o ecomenismo de laudato si
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Hans Joachim Schellnhuber: Uma base comum - A encíclica papal, a ciência e a preservação do planeta Terra
Edgard de Assis Carvalho: Da crise ecológica ao pensamentocomplexo
Gaël Giraud:Da dívida ecológicaao débito do sistemafnanceiro com os
pobres
Chiara Frugoni:Uma outra facede São Franciscode Assis
Moema Miranda:Laudato Si’ - Aperspectiva sistêmicaque atualiza o debate
ambiental
O ECOmenismode Laudato Si’
IHU O
N - L I N E
Nº 469 | Ano XV03/08/2015
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Revista do Instituto Humanitas Unisinos
Da Crise Ecológica à Ecologia Integral
Josh Rosenau: Por uma ética da terra – Caminhos para
o desenvolvimento científco
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Frente ao paradigma tecnocráti-co dominante, a Carta Encícli-ca do Papa Francisco LaudatoSi’ sobre o cuidado da casa comum,coloca em causa o lugar do ser huma-no na contemporaneidade.
O texto se inscreve no contextoda realização da 21ª Conferência dasPartes da Convenção das Nações Uni-das sobre Mudanças Climáticas – COP21, a ser realizada em Paris, de 30 denovembro a 11 de dezembro de 2015.
A edição desta semana da revistaIHU On-Line debate o documentopontifício no contexto das mudançasclimáticas que desaam o cuidado dacasa comum. Participam do debatepesquisadores e pesquisadores dasmais variadas áreas do conhecimentocomo os cientistas abaixo:
- Josh Rosenau, diretor do Proje-to de Informação Pública da NationalCenter for Science Education – NCSEdos EUA;
- Jefferson Simões, glaciólogo eprofessor da Universidade Federal doRio Grande do Sul – UFRGS;
- Veerabhadran Ramanathan, daUniversidade da Califórnia, em SanDiego, EUA;
- Partha Dasgupta, da Universida-de de Manchester, no Reino Unido;
- Filipe Duarte Santos, diretor doCentro de Física Nuclear da Universi-dade de Lisboa, Portugal;
- Tercio Ambrizzi, doutor em Me-teorologia pela Universidade de Rea-ding, Inglaterra.
O pensamento econômico do PapaFrancisco, expresso na Encíclica eno discurso proferido no EncontroMundial de Movimentos Populares,em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia,é analisado por Gaël Giraud, econo-mista e jesuíta, diretor de pesquisado Centre National de la Recherche
Scientique - CNRS, membro do Cen-tro de Economia da Sorbonne e daEscola de Economia de Paris. Incisi-vo, ele constata que “a economia ne-oclássica fracassou completamenteem seu programa epistemológico queconsiste em excluir a justiça social docampo da economia”.
Igualmente o documento é debati-do por ambientalistas:
- Moema Miranda, antropóloga doInstituto Brasileiro de Análises Sociaise Econômicas – Ibase;
- Maurício Waldman, sociólogo eantropólogo, tradutor do ManifestoEco Modernista;
- Carlos Rittl, coordenador execu-tivo do Observatório do Clima;
- Jennifer Morgan, diretora do Cli-mate Program at the World ResourcesInstitute.
Uma leitura do texto bergoglianoà luz do paradigma da complexidadede Edgar Morin é feita por Edgard deAssis Carvalho, professor da Pontifí-cia Universidade Católica de São Pau-lo – PUC-SP.
A abordagem multidimensional daquestão ecológica é, igualmente, res-saltada por José Roque Junges, pro-fessor e pesquisador do PPG em Saú-de Coletiva da Unisinos e por PatrickViveret, lósofo e ensaísta francês.
A Carta Encíclica também é reeti-da por teólogos e teólogas:
- André Wenin, professor da Uni-versidade Católica de Louvain, naBélgica, e da Pontifícia Universida-de Gregoriana, Roma, que discute afundamentação exegético-bíblica dodocumento;
- Paulo Suess, assessor teológicodo Conselho Indigenista Missionário- CIMI, analisa e detalha os pontosfundamentais do documento à luz dodiscurso do Papa Francisco, acima re-ferido, proferido no Encontro Mundialde Movimentos Populares;
- Christiana Peppard, professorade Teologia, Ciência e Ética na For-dham University;
- Jame Schaefer, teóloga que le-ciona na Universidade de Marquette,em Milwaukee, Wisconsin, EUA;
- Christian Albini, teólogo leigoitaliano;
Chiara Frugoni, historiadora ita-liana de renome internacional nos es-tudos sobre a Idade Média, descrevetraços característicos de Francisco deAssis, que inspiram a Laudato Si’, acomeçar pelo título tomado do Cânti-co das Criaturas.
Por sua vez, Michael Czerny, je-
suíta, assessor do Conselho PontifícioJustiça e Paz, narra suscintamentealguns detalhes dos bastidores doprocesso de elaboração da LaudatoSi’.
Por m, a edição faz memória deDorothy Stang, assassinada na defesada Amazônia. A entrevista com Rose-anne Murphy, socióloga e religiosanorte-americana, e um testemunhode Jane Dwywer, companheira devida religiosa de Dorothy, completama edição.
A todas e a todos uma boa leitura euma ótima semana!
Crédito da imagem de capa: Yogendra/ickr-creative commons
Editorial
O ECOmenismo de Laudato Si’.Da Crise Ecológica à Ecologia Integral
A íntegra da Carta Encíclica Laudato Si’ pode ser lida, em português, disponível em http://bit.ly/1LDHeI5.
Instituto Humanitas Unisinos - IHU Av. Unisinos, 950São Leopoldo / RSCEP: 93022-000
Telefone: 51 3591 1122 | Ramal 4128e-mail: [email protected]
Diretor: Inácio NeutzlingGerente Administrativo: Jacinto
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A IHU On-Line é a revista do InstitutoHumanitas Unisinos - IHU. Esta publi-cação pode ser acessada às segundas-feirasno sítio www.ihu.unisinos.br e no endereço
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A versão impressa circula às terças-feiras, apartir das 8 horas, na Unisinos. O conteúdoda IHU On-Line é copyleft .
Diretor de RedaçãoInácio Neutzling ([email protected])
JornalistasJoão Vitor Santos - MTB 13.051/RS([email protected])Leslie Chaves – MTB 12.415/RS([email protected])Márcia Junges - MTB 9.447/RS([email protected])Patrícia Fachin - MTB 13.062/RS([email protected])
Ricardo Machado - MTB 15.598/RS([email protected])
RevisãoCarla Bigliardi
Projeto GráfcoRicardo Machado
EditoraçãoRafael Tarcísio Forneck
Atualização diária do sítioInácio Neutzling, César Sanson, PatríciaFachin, Cristina Guerini, Fernanda Forner,Matheus Freitas e Nahiene Machado.
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Destaques da Semana4 Baú da IHU On-Line6 Destaques On-Line8 Linha do Tempo10 Artigo da Semana - Hans Joachim Schellnhuber: Uma base comum - A encíclica papal, a ciência e a pre-
servação do planeta Terra
Tema de Capa
18 Jefferson Simões: O humanismo como resgate ético à ciência tecnocrática24 Josh Rosenau: Por uma ética da terra – Caminhos para o desenvolvimento cientíco29 Veerabhadran Ramanathan: Ecologia integral, um olhar cientíco sobre o conceito32 Partha Dasgupta: A sintonia na entre Laudato Si’ e as ciências econômicas, sociais e naturais34 Filipe Duarte Santos: Assumir problema climático como antropogênico. Primeiro passo para mudança37 Tercio Ambrizzi: A interdisciplinaridade das mudanças climáticas40 Gaël Giraud: Da dívida ecológica ao débito do sistema nanceiro com os pobres45 Maurício Waldman: Manifesto Eco Modernista e Laudato Si’: duas visões da crise ecológica52 Carlos Rittl: Laudato Si’: a novidade que provoca e agita a agenda ambiental58 Edgard de Assis Carvalho: Da crise ecológica ao pensamento complexo62 Moema Miranda: Laudato Si’: a perspectiva sistêmica que atualiza o debate ambiental68 Jennifer Morgan: Laudato Si’ para além da COP 2171 Michael Czerny: O grito da terra nos ecos da ciência. Laudato Si é a “Rerum Novarum de 2015”
74 André Wenin: As convergências entre a Bíblia, a Laudato Si’ e o tempo presente78 Chiara Frugoni: Uma outra face de São Francisco de Assis83 Christian Albini: De religiosa a laica e cientíca: as perspectivas de uma Encíclica91 Paulo Suess: Os ecos de Laudato Si’ e o discurso do Papa Francisco no Encontro dos Movimentos Populares
em Santa Cruz de la Sierra104 José Roque Junges: Ecologia Integral e justiça ambiental no cuidado da “casa comum”111 Jame Schaefer: O despertar da consciência116 Christiana Peppard: O novo e o velho na Encíclica de Francisco120 Patrick Viveret: A deserticação humana e ecológica124 Roseanne Murphy: A luta pela Ecologia Integral na Amazônia brasileira128 Jane Dwywer: Os conitos pela terra no norte do país e as Irmãs de Notre Dame de Namur
IHU em Revista132 Agenda de Eventos134 Publicações135 Retrovisor
Sumário
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Baú da IHU On-LineConra outras publicações do IHU sobre a Encíclica Laudato Si’
• Laudato Si’ – Prestemos atenção às notas de rodapé. Artigo publicado nas Notícias do Dia, de 25-06-2015, nosítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1SQaVH3
• ‘’Tudo está interligado’’: uma leitura comunicacional da Laudato si’. Artigo publicado nas Notícias do Dia,de 25-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1J9Z1Do
• Laudato Si’. Uma “Contemplatio” inspiradora. Artigo publicado nas Notícias do Dia, de 25-06-2015, no sítiodo IHU, disponível em http://bit.ly/1GC2l66
• O clima denitivamente entrou na pauta global. Artigo publicado nas Notícias do Dia, de 25-06-2015, no sítiodo IHU, disponível em http://bit.ly/1NlQ2At
• Laudato Si’. A encíclica do Papa Francisco cita um sábio muçulmano e Teilhard de Chardin. Reportagempublicada nas Notícias do Dia, de 25-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1RDhCK7
• Laudato Si’ é inspiração aos que querem fazer parte da solução. Artigo publicado nas Notícias do Dia, de25-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1eMnSTT
• Ban Ki-Moon visita o Papa Francisco para tratar da encíclica sobre o meio ambiente. Reportagem publicadanas Notícias do Dia, de 24-04-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1KfPTi0
• O núcleo teológico de Laudato Si’. Artigo publicado nas Notícias do Dia, de 24-06-2015, no sítio do IHU,disponível em http://bit.ly/1fJF24E
• Secretário-geral da ONU elogia encíclica papal que destaca mudanças climáticas como “questão moral”fundamental. Reportagem publicada nas Notícias do Dia, de 23-06-2015, no sítio do IHU, disponível http://bit.ly/1LKgXox
• Papa defende a ecologia e ataca a ideologia de gênero: uma contradição ou uma escolha? Reportagempublicada nas Notícias do Dia, de 23-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1LKfpL2
• “A Laudato Si’ é, talvez, o ato número 1 de um apelo para uma nova civilização”. Entrevista com Edgar
Morin publicada nas Notícias do Dia, de 23-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1J9UalJ• Laudato si’: um desao para os poderosos do mundo. Reportagem publicada nas Notícias do Dia, de 21-06-
2015, no sítio do IHU disponível em http://bit.ly/1LA39jm
• Para ambientalistas, encíclica de Francisco é um “presente”. Reportagem publicada nas Notícias do Dia, de19-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1Gxh2bt
• Laudato si’: a íntegra e um “guia” para a leitura da Encíclica. Reportagem publicada nas Notícias do Dia, de18-06-2015, no sítio do IHU, disponível em http://bit.ly/1eMcE1u
• Ecologia integral. A grande novidade da Laudato Si’. “Nem a ONU produziu um texto desta natureza’’.Entrevista com Leonardo Boff publicada nas Notícias do Dia, de 18-06-2015, no sítio do IHU, disponível emhttp://bit.ly/1SQ9tV1
• A ecologia integral do Papa Francisco. Artigo publicado nas Notícias do Dia, de 01-06-2015, no sítio do IHU,disponível em http://bit.ly/1RDcQMC
• Deus e a criação em uma era cientíca. Cadernos Teologia Pública de William R. Stoeger, 59ª edição, dispo-nível em http://bit.ly/1Hkkqfy
• Perdendo e encontrando a criação na tradição cristã. Cadernos Teologia Pública de Elizabeth A. Johnson,57ª edição, disponível em http://bit.ly/1NlQbE2
• Eucaristia e Ecologia. Cadernos Teologia Pública de Denis Edwards, 52ª edição, disponível em http://bit.ly/1J9ZXrp
• O Deus vivo em perspectiva cósmica. Cadernos Teologia Pública de Elizabeth A. Johnson, 51ª edição, dispo-nível em http://bit.ly/1NlQi2s
• Da possibilidade de morte da Terra à armação da vida. A teologia ecológica de Jürgen Moltmann. CadernosTeologia Pública de Sérgio Lopes Gonçalves, 23ª edição, disponível em http://bit.ly/1HkSaYc
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Destaques da
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TEMADESTAQUES DA SEMANA
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Destaques On-LineEntrevistas publicadas entre os dias 27-07-2015 e 30-07-2015 no sítio do IHU
Parque da Serra da Capivara: “Estamos vendo o m seaproximando”
Entrevista com Niéde Guidon, graduada em História Natural pela Universidadede São Paulo - USP, especialista em arqueologia pré-histórica, pela Sorbonne, Fran-ça. Integrante da Missão Arqueológica Franco-Brasileira, e atualmente DiretoraPresidente da Fundação Museu do Homem Americano.
