o princípio da eficiência e as agências reguladoras no brasil
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O Princípio da Eficiência e as Agências Reguladoras no Brasil
The Principle of Efficiency and Regulatory Agencies in Brazil
Resumo
O presente trabalho teve como objetivo o estudo sobre a Administração Pública Brasileira valendo-se de uma faceta específica, qual seja, a ferramenta teórica das Agências Reguladoras e seu papel na implementação do princípio da eficiência determinado pelo art. 37, caput, da Constituição Federal do Brasil de 1988. A questão central residiu na investigação dos possíveis benefícios que o citado modelo regulatório trouxe para a estrutura administrativa brasileira e se ele foi capaz de garantir a implementação da dita eficiência. Este trabalho foi de caráter explicativo e exploratório, caracterizado por pesquisas bibliográficas em livros, artigos, documentos, legislação e web sites. Muito embora criticado, o modelo regulatório estudado possui intrínseca ligação com o princípio da eficiência, por pregar a privatização e desestatização, e tem, em sua teoria idealizadora, a missão de beneficiar a administração pública como uma ferramenta para aprimorar a relação entre as empresas que regula e o administrado, em substituição a atuação Estatal direta.
Palavras-chave: Agências Reguladoras. Administração Pública. Princípio da Eficiência.
Abstract
This work had as objective study the Brazilian public administration making use of a specific aspect, namely, the theoretical tool of regulatory agencies and their role in implementing the principle of efficiency in art. 37, introduced of the Federal Constitution of Brazil in 1988. The central question was the investigation of possible benefits that the said regulatory model brought to the administrative structure of Brazilian and if it was able to guarantee the implementation of that efficiency. This work was exploratory and explanatory in nature, characterized by literature searches in books, articles, documents, legislation and websites. Although criticized, the regulatory model studied has intrinsic connection with the principle of efficiency, for preaching privatization and denationalization, and has, in its idealized theory, the mission to benefit the public administration with a tool to enhance the relationship between companies regulates and administered, in lieu of direct State action.
Key-words: Regulatory Agencies. Public Administration. Principle of Efficiency.
1 INTRODUÇÃO
A pesquisa sobre as Agências Reguladoras e sua utilização para atingir a
eficiência na Administração Pública encontrou campo fértil e nem tanto explorado no ramo da
Ciência Jurídica se levar-se em consideração que a sociedade caminha, a grande velocidade,
para níveis cada vez maiores de entrosamento por meio da globalização. Ocorre que tal fato
demanda e demandará maior espaço para que a Iniciativa Privada, possuidora de maior
capacidade de investimentos nos setores essenciais ao progresso por ter grande facilidade em
financiar-se e muito menos burocracia para aplicar tais recursos do que os Estados, atue de
forma proativa em setores que antes eram comumente áreas de ação Estatal.
No Brasil, inobstante o fato de o Estado atuar com forte influência
ideológica centralizadora e estatizante, o modelo regulatório adotado em grande parte das
privatizações demonstrou-se uma ferramenta eficaz nos momentos em que os setores
privatizados apresentaram distorções na sua atuação, ou seja, desviaram-se da função social,
uma vez que, ao invés do Estado atuar diretamente em tais setores, nestes casos atua como
ente regulador das relações entre sociedade e iniciativa privada, o que representa diminuição
da máquina estatal e consequente economia aos cofres públicos.
Desta feita, tendo como objetivo analisar os efeitos da aplicação do conceito
teórico de Agências Reguladoras no Estado brasileiro e seus reflexos na implementação do
princípio da eficiência na Administração Pública do Brasil, esta pesquisa assim se divide:
Foram analisadas as origens históricas das Agências Reguladoras, bem
como sua natureza jurídica e delimitação conceitual no direito brasileiro.
Na sequência, atem-se a uma análise da estrutura administrativa brasileira,
trazendo os conceitos de Estado e Governo, bem como a diferenciação entre Administração
Pública Direta e Indireta e, nesta última, a inclusão das Agências Reguladoras no correto
instituto da Administração do Estado Brasileiro.
Após, apresenta-se o conceito de Administração Pública pela vertente da
Atividade Administrativa, vale dizer o ato de administrar propriamente dito, delimitando sua
natureza jurídica e apresentando os Princípios Constitucionais que regem a Administração
Pública no Brasil com especial ênfase no princípio da eficiência, sendo que, ao final,
demonstra-se um breve confronto entre o modelo teórico das Agências e o referido princípio.
2 MATERIAL E MÉTODOS
O estudo desenvolver-se-á por meio do uso de material bibliográfico, pesquisas
jurisprudenciais e análise de casos. A apresentação do desenvolvimento dos institutos objeto
da presente pesquisa dar-se-á mediante a adoção do procedimento dedutivo, auxiliado pelos
procedimentos histórico e comparativo. A averiguação a se levada a efeito neste trabalho
utilizará de expressão instrumental como coleta, análise e fichamento de material
bibliográfico, matéria de jurisprudências e exame de legislações.
3 CONTEXTO HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS
3.1 BREVE HISTÓRICO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS
Após as duas grandes guerras o mundo passou por um período de transição
onde os conceitos ideológicos conflitaram, tendo uma bipartição visível onde figuravam os
Estados Unidos na vertente capitalista e a União Soviética na vertente Socialista; tal período
ficou conhecido como Guerra Fria.
Ocorreu que durante o governo de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, o
Socialismo declinou na disputa econômica.
Segundo Motta (2003, p2):
O capitalismo estava livre, não só para adentrar nos antigos territórios da Cortina de Ferro, como também encontrar um fortalecimento nos países em que já era o sistema jurídico-econômico dominante. Na batalha, o presidente Reagan contou com a aliança da primeira mandatária do Reino Unido, a Dama de Ferro, Margaret Thatcher, que havia iniciado, pouco antes, uma processo de desestatização, até então inédito, transformando por completo o panorama econômico da Grã-Bretanha. Essa política teve como características fundamentais: a desregulação e a privatização; a contratação externa de serviços financiados publicamente; e a venda de propriedades públicas.
As crises motivaram e legitimaram os Estados a intervirem na economia e
até mesmo competirem com empresas privadas, isso na tentativa de resolver os problemas
econômicos, ocorre, todavia que não se vislumbrou uma solução no horizonte.
A intervenção promovida pelo Estado para reavivar as economias trouxe um
alto endividamento, mostrando-se talvez como não sendo a melhor alternativa ao deslinde da
questão, daí a iniciativa praticada pelos Governos Reagan e Thatcher, onde a desvinculação
do Estado de Setores da Indústria e a privatização de patrimônio do Estado trouxeram a
competição privada como novo motor de impulsão para a derrocada da crise.
Neste diapasão, Medauar (2006, p.75) ensina:
Com a extinção total ou parcial do monopólio estatal de alguns serviços públicos e outras atividades e com a transferência total ou parcial, ao setor privado, da execução de tais serviços e atividades, mediante concessões, permissões ou autorizações, surgiram no ordenamento brasileiro as respectivas agências reguladoras. Assim, por exemplo, a Emenda Constitucional 8/95 possibilitou que os serviços de telecomunicações, antes monopolizados, fosse explorados diretamente
pela União ou pelo setor privado, mediante autorização, permissão ou concessão, e previa a criação, por lei, do respectivo órgão regulador.
Portanto o ideário inovador foi necessário em razão das crises financeiras
que os países enfrentaram no pós-guerra, haja vista o enorme dispêndio financeiro demandado
nas batalhas, o que exigiu dos administradores públicos atitudes enérgicas e concentradas na
reativação das economias como forma de recuperar o que foi perdido.
Este movimento reformador pós-guerra foi um fenômeno de nível mundial e
englobou diversos países que, no intuito de combater a crise que se avizinhava, promoveram
mudanças no estilo de administração da época. No entender de Motta (2003, p.2):
Entre os países mais desenvolvidos, os anglo-saxões desenvolveram os programas mais vigorosos de desintervenção dos setores produtivos. Nos EUA, a administração Reagan formulou a desregulação e a privatização como um dos marcos das políticas públicas. À medida que avançou a presidência de Reagan perderam relevância as medidas desreguladoras e se enfatizaram as propostas privatizadoras centradas na (1) contratação externa de serviços financiados publicamente e (2) venda de propriedade públicas. Em alguns países europeus, de forma destacada no Reino Unido, se outorgou prioridade à privatização de empresas públicas, especialmente em setores dedicados à provisão serviços públicos. A política de privatizações teve também um grande impulso nos países da Europa Central e Oriental nos anos noventa.
