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MILHO I
OMILHONO BRASIL :
"CONSIDERA~OES
A
ECONOMICASJosé de Anchieta Monteiro.Jj
INTRODUÇÃO
Este trabalho tece considerações arespeito da situação econômica da produ-ção do milho no Brasil, sem esquecer as-pectos sociais e tecnol6gicos relevantes,mesmo porque em determinadas circuns-tâncias é impossível separã-Ios, Não se-gue automaticamente do exposto que seráum trabalho completo. Pelo contrário, elelevanta questões para a reflexão e nãopretende que os argumentos colocadossejam verdades fmais.
Em relação a outros trabalhos sobreo mesmo assunto (por exemplo: Moura &Oliveira 1980 e Garcia 1986), este buscacolocar questões adicionais ou mesmoquestões a partir de outro ângulo. Objeti-va, portanto, mostrar aspectos econômi-cos da situação atual da cultura do milhono Brasil.
A análise será concentrada na evolu-ção da produção brasileira nesta década,na origem desta produção por região e notamanho da fazenda e da lavoura e na suadistribuição. As perspectivas levantadasserão pura exploração, baseadas na reali-dade atual.
Muitos dos dados utilizados se refe-rem ao Censo Agropecuário de 1980,pois, infelizmente, algumas informaçõessemelhantes para 1985 não estão aindadisponíveis.
A PRODUÇÃO BRASILEIRANA DÉCADA DE 1980
A produção brasileira de núlho, queera de 20,5 milhões de toneladas em 1980,passa aos esperados 25,5 milhões em 1988(Quadro 1). O maior salto positivo acon-tece da safra 1985/86 para a safra1986/87 (29,87%), em função principal-mente dos estímulos do Plano Cruzado. Amaior perda verificou-se da safra1981/82 para a safra 1982/83, muito emrazão de problemas climáticos. O rendi-mento cultural mostra tímida tendência decrescimento no período, indo de1.770 kg/ha em 1980 para pr6ximo de2.000 kg/ha em 1988.
Conquanto o milho seja cultivado emtodo o país, há uma forte concentraçãonas regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste.Tomando-se como exemplo os dados dasafra 1985/86, verifica-se que 73% daárea foi cultivada nestas três regiões, ob-tendo-se aí 88% da produção nacional.Com oscilações naturais, a importância
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11 Eng9 Ang9, Ph. O, Pesq. EMBRAPAICNPMS, Caixa Posta/151- CEP 35700 Sete Lagoas, MG.
relativa dessas regiões se mantém ao lon-go do tempo.
A conseqüência imediata deste fato éque a média nacional do rendimento cul-tural do milho não reflete muito bem arealidade. Enquanto a média brasileira, nadécada de 1980, mal supera os1.800 kg/ha em alguns anos, no Centro-Sul com facilidade foram superados os2.000 kg/ha (Quadro 2). Em conseqüên-cia de as regiões Norte e Nordeste apre-sentarem condições desfavoráveis à pro-dução do núlho, elas contribuem com pe-quena parcela da produção e da área, ob-tendo assim baixo rendimento. Estas con-dições, entretanto, são refletidas na médiatotal.
A importância social e econômica domilho no Brasil se manifesta pela áreaocupada (mais de 13 milhões de ha), pelocontingente humano dedicado a ele (maisde 3 milhões de pessoas), pela sua amplaadaptação geográfica (cultivado em todopaís) (Garcia 1986) e também pelo valorda produção. A safra de 1986/87, a preçode julho de 1987, valeu mais que 70 bi-lhões de cruzados (EMBRAPA 1988),superando com folga os valores obtidospelo arroz, pelo feijão ou pelo trigo. Entreos grãos, apenas a soja o ultrapassa emvalor.