Publicada em 30-07-2015
Disponível em http://bit.ly/1OQNwCZ
Depois de 40 anos desenvolvendo pesquisas e buscando fundos para manter oParque da Serra da Capivara, no Piauí, que tem “a maior concentração de sítioscom pinturas rupestres do mundo, um meio ambiente muito rico, ainda não com-pletamente estudado e monumentos geológicos fantásticos”, a arqueóloga NiédeGuidon é categórica ao armar que não vislumbra “nenhum” futuro para os pro-jetos que vêm sendo desenvolvidos até então. A falta de recursos nanceiros paradar continuidade ao projeto que vem sendo desenvolvido nas últimas quatro décadas tem tornado impossível“manter um corpo permanente de funcionários, os veículos e máquinas necessários para os trabalhos”, informa.
Na avaliação de Niéde, a atual situação do Parque da Serra da Capivara é o claro exemplo de que “o problema éque no Brasil há muitas leis, mas não são fornecidos recursos para que as mesmas sejam aplicadas”.
O imobilismo e a tentativa de resgatar o sentimentoprogressista
Entrevista com Talita Tibola, psicóloga e tradutora, doutora em Psicologia pelaUniversidade Federal Fluminense – UFF, integrante do Grupo PesquisarCom e daUniversidade Nômade. A pesquisadora participou do ciclo de Ocupas e de movi-mentos autônomos em Bologna, na Itália.
Publicada em 29-07-2015Disponível em http://bit.ly/1LZHjGu
Junho de 2013 signicou “a perda do medo e a retomada do político pela popu-lação”. Contudo, “depois de junho”, restaurou-se o medo, fragmentou-se a mobi-lização e houve uma divisão ainda maior entre partidos políticos e movimentos so-ciais, arma Talita Tibola, psicóloga que vem estudando as manifestações políticasque têm surgido no país nos últimos anos. Entre as divisões políticas acentuadaspós-junho, a psicóloga destaca a divisão no Partido dos Trabalhadores, a qual temcomo nalidade “conservar a unidade” do partido apesar das posições divergentes. “Contraditoriamente, nomomento em que o governo do PT é praticamente um governo de direita, o que é consenso inclusive entre osgrupos mais à esquerda, o ‘sentimento de esquerda’ é convocado para defender, no nal das contas, o governo.O resultado é mais imobilismo. Porque em vez de práticas, pautas, reinvenção, o que acontece é uma ação ba-seada na negação de algo, em ser ‘anti-direita’”, pontua.
Fonte imagem: www.ihu.unisinos.br
Fonte imagem: www.ihu.unisinos.br
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DE CAPA IHU EM REVISTA
SÃO LEOPOLDO, 03 DE AGOSTO DE 2015 | EDIÇÃO 469
Fonte imagem: www.ihu.unisinos.br
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Desmatamento silencioso da Caatinga tem intensicado adeserticação do semiárido brasileiro
Entrevista com Iêdo Bezerra de Sá, graduado em Engenharia Florestal pela Uni-versidade Federal Rural de Pernambuco, mestre em Sensoriamento Remoto peloInstituto Nacional de Pesquisas Espaciais, doutor em Geoprocessamento pela Uni-versidad Politécnica de Madrid, e pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária - Embrapa.Publicada em 28-07-2015
Disponível em http://bit.ly/1IqlP2T
Mais de 50% das áreas do semiárido brasileiro já “estão com processo de deser-ticação acentuado”, e cerca de 10 a 15% do território enfrenta uma situação dedeserticação severa. Para se ter uma ideia, a soma das extensões de terras de-gradadas no Ceará, na Bahia e em Pernambuco equivale a “63 mil km²” de deser-ticação, aponta Iêdo Bezerra de Sá. O pesquisador explica que a deserticação éum fenômeno de degradação ambiental que acontece particularmente em regiõesáridas, semiáridas e subúmidas secas, a exemplo do Nordeste e de parte do Sudeste brasileiro.
De acordo com o engenheiro orestal, no Brasil a deserticação no semiárido tem se agravado por causa do
desmatamento na Caatinga. “Ao desmatar a Caatinga, os solos cam completamente expostos a todas as intem-péries”, frisa. Além do desmatamento, Bezerra de Sá enfatiza que a irregularidade das chuvas contribui para quea degradação seja ainda mais acentuada em algumas regiões.
A história grega ainda está sendo escrita
Entrevista com Rodrigo Nunes, doutor em Filosoa pelo Goldsmiths College, Uni-versidade de Londres, e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio deJaneiro - PUC-Rio. É colaborador de diversas publicações nacionais e internacio-nais. Como organizador e educador popular, participou de diferentes iniciativasativistas, e foi membro do coletivo editorial de Turbulence, uma revista inuenteentre os movimentos sociais da Europa e da América do Norte.
Publicada em 27-07-2015Disponível em http://bit.ly/1Iu8Nl0
A crise grega, que já dura cinco anos, “não tem nenhuma perspectiva de ter-minar — pelo contrário, tende a se agravar com as novas medidas”, avalia Ro-drigo Nunes, que acaba de retornar de Atenas, após participar da conferênciaDemocracy Rising, da qual também participaram pessoas como Tariq Ali, CostasLapavitsas, Paul Mason, Zoe Konstantopoulou, Bruno Bosteels, Jodi Dean, SandroMezzadra, entre outros.
Na entrevista, Nunes diz que há muitas questões em aberto em relação à crise grega, em especial ao novomemorando anunciado pelo governo grego, resultado do novo acordo com a Troika, e ao futuro político de Tsiprase do Syriza de modo geral. Rodrigo Nunes lembra que o “Syriza se elegeu com a linha da ala moderada, majori-tária, do partido: acabar com a austeridade sem sair do Euro”. Entretanto, pontua, “a questão é: é possível teras duas coisas ao mesmo tempo?”
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Linha do TempoA IHU On-Line apresenta seis notícias publicadas no sítio do Instituto HumanitasUnisinos – IHU entre os dias 27-07-2015 e 31-07-2015, relacionadas a assuntosque tiveram repercussão ao longo da semana.
Belo Monte: modelopara aniquilar ospovos tradicionais
É um método requintado, apri-
morado durante a construção da
terceira maior hidrelétrica do
mundo, que atinge quase 40 milpessoas em uma população ori-
ginal de 100 mil, caso da cidade
de Altamira. São oito mil casas
destruídas, sendo que cinco mil
já foram abaixo. Parte da popu-
lação, chamados de beiradeiros,
porque vivem na beira do rio e
trabalham dentro da oresta,
é obrigada a optar: urbano ou
rural. Escolhe qual situação vai
aderir, ou ca sem nada. Esta é
a opção dada pela terceirizada
da Norte Energia S.A., a socie-
dade de propósito especíco,
responsável pela usina. O Insti-
tuto Socioambiental (ISA) elabo-
rou um Dossiê sobre Belo Monte.
Por um motivo fundamental: em
fevereiro deste ano, a empresaentrou com o pedido de Licença
de Operação, o que praticamen-
te encerra o poder de barganha
da população atingida, de conse-
guir amenizar seu sofrimento. A
reportagem é de Najar Tubino,
publicada por Carta Maior, em
29-07-2015.
Leia mais em http://bit.
ly/1U9rNcu
Com mortes, crisemigratória explodeno túnel do Canal daMancha
Houve milhares de tentativas
de entrada nos últimos dias, e
nove mortes desde junho. Umjovem migrante sudanês com
idade entre 25 e 30 anos morreu
na madrugada de 29-07-2015 no
túnel do Canal da Mancha, que
liga a França ao Reino Unido, se-
gundo informou a operadora Eu-
rotunnel. A vítima foi esmagada
por um caminhão ao qual tenta-
va subir. Centenas de migrantes
também em situação irregular
tentaram entrar durante a noite
nas instalações, além de outras
2.000 tentativas na véspera. A
Eurotunnel diz já ter intercepta-
do este ano até 37.000 pessoas
que tentaram penetrar de forma
ilegal em suas instalações. Com
esse novo drama, já são nove os
cidadãos da Etiópia e da Eritreia
mortos nessas condições desde
o início de junho. O ministrodo Interior francês, Bernard Ca-
zeneuve, anunciou que enviará
120 agentes complementares a
Calais para reforçar a segurança
na entrada do túnel. A reporta-
gem é de Ana Teruel e Pablo Gui-
món e publicada por El País, em
29-07-2015.
