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NICIF - Núcleo de Investigação Científica de Incêndios Florestais / Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
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Mourízia
Aldeia das Dez
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Título
Projecto Terrisc - Recuperação de paisagens
de socalcos e prevenção de riscos naturais
Coordenador
Luciano Lourenço
Consultor Científico
Fernado Rebelo
Investigadores
Adriano Nave
Nuno Pereira
Mafalda Silva
Ana Carvalho
José Fialho
Editor
Núcleo de Investigação
Científica de Incêndios Florestais
Composição, Paginação e
Desenho Gráfico
Adriano Nave
Revisão do Texto
Luciano Lourenço
Ilustrações
Marisa Espínola
Foto da capa
Vista parcial de Chãs de Égua,
Serra do Açor.
ISBN
972-99462-3-X
Depósito Legal n.º
249329/06
Impressão
Ediliber, Lda
Tiragem: 1000 exemplares
© Núcleo de Investigação Científica de
Incêndios Florestais
Outubro de 2006
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Monte do Colcurinho, Serra do Açor
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IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução
A partir da necessidade da
revitalização de um conjunto de estruturas
agrícolas tradicionais, surgiu um
ambicioso projecto no seio dos países do
Mediterrâneo. Dar a conhecer a
importância dos socalcos é a premissa
fundamental do Terrisc. Os socalcos
agrícolas são estruturas que contrariam a
natureza dos declives e permitem ao
homem desenvolver as actividades
agrícolas nos locais mais inóspitos. Ao
mesmo tempo, através da permeabilização
do solo previnem o desencadeamento de riscos naturais, como movimentos de terra
em vertentes.
Em Espanha, França e Portugal (fig. 1), procedeu-se a um exaustivo trabalho de
investigação nos socalcos, desenvolvendo directrizes de estudo direccionadas para
os governos locais, alertando para a sua valorização, para a recuperação das
paisagens, e para a prevenção de riscos naturais.
Em Espanha, o grupo de Palma de Maiorca coordena o projecto a partir do
Departamento do Ambiente e da Natureza (fig. 2), do respectivo Governo Regional, e
Fig. 1 - Localização geográfica dos grupos participantes no projecto Terrisc.
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Fig. 2 - Reunião de trabalho, Palma de Maiorca.
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Fig. 3 - Saída de campo, Cévennes.
tem como associados a Universidade de Las Palmas, das Canárias, e a Fundação El
Solá, de Tarragona. Em França, são parceiros o Parque Nacional das Cévennes, em
associação com o Centro Nacional de Investigação Científica (CNRS) do Languedoc -
Roussillon (fig. 3). Em Portugal, participam também como parceiros, as Faculdades
de Letras das Universidades do Porto e de Coimbra, esta através do Núcleo de
Investigação Científica de Incêndios Florestais.
Em Portugal os processos de erosão provocam, com grande frequência, fenómenos
de desgaste do solo, que se devem sobretudo à acção não controlada da água sobre
a terra. Os movimentos de massa aparecem, habitualmente, depois de chuvas mais
abundantes, e se o solo carece de vegetação, a sua coesão pode ficar comprometida
e, nestas condições, uma massa de terra é susceptível de se transformar num
verdadeiro fluido viscoso.
Ao favorecerem a diminuição do declive da vertente, os socalcos contribuem para
aumentar a infiltração da água, benéfica para a agricultura, e limitar a escorrência
superficial, prevenindo a erosão hídrica e outros riscos inerentes.
No entanto, as transformações socio-económicas que se foram desenvolvendo
no nosso país, sobretudo a partir da segunda metade do século XX, manifestaram-se
num progressivo abandono agrícola, que levou a uma deterioração dos socalcos. Por
sua vez, os processos erosivos aumentaram com a desarticulação dos sistemas
hidrológicos que regularizavam a escorrência, pelo que na paisagem actual de socalcos
são frequentes os fenómenos de deslizamentos e desmoronamentos.
A degradação das paisagens de socalcos está bem patente nas regiões serranas
de Portugal. Foi a partir desta realidade que nos comprometemos a estudar algumas
destas áreas e a avaliar o seu grau de degradação, no sentido de facultar a cada
município da área de estudo elementos que os possam habilitar a justificar e a actuar
na revitalização dessas regiões.
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Fig. 4 - Enquadramento geográfico da área de estudo.
1. Enquadramento geográfico1. Enquadramento geográfico1. Enquadramento geográfico1. Enquadramento geográfico1. Enquadramento geográfico1.1. Caracterização física1.1. Caracterização física1.1. Caracterização física1.1. Caracterização física1.1. Caracterização física
As bacias hidrográficas do rio Alvoco e da ribeira de Pomares agrupam um conjuntode seis sub-bacias que se enquadram a título administrativo em três concelhos. Para oconcelho de Arganil destacam-se as bacias hidrográficas das ribeiras de Pomares e doPiódão. Dentro do concelho de Oliveira do Hospital as bacias hidrográficas em estudo sãoas das ribeiras de Avelar, de Aldeia das Dez e de Rio de Mel. Enquadrada no município deSeia encontra-se a bacia hidrográfica da ribeira de Loriga. Estas bacias hidrográficas dorio Alvoco e da ribeira de Pomares estão integradas nas Serras do Açor e da Estrela, quese encontram no conjunto montanhoso mais notável de Portugal, a Cordilheira Central.Com altitudes superiores a 1000m, estamos perante um ambiente agro-florestal mais oumenos homogéneo, mas que em termos litológicos comporta duas unidades distintas(fig. 4).
A Serra do Açor é essencialmente xistosa e a Serra da Estrela granítica, o que constituium quadro morfo-estrutural diversificado numa área que, do ponto de vista morfológico, érelativamente movimentada. Em termos climáticos estas serras desempenham um papelde barreira para as massas de ar provenientes de Oeste, quer pela sua elevada altitude,quer pelo seu posicionamento geográfico, registando, assim, quantitativos de precipitaçãoelevados, principalmente nas vertentes expostas a ocidente e a noroeste.
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Fig. 5 - Evolução da população residente, naárea de estudo.
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Sector Primário Índice de Envelhecimento
Fig. 6 - Evolução do índice deenvelhecimento e do sector primário.
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Atendendo à baixa permeabilidade das rochas magmáticas presentes, juntamente
com a dos xistos e grauvaques, as taxas de infiltração são baixas e os coeficientes de
escoamento superficial elevados, o que contribui para tornar estas áreas bastante
vulneráveis. Estas características vão desencadear o aparecimento de ravinamentos
e de outros movimentos em massa, tais como desabamentos, desmoronamentos e
deslizamentos. São áreas fragilizadas que devem ser defendidas dos efeitos erosivos,em particular após a destruição da vegetação pelos incêndios florestais.