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MILHO I
QUADRO 1 - Evolução da Área, Produção e Rendimento de Milho no Brasil,1980$11988
11.586.19911.490.74912.601.26210.750.13512.204.340
FONTE: * ANUÁRIO ESTATÍSTICO DO BRASIL - vários anos.** INFORMATIVO GCEA-MG, 1988.
Os dados de 1988 são previsão.
rasil, 198€lili'%0
Centro-oeste Brasil
FONTE: ANUÁRIO ESTATÍSTICO DO BRASIL - vários anos.
A importância do milho no Brasil,em relação a outros produtos agrícolas,não tem implicado que o nível tecnol6gicocom que é conduzida a lavoura seja, tam-bém, mais elevado. Trabalhos experi-mentais mostram que rendimentos acimade 6.000 kg/ha podem ser obtidos coma tecnologia já disponível. O argumento émais discutido nas pr6ximas seções, quetratam da origem e do destino da produ-ção nacional de milho.
tamanho das lavouras. Em relação à ori-gem geográfica, o que se constata é agrande dispersão da produção, sendo omilho cultivado em todos os Estados dafederação. As limitações que ocorrem po-dem ser analisadas a partir das informa-ções do Quadro 2. Em estados e regiõesque apresentam muitas restrições, princi-palmente climáticas, como o Nordeste,observa-se rendimento cultural tão baixoque praticamente não há esurnulo para odesenvolvimento tecnol6gico. É mesmoprovável que no Centro-Sul o milho sejacultivado também em áreas marginais oupouco aptas à cultura.
O segundo ângulo da análise diz res-peito ao tamanho da fazenda onde é pro-
A ORIGEM DA PRODUÇÃONACIONAL DE MILHO
A origem da produção de milho podeser enfocada a partir de três ângulos: ori-gem geográfica, tamanho da fazenda e
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duzido o milho. Este enfoque tem a suaimportância respaldada no fato de haveruma forte concentração da propriedadeda terra no Brasil, afetando, como conse-qüência, a distribuição da renda no setoragrícola. A hip6tese básica utilizada é queos produtos agrícolas com maiores possi-bilidades comerciais, tanto com referênciaao mercado interno como ao internacio-nal, tendem a ser explorados por fazendasmaiores. As fazendas pequenas, por suaslimitações, são conduzidas a um tipo deagricultura de subsistência, em que os pe-quenos recursos existentes são dedicadosà produção de alimentos para consumo,restringindo-se a comercialização ao ex-cedente.
A parcela oriunda da pequena pro-priedade agrícola, no Brasil, é expressiva(Quadro 3). Novamente a informação nãoreflete claramente a realidade do país,pois há uma maior concentração da pro-dução a partir da pequena propriedade noNordeste. Contudo, esse quadro ainda émuito importante para estados como RioGrande do Sul e Santa Catarina. Mesmoem outros estados do Centro-Sul, nota-sea produção que tem origem na pequenapropriedade.
É importante notar que o rendimentoobtido em pequenas propriedades tende aser um pouco mais baixo que nas médias enas grandes. Este fato, possivelmente,tem a sua explicação na tecnologia deprodução mais baixa, em virtude do inte-resse do agricultor, e na dificuldade queele tem de fazer rotação de culturas oudeixar áreas em descanso, por suas limita-ções naturais.
Em terceiro lugar, deve-se conside-rar o tamanho das lavouras de milho, in-dependentemente do tamanho da fazenda.Assim, nota-se agora a importância dapequena lavoura (Quadro 4): 58,26% daárea e 52,57% da produção vêm de la-vouras de menos de 10 ha, Quase a meta-de da área (46,38%) é cultivada em la-vouras de 2 a 10 ha. Algum destaque énotado para áreas cultivadas entre 10 e50 ha. Apenas 7% da área cultivada commilho o foi em lavouras maiores que100 ha, obtendo-se 9,03% de produção.