Leia mais em http://bit.
ly/1h7BdHd
Estará o Papa
negociando a soltura
de Paolo Dall’Oglio?
Apesar de inúmeros rumores,
nada mais se soube a respeito do
Pe. Paolo Dall’Oglio desde que
ele desapareceu na Síria há doisanos. Agora, o Papa Francisco
criou esperanças para o regresso
do padre jesuíta. A informação
foi publicada por The Daily Be-
ast, em 29-07-2015. A tradução é
de Isaque Gomes Correa.
Paolo Dall’Oglio, padre jesuíta
italiano de 60 anos de idade, foi
sequestrado enquanto caminha-va por Raqqa, na Síria, em 27 de
julho de 2013. Houve inúmeros
rumores de sua morte brutal nas
mãos de terroristas jihadistas, e
o mesmo acontece com as mui-
tas histórias de sua sobrevivên-
cia milagrosa supostamente por
causa da declarada oposição
que ele fez ao regime de Bashar
al-Assad. Porém, nunca o Esta-
do Islâmico reivindicou autoria
no sequestro do sacerdote, e a
família de Dall’Oglio diz que ele
está, diferentemente, sendo
mantido por um grupo ligado à Al
Qaeda, embora se saiba que nin-
guém nunca exigiu um resgate.
Leia mais em http://bit.
ly/1JxJQFW
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DE CAPA IHU EM REVISTA
SÃO LEOPOLDO, 03 DE AGOSTO DE 2015 | EDIÇÃO 469
Varoufakis quer criar
na Europa movimento
político transnacional
e antiausteridade
Entre os quadros da organiza-
ção, que não se apresenta como
partido, estarão os economistas
Paul Krugman e Joseph Stiglitz,
conforme noticia a imprensa eu-
ropeia. A reportagem foi publi-
cada no portal Opera Mundi, em
28-07-2015.
O ex-ministro das Finanças
grego Yanis Varoufakis está pre-
parando a criação de um novomovimento político cujo objeti-
vo será lutar contra o “austericí-
dio”, o suicídio provocado pelas
políticas de austeridade imposta
por credores internacionais. O
agrupamento terá alcance eu-
ropeu, plataforma transnacional
e deverá reivindicar mais demo-
cracia nas instituições da UniãoEuropeia. Liderado pelo próprio
Varoufakis, o novo grupo político
possivelmente se chamará Alian-
ça Europeia e pretende partici-
par das próximas eleições gregas
– previstas para 2019, caso não
haja antecipação.
Leia mais em http://bit.
ly/1eCVin0
A coragem da
desesperança
“A verdadeira coragem não é
imaginar uma alternativa, mas,
sim, aceitar as consequências
do fato de que não há uma al-ternativa claramente discerní-
vel: o sonho de uma alternativa
é um sinal da covardia teórica,
suas funções são como um feti-
che que evita que pensemos até
o nal de nossa elaboração. Em
outras palavras, a verdadeira
coragem é admitir que a luz ao
nal do túnel é a luz de outro
trem que se aproxima de nós na
direção oposta”, escreve Slavoj
Zizek, lósofo e crítico cultural.
Segundo ele, “a história recor-
rente da esquerda contemporâ-
nea é a de um líder ou partido
eleito com entusiasmo universal,
prometendo um “novo mundo”
(Mandela, Lula), mas, então,
cedo ou tarde, em geral, após
alguns anos, depara-se com o
dilema fundamental: atreve-se
a mexer nos mecanismos capi-
talistas ou decide “continuar o
jogo”?”, questiona.
Leia mais http://bit.
ly/1N439pv.
Gays e transexuaiscatólicos dos EUAquerem se encontrarcom o papa
Um grande grupo de católicos
gays e transexuais estaduniden-
ses quer se encontrar com o PapaFrancisco quando, em setembro
próximo, o pontíce realizará a
sua primeira visita aos Estados
Unidos. O objetivo é levá-lo a
tomar posição sobre as questões
de gênero e sexualidade, que
estão cada vez mais dividindo
os éis. A reportagem é do sítio
Askanews, e foi publicada em 27-
07-2015. A tradução é de MoisésSbardelotto.
Esse grupo de católicos quer
que o Papa Francisco aproveite a
sua popularidade para reconhe-
cê-los como membros de pleno
direito da Igreja, com um acesso
igual aos sacramentos como ba-
tismo e matrimônios. É verdade
que o seu ponticado, até ago-ra, se centrou em quem vive às
margens da sociedade, como os
pobres, os migrantes e os pre-
sos, mas ainda não está claro se
Jorge Mario Bergoglio incluirá
as minorias sexuais no conjunto
dos indivíduos que, segundo ele,
precisam de justiça.
Leia mais em http://bit.
ly/1LZyE78
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TEMADESTAQUES DA SEMANA
SÃO LEOPOLDO, 03 DE AGOSTO DE 2015 | EDIÇÃO 469
ARTIGO
Uma base comum - A encíclica papal, aciência e a preservação do planeta Terra
Por Hans Joachim Schellnhuber | Tradução Luis Sander
“A ciência é clara: o aquecimento global é movido pelas emissões de gases deefeito estufa que resultam da queima de combustíveis fósseis. Se deixarmos dereduzir fortemente essas emissões e reverter a curva do aquecimento, nós, nos-sos vizinhos e nossos lhos estaremos expostos a riscos intoleráveis”, arma HansJoachim Schellnhuber, pesquisador do Instituto de Pesquisa sobre o Impacto Cli-mático, Potsdam, Alemanha, e do Instituto de Pesquisa sobre Sistemas Complexos,Santa Fé, EUA.
Eis o artigo.
Laudato Si’, a Encíclica Papal,1 foi compilada em ummomento crucial na história da humanidade: hoje.
Defrontamo-nos com o grande desao de limitar oaquecimento global para um nível abaixo de 2 oC e, aomesmo tempo, fomentar o desenvolvimento para osmais pobres. Mas também estamos vivenciando umajanela de oportunidade especial porque o conheci-
mento sobre o sistema da Terra nunca foi maior doque hoje. Além disso, dispomos das soluções técnicase econômicas para superar os desaos com que nosconfrontamos.
A urgência de agir em relação a essas questões ur-gentes que se expressa na Encíclica reete os achadoscientícos que se acumularam até formar um conjuntoirresistível de evidências. A ciência é clara: o aque-cimento global é movido pelas emissões de gases deefeito estufa que resultam da queima de combustíveisfósseis. Se deixarmos de reduzir fortemente essas
emissões e reverter a curva do aquecimento, nós,nossos vizinhos e nossos lhos estaremos expostos
a riscos intoleráveis. O consenso cientíco represen-tado pelo Painel Intergovernamental sobre MudançasClimáticas (IPCC, na sigla em inglês) tem sido rear-mado continuamente pelas mais eminentes academiascientícas, incluindo a Pontifícia Academia das Ciên-cias e a Pontifícia Academia das Ciências Sociais, quese reuniram várias vezes ao longo dos últimos anospara abordar os temas da mudança climática e da
1 Papa Francisco, Carta Encíclica Laudato Si’: Sobre o cuidado da casacomum. Cidade do Vaticano, 2015. (Nota do autor)
sustentabilidade global)2. Já que qualquer adiamentoadicional de medidas de mitigação podem ameaçar aestabilidade climática e, assim, nosso futuro, está nahora de formar alianças, encontrar terreno comum eagir juntos como humanidade – mas também de assu-mir responsabilidade individual e mudar o que está emnosso poder mudar.
O que fzemos
A produção de energia à base de combustíveis fósseisem larga escala que foi iniciada pela Revolução Indus-trial e acelerada no século XX levou a um grande de-senvolvimento humano – para uma minoria. Para muitopoucos, ela gerou extrema riqueza. Do outro lado dessedesenvolvimento se encontram os pobres e os mais po-bres dentre os pobres. A violência estrutural desse de-senvolvimento predetermina a vida deles. As fontes deenergia de combustíveis fósseis são bens privados, de
propriedade de empresas ou controlados por governos.Assim, o acesso à energia depende em grande parte dosrecursos nanceiros do indivíduo. Segue-se que a utili-zação da energia de combustíveis fósseis e os avanços
2 Pontical Academy of Sciences and Pontical Academy of Social Sciences. Sustainable Humanity Sustainable Nature: Our Respon-sibility. Vatican City, 2014; A Report by the Working Group Com-missioned by the Pontical Academy of Sciences: Fate of MountainGlaciers in the Anthropocene. 2011; Pontical Academy of Sciences.
Declaration of Religious Leaders, Political Leaders, Business Lea-ders, Scientists and Development Practitioners. Vatican City, 2015;
P. Dasgupta, V. Ramanathan, P. Raven, M. Sánchez Sorondo, M. Archer, P. J. Crutzen, P. Léna, M. J. Molina, M. Rees, J. Sachs, H. J. Schellnhuber. Climate Change and the Common Good: A Statement
of the Problem and the Demand for Transformative Solutions. Vati-can City, 2015. (Nota do autor)
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tecnológicos a ela conectados levaram a disparidadessem precedentes e a um uso excessivo e esbanjadorde recursos. A história do uso do carbono por parte dahumanidade é uma história de exploração.
Figura 1:
Distribuição das emissões globais de carbono pela popu-lação mundial (agrupada em países e classicada por seu
grau de riqueza). A parte esquerda da curva é “plana”,indicando que o bilhão na base não contribui com virtu-almente nada para o aquecimento global. Além disso, os
grupos de renda mais baixa pouco contribuem para asemissões globais na média. A parte direita da curva é“íngreme”, indicando o quanto mais o estilo de vida do
indivíduo médio em países ricos contribui para o proble-ma global total.
Fontes dos dados: CDIAC para as emissões e Penn WorldTables 8.0 para o PIB e a população. Os dados necessáriosnão estavam disponíveis para todos os países; daí a dife-rença para com o número efetivo da população mundialde mais de 7 bilhões.
