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O PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO (1960-2005)
Lúcia Aparecida Valadares Sartórioi
Este texto traz à baila algumas referências sobre o processo de construção da
educação infantil oferecida pela rede de ensino do município de São Bernardo do
Campo e destaca as modificações realizadas no âmbito das diretrizes educacionais e na
organização da Secretaria de Educação, Cultura e Esportes, bem como a alteração da
relação entre professores e alunos e do próprio teor educativo. Para isso, foi realizado
levantamento de fontes primárias como subsídios de formação, planejamento escolar, e
entrevista com professores. Através da análise desses documentos foi possível retomar
as primeiras atividades realizadas no momento de criação da pré-escola e relatar o modo
como a estrutura de ensino foi montada na década de 1960 e os fatores que
influenciaram as transformações no percurso de sua história.
A sistematização dos dados recolhidos para construção do esboço histórico da
educação infantil da rede de ensino do Município de São Bernardo do Campo,
necessariamente levou ao estabelecimento de um paralelo entre as diferentes
perspectivas educacionais que se manifestaram no decorrer desses anos e a identificação
das suas conseqüências e resultados. Desse modo, o artigo aborda a Constituição e
desenvolvimento da educação no município de São Bernardo do Campo e o
redirecionamento e inversão dos princípios da educação, em completa conformação às
propostas veiculadas em âmbito mundial. Embora o município de São Bernardo do
Campo incorpore e acompanhe pari passu as diretrizes encabeçadas pelo movimento
teórico predominante – ancorado no ideário de César Coll, Philippe Perrenoud, a
psicolingüística de Emília Ferreiro e o construtivismo de Jean Piaget –, possui algumas
peculiaridades que podem nos auxiliar a ter uma visão mais ampla da educação nos
últimos quarenta anos.
Em nossa análise evidenciamos a Constituição e desenvolvimento da educação no
município de São Bernardo do Campo, A proposta curricular de 1992, A
municipalização do Ensino Fundamental, Os pensadores clássicos e Redirecionamento
e inversão dos princípios da educação.
Constituição e desenvolvimento da educação no município de São Bernardo
do Campo.
1
As primeiras escolas no município de São Bernardo do Campo foram
constituídas sob a administração do Prefeito Lauro Gomes de Almeida (PTB) para
oferecer atendimento escolar às crianças de 0 a seis anos a partir de 1960 pelo
Departamento de Educação e Cultura através dos Jardins da Infância, Parques Infantis.
E foram transformadas em Escolas Municipais de Educação Infantil para crianças de
quatro a seis anos e pelo Departamento de Promoção Social a partir de 1979, através das
Creches para crianças de 4 meses a 3 anos e 11 meses” ii. O Jardim da Infância Santa
Terezinha sob a coordenação da professora Tirza Martins Ribeiro Magdalena foi
inaugurado em agosto de 1960, sob os princípios educacionais de Froebel e Decroly,
pautados em “Unidades de experiência: expressão artística, expressão corporal,
valorizando ainda alfabetização. As professoras eram tidas como professoras
jardineiras”iii.
Os Parques Infantis, embora tivessem os mesmos objetivos do Jardim da Infância
ao buscarem acolher as crianças para tirá-las da rua, possuíam algumas especificidades.
O primeiro Parque Infantil surgiu por iniciativa do Padre Fiorenti Elena em acordo com
a administração municipal, alocado nas dependências do salão da igreja. Nesse espaço
atendiam crianças de 3 a 12 anos como uma forma de amparar as crianças que ficavam
sem a presença dos pais no horário de trabalho, por isso, ficavam meio período nos
Parques Infantis e no outro freqüentavam os grupos escolares. Os Parques Infantis
auxiliavam as crianças nas tarefas escolares e centravam-se em atividades recreativas,
embora também desenvolvessem ação pedagógica em torno de unidades de trabalho e
datas comemorativas.
