o amor de cristo nos uniu - seminário de qualificação

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“O amor de Cristo nos uniu”: Construções identitárias e mudança social em narrativas de vida de gays cristãos do grupo Diversidade Católica Murilo Silva de Araújo Orientação: Prof.ª Dr.ª Maria Carmen Aires Gomes Mestrado em Letras | Estudos Linguísticos | UFV

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Page 1: O Amor de Cristo nos Uniu - Seminário de Qualificação

“O amor de Cristo nos uniu”: Construções identitárias e mudança social em narrativas de vida de gays cristãos do

grupo Diversidade Católica Murilo Silva de Araújo

Orientação: Prof.ª Dr.ª Maria Carmen Aires Gomes Mestrado em Letras | Estudos Linguísticos | UFV

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Introdução • Motivações:

– Tema interessante no contexto contemporâneo

• Conflitos entre religiosos e movimento LGBT

• Atuação de fundamentalistas cristãos na política

– Fé e homossexualidade em minha trajetória pessoal

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Introdução • Interesses de pesquisa:

– Como os participantes articulam as identidades gay e católica, que são tomadas como antagônicas?

– Como se relacionam com o discurso oficial da Igreja?

– A participação no Diversidade Católica perpassa as suas trajetórias de modo significativo, no que diz respeito ao processo de construção de suas identidades?

– Quais relações de poder e hegemonia se instalam nos seus discursos?

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Introdução • Lugar de pesquisa:

– Análise de Discurso Crítica (Fairclough, 2001 [1992], 2003; Chouliaraki & Fairclough, 1999)

– Instrumental útil para análise das questões relativas a identidades e representações sociais; e das disputas ideológicas de poder e hegemonia.

• Diálogos transdisciplinares – Teoria Queer (Butler, 2003 [1990]; Foucault, 1988 [1976]) – Teologia Moral Católica (Gomes & Trasferetti, 2011;

Catecismo da Igreja Católica e outros documentos) – Teologia Queer (Musskopf, 2003, 2005a, 2005b, 2008) – Antropologia (Natividade, 2006; Weiss de Jesus, 2010)

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Objetivos Objetivo geral:

Compreender, através de análise discursivo-crítica, os processos de construção e afirmação de uma identidade gay cristã, em narrativas de vida de membros do grupo Diversidade Católica, bem como as apropriações do discurso pelos sujeitos de pesquisa, como estratégia de intervenção e mudança nos contextos eclesiais e sociais.

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Objetivos • Objetivos específicos:

– Investigar na trajetória dos sujeitos importância da participação no grupo Diversidade Católica para o seu processo de afirmação identitária gay;

– Identificar no discurso dos participantes os modos de reconfiguração e contestação do discurso oficial da Igreja;

– Fomentar discussões no campo científico a respeito da relação entre sexualidades não-heterossexuais e a prática religiosa católica.

– Contribuir para o aumento da visibilidade de pessoas e grupos homossexuais católicos.

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Referencial Teórico

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Análise de Discurso Crítica

• Ramo da Linguística consolidado nos anos 90 – Desenvolvimento de agenda política engajada e

crítica no campo dos estudos linguísticos

• Chouliaraki & Fairclough (1999): questões sociais são questões sobre o discurso, e vice-versa. – Análises linguísticas/semióticas de textos e

interações têm um papel a desempenhar nas análises sociais;

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Análise de Discurso Crítica • Relação dialética:

– A linguagem, ao mesmo tempo em que é moldada e constrangida pela estrutura social, também tem poder de intervenção sobre essa estrutura, na medida em que constitui o mundo em significado.

– Análise social é importante porque justifica a investigação dos textos e discursos;

– Análise linguística é importante porque alimenta a crítica e possibilita compreender os problemas sociais;

• Análise do Discurso Textualmente Orientada (ADTO): Fairclough (2001 [1992], 2003); Chouliaraki & Fairclough, (1999).