Mas os pobres não só foram excluídos da participaçãono progresso humano; agora são forçados a enfrentarum horrível subproduto dele: a mudança climática. Issoconstitui uma inaceitável desigualdade dupla: os pobres
são responsáveis por uma parte diminuta das emissõesglobais (gura 1), mas têm de arcar com as maioresconsequências. Ao contrário do que têm armado al-guns, não é a massa das pessoas pobres que destrói oplaneta, mas o consumo dos ricos. O aquecimento glo-bal é a consequência desse desenvolvimento de algunspoucos e irá afetar todo o mundo, mas traz devastaçãoespecialmente para os mais débeis na sociedade. Comodestacou a Encíclica, não é possível atacar a mudançaclimática e a pobreza consecutivamente, em qualquersequência. É indispensável enfrentá-las simultanea-mente, pois o desenvolvimento humano está profunda-
mente entrelaçado com os serviços que a Terra presta.
Se esses serviços estiverem ameaçados em função dadestruição ambiental produzida pelo ser humano, ospobres serão os primeiros a sofrer. Eles vivem em áreasexpostas e não têm recursos para se adaptar a um cli-ma que está mudando. Além disso, alguns dos impactosclimáticos afetarão desproporcionalmente muitos dospaíses em desenvolvimento.
Atualmente, as disparidades estão enraizadas tãoprofundamente que os pobres cam sem voz, estandoconscientes das mudanças em seu meio ambiente, massem qualquer conhecimento sobre as causas subjacen-tes. Eles são continuamente impedidos de formar umaopinião sobre a mudança climática porque carecem deeducação formal; entretanto, sua necessidade de umavida digna tem sido repetidamente abusada como pre-texto para a inação em relação à mudança climática.Até agora, a dignidade tem permanecido algo impossí-vel de atingir para os muitos que vivem em seu própriolixo e no lixo de outros, sem acesso a água potável, ex-
postos a riscos ambientais e desprovidos do poder paramoldar seu próprio futuro. O sofrimento desnecessáriopelos qual os pobres têm tido de passar em um mundode abundância não pode mais ser aceito.
Nós já não só violamos as fronteiras morais de nos-sa sociedade civil global, mas também estamos dei-xando o espaço operacional seguro de nosso planetaao ultrapassar barreiras de segurança planetárias.3 A continuação dessa trajetória de desenvolvimentonão trará prosperidade para todos, mas poderá ter-minar em desastre para a maioria. Mas não se trata
de um destino inevitável ao qual a humanidade temde sucumbir. Visto que a mudança climática é obra doser humano, também está em nossas mãos revertera tendência. Embora o sistema da Terra se caracteri-ze por grandes complexidades e mais pesquisas sejamnecessárias em muitas áreas, o conhecimento cientí-co sobre os impactos da mudança climática já é tãoprofundo que será impossível alegar ignorância parajusticar nossa inação.
O que aprendemos
“Se o Senhor Todo-Poderoso tivesse me consultadoantes de empreender a Criação, eu teria recomendadoalgo mais simples”, disse Alonso X de Castela no séculoXIII. Se esse conselho tivesse sido aceito, nós teríamossido privados da extraordinária alegria que reside naadmiração da complexidade que nos cerca – da próprianatureza. Até mesmo um matemático com a mais abs-trata das mentes reconhece o espantoso mistério queestá atrás do fato de que uma equação aparentemente
3 W. Steffen, K. Richardson, J. Rockström, S. Cornell, I. Fetzer, E. Ben-nett, R. Biggs, S. R. Carpenter, C. a. de Wit, C. Folke, G. Mace, L. M.Persson, R. Veerabhadran, B. Reyers, S. Sörlin. Planetary boundaries:
Guiding human development on a changing planet. Science (80-. ), v.347, n. 6223, p. 1259855, 2015. (Nota do autor)
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muito simples pode se transformar maravilhosamenteem um belo e intrincado quadro. O clima da Terra (emviva concorrência com o cérebro humano) constitui,talvez, uma das mais empolgantes manifestações des-sa complexidade [1, nº 20]. Nós vivemos em uma eraque nos concede o privilégio de basear-nos em séculosde tradição nas ciências naturais movida pela curiosi-
dade humana – isso nos possibilita, mais do que nuncaantes, avaliar as causas da mudança do clima.
Tive a honra de aprofundar esse assunto em umacontribuição para uma ocina realizada pelas Pontifí-cias Academias das Ciências e intitulada “HumanidadeSustentável, Natureza Sustentável: Nossa Responsabi-lidade”, no ano passado.4 Ela arma que “o sistemaclimático é um tecido extremamente delicado de com-ponentes planetários interligados (como a atmosfera,os oceanos, a criosfera, os solos e os ecossistemas)que interagem por meio de intrincados processos físi-cos, químicos, geológicos e biológicos (como, p. ex.,adveccção, ressurgência, sedimentação, oxidação, fo-tossíntese e evapotranspiração). [...] No nal das con-tas, damo-nos conta do fato de que puxar um únicoo poderia ter o potencial de romper o tecido todo.”
Esse tecido constitui o paraquedas de nosso voo diá-rio no ambiente que nos cerca, abalado pelas podero-sas forças da natureza – e, ainda assim, um pequeno eprivilegiado grupo da humanidade vem puxando os demodo cada vez mais vigoroso desde o início da Revolu-ção Industrial no século XVIII. Em decorrência disso, jácomeçamos a entrar em parafuso. Por exemplo, após
uma “década de extremos climáticos”,5 está claroagora que os recordes locais de calor acontecem cercade cinco vezes mais frequentemente do que o fariamem um clima não mudado – isto é, com um paraquedasintacto.6 Ao mesmo tempo, embora ainda esteja longedemais para ser diretamente visível para a maioria denós (mas não para todos!), uma turbulência signica-tiva está se aproximando inexoravelmente: quase 20cm de aumento médio global do nível do mar desde1880, por exemplo, está começando a impactar socie-dades inteiras, e a água está levando o chão em queelas vivem ou degradando o solo em que plantam seus
alimentos pela intrusão da água do mar.
A elevação do nível do mar ilustra claramente muitosdilemas muitas vezes implicados também em outrosimpactos da mudança climática. Os níveis crescentes,por exemplo, são causados, por um lado, pela expan-
4 H. J. Schellnhuber, M. A. Martin. Climate-system tipping points andextreme weather events. In: Pontical Academy of Sciences and Pon-tical Academy of Social Sciences. Sustainable Humanity, SustainableNature: Our Responsibility. 2014. (Nota do autor)5 D. Coumou, S. Rahmstorf. A decade of weather extremes. Nat. Clim.Chang., mar. 2012. (Nota do autor)6 D. Coumou, A. Robinson, S. Rahmstorf. Global increase in record-
breaking monthly mean temperatures. Clim. Change, 2013. (Nota doautor)
são da água do mar à medida que ela se aquece e,por outro lado, pela quantidade adicional de água emnossas bacias oceânicas em razão do derretimento dasgeleiras e calotas de gelo. Visto que a maior parte dogelo da Terra – herdado de muitas eras glaciais ao lon-go de incontáveis milênios – está localizada perto dospolos na Groenlândia e no Continente Antártico, sua
perda por derretimento reduz a força gravitacional elibera a água, que utua mais na direção do Equador.Essa é a região do globo onde vive a maior parte daspessoas que não têm condições de comprar paraque-das de reserva em forma de terrenos em locais maiselevados. Outro dilema reside no longo lapso de tempoentre a causa e o efeito – o tecido já danicado vai sedesar cada vez mais, silenciosa mas inexoravelmente,até que as consequências não possam mais ser ignora-das. Mudanças no uxo do gelo que estão acontecendoagora, por exemplo, em uma grande bacia glaciar naAntártica ocidental7 parecem ter sido desencadeadas
por águas oceânicas quentes que banham as línguas degelo dos glaciares. Mas a aceleração do uxo do gelodaí resultante provavelmente não pode, depois de ini-ciada, ser detida por causa da existência de não linea-ridades na dinâmica subjacente. Isso signica que, emúltima análise, cerca de 1,2 m de elevação do nível domar – além de todas as contribuições esperadas da in-terferência humana no sistema climático – têm de seresperados daquela única fonte nos séculos vindouros.
A manta de gelo da Antártica ocidental é – por causada não linearidade mencionada acima – um exemplo
clássico de elemento de ruptura no sistema da Terra.8
Mas há muitos mais: das mantas de gelo e geleiraspara os solos permanentemente gelados na vastidãoda Sibéria e na América do Norte setentrional, os sis-temas de monções, a Corrente de Jato e o padrão ElNiño-Oscilação Meridional, e para sistemas biológicoscomo os recifes de corais ou a Floresta Amazônica. Oque eles têm em comum é que mudanças fundamen-tais de estado, causadas por uma perturbação exter-na relativamente pequena, são possíveis por causada complexidade do sistema não linear associado aeles. Embora a respectiva dinâmica desses elementos
esteja começando a ser melhor entendida, nossa ca-pacidade como seres humanos para compreender in-tuitivamente não linearidades é surpreendentementelimitada: em nossa experiência cotidiana, a causa eo efeito geralmente estão estreitamente conectadosno tempo, espaço e extensão. Esse, entretanto, nãoé o caso dos elementos de ruptura: a mudança cli-
7 E. Rignot, J. Mouginot, M. Morlighem, H. Seroussi, B. Scheuchl. Wi-despread, rapid grounding line retreat of Pine Island, Thwaites, Smith,and Kohler glaciers, West Antarctica, from 1992 to 2011. Geophys. Res.Lett., v. 41, p. 3502-3509, 2014; I. Joughin, B. E. Smith, B. Medley.Marine ice sheet collapse potentially underway for the Thwaites Gla-cier Basin, West Antarctica. Science, v. 735, maio 2014. (Nota do autor)
8 H. J. Schellnhuber. Tipping elements in the Earth system. Proc. Natl. Acad. Sci., v. 106, n. 49, p. 20561-3, dez. 2009. (Nota do autor)
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mática causada por essa diminuta molécula de CO2
pode desencadear disrupções súbitas, irreversíveise de grande escala nos sistemas físicos e ecológi-cos interligados que mencionamos acima. Por isso,é de suma importância para a comunidade cientícacomunicar claramente os riscos implicados na altera-ção de nosso clima – ultrapassar certos limiares pode
transformar buraquinhos no tecido em buracões cadavez maiores.
A visualização desses riscos na Figura 2 visa tornarvívidos esses resultados cientícos às vezes áridos:ela ilustra um raciocínio crucial que está por trás daconhecida barreira dos 2 ºC. Enquanto que, por mui-tos milênios, a civilização humana teve o privilégio dedesfrutar de uma temperatura em grande parte está-vel da Terra (em azul), estamos agora a caminho deabandonar esse paraíso climático, como mostra cla-ramente o forte aumento da temperatura (em preto).Dependendo das opções que zermos hoje, em nossofuturo poderemos seguir o caminho verde, respeitandoa barreira dos 2 ºC, ou – se continuarmos no mesmo rit-mo – as emissões dos gases de efeito estufa nos levarãopara o caminho vermelho, passando dos 4 ºC por voltado nal deste século e com níveis de aquecimento ain-da mais elevados depois disso.