As atividades desenvolvidas tinham como objetivo levar as crianças a adquirem o
conhecimento universal e científico, que por sua vez, propiciava o desenvolvimento do
raciocínio, pois havia um conjunto de atividades específicas que proporcionavam às
crianças diferentes oportunidades de reflexão sobre as áreas das ciências. Desse modo,
os subsídios que davam amparo ao planejamento dos professores asseguravam às
crianças a oportunidade de iniciar o contato com o conhecimento, como podemos ver na
orientação aos professores veiculada pelo Serviço de Orientação Técnica:
Os animais
Preparo da professora:
1. Ler com atenção o Centro de interesse: “Os animais” e quais os
seus objetivos.
2
2. Preparar com antecedência o material que vai usar no início da aula
e prosseguir na coleta de outros. Ex. Cartolina, papéis coloridos de
revistas, papel espelho, cola, lápis de cera, pincel atômico, tesoura,
agulha e linha grossa para alinhavos, pedaços de couro, peles, penas
seda natural, novelos de lã, tecidos de lã, figuras as mais diversas de
animais e a sua utilização pelo homem, giz colorido, casulo, favo de
mel (vazio).
3. Conseguir se for possível um gatinho, uma tartaruga, um aquário.
4. Preparar cartazes mostrando o valor dos animais: Ex. Figura de uma
vaca e ao redor dela todos os produtos derivados:
* – Abelha: a colméia, o favo, o mel.
* _ O Bicho-da-seda: um ramo de amoreira com a lagartinha, o
casulo, o fio de seda, o tecido da seda.
5. Praticar (se preciso) com massinha plástica a confecção de alguns
bichinhos e ensinar aos seus alunos.
6. Aproveitar o máximo o presente Centro de Interesse, ensinando a
criança a cuidar com carinho dos animais e também das precauções
que deve tomar para evitar as suas doenças peculiares e os seus
parasitos: a sarna, a asma, a hidrofobia, o piolho etciv.
A orientação dada aos professores estava voltada para o acompanhamento do
processo educativo, aos primeiros passos para formação do pensamento abstrato através
dos Centros de Interesse, bem como o cuidado com a organização de um espaço rico de
informações, figuras e quadros. Na sugestão de atividades apareciam exercícios de
observação e associação para estimular a aquisição do conhecimento e estimular as
diferentes formas do raciocínio:Sugestão de atividades:
1 – Exercício de Observação: estimular a observação das crianças
através de figuras de animais domésticos, através do que está exposto
na sala de aula, através de passeios aos redores da escola, passeios no
jardim zoológico.
2 – Exercícios de associação: Atividades de desenvolvimento e de
pensamento da linguagem. Por meio de estórias, conversas informais
com os alunos, quadrinhas (de memorização), dramatização, fazer
distinção entre animais de pelo, de escamas, de penas etc. fazendo a
criança a identificar o “habitat” de cada um, como se alimentam, as
suas diversas utilidades, como procriam.
Animais de pêlo, mamíferos. Domésticos: o cão, o coelho, a
vaca, o carneiro, o cavalo. Selvagens: o urso, o elefante, o leão, a
onça. Batráquios: o sapo e a sua utilidade, a rã. Peixes: suas
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características, habitantes da água doce e salgada, seu grande valor
alimentício, suas escamas. Aves: o João-de-barro, o canário, o bem-te-
vi, o gavião, o pombo, a galinha, o pato. Insetos úteis: a abelha, o
bicho-da-seda. Insetos nocivos: a formiga, a pulga, a moscav.
As professoras também realizavam conversas informais com as crianças, com o
objetivo de aprofundar o estudo sobre os animais, o cuidado e a prevenção de doenças: a – Conversas informais: (crianças dispostas em círculo) Você tem
um cachorrinho?
Como se chama? Ele brinca com você? Você cuida dele? O
que ele gosta de comer? “Faça com que todas as crianças participem
com as suas experiências. Mostrar então um cartaz com figuras de
animais domésticos e como eles nos ajudam”.