1.2. Caracterização demográfica1.2. Caracterização demográfica1.2. Caracterização demográfica1.2. Caracterização demográfica1.2. Caracterização demográfica
Numa análise espacial à escala concelhia, o quadro demográfico reflecte um
cenário actual de regressão e de desequilíbrio etário nestas áreas de montanha. Os
agentes que contribuíram para tal são de origem diversa, mas entre estes destaca-se
claramente o êxodo rural, que consequentemente levou à falta de manutenção dos
socalcos e à deterioração geral das paisagens.
Embora o êxodo rural seja naturalmente justificado pela procura legítima de
melhores condições de vida nas cidades, acabou por acarretar profundas modificações
nas estruturas socio-económica, etária e profissional dos residentes nas áreas
serranas, as quais, se fizeram repercutir negativamente no binómio agricultura – floresta
(Lourenço, 1996, p.385).
O abandono dos campos, quer se tenha verificado por êxodo rural, emigração ou
envelhecimento populacional, é uma realidade significativa. Nos últimos 50 anos a
população teve uma evolução regressiva. Se em 1950 a população residente na área
de estudo era de 10071 habitantes, já em 2001 a realidade é de um acentuado
decréscimo para 4747 habitantes (fig.5).
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Fig. 7 - Levantamento da área de socalcos,com recurso à foto-interpretação.
Fig. 8 - Pormenor do trabalho de levantamentode campo, nas áreas-amostra.
No entanto, a diminuição da população que afecta grande parte das freguesias do
interior destes concelhos teve, como uma das consequências, o envelhecimento da
população e o abandono progressivo da agricultura bem como do espaço agricultado
que tinha sido modelado para esse fim (fig. 6).
Efectivamente até 2001 a tendência geral foi para uma diminuição significativa da
população empregada no sector primário, sendo que, na generalidade, aquela que
ainda se ocupa neste sector, apresenta uma média de idades já bastante elevada, o
que de certa forma reflecte o cenário dos concelhos do interior do país.
2. Metodologia2. Metodologia2. Metodologia2. Metodologia2. Metodologia
A primeira fase estabelecida pelo Terrisc correspondeu à cartografia,
experimentação e inventariação da área em estudo, integrada num conjunto de
unidades geomorfológicas, num total de seis bacias hidrográficas, repartidas em
termos administrativos pelos concelhos de Oliveira do Hospital, Arganil e Seia. Pela
extensão da área de estudo foram delimitadas sete áreas-amostra escolhidas em
função da sua localização, nomeadamente, de forma a representar as características
geomorfológicas, litológicas e climáticas da área total.
Partindo da definição desta unidade geográfica, passamos ao estudo dos impactes
do escoamento fluvial, que correlacionado com as características físicas da área,
nomeadamente os acentuados declives das vertentes, fomenta consequências
significativas ao nível das torrentes que funcionam nas linhas de água provocando,
por sua vez, grandes efeitos erosivos.
O trabalho de gabinete encontrou a sua máxima expressão na cartografia da área
ocupada por socalcos, já que a presença dos socalcos cumpre um conjunto de
finalidades específicas, baseadas no aumento da espessura do solo, que por sua
vez, decorrente da diminuição local do declive da vertente e no favorecimento da
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Fig. 9 - Estação meteorológica e parcela deerosão do campo experimental de Loriga.
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infiltração da água, limita a escorrência superficial e, consequentemente, a erosão
hídrica. Os objectivos deste parâmetro assentam na inventariação da estrutura dos
socalcos e no estado de conservação dos muros que os suportam e numa análise
mais específica do uso agrícola e fisionomia vegetal dos campos agrícolas.
A inventariação dos socalcos foi realizada a partir da análise integrada de cartas
militares do Instituto Geográfico do Exército, fotografias aéreas de 1958 e ortofotomapas
de 2004 (fig. 7). A partir da análise destas fontes de informação geográfica, procedeu-
se à vectorização dos socalcos através das ferramentas contidas no software ArcGis
9.1. Posteriormente, os resultados foram validados no terreno (fig. 8).
Um dos objectivos do Terrisc foi o de se proceder à quantificação de diferentes
aspectos que, directa ou indirectamente, se relacionam com a erosão do solo e que
permitem um acompanhamento e controlo sistemático da movimentação de materiais.
Para esse efeito instalaram-se parcelas de erosão, onde periodicamente se recolheram
amostras de material proveniente da escorrência, sendo esses, objecto de tratamento
laboratorial. Cada parcela tem uma área padronizada de 2,5 m2, constituída,
basicamente, por um rectângulo de chapa zincada, no qual foram instalados
equipamentos para a medição da água da escorrência e dos materiais sólidos
deslocados.
Os componentes principais da parcela de erosão são uma calha colectora que
armazena o material sólido, um limnígrafo de balança e um totalizador, com capacidade
para armazenar 30 litros de água da escorrência, podendo recolher o material sólido
mais fino transportado em suspensão.
Para a quantificação de um conjunto de
variáveis meteorológicas indispensáveis à
caracterização do clima local, instalaram-se
estações meteorológicas em cada um dos
municípios (fig.9). O principal objectivo desta
instalação foi o de se obter um registo de
informações relativas à pluviosidade,
temperatura, humidade relativa, pressão
atmosférica, vento e, também, monitorizar
episódios de precipitações concentradas.
A estação meteorológica é basicamente
constituída por anemómetro, termo-higrómetro
e pluviómetro, sendo a leitura destas grandezas
feita de forma contínua, com um intervalo de 30
minutos, através de um sistema automático de
aquisição e armazenamento de dados, cuja
recolha foi efectuada periodicamente ao longo
do projecto.
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3. Áreas-amostra e parcelas experimentais3. Áreas-amostra e parcelas experimentais3. Áreas-amostra e parcelas experimentais3. Áreas-amostra e parcelas experimentais3. Áreas-amostra e parcelas experimentais
Pela extensão da área de estudo das seis bacias hidrográficas (141,4 km2), foi
pertinente e fulcral a delimitação de unidades geográficas mais restritas, mas, que no
entanto, permitissem caracterizar as áreas-amostra no que respeita quer a aspectos
naturais, quer a situações demográficas. Escolheram-se sete áreas-amostra de 1km2
cada uma, localizadas dentro de um perímetro onde se encontram instaladas as
estações meteorológicas e as parcelas experimentais.
Os campos em socalcos, dentro da área de estudo perfazem um total de 18,4 km2.
A sua distribuição é o resultado de uma conjugação de características físicas e humanas
diversas (Quadro I).
Quadro I - Área total ocupada por socalcos.
Ribª de Pomares 44,7 7,1Ribª de Loriga 41,8 3,8Ribª do Piódão 34,3 3,1
Ribª do Rio de Mel 9,3 1,3Ribª do Avelar 7,6 1
Ribª de Aldeia das Dez 5,5 2,1Total 143,2 18,4
Bacias Hidrográficas Área das Bacias (km2)Área ocupada por campos
em socalcos (km2)
Fig. 10 - Área total ocupada por socalcos.