Figura 2:
Evolução da temperatura global média da superfície des-de o Último Máximo Glacial até o Holoceno, com baseem dados proxy paleoclimáticos9 (cinza claro), mediçõesinstrumentais desde 1750 (dados HadCRUT, preto) e di-
ferentes cenários do aquecimento global para o futuro(veja [15] quanto a estes últimos). Faixas de limiares para a ultrapassagem de vários pontos de ruptura emque importantes subsistemas do sistema climático se de-sestabilizam são acrescentados a partir de referências.10
9 S. A. Marcott, J. D. Shakun, P. U. Clark, A. C. Mix. A reconstructionof regional and global temperature for the past 11,300 years. Science,
v. 339, p. 1198-1201, 2013; J. D. Shakun, P. U. Clark, F. He, S. A. Mar-cott, A. C. Mix, Z. Liu, B. Otto-Bliesner, A. Schmittner, E. Bard. Global
warming preceded by increasing carbon dioxide concentrations duringthe last deglaciation. Nature, v. 484, n. 7392, p. 49-54, abr. 2012. (Notado autor)10 IPCC. Climate Change 2014: Synthesis Report. 2014; T. M. Len-ton, H. Held, E. Kriegler, J. W. Hall, W. Lucht, S. Rahmstorf, H. J.
Schellnhuber. Tipping elements in the Earth’s climate system. Proc.Natl. Acad. Sci., v. 105, n. 6, p. 1786-93, fev. 2008; A. Levermann, J. L.
Que diferença faz? Essa pergunta é muitas vezesfeita com a noção de que uma duplicação do aumen-to da temperatura signicaria uma simples duplica-ção da gravidade das consequências. E ela revela opensamento linear que é tão natural para a maioriade nós. Entretanto, essa suposição é completamenteenganosa. A complexidade da natureza produz li-
miares de temperatura que, se ultrapassados, dei-xam o elemento de ruptura associado a eles em umestado fundamentalmente diferente. Na Figura 2 sepodem visualizar esses limiares de uma série de ele-mentos climáticos. Os recifes de corais, por exemplo,correm o risco de uma degradação de longo prazo11 eo manto de gelo da Groenlândia talvez se derreta nonal,12 mesmo que a barreira de 2 ºC seja respeita-da. Mas quanto mais a temperatura subir, tanto maiselevado é o risco de ultrapassar o ponto de rupturade cada elemento, e tanto mais elementos climáticoscorrem perigo. As consequências como o colapso do
“pulmão da Terra”, a oresta tropical da Amazônia,seriam desastrosas, sem falar na completa desinte-gração dos mantos de gelo da Antártica Ocidental eda Groenlândia, associados com um aumento do níveldo mar de cerca de 3,3 e 7 metros, respectivamente.Como também diz a Encíclica [1, nº 34], os avançostecnológicos não teriam condições de manter o ritmode produção de soluções para dar conta de mudançasdessa escala.
A diferença entre 2 e 4 ºC de aquecimento globalse reete nesses elementos de ruptura. Mas, mesmo
sem considerar explicitamente essas mudanças em po-tencial, que são de grande escala e não lineares, éindiscutível que um mundo 4 ºC mais quente tem deser evitado. 13 Por exemplo, extremos de calor, queestão virtualmente ausentes na atualidade e quasecertamente nunca ocorreram desde o surgimentoda humanidade (e nem mesmo desde a formação deecossistemas-chave) se tornariam normais no centroda África Ocidental segundo o caminho vermelho –esse é o cenário para a manutenção do ritmo atual.
Bamber, S. Drijfhout, A. Ganopolski, W. Haeberli, N. R. P. Harris, M.Huss, K. Krüger, T. M. Lenton, R. W. Lindsay, D. Notz, P. Wadhams, S.
Weber. Potential climatic transitions with profound impact on Europe.Clim. Change, v. 110, n. 3, p. 845-878, jun. 2012; T. M. Lenton. Arcticclimate tipping points. Ambio, v. 41, n. 1, p. 10-22, fev. 2012; A. Robin-son, R. Calov, A. Ganopolski. Multistability and critical thresholds ofthe Greenland ice sheet. Nat. Clim. Chang., v. 2, n. 4, p. 1-4, mar. 2012.(Nota do autor)11 K. Frieler, M. Meinshausen, A. Golly, M. Mengel, K. Lebek, S. D.Donner, O. Hoegh- Guldberg. Limiting global warming to 2 °C is unli-kely to save most coral reefs. Nat. Clim. Chang., v. 3, p. 165-170, 2013.(Nota do autor)12 A. Robinson, R. Calov, A. Ganopolski. Multistability and criticalthresholds of the Greenland ice sheet. Nat. Clim. Chang., v. 2, n. 4, p.1-4, mar. 2012 (Nota do autor)13 World Bank. Turn down the heat: Why a 4°C warmer world must
be avoided. 2012; World Bank. Turn down the heat: Climate extremes,regional impacts, and the case for resilience. 2013; World Bank. Turn
down the heat
: Confronting the new climate normal. 2014. (Nota doautor)
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Uma mudança drástica dessas atingiria, mais uma vez,com a maior gravidade aqueles que não comeram emqualquer medida signicativa do fruto da queima decombustíveis fósseis: os pobres.
Figura 3:
Distribuição regional da frequência de meses extre-mamente quentes (“meses 5σ”) em um mundo de 4ºC (junho, julho e agosto entre 2080 e 2100). A co-dificação de cores indica o percentual de meses maisquentes do que hoje em cinco desvios-padrão (5σ) –
esses extremos de calor ficariam virtualmente ausen-tes sem mudança climática. Em uma extremidade daescala de cores está o azul escuro (0-10% de todos osmeses são mais quentes em 5σ); na outra extremida-de, o vermelho escuro (90-100% de todos os meses sãomais quentes em 5σ). Isso mostra claramente que osmeses 5σ se tornam o novo “clima normal” nas regi-ões de terras tropicais.14
O que precisamos fazer
A perspectiva de longo prazo ilustrada por meio doslimiares de ruptura na Figura 2 revela uma percepção
de grande alcance: embora os pobres sejam os primei-ros a sofrer e os mais fundamentalmente afetados, todaa humanidade depende, em última análise, do mesmoparaquedas, independentemente dos benefícios de cur-to prazo temporários para um punhado de pessoas. Esseparaquedas – um clima estável – sendo destruído poralguns é nosso bem comum. A Encíclica conrma essaavaliação que os cientistas e lósofos morais têm rei-vindicado no contexto da política climática: “O climaé um bem comum global de todos e para todos” [1,nº 20]. A atmosfera é um bem global por causa de seuespaço limitado de destinação para emissões de gases
de efeito estufa. No presente, as classes médias e altasno mundo inteiro estão esgotando rapidamente esse re-curso escasso emitindo gases de efeito estufa em vastasquantidades. Em contraposição ao escasso espaço dedestinação na atmosfera, os combustíveis fósseis, espe-cialmente o carvão, são abundantes. Por conseguinte,limitar o aumento da temperatura global média em até2 ºC exige que se restrinja a quantidade de carbono a
14 World Bank. Turn down the heat: Climate extremes, regional im-pacts, and the case for resilience. 2013; World Bank. Turn down theheat : Confronting the new climate normal. 2014. World Bank. Turn
down the heat: Why a 4°C warmer world must be avoided. 2012. (Notado autor)
ser ainda lançado na atmosfera para 1.000 gigatone-ladas de Co2 (ou menos). Ao passo que restringir o usoda atmosfera como lixão de carbono é absolutamentenecessário para evitar dano e sofrimento intolerávelpara muitas pessoas, isso vai desvalorizar os ativos eos títulos de propriedade dos atuais donos de carvão,petróleo e gás. Quase 80% do carvão tem de car de-
baixo do solo em um cenário de mitigação da mudançaclimática em comparação com um cenário em que secontinue no mesmo ritmo como até agora. Portanto, apolítica climática implica transferir os direitos de pro-priedade para o uso da atmosfera dos proprietários doscombustíveis fósseis para um novo dono – a humanidadecomo um todo.15
É compreensível que haja reivindicações de inde-nização pela desvalorização dos ativos no setor decombustíveis fósseis. Entretanto, a desvalorizaçãodesses ativos de modo algum é uma expropriação ile-gítima, pois ela serve ao bem comum – a evitaçãode riscos climáticos catastrócos. A Encíclica chamaa atenção para o princípio da “obrigação social dapropriedade privada”. Isso remonta a S. Tomás deAquino e foi desenvolvido pelo ensino social da IgrejaCatólica, em particular por essa Encíclica “LaudatoSi’” do Papa Francisco I (1, nos 20, 93-95, 156-158).Ela sustenta que a propriedade privada, em geral, eem patrimônios de recursos naturais, em particular,só é eticamente justicável se serve ao bem comum.Além disso, a desvalorização vindoura de recursosfósseis poderia ser vista como um ato de “destruição
criativa”, instigando uma nova revolução industrialintegral que traria enormes oportunidades econô-micas – possivelmente também para as pessoas queaté agora não participaram do progresso humano. Atransformação da maneira como produzimos nossaenergia pode muito bem causar uma transformaçãomaior da sociedade como um todo.
As negociações internacionais em torno de objetivosnacionais de redução de emissões, preços nacionais docarbono ou mesmo um preço global alocam, implíci-ta ou explicitamente, direitos para o uso do espaçodo carbono na atmosfera a estados nacionais, empre-
sas e consumidores. “Laudato Si’” não dá orientaçãotécnica sobre como alocar direitos de usuários paraa atmosfera. Entretanto, o Papa Francisco destaca adimensão ética do problema do clima e propõe prin-cípios fundamentais a serem aplicados para soluções:a opção preferencial pelos pobres, a justiça inter eintrageracional, a responsabilidade comum mas dife-renciada, orientação pelo bem comum. A Encíclica de-
15 O. Edenhofer, C. Flachsland, M. Jakob, K. Lessmann. The atmos-phere as a global commons: Challenges for international cooperationand governance. In: L. Bernard, W. Semmler (eds.). The Oxford Hand-
book of the Macroeconomics of Global Warming. Oxford: Oxford Uni- versity Press, 2015. (Nota do autor)
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fende uma estrutura de governança global para todoo espectro dos bens comuns planetários [1, nº 174].Fixar um preço para emissões de CO2 – seja em formade sistemas de limitação e comércio de emissões comoo europeu ou o que a China pretende estabelecer, sejaatravés de tributos nacionais sobre o CO2 – é um instru-mento ecaz para proteger o bem comum.
