticas pblicas, ainda
elenca que cinco categorias fundamentais:
(i) As dirigidas ao cumprimento voluntrio de normas; (ii) As que buscam a
incluso social e a diminuio de fatores de risco (lcool, drogas, armas, etc) ; (iii)
As que tm como propsito a melhoria dos contextos urbanos associados ao medo e
ao perigo real (recuperao de espaos pblicos); (iv) As que facilitam o acesso dos
cidados a mecanismos institucionais e/ou alternativos de resoluo de conflitos; e
(v) As que possuem foco na construo de capacidades institucionais, melhoria da
eficcia policial e das autoridades executivas ou judiciais e da confiana dos
cidados em tais instituies.Em outras palavras, permanece a proteo vida e
-
26
propriedade j presente no paradigma de Segurana Pblica, mas avana-se rumo
proteo plena da cidadania. (FREIRE, 2009, p.52).
H pontos positivos elencados pela autora acerca da segurana cidad, como o acesso
justia, incluso social de capacidades institucionais, etc. Porm, penso haver a necessidade
de tomar cuidado com a utilizao dos temos cidado e comunidade, pois, segundo Bauman
(2003) a ideia de comunidade nos remete a concepo de compartilhamento e cuidado
recproco, ou seja, a confiabilidade entre os comuns em nome da sensao de segurana de
forma inconsciente. Porm, o que h hoje a sensao de insegurana, fruto de uma
sociedade transitria, nas quais as relaes so lquidas. Assim, h fortes investimentos na
tentativa de controlar o mundo, investimos em mecanismos para criar essa segurana de
forma artificial, na medida em que isso feito: Comeamos a suspeitar dos outros nossa
volta e em especial dos estranhos entre eles, portadores e corporificaes do no previsto e do
imprevisvel. (BAUMAN, 2003, p. 9). O que temos uma no-comunidade (FREIRE,
2009).
Esses dois termos segurana e cidad j nos remetem a um paradoxo, a incorporao
de um conjunto de elementos de que enquanto a segurana for estatuto intrnseco a uma
polcia militarizada, que opera na competncia de fazer e administrar uma poltica de
segurana pblica ser complicado, outro elemento a palavra cidado, a ideia da cidadania
operando pelo fato de haver interveno policial em reas pobres, muitas vezes ligados ao
conceito de comunidade e bem comum, que como sabe-se no opera desta maneira, a ideia de
uma poltica de segurana pblica envolvendo a policializao de um territrio construmos a
ideia de que esses moradores so cidados nos tira do debate de que eles no possuem acesso
a elementos bsico e necessrios de bem estar-social, desta forma:
Como se sabe, a institucionalizao dos direitos de cidadania no Brasil no seguiu o
postulado da universalidade que define a prpria noo de cidado e que foi aplicado
em grande parte da Europa, sendo sintetizado por Marshall (1967) como uma
medida de igualdade que correlaciona, a partir de um elenco de direitos, indivduos
pertencentes a um estado nacional. Comparando os dois processos, Lautier (1987)
destaca na experincia europia a assimilao da cidadania plena cidadania salarial, que se caracteriza pela garantia dos direitos sociais correlata ao exerccio do trabalho assalariado, e tambm a inadequao do modelo marshalliano para o
caso brasileiro, caracterizado por uma cidadania fragmentada, de geometria varivel. Com isso, remete incapacidade de o estado definir estatutos sociais, ajust-los e unific-los em um sistema nico de direitos-deveres (Lautier, 1987, p. 89). Evidncia disso seria o fato da imensa maioria dos atores da economia informal no [estar] inscrita no sistema de direitos-deveres sociais ligado ao
emprego assalariado: se uma pequena parte deles tem acesso ao sistema de sade,
quase todos esto excludos da aposentadoria, da garantia jurdica do emprego etc.
(Lautier, 1997, p. 86, apud, Fridman; Leite; Machado da Silva, 2005, p.6).