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Conceitos fundamentais • Prática:

modos habitualizados, ligados a tempos e espaços particulares, em que as pessoas aplicam recursos (materiais ou simbólicos) para agir conjuntamente no mundo. (Chouliaraki & Fairclough, 1999)

– Momentos da prática: “partes” de práticas sociais particulares, que existem simultaneamente nelas, de modo a internalizarem e se articularem com outros momentos, sem serem reduzidos a eles.

• Discurso como momento discursivo das práticas sociais. • Momentos da prática possuem também os seus

“momentos internos”. No momento discursivo, os momentos internos se articulam em função das ordens do discurso: gêneros, discursos e estilos

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Três tipos de significado • Diálogo com a Linguística Sistêmico Funcional de

Halliday - noção de multifuncionalidade da linguagem

• Gêneros, discursos e estilos como três tipos de significado (em vez de funções): – Gêneros como modos de ação/interação: significado

acional – Discursos como modos de representação: significado

representacional – Estilos como modos de identificação: significado

identificacional

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Homossexualidade no catolicismo • Distinção entre homossexualidade e atos homossexuais.

– Reconhecimento de “tendências homossexuais profundamente enraizadas”

– Homossexualidade como tendência desordenada, mas que não constitui pecado, por si só.

• Fundamento do sexo/casamento: procriação – Práticas sexuais sem essa finalidade são contra a castidade.

– Atos homossexuais: mesma categoria de pecado que masturbação ou uso de preservativos

– Orientação pastoral: contenção sexual, celibato.

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Teoria Queer • Identidade como performance:

– As identidades, bem como o gênero, não são pré-discursivas, ou, em outro termo, “pré-formadas”. Pelo contrário, somos continuamente (e discursivamente) construídos por uma série de atos de identidade que desempenhamos como uma série de per-formances sociais e culturais.

– Não existe um “eu” fora do nível da linguagem, “uma vez que a identidade é uma prática significante, e os sujeitos culturalmente inteligíveis são efeitos e não causas dos discursos que ocultam a sua atividade.” (Salih, 2012, p. 91)

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Visões em confronto... • Na perspectiva católica: homossexualidade como “tendência profundamente enraizada” (portanto anterior, pré-discursiva), que pode – mas não deve - se manifestar em “atos homossexuais”.

• Na perspectiva queer: os “atos [performativos] homossexuais” são o que constituem, reproduzem e “perpetuam” a homossexualidade.

Caminhos essencialmente inversos...

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Uma teologia queer? • Proposta que causa certo estranhamento...

• Pessoas “queer” sempre produziram Teologia – mas não a partir de um “lugar queer” de reflexão.

• Teologias da Libertação: Teologia Negra, Feminista, Gay/Homossexual/Inclusiva, Queer.

• Proposta: entender como pessoas “queer” leem a Bíblia, e quais contribuições podem dar para a superação de “chaves de leitura” heteronormativas usadas na interpretação das Escrituras.

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Via(da)gens teológicas • Em consonância com o projeto da teoria queer, rompe

com binarismos criados em torno do gênero e da sexualidade, que são tomados como dados, pré-discursivos, anteriores à constituição do texto bíblico. – Olhar que parte não do texto em si, mas das experiências

corpóreas e performances queer, quem podem fornecer chaves de leitura problematizadoras (Musskopf, 2008).

– “O próprio contexto bíblico é queer na sua formação, não apresentando um modelo de identidade monolítico e excluindo outros” (Musskopf, 2003, p. 143)

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Metodologia e Análise de dados

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Contexto e participantes • Grupo Diversidade Católica

– Surgimento em 2006, no Rio de Janeiro

– Grupo de leigos católicos (gays e heterossexuais) acompanhados por um padre jesuíta, reunidos em uma CVX – Comunidade de Vida Cristã

– Interesse em formar um grupo católico inclusivo

– Julho de 2007: lançamento do site do grupo

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Contexto e participantes – Frentes de atuação:

• Acolhida e acompanhamento de gays católicos

• Trabalho de publicização do debate

– Consolidação do grupo

• Reuniões mensais/quinzenais

• Acompanhamento de iniciativas semelhantes no país

• Formação de rede com outras iniciativas pelo mundo

• Promoção de eventos de discussão e troca de experiência

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Passeata organizada com a ICM - Betel, em para protesto contra a derrubada no Kit Anti-Homofobia.

