o mundo do trabalho e educaÇÃo · contradições do sistema, os valores que permeiam tais as...
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O MUNDO DO TRABALHO E EDUCAÇÃO
Salonides José Zanella de Avila1
RESUMO: As transformações ocorridas no mundo do trabalho, a partir de novas
formas do homem organizar a produção de sua existência, tem um impacto direto
nas instituições sociais, principalmente na família e na escola. Na educação formal,
educadores e educandos vivem diretamente os resultados, geralmente conflituosos,
da implantação de políticas educacionais formuladas de acordo com as novas
demandas criadas pelas mudanças no mundo do trabalho. De um lado vemos a
versão da educação salvacionista como fator por excelência para a inclusão e
participação social. De outro vemos a descrença em uma educação, incapaz de
superar os interesses do capital, em relação à exploração e exclusão. Conhecer o
processo pelo qual o homem organizou sua produção e existência, sua forma de
pensar e ser em diferentes tempos, nos ajudará a entender melhor, no contexto
atual, as relações e valores que permeiam o modo de produzir e as políticas
educacionais.
PALAVRAS-CHAVE: Trabalho. Educação. Modo de produção. Contradição.
ABSTRACT: The changes in the world of work, from new forms of man to organize
the production of its existence, have a direct impact on social institutions, especially
in the family and at school. In formal education, educators and students living with
their results, often conflicting, the implementation of educational policies formulated
according to the new demands created by changes in the working world. On one side
we see the version of education excellence by Salvationist as a factor for social
inclusion and participation. Otherwise we see the disbelief in an education, unable to
overcome the interests of capital in relation to the exploitation and exclusion.
Knowing the process by which the man organized its production and existence, their
way of thinking and be at different times, will help us better understand, in the current
context, relationships and values that permeate how to produce and education
policies.
1Salonides José Zanella de Avila é professor da rede pública de ensino do Estado do Paraná, Educação Básica e
formado em filosofia/história, pela PUC/PR.
Este trabalho contou com a orientação e discussão do professor Rinaldo José Varussa, da Unioeste-Mal
Rondon.
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KEY WORDS: Work. Education. Mode of production. Contradiction.
INTRODUÇÃO
Neste artigo veremos que as transformações ocorridas no mundo do
trabalho, a partir de novas formas do homem organizar a produção de sua
existência, tem um impacto direto nas instituições sociais, principalmente na família
e na escola.
Na educação formal, educadores e educandos vivem diretamente os
resultados, geralmente conflituosos, da implantação de políticas educacionais
formuladas de acordo com as novas demandas criadas pelas mudanças no mundo
do trabalho. De um lado vemos a versão da educação salvacionista como fator por
excelência para a inclusão e participação social. De outro vemos a descrença em
uma educação, incapaz de superar os interesses do capital, em relação a
exploração e exclusão.
Conhecer o processo pelo qual o homem organizou sua produção e
existência, sua forma de pensar e ser em diferentes tempos, nos ajudará a entender
melhor, no contexto atual, as relações e valores que permeiam o modo de produzir
e as políticas educacionais.
Ainda neste artigo veremos os conceitos de trabalho e as concepções
estabelecidas entre trabalho e educação em diferentes tempos e sociedades, no
intuito de entender os valores que permeiam tais ralações.
Este estudo permitirá compreender, através de um embasamento
bibliográfico, as várias maneiras como o homem vem organizando, no decorrer do
processo histórico, os modos de produzir sua existência, que tem se modificado de
acordo com as necessidades e interesses de uma classe dominante.
A análise não tem a intenção, nem conta com a ingenuidade de encontrar as
soluções, mas, levantar dados provocando discussão, visando uma melhor
compreensão do contexto atual.
Entendendo melhor a maneira como o homem organiza a produção de sua
existência, sua forma de pensar e de ser, podemos perceber no bojo dos conflitos e
contradições do sistema, os valores que permeiam tais as relações, no que tange a
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questão trabalho-educação, na tentativa de compreender melhor as crises
vivenciadas no cotidiano da escola.
PERCEPÇÕES RELATIVAS A TRABALHO E EDUCAÇÃO
Ao desenvolver nosso trabalho cotidiano como educadores, fazemos
constantemente referências a concepção trabalho-educação e percebemos a
importância que o educando dispensa a referida concepção , devido o tema fazer
relação direta com seus anseios e projetos.
Como o homem se constitui através do trabalho em diferentes sociedades?
Trabalho sempre teve relacionado com a educação nas diferentes culturas? Quais
significados o trabalho tem assumido em diferentes tempos, e que valores permeiam
as relações de produção? Como as mudanças ocorridas no modo de produção
acarretam transformações no modo de pensar e ser das pessoas hoje?
Conhecer o processo pelo qual o homem organizou sua produção e
existência, sua forma de pensar e ser em diferentes tempos, nos ajudará a entender
melhor, no contexto atual, as relações e valores que permeiam o modo de produzir
e as políticas educacionais.
Sentimos nos dizeres e comportamentos dos alunos, através de suas
experiências vividas no mundo do trabalho, somadas as que seus próprios familiares
vivem, diferentes concepções na relação trabalho-educação. Percebemos por parte
de alguns, a confiança depositada na educação, como uma ferramenta que o
capacitará para o trabalho através da aquisição do conhecimento, capaz de garantir
um futuro melhor. Como no dizer do aluno do 3º ano do Ensino Médio:
“Meu pai sempre trabalhou muito, para sustentar a família, não conseguiu
fazer faculdade. Eu quero uma vida diferente, mais tranqüila, ser alguém através de
meu próprio esforço. Quero fazer uma boa faculdade e conseguir bom emprego”.
(ALUNO2)
2Entrevista com o aluno F.B.C.. 3º ano Ens.Médio
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Por outro lado, percebe-se nos dizeres de outros estudantes, uma concepção
de trabalho e educação totalmente diferente. Mostrando o descrédito no mercado de
trabalho, na perspectiva de um meio que garanta a sobrevivência com dignidade,
através de suas capacidades e um descrédito na educação como instrumento capaz
de superar esta condição.
“A minha perspectiva diante do mercado de trabalho é de desânimo, vejo
muita gente desempregada ou se matando de trabalhar e ganhando pouco, mesmo
com faculdade completa.” (ALUNO3 )
Esta falta de perspectiva, de não conseguir incluir a educação formal como
parte de um projeto de vida, de futuro, explica também, a falta de interesse e certos
comportamentos tão indesejados do educando em relação à educação, refletidos no
cotidiano das escolas.
Trabalho e educação são atividades especificamente humanas, inexistem fora
do que concebemos como humanidade. O homem se humaniza através do
trabalho. Ao transformar a natureza, na tentativa de suprir suas necessidades, o
homem produz sua própria maneira de ser, de existir, sua essência. Agindo sobre o
meio natural, trabalhando-educando, construindo e transmitindo o conhecimento
necessário à existência , está se humanizando , ou seja, se fazendo diferente
dos outros animais.
Ao agir de forma consciente, segundo o marxismo, no ato de criar e recriar-se
pelo trabalho, o homem também humaniza a natureza. Assim ao trabalhar está se
educando, numa contínua condição histórica, de forma que sua essência é
construída continuamente pelo trabalho e transmitida através das gerações, no ato
de educar-se. Desta forma o homem não nasce homem, ele se faz pelo trabalho. A
medida que produz sua existência , o homem se faz. Diferentemente do animal que
age pelo instinto, ele age intencionalmente.
Mas, o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já
3 Entrevista com a aluna A.P.D. – 3º ano do Ens. Médio
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no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e, portanto, idealmente (PARANÁ, 2006, p.19).
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Temos visto que o homem não tem medido esforços em produzir e acumular
conhecimentos, e revelado suas capacidades de aperfeiçoar a técnica, a arte de
fazer, a tal ponto de automatizar a produção, reduzindo o tempo e o seu próprio
esforço físico na realização do trabalho.
Na sua evolução histórica, a humanidade tem experimentado vários sistemas
ou formas de organizar sua produção e existência, mudando de acordo com as
necessidades e de acordo com os valores estabelecido pelos interesses de uma
classe dominante.