Freire (2009) tambm aponta iniciativas do governo federal que tentam operar com
-
27
uma segurana cidad atualmente, como o Programa Nacional de Segurana Pblica com
Cidadania (PRONANCI), porm, mesmo com essa retrica ainda camos na criminalizao da
juventude pobre (MORAES; KULAITIS, 2013: KULAITIS, 2014) e alimentamos aquilo que
Coelho (2005) quis desconstruir de que at mesmo nos estudos das cincias sociais h essa
causalidade entre criminalidade e pobreza. Falo isso no sentido de evocar a palavra cidado
toda vez que h interveno policial e um projeto de futuro em favelas e bairros pobres como
se para eles chegarem cidadania s fosse possvel atravs do caminho policializado. Assim,
como apontou Machado da Silva (2010b) que a partir do cenrio construdo na dcada de
1980, foi produzida (at hoje ) uma srie de posies que no senso comum, na poltica, em
estudos acadmicos apresenta como sinnimo os elementos de controle social, segurana e
represso/ordem. Um dos objetivos desse trabalho desconstruir certas causalidades tendo
como a principal a criminalizao da pobreza, a ideia de causa e efeito de controle social,
segurana e ordem (policial) como se fossem sinnimos nos tira da construo de um debate
que mais complexo. No pretendo negar a existncia de uma mudana que vemos em termos
como: segurana cidad e policiamento comunitrio, realmente essa mudana consta no
meu objeto emprico, Machado da Silva (2010b) tambm apontou essa possvel reorientao
falando das UPPs17 no Rio de Janeiro. Reorientao esta ligada aos discursos acerca da
violncia urbana, o posicionamento - mesmo que ainda no seja uma realidade prtica
efetiva - de uma ao permanente em contraposio a uma imediatista somada ideia de uma
polcia comunitria j representa uma mudana. Assim, as UPPs representam esse incio de
posio modificada, pode ser pelo fato das aes anteriores terem sido apontadas de forma
crtica pela opinio pblica e entidades ligadas aos direitos humanos. Porm, o quadro
associado que h uma guerra ainda opera fortemente. Afinal, pacificao designa o
processo que ocorre aps a vitria na guerra, a qual s pode ser evitada pela fuga dos
inimigos. De fato, antes da implantao de cada nova UPP, feita uma srie de alertas
pblicos aos criminosos para que deixem a localidade a ser ocupada. (MACHADO DA
SILVA, 2010b. p.36).
Desta forma, ao longo processo de construo terica e emprica da fonte coletada
adentrarei nesses mecanismos discutidos neste tpico, porm, frisando o cenrio paranaense,
atravs das pesquisas de Berlatto (2008;2011), Bod de Moraes ( 2003;2008;2014;), Bordin
(2009), Kulaitis (2014) e Anjos (2011) aponto que o cenrio do Paran tambm opera com
17
Porm, Silva (2010) coloca em termos de reorientao e no de uma nova poltica, afirma que este termo um exagero, pois o seu propsito a manuteno da ordem pblica, assim, como outros projetos anteriores
ligados a segurana.
-
28
esse pano de fundo de marginalizao da pobreza, inclusive h o apontamento de que as
UPSs foram inspiradas nas UPPs do Rio de Janeiro. Controlar a pobreza utilizando de
aparatos que envolvem a fora uma tradio no Brasil. (BERLATO, 2008).
-
29
2. UNIDADE PARAN SEGURO- UPS
A Unidade Paran Seguro (UPS) consiste em um tipo de interveno policial fixa,
inspirada nas Unidades de Polcia Pacificadora18
(UPP) do Rio de Janeiro, porm, na verso
paranaense no h a interveno do exrcito e desenvolvida pelo Governo do Estado em
conjunto com a Prefeitura e a Secretaria da Segurana Pblica19
. Segundo Nogueira (2012),
que atravs de consultas s Ordens de Operao da Polcia Militar colocou que:
As Unidades Paran Seguro (UPS) refletem uma nova poltica de segurana pblica
implantada pelo governo estadual paranaense e objetiva tornar regies com altos
ndices de criminalidade em espaos sustentveis de segurana, nos quais, num
planejamento de longo prazo, no haja necessidade de intervenes agudas da polcia. (p.2)
A poltica paranaense foi anunciada pelo governador Carlos Alberto Richa no dia 05
de janeiro de 201220
. Foi implantada no dia 1 de maro do mesmo ano no bairro Uberaba e
continua operando em mais treze vilas da regio de Curitiba e regio metropolitana, tambm
houve a expanso para outras cidades do interior do Paran, sendo elas Cascavel e Londrina21
.