O aumento do rendimento cultural, àmedida que cresce o tamanho da lavoura,é evidente pelos dados do Quadro 4, sig-nificando possíveis ganhos de escala como crescimento dela, ao mesmo tempo quepodem revelar diferenças de objetivos das
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MILHO I
, ,mQUADRO 3 - Area, Produção e Rendimento dê Milho, por Grupos de AreaTotal de Propriedade, Brasil, 1980
kg/ha
Área J{rodução RendimentoGrupos deÁrea Total
(ha) ha % %
1.952.0431.638.7982.353.0411.275.566
utl.026.0411
1.1911.6331.6051.5191.5351.619l.P?9
0- 1010- 2020- 5050-100
100-200200-500500-,maíS
Nota: Os totais dos Quadros 3 e 4 não são perfeitamente iguais por causa deproblemas de arrendamento e falta de informação.
FONTE: Censo Agropecuário 1980.
QUADRO 4 - Área, Produção e Rendimento deMilho, por Grupos de Área deColheita, Brasil, 1980
ÁreaGrupos deÁrea
Colheita! ba
Produção Rendimento
% %ha kg/ba
lavouras segundo a área ou limitações ã
adoção de novas técnicas. Contudo, aobservação pode ser invalidada, porquegrande parcela da pequena produção con-centra-se no Nordeste brasileiro, quemostra, notoriamente, baixos rendimen-tos.
portância relativa deles. Na regiao doAlto Paranaíba, em Minas Gerais, porexemplo, convivem a exploração capita-lista em grandes extensões (acima de100 ha, e não raro superando 500 ha delavoura) e a alta tecnologia; a média ex-ploração localizada em fazendas de pe-cuária e com uma finalidade maior deapoio a ela, com técnica de produção umpouco mais pobre; e a pequena lavoura,
Hoje é possível encontrar uma varia-da gama de sistemas de produção de mi-lho, e os dados agregados retratam a im-
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conduzida tradicionalmente em comuni-dades de pequenos proprietários, com fi-nalidade de consumo e comercialização doexcedente.
Os dados do Censo de 1980, do!BGE, revelam, adicionalmente, que noBrasil 45,82% da área foi plantada comsemente comum de onde se obtém 30% daprodução. Apenas no Centro-Sul, 31,33%da área foi ainda cultivada com sementecomum, obtendo-se 24,89% da produção.Tão séria quanto a anterior é a informa-ção de que, no mesmo ano, no Brasil,54,65% da área foi cultivada praticamentesem nenhuma adubação. Considerandoa região Centro-Sul isoladamente, perce-be-se 41,91% da área explorada semqualquer tipo de adubação.
As informaçõs aqui colocadas des-cortinam uma realidade que deve sempreser levada em conta nos estudos, planos eprogramas, oficiais ou não, que tenhampor objetivo estimular a produção e aprodutividade do milho. Acenam, poroutro lado, para o potencial da cultura seos principais pontos de estrangulamentopuderem ser superados.
o DESTINO DO MILHOPRODUZIDO NO BRASIL
O milho tem utilização ampla e va-riada no Brasil, predominando, boje, o seuuso como ingrediente de rações para ani-mais, principalmente aves e suínos. Umaparcela é destinada ã indústria de moagempara a produção de óleos e outros produ-tos industriais. Uma porção razoável daprodução é retida no próprio meio rural,onde é utilizada para alimentação animal ehumana. Esporadicamente o milho é ex-portado e outras vezes há importaçãopara complementar o consumo interno.
Embora não haja dados oficiais dis-poníveis, as perdas com milho da parteretida no meio rural para consumo sãoelevadas. Os paióis, via de regra, deixam adesejar com relação às características téc-nicas mínimas exigidas, estando, portanto,muito sujeitos a ataque de roedores e in-setos. A Comissão de Financiamento daProdução - CFP estima em 10% as perdastotais (Quadro 5), o que, para estudiososdo assunto, pode não representar o dadoreal, que deve ser mais alto.