Depreende-se que a proliferação das privatizações e “desintervenções” do
Estado na economia se espalhou por diversos países, e serviu como ferramenta para superação
das crises que permeavam inclusive os anos oitenta e noventa no Brasil.
Acrescenta Medauar (2006, p.75) a respeito da denominação “órgão
regulador” e da importância dos EUA no amadurecimento do modelo regulador:
Tal denominação [órgão regulador] vem sendo usada no Brasil, recentemente, por influência dos ordenamentos anglo-saxônicos, sobretudo. Na Inglaterra, a partir de 1834, floresceram entes autônomos, criados pelo Parlamento para concretizar medidas previstas em lei e para decidir controvérsias resultantes desses textos; a cada lei que disciplinasse um assunto de relevo, criava-se um ente para aplicar a lei. Os Estados Unidos sofreram influência inglesa e desde 1887, com a criação da “ Interstate Commerce Commission”, tem início a proliferação de agencies para a regulação de atividades, imposição de deveres na matéria e aplicação de sanções; adquiriu muita fama a FDA (Food and Drugs Administration), responsável pela regulação, fiscalização e imposição de penalidades no âmbito da produção e comercialização de alimentos, cosméticos e medicamentos. (grifo do autor).
O país que mais se destaca quando se analisa a evolução histórica das
Agências reguladoras é os Estados Unidos vez que o grande amadurecimento de tais
instrumentos de governança tomaram a forma que conhecemos pela evolução política e
administrativa deste país. O professor Gomes (2006, p. 22) teceu considerações relevantes
acerca desta evolução política, social e legislativa:
O que é certo é que esse fenômeno de mutação constitucional, desencadeado pelas mudanças estruturais por que passou a sociedade, teve como consequência, no plano das instituições políticas, o surgimento do imperativo de mudança nas formas de exercício das funções estatais clássicas. O fenômeno da Regulação, tal como concebido nos dias atuais, nada mais representa, pois, do que uma espécie de corretivo indispensável a dois processos que se entrelaçam. De um lado, trata-se de um corretivo às mazelas e às deformações do regime capitalista. De outro, um corretivo ao modo de funcionamento do aparelho do Estado engendrado por esse mesmo capitalismo.
Por fim, apresenta-se o ensinamento de Motta (2003, p. 69), que resume em
dois aspectos básicos dos parâmetros e postulações que se como características mais
marcantes na teoria das Agências Reguladoras no direito Americano e que podem ser
vislumbradas, mesmo que de forma ainda nascente no direito Brasileiro.
O primeiro, diz respeito à função administrativa realizada pelas agências no direito norte-americano, em que é, a todo tempo, realçado o papel de prevenção realizado por estes entes, no intuito de evitar conflitos entre usuários e concessionários, na medida em que se possa usar a expressão concessionário no direito norte-americano, e usuários contra usuários. A Federal Energy Regulatory Commission, por exemplo, possui uma antiga tradição em defender o estabelecimento de regras claras, visando, com isso, evitar litígios prolongados. A segunda questão, importante de ser levantada neste momento do presente trabalho, diz respeito ao papel jurisdicional exercido pelas agências nos Estados Unidos, eis que existe ampla e específica regulamentação para que a decisão dos conflitos caiba a pessoas sem vínculo com as Agências [...]. (grifo do autor).
Portanto, pode-se perceber que na história recente, as agências reguladoras
surgiram, mais claramente no Reino Unido e Estados Unidos num cenário de pós-guerra, das
necessidades dos Estados se reorganizarem administrativamente com a finalidade de
organizar as despesas deixando de serem Estados empresários para adotarem um viés
regulador das atividades, a fim de garantir-se, principalmente um ganho de eficiência na
prestação dos serviços antes de competência estatal.
3.2 AS AGÊNCIAS REGULADORAS NO BRASIL
No Brasil não é nova a ideia de regulação de setores econômicos, sendo que,
na lição de Di Pietro (2007, p. 434):
No direito brasileiro, existem, de longa data, entidades com função reguladora, ainda que sem a denominação de agências. [...]. no início do século passado, no período 1930-1945, o Comissariado de Alimentação Pública (1918), o Instituto de Defesa Permanente do Café (1923), o Instituto do Açúcar e do Álcool (1933), o Instituto Nacional do Mate (1938), o Instituto Nacional do Pinho (1941), o Instituto Nacional do Sal (1940), todos esses institutos instituídos como autarquias econômicas, com a finalidade de regular a produção e o comércio. Além desses, podem ser mencionados outros exemplos, como o Banco Central, o Conselho Monetário Nacional, a Comissão de Valores Mobiliários e tantos outros órgãos com funções normativas e de fiscalização.
No mesmo sentido Mello (2008, p. 172) acrescenta sobre a questão da
temporalidade das Agências Reguladoras no direito pátrio, demonstrando a ligação do modelo
brasileiro ao modelo americano:
Em rigor, autarquias com funções reguladoras não se constituem em novidade alguma. O termo com que ora foram batizadas é que é novo no Brasil. Apareceu ao ensejo da tal “Reforma Administrativa”, provavelmente para dar sabor de novidade ao que é muito antigo, atribuindo-lhe, ademais, o suposto prestígio de ostentar uma terminologia norte-americana (“agência”).
E, de forma a exemplificar essa simples modificação nominal, Mello (2008,
p. 172) acrescenta:
A autarquia Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE, por exemplo, cumpria exatamente a finalidade ora irrogada à ANEEL, tanto que o art. 31 da lei transfere à nova pessoa todo o acervo técnico, patrimonial, obrigações, direitos e receitas do DNAEE.
Portanto é possível notar que a evolução e implementação das Agências
Reguladoras no Brasil não foi algo novo, mas apenas um aprimoramento de algo que já
existia de forma modesta.
Ocorre que, como observa Justen Filho (2002, p. 315):
Mas sequer pode discutir-se a conveniência do modelo consagrado pela Carta de 1988 para o Estado. Talvez até se pudesse reconhecer como desejável o Estado acumular funções assim relevantes para a evolução das conquistas democráticas, econômicas e de aperfeiçoamento social. O problema básico que logo se revelou foi a inviabilidade material da implementação do modelo teórico. O endividamento econômico do Estado brasileiro conduziu a uma crise profunda, caracterizada pela ausência de recursos para desempenho das funções estatais essenciais. Nem mesmo as competências mais básicas, correspondentes a uma concepção de Estado Mínimo, puderam ser cumpridas satisfatoriamente. Os serviços públicos na área de Educação, Saúde, Previdência e Assistência Social foram reduzidos à ineficiência, num limiar de colapso absoluto. Nesse contexto, escassearam recursos também para atividades de cunho econômico, mesmo aquelas diretamente relacionadas com o atendimento a necessidades coletivas essenciais.
Neste contexto, onde um momento pós-ditadura criou uma consciência
coletiva de garantismo absoluto na nova Carta Constitucional, deparou-se com um problema
latente na época, a crise de meados da década de 70, a famosa crise dos “Petrodólares”, onde
o Brasil mergulhou em uma crise onde o aumento da dívida se aliou a um consistente
aumento de inflação, inclusive ocasionando uma piora sistêmica no sistema administrativo do
Estado brasileiro, o que levou a ausência de possibilidades materiais para que o próprio
Estado assumisse uma postura provedora e efetivasse todos os benefícios que a nova
Constituição garantiam.
Continua Justen Filho (2002, p. 315), ao concluir que neste contexto
“produziu-se a reorganização das estruturas e atividades estatais, no bojo de um processo que
poderia ser qualificado de privatização, numa acepção não técnica”.
Isso é afirmado uma vez que o que se objetivava não era um
desmantelamento do Estado como foi alegado e ainda o é por razões político-ideológicas, mas
sim uma reordenação do Estado, tentando-se reduzir o máximo possível as despesas, sem
prejudicar os serviços e, quem sabe, através da concorrência privada, garantir a ampliação e
difusão de tais serviços.