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Primeiro evento público do grupo. Início dos contatos da pesquisa

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Forte presença na mídia digital e impressa,

especialmente na época da JMJ Rio 2013

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Encontro de relatos e experiências organizado

durante a Jornada Mundial da Juventude. Participação

do grupo americano “Equally Blessed”

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Geração de dados • Cunho etnográfico da pesquisa

– Preferimos trabalhar com o contexto mais interno, e não com a atuação pública do grupo.

• Entrevistas semiestruturadas – Narrativas de vida

A narrativa está entre os mais importantes recursos de criação e manutenção de identidade pessoal. Ela é um recurso significante para criar o nosso senso interno e privado de si e é, mais ainda, um recurso para transmitir este senso para os outros, e negociá-lo com eles. (Linde, 1993, p. 98)

– 06 participantes voluntários – 03 homens gays, 01 homem bissexual, 02 mulheres lésbicas. Todos cissexuais.

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Procedimentos de análise de dados • Enquadre metodológico para a ADC

(Chouliaraki & Fairclough, 1999)

– Categorias de análise segundo Fairclough (2003)

– Análise textual: apoio em categorias da Gramática Sistêmico Funcional hallidayana (Gouveia, 2009; Fuzer & Cabral, 2010)

• Software: WordSmith Tools 6.0

– Ferramentas: Wordlist, Concordance

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Estágio atual de pesquisa • Análise do significado representacional

– Sistema de transitividade

– Como os participantes representam: • a si (ocorrências de “eu”, “mim” e “me”);

• a questões relacionadas à fé/igreja/religiosidade;

• à homossexualidade

• Apresentaremos aqui discussões prévias, a partir da “análise-piloto” de duas narrativas.

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Ester

Papeis assumidos por “eu”, “mim” e “me”, de acordo com o sistema de transitividade da GSF

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Ezequiel

Papeis assumidos por “eu”, “mim” e “me”, de acordo com o sistema de transitividade da GSF

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Ator Dizente Experienc. Portador Comport. Existente Circunst. Fenômeno Receptor Meta Benefic. Verbiagem

Ester 26,10% 10,90% 28,40% 18,50% 5,30% 0,30% 0,30% 1,00% 3,30% 4,30% 1,00% 0,70%

Ezequiel 21,40% 6,30% 39,60% 10,10% 0,60% 4,40% 4,40% 3,10% 4,40% 3,80% 1,90% 0,00%

0,00%

5,00%

10,00%

15,00%

20,00%

25,00%

30,00%

35,00%

40,00%

45,00%

Quan

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as (

em p

orce

nta

gem

) Representação de si – comparação de dados

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Sobre o “eu” • Ezequiel aparece mais significativamente como

Experienciador: maior uso de processos mentais.

– Em Ester: predominância de processos mentais perceptivos/cognitivos

– Em Ezequiel: predominância de processos mentais afetivos, geralmente associados a conflito e sofrimento.

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Ester eu me lembro da minha primeira aula de religião. Lá pelos meus 14, 15 anos, eu descobri essa coisa incrível que é a masturbação. Né? Tava na época. Aí eu ouvi que masturbação era pecado. (...). Mas aí assim: aí eu não entendia, porque assim, brigar, fazer malcriação pro pai, não sei quê, tudo bem, dá pra entender qual é o conceito do erro, porque você prejudica alguém, né? eu descobri que eu tinha sido apaixonada por uma menina no colégio. Que eu achava que era a minha melhor amiga, como geralmente acontece com as meninas, principalmente, né. Aí eu entendi, “ahh, eu era apaixonada por ela. Tá. Então eu sou gay” Porque eu sabia que era um pecado mais sério, aí eu não comungava mais.