Na atual fase, o sistema capitalista, acabou de ultrapassar a partir dos anos
80, a hegemonia da organização fordista, baseada nos princípios do taylorismo-
fordismo, como organização do trabalho, para um novo modo de organizar a
produção, tendo como principal característica à acumulação flexível. As formas
anteriores são incorporadas, portanto deixam de ser hegemônicas. Esta nova lógica
da reestruturação produtiva supera a anterior no poder de acumulação. Busca uma
produção ainda mais enxuta, através da redução de custos: investindo em
tecnologia de automação, na redução da força de trabalho vivo, criando o
desemprego estrutural, intensificando a exploração e flexibilizando os direitos
trabalhista.
Como resultado da crise sofrida nas décadas de 70 e 80, houve o processo
de internacionalização do capital. Este ultrapassou as fronteiras nacionais e se
globalizou, trazendo de arrastão na sua esteira, pelas exigências das necessidades
criadas, transformações em todos os âmbitos da sociedade: do ponto de vista do
mundo do trabalho trouxe o desemprego estrutural; novas formas de organizar a
produção (flexibilização produtiva); do ponto de vista do estado, uma nova
concepção (estado mínimo), cada vez mais descompromissado com as políticas
públicas, exatamente no momento em que seria mais necessário, devido a
intensificação da precarização do trabalho, a redução do poder aquisitivo e o próprio
desemprego.
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Estas transformações impactam diretamente no âmbito educacional, criando
perspectivas diferentes e ambíguas nos educandos, incertezas , como citamos
acima. Cria a necessidade de novas demanda por educação, exigindo formação
de novas políticas educacionais específicas para atender esta nova forma de
organização e gestão do mundo do trabalho , que por sua vez são dadas pelo
capital. Como se processou a construção desta estrutura? Para aprofundar a
análise , veremos como a concepção de trabalho foi percebida em diferentes
tempos e culturas , que funções ele exerceu e sua dinâmica de transformação.
CONCEITO DE TRABALHO
O conceito de trabalho assume diferentes conotações em diferentes povos .
Em algumas culturas ele traduz o significado de algo penoso, representação de
sofrimento humano, como tortura, dor, fadiga , algo humilhante e servil, já em
outras, o significado pode mudar completamente, tendo a conotação de algo
libertador, razão da existência do homem, dignificação da vida, etc.. O fato é que,
independente da concepção, ele desempenha um papel central na vida do homem.
Para o grego, há uma palavra para fabricação e outra para esforço, oposto ao
ócio; também aparece a palavra pena, que é próxima da fadiga. No latim, surgem
as palavras laborare, a ação de labor, e operare, que corresponde a opus, obra.
Em nossa língua , a palavra trabalho assume diversas significações e tem
sua origem no latim tripalium, que era um instrumento agrícola , feito com três paus,
Com o tempo, o termo tripalium foi relacionado com instrumento de tortura,
juntamente com o verbo tripaliare, que significa torturar. Neste sentido, o trabalho
associa-se também a noção de punição, pelo pecado original, como está no Antigo
Testamento, em: (Gênesis III, p. 19 ): “Ganharás o teu pão com o suor do teu
rosto”). O direito a ter alimentação passa pelo dever do trabalho”.
Desta forma, em português, influenciado pelas culturas citadas a palavra
originou-se vinculada às idéias de padecimento, sofrimento, esforço, laborar e obrar.
Para os filósofos que compartilham o pensamento de Marx, de acordo com o
citado no início da análise, o trabalho humano se distingue do trabalho dos outros
animais, porque nele há consciência e intencionalidade, diferente de agir apenas por
instinto, e expressa a liberdade humana.
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Numa visão mais positiva, o trabalho, é visto como a aplicação das
capacidades humanas para propiciar o domínio da natureza, sendo responsável pela
própria condição humana, como sendo um esforço para atingir determinado objetivo
Na atualidade, na sociedade capitalista, o trabalho assumiu uma forma muito
específica: o emprego assalariado. Para entender como se construiu o modelo
capitalista, e que conhecimentos foram sendo exigidos para estar inserido no
processo de produção, bem como sua organização e suas conseqüências, faz-se
necessário entender como as relações de trabalho foram construídas
historicamente.
A CONCEPÇÃO DO TRABALHO EM DIFERENTES CULTURAS
A cultura do mundo antigo nunca valorizou o trabalho, mostrando um
contraste em comparação com a atualidade. Segundo a filósofa Arendt (apud
CARMO 1992, p.17), “os gregos cultivavam, em seu ideal de sabedoria , o primado
da contemplação sobre toda atividade, na convicção de que nenhum trabalho de
mãos humanas pode igualar em beleza e verdade o universo.” O trabalho seria
uma atividade menor, visto ter como fim apenas suprir as carências físicas. Tem
destaque nesta sociedade o trabalho escravo, executores das tarefas mais humildes
e pesadas para as quais não é desnecessário o uso de um conhecimento mais
sistematizado, visto que na rotina diária utilizam instrumentos rudimentares, sem
técnica e criatividade.
Para o filósofo Aristóteles a humanidade não poderia abrir mão do trabalho
escravo, era próprio da lei natural. Assim os cidadãos, a elite, livre das tarefas servis,
podia consagrar-se a pólis, aos prazeres do corpo, ou à investigação e à
contemplação das coisas eternas do espírito, a filosofia.
Ser escravo nas pólis significava não poder participar da vida política, ser
excluído de parte das festas religiosas, ser desprovido de direitos e da educação
para jovens cidadãos.
Na sociedade romana que também era escravista, o trabalho era algo vil,
oposto ao lazer e as atividades intelectuais.
Tanto os gregos como os romanos, tentaram justificar a escravidão, com base
ideológica, de que o escravo era um ser inferior por natureza. Com as
transformações ocorridas na sociedade romana, com passar dos séculos, o sentido
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do ócio a ser alcançado como um fim em si mesmo e como necessário para o
exercício espiritual, começa a ser concebido e interpretado de forma diferente: não é
mais o sentir livre do trabalho, mas o repouso necessário para a volta ao trabalho.
Na Idade Média, com a economia predominantemente agrícola, os servos,
como despossuídos da principal riqueza e fonte de sustento, a terra, também não
gozavam de liberdade. Embora levassem uma vida muito próxima a dos antigos
escravos, eram livres juridicamente. O trabalho apresentava-se importante como
atividade necessária à manutenção da economia feudal, mas, como não havia uma
economia de mercado que comportasse excedentes, não mereceu uma
preocupação especial na estrutura social e econômica do período, embora isto não
negue sua importância. Enquanto aos nobres cabia a função de defesa através da
guerra e ao clero, a oração para garantir a proteção divina, ao servo restou o
trabalho, seguindo a ideologia católica do trabalho como castigo, sofrimento e
penitência do homem. O catolicismo, enfatizou a virtude dos humildes, afastando
assim as tentativas do servos de maldizer a situação de penúria em que muitos
viviam, consolando-os com os dizeres bíblicos, conforme podemos perceber neste
trecho do Sermão da Montanha:
Vede as aves do céu, não semeiam nem colhem, nem guardam as provisões e, contudo, o vosso Pai celeste as alimenta. Não vos aflijais dizendo: que teremos para comer ou beber, que teremos para vestir? São os pagãos que buscam isso com diligência (CARMO 1992, p.23).
O trabalho servia para a resignação do cristão e a restauração da pureza da
mente. O corpo deveria estar ocupado para livrar-se das tentações diabólicas, assim
o trabalho visto também como castigo, incumbia-se da penitência, sofrimento e
meio de salvação para o homem.
Como a ordem no mundo terreno foi instituída por Deus, a riqueza e a
pobreza eram portanto dons divinos , postergou-se assim, igualdade para a vida
no paraíso.
SOCIEDADE MODERNA E O TRABALHO ASSALARIADO
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Somente na modernidade (séculos XV ao XVIII), com mudanças profundas pela qual a sociedade européia passou com o revigoramento comercial e urbano, que o trabalho passou a ser valorizado. Neste período, o trabalho foi idealizado como um símbolo de liberdade do homem, de transformação da natureza, das coisas e da sociedade, assumindo os anseios da burguesia nascente (PARNÁ, 2006, p.20).