Portanto, ainda segundo Justen Filho (2002, p. 322), “a viabilidade de um
modelo tal como esse depende da existência de uma competência regulatória, como é
evidente. Se o Estado reduzir sua atuação direta [...] a contrapartida será a regulação”.
Para a visão brasileira, neste sentido, é que não houve compatibilidade entre
o anterior sistema administrativo e as inovações trazidas pela Constituição Federal de 1988, o
que levou os administradores da época s reformular a estrutura administrativa brasileira com o
intuito de garantir maior dinamismo e capacidade de ação ao Estado.
3.3 CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTADO REGULADOR
Cabe esclarecer-se a figura do Estado Regulador que na visão de Justen
Filho (2002, p. 535),
O modelo regulatório propõe a extensão do setor dos serviços públicos de concepções desenvolvidas na atividade econômica privada. Somente incumbe ao Estado desempenhar atividades diretas nos setores em que a atuação da iniciativa privada, orientada à acumulação egoística de riqueza, colocar em risco valores coletivos ou for insuficiente para propiciar sua plena realização. O Estado deve manter a participação no âmbito da segurança, da educação e da seguridade social, evitando a mercantilização de valores fundamentais.
Portanto o dito modelo regulatório apresenta-se na tentativa de retirar do
Estado as funções não essenciais que somente trazem transtornos administrativos, dentre eles,
aumentos de gastos em função do aumento da máquina pública.
Há de se entender, portanto que a regulação visa resguardar a não incidência
de eventuais monopólios agora privados, tentando garantir regras que resguardem o bem estar
social, sem haver, teoricamente, o risco de envolvimento direto dos interesses políticos
ideológicos, mas como forma de se criar verdadeiras políticas de Estado.
Para reforçar o conceito de regulação, portanto, nos dizeres de Motta (2003,
p. 48):
[...] o conceito antes exposto permite concluir que a regulação é: a) Uma ação distinta e externa da atividade regulada; b) Uma limitação à liberdade do regulado;
c) Uma política pública, que responde ao interesse geral ou público; d) Pressupõe um padrão, um modelo, que não é outra coisa senão a conduta
desejada das atividades do regulado; e) Esta conduta (comissiva ou omissiva) está contida na norma regulatória e a
verificação do cumprimento desta é a tarefa do controle realizado. f) É um processo permanente, dinâmico, de ajuste para assegurar a regularidade e
a continuidade dos serviços prestados.
O objetivo da regulação toma forma como uma fórmula de se
desburocratizar o ato administrativo e, mais do que isso, conceder a tais atos uma natureza
mais técnica em detrimento de interferências ideológicas que podem corromper o ideal
administrativo original.
Um exemplo é aumento da máquina pública, principalmente no que se
refere à elevação do efetivo de servidores públicos, que representa, em alguns casos, o efeito
contrário ao esperado, qual seria, a melhora na eficiência do atendimento à população, uma
vez que, levando-se em consideração as dimensões continentais do Brasil, torna-se tarefa
árdua o alinhamento das diretrizes operacionais, e o estabelecimento de metas e objetivos no
serviço público é praticamente impossível no atual sistema, em razão de um excesso de
prerrogativas e garantias instituídos pela legislação vigente.
Sobre esse tema a lição de Pereira (2011, p. 13) é muito acertada, no ponto
em que afirma,
Na medida que a Constituição de 1988 representou um retrocesso burocrático, revelou-se irrealista. Em um momento em que o país necessitava urgentemente reformar a sua administração pública, de forma a torná-la mais eficiente e de melhor qualidade, aproximando-a do mercado privado de trabalho, o inverso foi realizado. O serviço público tornou-se mais ineficiente e mais caro, e o mercado de trabalho público separou-se completamente do mercado de trabalho privado. A separação foi proporcionada não apenas pelo sistema privilegiado de aposentadorias do setor público, mas também pela exigência de um regime jurídico único, que levou à eliminação dos funcionários celetistas, e pela afirmação constitucional de um sistema de estabilidade rígido, que tornou inviável a cobrança de trabalho dos servidores.
O excesso de segurança, estabilidade e regalias em relação ao setor privado
trouxe, segundo Bresser Pereira, um clima de completa estagnação no serviço público, uma
vez que não existia nenhuma ameaça direta aos servidores em razão de apuração de eventual
ineficiência.
Certo é que não foi proposital que isto ocorresse, tratando-se apenas de
consequência à aplicação de um “remédio” para um mal maior existente na época, que era, o
desmantelamento do setor público na maioria das vezes que a orientação política do país era
altera. Acerca disto, ainda em análise de Pereira (2011, p. 14), vejamos:
A estabilidade dos funcionários é uma característica das administrações burocráticas. Foi uma forma adequada de proteger os funcionários e o próprio Estado contra as práticas patrimonialistas que eram dominantes nos regimes pré-capitalistas. No Brasil, por exemplo, havia, durante o Império, a prática da “derrubada”. Quando caia o governo, eram demitidos não apenas os portadores de cargos de direção, mas também muitos dos funcionários comuns.
Outra consequência observada por Pereira (2011, p. 14) foi o elevado custo
da medida de estabilização dos servidores, que podemos observar no seguinte fragmento:
A estabilidade, entretanto, implica em um custo. Impede a adequação dos quadros de funcionários às reais necessidades do serviço, ao mesmo tempo que inviabiliza a implantação de um sistema de administração pública eficiente, baseado em um sistema de incentivos e punições. Era justificável enquanto o patrimonialismo era dominante e os serviços do Estado liberal, limitados; deixa de sê-lo quando o Estado cresce em tamanho, passa a realizar um grande número de serviços, e a necessidade de eficiência para esses serviços torna-se fundamental, ao mesmo tempo que o patrimonialismo perde força, deixa de ser um valor para ser uma mera prática, de forma que a demissão por motivos políticos se torna algo socialmente inaceitável. Se, além de socialmente condenada, a demissão por motivos políticos for tornada inviável através de uma série de precauções [...], não haverá mais justificativa para se manter a estabilidade de forma absoluta, [...].
É importante tal lição para demonstrar como o engessamento do serviço
público pode gerar transtornos aos administrados uma vez que a administração pública fica
ceifada de ferramentas para exigir e aplicar preceitos de eficiência e obtenção de melhores
resultados.
Claro que tal modificação na sistemática do serviço público não seria
calcada em extirpação total das garantias dos servidores, como se pode extrair da leitura do
trecho supramencionado, uma vez que outras formas de precauções com o fim de se garantir
os direitos dos servidores seriam implantadas.
Para fechar-se a ideia de Estado Regulador, veja-se a lição de Justen Filho
(2008, p. 535) em sua obra Curso de Direito Administrativo:
Segundo esse enfoque, é possível afirmar que o Estado de Bem-Estar Social evolui para transformar-se num Estado Regulador. Os Poderes regulatórios externam não apenas mera circunstância da existência do Estado como instituição política, mas lhe asseguram natureza própria e inconfundível.
É muito valiosa a lição supracitada por ser bem mais profunda do que possa
parecer a olhos pouco atentos.
Quando se defende o Estado Regulador não está se abolindo as benesses do
Estado de Providência, ou seja, a teoria do Estado atender a todos os anseios sociais
diretamente, muito menos à visão de austeridade estrida do Estado Mínimo, a vertente que
prega um Estado tão austero que beira a desestatização total. O que se defende é, na prática o
meio termo. Desonera-se o Estado da atuação direta em setores previamente identificados e
passa-se somente a regula-los, relegando à iniciativa privada a prestação destes serviços,
sendo que se resguarda ao Estado a atuação nos setores estratégicos.
Trata-se, em síntese, de uma séria estratégia de administrar que objetiva
principalmente a eficiência.
Com estas observações consegue-se notar os fatores históricos que
ensejaram as mudanças na política administrativa brasileira trazendo à baila as Agências
Reguladoras como ferramenta para o aperfeiçoamento do modelo administrativo existente.
3.4 NATUREZA JURÍDICA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NO DIREITO
BRASILEIRO
As Agências Reguladoras apresentam um papel importante na
administração pública, conforme se pode notar do que já foi apresentado, demandando,
portanto que elas sejam conceituadas.