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Fig. 11 - Disposição paralela, Loriga. Fig. 12 - Disposição radial, Cabeça.
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As áreas de meandros são particularmente favoráveis a essas construções e,
desde cedo, foram alvo de uma intensa exploração agrícola, a qual contribuiu para a
manutenção das formas aplanadas e para o aparecimento das aldeias (Lourenço,
1996). São áreas facilmente transformadas em solos agrícolas e facilmente irrigáveis.
A superfície actualmente ocupada por socalcos traduz, desde logo, uma disposição
linear, acompanhando o percurso das linhas de água e, sobretudo, concentrando-se
em volta dos aglomerados populacionais (fig. 10).
Conforme os objectivos propostos pelo projecto, foram alvo de intenso trabalho
de campo uma série de elementos envolventes ao património dos socalcos. Para
isso, foi essencial a inventariação da estrutura, estado de conservação, uso agrícola,
culturas agrícolas e da fisionomia vegetal dentro do perímetro delimitado para as
áreas-amostra.
3.1. Estrutura3.1. Estrutura3.1. Estrutura3.1. Estrutura3.1. Estrutura
Para o estudo desta variável
considerou-se toda uma série de
elementos construtivos dos socalcos e
do património adjacente. A observação
dos socalcos permitiu a delimitação de
tipos de disposição estrutural dos muros
em que se consideraram disposições
paralelas (fig.11), concêntricas, radiais (fig.12) e ortogonais, seguindo um critério de
orientação dos muros de socalcos perante a orientação das vertentes e das linhas de
água.
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Fig. 13 - Muro com aparelhamento,Piódão.
Fig. 14 - Remate sobreelevado com lajeperpendicular, Cabeça.
Os acessos entre os socalcos fazem-se a partir de escadarias ou rampas. As
escadarias são as estruturas mais vulgares e foram estabelecidos vários tipos:
paralela de laje simétrica (fig.15), paralela de laje destacada, embutida (fig.16), paralela
e embutida, oblíqua, e esculpida na pedra. As rampas são encontradas com alguma
raridade e observam-se normalmente em áreas de menor declive e patamares com
maior extensão, permitindo um maior aproveitamento agrícola do espaço.
Fig. 15 - Escadaria paralela de lajesimétrica, Muro.
Fig. 16 - Escadaria embutida, Colcurinho.
Foi também considerado o tipo de aparelhamento da pedra constituinte dos muros,
com as seguintes designações: sem aparelhamento, com pouco aparelhamento ou
irregular, com aparelhamento ou entrecruzado (fig.13), e poligonal. Foi ainda alvo de
estudo o tipo de acabamento superior do muro, nomeadamente, nivelado,
sobreelevado, sobreelevado com laje perpendicular (fig.14) e sobreelevado com laje
oblíqua .
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Fig. 17 - Mina de água, Cimo da Ribeira. Fig. 18 - Levada perene, Cabeça.
No que respeita ao património edificado associado aos socalcos são de destacar
as casas de habitação, que também serviam como lojas e locais de armazenamento
dos produtos agrícolas. As palheiras para acondicionar palha e os currais para guardar
os animais constituem um elemento determinante na paisagem agrícola dos socalcos
(fig.19). Salientam-se ainda as pontes e os pontões (fig. 20).
Fig. 19 - Palheira, Piódão. Fig. 20 - Ponte, Cabeça.
Os sistemas de aproveitamento de água destinados para a rega são estruturas
confinantes aos socalcos e contam-se fontes, tanques, minas de água (fig.17), minas
de água com tanque, poças, poços, açudes e levadas perenes (fig.18) e efémeras. Em
áreas em que o predomínio era a actividade primária, os principais sistemas de
aproveitamento da força motriz da água encontrados são os moínhos e os lagares de
azeite. No que respeita, aos sistemas hidráulicos de regularização da escorrência
contam-se os travessões/barragens.
Ao longo dos tempos as estruturas hidráulicas permitiram o desenvolvimento de
outros equipamentos e de outras actividades, como são exemplos, as piscinas naturais
e os parques de campismo, que abundam na área de estudo e que impulsionam o
turismo local, nomeadamente nos períodos de estio.
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Fig. 21 - Muro com saliência, Porto Silvado. Fig. 22 - Laje de pedra para cancela, Cabeça.
3.2. Estado de Conservação3.2. Estado de Conservação3.2. Estado de Conservação3.2. Estado de Conservação3.2. Estado de Conservação
O estado de conservação do
património de socalcos foi definido tendo
em conta os socalcos em bom estado,
mau estado e destruídos. Estes, implicam,
tanto para a sua construção como, depois,
na sua manutenção, avultados
investimentos. Como estão muito
expostos à erosão, nomeadamente
hídrica, resultante da escorrência da água
das chuvas (fig. 23), a conservação dos socalcos depende de muitos factores e de
uma mão-de-obra abundante, para serem explorados, reconstruídos e, sempre que
necessário, preservados (fig. 24).
Habitualmente, o estado de conservação dos socalcos encontra-se determinado
pelo seu uso e, em caso de abandono, pela duração desse período (fig. 25). Para
facilitar o abandono contribuem as características construtivas dos muros de suporte,
determinadas pela litologia da área onde estão implantados, a exposição das vertentes
que influencia a produtividade e a altitude a que os socalcos se encontram, pois
condiciona a acessibilidade e a produtividade e, por conseguinte, o período de
abandono.
Foram ainda considerados outros elementos construtivos, tais como, saliências
de grandes blocos inseridos nos muros dos socalcos (fig.21), suportes para vinha,
muros de separação de propriedade e suporte em laje de pedra para cancela/porteira
(Fig. 22).
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A realidade corrente e os trabalhos realizados conduzem a um cenário que se
caracteriza por um avanço significativo do abandono da superfície agrícola utilizada e
um retrocesso do total da área cultivada. Embora o bom estado dos socalcos predomine,
existe já uma área expressiva de degradação. As principais observações de regressão
nos socalcos são, entre outros, desmoronamentos nos muros (fig. 26), avanço
progressivo da vegetação nos interstícios dos muros, ausência de trabalho agrícola,
presença permanente de gado nos espaços agrícolas.
Na análise desta variável denota-se a influência de factores conjunturais,
relacionados sobretudo com o processo de terciarização da população e que resultou
em importantes mudanças na ocupação do solo. Em resultado destas mudanças
salienta-se a predominância da superfície agrícola não utilizada e das matas e florestas.
Fig. 23 - Desmoronamento de muro, Loriga. Fig. 24 - Recuperação de muro, Piódão.
Fig. 25 - Estado de conservação, Cabeça. Fig. 26 - Muros desmoronados, Porto Silvado.