A partir do séc. XVI, mais precisamente como resultante da Reforma
Protestante, os ensinamentos religiosos também começaram a expressar um sentido
renovado ao sofrimento oriundo do trabalho, transformando-o em conformismo e
motivo de orgulho. Há uma releitura da concepção cristã, no intuito de legitimar os
valores da classe emergente e justificar como aceitável o princípio da obtenção do
lucro. Na análise da ética protestante, segundo o sociólogo alemã Max Weber (apud
Carmo, 1992, p.27) “nesta a conduta racional tinha por princípio valores morais que
iam ao encontro dos ideais do capitalismo emergente.”
A ascensão da economia capitalista tem uma relação direta com a expansão
do protestantismo, à medida que se dá ênfase ao sucesso profissional através do
trabalho, ligado a fé. Isto é, o fato de que a acumulação financeira não é
condenável, e ainda é, sinal de aceitação e agrado divino. Desta forma, o tempo
como dádiva divina, passa a ser precioso, gradativamente a noção do mesmo que
estava ligada aos tempos da natureza irá sendo substituída pela do cronômetro
mecânico, que regula as atividades de forma mais precisa. Tempo passa a ser
dinheiro.
A maior produtividade no trabalho e a recusa ao luxo deram origem a um estilo de vida que influenciou indiretamente o espírito do capitalismo, criando um clima propício para a acumulação de capital. Sendo o trabalho a melhor oração, a obtenção de êxito e prosperidade através dele revela a condição de “eleito” para entrar no reino de Deus (CARMO, 1992, p.27).
O desenvolvimento fantástico que impulsiona o capitalismo, com a expansão
comercial e financeira, e num segundo momento com o desenvolvimento e
implantação da máquina no modo produção , gerou mudanças sem precedentes na
história: o surgimento de grandes cidades industriais, com conseqüência de um
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grande êxodo rural e o crescimento e a organização da classe operária. Estas
profundas transformações derivam conjuntamente ao novo modo de organizar a
produção. Como decorrência acarretam modificações substanciais, desqualificando
as atividades do artesão, ao mesmo tempo em que consolidava a separação entre
capital e trabalho, criando novas formas de intensificar a exploração da mão-de-
obra. Mudanças estas que atendiam as necessidades da acumulação capitalista.
O trabalho assalariado vai sendo imposto como condição de existência
humana, na medida em que se consolida o capitalismo . O sistema, na sua lógica
acumulativa, intensifica, em escala ascendente a alienação do trabalhador, ao
mesmo tempo em que vai parcelizando as tarefas. Marx deixa claro, que esta
divisão do trabalho não trouxe vantagens à classe operária porque, ao “apertar
apenas um parafuso”, efetivando o parcelamento do trabalho, vai-se perdendo o
controle e o conhecimento sobre a totalidade do processo de produção. Ao tornar-se
especializado em apenas uma parte do processo da construção do produto, o
trabalhador não consegue mais perceber o conjunto da atividade em que seu
esforço se insere. Ocorre a intensificação do caráter de estranhamento da
mercadoria. .
A força de trabalho, dentro da lógica de acumulação do sistema, passa a ser
organizada e efetivada de acordo com normas, que impõe disciplina e condição de
sobrevivência ao trabalhador, já que lhe foi tirada outras formas de prover seu
sustento. Dessa maneira, a medida que o sistema capitalista de consolidava, a
classe trabalhadora passa a reivindicar para si, como direito, o emprego
remunerado. O trabalho agora, passa a ser visto como constituinte da
personalidade do trabalhador, o que podemos chamar de consciência profissional
dos operários, que lutará pelos seus direitos.
DO TRABALHO ARTESANAL AO ASSALARIADO
Com o advento do renascimento urbano e comercial pelo qual a Europa vai
passar a partir dos séculos XII e XIII, intensifica o uso da moeda e muitos artesãos
que viviam em suas aldeias, produzindo até então para a sua família e tendo o
sustento complementando pelo trabalho agrícola, passam a ter a opção de
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sobreviver do seu próprio trabalho na área urbana. Assim a produção que era de
caráter doméstico, passa a atender o mercado em expansão.
Nesta etapa, utilizando a mão-de-obra familiar, não havia ainda, a divisão do
trabalho, nem a separação entre capital e trabalho. O artesão além de ser dono das
instalações, das ferramentas com as quais produzia, era dono da matéria prima, e
do lucro total da venda da produção. Quando havia ajudantes, estes não vendiam
seu tempo de trabalho ainda, apenas, pagavam pela utilização das ferramentas. O
crescimento das cidades, com a intensificação do êxodo rural, conseqüentemente
faz aumentar a demanda comercial e o número de artesãos e de aprendizes de
artesãos, os quais passam a receber um pagamento pelo trabalho, em alimento ou
em dinheiro. Podendo posteriormente montar sua própria oficina, ou passava a ser
jornaleiro recebendo um salário do mestre.
Neste período, a produção artesanal era controlada pelas corporações de
ofício, associações econômicas que defendiam os interesses da classe.
Organizados por especialidades nas corporações, seguiam normas quanto à
hierarquia, à formação, ao tempo de trabalho, ao salário, aos preços de venda dos
produtos e a proteção contra a concorrência externa.
A partir do século XV, com as grandes navegações e os descobrimentos,
houve uma enorme expansão comercial rumo ao oriente e a América, aumentando
consideravelmente a demanda. As oficinas de produção se multiplicaram com a
crescente expansão do mercado e os lucros passaram a se concentrarem nas mãos
dos comerciantes. Com o desenvolver deste processo ocorre um considerável
aumento da mão-de-obra assalariada.
No século XVI, à medida que a economia mercantil ganha corpo, as
corporações foram perdendo seu poder de controle. Abre-se espaço então para a
ingerência dos comerciantes, que passam a distribuir a matéria prima, a fornecer
instrumentos de trabalho e a controlar o mercado em prejuízo da decadência das
corporações. Surge então o comerciante capitalista, intermediário entre a produção
e a comercialização. Sistema conhecido como putting-out. Eles forneciam
mercadorias aos membros das corporações urbanas e aos aldeões, que
concordavam em trabalhar para eles.
A organização da produção continuou a mesma, continuando o mestre
proprietário dos instrumentos de trabalho, com o domínio do processo de produção,
mas, com uma diferença básica: este já não era independente, dependia agora, de
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um intermediário para ter a matéria-prima e vender a produção. Passou a receber
um salário por tarefa.
A produção passa então por uma reorganização, com objetivo de aumentar
sua capacidade, atendendo as necessidades de acumulação capitalista:
Já percebia, por exemplo, as vantagens da especialização, da divisão do trabalho para acelerar a produção. Não que sob o sistema corporativo a divisão do trabalho fosse inexistente. A produção têxtil, por exemplo, era dividida em tarefas separadas, cada uma controlada por especialistas. Nesse caso a divisão profissional do trabalho foi substituída pela divisão técnica do trabalho, isto é, a exclusividade profissional dominante nas oficinas de artesanato foi substituída pela distribuição de funções nas oficinas de manufaturas modernas. (PARANÁ, 2006, p.20).
Na Inglaterra, o êxodo rural, proporcionado pelos cercamentos, com o objetivo
de transformar a terra em pastagem para a criação de ovelha e a produção de lã,
visando alimentar a indústria têxtil, deixou desprovida uma grande massa humana
de sua subsistência, obrigados a vender sua mão-de-obra a qualquer preço, nos
centros urbanos. Intensifica-se desta maneira a formação e o crescimento da classe
operária.