Pode também apresentar figuras de animais utilizando-se de
flanelógrafo, recortar as figuras dos animais, colar atrás uma lixa e
fixá-las no quadro de flanela.
Para aumentar o conhecimento das crianças, apresentar os
animais que habitam os bosques: esquilos, coelhos, passarinhos,
animais selvagem, o leão, a girafa, o urso etc.
Enriquecer o conhecimento através de livros, fotos etc.
Os Subsídios oferecidos aos professores além de apresentar um leque bastante
abrangente de opções em torno das Áreas das Ciências desenvolvidas através das
Unidades de Trabalho também promoviam Campanhas Educativas nas quais eram
realizadas reflexões sobre as atitudes e o conhecimento de outros povos. Esses
conteúdos oferecidos na educação infantil, de certo modo também apareciam no ensino
primário, que era centrado na apropriação do conhecimento universal, Todavia,
paulatinamente foram sendo abandonados em decorrência de um processo de
transformação mais amplo, para incorporar uma concepção de educação centrada na
experiência do aluno. É bem verdade, que a Escola Nova já havia introduzido o debate
que deu início às mudanças estruturais dos princípios da educação, já exposto por
Dermeval Saviani em Escola e Democracia, mas é sob o Governo Militar que de fato
passaram a ser efetivas as mudanças mais profundas no ensino.
A segunda metade da década de 60 do século XX foi marcada por muitas tensões
sociais, momento em que o destino do país foi posto em cheque numa verdadeira
batalha: de um lado setores nacionalistas que defendiam a possibilidade de se construir
um país independente, de resistência ao imperialismo e ampla reforma para garantir o
desenvolvimento interno. De outro, setores que defendiam o desenvolvimento
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econômico associado ao capital estrangeiro, mas também investiam na atuação política
que estabeleciam privilégios ao setor privado.
Além da alteração dos princípios educacionais, também foi intenso o debate em
torno da defesa da escola pública. Já em 1961, o movimento sindical abraçou causas
relativas a educação, realizando-se a 26 de fevereiro, a Primeira Convenção em Defesa
da Escola Pública contra o projeto-substitutivo de Lei de Diretrizes e Bases do ex-
deputado Carlos Lacerda, que pretendia extinguir a escola pública. Diversos
movimentos culturais e de educação de base, progressistas, foram criados, tais como:
Associação dos Universitários de Santo André, os CPCs – Centros de Cultura Popular
(ligados à UNE), os de Alfabetização popular, utilizando o método Paulo Freire”vi. Mas
as forças sociais que defendiam a radicalização no sentido de estreitar laços com o
capital estrangeiro em conformidade com a política norte-americana no auge da Guerra
Fria precisavam estancar os movimentos populares de toda ordem, os progressistas e os
nacionalistas. O resultado desse processo culminou no estrangulamento das lideranças
sociais, na ruptura com a história do Brasil que antecedeu 1964, com o aprofundamento
da subordinação ao capital estrangeiro.
A educação não escapou desses acontecimentos, pelo contrário, foi totalmente
envolvida como um dos suportes da política econômica e de reestruturação social, meio
pelo qual estreitaram-se os laços com a política intervencionista norte-americana. O
acordo MEC-USAID introduziu no Brasil uma mudança radical nas diretrizes
educacionais ao dar início a um processo irreversível: a destituição da formação ampla,
integral e humanística para substituí-la pela visão tecnocrata de homem, pautada pela
educação tecnicista para atender o mercado de trabalhovii. Assim, a Lei 5692-71 teve
como propósito preparar mão de obra especializada para o mercado de trabalho com a
criação do ensino profissionalizante e enfraquecimento da formação científica e
cultural.