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3.3. Uso agrícola3.3. Uso agrícola3.3. Uso agrícola3.3. Uso agrícola3.3. Uso agrícola
O sistema agrário tradicional, praticado pelas
gentes de outrora, foi sendo substituído por uma
agricultura de complementaridade, em que predomina
a importância das unidades familiares, da
pluriactividade e da agricultura de consumo doméstico.
Deste modo, os usos e culturas agrícolas que
caracterizavam estas áreas de socalcos foram sofrendo
alterações ao sabor de um conjunto de factores, dos quais se destacam o
despovoamento humano e o abandono das terras.
Para este estudo o uso agrícola foi definido tendo em conta socalcos produtivos e
socalcos não produtivos. Em função da caracterização dos factores sociais e físicos,
que influenciam a presente configuração da paisagem de socalcos nesta área, pode
concluir-se que a área produtiva ainda é superior à área não produtiva (fig.27).
Com efeito, os socalcos não produtivos encontram-se, em grande parte, em
altitudes mais elevadas ou mais distantes dos aglomerados populacionais. De um
modo geral, estas áreas estão, muitas vezes, em sobreposição com socalcos destruídos
ou em mau estado de conservação.
Nos dias de hoje, a agricultura já não determina a actividade principal dos meios
rurais. A actividade agrícola apenas constitui o modo de vida dos mais idosos, sendo
praticada a tempo parcial, reflectindo apenas uma ocupação.
Fig. 27 - Uso agrícola nos campos em socalcos das bacias hidrográficas em estudo.
68%
32%
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O abandono agrícola é um facto consumado e esta conjuntura socio-económica
que caracteriza o sistema agrário actual causou alterações significativas no mosaico
agrícola das áreas rurais. A redução da superfície agrícola utilizada, acarreta graves
consequências ao nível da erosão dos solos, da mesma forma que, a reconversão
destes espaços em áreas florestais, aumenta o risco de ignição e propagação de
incêndios florestais (fig. 28).
O espaço agrário nas áreas de socalcos caracteriza-se pela fragmentação em
pequenas parcelas, dedicadas na sua maioria a uma policultura de subsistência com
escassa orientação comercial. A maior parte destas estruturas estão dedicadas ao
cultivo de produtos hortícolas, vinha em arjoado (fig.29) ou árvores de fruto (fig. 30),
havendo cada vez mais parcelas abandonadas, sem qualquer tipo de aproveitamento
agrícola (QUADRO II).
Fig. 28 - Socalcos não produtivos, Alentejo. Fig. 29 - Vinha em arjoado, Chão Sobral.
Quadro II: Principais culturas agrícolas.Árvores de fruto
Castanheiro (Castanea sativa)Cerejeira (Prunus avium)
Figueira (Ficus carica)Laranjeira (Citrus sinensis)Macieira (Malus domestica)
Medronheiro (Arbutus unedo)Nespereira (Eriobotrya japonica)
Nogueira (Juglans regia)Oliveira (Olea europaea)
Pessegueiro (Prunus persica)
Romãzeira (Punica granatum L.)Culturas hortícolas
Alface (Lactuca sativa L.)Alho (Allium sativum)
Batata (Solanum tuberosum L.)Cebola (Allium cepa)
Couve (Brassica oleracea L.)Ervilha (Pisum sativum L.)Feijão (Phaesolus vulgaris)
Milho (Zea mays)Salsa (Petroselinum sativum)
Vinha em arjoado Fig. 30 - Macieiras, Loriga.
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Em determinadas áreas ocupadas por espécies arbóreas, surge um sub-bosque
formado por medronheiros (Arbutus unedo), urzes (Erica sp.) ou silvados (Rubus
ulmifolius) (fig. 33).
Fig. 31 - Fisionomia vegetal, Cimo da Ribeira. Fig. 32 - Socalcos com olival, Piódão.
Fig. 33 - Silvado (Rubus ulmifolius), Cimo da Ribeira. Fig. 34 - Urze (Erica arborea), Cabeça.
3.4. Fisionomia vegetal3.4. Fisionomia vegetal3.4. Fisionomia vegetal3.4. Fisionomia vegetal3.4. Fisionomia vegetal
A fisionomia vegetal foi definida tendo em conta a ocupação dos socalcos com
formações arbóreas, arbustivas ou herbáceas (fig. 31). A fisionomia vegetal encontra-se
directamente relacionada com o estado de conservação dos socalcos, bem como com o
seu uso agrícola, sendo condicionada, ainda, pelas características geomorfológicas e
litológicas da área, predominando as formações arbóreas (fig.32).
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Fig. 36 - Socalcos com eucaliptos, Chão
Sobral.A área de socalcos encontra-se ainda
ocupada por muitas culturas agrícolas,
muito embora com avançado estado de
degradação, e, por outro lado, é utilizada
também para usufruto do gado que vai
mantendo o estrato herbáceo. As
formações arbóreas ocupam o segundo
lugar nesta contagem, e estão
relacionadas, sobretudo, com extensas
áreas de mato abandonado e com áreas
que têm sido alvo de reflorestações, pelo
que existe uma grande variedade de
espécies vegetais (QUADRO III).
Fig. 35 - Fisionomia vegetal, Cimo da Ribeira.
Quadro III - Principais espécies vegetais.
Nome Vernáculo EspéciePinheiro-bravo Pinus pinaster
Oliveira Olea europaeaCastanheiro Castanea sativa
Árvores de Fruto Prunus, Citrus, Malus, etc.Eucalipto Eucalyptus globulus
Carvalho-alvarinho Quercus robur
Nome Vernáculo EspécieGiesta Cytisus sp.Urze Erica sp.
Medronheiro Arbutus unedoTojo Ulex sp.
Carqueja Chamaespartium tridentatumEsteva Cistus ladanifer
Rosmaninho Lavandula stoechas
Nome Vernáculo EspécieFeto Pteridium aquilinum
Fumária Fumaria officinalisDedaleira Digitalis purpureaErvilhaca Vicis sp.
Campainhas Campanula lusitanica
Arbóreas
Arbustivas
Herbáceas
Por outro lado, as espécies arbustivas surgem, frequentemente, junto à base dos
muros ou até no próprio muro, não definindo portanto, uma área propriamente dita (fig.
34).
Quanto às formações arbóreas, podemos apontar três tipos diferentes de
ocupação. Por um lado, temos as situações de olival e de castanheiros, que de uma
forma geral continuam a ser aproveitados e mantêm-se «livres» do crescimento
desregrado do sub-bosque. Por outro lado, temos a existência de árvores de fruto, tais
como cerejeiras (Prunus avium), figueiras (Ficus carica), pessegueiros (Prunus persica)
ou macieiras (Malus domestica), que coabitam com pequenas hortas (fig. 35). Por
último, encontramos os povoamentos de pinheiro-bravo ou eucalipto, em resultado da
reconversão dos campos agrícolas (fig. 36).