O lento processo de ruptura das relações feudais promoveu a separação gradativa do trabalhador dos meios de produção, no campo e nas manufaturas. O camponês, aos poucos expropriado, e como o artífice, transformado em trabalhador livre, viu-se obrigado a vender sua força de trabalho para sobreviver. Enfim, o domínio burguês do trabalho percorreu uma trajetória que se iniciou no crescimento das populações municipais no fim da Idade Média, alimentado pela expansão dos mercados internacionais. O interior da Europa modificou-se com os resultados dessa expansão: a manufatura substitui o artesanato, a divisão do trabalho corporativo desapareceu diante da divisão do trabalho nas oficinas e, mais tarde, nas fábricas (PARANÁ, 2006, p.53).
Em meados do século XVIII, como resultado de todo o progresso técnico até
então experimentado, surge o elemento que vai produzir as condições de transferir
ao capitalista o controle total do processo de produção e impor a disciplina ao
trabalhador: a invenção da máquina. A produção , feita em escala cada vez maior,
passa a ser executada em grandes oficinas, denominadas de fábricas. , O
trabalho, caracterizado através da venda da mão-de-obra recebe o status de
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mercadoria, uma vez que antigo artesão, agora operário, perdeu no processo, a
posse das instalações, das ferramenta e da matéria-prima, ficando dependente, para
sobreviver, da venda da sua força de trabalho ao capitalista. O trabalhador, não
controla mais todo o processo de produção, passou a ocupar um posto fixo neste
processo, consolidando assim a divisão técnica do trabalho. Uma vez que a máquina
passa a fazer a maior parte do trabalho, as principais habilidades agora exigidas,
são de alimentar as máquinas.
UMA NOVA CONCEPÇÃO DE TEMPO
As inovações tecnológicas, que deram condições de consolidar o sistema
fabril e a divisão do trabalho, também trouxeram como conseqüência para o
trabalhador, a concentração de um grande número do mesmo e um só espaço,
possibilitando também ao capitalista, o controle do ritmo do trabalho e do saber
técnico. Para isto, foi fundamental o controle do tempo, que juntamente com a
necessidade de sincronizar o trabalho, agora ditado pelo movimento da máquina,
possibilitou a maximização da exploração da mão-de-obra. Os Trabalhadores
vigiados e submetidos a uma rígida disciplina, passaram a ter horário de entrada e
saída, prazos de entregas de tarefas e severa hierarquia. As concepções
tradicionais de sentir o tempo (tempos da natureza, da religião, da Igreja marcado
pelo sino, etc..) vão gradualmente sendo substituídos pelo tempo do mercador,
marcado pelo relógio.
Essa medição incorpora uma reação simples. Aqueles que são contratados experienciam uma distinção entre o tempo do empregador e o seu “próprio” tempo. E o empregador deve usar o tempo de sua mão-de-obra e cuidar para que não seja desperdiçado: o que predomina não é a tarefa, mas o valor do tempo quando reduzido a dinheiro. O tempo é agora moeda: ninguém passa o tempo, e sim o gasta (THOMPSON, 2002, p.272)
Outros tempos
Esse contraste entre dois tipos de tempo (“o tempo da Igreja” e o “tempo dos mercadores”) é esclarecedor, mas certamente é
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necessário pensar em termos de ainda mais variedades, incluindo o “tempo camponês”, o tempo do ano agrícola. Também existe o “tempo industrial”, não apenas a extensão do tempo do mercador às fábricas, primeiramente na Inglaterra e depois em todo o mundo, mas também a padronização do tempo seguindo o surgimento de novas formas de transporte. O estabelecimento de uma rede de carruagens públicas na Europa do século 18 dependia de um “horário”, um sistema de organização que mais tarde se estendeu às viagens de trem e avião. Hoje, nosso “tempo livre”, “feriados” e lazer, assim como nossas horas de trabalho, são governados pelo relógio e pelo horário (PARANÁ, 2006, p.59).
O domínio do Capital
Antes de sua expulsão do Paraíso, Adão e Eva desfrutavam, sem trabalhar, um nível de vida elevado. Depois de sua expulsão, tiveram de viver miseravelmente, trabalhando de manhã até a noite. A história do progresso técnico dos dois últimos séculos é a de um esforço tenaz para voltar a encontrar o caminho do Paraíso (Wassily Leontief, Prêmio Nobel de Economia,1973) (apud CARMO, 1992, p.36).
Na configuração deste contexto, vai ganhando corpo doutrinas sociais,
que defendem tanto os interesses da classe emergente quanto da classe operária.
Como ideologia empresarial nascente , tem destaque o liberalismo. Pautada na não
intervenção do Estado na economia , favorável a livre concorrência do mercado e a
exaltação dos direitos individuais. Agora um dos valores máximos, passa ser a
liberdade, liberdade do trabalhador vender sua força de trabalho. Deste modo a
miséria passa a ser conseqüência do crescimento desordenado da população
(Malthus), uma inadequação entre o crescimento populacional e a produção de
alimentos ou, na incapacidade dos derrotados em adequar-se ao sistema. Quanto
mais intensifica o uso de novas tecnologias, mais aumenta a exclusão através do
desemprego. Ideologicamente, escondendo que no bojo da lógica de acumulação:
...que esse ideal econômico se preocupou mais em defender os interesses da propriedade do que em proteger aquele cidadão que só possuía sua força de trabalho para vender. Assim , os ideais liberais se converteram em uma ideologia disciplinar da classe trabalhadora. (...) Com Adam Smith (1723-1790), o trabalho passa a ocupar o primeiro plano na conquista de riquezas. Ele constata que a riqueza dos países não reside no ouro, na prata ou na agricultura, como era a tendência do pensamento do séc. XVIII, mas no
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trabalho, capaz de transformar matéria bruta em produtos com valor de mercado (CARMO, 1992, p.37).
A exploração da força de trabalho humano, intensifica-se de tal forma que,
acentuou consideravelmente a miséria da classe operária. Não bastando a total
subsunção do esforço do homem adulto, em condições aviltantes como:
insalubridade, galpões escuros, sujos, mal ventilados, com máquinas ruidosas e
que apresentavam um enorme risco de acidentes, trabalho o tempo todo em pé,
ocasionando problemas de saúde, 14 h de trabalho diária, ausência de direitos e
salários miseráveis, segundo Carmo (1992, p.29) “A era do maquinismo arrancou
mulheres e crianças do lar e levou-os ao ambiente sombrio das fábricas”.
Hegel (1770-1831), na sua análise filosófica sobre o trabalho, tematizou o
desenrolar da luta entre duas consciências, a do senhor e a do escravo. Iria
influenciar profundamente Karl Marx (1818-1883), que através da concepção
materialista dialética da história, supera as teorias dos socialistas utópicos, os quais
apregoavam a eliminação da exploração do operariado através de reformas sociais
e econômicas, e vê na classe operária o potencial revolucionário, para a mudança
do sistema. A doutrina socialista se destaca, reunindo correntes político-ideológicas,
se opondo de modo geral, ao liberalismo burguês e ao capitalismo.
Para Marx o capitalismo tinha se tornado profundamente irracional, com a
produção voltada para o lucro de alguns poucos, na intensa extração da mais valia,
o trabalho excedente que não é pago. A classe capitalista se apropria e faz do
estado um instrumento de domínio e garantia de seus interesses.
A MÃO-DE-OBRA NA CONSOLIDAÇÃO DO CAPITALISMO NA AMERICA
PORTUGUESA E INGLESA:
A implantação do modelo econômico, plantation, baseado no latifúndio
exportador e com mão-de-obra escrava, foi a alternativa encontrada pelas potências
européias para explorar as riquezas da América. Esta condição de trabalho escravo
africano e indígena aceita e incentivada pelo Estado, prevaleceu oficializada até a
segunda metade do século XIX, e em condições clandestina, até os nossos dias. Na
condição de escravo, o trabalhador era destituído da livre opção em vender sua
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força de trabalho, privado de sua liberdade, estava submetido a vontade de um
senhor a quem pertence como propriedade. O trabalho livre assalariado existente
era a minoria.