A Figura 4 mostra que um caminho de mitigaçãoé economicamente viável, sem perdas signica-tivas de consumo, em comparação com um cená-rio em que se continue no mesmo ritmo como atéagora. Além disso, um objetivo forte, juridicamentevinculante, e um preço adequado para o CO2 dariamàs empresas marcos mais previsíveis para operarem– algo que até as principais companhias petrolíferaspediram recentemente – e ofereceriam incentivospara investir em tecnologias limpas. Isso acelerariasignicativamente a inovação nas áreas da produção,distribuição e armazenamento de energia renovávele, ao mesmo tempo, reduzir os custos de produção eos preços no varejo. Para estimular o incremento denovos sistemas energéticos no mundo em desenvolvi-mento, apoiar esses países em seus esforços de mi-tigação e em medidas de adaptação para construir aresiliência climática, instrumentos nanceiros comoo Fundo Verde para o Clima são indispensáveis. Éclaro que controlar o uso eciente do nanciamentopara o benefício dos pobres é um desao. Entretanto,sistemas de seguro agrícola, por exemplo, que possi-bilitam que agricultores que plantam para sua sub-
sistência sobrevivam economicamente a quebras desafra e outros desastres relacionados ao clima ilus-tram o quanto já pode ser feito hoje em dia. Alémdisso, várias soluções surgiram do discurso cientíco,incluindo, por exemplo, o monitoramento internacio-nal de reduções de emissões nacionais ou o estabele-cimento de um “banco do clima” global para gerir aslicenças de emissões.
Figura 4:
“O custo de salvar o planeta”. A trajetória azul da miti- gação mostra a redução mediana do consumo e sua mar-
gem de incerteza segundo a estimativa do IPCC, ilustradaaqui em relação a um exemplo de referência (vermelho)com um crescimento anual de 2,3%. O aumento quaseóctuplo no consumo global por volta do ano 2100 no casode referência é atingido dois anos mais tarde no caso queinclui os custos de mitigação do clima mediano. Observeque essas estimativas de custo não consideram prejuízosdecorrentes de dano climático, que provavelmente aca-
bariam sendo um ônus muito maior do que os custos demitigação, assim como não inclui benefícios ou efeitoscolaterais da mitigação.
Tecnologicamente, a utilização de energia limpapara todos é viável:16 essa energia, na verdade, estádisponível em abundância. Tudo o que temos de fazeré captá-la apropriadamente e gerir responsavelmentenosso consumo. Enquanto trabalhamos década apósdécada no desenvolvimento de um reator de fusão in-crivelmente caro, já somos abençoados com um quefunciona perfeitamente bem e é grátis para todos nós:o Sol. A energia fotovoltaica, a eólica e a proveniente
da biomassa são, em última análise, todas movidas aluz do sol. Essas novas tecnologias poderiam desdobrarseu potencial em países pobres onde não existem re-des para distribuir a eletricidade produzida por usinascentralizadas e onde os assentamentos talvez estejamdistantes demais uns dos outros para tornar viável umsistema assim. Assim como no caso do uso em evoluçãode telefones móveis sem o estabelecimento anteriorde redes xas, os países em desenvolvimento pode-riam pular o episódio dos combustíveis fósseis e entrarna era da produção descentralizada de energia reno-vável sem desvios.
Portanto, o cuidado de nosso planeta não preci-sa virar uma tragédia dos bens comuns. Ele bem quepode se tornar uma história de grande transformaçãoem que se aproveitou a oportunidade para superar asprofundas desigualdades. Essas disparidades surgiramda coincidência geológica da distribuição regional decombustíveis fósseis controlada por uns poucos e daexploração concomitante. Hoje em dia, as implicaçõesde nossas ações e os caminhos estão claros. É só umaquestão de qual é o futuro em que optamos por acre-ditar e que optamos por buscar.17
16 IPCC. Climate Change 2014: Mitigation of Climate Change: Con-tribution of Working Group III to the Fifth Assessment Report of theIntergovernmental Panel on Climate Change – Chapters 6 and 7. Cam-
bridge, United Kingdom and New York, NY, USA: Cambridge Univer-sity Press, 2014. (Nota do autor)17 O. Edenhofer, J. Wallacher, H. Lotze-Campen, M. Reder, B. Knopf,
J. Müller. Climate Change, Justice and Sustainability: Linking Climateand Development. Springer, 2012. (Nota do autor)
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O humanismo como resgate ético àciência tecnocráticaPara Jefferson Simões, “todo cientista sério deve obrigatoriamente adquirir umaformação humanística e ter inserção social”
Por João Vitor Santos
Oglaciólogo e pesquisador daUniversidade Federal do RioGrande do Sul – UFRGS Jeffer-son Simões endossa o coro de cientis-tas ao assegurar que “a crise ambientalplanetária é, antes de tudo, uma crisede valores”. Para ele, um dos méritosda Encíclica Laudato Si’ é trazer à luzessa perspectiva. Outro ponto destaca-do por Simões é o fato de o documentointrojetar premissas cientícas paraconstituir o atual cenário de degrada-ção do Planeta. No entanto, reconheceque a Encíclica também faz o movi-mento contrário, com suas críticas aopensamento cientíco tecnicista, cha-mando à reexão também pesquisado-res. “É ilusório achar que ciência semconsciência leva ao desenvolvimentohumano”, dispara, ao defender umaespécie de consciência humanística nosmais variados campos cientícos.
O professor lembra ainda que issotem a ver com o conceito de EcologiaIntegral, tão presente na carta do PapaFrancisco. Não é o fazer ciência pelaciência, tendo em horizonte apenas odesenvolvimento do homem e da socie-dade e como se fosse ele o senhor acolocar o planeta cada vez mais a seusserviços. “Todo cientista sério e de
vanguarda deve obrigatoriamente ad-quirir uma formação humanística e terinserção social”, defende, na entrevis-ta concedida por e-mail à IHU On-Line.
Porém, Simões lembra que se há nasáreas exatas da academia uma tendên-cia ao tecnicismo, há também algumasposturas nas ciências humanas que dis-tanciam esse ideal de integralidade.“O que me preocupa são algumas ten-dências em setores das humanidades edas ciências sociais que questionam apossibilidade de uma verdade objetiva(base das ciências naturais). Isso leva a
consequências absurdas apresentadaspor um relativismo absurdo pós-mo-derno, e que creio serem portas para oobscurantismo”, destaca.
Ao longo da entrevista, o professor
ainda analisa a inuência da Encícli-ca em fóruns internacionais, como aCOP 21, e o desao de abandonar adependência de combustíveis fósseis.O pesquisador sai em defesa do PapaFrancisco, sobre as acusações de terescutado apenas o lado da ciência queacredita em aquecimento global an-tropogênico. “O que temos não é umembate cientíco. Temos um embateideológico e que envolve questões devisões econômicas, de valores e até re-ligiosas”, dispara.
Jefferson Cardia Simões é profes-sor de Geograa Polar e Glaciologiada UFRGS e membro titular da Acade-mia Brasileira de Ciências. É pioneiroda ciência glaciológica no Brasil. TemPhD pelo Scott Polar Research Insti-tute, University of Cambridge, Ingla-terra, e é pós-doutor pelo Laboratoi-re de Glaciologie et Géophysique del’Environnement, du Centre Nationalde la Recherche Scientique - LGGE/CNRS, França, e pelo Climate Change
Institute - CCI, University of Maine, Es-tados Unidos. Toda sua carreira é dedi-cada às Regiões Polares, tendo publi-cado 115 artigos, principalmente sobreprocessos criosféricos. Pesquisador doPrograma Antártico Brasileiro - PRO-ANTAR, é o delegado nacional juntoao Scientic Committee on AntarcticResearch - SCAR do Conselho Interna-cional para a Ciência - ICSU. Simõesparticipou de 22 expedições cientícasàs duas regiões polares, criou e dirigeo Centro Polar e Climático da UFRGS.
Conra a entrevista.
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Devemos entender que alguns gru- pos montaram uma estratégia de
negação do problema climáticocom o objetivo de postergar o má- ximo possível qualquer regula-
mentação sobre emissão de gases
IHU On-Line - Como o senhorrecebeu a Encíclica Laudato Si’?Quais pontos destaca?
Jefferson Simões - Muito bem,
trata-se de um posicionamento re-ligioso, ético e moral sobre a criseambiental e sobre as consequênciaspara a sociedade como um todo. Eestá alinhada a várias encíclicas edeclarações dos sumos pontícesantecessores do Papa Francisco eque mostram a preocupação da ex-ploração do homem pelo homem eda natureza pelo homem. É comoo Papa Leão XIII1 já exprimiu naencíclica Rerum novarum2 no naldo século XIX. Enfatiza que os maispobres, os menos providos, serão,como sempre, os mais afetados pe-los impactos das mudanças climáti-cas globais.
Laudato Si’ ainda reete o co-nhecimento cientíco atualizadocom a questão das mudanças doclima, mostrando que o Vaticanoreconhece a ciência como uma luzno meio da escuridão. Como cien-
1 Leão XIII (1810-1903): nascido Vincen-
zo Gioacchino Raffaele Luigi Pecci . Foi Papade 20 de fevereiro de 1878 até a data da suamorte. Notabilizou-se primeiramente comopopular e bem-sucedido Arcebispo de Per-guia, o que conduziu a sua nomeação comoCardeal em 1853. Ficou famoso como o “papadas encíclicas”. A mais conhecida de todas, a
Rerum Novarum, de 1891, sobre os direitose deveres do capital e trabalho, introduziu aideia da subsidiariedade no pensamento so-cial católico. (Nota da IHU On-Line)2 Rerum Novarum: primeira encíclicapontifícia que aborda os problemas sociais,publicada no dia 15 de maio de 1891 pelo papaLeão XIII. O título pode ser traduzido por“Das coisas novas”. O subtítulo da encíclica
é: “Sobre a condição de vida dos operários”.(Nota da IHU On-Line)
tista ambiental tenho que valorizare também apreciar o modelo invo-cado por sua Santidade: São Fran-cisco de Assis, pelo cuidado como frágil, a preocupação pela na-
tureza, a justiça, e que considerouma obrigação moral daqueles quecomo nós adquiriram um nível deauência econômica numa socie-dade ainda tão injusta como a nos-sa. Também tenho a destacar quea Encíclica dá atenção à questãoda água, bem comum primordialda humanidade e que teremos quelutar para evitar qualquer possibi-lidade de apropriação desse direitohumano essencial, a água potável
para todos.
IHU On-Line - Qual a importân-cia de uma instituição como aIgreja Católica manifestar seu po-sicionamento sobre as questõesambientais?
Jefferson Simões - Consideroessencial, principalmente paramostrar para aqueles que por ig-norância, medo ou autointeressenão aceitam as conclusões da co-
munidade cientíca plenamen-te. Essa postura acaba mostrandoque a questão da crise ambiental,e em particular das mudanças doclima, é real e imediata. Mostra,também, que a solução da questãonão depende somente de soluçõestecnológicas ou econômicas. Sobreeste último ponto, temos que con-cordar plenamente com o BeatoPaulo VI3, que já armava o que o
3 Papa Paulo VI: nascido Giovanni BattistaEnrico Antonio Maria Montini, Paulo VI foi o
Papa Francisco reforça: “os pro-gressos cientícos mais extraordi-nários, as invenções técnicas maisassombrosas, o desenvolvimentoeconômico mais prodigioso, se nãoestiverem unidos a um progressosocial e moral, voltam-se necessa-
riamente contra o homem”4
.