NICIF - Núcleo de Investigação Científica de Incêndios Florestais / Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
- 19 -
Como já foi referido anteriormente, a leitura dos dados foi feita de forma contínua,
com um intervalo de 30 minutos, no período compreendido entre os meses de Janeiro
e Agosto de 2006. Para o projecto Terrisc, a importância destes dados é fulcral, na
medida em que ajudam a caracterizar as condições meteorológicas locais, e permitem
o cruzamento dos dados meteorológicos com os de escorrência registados nas
parcelas (fig. 38).
Fig. 37 - Vista geral do Piódão, Fevereiro de 2006.
Fig. 38 - Pormenor da ribª. de São Bento, Loriga, Março de 2006.
3.5. Condições meteorológicas locais3.5. Condições meteorológicas locais3.5. Condições meteorológicas locais3.5. Condições meteorológicas locais3.5. Condições meteorológicas locais
As observações meteorológicas foram realizadas a partir das estações instaladas
nas áreas-amostra do Piódão (fig. 37), no concelho de Arganil, do Colcurinho, em
Oliveira do Hospital e de Loriga, no município de Seia.
A estação meteorológica do Piódão encontra-se a 695m de altitude, numa latitude
de 40º13’42’’N e longitude de 7º49’44W. A estação do Colcurinho está a 650m de
altitude, numa latitude de 40º16’44’’N e longitude de 7º49’57’’W. A estação de Loriga
encontra-se a 633m de altitude numa latitude de 40º19’06’’N e longitude de 7º41’52’’W.
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Fig. 39 - Valores totais de precipitação etemperatura média.
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
Colcurinho Piódão Loriga
(mm)
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
20
(ºC)
Precipitação Total (mm) Temperatura média mensal (ºc)
Fig. 4 - Recolha periódica dos dadosmeteorológicos.
Fig. 41 - Temperatura média mensal e valoresextremos de máxima e minima, em Loriga.
A humidade relativa média das estações do Piódão, do Colcurinho e de Loriga foi,
respectivamente de 62,7 %, 63,4 % e 67,7 %, representando valores muito equitativos.
O vento soprou em média com uma velocidade de 1,2 km/h no Piódão, estação mais
abrigada, 3,9 km/h no Colcurinho (fig. 42) e 2,3 km/h em Loriga, e atingiu rajadas
máximas de 69,2 km/h, 85,3 km/h e 67,7 km/h. No que respeita à pressão atmosférica
média foi de 926,9 mb, 949,7 mb e 953,1 mb, respectivamente.
-5,0
0,05,0
10,0
15,020,0
25,0
30,035,0
40,0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set
(ºC)
média max. min.
Fig. 42 - Pormenor do anemómetro da estaçãometeorológica do Colcurinho.
O estudo revela que apesar das estações apresentarem algumas semelhanças
em termos de temperatura, existem diferenças algo significativas no que respeita aos
quantitativos pluviométricos (fig. 39).
Assim, e no referido período, a estação do Piódão registou um total de 831,4 mm
de chuva, fazendo desta área a mais chuvosa de entre os três concelhos. Em termos
de temperatura registou uma média de 14,4 ºC, com uma máxima absoluta de 38 ºC e
uma mínima de -3,4 ºC. No Colcurinho o total de precipitação foi de 634,4 mm. A
temperatura média foi de 14,9 ºC, com uma máxima absoluta de 38,5 ºC e uma mínima
de -3,5 ºC (fig. 40). A estação de Loriga registou 740,8 mm de chuva e temperatura
média 14,7 ºC, com uma máxima de 37,4 ºC e uma mínima de -4,7 ºC (fig. 41).
NICIF - Núcleo de Investigação Científica de Incêndios Florestais / Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
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Fig. 43 - Campos em socalcos e palheirosnuma vertente de elevado declive.
Fig. 44 - Campos em socalcos colmatados commaterial sedimentar grosseiro.
Os factores que mais contribuem, directa ou indirectamente, para a erosão naárea de estudo são a precipitação, o gelo, a topografia, o coberto vegetal e os incêndiosflorestais e a acção biológica dos animais.
A análise da erosão registada nas bacias hidrográficas foi realizada a partir dacomparação dos valores da precipitação, escorrência e material erosionado.
Apresentam-se os valores de escorrência em cada área-amostra totalizados noperíodo já referido, e contabilizados a partir dos valores obtidos pelas parcelas deerosão. Destaca-se a parcela experimental de Loriga com valores totais na ordem dos55 l/m2, que não são de estranhar dado ser o local mais próximo da Serra da Estrela,e que se encontram associados aos quantitativos de água proveniente do degeloverificado, tanto nos meses de Inverno como nos de Primavera.
3.6. Erosão nos socalcos3.6. Erosão nos socalcos3.6. Erosão nos socalcos3.6. Erosão nos socalcos3.6. Erosão nos socalcos
Os campos em socalcos revelam o esforço, a tenacidade e a capacidade de
adaptação e sobrevivência do ser humano, face a um ambiente hostil e repulsivo (fig.
43). A realidade mostra-nos que estas antigas estruturas são muito eficientes na
protecção contra a perda de material mineral dos campos agrícolas, favorecendo a
infiltração e fazendo aumentar a humidade do solo essencial para a instalação da
vegetação. No entanto, a ausência da sua utilização agrícola e, consequentemente, da
sua conservação a médio e longo prazo, vai acarretar uma destruição parcial ou total
dos muros de suporte dos socalcos, levando ao aumento do risco de movimentos em
massa, com a perda de todo o solo agrícola presente no patamar (fig. 44).
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Loriga Cabeça Piódão Porto Silvado Colcurinho Cimo da Ribeira
(mm)
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(l/m2)
Escorrência (l/m2) Precipitação Total
0
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30
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50
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Loriga Cabeça Piódão Porto Silvado Colcurinho Cimo da Ribeira
(l/m2)
0
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30
40
50
60
g/m2
Material Erosionado (g/m2) Escorrência (l/m2)
Fig. 45 - Escorrência total na área de estudo.
Fig. 47 - Material erosionado total na área deestudo.
Apesar da influência exercida pelo declive do patamar ou pela litologia, por
exemplo, conclui-se que as parcelas que apresentam maiores quantitativos de material
erosionado, correspondem ás áreas que tinham ardido recentemente, nomeadamente,
Cabeça e Porto Silvado (fig. 46). Deste modo, os incêndios florestais, ao eliminar o
referido factor de protecção oferecido pela vegetação, potenciam a erosão hídrica
acelerada (fig. 47) e a situação só fica regularizada após alguns meses, quando a
regeneração natural das espécies permitir uma cobertura protectora de gramíneas e
espécies arbustivas (fig. 48).
Fig. 46 - Parcela experimental de Cabeça.
Fig. 48 - Parcela experimental do Colcurinho.