Quanto ao Brasil, nos primeiros 30 anos da colonização, explorou-se o nativo
através do escambo, na extração do pau-brasil. Após, foi intensificada a escravidão
até 1570, quando O Estado Português, proíbe esta prática de trabalho escravo
indígena, com exceção dos hostis e antropófagos. Esta transformação radical na
maneira do indígena ocupar o tempo, através da imposição do trabalho compulsório
levou-o a várias formas de resistência como: fuga, morte por melancolia, suicídio
além de promover revoltas. Após, foram subordinados às ordens religiosas dos
Jesuítas, numa espécie de semi-escravidão. Apesar da proibição, o indígena
continuou sendo escravizado em algumas regiões do Brasil.
De modo geral, os estado europeus, optaram pela mão-de-obra escrava
africana. Houve uma concentração maior nas grandes regiões produtoras, Caribe,
Estados Unidos e Brasil, destacando a produção de açúcar, algodão e café.
Capturados por próprios povos africanos, eram vendidos para os comerciantes
europeus em troca de mercadorias: (aguardente, tabaco, tecido...), os quais
revendiam na América. Estima-se que entre os séculos XVI e XIX, de 10 a 12
milhões de africanos, entraram na América como escravos.
Submetidos aos castigos corporais e a humilhações, o escravo reagia ao
escravismo de diversas formas: revoltas, fugas, rebeliões, suicídio, entre outras.
A partir do século XVIII, as transformações que ocorreram na Europa com o
advento da Revolução Industrial, modificaram as estruturas políticas e econômicas,
provocando uma nova organização no modo de produzir, novas relações na
política internacional, a divisão internacional do trabalho e outras habilidades para o
exercício do trabalho. Neste contexto a exploração da mão-de-obra escrava, já não
atendia as demandas do mundo capitalista. A Inglaterra, maior potência econômica
do período, passou a combater o trafico de escravos. Nos Estados Unidos a
escravidão foi abolida em 1863 e no Brasil em 1888. Ocorre, então, a
intensificação da vinda de imigrantes, excedentes de trabalhadores europeus,
resultado das modificações do avanço do capitalismo. Vendem seu esforço físico
livremente conforme a lógica do capitalismo, como foi analisado anteriormente.
17
RESISTÊNCIA A EXPLORAÇÃO
À medida que o processo de efetivação da Revolução Comercial e Industrial
faz emergir a classe operária, em condições extremamente precárias, de intensa
exploração, emerge conjuntamente, a consciência de classe e os movimentos de
resistência, em busca de dignidade e dos direitos de tornarem-se cidadãos. A
mulher a partir do momento em que ocupa espaço na produção fabril e participação
nos movimento de protestos, inicia a conquista gradativa de direitos, antes quase
que exclusivo do homem, como o próprio direito de participação na luta da classe e
o direito de voto.
A classe operária em seu conjunto lança-se à luta utilizando os mais diversos
mecanismos possíveis: organizações corporativistas que mais tarde se transformam
em sindicatos de trabalhadores, greves, o movimento dos Luddistas, o movimento
Cartista, saques, e movimentos revolucionários, posteriormente partidos políticos,
entres outras formas de organização, reivindicações e protestos. O socialismo
começa a se tornar expressivo entre as teorias de protestos. Marx, autor do
socialismo científico, conclama o operariado à tomada de consciência de seu papel
histórico e à luta contra a opressão da burguesia, convocando os trabalhadores a se
unirem, para mudar o sistema.
O TRABALHO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA.
Observando a evolução tecnológica, verifica-se que a primeira revolução foi a da desvalorização do braço humano pela concorrência que lhe moveu a máquina e a segunda foi a da máquina de calcular assumindo o papel do cérebro. Depois de longo período de crescimento da produção causado pelos inventos da Revolução Industrial, o homem tornou-se apenas um apêndice da máquina. No final do século XIX, o fator humano passa a merecer mais atenção, não por um inesperado humanismo, mas porque o homem já não acompanhava o ritmo desejado da produção (CARMO, 1992, p.41).
Se agora tempo é dinheiro e trabalho virou mercadoria, nada melhor, para a
classe que detém o capital e os meios de produção, desenvolver mecanismos cada
vez mais precisos para diminuir o tempo necessário gasto na produção e reduzir o
18
valor pago pela mercadoria tempo. O objetivo é a maior produtividade com menor
custo. O trabalho passa a ser organizado, utilizando-se métodos para o controle
minucioso dos movimentos e do tempo.
Objetivando aumentar a acumulação capitalista, no início do século XX,
dentre a vária teorias e métodos elaborados para maximizar o desenvolvimento
econômico-industrial , destacam -se duas: o Taylorismo e o Fordismo.
Taylorismo
Frederick W. Taylor (1856-19150) , nasceu em família rica na Filadélfia, foi
educado dentro de uma mentalidade de veneração ao trabalho. De formação
puritana e princípios rígidos. Trabalhou como mecânico em fábrica de produção de
aço e graduo-se em engenharia .
Com Taylor, a maneira de trabalhar e o próprio trabalho, passam a ter
atenção especial, isto é, uma sistematização em seus mínimos detalhes. Buscando
o máximo de produtividade no trabalho e o controle do trabalhador (do trabalho
alienado), ele racionaliza a produção, de forma a evitar desperdício de tempo, de
gestos e movimentos desnecessários, economizando mão-de-obra . Ele analisou
matematicamente, cada gesto necessário . Introjeta a obsessão pelo tempo,
concretizando a noção do “tempo útil”. Tudo passa a ser cronometrado. A
organização do trabalho passa a ter um método “científico”.
Ao conceder o estatuto de ciência à sua técnica, oferece-lhe o prestígio de um saber desinteressado, objetivo e neutro, dissimulando, assim, uma concepção ideológica de trabalho nela revestida. Sua técnica disseminou pelas indústrias do mundo todo. Com aplicação ampla, ultrapassou os muros das fábricas e penetrou nos trabalhos de escritórios e até mesmo no trabalho intelectual. A generalizar-se, seu alcance transformou-se numa técnica social de dominação (CARMO, 1992, p.42).
O taylorismo aumentou a produção na fábrica , mas também aumentou a
exploração sobre o trabalhador, obrigando-o a produzir mais em menos tempo.
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Cada tarefa é decomposta em movimentos elementares individualizada e ritmados
de acordo com a cadência da máquina.
O método elimina o trabalho em grupo, gerador de corporativismo . Acentua
de vez a separação entre o trabalho intelectual (planejamento, concepção e direção)
e o trabalho manual (execução), retirando do trabalhador o saber integral, que como
artesão possuía, e conseqüentemente o poder de lutar por melhores condições de
trabalho.
Segundo Taylor, a vantagem do método é que “beneficia” os mais produtivos e “pune” os indolentes. Na verdade, porém, sua “ciência” redunda em uma das grandes tecnologias disciplinares do mundo moderno, dissimulada pela eficácia da produção, tornando o trabalhador uma massa bruta destituída de capacidade crítica e de satisfação, por não realizar atividades criativas. Suas tarefas são as de puxar alavancas, apertar botões, supervisionar painéis, vigiar equipamentos ou alimentar máquinas com matéria-prima (CARMO, 1992, p.44).
Fordismo
Henry Ford (1863-1947), tem a fantástica idéia de criar a linha de montagem e
a produção nunca mais foi a mesma. Nascido em Michigan, trabalhou como
mecânico e, em 1886, construiu seu primeiro carro. Fundou a Ford Motors Company,
tornando-se um dos maiores empresários da indústria de automóveis.
Ford mantém o essencial do Taylorismo, mas, faz um aperfeiçoamento no
método introduzindo em 1909, a linha de montagem, onde uma esteira traz as peças
e os componentes até o operário. Para elevar as margens de lucro e diminuir os
gastos, implantou um sistema de controle que ia desde o controle da produção da
matéria-prima, ferramentas, energia, transporte, até a formação da mão-de-obra.
A repetição das atividades e o tédio por passar a maior parte do tempo
calado, fazia com que o operário não suportasse muito tempo este emprego. Isto fez
com que a rotatividade da mão-de-obra fosse muito grande, num período de pleno
emprego. A saída encontrada foi o incentivo salarial.