Dois meses aps a instalao da primeira UPS no Uberaba foi introduzida mais uma no bairro
Parolin. Na sequncia do ano de 2012 houve mais instalaes em Curitiba. No dia 17 de julho
na Cidade Industrial de Curitiba foram implantadas Unidades nas Vilas Sabar, Vila Verde,
Vila Nossa Senhora da Luz e na Vila Caiu. No dia 03 de agosto na Vila Osternack, bairro
Stio Cercado; 17 de setembro na Vila Sandra, bairro Cidade Industrial; 1 de outubro na Vila
Ludovica, Bairro Tatuquara; 13 de outubro na Vila Trindade, Bairro Cajuru. Tambm houve a
expanso para o interior do Estado, sendo no dia 19 de outubro de 2012 a implantao ocorreu
18
O programa do Estado do Rio de Janeiro teve incio no ano de 2008 e atualmente conta com 38 unidades com um quadro fixo de 9.543 policiais. A UPP tem o objetivo de instaurar o controle estatal atravs do aparato
policial em territrios que tem influncia direta do trfico de drogas.
UNIDADE DE POLCIA PACIFICADORA. O que ? Disponvel em: <
http://www.upprj.com/index.php/o_que_e_upp> Acesso em 24 jul. 2014. 19
POLICIA MILITAR DO PARAN. Governo implanta em Curitiba a primeira Unidade Paran Seguro. 1
mar. 2012. Disponvel em: < http://www.policiamilitar.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=4942>
Acesso em: 20 jul.2014.
20
RICHA ANUNCIA IMPLANTAO DE UNIDADES PARAN SEGURO. Umuarama Ilustrado. 6 jan.
2012. Disponvel Em: <
http://www.ilustrado.com.br/jornal/ExibeNoticia.aspx?NotID=16802&Not=Richa%20anuncia%20implanta
%C3%A7%C3%A3o%20de%20Unidades%20Paran%C3%A1%20Seguro>. Acesso: 20 jul. 2014. 21
Dados levantados no dia 22/07/2014, porm, a contabilizao neste trabalho da quantidade de vilas
ocupadas, vale colocar que h bairros que possuem mais de uma base da UPS.
-
30
no bairro Jardim Interlagos em Cascavel22
. No dia 10 de dezembro de 2012 no Jardim Unio
da Vitria em Londrina23
.
No ano de 2013 as instalaes ocorreram na Regio Metropolitana de Curitiba, no dia
07 de maio na Vila Zumbi dos Palmares e Vila Liberdade em Colombo24
. Em 08 de junho em
Guatup em So Jos dos Pinhais25
.
2.1. UPS DO UBERABA
A primeira UPS do Paran foi instalada em uma quinta-feira, dia 1 de maro de 2012
no bairro Uberaba em Curitiba contando com 300 policiais militares, 150 policiais civis,
unidades da Guarda Municipal, helicptero e ces farejadores. Tendo o objetivo de conter o
trfico de drogas e diminuir os ndices de homicdio na Cidade26
. A regio do Uberaba possui
duas bases. Segundo dados da pgina da Polcia Militar:
Na ao de congelamento da regio, policiais tomaram reas da Vila Audi, Vila
Unio Ferroviria, Jardim Icara, Vila Solitude II, Moradias Marumbi I e II,
Moradias Lotiguassu, Vila Yasmim, Vila Reno, Jardim Alvorada II, Moradias
Itiber, Moradias Cairo e Jardim Torres integrantes do bairro Uberaba, que apresenta elevado ndice de homicdios e crimes relacionados ao trfico
27.