Segundo Di Pietro (2007, p. 434):
Agência Reguladora, em sentido amplo, seria no direito brasileiro, qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com função de regular a matéria específica que lhe está afeta. Se for entidade da administração indireta, ela está sujeita ao princípio da especialidade, significando que cada qual exerce e é especializada na matéria que lhe foi atribuída por lei.
A autora nos traz um conceito genérico, explicando que estas agências têm
como função regular setores específicos determinados pelas leis que as criaram.
Ainda segundo Di Pietro (2007, p. 434), “regular significa, no caso,
organizar determinado setor afeto à agência, bem como controlar as entidades que atuam no
setor”.
No mesmo sentido, Meirelles (2009, p. 356) apresenta conceituação sobre o
tema, definindo juridicamente, de forma concisa as agências:
Com a política governamental de transferir para o setor privado a execução de serviços públicos, reservando ao Estado a regulamentação, o controle e a fiscalização desses serviços, houve a necessidade de criar, na Administração, agências especiais destinadas a esses fins, no interesse de usuários e da sociedade. Tais agências têm sido denominadas agências reguladoras e foram instituídas como autarquias sob regime especial, com o propósito de assegurar sua autoridade e autonomia administrativa.
Visualiza-se, portanto, que as Agências Reguladoras constituem figuras
únicas no prisma jurídico por possuírem características inovadoras no que tange à autonomia
de funcionamento, uma vez são dotadas de poderes normativos, executórios e coercitivos.
Neste sentido importante ressaltar ensinamento de Motta (2003, p. XXI) que apresenta de
forma clara e sintética uma definição relevante sobre Agências Reguladoras:
Agências Reguladoras são entes administrativos autárquicos, integrantes da Administração Pública indireta, dotados de ampla autonomia, sendo que sua criação deve ser realizada por lei específica, com personalidade jurídica de direito público interno, patrimônio próprio e competências perfeitamente especificadas no texto legal criador destas. Caracterizam-se, ao menos no direito comparado, como entidades capazes de exercer, em simultâneo, as funções normativa, administrativa e jurisdicional.
Binenbojm (2006, p. IX), com segurança, afirma que o ideário estabelecido
quando do início da implementação das Agências em decorrência do movimento de
privatizações dirigido pelo Plano Diretor de Reforma do Estado (PDRE)1. Vejamos o que o
autor ensina:
Na lógica do Plano Diretor de Reforma do Estado (PDRE), de 1995, as agências independentes seriam instrumentos essenciais para dissolver os anéis burocráticos dos Ministérios e subtrair a regulação de setores estratégicos da economia do âmbito das escolhas políticas do Presidente da República.
Entretanto o autor não se satisfaz apenas em afirmar o objetivo de
despolitização de forma genérica, aprofundando tal entendimento, como podemos notar no
seguinte excerto, onde Binenbojm (2006, p. IX) esclarece que “sob o ponto de vista
pragmático, essa pretensa despolitização tinha por objetivo criar um ambiente regulatório não
diretamente responsivo à lógica político-eleitoral, mas pautado por uma gestão profissional,
técnica e imparcial.”
Por fim, apresenta-se a lição de Justen Filho (2008, p. 554), onde traz um
conceito bastante completo acerca das Agências Reguladoras:
Agência Reguladora independente é uma autarquia especial, sujeita a regime jurídico que assegure sua autonomia em face da Administração direta e investida de competência para a regulação setorial. [...] Trata-se de uma autarquia, integrante da Administração indireta, dotada de personalidade jurídica de direito público e sujeita ao regime jurídico correspondente a esta categoria. [...] é titular da competência regulatória setorial. Isso significa o poder de editar normas abstratas infralegais, adotar decisões discricionárias e compor conflitos num setor econômico.
Fica clarificado o entendimento de que a Agência Reguladora é uma
autarquia integrante da Administração indireta, criada de forma a ter autonomia em face da
Administração direta dotada de personalidade jurídica de direito público devendo ser criada
por lei específica.
1 Instituído em 1995 no governo de Fernando Henrique Cardoso idealizado por Luiz Carlos Bresser-Pereira) tratava da despolitização e segurança autônoma a estes novos entes públicos cujo escopo mor residia na regulação
4 ESTRUTURA ADMINISTRATIVA BRASILEIRA
4.1 CONCEITO DE ESTADO E GOVERNO
É importante apresentarmos os conceitos e diferenciações entre Estado e
Governo como forma de situar a pesquisa dentro da administração pública.
Segundo Meirelles (2009, p. 356):
[...] na conceituação de nosso Código Civil, (o Estado) é pessoa jurídica de Direito Público Interno. [...] Esse é o Estado de Direito, ou seja, o Estado juridicamente organizado e obediente às suas próprias leis. [...] Estado em sentido amplo, abrangendo todas as entidades estatais e seus prolongamentos administrativos.
Sendo o Estado o conjunto de entidades estatais, dotado de personalidade
jurídica de direito público, que cria e cumpre suas próprias leis, dotado de prolongamentos
administrativos, Meirelles (2009, p. 357) conceitua Governo como:
Em sentido formal é o conjunto de Poderes e órgãos constitucionais; em sentido material, é o complexo de funções estatais básicas; em sentido operacional, é a condução política dos negócios públicos. Na verdade Governo ora se identifica com os Poderes e Órgãos supremos do Estado, ora se apresenta nas funções originárias desses poderes e órgãos como manifestação da soberania.
O Governo, segundo o autor se caracteriza pelas decisões políticas dos
negócios públicos, ora se identificando com os órgãos do Estado e ora sendo as funções que
estes órgãos executam, porém sempre sendo peça indissociável do conceito de soberania.
Tem-se, portanto, que o Estado é a soma das vontades individuais de um
povo que concede a uma figura abstrata de direito público parcela de sua autonomia privada
para que este ente promova a pacificação social, estabelecendo dentro de um território uma
sociedade soberana.
E o Governo é a exteriorização da vontade do Estado, em verdade trata-se
da materialização das ferramentas necessárias para que se efetive essa vontade, consistindo
nos órgãos governamentais incumbidos de promover o viés administrativo do País.
A análise do princípio da eficiência e as agências reguladoras demandam a
apreciação destes conceitos sendo que para delimitar de forma mais precisa, visualizaremos
alguns entes da administração direta e indireta, integrantes do governo, sendo que dentre eles
encontram-se as autarquias onde, no direito brasileiro encaixam-se as agências reguladoras.
Como é objeto deste trabalho a análise da administração pública, resguarda-
se a apresentar os demais institutos apenas com análise superficial, reservando a análise mais
aprofundada aos itens que guardam ligação direta ao tema.
Enquanto nesse capítulo se tratará da estrutura hierárquica, vale dizer, da
composição estrutural da administração pública, relegar-se-á à conceituação e análise da
natureza jurídica da atividade administrativa ao próximo capítulo.
A administração pública que hoje conhecemos, dividida em direta e indireta
foi idealizada pelo Decreto-Lei n. 200/67 que, segundo Bulos (2009, p. 798), “o referido
decreto de 25 de fevereiro de 1967, implantou o cognominado Estatuto da Reforma
Administrativa de 1967, classificando, organicamente, a Administração Pública em direta (ou
centralizada) e indireta (ou descentralizada)”. Esta dicotomia será abordada nos tópicos
seguintes.
4.2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA
De início, vale-se do ensinamento de Silva (2008, p. 655) que conceitua
“administração centralizada, como um conjunto de órgãos administrativos subordinados
diretamente ao Poder Executivo de cada uma daquelas esferas governamentais autônomas –
chamada, por isso, Administração direta”.
Para esclarecer a lição supramencionada veja-se a lição do professor Bulos
(2009, p. 799):
Administração direta é o conjunto de órgãos ligados à estrutura do Poder Executivo de cada uma das esferas governamentais autônomas que formam a Administração centralizada. No âmbito federal a administração direta compõe-se basicamente da Presidência da República e dos Ministérios. Na primeira incluem-se os órgãos de assessoramento imediato do Presidente da República, é dizer, o Conselho de Governo, a Advocacia-Geral da União, o Alto Comando das Forças Armadas, o Estado-Maior das Forças Armadas, além de outros órgãos, tais como a Casa Civil, a Casa militar a Secretaria Geral, a Secretaria de Comunicação Social, a Secretaria de Assuntos estratégicos, acrescendo-se a essa lista os órgãos de consulta do Presidente, ou seja, o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional.