Essa atividade em cadeia elevou o grau de mecanização do trabalho,
reduzindo ainda mais a iniciativa e autonomia dos operários. Ao ditar a cadência
do trabalho, a linha de montagem permite um grau de padronização de mão-de-obra
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que elimina o operário zeloso ou preguiçoso, pois ambos retardariam a marcha da
produção. Através da esteira transportadora o fordismo fixa o operário em seu posto,
fazendo com que as peças e os componentes venham até ele, para que “nenhum
homem precise dar um passo”; diz Ford (apud CARMO, 1992, p.44).
O fordismo proporcionou o aumento da produção, e conseqüentemente o
padrão de consumo nos países desenvolvidos, no início do século XX.
OS REFLEXOS NA ECONOMIA BRASILEIRA
No Brasil, a influência do sistema fordista, que incorpora características do
taylorismo, ocorre a partir da década de cinqüenta, com o incentivo à
industrialização proporcionado pelo estado. Surgiram grandes áreas industriais, com
destaque para a região sudeste: São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Proporcionalmente à implantação das indústrias, ocorre também, direcionados para
estas regiões, principalmente advindo da região nordeste, um intenso movimento
migratório, atraído pela crescente oferta de postos de trabalho . Muitos continuaram
excluídos.
Desde a revogação da lei de 1775, por D. João VI, a qual proibia a instalação
de atividades industriais em solo colonial, a sempre incipiente atividade industrial
brasileira, tem sofrido vários revezes no seu desenvolvimento. O próprio rei D. João
VI assina em 1810, um tratado que prejudica o crescimento da mesma. A partir de
1850, o capital derivado da economia cafeeira, juntamente com a substituição da
mão-de-obra escrava pela operária, com a vinda do imigrante europeu, o qual “tem”
mais habilidades de acordo com a demanda do mercado de trabalho da época,
proporcionou um crescimento urbano e econômico, mas, a economia brasileira
continuou agro-exportadora.
Na primeira metade do século XX, impulsionado pelas mudanças na
conjuntura internacional, aumenta a necessidade do Brasil desenvolver sua
indústria. Diante da escassez do capital privado nacional e multinacional, o
desenvolvimento industrial se deu mediante a intervenção do capital estatal, com
investimentos nos setores de base e na infra-estrutura: mineração, siderurgia,
energia e setor químico.
Foram criadas a bases para o desenvolvimento nos diversos setores da
indústria, com a produção nacional substituindo uma série de bens industrializados
21
que até então eram importados. O Brasil deveria deixar de ter uma economia agro-
exportadora para se tornar predominantemente industrial. Mas, os incentivos dados
pelo governo JK na década de 60 , ao capital internacional, trouxe , além das
indústria multinacionais do setor automobilístico, as de bens de consumo,
juntamente com as novas teorias de produção. Prejudicando o desenvolvimento do
setor industrial nacional.
Durante os governos militares, continuou o incentivo ao capital estrangeiro ,
agora, com o predomínio de grandes empresas monopolistas, política que levou a
proletarização de parcelas cada vez maiores da sociedade brasileira, com a
conseqüente precarização dos salários e das condições de vida. Neste período a
população urbana ultrapassa em porcentagem a população rural, em1960, 45% da
população vivia nas cidades, passando para 67% em 1980 (IBGE). A produção
industrial brasileira, no período, passa a ser organizada conforme os ditames da
ideologia taylorista-fordista.
Até o início do século XX, o trabalhador brasileiro não havia conquistado
melhorias nas condições de trabalho: jornada de trabalho de até 18 horas diária,
intensa exploração do trabalha feminino e infantil, condições insalubres e não havia
lei para o salário. Direitos já conquistados pelos trabalhadores europeus. Estas
condições levou a classe se organizar na luta por direitos. Direitos estes, que no
período da Primeira República, eram tratados como Caso de Polícia.
Com a Crise de 29, a qual provoca a derrubada da oligarquia cafeeira do
poder e dá início ao governo de Getúlio Vargas, leva à falência a política agro-
exportadora , exigindo um investimento pesado do Estado no desenvolvimento
industrial.
Durante o governo Getúlio D. Vargas (1882-1954), ocorre a efetivação dos
direitos trabalhistas, a CLT (1943) : organização da jornada de trabalho, instituição
do Ministério do Trabalho, a lei de sindicalização, o salário mínimo... O estado
institui os direitos, mas, mantém o controle sobre trabalhador, controlando os
sindicatos. Concepção trabalhista inspirada na Carta Del Lavoro de 1927, do
fascismo italiano, a qual prega, que a organização sindical é livre , mas, só o
sindicato subordinado ao estado tem direito de representar os trabalhadores.
A CLT regulamentou o trabalho urbano e ignorou o trabalhador rural que
compunha a maioria da força de trabalho do Brasil em 1943. Na década de 50,
surgem movimentos sociais que lutam pela defesa dos direitos do trabalho no
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campo: Ligas Camponesas, as Associações de Lavradores e Trabalhadores
Agrícolas, e o MST.
Hoje, devido a Reestruturação Produtiva, há a necessidade por parte dos
empresários de atualizar, flexibilizando as relações trabalhistas, de acordo com
lógica do capital, uma produção cada vez mais enxuta, no sentido de precarizar os
direitos.
Toyotismo
O sistema de reformulação do modo de produção, chamado toyotismo, surgiu
num contexto de recessão da produção capitalista, em que o mundo, e em particular
a economia japonesa onde nasceu, se encontravam no início da década de 70.
Diferente do contexto, de uma economia em expansão, onde se originou o
taylorismo-fordismo.
Foi concebido para se adaptar as condições de diversificação mais difíceis.
Revela-se muito plástico. Seu objetivo é uma produção enxuta.
Nos anos 70 o padrão de regulação taylorista-fordista começa a dar sinais de esgotamento em meio à uma crise estrutural vivida pelo capitalismo nesse período. O Taylorismo e o fordismo passam a conviver ou mesmo a ser substituído por outros modelos considerados mais “enxutos”, melhor adequados às novas exigências capitalistas de um mercado cada vez mais globalizado. É a partir dos anos 1980 que se observa o acirramento da chamada reestruturação produtiva. Em um cenário de maior competitividade as empresas, visando a redução dos custos de produção, a maior variabilidade de suas mercadorias, a melhoria da qualidade de seus produtos e serviços e de sua produtividade, investem em mudanças de ordem tecnológica e organizacionais, que repercutiram negativamente nas relações e condições de trabalho (NAVARRO.; PADILHA, 2005, p.05).
A produção passa a ser feita de acordo com a demanda. O consumo é que
condiciona a produção, mantendo o mínimo de estoque. O trabalho na fábrica foi
divido em: transporte, produção, estocagem e controle de qualidade. Apresentando
no seu mecanismo inovações primordiais como a autonomação, a polivalência e a
secularização, o sistema se apresenta flexível, capaz de reduzir ou acelerar a
velocidade da produção de acordo com a demanda, manter padrão de qualidade,
fácil reposição da mâo-de-obra, alto índice de produção... Adaptável aos momentos
23
de crises do capitalismo. As características principais são: produção através de
tecnologia avançada; novas formas de gestão administrativa; automatização da
produção; terceirização de alguns setores; número reduzido de trabalhadores;
introdução de estratégias colaborativas; polivalência – um trabalhador cuida de
várias máquinas; jornadas flexíveis; secularização; entre outras.
Acumulação flexível.
No início da década 70 o modelo taylorista-fordista, já não corresponde
adequadamente a demando do capitalismo acarretando perda de lucratividade,
ficando cada vez mais evidente a incapacidade de responder as novas exigências
do mercado. Por ser um sistema rígido, já não se mostrava rentável, num período
em que estava exigindo mais flexibilidade na produção. O quadro foi agravado com
a Crise do Petróleo de 73, que fez aumentar o gasto com energia, levando a uma
recessão mundial. A crise pressiona o aumento dos juros do capital financeiro,
encarecendo a dívida externa dos países pobres, causando inflação, desemprego e
arrocho salarial para a classe operária.