H um discurso dos operadores do sistema de que o objetivo da UPS alm de reduzir a
criminalidade criar mecanismos para uma polcia cidad. Segundo o Secretrio de
Segurana do Paran:
(...) a metodologia de implantao das UPS prev uma fase inicial, de inteligncia
policial, para identificao de traficantes, pontos de trfico de drogas e cenas de uso
de entorpecentes. No momento seguinte so feitas as prises. uma ao profiltica, saneadora da regio e, em seguida, iniciado um trabalho muito forte
de policiamento comunitrio por parte da Polcia Militar, seguindo o conceito de
polcia de proximidade, uma Polcia Militar amiga da populao, paralelamente
22
GOVERNO DO ESTADO DO PARAN. Aes integradas de desenvolvimento e cidadania nas Unidades
Paran Seguro (UPS). Nov. 2012. Curitiba. Disponvel em: <
http://apmppr.org.br/siteold/images/arquivos/PlanodeAcoesIntegradas.pdf> Acesso em 20 jul. 2014 23
BIBIANA, Dionisio. Londrina vai receber a primeira Unidade Paran Seguro do interior. G1 globo. 09 mar.
2012. Disponvel em: < http://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2012/03/londrina-vai-receber-primeira-
unidade-parana-seguro-do-interior.html> Acesso em: 20 jul. 2014 24
CAMPANHA, Fabio. Governo Richa instala a 1 Unidade Paran Seguro da RMC. 07 mai. 2012.
Disponvel em: < http://www.fabiocampana.com.br/2013/05/governo-richa-instala-1a-unidade-parana-seguro-da-rmc/Acesso em: 20 jul. 2014.
25 LIMA, Jnatas. PM inicia instalao de UPS em So Jos dos Pinhais. Gazeta do povo. Vida e cidadania. 08
jun. 2012. Disponvel em: < disponvel em
http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?id=1380079> Acesso [20/07/2014) 26
GOVERNO IMPLANTA EM CURITIBA A PRIMEIRA UNIDADE PARAN SEGURO. Polcia Militar.
01 mar. 2012. Disponvel em<
http://www.policiamilitar.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=4942> Acesso em 20 jul. 2014. 27
GOVERNO IMPLANTA EM CURITIBA A PRIMEIRA UNIDADE PARAN SEGURO. Polcia Militar.
01 mar. 2012. Disponvel em<
http://www.policiamilitar.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=4942> Acesso em 20 jul. 2014.
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31
implantao de polticas pblicas que podem mudar a realidade de uma regio, explicou
28. (grifo meu)
Esse contingente de policiamento no Uberaba ocorreu nos dias iniciais, chamado pelas
fontes oficiais de congelamento, (do dia 1 at o dia 7). J na instalao fixa da UPS, no dia
8 de maro o contingente de operao foi anunciado como sendo de 60 policiais, com o
intuito de permanecerem efetivamente na regio, inclusive fazendo visitas domiciliares, que
segundo informao do site da PM para explicar a filosofia de trabalho da polcia militar
que pretende agir junto comunidade29
. Ainda segundo dados da pgina oficial da PM essas
aes tiveram um preparo com estudo e mapeamento da regio, assim:
Nesse perodo, as polcias Militar e Civil fizeram um mapeamento completo da
regio para identificar traficantes, pontos de vendas de drogas e a presena de
homicidas na rea. Como resultado desse trabalho, foram presas em novembro e
dezembro 12 pessoas ligadas ao trfico de drogas na rea, e mais duas nos ltimos
dias. Foi um trabalho profiltico prvio, para preparar a entrada da polcia na regio, disse o secretrio da Segurana Pblica, Reinaldo de Almeida Cesar30. (Grifo meu)
A ocupao no Uberaba atingiu 15 Vilas do chamado bolso Audi/Unio, a partir de
uma pesquisa realizada pela Cohab (2006) o jornal Gazeta do Povo produziu infogrficos
acerca dos problemas nesta regio de UPS, como uma srie de problemas de infraestrutura,
saneamento bsico, falta de coleta de lixo31
, dificuldade at mesmo de locomoo, visto que
h um trilho de trem32
que corta essas vilas, sendo a nica forma de passar de um lado para o
outro, acarretando uma srie de problemas de locomoo, quando os trens param na estao
os moradores tm que passar entre os vages33
.