Além do referido autor esclarecer que a administração direta reside na esfera
do poder executivo dos entes da Federação, no apresenta o exemplo do Poder Executivo
Federal, exemplificando com a citação de alguns dos integrantes da administração direta
federal.
Neste mesmo sentido, acrescenta Medauar (2006, p. 61):
Conforme o inc. I do art. 4º do Dec.-lei 200/67, a Administração direta federal se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. Portanto, na esfera federal, os órgãos inseridos na estrutura da Presidência da República e na estrutura dos Ministérios compõem a Administração direta.
Importante apresentarmos o texto do Decreto Lei 200/67 (BRASIL, 1967),
que estabelece no “Art. 4° A Administração Federal compreende: I - A Administração Direta,
que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da
República e dos Ministérios”. Ou seja, esta organização que agora estudamos foi delimitada
pelo referido decreto, dentre outras determinações.
4.3 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA
O professor Justen Filho (2008, p. 155) afirma que “[...] os órgãos públicos
estão integrados em pessoas jurídicas, cuja vontade produzem e exteriorizam.”
Foi possível adaptar e esquematizar em forma de tabela os ensinamentos do
professor Justen Filho acerca da administração pública direta e indireta a fim de trazer
graficamente uma compreensão mais visual de sua lição:
Administração Pública Direita
União, Estados, Distrito Federal e Municípios
Personalidade Jurídica de Direito Público
Autarquias
Consórcios Públicos
Empresas Públicas
Administração Pública Indireta
Sociedades de
Economia Mista
Personalidade Jurídica de Direito Privado
Fundações Públicas
Consórcios Públicos
Privados
Sociedades
Controladas
Quadro 1: Sistematização Administração Pública Fonte: Adaptado de Justen Filho (2008, p. 155-156)
É importante ressaltar que Justen Filho (2008, p. 156) informa que “[...] essa
sistematização reflete a disciplina consagrada no Decreto-lei n. 200/67 e a evolução
legislativa posterior.”
No mesmo sentido Meirelles (2009, p. 746) aborda o tema em comento de
forma esclarecedora, o que se pode depreender da análise do seguinte excerto:
Observamos que a administração pública não é propriamente constituída de serviços, mas sim, de órgãos a serviço do Estado, na gestão de bens e interesses qualificados da comunidade, o que nos permite concluir, com mais precisão, que, no âmbito federal, a Administração direta é o conjunto dos órgãos integrados na estrutura administrativa da União e a administração indireta é o conjunto dos entes (personalizados) que, vinculados a um Ministério, prestam serviços públicos ou de interesse público. Sob o aspecto funcional ou operacional, Administração Pública direta é a efetivada imediatamente pela União, através de seus órgãos próprios, e indireta é a realizada mediatamente, por meio dos entes a ela vinculados. Esses mesmos conceitos são extensivos aos Estados-membros, Municípios, Distrito Federal e Territórios.
Antes de analisarmos a administração indireta em espécie, vejamos os
dizeres de Medauar (2006, p. 67), que conceitua:
Segundo o art. 4º, inc. II do Dec. Lei 200/67 (com alterações posteriores), a Administração indireta compreende as entidades dotadas de personalidade jurídica própria que estão indicadas nas suas alíneas. Assim, em cada nível de Administração, o conjunto dessas entidades personalizadas forma a Administração indireta estadual e administração indireta municipal, se a dimensão do Estado-membro e do Município comportar.
A partir destas noções gerais, vejamos em espécie as Autarquias, uma vez
que é aí que se inclui as Agências Reguladoras e, portanto, o foco do presente estudo.
4.3.1 Autarquias
Para o presente estudo, analisar as autarquias, entes governamentais da
administração indireta, é atividade substancial, vez que quando tecemos as considerações
acerca das agências reguladoras no capítulo anterior, nos deparamos como sendo a natureza
jurídica das ditas agências, autarquias especiais. Desta feita vejamos os conceitos
apresentados pela doutrina.
Segundo Medauar (2006, p. 70):
Na atualidade, o delineamento essencial da figura da autarquia é dado pelo inc. I do art. 5º do Dec.-lei 200/67. Segundo esse dispositivo, a autarquia é um serviço autônomo, criado por lei com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada.
Então, a autarquia é, na verdade, um ramo da administração pública indireta
que possui certas autonomias em relação à administração direta em razão da atividade que
executa.
Corroborando tal afirmação Bastos (2008, p. 160) preleciona:
Ao nível da legislação ordinária, a definição do que seja autarquia nos é dada pelo art. 5º do Decreto Lei n. 200/67, alterado pelo Decreto Lei n. 900/69, que considera como tal todo serviço autônomo criado por lei com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública que requeiram, para seu melhor funcionamento, a gestão administrativa e financeira descentralizada. A Emenda Constitucional n. 19, de 04 de junho de 1998, alterou a redação do inciso XIX do art. 37, deixando certo que, somente por lei específica a autarquia poderá ser criada.
Por fim, a notável lição de Mello (2008, p. 160) nos ajuda a visualizar os
principais pontos destas instituições:
O Decreto-lei 200 as caracteriza, com grande infelicidade, nos seguintes termos: ‘o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada’. [...] Sendo, como são, pessoas jurídicas, as autarquias gozam de liberdade administrativa nos limites da lei que as criou; não são subordinadas a órgão algum
do Estado, mas apenas controladas, como ao diante melhor se esclarece. Constituindo-se em centros subjetivados de direitos e obrigações distintos do Estado, seus assuntos são assuntos próprios; seus negócios, negócios próprios; seus recursos, não importa se oriundos de trespasse estatal ou hauridos como produto da atividade que lhes seja afeta, configuram recursos e patrimônio próprios, de tal sorte que desfrutam de ‘autonomia’ financeira, tanto como administrativa; ou seja, suas gestões administrativa e financeira necessariamente são e suas próprias alçadas – logo, descentralizadas.
Imprescindível destacar a unanimidade da doutrina quanto aos seguintes
aspectos: autarquias são pessoas jurídicas de direito público, possuem administração e
orçamento próprios, não são diretamente subordinadas ao Estado, apenas controladas através
da lei que as criou, possuem finalidade própria e específica.
Essa conjuntura de atributos que se desenhou apresenta-se como fórmula
ideal para que se amolde às Agências Reguladoras neste contexto em razão de sua natureza,
vez que sua missão é regular setores onde a atuação Estatal não mais é feita diretamente.
5 ATIVIDADE ADMINISTRATIVA – FUNÇÃO ADMINISTRATIVA
5.1 CONCEITO, NATUREZA E FINS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
No que se refere à atividade de conceituar Administração Pública apresenta-
se uma tarefa não tão simples no entender de Meirelles (2009, p. 85), uma vez que tal
conceito “[...] não oferece contornos bem definidos, quer pela diversidade de sentidos da
própria expressão, quer pelos diferentes campos em que se desenvolve a atividade
administrativa”. [grifo nosso].
A diferenciação apresentada pelo autor entre a administração pública e a
privada clarifica o entendimento e demonstra que o que traz o âmago da diferença é o objeto
do ato de administrar, vale dizer, em se tratando de coisa individual tem-se a administração
particular, porém, em se tratando de coisa coletiva, ou seja, pública, tem-se administração
pública, que sempre visará o escopo mor, qual seja, o bem comum.
O objetivo maior levantado pelo autor parece vir de encontro ao objeto deste
estudo, uma vez que este consiste na análise de uma das formas desenvolvidas a se dar novos
contornos à Administração Pública de nosso país com o fim lógico de aperfeiçoar ainda mais
a busca pelo bem coletivo.
Ainda na linha de conceituação, vale-se da lição de Bastos (2001, p. 64),
que apregoa:
Embora, como vimos, predominantemente sediada no Poder Executivo, a Administração Pública não se confunde com este. Os seus órgãos de cúpula são de natureza política; consequentemente, não integram a Administração Pública. Tanto os órgãos quanto a própria atividade administrativa existem em função da lei cuja
atuação objetivam. Administrar, pois, é tornar concreta, é transformar em realidade a vontade abstrata da lei.