Com a modernização no parque industrial, através do uso das novas
tecnologias de automação, e novas formas de gestão, buscando uma produção mais
flexível, regiões da Europa Ocidental e o Japão, passaram a oferecer produtos a
preços mais competitivos, pressionando a demanda a nível mundial. O modelo
japonês, Toyotismo, destaca-se por ser um sistema mais ágil e capaz de responder
de forma mais eficiente as demandas de um mercado em crise. Desta forma este
novo sistema de organizar a produção, serviu para a manutenção do sistema
capitalista, auxiliando na implantação hegemônica do neoliberalismo.
Surgido na década de 40, como crítica ao estado intervencionista de Bem
Esta Social, que predominou na Europa Ocidental e nos Estados Unidos no período
Pós-Segunda Guerra Mundial (1939-1945), até a crise de 73, o neoliberalismo,
devido a estabilidade do capitalismo neste período, não encontra espaço para
crescimento. Agora na crise, apresenta o receituário para superá-la: diminuição da
inflação, diminuição do déficit público, privatizações de empresas públicas,
diminuição dos conflitos sindicais e aumento de ganho de capital. No âmbito político,
tendo como característica o estado-mínimo, destrói as bases do Estado de Bem
Estar Social.
24
A adoção dos princípios do toyotismo na organização da produção levou a
formação do que ficou conhecido como processo de acumulação flexível, e a
flexibilização passou a ser a palavra de ordem.
CONSIDERAÇÕES NO CONTEXTO ATUAL
De forma mais geral, o que nos remete aos questionamentos do início do
texto, importa conhecer algumas macro-categorias que estruturam o regime de
acumulação flexível, sobre o ponto de vista do mundo do trabalho e de acordo com
a ideologia neoliberal, visto que a reestruturação produtiva, exige um novo perfil de
trabalhador, com novos conhecimentos e habilidades, de acordo com os interesses
do mercado, que ao enxugar a produção, precariza os direitos trabalhistas e
intensifica a exploração da mão-de-obra. O que nos remete, novamente, à relação
trabalho-educação, ou seja, as relações entre as políticas pedagógicas e as
necessidades da produção, visto que para entender a gênese dos projetos políticos
pedagógicos, necessitamos entender como estas novas necessidades de
conhecimento surgem a medida que muda o processo de produção, implantando
uma nova concepção de mundo.
A acumulação flexível em relação à economia, levou à internacionalização do
capital, que por sua vez como parte integrante desta acumulação, provoca o
desemprego estrutural, devido a lógica do capital, que para aumentar seus lucros,
investe numa produção cada vez mais enxuta, intensificando o uso de tecnologia,
automação, o que vai provocar o desaparecimento de postos de trabalho, e força
mudanças nas relações trabalhistas, levando a uma intensa precarização dos
direitos trabalhistas. Em relação ao estado, impõe uma nova concepção, o
estado mínimo, incapaz de manter os direitos essenciais, destruindo as conquistas
do Estado de Bem Estar Social. No Brasil, implantada nos anos 90, com a política
neoliberal do governo Collor. O Estado passa a ter um crescente descompromisso
com as políticas públicas, realocando verbas, em prol do aumento do ganho de
capital. À medida que a classe operária perde seu poder aquisitivo, o estado reduz
sua função social.
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De acordo com as novas demandas do mercado, provocadas pela
reestruturação produtiva, as habilidades exigidas são outras. O trabalhador rígido,
do sistema fordista, que fazia o mesmo trabalho a vida inteira, devido as pequenas
mudanças tecnológicas, especializado, executando as mesmas tarefas, simples e
repetitivas, com os direitos trabalhistas garantidos, vai perdendo espaço para um
saber mais genérico. Os projetos pedagógicos profissionais tinham a função de
especializar o trabalhador para uma determinada tarefa, da produção, agora são
elaborados com outros objetivos.
Já no processo determinado pela acumulação flexível, surge a necessidade
de formar um trabalhador polivalente, mais participativo e mais envolvido no
processo. Capaz de trabalhar em equipe. Um trabalhador mais flexível, versátil,
capaz de realizar tarefas bastante amplas, envolvendo a fabricação, a manutenção,
o controle de qualidade e a gestão de produção. Com uma visão do conjunto do
processo de trabalho, capaz de desenvolver o espírito de liderança. O que leva à
necessidade de novos projetos educacionais, de acordo com as competências
exigidas.
No Brasil, a crise do Milagre Econômico nos anos setenta e os fracassos dos
planos econômicos do Governo Sarney, trouxeram o aumento da inflação e a
recessão dos anos oitenta. A Constituição de 88, que garantia direito social, nasce
tardia do ponto de vista do Estado de Bem Estar social, porque ao nascer, já é
dominada pela avalanche da internacionalização do capital, de acordo os valores
neoliberais, implantados pelos governos Collor, Itamar e FHC, os quais promovem
ajustes, em concordância com as políticas dos organismos que comandam o capital
internacional (FMI e Banco mundial) . Desta forma o Brasil entra na sintonia do
processo hegemônico capitalista: globalização e neoliberalismo, com todas as suas
conseqüências na modernização do processo de produção, dentro da lógica da
acumulação produtiva: desregulamentação, privatização e flexibilização.
È nesse contexto e nessa concepção da lógica de mercado, que são geradas
as políticas educacionais em curso no Brasil na década de 90. Houve
remanejamento dos recursos da educação; priorizou-se a formação
profissionalizante, na intenção de formar mão-de-obra eficiente para o mercado,
em prejuízo da educação integral.
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A reforma educacional tem como seu principal instrumento jurídico-narmativo o O Decreto no. 2.2208/97 de 17.04.97. Para Lima Filho uma das principais funções dessa reforma é: ... a de proporcionar uma alternativa ou ensino superior. Esta função contenedora (sic) é buscada pela oferta de cursos pós-médios para a formação de tecnólogos. A reforma , ao mesmo tempo que redireciona a demanda par estes cursos, vincula às necessidades imediatas do mercado a oferta de cursos, a flexibilização de currículos e a própria organização e gestão das instituições educacionais. Enfim, a relação educação-trabalho é associada ao primeiro e a empresa ao segundo. Os produtos – educandos e assessorias etc., são como outras mercadorias, que tem suas ofertas, demandas e valores de trocas regulados conforme a relações de mercado (VASCONCELOS, 2008, p.08).
Enfim, a reestruturação produtiva, traz na sua esteira mudanças nas mais
diversas áreas e em especial, além da econômica, na esfera social e cultural,
abalando os pilares que sustentavam a modernidade: estado, escola e
família. Coloca os valores tradicionais em choque com o relativismo pós-moderno,
expressado no consumismo e no imediatismo.
Visto que a escola reflete a sociedade, percebemos que estas mudanças
atingiram a educação. De um lado reforçando uma concepção salvacionista de
educação, a empregabilidade: a qual, habilita, para o mundo do trabalho,
dissimulando, a garantia de inclusão . Refletindo no interesse do educando. De
outro, a descrença: de que a aquisição de conhecimentos possa levar a superação
da condição de excluído. Refletindo no desinteresse e em comportamentos
indesejáveis dos educando, como vimos no início do texto.
Como vimos, a doutrina neoliberal, em seu caráter globalizante, impõe cada
vez mais os interesses de mercado como eixo regulador das relações sociais. Em
conseqüência, aumenta a concentração de riquezas no topo da pirâmide social,
levando ao aumento do contingente dos despossuídos e excluídos na base da
mesma. Agravando os problemas sociais, aliado a capacidade reduzida de
intervenção do estado. Que agora, dependente do capital internacional, sofre, no
bojo das diretrizes educacionais, influência de organismos que comandam o capital.
O conhecimento que o Banco Mundial sugere para o Terceiro Mundo é um produto acabado, feito no Primeiro Mundo, passível de ser adquirido como uma mercadoria que, objetivada em um pacote, pode ser utilizada segundo normas técnicas, presas ao próprio produto, por qualquer consumidor. Segundo esse órgão, o conhecimento assim empacotado, servindo para eliminar, de modo rápido a
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defasagem entre ricos e pobres traz a vantagem embutida na supressão do tempo que seria necessário à compreensão, pelo usuário, das reações entre as medidas a serem tomadas e os seus efeitos, ou as possíveis conseqüências (boas ou más) do tratamento utilizado(NAGEL, s.d., p.02)
Isto nos remete à questão inicial, na tentativa de entender melhor , no
contexto da crise atual, aos valores permeiam as relações de produção . Como se
processa as relações entre trabalho e educação e quais os valores predominantes,
na atual forma de organizar a produção.