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Ezequiel Porque eu lembro assim que uma das coisas que eu falei foi que desde que minha avó tinha morrido, eu nunca tinha me sentido tão próximo de Deus. Porque assim, o meu Deus era esse da minha avó, um Deus de amor, um Deus que me aceitava, um Deus que me amava. E depois que ela morreu, parece que eu fiquei buscando esse Deus na Igreja e não encontrava mais, não encontrei mais isso em lugar nenhum. E naquele momento ali, eu me reconciliei totalmente com a Igreja e realmente eu senti ali realmente isso, eu senti que eu voltei pra esse meu ponto de partida em relação a minha fé. não é em qualquer igreja, não é qualquer missa, não é qualquer padre que eu me sinto à vontade. Eu preciso que naquele momento eu me sinta preparado. E pra eu me sentir preparado, vai depender da igreja onde eu tô, do padre que tá celebrando, do meu momento naquele dia, de como que eu tô me sentindo.

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Sobre a sexualidade • Ester utiliza mais frequentemente de processos

relacionais atributivos, representando a si como “Portador”

– Relativa recorrência do termo “gay” como atributo, geralmente utilizado com o processo “ser”.

– Por outro lado, em Ezequiel, a homossexualidade é apenas pressuposta, com raras menções explícitas.

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Ester 8 anos eu descobri que eu era gay. E eu descobri que eu era gay. E eu descobri que eu era gay da forma mais... eu era ma smo. E eu descobri que eu era gay fazendo terapia. Em teoria

ada por ela. Tá. Então eu sou gay”. Tá. E aí eu avisei pra t os próximos assim, que eu era gay. E eu fiquei sendo gay. Ma eu era gay. E eu fiquei sendo gay. Mas tipo, eu nunca tinha

uns três ou quatro anos sendo gay sem nunca ter ficado com u Aí, nesse período que eu era gay sem nunca ter ficado com n as. Aí começa: “porque eu sou gay, padre”. Aí o padre já gel á me confessar, falar “eu sou gay, me perdoa”. Eu falava “eu me perdoa”. Eu falava “eu sou gay e queria saber porque que ue eu nunca fui falar “eu sou gay, me perdoa”. Nunca fui nes hegado à conclusão que eu era gay em noventa e... três. 92 p de que definitivamente eu era gay. Eu tinha ficado com uns t !... E definitivamente eu sou gay. Sem sombra de dúvida. Mas re Bartolomeu: “padre, eu sou gay, e queria entender porque dora? Ela já sabia que eu era gay. Acho que ela sabia. Mas e ive o padre, sabia que eu era gay. Foi nesse momento que pel sada com a Raquel, que eu sou gay, porque assim... quando to

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Ezequiel

E aí é uma questão que sempre aparece e eu vivo essa questão, e eu acho que vou viver pelo resto da minha vida...

Lá em Fortaleza também eu frequento a igreja (...). Nunca cheguei a falar nada, mas também não deixei de falar. Nunca falei pra ninguém, até porque é uma igreja bem... as pessoas que frequentam são bem conservadoras e tudo, não sei exatamente qual é a postura do padre lá...

(...) minha mãe ser uma pessoa que sabe tudo da minha vida depois de um longo processo também. (...) Eu nunca tinha sido completamente assumido com a minha mãe, a ponto de falar qualquer coisa.

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Sobre a religião • Como representam a Igreja e seu discurso?

• Recorrência da palavra “Igreja”; – Maior presença na narrativa de Ezequiel

– Termo quase não aparece com a função de “Dizente” (participantes não mencionam ou debatem aquilo que a Igreja “diz” ou “orienta”). “Achava muito difícil conseguir conciliar uma coisa com a outra justamente porque o magistério oficial da igreja é muito claro em relação aos atos homossexuais”

– Representação mais recorrente: circunstância de lugar

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Sobre a religião • Voz institucional reverberada na representação

de “padre” – como categoria genérica ou como sujeitos específicos.