Pode-se extrair que se o administrador público somente pode agir de acordo
com o que a lei determina é bastante assertiva a afirmação do professor Bastos quando ensina
que administrar “é transformar em realidade a vontade abstrata da lei”, é dizer, o
administrador deve, da melhor forma possível, realizar o que a lei dispõe.
Em síntese pode-se vislumbrar um conceito lugar comum no direito pátrio,
qual seja, “ao particular é permitido fazer tudo o que a lei não proíba, porém, ao administrador
público somente é permitido fazer o que a lei expressamente preveja” e visualizamos a ideia
principal do princípio da legalidade que será tratado em outro momento nesta pesquisa. Aí
encontramos a principal diferenciação entre os atos administrativos públicos e os privados.
Medauar (2006, p. 44) complementa a definição de administração pública,
dividindo seu conceito em duas vertentes. Quanto ao aspecto funcional:
Administração pública significa um conjunto de atividades do Estado que auxiliam as instituições políticas de cúpula no exercício de funções de governo, que organizam a realização das finalidades públicas postas por tais instituições e que produzem serviços, bens e utilidades para a população, como por exemplo, ensino público, calçamento de ruas, coleta de lixo. Na verdade, apresenta-se difícil a caracterização objetiva da Administração Pública, daí por vezes se buscar o modo residual de identifica-la: conjunto de atividades que não se enquadram na legislação, nem na jurisdição; assim, nem o Legislativo, nem o Judiciário cuidam do calçamento de ruas, da coleta de lixo, da rede de escolar públicas, por exemplo.
Neste contexto a autora separa a parte mais prática da atividade
administrativa, no que se refere a atuação direta em atividades físicas, como a implementação
das políticas públicas de benfeitorias sociais.
Já no que diz respeito ao ângulo organizacional, Medauar (2006, p. 44)
continua:
Administração Pública representa o conjunto de órgãos e entes estatais que produzem serviços, bens e utilidades para a população, coadjuvando as instituições políticas de cúpula no exercício das funções de governo. Nesse enfoque predomina a visão de uma estrutura ou aparelhamento articulado, destinado à realização de tais atividades; pensa-se, por exemplo, em ministérios, secretarias, departamentos, coordenadorias etc.
Portanto verificamos que administrar é gerir, realizar, ou seja, significa
atividade ativa do Estado.
Levando-se em conta os argumentos colacionados, percebe-se que a
Administração Pública, possui tanto o caráter prático, vinculado a execução direta e a
organização e promoção concretização da letra abstrata da lei quanto ao conjunto de órgãos e
agentes que executam a função administrativa.
5.2 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA ADMNISTRAÇÃO PÚBLICA
Os princípios básicos da Administração Pública encontram-se expressos no
art. 37 da CF/88 e são de suma importância e apresentam as linhas mestras que deverão ser
seguidas na atividade administrativa.
Antes de iniciarmos o ataque aos princípios em espécie, importante
apresentar a norma fundamentadora deste estudo, seja ela, o artigo 37 da Constituição Federal
de 1988 (BRASIL. CF/1988) que dispõe que “a administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
[...]” (grifo nosso), neste sentido a imperatividade da norma vincula a atividade administrativa
a estes princípios como forma de vinculá-la aos mesmos e garantir que estejam sempre
presentes no bojo dos atos praticados pela Administração Pública.
5.2.1 Princípio da Legalidade
O princípio da legalidade se apresenta como o primeiro na redação do artigo
37 não por acaso. No Estado Democrático de Direito, para que se garanta o correto andamento
da vida dos administrados de sua importância é o respeito e cumprimento das leis
democraticamente postas, uma vez que legitimadas pela vontade do povo que é o detentor de
todo o poder Estatal.
Ou seja, o princípio da legalidade se apresenta como o grande diferenciador
entre as práticas administrativas públicas das privadas, quando vincula a ação administrativa
pública a uma correspondente norma autorizadora, uma vez que ao ente público somente
existe uma via a ser seguida, seja ela, aquela que a lei asseverar, por outro lado, ao particular é
permitido percorrer a via que melhor lhe provier desde que não seja ilegal.
Para Paulo (2008, p. 330), em linha correlata:
O princípio da legalidade administrativa tem, para a Administração Pública, um conteúdo muito mais restritivo do que a legalidade geral aplicável à conduta dos particulares (CF, art. 5º, II). Por outro lado, para o administrado, o princípio da legalidade administrativa representa uma garantia constitucional, exatamente porque lhe assegura que a atuação da Administração estará limitada estritamente ao que dispuser a lei. O fato de estar a Administração Pública sujeira ao princípio da indisponibilidade do interesse público, e de não ser ela quem estabelece o que é de interesse público, mas somente a lei, única expressão legítima da vontade geral, acarreta a necessidade de que a atuação administrativa esteja previamente determinada ou autorizada na lei. Vale dizer, para que haja atuação administrativa não é suficiente a mera inexistência de proibição legal; é mister que a lei preveja ou autoriza aquela atuação. Em suma, a administração, além de não poder atuar contra a
lei ou além da lei, somente pode agir segundo a lei (a atividade administrativa não pode ser contra legem nem praeter legem, mas apenas secundum legem). Os atos eventualmente praticados em desobediência a tais parâmetros são atos inválidos e podem ter sua invalidade decretada pela própria Administração que os haja editado (autotutela administrativa) ou pelo Poder Jucidiário.
Não menos importante é a lição de Moraes (2008, p. 320):
O tradicional princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, da Constituição Federal, aplica-se normalmente na Administração Pública, porém de forma mais rigorosa e especial, pois o administrador público somente poderá fazer o que estiver expressamente autorizado em lei e nas demais espécies normativas, inexistindo, pois, incidência de sua vontade subjetiva, pois na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza, diferentemente da esfera particular, onde será permitida a realização de tudo que a lei não proíba. Esse princípio coaduna-se com a própria função administrativa, de executor do direito, que atua sem finalidade própria, mas sim em respeito à finalidade imposta pela lei, e com a necessidade de preservar-se a ordem jurídica.
Leia-se o seguinte julgado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo (2011) que apresenta um exemplo prático da aplicação do princípio da legalidade:
Apelação Cível - Servidor Municipal - Ação Ordinária - Cobrança- Pagamento de horas extraordinárias -Jornada de acordo com legislação específica - As horas extraordinárias não podem extrapolar o teto máximo permitido por lei - Ação julgada improcedente - Inconformismo - Não poderá ser admitida remuneração que exceda o limite previsto -Ofensa ao princípio da legalidade administrativa - Observação do arl. 65, parágrafo 9o da Lei Complementar nº 113/99 - Não é dado ao Poder Judiciário inovar na ordem legal vigente,estabelecendo normas não previstas em lei, determinando o pagamento de verbas não especificadas aos servidores públicos- Recurso improvido113. (9126337082005826 SP 9126337-08.2005.8.26.0000, Relator: Castilho Barbosa, Data de Julgamento: 26/04/2011, 1ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 11/05/2011). (grifo nosso).
Assim, o princípio da legalidade obriga o administrador a ser um cumpridor
submisso da lei; este imperativo principiológico pode parecer radical ou até mesmo tornar-se
algumas vezes trava no exercício da administração, mas, sua principal missão é vincular os
atos dos administradores públicos única e somente a vontade da lei que reflete a vontade do
povo, e jamais sua vontade pessoal.
5.2.2 Princípio da Impessoalidade
O princípio da impessoalidade representa uma regra valiosa a ser seguida na
Administração Pública brasileira na medida em que estabelece que o administrador não deve e
nem pode agir com fim particular, pessoal, ou seja, seus atos não podem contaminar-se de seu
entender pessoal.
Neste sentido, Meirelles (2009, p. 93) esclarece que a norma constitucional
imperativa é bastante clara quando diz que o administrador deve apenas executar o que a lei
determina, e, se se ater a isto, estará cumprido fielmente seu dever de mandatário:
O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. Esse princípio também deve ser entendido para excluir a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos sobre suas realizações administrativas (CF, art. 37, § 1º).