Os dados do Quadro 5 oferecem oseguinte panorama, em relação ao destinoda produção brasileira de milho: cerca de60% do consumo total é classificado co-
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MILHO I
Consumo totalConsumo comercial
-Avie""tSuib·a !\Ii@. ' ::::0";'
- Outros animaiS-Moagem-Semente
Consumo Rural
FONTE: Alvares 1988.
Anos
mo consumo comercial, 30% fica retidono meio rural e 10% é perdido. Os valoresano a ano são muito próximos. Os 60% deconsumo comercial são, aproximadamen-te, assim distribuídos: 40% para avicul-tura; 27% a 29% para suinocultura; 9% a10% para alimentação de outros animais;20% a 22% para moagem; e próximo de1% para sementes.
A informação relativa à parcela des-tinada a semente deixa dúvida se se referea semente melhorada ou comum. O totaldaria para cerca de 7 milhões de ha, querepresentam próximo de 55% da área na-cional cultivada com milho. Aparente-mente refere-se à semente comum. Denovo, há dúvida com relação à inclusão,no consumo rural, do milho utilizado di-retamente como forragem.
Confirma-se, por estes dados, quenão há rotina de exportação de milho noBrasil. Essas, quando acontecem, são es-porádicas, e os custos internos de produ-ção e transporte afetam a competitividadedo milho nacional no mercado externo.
Há uma forte intervenção governa-mental no mercado interno de milho,principalmente através da política de pre-ços mínimos e crédito, cuja principal fina-lidade é assegurar o abastecimento inter-no, notadamente a parcela comercial, emnível de preços que não afetam o consu-mo dos produtos que utilizam o milhocomo insumo.
Os estímulos ou desestímulos à pro-dução afetam a parcela comercial da pro-dução (60%). Como regra, os produtores
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deverão assegurar o próprio consumo nomeio rural, no caso de desestímulo, e sa-crificar parte da área destinada à produ-ção comercial: Portanto, os incentivos àprodução nacional devem visar a essaparcela comercial. Na medida em que seamplia a demanda comercial por milho,haverá, como conseqüência, um aumentode produção, que poderá se dar, em parte,por aumento de área, mas hoje principal-mente por aumento de produtividade daterra, através da adoção de novas tecno-logias que já se acham à disposição dosprodutores.
A demanda comercial de milho é di-vidida em uma pequena parcela, formadapela possibilidade de industrialização domilho e outra, a maior, relacionada ao usocomo alimento animal. Essa última parte éuma demanda índireta. A ampliação daspossibilidades de industrialização terá semdúvida reflexo positivo na produção emodernização do milho. Os reflexos posi-tivos serão, contudo, mais sensíveis casohaja aumento da demanda por produtospecuários, ovos, carne e leite, o que podeacontecer por aumento de renda interna eatravés da ampliação de oportunidades nomercado externo.
CONCLUSÕESAs diferentes situações que existem
considerando-se a produção, e os varia-dos usos do milho, considerando-se oconsumo, revelam a um só tempo as limi-tações à modernização, o aumento deprodutividade da terra e as potencialida-
des que existem para esta modernização.Não há um toque mágico que possa
alterar rapidamente a situação, é claro. Énecessário um conhecimento mais pro-fundo do que ocorre no lado da produção,a fim de se buscarem as razões que a fa-zem assim, para que as propostas de mu-dança sejam mais efetivas e tenham maiorsucesso. Da mesma forma, no lado doconsumo, é necessário dimensionar aspotencialidades do uso do milho, 'atravésdo conhecimento dos entraves à sua ex-pansão.
As oportunidades de mercado porum lado e as opções que o produtor agrí-cola tem, de outro, são os ângulos daquestão que devem ser melhor dimensio-nados, para, a partir daí, se elaborarempolíticas coerentes e eficazes que condu-zam à modernização efetiva do milho noBrasil.
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REFER~NCIAS
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