30-11-2005 a 21/04/2006
30-11-2005 a 21/04/2006
O lugar da Cabeça, influenciado pelas condições de Loriga, verifica ainda valores
de escorrência elevados representando 39,2 l/m2. Estas áreas-amostra são as que
representam melhor a impermeabilidade do solo face à escorrência, se observarmos
a reduzida diferença entre precipitação e escorrência, propícios a uma erosão hídrica
que desencadeia movimentos de vertentes, como foi possível constatar nas incursões
ao terreno (fig. 45).
As restantes áreas apresentam valores de escorrência reduzidos se compararmos
com os de precipitação. No caso do Piódão a precipitação total foi de 692,3 mm, e a
escorrência ficou-se pelos 24 l/m2, constituindo uma área-amostra representativa no
que respeita à acção de permeabilização do solo e à prevenção da erosão hídrica.
Este é um dos casos em que os socalcos ao limitar a escorrência superficial favorecem
a infiltração, prevenindo situações de deslizamentos e desmoronamentos em vertentes.
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Fig. 50 - Propagação do incêndio em direcçãoa um povoado de montanha.
Fig. 49 - Paisagem da Serra do Açor afectadapelos incêndios florestais.
Se por um lado, milhares de hectares são queimados, dando lugar a uma
paisagem árida e sem recursos naturais, por outro, ouve-se o grito desesperado das
populações que perdem os seus bens materiais, e onde por vezes se perdem vidas.
Desta forma, e para este estudo foi essencial a análise histórica e geográfica dos
incêndios florestais (fig. 51).
Com efeito, pode concluir-se que, em termos de área ardida, a evolução é cíclica,
ou seja, após fases de maiores quantitativos, seguem-se anos a registar menores
áreas ardidas. Quanto ao número de ocorrências, a distribuição é mais irregular e
aparentemente, não se pode estabelecer um padrão evolutivo, com igual certeza, dado
que os valores máximos atingidos apresentam uma distribuição mais ou menos
aleatória, correspondente aos anos de 1992,1995, 1998 e 2005.
4. Riscos Naturais4. Riscos Naturais4. Riscos Naturais4. Riscos Naturais4. Riscos Naturais4.1. Campos em socalcos e os incêndios florestais4.1. Campos em socalcos e os incêndios florestais4.1. Campos em socalcos e os incêndios florestais4.1. Campos em socalcos e os incêndios florestais4.1. Campos em socalcos e os incêndios florestais
Portugal, como os restantes países do Mediterrâneo, é habitualmente confrontado
por situações de riscos naturais característicos do seu clima e das suas condições
geomorfológicas. No nosso país, e principalmente, nas áreas de montanha, os
incêndios florestais tornaram-se no agente mais agressivo na modificação da
paisagem (fig. 49). O projecto Terrisc contribuiu para um estudo aprofundado das
situações dendrocaustológicas de Portugal, nomeadamente na forma como os
socalcos podem contribuir para as mitigar, respondendo assim a um dos objectivos
do projecto, a prevenção de riscos naturais.
Importa aqui sublinhar as consequências destruidoras que, ano após ano, se
verificam com a passagem dos incêndios pelas florestas, matas e núcleos
habitacionais (fig.50).
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Fig. 51 - Evolução da área ardida e número de ocorrências, nos concelhos de Arganil, Oliveirado Hospital e Seia.
0
2000
4000
6000
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12000
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1993
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1995
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2000
2001
2002
2003
2004
2005
(ha)
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50
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250
300
350
400
450
500
(nº)
AA Total nº de ocorrências tendência NIF tendência AAT
Os anos com maior número de ocorrências nem sempre correspondem aos de
maiores áreas ardidas, pelo que do ponto de vista dendrocaustológico, houve anos
caracterizados pela ocorrência de incêndios florestais de grandes dimensões.
A carta de reincidência das áreas ardidas ao longo dos últimos 30 anos, permitiu
localizar as áreas mais afectadas e quantificar as diferenças existentes entre os
campos em socalcos próximos dos aglomerados populacionais e os espaços
agro-florestais circundantes, mais afastados (fig. 52).
Fig. 52 - Grau de reincidência de incêndios florestais nas bacias hidrográficas da área deestudo, ocorridos entre 1975 e 2005.
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Quadro IV - Distribuição da área de estudopor grau de reincidência entre 1975 e 2005.
Grau Total % C/socalcos % S/socalcos %
0 3151,3 22,0 682,0 4,8 2469,3 17,2
1 3685,5 25,7 662,0 4,6 3023,5 21,1
2 4758,3 33,2 427,5 3,0 4330,8 30,2
3 2431,0 17,0 73,3 0,5 2357,8 16,4
4 257,8 1,8 1,5 0,0 256,3 1,8
5 49,8 0,3 0,0 0,0 49,8 0,3
6 2,5 0,0 0,0 0,0 2,5 0,0
Total 14336,0 100,0 1846,3 12,9 12489,8 87,1
Área de Estudo
Área de Estudo - 14336 ha
0
1000
2000
3000
4000
5000
0 1 2 3 4 5 6
Grau
(ha)
Com Socalcos Sem Socalcos
Fig. 53 - Distribuição da área de estudo porgrau de reincidência entre 1975 e 2005.
Através deste estudo foi possível verificar que os socalcos agrícolas têm
desempenhado ao longo dos tempos, e em certas ocasiões, uma barreira à propagação
do fogo, quando estes se encontram em bom estado de conservação e produtivos (fig.
54). Por outro lado, em determinadas ocorrências verificadas em 2005 o mau estado
dos socalcos, cobertos de arbustos secos e outros mater iais faci lmente
combustíveis, favoreceram a propagação de frentes de fogo, dificultando igualmente
o seu combate (fig. 55).
Fig. 54 - Vista geral de Chão Sobral. Fig. 55 - Simultaneidade de estratos vegetais.
O objectivo principal foi o de destacar o papel desempenhado pelos socalcos
na compartimentação da floresta, e por conseguinte, na progressão do fogo.
Relativamente à área de estudo propriamente dita, pode verificar-se que a
área nunca atingida por incêndios florestais é de 22 % (QUADRO IV).
Em contrapart ida, as classes 1 e 2 registam os maiores efect ivos,
correspondendo a 58,9 % de área ardida, na sua totalidade. Finalmente, de referir
a percentagem mínima de 0,35 % registada nas classes 5 e 6, num total de 52,3 ha
relativos a uma área de cabeceiras de linhas de água, localizada no Monte do
Colcurinho e no Outeiro dos Penedos.
Mais especificamente, a reincidência das áreas ardidas em campos em
socalcos, concentra-se maioritariamente nos graus de reincidência 1 e 2, num
total de 7,6 % do total da área de estudo (Fig. 53).
