o meu nome simbolico

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Prancha - O MEU NOME SIMBÓLICO Venerável Mestre, Meus Irmãos em vossos Graus e Qualidades, Foi com alguma surpresa que recebi a informação que ao ser iniciado na nossa Augusta Ordem, teria que adotar um nome simbólico, segundo me foi explicado, tal gesto teria as suas origens em tempos de clandestinidade, em que era de vital importância proteger a identidade do maçon no mundo profano. Embora tal ato possa parecer desajustado em pleno Séc XXI, a verdade é que além de se estar a preservar uma tradição, existem ainda no nosso país alguns preconceitos resultantes de perseguições e publicidade envenenada que têm sido feitas à Maçonaria e seus membros ao longo dos tempos, quer pela igreja quer pelo antigo regime. Não podemos esquecer que nenhum regime político ou religioso intolerante consegue conviver pacificamente com a Maçonaria, aliás, é com espanto que descubro que existe em Portugal um partido com acento parlamentar, que proíbe os seus militantes de serem maçons, sob pena de serem expulsos do partido. Segundo afirmam "A filiação na maçonaria ou em qualquer outra organização de cariz secreto é incompatível com a condição de membro do nosso partido" Percebido que estava o motivo para tal necessidade, era agora tempo para fazer a minha escolha e confesso que para mim este foi tema de grande reflexão e principalmente inquietação. Ao recordar as inquirições a que fui submetido, ao reviver algumas das perguntas, começo a formar alguns conceitos, pátria, liberdade e altruísmo. Era assim claro, teria que ser alguém português, que tenha lutado pela liberdade, ou que se tenha dedicado a ajudar o próximo, alguém cujos atos do passado ecoem no presente e futuro da nossa nação. Fiz uma lista inicial de nomes e fui estudando um pouco sobre cada um deles, para poder assim tomar uma decisão. Durante dias a fio sempre esta dúvida, que nome escolher, horas de pesquisas e não havia forma de me decidir. pág. 1

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Prancha - O MEU NOME SIMBÓLICO

Venerável Mestre,Meus Irmãos em vossos Graus e Qualidades, Foi com alguma surpresa que recebi a informação que ao ser iniciado na nossa Augusta Ordem, teria que adotar um nome simbólico, segundo me foi explicado, tal gesto teria as suas origens em tempos de clandestinidade, em que era de vital importância proteger a identidade do maçon no mundo profano.

Embora tal ato possa parecer desajustado em pleno Séc XXI, a verdade é que além de se estar a preservar uma tradição, existem ainda no nosso país alguns preconceitos resultantes de perseguições e publicidade envenenada que têm sido feitas à Maçonaria e seus membros ao longo dos tempos, quer pela igreja quer pelo antigo regime. Não podemos esquecer que nenhum regime político ou religioso intolerante consegue conviver pacificamente com a Maçonaria, aliás, é com espanto que descubro que existe em Portugal um partido com acento parlamentar, que proíbe os seus militantes de serem maçons, sob pena de serem expulsos do partido. Segundo afirmam "A filiação na maçonaria ou em qualquer outra organização de cariz secreto é incompatível com a condição de membro do nosso partido"

Percebido que estava o motivo para tal necessidade, era agora tempo para fazer a minha escolha e confesso que para mim este foi tema de grande reflexão e principalmente inquietação. Ao recordar as inquirições a que fui submetido, ao reviver algumas das perguntas, começo a formar alguns conceitos, pátria, liberdade e altruísmo. Era assim claro, teria que ser alguém português, que tenha lutado pela liberdade, ou que se tenha dedicado a ajudar o próximo, alguém cujos atos do passado ecoem no presente e futuro da nossa nação.

Fiz uma lista inicial de nomes e fui estudando um pouco sobre cada um deles, para poder assim tomar uma decisão. Durante dias a fio sempre esta dúvida, que nome escolher, horas de pesquisas e não havia forma de me decidir.

Há poucos dias um Mestre Maçon disse-me " vive a tua vida com tranquilidade, sem tantos anseios e angústias, verás que as respostas virão ao teu encontro, até mesmo na tua vida maçônica".

Sabias palavras, e agora que penso nisso meus irmãos, não fui eu que encontrei o nome, ele veio ao meu encontro quando eu menos esperava. Uma noite, no sossego de uma sala aquecida por uma reconfortante lareira, eis que durante um tão habitual zapping, me deparo com a história de um homem cujo nome já conhecia, mas cuja verdadeira história e as implicações que os seus atos tiveram na sua vida, confesso até aquele momento desconhecer.

Aristides de Sousa Mendes do Amaral e Abranches, Cônsul de Portugal em Bordéus no ano da invasão da França pela Alemanha Nazi, durante Segunda Guerra Mundial. Se os homens forem do tamanho das suas convicções, Aristides foi um gigante, um herói do séc XX e o Português que mais marcou a história desta nefasta guerra.