Foi diante dessas circunstâncias que na década de 1970 incorporou-se à pré-
escola o caráter de educação compensatória e a Prefeitura Municipal – sob o governo de
Aldino Pinotti (ARENA) – passou a oferecer mais investimentos, tanto na construção de
novos prédios arrojados como na instalação de infra-estrutura. O município de São
Bernardo do Campo havia obtido “um grande crescimento econômico decorrente da
industrialização iniciada na década anterior e a administração municipal investiu no
ensino à criança pequena de forma mais acentuada. Projetos arquitetônicos arrojados de
pré-escolas são desse período. Investiu-se na ampliação do quadro de profissionais, na
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capacitação e aperfeiçoamento do corpo docente e na formação da equipe técnica para
orientar a prática dos professores”viii.
Desse modo, a educação infantil ganhou alguns contornos no sentido de
aprimorar o caráter de educação compensatória, através de atividades que preparariam
as crianças à leitura e à escrita, ou seja, desenvolvendo a linguagem, ou seja,
estimulando a coordenação motora. As atividades de treinos gráficos e coordenação
motora, noções de números e escritas de numerais, contudo, é preciso ressaltar que os
subsídios direcionados ao planejamento escolar confirmam que a pré-escola também
oferecia uma educação amparada na organização de centros de interesses, através dos
quais as crianças obtinham os primeiros contatos com as áreas das ciências, a literatura
e o teatro.
Em 1974, houve uma junção dos serviços de Jardim da Infância e Parques infantis,
mantendo atendimento às crianças entre quatro e seis anos, mas o agravamento dos
problemas sociais levou a uma nova modificação a partir de 1979, quando o
Departamento de Promoção Social (criado em 1978) passou a atender crianças entre 4
meses e 3 anos e 11 meses de idade através da criação de creches. Pela primeira vez, o
município assumiu o serviço das creches, até então conduzida por instituições
assistenciais, como resultado da pressão da comunidade sobre a Prefeitura.
Contraditoriamente às transformações na educação em âmbito municipal, o final da
década de 1970 já evidenciava os resultados da nova política educacional aplicada ao
Ensino Primário ao serem anunciados os números alarmantes de repetência e evasão
escolarix, fato que levou a pré-escola a assumir mais acentuadamente o caráter de
educação compensatória como alternativa à crise instaurada.
A equipe técnica era constituída por um número pequeno de pessoas – em torno
de 5 a 8 pessoas – e era responsável pela formação das professoras e pela produção de
subsídios pedagógicos, que resultaram na criação de apostilas de formação intituladas
“Recordando e Renovando”, formato que se estendeu até meados da década de 1990.
Os subsídios pedagógicos oferecidos pela Secretaria de Educação para orientar o
desenvolvimento das atividades deram continuidade as propostas que giravam em torno
de Unidades de Trabalho como suporte à prática educativa. A partir de temas eram
construídas diversas atividades que tratavam do mesmo assunto através de palavras
cruzadas, busca de palavras-chave, constituição de imagens através de ligamentos de
ponto. Em torno das Unidades de Trabalho desenvolviam-se conversas acerca da vida
no lar, sobre as atividades que os pais exerciam, a contribuição que a criança poderia
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oferecer em casa, locais em que costumavam passear aos finais de semana etc. As
crianças recebiam atividades mimiografadas nas quais teria que assinalar alternativas, a
professora tinha a seu dispor histórias acompanhadas de figuras que auxiliassem na
exploração do tema, que evidenciassem os profissionais que estão mais próximos da
nossa vida (o médico, o professor, o dentista etc.).
A pré-escola atuava como um espaço em que se apresentava o mundo para as
crianças. Cada Unidade de Trabalho trazia um universo a ser conhecido, ainda que
desprovido de grandes elaborações teóricas. Temas como “Lar, Escola e Comunidade”,
“Meios de Transportes e Comunicações”, “As Regiões do Brasil”, “A vida no Campo e
na Cidade”, “Os Três Reinos da natureza: animal, vegetal e mineral”, permitiam à
criança tomar familiaridade com as diferentes áreas da ciência, com a cultura de
diferentes povos, noções de geografia, músicas regionais etc. Na sala de aula era
reservado o cantinho da novidade, no qual deixavam-se disponíveis jogos, como
dominós gigantes, realizava-se construção de maquetes, diferentes formas de pinturas.