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Como estruturas capazes de contrariar estes intensos processos erosivos,
mormente após os incêndios florestais, surgem os socalcos, pois enquanto se
mantêm conservados, funcionam como verdadeiras estruturas anti-erosão. Com efeito,
a comparação da erosão dos solos, após incêndios florestais, em socalcos e em
vertentes naturais, não deixa qualquer dúvida sobre a acção anti-erosiva dos socalcos,
mesmo em situações de temporal.
Fig. 56 - Gráfico termopluviométrico horário, dodia 14 de Julho de 2006, Piódão.
0
5
10
15
20
25
30
0:00
1:30
3:00
4:30
6:00
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9:00
10:30
12:00
13:30
15:00
16:30
18:00
19:30
21:00
22:30
(mm)
0
10
20
30
40(ºC)
Precipitação Total (mm) Temperatura média mensal (ºc)
Fig. 57 - Cheia de 16 de Junho, ribª. dePomares.
Fig. 58 - Destruição de estrada pela enxurrada, Piódão. Fig. 59 - Buscas da vitima mortal, rib.ª do Piódão.
4.2. Campos em socalcos e episódios pluviosos extremos4.2. Campos em socalcos e episódios pluviosos extremos4.2. Campos em socalcos e episódios pluviosos extremos4.2. Campos em socalcos e episódios pluviosos extremos4.2. Campos em socalcos e episódios pluviosos extremos
As serras do centro de Portugal são muitas vezes palco de fortes trovoadas, com
quantitativos pluviométricos muito elevados e concentrados, tanto no tempo como no
espaço (fig. 56). A inevitável perda de solos agrícolas, devido aos fenómenos extremos,
é muito potenciada pelos nefastos incêndios florestais que, insistentemente, fustigam
a área.
Na história, existem alguns episódios de intensa erosão hídrica acelerada dos
solos, principalmente após a ocorrência de grandes incêndios florestais, bem como,
o registo de cheias e inundações (fig. 57), destacando-se anos como de 1988 e 2006.
As chuvadas extremamente intensas e concentradas, verificadas na Serra do Açor,
deram origem a gigantescas enxurradas de pedra, terra e água (fig. 58), tendo, em
2006, levado mesmo à perda de um vida humana (fig. 59).
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5. Propostas de gestão e perspectivas5. Propostas de gestão e perspectivas5. Propostas de gestão e perspectivas5. Propostas de gestão e perspectivas5. Propostas de gestão e perspectivas
As perspectivas de futuro de uma área como esta, terão necessariamente de ser
audaciosas, mantendo uma visão integrada do território, tendo sempre em vista a
melhoria das condições de vida das populações locais, através da preservação e
valorização do património de socalcos. Apresentam-se então três propostas,
nomeadamente, da prevenção de riscos naturais, da preservação do património de
socalcos e de um roteiro turístico.
A recuperação das paisagens de socalcos é indissociável da prevenção dos riscos
naturais, uma vez que estes são os princípios responsáveis pela sua rápida
degradação, e já que é impossível fazer regressar os numerosos braços que, antes,
asseguraram a sua construção e preservação. Deste modo, só um esforço conjugado
entre o poder central do Estado, o poder local dos Municípios e os proprietários poderá
permitir a conservação dos socalcos mais emblemáticos deste vasto e valioso
património cultural dos povos da serra (fig.s 60, 61, 62,e 63).
Fig. 60 - Vista geral do Piódão. Fig. 61 - Vista geral de Loriga.
Fig. 62 - Casa de habitação abandonada,Colcurinho. Fig. 63 - Paisagem de socalcos, Cabeça.
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Para o efeito, o primeiro passo a ser dado passa pela prevenção dos riscos
naturais. Depois, pela valorização social do espaço de montanha, que permita aos
urbanos desfrutar das suas potencialidades e, em contrapartida, através de um turismo
sustentável, participem na viabilização económica desses espaços.
5.1.5.1.5.1.5.1.5.1. Pr Pr Pr Pr Preeeeevvvvvenção dos riscos naturais atraenção dos riscos naturais atraenção dos riscos naturais atraenção dos riscos naturais atraenção dos riscos naturais através da rvés da rvés da rvés da rvés da redução do riscoedução do riscoedução do riscoedução do riscoedução do riscode incêndio florestalde incêndio florestalde incêndio florestalde incêndio florestalde incêndio florestal
No que respeita à redução do risco de incêndio (fig. 64), apresentam-se uma série
de medidas que contribuem para a mitigação dos efeitos nefastos dos fogos florestais:
- Imediata rearborização de perímetros sob administração pública, privilegiando
espécies autóctones ou edafoclimaticamente adaptadas (fig. 65);
- Compartimentação do espaço através da introdução de ordenamento florestal
(infra-estruturas DFCI) em toda a área (fig. 66);
- Incentivo aos proprietários privados no sentido da reorganização e limpeza
das suas matas, nomeadamente, nos espaços circundantes às habitações (fig. 67).
Fig. 65 - Bosque de castanheiros, Loriga.
Fig. 66 - Falta de ordenamento florestal, ChãoSobral.
Fig. 67 - Falta de limpeza junto a habitações,Cimo da Ribeira.
Fig. 64 - Grande incêndio de Julho de 2005, Arganil.
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5.2. Preservação do património de socalcos5.2. Preservação do património de socalcos5.2. Preservação do património de socalcos5.2. Preservação do património de socalcos5.2. Preservação do património de socalcos
Nestas áreas serranas, os socalcos
constituem um forte elemento na afirmação
cultural das suas gentes. Após o exôdo rural
massivo que as afectou ao longo de várias
décadas, sente-se a necessidade de dar a
estes lugares uma nova vocação. O ponto
de partida, pode passar pela revitalização e
promoção dos saberes tradicionais com
vista á reabilitação do património construido.
Assim, para a preservação do património de socalcos sugerem-se as seguintes
medidas:
- Criação de um curso de formação profissional de alvenaria, como forma de
especializar técnicos em recuperação de muros e criar postos de trabalho;
- Restauração de algum património construído: casas de habitação, palheiras,
moinhos, lagares, etc (fig. 68).
- Desenvolvimento de rotas de interesse etnográfico:
- Rotas do azeite com a recuperação de lagares, para eco-museus, por exemplo;
- Rotas da gastronomia serrana, através da valorização de produtos regionais,
entre os quais, o mel, o queijo ou os enchidos;
- Rotas da transumância: identificação dos principais trilhos percorridos no
passado pelos pastores com os seus gados (fig. 69).
Fig. 68 - Palheira, Cabeça.Fig. 69 - Pastoreio em campos em socalcos,
Loriga.
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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É a partir destas três propostas ambiciosas, que se pretende dotar as áreas de
socalcos de condições estruturais para que estas se tornem numa alternativa
harmoniosa em termos turísticos e económicos garantindo sempre a sua
sustentabilidade cultural e patrimonial.