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Um homem que perante a iminência da chegada dos alemães, optou por desobedecer às ordens que lhe eram dadas pelo governo português e colocando em risco a sua subsistência e a da sua família, optou por fazer o que a consciência lhe ditava. Pode ser ignorância minha, mas não conheço igual exemplo de autroismo, fraternidade e amor próximo, a maior herança que Aristides deixa à humanidade são os seus atos e sobre os mesmos devemos todos refletir. Estes factos remontam ao ano de 1940 mas infelizmente continuam atuais, a perseguição e limpeza étnica que nesta altura ocorreram, ainda nos nossos dias se verificam em pontos mais remotos do nosso planeta.

O que Aristides fez foi algo muito controverso, se pensarmos que desrespeitou as ordens do responsável máximo da sua nação e por isso poderia até ser considerado de traidor e que poderá ter colocado em risco a posição neutra do seu pais perante uma Alemanha forte e que se aproximava das suas fronteiras.

Mas a verdade é que eram tempos difíceis, nas ruas haviam milhares de refugiados que vinham a fugir do invasor e que poderiam estar a chegar ao fim da linha. Se não conseguissem passar a fronteira para Espanha em direção a Portugal, muitos deles acabariam em campos de concentração e quem sabe até mortos. Não se sabe ao certo quantos poderão ter sido salvos pelo cônsul, no entanto muitas publicações referem que este homem poderá ter sido responsável por salvar 30.000 pessoas.

O livro “A History of the Holocaust”, menciona o seguinte: “o Cônsul português em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes, concede vistos de trânsito a milhares de judeus refugiados, em transgressão das regras do seu governo. Talvez a maior ação de salvamento feita por uma só pessoa durante o holocausto. A 19 de Junho, Aristides segue para o Consulado em Bayonne, onde continua a maratona de concessão de vistos, na própria rua, uma vez que as escadas do edifício poderiam não suportar o peso de tão grande fila de espera. Vai depois para Hendaye/Irun e contínua de um lado para o outro, salvando pessoas nas estradas do sul de França, nas estações de caminhos-de-ferro, conduzindo mesmo um grupo de refugiados através dos Pirenéus, a pé e de automóvel".

Nas pesquisas que efetuei, encontrei relatos dos seus filhos onde referem esta grande viagem, em que afirmam que o seu pai conduziu esta caravana de pessoas por estradas secundárias, para tentar passar num posto fronteiriço isolado, sem telefone, na esperança que as ordens de que os seus vistos não tinham validade e que as pessoas teriam que ser recambiadas, ainda não tivessem ali chegado.

Estes gestos valeram-lhe um processo disciplinar instaurado pelo governo português, que teve como resultado a sua expulsão da carreira diplomática. Na verdade após este castigo, Aristides não voltou a conseguir trabalhar, nem que lhe fosse atribuída uma reforma. Os seus filhos foram aconselhados pelo próprio a emigrarem, pois segundo ele o nome Sousa Mendes estaria para sempre manchado em Portugal. É curioso que em 1943 dois dos seus filhos se tenham alistado no exército dos Estados Unidos, tendo inclusivamente participado no desembarque da Normandia

Aristides acabou por morrer em 1954, com imensas dificuldades financeiras. Em 1967 a autoridade estatal israelita para a recordação dos mártires e heróis do Holocausto, homenageia-o com a sua mais alta distinção: uma medalha com a inscrição do Talmude "Quem salva uma vida humana é como se salvasse um mundo inteiro”. Em 1987, o

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então presidente da República Dr. Mário Soares conferiu-lhe, a título póstumo, a Ordem da Liberdade. Em 1989, a Assembleia da República reparou a grave injustiça que lhe fora cometida, reintegrando-o no serviço diplomático por unanimidade e aclamação.

Julgo que Aristides não era maçon, no entanto existe no nosso país uma loja com o seu nome, trata-se da Respeitável Loja Aristides Sousa Mendes, n.º 32 da GLLP/GLRP. Esta respeitável loja promoveu-lhe uma homenagem onde lhe atribuiu um diploma de persona grata e o Grande Colar da Ordem General Gomes Freire de Andrade, condecorações maçónicas concedidas, a título póstumo, em reconhecimento da sua conduta de alto significado moral e humanitário, pelo Grão-Mestre daquela obediência.

Meus queridos irmãos foi a inspiração deste homem que me fez muito humildemente escolher o seu nome para meu nome simbólico e posso-vos garantir que é com muito orgulho que respondo pelo mesmo junto de todos vós. Inexplicavelmente o nome caiu sobre mim de uma forma tão intensa que mesmo no mundo profano, sempre que ouvir chamar Aristides, olharei como se me estivessem a chamar a mim. Na verdade e de uma forma involuntária, desperta-me o mesmo estímulo, quer me chamem pelo nome profano ao qual repondo há 40 anos, quer pelo maçónico que tenho há pouco mais de um mês.

Disse Venerável Mestre Aristides S. Mendes, Ap:.Em Dezembro 6013

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