Ainda, havia a urna das boas ações: a professora perguntava às crianças qual tinha sido
a boa atitude em casa, depois escolhia bilhetes da urna para lê-los e junto com as
crianças escolher algumas ações de acordo com a vontade da sala. Havia uma
preocupação acentuada com a formação das virtudes desde a infância.
A proposta curricular de 1992:
Sob a administração do prefeito Maurício Soares (PT) foram realizadas diversas
mudanças na educação a partir da década de 1990, e mais precisamente, com o
lançamento currículo em 1992. Nesse período, a Secretaria de Educação e Cultura sob a
Presidência do Professor Luís Roberto Alves, realizou concurso interno para estruturar a
Equipe Técnica e ampliar o número de profissionais que pudesse oferecer suporte
pedagógico à Educação Infantil no Município de São Bernardo do Campo.
A educação recebeu um novo viés, ancorado aos pressupostos dos três teóricos –
como eram denominados Lev Semionovich Vigotski (1896-1934), Henri Wallon
(1879-1962), Jean Piaget (1896-1980) – adequado às perspectivas educacionais que
buscava uma articulação entre esses pensadores. No âmbito mais abrangente das
políticas educacionais, o currículo expressou a perspectiva de uma educação
democrática, atenta aos problemas humanos sociais:“A massificação de um modelo capitalista que ignora a natureza,
privilegiando o produto e a mecanização, tornou os indivíduos
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extremamente competitivos, individualistas e alienados, não se
percebendo como parte de um todo e desconsiderando as
conseqüências de sua própria ação no ambiente” (Currículo de São
Bernardo do Campo, 1992, p.13).
Também traçou comentários acerca das condições educacionais daquele período e o
descaso com que as administrações anteriores trataram a educação e a formação de
professores:É claro que a escola, como parte dessa sociedade, sofreu com a
ausência de uma política que garantisse a qualidade no trabalho
educacional realizado, produzindo o empobrecimento dos conteúdos
didáticos, o descaso com a formação dos professores, o abandono da
manutenção da própria educação. Não é apenas o professor que deseja
reverter hoje esse quadro. Porém a reversão não é tarefa fácil, uma vez
que demanda conhecer as causas e os interesses que levaram a essa
situação e, ainda, lidar com questões que não estão, imediatamente, ao
nosso alcancex (Currículo de São Bernardo do Campo, 1992, p.13).
Além da crítica às políticas educacionais anteriores, o currículo também realizou
uma crítica à ausência de conteúdos didáticos e defendeu a idéia de que até aquele
momento a educação havia ficado à deriva e era objetivo da atual administração ampliar
os investimentos para elevar sua qualidade e eficiência.
Entretanto, a reforma educacional presente no currículo de 1992 promoveu
uma ruptura com as diretrizes educacionais anteriores, dentre elas o desmonte do
planejamento prévio e das unidades de trabalho, para incorporar um
planejamento flexível, construído a partir das rodas de conversas e das
necessidades das crianças, adquirindo um aspecto espontaneísta. Ao introduzir
novas diretrizes para a grade curricular, propôs um planejamento direcionado à
construção de projetosxi, e menos focado nas áreas do conhecimento com
planejamento previamente organizado.
Em linhas gerais, o currículo de 1992 apresentou diretrizes que deveriam nortear
as áreas do conhecimento contempladas na grade curricular: a escola democrática, o
rompimento com a superficialidade da formação de professores e autonomia nas
escolas. Deveria ainda, despertar a visão crítica e apropriação do conhecimento para
construção de um homem solidário, autônomo, dono do seu tempo, sujeito de sua
história. Anda, através do novo currículo foi introduzido o princípio de que a formação
de professores seria dada em serviço com o pressuposto de que “As transformações
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precisam ser geradas dentro dos grupos nas escolas” (Currículo de São Bernardo do
Campo, 1992, p. 15).