A UPS ainda est instalada nessa regio assim como nas outras referidas, h pesquisas
sobre: estatsticas de reduo de homicdios e aprovao da populao curitibana sobre esta
28
GOVERNO IMPLANTA EM CURITIBA A PRIMEIRA UNIDADE PARAN SEGURO. Polcia Militar.
01 mar. 2012. Disponvel em<
http://www.policiamilitar.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=4942> Acesso em 20 jul. 2014. 29
SANTOS, M. Bairro permanecer ocupado por centenas de policiais. Policia Militar do Paran. 01 mar. 2012.
Disponvel em < http://www.policiamilitar.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=4941> Acesso em
20 jul. 2014. 30
GOVERNO IMPLANTA EM CURITIBA A PRIMEIRA UNIDADE PARAN SEGURO. Polcia Militar.
01 mar. 2012. Disponvel em<
http://www.policiamilitar.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=4942> Acesso em 20 jul. 2014. 31
UPS DO UBERABA: PERFIL DA PRIMEIRA UNIDADE PARAN SEGURO. Gazeta do Povo. Vida e
Cidadania. 09 set 2012. Disponvel em <
http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1328697),> Acesso em 20 jul.
2014 32
Como consta no anexo b e na figura 4. 33
BRENBATI, K. FERNANDES, J.C. PERES, A. Quinze vilas em busca de uma histria. Gazeta do povo.
Vida e Cidadania. 09 set. 2012. Disponvel em <
http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?id=1295284> Acesso em 29 jul. 2014
-
32
poltica de segurana pblica34
. As Unidades existem h mais de 2 anos, porm, o recorte
deste trabalho do primeiro ms da implantao, que foi no bairro Uberaba.35
Devido ao recorte adotado neste trabalho, o tpico seguinte ser uma contextualizao
introdutria acerca de aspectos histricos, geogrficos e sociais do bairro Uberaba, o primeiro
a receber a UPS.
FIGURA 1 SEDE DA UPS DO UBERABA
FONTE 1: http://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2013/04/apos-aniversario-moradores-pedem-melhoria-em-ups-
do-uberaba-no-pr.html> Acesso em: 10 nov. 2014
2.2. UBERABA36
O Bairro Uberaba localizado na regio sul de Curitiba e limtrofe a So Jos dos
Pinhais, Regio Metropolitana. Segundo FENIANOS (2001, p.12):
Registros de ocupao do bairro remontam do sculo 18, mas, com indcios que
antecede estes fatos inicialmente as terras pertenciam ao dono da sesmaria Antnio Rodrigues Sid (1693). Aproximadamente por volta de 1870, Curitiba passou a
receber grande contingente de imigrantes, e, com a necessidade de novos espaos, a
regio passou a se beneficiar com o desenvolvimento que despontava. Em 1900, os
34
PREFEITURA DE CURITIBA. Instalo de UPS em Curitiba reduz o nmero de crimes graves, aponta
Polcia Militar. 06 jun. 2012. Disponvel em . Acesso em 24 jul. 2014. 35
Desta forma, h uma srie de elementos nesta poltica que no sero abordados devido o recorte efetuado. 36
A palavra Uberaba significa gua que brilha e foi utilizada em referncia ao Rio Belm que corta a regio de Curitiba. (TSCHOKE, 2010.p.24).
-
33
domnios das terras passaram em grande parte a pertencer s famlias Franco e
Oliveira que, aos poucos foram negociadas e, em quinze anos o territrio comeava
a ser loteado. J nas dcadas subsequentes a regio comeou a se desenvolver
comercialmente.