Neste contexto, a educação surge com características redentora , capaz de
minimizar ou compensar os graves problemas sociais e econômicos, inerentes da
lógica interna do sistema neoliberal. A produção do conhecimento com potencial de
libertar o dominado de tal condição é preterida pela cópia do conhecimento pronto,
que na tentativa de esterilizar a razão, traz incluído o caráter ideológico da
dominação e da exploração. Características que ficam bem claras na política dos
PCN (1998), onde a política educacional como componente da política social e
econômica, priorizava o desenvolvimento de habilidades e competências, em
detrimento do raciocínio crítico e criativo. A teoria do capital humano, presente no
fordismo, é substituída pela da empregabilidade, que através da aquisição do
conhecimento, garante o inclusão no mercado de trabalho. Porém, esconde que o
sistema é excludente e não deixa espaço para todos. Dessa forma o excluído passa
a ser responsável por sua incapacidade. A vítima passa a ser a culpada.
A sociedade burguesa sustenta que a educação é o antídoto para quase todos os problemas sociais. A educação seria ainda a alavanca necessária para o desenvolvimento econômico do país. Entretanto, o pensamento crítico permite compreender que, sem a superação do modo de produção capitalista, não se terá educação de qualidade, tampouco haverá ampliação dos postos de trabalho por intermédio do acesso à escola (GALVÃO, 2007, p.187).
É notório que o diploma universitário já não garante um emprego e, não raramente, alunos recém-graduados não encontram um posto de trabalho. Muitos diplomados acabam aceitando empregos em áreas diferentes das de sua formação, e com salários que não condizem com o nível superior de escolaridade (GALVÃO, 2007, p.174).
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Estas transformações atingem diretamente as estruturas familiares,
intensificando os conflitos internos devido a ausência dos pais que gastam a maior
parte do tempo consumido pelas novas dinâmicas sociais; e as mudanças nas
concepções dos valores, que agora são transmitidos e reforçados pela mídia, com
a sutileza da ideologia burguesa. Como a escola reflete a sociedade, vive
diretamente estes conflitos.
Se, do ponto de vista sócio-histórico, a escola é palco de confluência dos movimentos históricos (as formas cristalizadas versus as forças de resistência), do ponto de vista psicológico ela é profundamente afetada pelas alterações na estruturação familiar. De ambos os modos, a indisciplina apresenta-se como sintoma de relações descontínuas e conflitantes entre o espaço escolar e as outras instituições sociais (AQUINO, 1996, p.48)
Como vimos, os reflexos deste contexto têm influência direta no âmbito
escolar. Impactando na qualidade da educação através das: “impotentes” políticas
educacionais; do sucateamento das estruturas físicas das escolas e dos materiais
didáticos ; e da defasagem da capacitação continuada dos educadores. Docentes
e discentes, sentem a pouca eficiência dos sistema educacional em apresentar
alternativas.
A Educação, segundo a LDB, é apresentada com princípios de uma escola
democrática, universal, com garantia de padrão de qualidade, vinculando a
educação escolar ao trabalho e práticas sociais; tendo por objetivo transferir o
conhecimento acumulado, apoiado em um currículo que contribui para a formação
crítica e a construção da cidadania. “(...) tem por finalidade o pleno desenvolvimento
do educando, seu preparo par o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho”.(LDB 9394/96, Art.2º)
Pelas experiências vivenciadas, a educação, tem constituído um campo
limitado para atender a complexidade gerada nas relações desta sociedade e
apresentar alternativas de superação à uma grande parcela da população. Como
parâmetro, podemos ver o quadro de exclusão social no Brasil. O que exigiria outra
pesquisa.
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Se os novos projetos educacionais, como vimos, derivam das necessidades
criadas no bojo das relações sociais e econômicas e, no interior do sistema estas
seguem a lógica da acumulação através da exploração e exclusão, como a
educação, de forma autônoma, pode objetivar projetos de superação da realidade
posta? Que cidadania visa?
...a educação ou aquisição (consumo) de novos saberes, competências e credenciais, apenas habilitam o indivíduo para a competição, num mercado de trabalho cada vez mais restrito, não garantindo, entretanto, sua integração sistêmica plena (e permanente) à vida moderna. Enfim, a mera posse de novas qualificações não garante ao indivíduo um emprego no mundo do trabalho (ALVES, 2007, p.7 ).
Da mesma forma, não podemos esquecer da importância primordial da
educação:
Independente de qualquer argumento contrário, temos que reconhecer que alguém à margem da escolarização não pode (e nem mesmo o sabe) aceder ao status de cidadão na sua plenitude. Seus direitos, mesmo que em tese sejam iguais aos dos outros, na prática serão mais escassos. O acesso pleno à educação é, sem dúvida, o passaporte mais seguro da cidadania, para além de uma sobrevivência mínima, à mercê do destino, da fatalidade enfim (AQUINO, 1996, p.48).
Voltamos ao paradoxo da educação, na sua função de reproduzir e
transformar a sociedade. O que também não é o mérito desta pesquisa.
A análise não tem a intenção, nem conta com a ingenuidade de encontrar as
soluções, mas, levantar dados provocando discussão, visando uma melhor
compreensão do contexto. Lembrando que a escola sozinha não muda a sociedade.
Entendendo melhor a maneira como o homem organiza a produção de sua
existência, sua forma de pensar e de ser, podemos perceber no bojo dos conflitos e
contradições do sistema, as relações e os valores, que hoje permeiam a questão
trabalho-educação, na tentativa de compreender melhor as crises vivenciadas no
cotidiano da escola.
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CONCLUSÃO
O artigo permitiu demonstrar, através de uma análise sobre o modo como o homem
organiza e concretiza a produção se sua existência no decorrer do processo
histórico, alguns sentidos estabelecidos à concepção trabalho-educação, no intuito
de entender um pouco melhor os valores que permeiam esta relação no contexto
atual.
Vimos também, como conseqüência da implantação dos projetos
políticos/econômicos, de acordo com a concepção neoliberal, com objetivo de
superar a crise do sistema, surgida na década de 70, resultou na reestruturação
produtiva, objetivando , como lógica interna do sistema, uma produção cada vez
mais enxuta, o que vai resultar, a partir da adoção dos princípios do chamado
toyotismo, no processo conhecido por acumulação flexível. Este processo levou a
falência do Estado de Bem Estar Social, na tese do Estado mínimo, precarizou os
direitos trabalhistas, a medida que enfraquece o poder do estado, quanto ao
compromisso de efetivar políticas sociais.
Com o neoliberalismo, e a globalização, o mercado passou a ser o eixo
regulador das relações sociais. A partir desta concepção, vimos que cada vez mais,
os projetos políticos pedagógicos, seguem a lógica estabelecida pelas relações
sociais e produtivas. Ou seja, a necessidade de formação, segue as necessidades
da produção. Para entender a gênese dos projetos políticos pedagógicos, com suas
diretrizes, necessitamos entender como estas novas necessidades surgem a medida
que muda o processo de produção, implantando uma nova concepção de mundo.
Como resultado, vivenciamos crises e conflitos refletidos na concepção de valores e
nas instituições sociais.
No contexto educacional, de um lado vimos, uma concepção salvacionista , a
empregabilidade: a qual, habilita, para o mundo do trabalho, dissimulando, a
garantia de inclusão . Refletindo no interesse do educando. De outro, a descrença:
de que a aquisição de conhecimentos possa levar a superação da condição de
excluído. Refletindo no desinteresse e em comportamentos indesejáveis dos
educando.
Para concluir, vimos que é necessário entender melhor a maneira como o
homem organiza a produção de sua existência, sua forma de pensar e de ser,
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para compreender as relações estabelecidas entre trabalho-educação e as crises
vivenciadas no cotidiano da escola.
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