• Recorrências:

– Ezequiel: “padre” como Dizente e como Ator;

– Ester: “padre” como Receptor e como Comportante;

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Ezequiel Agora nesse primeiro encontro, o padre Jeremias falou duas coisas fundamentais que me norteiam em relação a essa questão da confissão e da comunhão. Uma é que ele disse assim: “todos estão convidados a comungar. o padre daí, antes da comunhão, ele faz aquele preâmbulo que foi discutido também ontem na reunião: “só as pessoas que estejam preparadas e que se confessaram é que podem vir comungar”. Então, sabe? Não vou! Porque assim, pra eu me sentir preparado... Mas outra coisa que o padre falou nesse primeiro encontro, que eu também nunca esqueci, é que diz assim, que a hóstia não é uma medalha de bom comportamento. Então essa é uma coisa que eu também nunca me esqueço. Então eu me sinto autorizado a comungar.

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Ester Eu ia de igreja em igreja. Cada semana eu experimentava uma igreja diferente, descobria o horário da confissão e ia lá perguntar pro padre por que que masturbação era pecado!

Aí um dia lá vai a Ester se confessar com o pobre do padre Tobias. Aí começa: “porque eu sou gay, padre”. Aí o padre já gela, né? “Aí eu queria entender porque que isso é pecado”. Eu não ia lá me confessar, falar “eu sou gay, me perdoa”. Eu falava “eu sou gay e queria saber porque que isso é pecado!”

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Alguns apontamentos • Organização discursiva do conflito:

– Ezequiel: invisibilização da própria homossexualidade; demanda por tutela eclesial;

– Ester: conflito como confronto, no nível da razão.

• Diante da pergunta: “como pertencer a uma instituição que te condena?” – “Igreja” não representada como instituição: até que

ponto o discurso “oficial” interessa a esses sujeitos? – Pertencimento às redes de práticas: centralidade da

experiência da comunhão, vínculo maior com padres próximos, e não com a hierarquia.

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Próximas etapas • Aprofundamento das discussões nas análises das

outras narrativas. • Investigar mais aspectos sobre a representação

dos conflitos relacionados a fé e a homossexualidade – e a eventual superação deles.

• Analisar a representação do grupo Diversidade Católica, também a partir do sistema de transitividade;

• Análise de categorias relativas ao significado identificacional: modalidade e avaliação

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Referências Bibliográficas ARAÚJO, Murilo Silva de; CALEIRO, Maurício de Medeiros. A fé e os afetos: Diversidade Sexual, Catolicismo e Protestantismo em sites de grupos cristãos inclusivos In: XVI Congresso de Ciências da Comunicação da Região Sudeste, 2011, São Paulo. Anais do XVI Congresso de Comunicação da Região Sudeste. São Paulo: Intercom, 2011. ARAÚJO, Murilo Silva de. “E o que eu pregava, eu estava vivendo”: Identidade social e identidade discursiva na narrativa de vida de um católico gay. (no prelo) BUTLER, J. Problemas de Gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003 [1990]. CHOULIARAKI, Lilie; FAIRCLOUGH, Norman. Discourse in Late Modernity: Rethinking Critical Discourse Analysis. Edinburgh: Edinburgh University Press, 1999. FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e Mudança Social. Brasília: UnB, 2001 [1992]. ______. Analysing Discourse: Textual analysis for social research. New York: Routledge, 2003.

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NATIVIDADE, Marcelo. Homossexualidade, Gênero e Cura em Perspectivas Pastorais Evangélicas. Revista Brasileira de Ciências Sociais. vol. 21, no 61, junho/2006. NATIVIDADE, Marcelo; OLIVEIRA, Leandro de. Sexualidades ameaçadoras: religião e homofobia(s) em discursos evangélicos conservadores. Sexualidad, Salud y Sociedad - Revista Latinoamericana. n. 2, pp.121-161, 2009. PENNYCOOCK, Alastair. Uma linguística aplicada transgressiva. In. MOITA LOPES, Luis Paulo da (org.) Por uma Linguística Aplicada Indisciplinar. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. RAMALHO, Viviane; RESENDE, Viviane de Melo. Análise de Discurso (para a) Crítica: O texto como material de pesquisa. Campinas: Pontes, 2011.

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Obrigado! “corpo é alado corpo é sentido

corpo não é pecado corpo não é proibido

fora do corpo não há salvação

corpo é santo não é perdição.”