Sobre a importante lição de Meirelles, vejamos um julgado do Egrégio
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (2010) onde se tem a configuração de improbidade
administrativa em razão da utilização de publicidade pública para promoção pessoal do chefe
do poder executivo municipal no Município de Matelândia-PR:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE. PUBLICIDADE PESSOAL DO CHEFE DO EXECUTIVO MUNICIPAL, DURANTE SUA GESTÃO. TESE DE INAPLICABILIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AOS PREFEITOS. NÃO ACOLHIMENTO. DECISÃO EM RECLAMAÇÃO JUNTO AO STF SEM EFEITOS VINCULANTE E ERGA OMNES. AUSÊNCIA DE "BIS IN IDEM". LEI 1.070/1950 QUE NÃO ENQUADRA O PREFEITO MUNICIPAL DENTRE AS AUTORIDADES ELENCADAS. AMPLA ACEPÇÃO DO TERMO "AGENTE PÚBLICO" NA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 4.29/92). MANIFESTAÇÃO INICIAL DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELO ARQUIVAMENTO DA DENÚNCIA. REJEITAÇÃO PELO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DESIGNAÇÃO DE OUTRO PROMOTOR DE JUSTIÇA PARA PROPOSITURA DA AÇÃO. INTERESSE PROCESSUAL CARACTERIZADO. TESE DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE AFASTADA. INEXISTÊNCIA DE EXPRESSA PREVISÃO LEGAL. AUSÊNCIA, ADEMAIS, DE INÉRCIA DO AUTOR, A CARACTERIZAR O INSTITUTO. DEMORA NO TRÂMITE PROCESSUAL REPUTADA EXCLUSIVAMENTE AO SERVIÇO JUDICIÁRIO. VEICULAÇÃO DE PUBLICIDADE PARA PROMOÇÃO PESSOAL, SEM FINALIDADE DE EDUCAÇÃO, INFORMAÇÃO OU ORIENTAÇÃO SOCIAL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE SÍMBOLOS E EXPRESSÕES NÃO OFICIAIS. APROVEITAMENTO DOS PODERES E FACILIDADES DECORRENTES DO CARGO EM PROVEITO PRÓPRIO. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, NOTADAMENTE DA LEGALIDADE, MORALIDADE E IMPESSOALIDADE. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA. ARTIGO 37, §1º, CF E ARTIGO 11, DA LEI 8.429/92. PENALIDADES COMINADAS DE REPARAÇÃO DO DANO E MULTA. MANTENÇA. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NAS SANÇÕES CIVIS. EXPOSIÇÃO MOTIVADA NO JULGADO. DOSAGEM DE ACORDO COM A GRAVIDADE DOS FATOS. ARTIGO 37, §4º, CF. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 4ª C. C. - AC 0602476-4 - Matelândia - Rel.: Desª Maria Aparecida Blanco de Lima – Unânime - J. 23.03.2010).
A jurisprudência apresenta que a infração ao princípio em comento
configurou, no caso narrado, crime de improbidade administrativa, quando o administrador
valeu-se das facilidades do cargo que ocupava para autopromover-se as expensas dos cofres
públicos, causando possível confusão aos administrados em razão de associação indevida
entre o fim da administração e a atuação direta da pessoa do administrador.
Como se vê, o princípio da impessoalidade estabelece, como bem apontam
os doutrinadores supra relacionados, que o administrador nada mais é que um longa manus da
vontade Estatal, sendo incumbido, em verdade, somente de exteriorizar tais preceitos
institucionais sem, jamais, amoldá-los a vontades ou questões de cunho pessoal.
5.2.3 Princípio da Moralidade
O princípio da moralidade traz em seu bojo a necessidade precípua de que o
administrador público deve agir com decoro e lisura quando na pratica dos atos de sua
competência. Talvez não fosse necessário ser expresso na Carta Magna em razão de sua
natureza óbvia, porém, quando se trata de patrimônio público, nunca é demais esclarecer
expressamente todas as regras.
Conferindo absoluta importância ao tema em comento, Silva (2008. p. 668)
adverte:
A moralidade é definida como um dos princípios da administração pública (art. 37). [...] Vimos que a Constituição quer que a imoralidade administrativa em si seja fundamento de nulidade do ato viciado. A ideia subjacente ao princípio é a de que moralidade administrativa não é moralidade comum, mas moralidade jurídica. Essa consideração não significa necessariamente que o ato legal seja honesto. Significa, como disse Hauriou, que a moralidade administrativa consiste no conjunto de regras de condutas tiradas da disciplina interior da Administração.
Apresenta-se recente julgado do Colendo Tribunal de Justiça do Estado do
Paraná (2011), a respeito do princípio da moralidade:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - VENDA DE COMPACTADORES E COLETORES DE LIXO - SIMULAÇÃO COMPROVADA NA COMISSÃO PARA AVALIAÇÃO E NA VENDA DOS EQUIPAMENTOS - CONFIGURAÇÃO DE ATO INDEVIDO - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA MORALIDADE - CONDENAÇÃO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL - RECURSO DESPROVIDO.A relação entre o dever da Administração Pública de atuar e o fim almejado pela lei, não pode dispensar a observância da lealdade e da boa-fé, conceitos formadores do princípio da moralidade. (6981140 PR 0698114-0, Relator: Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, Data de Julgamento: 01/03/2011, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 591)
Em análise do que foi colacionado pode-se perceber que, muito embora não
seja tão simples de caracterizá-lo no plano real, o princípio da moralidade possui em seu bojo
um salvaguardo incomensurável em se tratando de resguardar a integridade do patrimônio
público em eventual detrimento de vontades escusas do administrador.
5.2.4 Princípio da Publicidade
Primeiramente será apresentada a visão de expressivos autores acerca do
tema para, ao final se formular considerações a respeito do referido princípio.
Para Paulo (2008. p. 333), em caráter conceitual:
O princípio da publicidade, no Direito administrativo, possui dupla acepção, a saber: a) Publicação em órgão oficial como requisito de eficácia dos atos administrativos gerais que devam produzir efeitos externos ou impliquem oneração do patrimônio público; b) Nessa acepção, a publicidade não está ligada à validade do ato, mas à sua eficácia, isto é, à produção de seus efeitos. c) Enquanto não publicado, o ato não pode produzir efeitos. Exigência de transparência da atuação administrativa. Nessa vertente, preocupa-se em assegurar a efetividade do controle da administração pelos administrados.
No seguinte julgado do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (2005),
vemos o que a jurisprudência estabelece sobre o tema:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. EDITAL. PUBLICIDADE SUFICIENTE. AÇÃO POPULAR. INEXISTÊNCIA DE LESIVIDADE. IMPROCEDÊNCIA.1. São requisitos da ação popular a condição de eleitor do autor, a ilegalidade e lesividade do ato impugnado, constituindo estes dois últimos, também, o próprio mérito do pedido de anulação do ato.2. Não se verifica violação ao princípio da publicidade, na hipótese, em que a publicação do edital de concurso público foi feita no Diário Oficial da União (DOU) e em periódicos especializados, além de divulgação pela televisão local.3. Inexistência, assim, de lesividade à moralidade administrativa, apta a anular o ato, por meio de ação popular.4. Ação que se julga improcedente.5. Apelações providas. (384 AP 2004.31.00.000384-8, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, Data de Julgamento: 30/05/2005, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 13/06/2005 DJ p.92)
Desta feita, o que se vê é que o princípio da publicidade, mais do que o
simples ato de publicar nos Diários Oficiais ou disponibilizar aos administrados informações
a respeito da administração, ou seja, mais do que um dever da administração, consiste em
verdadeiro direito da população em acompanhar o que é feito dos recursos públicos, e, ainda
mais, constitui requisito de eficácia aos atos praticados que somente terão validade após a
publicação.
5.2.5 Princípio da Eficiência
Ao princípio da eficiência dar-se-á dois enfoques diferentes. Neste tópico
será conceituado e definido de acordo com a mais respeitável doutrina, resguardando ao
tópico seguinte uma análise comparada entre o referido princípio e as Agências Reguladoras,
o que é objeto deste estudo.
Assim, quanto à conceituação do princípio da eficiência, veja-se os
ensinamentos dos seguintes autores.