Em princípio foi montada uma comissão provisória de coordenadores
pedagógicos para auxiliar nas discussões regionais junto aos professores. Depois
ocorreu um concurso interno para efetivação e ampliação da Equipe Técnica, o que
tornou possível nos anos de 1993 e 1994 a realização de discussões em torno do
currículo com o grupo de professores de cada escola do município.
Nos encontros regionais de formação ou nos encontros gerais, foi dada atenção
especial ao estudo do pensamento de Piaget, Vigotsky e Wallon, e debatido em vários
encontros as diversas atividades que poderiam aprofundar os conteúdos pertinentes às
áreas do conhecimento, incluindo a Arte como área de conhecimento específica.
Contudo, no ano de 1996, com a incorporação das orientações presentes nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) começou a manifestar os sinais da grande mudança que
estaria por vir no âmbito das diretrizes educacionais, como na própria estrutura da
secretaria de educação.
Com processo de municipalização do ensino promovido em 1998 foi dado o
acabamento daquele processo: ocorreu o ajuste à psicolingüística de Emília Ferreiro,
associada a uma reflexão pragmática direcionada a atender interesses imediatos sem
prever conseqüências futuras ou enxergar diferentes alternativas presentes na realidade.
Houve uma maior preocupação com o estímulo da escrita através da convivência com
rótulos das mercadorias, leituras de jornais de supermercados, que passaram a compor
universo cultural oferecido às crianças.
As diretrizes educacionais contidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais,
centrado nos quatro pilares da educação – aprender a ser, aprender a fazer, aprender a
conviver e aprender a aprender – e nos temas transversais – ética, meio ambiente,
doenças sexualmente transmissíveis – foram postos como mediadores das áreas do
conhecimento. Contudo, o resultado tem sido uma ênfase ao desenvolvimento da escrita
em detrimento da supressão do estudo das ciências.
Contraditoriamente, os conteúdos científicos foram substituídos por outras formas
de conteúdo, isto é, no planejamento escolar elaborado pelo professor passou a ser
exigido a especificidade dos objetivos e dos conteúdos a serem desenvolvidos e
distinguir, por exemplo, os objetivos didáticos e os objetivos a serem alcançados pelos
alunos. Por isso, os conteúdos também passaram a ser especificados de acordos com os
seus objetivos: os conteúdos atitudinais estão relacionados a valores e normas, os
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conteúdos procedimentais dizem respeito a forma do educador desenvolver a pesquisa
junto aos alunos ou como conduzir o diálogo nas rodas de conversas, os conteúdos
conceituais relacionados às áreas das ciências. Desse modo, o planejamento, além de
traçar os objetivos e conteúdos das atividades, passou a evidenciar os resultados que
deveriam ser obtidos na realização das atividades. Por outro lado, a retomada do
planejamento permitiu a superação daquela fase espontaneísta para a incorporação de
atividades sistematizadas no sentido de garantir o desenvolvimento das áreas do
conhecimento, a realização de projetos (reduzindo o seu papel nas atividades escolares).
Municipalização do ensino fundamental.
Com a municipalização do Ensino Fundamental I, a secretaria de Educação seria
ampliada através da criação de diversos departamentos, com a contratação de mais de
500 funcionários no setor administrativo e aquisição das escolas estaduais: prédio e
infra-estrutura. A Prefeitura aceitou incorporar a proposta do Estado de São Paulo de
municipalizar o ensino fundamental. Todavia, os professores da rede estadual
continuaram a receber salário pela Secretaria do Estado de São Paulo.