O crescimento populacional do bairro comeou a se expandir na dcada de 1940 e na
mesma poca j havia uma ideia da existncia de dois uberabas. Segundo (TSCHOKE,
2010) essa diviso no imaginrio ocorria pelo Uberaba de Cima estar prxima ao bairro do
Boqueiro, que na poca era uma rea de leiterias, esta parte do Uberaba contava com
criaes de gado e de lavoura. J o outro Uberaba, chamado de Baixo apresentava outra
caracterstica, tinha um terreno alagadio que proporcionava areia para obras realizadas no
centro da cidade de Curitiba. Outro elemento histrico a participao dos imigrantes
japoneses no bairro, visto que na dcada de 1930 imigrantes iam para a regio para trabalhar
em lavouras, em 1945 o bairro foi escolhido para sediar um clube de amigos imigrantes
japoneses, que hoje possui o nome de Nikkei Clube. (TSCHOKE, 2010)
Segundo o censo do IBGE (2010), o bairro Uberaba o 5 mais populoso de Curitiba,
tendo 71.056 habitantes, a mesma colocao no ranking o bairro tem em se tratando do
crescimento populacional, desde o censo de 2000 at o atual, tendo um aumento de 11.780
habitantes, que em porcentagem representa 19,4%. Quanto densidade demogrfica, Uberaba
ficou em 28 sendo 5.115. O bairro possui uma rea de 14,9 Km e est no tocante dos bairros
Jardim das Amricas, Cajuru, Guabirotuba, Hauer e Boqueiro e com parte da regio de So
Jos dos Pinhais37
.
Como j foi apontado, o Uberaba tem uma diviso no oficial, ao qual h o Uberaba
de Cima e do de Baixo, essa segmentao questionvel, pois ora dada devido ao corte feito
entre ambos pela Avenida das Torres e ora pela Avenida Senador Salgado filho. Assim,
(...) pelo comerciante Antnio Guebur, destaca que, o Uberaba de Cima e Uberaba
de Baixo foi uma expresso utilizada teoricamente por volta do final da dcada de
30. Nos dias de hoje essa forma de dividir o bairro imaginariamente de pouco
utilizao. Mas, alguns moradores arriscam em dizer que a diviso ocorria a partir da
Avenida Comendador Franco, ou simplesmente, Avenida das Torres, outros
consideram a real diviso, sendo pela Avenida Senador Salgado Filho.
Consideravelmente, por ser a pioneira, para muitos, isso faz jus importncia desta
avenida como principal via de acesso Curitiba e a cidade de So Jos dos Pinhais e
a Santa Catarina, para poca. (OLIVEIRA, ZANELLO. 2010. P.9)
O bairro em questo extenso e extremamente heterogneo, no apenas em sua diviso,
Uberaba de Cima e o de Baixo, dentro dessa diviso h subdivises de Vilas. Assim, esta
regio uma mescla de residncias de classe mdia (no Uberaba de Cima), restaurantes e
armazns tradicionais como o Armazm Santa Ana, capelas, como a So Paulo Apstolo que
37
IPPUC. Censo 2010: anlise dos bairros de Curitiba. Disponvel
em: Acesso em 14 jul. 2014.
-
34
data de 1945, conjuntos habitacionais, tambm h reas de cultivo de plantao familiar e em
algumas regies h a presena de gados pastando, dentre muitos outros elementos.
Contrastando com esses pontos h ocupaes irregulares no Uberaba de Baixo, contando com
locais com falta de estruturas sociais bsicas. Um exemplo a Vila Unio, que consiste em
uma ocupao irregular datada de 1998, fica nas proximidades do Rio Iguau e entre a BR
277 e a Avenida das Torres. (SANTOS, 2002).
FIGURA 2 RESIDNCIA NO BAIRRO UBERABA NO VALOR DE 1.490.000,00 NO CONDOMNIO
TIROL DAS TORRES.