IHU On-Line - Como a perspec-tiva da religião, em especial avisão manifestada na Encíclica,pode contribuir para o campocientíco?
Jefferson Simões - A contribui-ção, evidentemente, não será dire-tamente para o campo cientíco,e sim para indicar a cientistas,políticos, tomadores de decisão e
leigos em geral que a questão dacrise ambiental vai muito além desoluções tecnológicas e envolve,antes de tudo, mudança de esca-la de valores. De reconhecer quenossos problemas sociais, como aviolência urbana, a concentraçãode renda, o uso excessivo de veí-culos individuais, a exploração dooutro e a crise ambiental, estãotodos interconectados e são gera-dos pelo atual modelo econômico e
de consumo e como visualizamos arelação com nosso entorno. E tam-bém enfatiza algo que as geraçõesanteriores não tiveram que se pre-ocupar: a ética transgeracional.
IHU On-Line - De que forma essedocumento apostólico inuencia
questões internacionais de políti-ca ambiental? Como imagina quedeva ser o impacto em acordosinternacionais e em encontroscomo a COP 215, em Paris?
Sumo Pontíce da Igreja Católica Apostólicade 21 de junho de 1963 até 1978, ano de suamorte. Sucedeu ao Papa João XXIII, que con-
vocou o Concílio Vaticano II, e decidiu conti-nuar os trabalhos do predecessor. Promoveumelhorias nas relações ecumênicas com osOrtodoxos, Anglicanos e Protestantes, o queresultou em diversos encontros e acordos his-tóricos. (Nota da IHU On-Line)4 (LS 5). (Nota da IHU On-Line)5 COP 21: COP é a Conferência das Partes daConvenção-Quadro das Nações Unidas sobreMudança Climática. É a autoridade máximapara a tomada de decisões sobre os esforços
para controlar a emissão dos gases de efeitoestufa. Em 2015, a COP tem sua 21ª edição, a
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Jefferson Simões - Vem a se so-mar à posição dos cientistas, ló-sofos e ambientalistas e líderes deoutras religiões que já se manifes-taram. Todos se posicionam pelanecessidade de regularmos o nossocuidado com o ambiente, princi-
palmente com a sua parte mais tê-nue e mais fácil de ser modicada,a atmosfera. Espero que seja umguia para aqueles políticos católi-cos envolvidos nas negociações daCOP 21.
IHU On-Line - A dependência decombustíveis fósseis é duramentecriticada pelo Papa Francisco naLaudato Si’. Pensar em formasalternativas de energia renováveldeve ser a principal pauta da COP21? Por que os países resistemtanto a abandonar o uso de com-bustíveis fósseis?
Jefferson Simões - Acredito quesim, e em todas as alternativaspossíveis. Se por um lado é aindainviável a substituição plena doscombustíveis fósseis, devemos in-vestir pesadamente na pesquisa detodas as fontes de energia. Vejao sucesso da energia eólica. Vinte
anos atrás era algo impensável.Note que até mesmo as empresasinovadoras, no ramo do óleo e gás,como a Petrobras, hoje investemna geração de fontes alternativasde energia.
A questão da substituição doscombustíveis fósseis é complexa.Envolve não só a questão tecnoló-gica, mas também toda a depen-dência econômica gerada em maisde um século desse recurso natural
que permitiu um excedente ener-gético que, em geral, permitiu oaumento da qualidade de vida dahumanidade. Mas, por outro lado,sua intensa exploração e uso modi-cou o ambiente terrestre muitas
ser realizada em Paris, França, em dezembro.O objetivo é revisar o comprometimento dospaíses, analisar os inventários de emissões ediscutir novas descobertas cientícas sobreo tema. Foi criada na ECO-92 e teve sua pri-meira edição em 1995, em Berlim, na Alema-
nha. Desde então, ocorre anualmente. (Notada IHU On-Line)
vezes além de sua capacidade deresiliência.
Assim, hoje temos aqueles quesão beneciados diretamente pelaexploração desses recursos, e composições mais conservadoras, re-sistindo ao investimento em fontes
alternativas. No entanto, tambémtemos que entender que somos to-dos responsáveis, pois muitas vezesadotamos uma postura de desper-dício desse e outros recursos, comose a Terra fosse prover innitamen-
te todas nossas necessidades. Atémesmo a China passou a aceitarque cedo ou tarde teremos quereduzir o consumo de óleo e gáse procurar fontes alternativas. Agrande questão hoje é se realmen-te seremos capazes de agir antesde um colapso ambiental.
IHU On-Line - A Encíclica apre-senta o conceito de ecologia inte-gral. Como o senhor entende essaperspectiva?
Jefferson Simões - O sistemaambiental é único e indivisível enós somos partes integrais e inse-
ridas neste sistema. Vivemos emgrande parte com uma ideia do sé-culo XX, com o mito de que tínha-mos avançado numa sociedade quepoderia se considerar independen-te do entorno ambiental. Assim,poderia, pelo desenvolvimentocientíco-tecnológico, adquirir in-dependência das variações do meionatural. Basta um evento extremo,um terremoto, um desequilíbrioambiental que leva a tempestadesde poeira, secas, etc., para notar-
mos que isso ainda está longe. E
com o aumento da população hu-mana, esta sensitividade a varia-ções e mudanças ambientais tendea crescer.
Portanto, vejo o conceito ecoló-gico integral como o respeito a to-das as partes do ambiente, a outras
espécies, ao solo, ao oceano, àsmassas de gelo. Devemos entender,como bem aponta a Encíclica, que aTerra não é nossa propriedade paradominar, saqueá-la e transformá-laimaginando que o sistema ambien-tal não responderá. Pela Teoria deSistemas6, ou pela Teoria de Gaia7,ou até por princípios físicos ele-mentares, o sistema como um todoresponde a nossas agressões. Deve-mos constantemente nos questio-
nar sobre os limites que devemosimpor a todos no cuidado do bemcomum, garantindo a preservaçãodesse Planeta, não somente paranós, mas para as gerações futuras.
IHU On-Line - Outro ponto daLaudato Si’ que tem tido grande
6 Teoria de Sistemas: estuda, de modointerdisciplinar, a organização abstrata defenômenos, independente de sua formaçãoe conguração presente. Investiga todos os
princípios comuns a todas as entidades com-plexas, e modelos que podem ser utilizadospara a sua descrição. A Teoria de Sistemas,cujos primeiros enunciados datam de 1925,foi proposta em 1937 pelo biólogo Ludwig
von Bertalanffy, tendo alcançado o seu augede divulgação na década de 50. Em 1956,Ross Ashby introduziu o conceito na ciênciacibernética. A pesquisa de Von Bertalanffy foi
baseada numa visão diferente do reducionis-mo cientíco até então aplicada pela ciênciaconvencional. (Nota da IHU On-Line)7 Teoria Gaia: teoria que arma ser o pla-neta Terra um ser vivo. Apresentada em 1969pelo investigador britânico James Lovelock,a Teoria, também conhecida como HipóteseGaia, diz ser a biosfera terráquea capaz de ge-
rar, manter e regular suas próprias condiçõesde meio ambiente. Para chegar a estas conclu-sões, o cientista e a bióloga americana LynnMargulis analisaram pesquisas que compa-ravam a atmosfera da Terra com a de outrosplanetas. Estes cientistas propuseram que éa vida da Terra que cria as condições para asua própria sobrevivência, e não o contrário,como as teorias tradicionais sugerem. Vistacom descrédito pela comunidade cientícainternacional, a Teoria de Gaia encontra sim-patizantes entre grupos ecológicos, místicose alguns pesquisadores. O nome Gaia é umahomenagem à titã Gaia, que representava aTerra na mitologia grega. Sobre o assunto,conra o artigo de James Lovelock publicado
na edição 171 da IHU On-Line, intitulado “A vingança de Gaia”. (Nota da IHU On-Line)
A crise ambien-
tal planetá-ria é, antes detudo, uma cri-se de valores
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repercussão é a crítica ao an-tropocentrismo. Em que medidauma visão menos antropocên-trica, mais ecológica, pode con-tribuir para o desenvolvimentocientíco?
Jefferson Simões - É essencial.
Devemos entender que dividimosesta Terra com milhões de espé-cies, tão essenciais como nós paraa preservação do planeta. Se forfundamental que usemos váriasdelas para nossa alimentação, paranossas vestimentas, etc., devemosrespeitá-las e minimizar o seu so-frimento. Devemos valorizar e res-peitar a riqueza de nossa biodiver-sidade, resultado da evolução aolongo de bilhões de anos. Hoje, vá-
rias áreas das ciências já se bene-ciam dessa postura, principalmen-te as ciências da vida, ao ajudar aentendermos que somos produtoda evolução dessa biodiversidade enão estamos separados dela.
IHU On-Line - Como articularconhecimento cientíco especí-co, técnicos e mais duros, no seucaso estudos glaciológicos, comquestões como a desigualdade so-
cial? O senhor acredita num pon-to de encontro entre as ciênciashumanas e exatas ou numa fusãoentre as duas grandes áreas doconhecimento?
Jefferson Simões - Todo cien-tista sério e de vanguarda deveobrigatoriamente adquirir umaformação humanística e ter inser-ção social. É ilusório achar queciência sem consciência leva aodesenvolvimento humano, leva sim
a sua destruição. O cientista semesta consciência será um alienadode seu entorno. Ou pior, cedo outarde será usado pelos detentoresdo poder ou poderá ainda prejudi-car a sociedade que o nancia, ouambos.
A ciência glaciológica é uma ci-ência ambiental e, especicamen-te na minha área de investigação(testemunhos de gelo para recons-trução da história ambiental), exi-
ge conhecimento da história do uso
da terra, modicações no modo deprodução, entre outros. Acreditoem pontos de encontro entre asciências humanas e exatas, algoque o cientista ambiental deveconstantemente procurar. Mas issonão implica a existência de fusão
das duas áreas de conhecimento
que ainda hoje possuem métodose discursos diferentes. O que mepreocupa, por outro lado, são al-gumas tendências em setores dashumanidades e das ciências sociaisque questionam a possibilidade deuma verdade objetiva (base dasciências naturais). Isso leva a con-sequências absurdas apresentadaspor um relativismo absurdo pós-
-moderno, e que creio serem por-tas para o obscurantismo.
IHU On-Line - Críticos da Encí-clica alegam que o Papa Francis-co se cercou apenas de cientistasque acreditam que o aquecimen-to global decorre da ação do ho-mem no planeta. Como o senhorvê o campo da ciência que enten-de que as mudanças climáticasnão são provocadas pelo ser hu-
mano? Como se dá esse debate naciência?