Com vista à integração destas rotas e de outras que possam vir a ser criadas,
com algumas já existentes, desenvolvemos um percurso integrado, adaptável a
diversas circunstâncias, cujo objectivo será o de disponibilizar uma série de informação,
em particular com referência aos socalcos, que facilite a visita a públicos diversificados
e com diferentes tempos disponíveis (fig. 71).
Assim, será possível combinar uma deslocação base em veículo automóvel com
percursos pedestres, tanto mais detalhados quanto maior for o tempo de que se
dispuser.
Fig. 71 - Praia fluvial, Loriga.Fig. 70 - Socalcos conservados, Aldeia das Dez.
5.3.5.3.5.3.5.3.5.3. Roteir Roteir Roteir Roteir Roteiro o o o o TTTTTurísticourísticourísticourísticourístico
No seio deste projecto, desenvolveu-se um conjunto de percursos turísticos que
compreendem a Paisagem Protegida da Serra do Açor e do Parque Natural da Serra
da Estrela. Com este roteiro pretende-se a valorização destas áreas de socalcos, que
se encontram nos últimos anos, muito distantes da realidade urbana, votados, cada
vez mais, ao despovoamento e ao esquecimento.
A partir deste objectivo, foi perspectivado um percurso geral que liga Arganil, Oliveira
do Hospital e Seia. Entre as sedes de concelho ligam-se uma série de locais no meio
de vilas e aldeias, encontrando potencialidades patrimoniais, arquitectónicas, físicas,
etnográficas, gastronómicas, entre muitas outras (fig. 70). Assim, pretende-se divulgar
estas regiões serranas, incentivando o turista a percorrer estes caminhos e contribuindo
assim para revitalizar estas regiões e dinamizar a economia local.
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Fig. 72 - A população residente é cada vezmais idosa, Colcurinho.
Fig. 73 - Campos em socacos abandonados,ardidos em Julho de 2005, Torno.
De facto, os incêndios têm constituído o agente mais agressivo na destruição das
áreas de socalcos (fig. 73). Os impactes ambientais são elevados e a evolução das
vertentes é condicionada. Não só os efeitos directos do fogo são prejudiciais, mas
também aqueles que lhes são subsequentes fazem-se sentir por longos períodos de
tempo. As áreas serranas do centro de Portugal têm sido particularmente afectadas
por estes fenómenos, alterando por completo a paisagem, em grande parte agora
preenchida por matos e espécies vegetais mais rentáveis economicamente.
Aos socalcos pouca atenção tem sido dada. Ano após ano a mancha de socalcos
vai diminuindo e estas estruturas ancestrais vão sofrendo o abandono e a degradação
que os poucos e envelhecidos habitantes serranos não conseguem inverter. Perante
estas constatações, urge a sua preservação, que aqui sublinhamos, pela
representatividade do património natural e cultural que estas estruturas constituem. A
revitalização e preservação de algumas delas poderiam impelir o desenvolvimento turístico
destas regiões, que assim se alheariam do anonimato a que têm sido votadas (fig. 74).
6. Considerações finais
A partir da investigação realizada nas bacias hidrográficas do rio Alvoco e da ribeira
de Pomares foi possível analisar um conjunto de parâmetros que se encontram
relacionados com a actual utilização dos socalcos agrícolas. O estudo realizado nos
concelhos da área de estudo, quer através da análise cartográfica em gabinete, quer
na confrontação do terreno, revelou um panorama em que a degradação avança, ao
mesmo tempo que se perde a população e as actividades agrícolas (fig. 72). Como se
constatou, fenómenos como a terciarização e o êxodo rural contribuíram grandemente
para grandes mudanças na ocupação do solo. Com esta realidade, o estrato arbóreo
avança sobre os campos agrícolas e estende-se a área de matos descuidados mais
susceptíveis a incêndios florestais.
P r o j e c t o Te r r i s c - R e c u p e r a ç ã o d e pa i s a g e n s d e socalco s e pr e v e n ç ã o d e ri s c o s na t u r a i s
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Só que, para que tal venha a suceder, os municípios envolvidos não poderão ficar
à espera de que sejam os outros a resolver-lhe os problemas. Como muitos outros
munícipios que já estão a transformar e a valorizar o seu património de socalcos, terão
de deitar mãos à obra, pois, se assim o fizerem, ficarão para a história por terem
transformado áreas votadas ao abandono em exemplos de sucesso (fig.s 75 e 76).
Caso contrário, ficarão também para a história, mas desta vez pela negativa, ou
seja, por não terem sabido explorar as possibilidades de financiamento que o novo
Quadro Comunitário de Apoio lhes oferece para a valorização desses espaços e,
como tal, contribuirão consciente e decisivamente para a sua degradação. Se assim o
fizerem, no futuro serão responsabilizados por isso.
É uma questão de opção.
Fig. 74 - Paisagem de socalcos preservada, Cabrizes.
Fig. 75 - Um bom exemplo de recuperação dopatrimónio, Foz de Égua.
Fig. 76 - Muros de elevada qualidadeconstrutiva, Portela do Arão.
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B i b l i o g r a f i aB i b l i o g r a f i aB i b l i o g r a f i aB i b l i o g r a f i aB i b l i o g r a f i a
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IndíceIndíceIndíceIndíceIndíce
Introdução -------------------------------------------------------------------------------------------------- 3
1. Enquadramento geográfico ------------------------------------------------------------------------ 5
1.1. Caracterização física ----------------------------------------------------------------- 5
1.2. Caracterização demográfica -------------------------------------------------------- 6
2. Metodologia -------------------------------------------------------------------------------------------- 7
3. Áreas-amostra e parcelas experimentais ----------------------------------------------------- 9
3.1. Estrutura ---------------------------------------------------------------------------------- 10
3.2. Estado de conservação -------------------------------------------------------------- 13
3.3. Uso agrícola -------------------------------------------------------------------------------- 15
3.4. Fisionomia vegetal ----------------------------------------------------------------------- 17
3.5. Condições meteorológicas locais --------------------------------------------------- 19
3.6. Erosão nos socalcos -------------------------------------------------------------------- 21
4. Riscos naturais --------------------------------------------------------------------------------------- 23
4.1. Campos em socalcos e os incêndios florestais -------------------------------- 23
4.2. Campos em socalcos e episódios pluviosos extremos ---------------------- 24
5. Propostas de gestão e perspectivas ----------------------------------------------------------- 27
5.1. Prevenção dos riscos naturais através da redução do risco de incêndio ---- 28
5.2. Preservação do património de socalcos ---------------------------------------- 29
5.3. Roteiro turístico ------------------------------------------------------------------------ 30
Considerações finais ----------------------------------------------------------------------------------- 31
Bibliografia ------------------------------------------------------------------------------------------------- 33
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Projecto TerriscRecuperação de Paisagens de Socalcos e
Prevenção de Riscos Naturais
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Aérodromo da Lousã, Chã do Freixo, 3200-395 LousãTel. 239 992 251 / Fax. 239 992 302
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Piódão
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Loriga
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