Para Bastos (2001. p. 50),
A Emenda Constitucional n. 19, de 4 de junho de 1998, deu nova redação ao caput do art. 37 da Constituição Federal, acrescentando o princípio da eficiência àqueles
aos quais a Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios deve obediência. O princípio da eficiência, certamente, é um daqueles que já, antes da Emenda Constitucional n. 19/98, poderia ser extraído do sistema de princípios que regem a Administração Pública. Isto mostra-se um tanto óbvio, pois não seria razoável pensar em atividades da Administração Pública desempenhadas com ineficiência e sem o atingimento dos resultados dentro do seu objetivo maior, qual seja, a realização do bem comum.
É valido o entendimento do autor que o referido princípio não
necessariamente precisaria estar impresso no texto Constitucional em razão do quão óbvio é
que a Administração Pública sempre deverá agir com eficiência, não sendo admissível
visualizar uma administração legitimada para ser ineficiente.
Ou seja, não basta ser eficiente e ter uma estrutura cara e dispendiosa por
traz disso, é necessário criar-se um verdadeiro sistema administrativo que contemple
eficiência e diminuição de custos.
Di Pietro (2007. p. 75) assim conceitua o princípio da eficiência nos dois
aspectos que visualiza:
O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público.
Importante ressaltarmos o seguinte julgado do Tribunal Regional Federal da
3ª Região (2011) sobre o tema:
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INTERESSE ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA. REMOÇÃO. POSSIBILIDADE.1. Considerando-se o princípio da eficiência e o estado mental e emocional do Autor, mostra-se necessária a remoção requerida, até para o resguardo do interesse público.2. Há que se ter em vista, outrossim, que na época em que pleiteou o concurso interno de remoção, havia 4 vagas para a sua função em Franca/SP, demonstrando que seria perfeitamente possível a remoção sem prejuízos à Administração Pública.3. Apelação e remessa oficial, tida por interposta, improvidas. (216 MS 2004.60.04.000216-4, Relator: JUIZ CONVOCADO WILSON ZAUHY, Data de Julgamento: 25/05/2011, JUDICIÁRIO EM DIA - TURMA Y)
O julgado auxilia na compreensão das aplicações práticas do princípio
estudado, na medida em que nos apresenta o surgimento do interesse da administração pública
e consequente necessidade da operação do princípio da eficiência em um caso de necessidade
particular de um servidor ao solicitar remoção quanto da liberação de licença para início de
uma obra.
Por fim, cumpre salientar que as inovações legislativas recentes, inclusive as
que incluíram o princípio da eficiência no texto constitucional pretenderam conceder um
caráter mais gerencial à administração pública, na medida em que estabelecem uma
modernização, onde se deve fazer mais gastando menos.
5.3 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O MODELO TEÓRICO DAS AGÊNCIAS
REGULADORAS
Desta feita, conforme foi tratado anteriormente, nessa altura do trabalho é
possível estabelecermos que se fosse preciso justificar o modelo teórico das Agências
Reguladoras e o motivo pelo qual tal modelo contribui para a melhoria da administração
pública seria exatamente em razão das agências serem independentes da esfera política e
eficientes em razão da especificidade de seu corpo técnico.
É possível, portanto, estabelecer que este modelo regulatório é dotado de
imparcialidade nas decisões, decisões estas técnicas em razão da atuação especifica para a
área de criação da agência, não ingerência política, continuidade das políticas públicas de
responsabilidade da agência dentre outros.
Neste sentido, haja vista estas características apresentadas, o que realmente
motivou o surgimento nos Direitos Administrativos de vário países, segundo Justen Filho
(2002. p. 285):
A disseminação do modelo das agências foi propiciada pela insuficiência da estruturação política clássica. A arquitetônica da organização estatal se afigura como insatisfatória, na medida em que o postulado da soberania popular é insuficiente para produzir governos legítimos e a realização efetiva dos valores fundamentais e dos fins de interesse comum. A teoria da tripartição dos poderes não apresenta soluções que permitam o adequado controle do poder político. O modelo das agências surgiu como uma proposta que poderia realizar promessas que não foram cumpridas através de outras fórmulas de organização do poder estatal.
Portanto, tal modelo regulatório nasceu da necessidade de se instituir
mecanismos administrativos que sanassem as falhas que surgiram no decorrer da utilização
dos institutos clássicos da estrutura estatal, como forma de conferir a eles maior
confiabilidade e eficácia, aqui especial atenção ao ideal deste modelo em convergir para a
implementação do princípio da eficiência.
Se se institui um modelo onde a administração será pautada pela
continuidade das políticas, as decisões com embasamento técnico e a desvinculação das
intempéries político-ideológicas em verdade se objetiva a implementação do Princípio da
Eficiência previsto no art. 37 da Constituição de 1988.
De uma análise da lição de Mello (2006. p. 156), temos que a nomenclatura
das agências esclarece, mesmo que a olhos desatentos parece óbvio, uma noção absoluta
destes entes que não pode fugir do estudioso deste tema, vejamos: “Tem-se-lhes atribuído tal
nome pois a função que exercem é a de regular e fiscalizar os assuntos atinentes a suas
respectivas esferas de atuação”.
Destarte, vislumbra-se que o papel e a estruturação das Agências
Reguladoras no Brasil ainda é novo, não se consolidou e ainda necessita de muitas mudanças
e adequações, muito embora em caráter teórico apresente-se como grande expoente no
desenvolvimento do pais, até mesmo em razão da urgência que as crises financeiras das
décadas de 80 e 90 infligiram na modificação da Administração Pública no período, deixando
algumas lacunas que o cientista jurídico deverá, através da análise profunda deste instituto,
ajudar a sanar.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O princípio da Eficiência, segundo os autores estudados, se apresenta ao
mesmo tempo como ferramenta inovadora da administração pública e como regra
indissociável dela, vez que cada vez mais a sociedade anseia pelas prestações que competem
ao Estado, ante ao aumento populacional bem como ao amadurecimento da sociedade como
entidade; este fenômeno traz como principal consequência a enorme exigência da coletividade
para uma atuação Estatal eficiente, eficaz e o mais econômica possível ao erário haja vista o
aumento da conscientização da população.
O comando imperativo da Constituição Federal em seu art. 37, caput, onde
determina que a Administração Pública se pautará pelos princípios da Legalidade,
Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência, estabelece a regra geral, estabelece os
trilhos que a máquina pública obrigatoriamente seguirá, porém ficou a cargo da doutrina e da
jurisprudência estabelecer as formas de se procedimetalizar o cumprimento efetivo deste
ditame.
A pesquisa indicou que as Agências Reguladoras serviram ao propósito de
desonerar os Estados tanto administrativamente quanto financeiramente, na medida em que o
Estado pode deixar de atuar diretamente em determinados seguimentos, relegando ao setor
privado esta atuação, ficando o Estado apenas no papel regulador e fiscalizador.
Isto se verificou nos Direitos Inglês e Norte Americano, até em razão da
enorme experiência que eles adquiriram com o passar dos anos, uma vez que o
desenvolvimento da teoria regulatória começou a se desenhar no pós-guerra, tendo o Brasil
importado o modelo regulatório deles.
Apesar de termos vários exemplos práticos no Brasil é comum entre os
autores comentar que a forma de aplicação no Brasil, das Agências Reguladoras, não se
consolidou ainda, em razão dos mais variados fatores, inclusive questões ideológicas.
As Agências Reguladoras se apresentam como modelo viável a pôr em
prática os ideais de eficiência expressos na Constituição Federal, porém, não se pode afirmar
o mesmo quando se analisa a realidade prática no cenário brasileiro atual em razão da
excessiva politização de nossas Agências Reguladoras, o que ofende um pressuposto
fundamental delas.
Depreende-se de toda a pesquisa que mesmo não se tendo obtido êxito na
implementação da política de agências reguladoras no Brasil, entende-se que este é o caminho
para que se efetive a eficiência na Administração Pública, sendo uma tendência mundial a
diminuição da atuação do Estado, abrindo maior espaço à atuação da iniciativa privada, uma
vez que se reconhece que o Estado não deve ser empresário por não possuir as mesmas
condições de gerar emprego e renda que o setor privado possui. Isto se observa uma vez que é
fato que a corrupção está intrínseca à estrutura do Estado, portanto nada mais viável que a
diminuição de sua atuação e consequente diminuição nas possibilidades de atuação desta
mazela.
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