Jefferson Simões - Na verdade,não existe este debate. Vejamos osfatos: aproximadamente 98% dosartigos cientícos mostram evidên-cias de que o atual quadro de mu-danças do clima já tem o sinal dainterferência humana. Ainda, to-das as sociedades cientícas e aca-demias de ciências nacionais têm amesma opinião. Ou seja, não é so-
mente o Painel Intergovernamental
da ONU sobre Mudanças do Clima8 que tem esta opinião.
Assim, ao colocar esta questão, oque devemos perguntar é por quetemos esta percepção de um em-bate. Bom, devemos entender quedesde o início dos anos de 1990 al-
guns grupos (principalmente thinktanks norte-americanos) montaramuma estratégia de negação do pro-blema climático com o objetivo depostergar o máximo possível qual-quer regulamentação sobre emis-são de gases estufa que poderiamlevar à intensicação do efeitoestufa (que sem a interferênciahumana é um processo natural eessencial para o clima planetário).Sabe-se hoje que esse grupo usa as
mesmas técnicas de comunicaçãosocial das campanhas tabagistasque durante mais de três décadasnegaram os problemas causadospelo fumo.
O que temos, então, não é umembate cientíco. Temos um em-bate ideológico e que envolvequestões de visões econômicas,de valores e até religiosas. Maisgrave: esta campanha nos EstadosUnidos é nanciada pela Exxon-
Mobil9
, American Petroleum Insti-
8 Painel Intergovernamental sobreMudança Climática - IPCC: órgão dasNações Unidas responsável por produzir in-formações cientícas em três relatórios quesão divulgados periodicamente desde 1988.Os relatórios são baseados na revisão de pes-quisas de 2.500 cientistas de todo o mundo.O documento divulgado pelo IPCC em feve-reiro de 2007 armou que os homens são osresponsáveis pelo aquecimento global. Sobreo tema, a IHU On-Line 215 produziu umaedição especial, intitulada Estamos no mes-
mo barco. E com enjoo. Anotações sobre orelatório do IPCC. O sítio do IHU tem dadoampla cobertura ao tema. No endereço ele-trônico (www.unisinos.br/ihu), podem seracessadas entrevistas sobre o assunto. (Notada IHU On-Line)9 ExxonMobil: uma empresa multinacionalde petróleo e gás dos Estados Unidos, comsede em Irving, Condado de Dallas, no esta-do do Texas. A ExxonMobil foi formada em30 de novembro de 1999 na fusão da Exxoncom a Mobil, duas empresas resultantes dadivisão da Standard Oil Company em 1911. AExxon Mobil Corporation opera atualmenteno mercado sob a marca ExxonMobil, e tam-
bém opera as marcas Exxon, Mobil e Esso.
Sua sede brasileira encontra-se na cidade doRio de Janeiro. (Nota da IHU On-Line)
Somos produtoda evolução des-sa biodiversida-de e não estamosseparados dela
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tute10 e Koch Charitable Founda-tion11. Recomendo aos leitores olivro “Merchants of Doubt: How ahandful of scientists obscured thetruth on issues from tobacco smoketo global warming”12, por NaomiOreskes e Erik Conway.
IHU On-Line - Para o Papa Fran-cisco, áreas como a Amazônia,oresta do Congo, desertos e
reservas glaciais e hídricas sãointerconectados e agem na equa-lização do clima no mundo. Por-tanto, são de interesse comum. AAntártica não pertence a nenhumpaís13. De que forma acordos in-ternacionais, como o Tratado daAntártica14, asseguram o trabalhocientíco internacional nesses lo-cais “comuns”?
Jefferson Simões - Sim, os sis-temas naturais estão interconecta-dos, porque obviamente só temosum ambiente terrestre, ele não écompartimentado. Podemos com-partimentar o meio natural paraestudarmos e aprofundarmos nos-so entendimento, mas isso é so-
10 American Petroleum Institute - API:
é a maior associação comercial para a indús-tria de petróleo e gás natural dos EstadosUnidos. Representa cerca de 400 empresasenvolvidas na produção, renamento, distri-
buição e muitos outros aspectos da indústriade petróleo. (Nota da IHU On-Line)11 Koch Charitable Foundation: funda-ção ligada à corporação multinacional norte--americana, com sede em Wichita, Kansas,Estados Unidos. Possui liais envolvidas nafabricação, comércio e investimentos. Foifundada como Wood River Oil and ReningCompany, em 1940, e mais tarde como RockIsland Oil & Rening Company. (Nota daIHU On-Line)12 ORESKES, Naomi e CONWAY, Erik. Mer-chants of Doubt : How a Handful of Scientists
Obscured the Truth on Issues from TobaccoSmoke to Global Warming. Londres (ReinoUnido): Bloomsbury Press, 2011. (Nota daIHU On-Line)13 Países como Argentina, Austrália, Chile,França, Noruega, Nova Zelândia e Reino Uni-do reivindicam seu território. (Nota da IHUOn-Line)14 Tratado da Antártica: documento assi-nado em 1º de dezembro de 1959 pelos paísesque reclamavam a posse de partes continen-tais da Antártida (Argentina, Austrália, Chi-le, França, Noruega, Nova Zelândia e ReinoUnido). No documento, comprometem-se asuspender suas pretensões por período inde-nido, permitindo a liberdade de exploração
cientíca do continente, em regime de coope-ração internacional. (Nota da IHU On-Line)
mente um artifício intelectual. Asregiões do mundo não partilhadasdurante o período do colonialismo,felizmente, foram de uma manei-ra ou outra inseridas em tratadosinternacionais. Assim foi pela Con-venção das Nações Unidas sobre
o Direito do Mar ou o Tratado daAntártica. Este último teve sucessopleno, primeiramente por reservartoda a área do Planeta ao sul de60ºS como uma região para a paz ea ciência. Uma região não militari-
zada, e desde 1998 sob uma mora-tória de 50 anos para a exploraçãode recursos não renováveis (basi-camente os recursos minerais). OTratado congelou as reivindicaçõesterritoriais dos sete países e, aomesmo tempo, nenhum dos outros45 signatários do Tratado reconhe-ce essas reivindicações.
Finalmente, o Tratado da Antárti-ca tem uma cláusula única. Exige apesquisa cientíca e livre trânsitodas informações cientícas e pes-soas em toda sua região. Isso ga-rante uma constante colaboraçãointernacional, em uma comunidadeque de qualquer modo deve cons-tantemente lidar com um dos am-bientes mais agressivos do Planeta.
IHU On-Line - Qual a diferença
entre acordos como Tratado da
Antártica e a ideia de interna-cionalização, como a que se co-menta em torno de áreas comoAmazônia?
Jefferson Simões - Muito dife-rente. A Amazônia faz parte devários territórios nacionais onde
a soberania do Brasil e outros pa-íses deve ser respeitada. Cabe anós, sul-americanos amazônicos,fazer o uso sustentável da região,fazendo uma exploração racionale não destrutiva. Já a Antártica éuma região sem população nativae cuja ocupação permanente só foipossível com o avanço cientíco--tecnológico posterior à SegundaGrande Guerra. Evidentemente,as duas regiões devem ser preser-
vadas ao máximo, para o equilíbrioambiental planetário, mas as simi-laridades param por aí.
IHU On-Line - O que seus estu-dos sobre a Antártica já revelamsobre a presença do homem noPlaneta?
Jefferson Simões - Primeiramen-te é importante deixar claro que ocientista moderno não trabalha in-dividualmente, nossas conclusões
são acumulativas e geradas peloavanço do conhecimento geradopor nossa comunidade internacio-nal. Note que desde o início do Pro-grama Antártico Brasileiro - PRO-ANTAR15 cou evidente o papel do
15 Programa Antártico Brasileiro -PROANTAR : é um programa da Marinhado Brasil, que tem presença no continente da
Antártica. Ele coordena a pesquisa e o apoiooperacional para a pesquisa na região. Atual-mente, mantém uma estação de pesquisa du-rante todo o ano na Antártica (Estação Antár-
tica Comandante Ferraz), bem como váriosacampamentos sazonais. Também mantémdois navios de investigação que navegam naságuas da Antártica. Os objetivos cientícos doPrograma incluem o desenvolvimento de pes-quisas no continente Antártico para ampliaro conhecimento dos fenômenos naturais queali ocorrem e sua repercussão sobre o territó-rio brasileiro. Em 2012, ocorreu um incêndiona Estação Comandante Ferraz. Na ocasião,o sítio do IHU publicou repercussões do inci-dente — acesse em http://bit.ly/1OhVxjB. Ogoverno federal anunciou um programa paraa reconstrução da base antártica. No entanto,nenhuma empresa demonstrou interesse emparticipar para licitação aberta para recons-
trução. Em 2014, as pesquisas foram retoma-das após a instalação de módulos emergen-
Pela teoria de
sistemas, ou pela teoria deGaia, ou até por princípios físi-cos elementa-res, o sistemacomo um todo
responde a nos-
sas agressões
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continente antártico e do enormeoceano Austral (que rodeia o conti-nente) como essenciais no controledo clima da América do Sul. Paraentendermos a variabilidade doclima brasileiro, os processos cli-máticos antárticos são tão impor-
tantes quanto os que ocorrem naAmazônia. Basta, por exemplo, ci-tar a questão da intensidade e fre-quência das frentes frias, formadasno oceano Austral16, que tomamosciência de como nosso quotidia-no é afetado por processos que láocorrem.
Uma das mais importantes cons-tatações da ciência antártica veioexatamente da minha área de in-vestigação, testemunhos de gelo.
Por esses estudos sabemos queas concentrações dos dois princi-pais gases estufas (gás carbônicoe metano) têm hoje as maioresconcentrações ao longo dos últi-mos 800 mil anos. É um claro sinaldo impacto do homem na compo-
ciais. Em maio de 2015, a empresa CEIEC,da China, foi a vencedora da licitação parareconstrução. O custo da obra será de 99,7milhões de dólares e a previsão é de que sejaconcluída em 2016. (Nota da IHU On-Line)16 Oceano Austral: também chamado deOceano Antártico e Oceano Glacial Antár-tico. É o conjunto das águas que banham oContinente Antártico, mas que em realidadeconstituem o prolongamento meridional doOceano Atlântico, Oceano Pacíco e OceanoÍndico. Muitos cientistas, oceanógrafos e ge-ógrafos não reconhecem a existência do Oce-ano Antártico, considerando-o uma junçãode partes dos outros oceanos. (Nota da IHUOn-Line)
sição química do ar. Nas áreasgeográcas no norte da Antártica(a parte mais quente), onde tra-balhamos, temos um dos maioresaquecimentos ao longo dos últi-
mos 60 anos, e com substancialperda de gelo.
IHU On-Line - Quais os paísesque mais diretamente sofrem osefe