FONTE 2: http://pr.bomnegocio.com/regiao-de-curitiba-e-paranagua/imoveis/residencia-em-condominio-
fechado-no-uberaba-17577564> Acesso em 10 nov. 2014.
-
35
FIGURA 3 BAIRRO UBERABA (VILA NO IDENTIFICADA)
FONTE 3: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?id=1316440> Acesso em: 10 nov.
2014.
FIGURA 4 BOLSO AUDI- UNIO, TREM QUE DIFICULTA A PASSAGEM DOS MORADORES.
Fonte: Gazeta do Povo. Disponvel em:
10.nov. 2014.
-
36
3. ANLISE DE ENQUADRAMENTO DO JORNAL TRIBUNA DO PARAN E UM
EXERCCIO RELACIONAL COM A ORDEM DE OPERAO DA POLCIA
MILITAR N 005/201438
Segundo Becker (2009), ns cientistas sociais usamos variadas formas de representaes
da realidade social para embasar nossa pesquisa. Elas so diversas em suas formas, assim,
temos os elementos que tradicionalmente associamos enquanto socilogos como descries
etnogrficas, dados quantitativos, discursos, questionrios, dentre outros, por outro lado
tambm temos ainda que nem sempre valorizados , literatura, filmes, msicas, relatos,
jornais, dentre muitas outras maneiras de falar da sociedade que representam um tipo de
aspecto que pode se conectar com outros, assim, so mapas parciais, porm, so fundamentais
para os objetivos de pesquisa. A representao da realidade social as necessidades e
prticas de organizaes que moldam a nossa descrio de anlises. (BECKER, 2009, p. 16).
Ou ainda: (...) uma representao da sociedade algo que algum nos conta sobre algum
aspecto da vida social. (BECKER, 2009, p.18). Tambm temos o caminho de ir alm dessas
representaes, ou seja, conect-las a problemas que em um primeiro olhar vo alm dela.
Assim, utilizo neste trabalho fontes de papel, o jornal e um documento oficial da Polcia
Militar acerca da UPS e os trato enquanto representaes da realidade social39
. Desta forma,
essas maneiras apontadas por Becker (2009) so altamente organizadas podem nos apontar
uma srie de elementos desde os seus caminhos enquanto um ofcio (no caso o jornalista e o
policial), mas tambm apontam um tipo de leitura de mundo40
, aqui no caso o quadro
38
Nesta seo procurei elucidar os passos de construo e da apreenso do aporte de anlise emprica de anlise
de enquadramento de Goffman (2012). Porm, no destinei nenhuma seo deste trabalho a falar
exclusivamente de metodologia, pois, como apontou Bourdieu (2010), essa separao infundada, pois mtodo
e teoria andam juntos. Fiz essa conexo entre metodologias distintas, pensando nas perspectivas apresentadas
por Feyrabend (1997) de ir contra uma metodologia dura, dogmtica e que toma o estatuto pra si de nica. O
autor no nega a importncia do mtodo, porm, como aponta a concepo do vale tudo no negao do mtodo, mas o apontamento de que os mtodos no so unos, imutveis e que se aplicam a absolutamente tudo.
Por isso, esse vale tudo ou o anarquismo teortico (Feyrabend, 1997, p.17) nos propem essa abertura que enriquece o caminho da pesquisa e as formas de faz-la. Por isso, segui uma perspectiva pluralista acerca das sustentaes terico metodolgicas, este outro elemento que acho importante apontar, visto que, no pretendi
em nenhum momento separar a teoria do mtodo, penso aqui que os dois esto operando simultaneamente em
meu trabalho e que ao longo do processo de construo da pesquisa, releituras e novos caminhos foram
aparecendo em funo do prprio trabalho de pesquisar e acredito que essa juno, esta pluralidade me
auxiliou nisto. 39
Porm, assim como Becker (2009) colocou, friso que nenhuma representao/relato pode abarcar todos os
elementos da sociedade, inclusive ela imparcial, e segue um fluxo que envolve as instituies sociais da q