Ocorreu uma aproximação significativa entre a educação infantil e o ensino
fundamental I, todavia, a primeira ficou subordinada aos princípios e organização da
i Cientista Social, Mestre em Filosofia, matriculada no doutorado, área de Fundamentos da Educação do Programa de Pós-Graduação em educação da Universidade federal de São Carlos, e integrante do Grupo de Pesquisa: Economia Política da Educação e Formação Humana – GEPEFH, sob orientação do Prof. Dr. João dos reis Silva Jr. ii A educação infantil em São Bernardo do Campo: uma proposta integrada ao trabalho em creches e EMEI’s. Currículo – Secretaria de educação, Cultura e Esportes. Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo, 1992, p. 17.iii Ibid., p. 18.iv “Os animais” . Subsídio número 9. São Bernardo do Campo: Serviço de Orientação Técnica, 1968.v “Os animais” . Subsídio número 9. São Bernardo do Campo: Serviço de Orientação Técnica, 1968.vi Ibidem. vii A esse respeito, ver Otaísa Ronaelli, A história da educação no Brasil: 1930-1973. Petrópolis: Vozes, 1978.viii Ibidem., p. 20.ix Este problema provocou amplo debate nas universidades, cujo resultado foi expresso nas obras Cuidado Escola! Desigualdade, domesticação e algumas saídas (1980), de Babette Harper, Claudius Ceccon, Miguel Oliveira e Darcy Oliveira; Escola e Democracia (1983), de Dermeval Saviani; A vida na escola e a escola da vida (1984), de C. Ceccon, M. Oliveira e D. Oliveira; A reprodução do Fracasso Escolar (1990), de Maria Helena Souza Patto. x Na abertura do currículo é apresentado uma crítica às políticas educacionais, à ausência de conteúdos didáticos. A educação estava à deriva até aquele momento e era objetivo da atual administração ampliar os investimentos para elevar sua qualidade e eficiência.xi Projetos, inspirados nos relatos de Madalena Freire no livro A paixão de conhecer o mundo, cujo pressuposto educacional se pautava na ruptura com o planejamento prévio da atividade escolar, para se guiar pelas relações do cotidiano, através de rodas de conversa construir com as crianças roteiro de atividades do dia. Nas rodas de conversa deveria ser retirado idéias para construção do projeto que deveria ser pesquisado conjuntamente para aprofundar o assunto de interesse.
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segunda, não apenas na mudança de nomenclatura de Escola Municipal de Educação
Infantil (EMEI) para a Escola Municipal de Educação Básica (EMEB) envolvendo
creches, escolas de educação infantil e escolas de ensino fundamental – que compõem
ao todo 146 unidades escolares.
A orientação técnica foi divida em duas áreas: uma destinada à orientação da
educação infantil e outra para o ensino fundamental. No processo inicia de incorporação
das escolas, foi exigido dos professores do ensino fundamental que atuavam até então
na rede estadual, que se enquadrassem na linha teórica da secretaria municipal de
educação, alinhada à psicolingüística de Emília Ferreiro. As escolas que possuíam uma
padronização no processo de alfabetização – e se apoiavam no método fonético ou
silábico –, bem como uma seqüência articulada entre as salas de primeira a quarta série,
acabaram vivenciando um enfretamento com as diretrizes exigidas pela equipe técnica.
A educação infantil paulatinamente foi sendo submetida aos princípios das
competências defendidas por Philippe Perrenoud, reiterados por Thelma Weiz e Mônica
Gather Thuler. A direção da secretaria de educação através da videoconferência “As
competências para ensinar no século XXI: a formação dos professores e o desafio da
avaliação” e das discussões realizadas nas escolas sob orientação dos coordenadores
pedagógicos promoveram a reiteração dos novos princípios educacionais na formação
dos professores, e conseqüentemente, na formação das crianças.
A estrutura e a própria dinâmica do trabalho dos educadores com as crianças
foram modificadas radicalmente. A escola adquiriu a orgânica de empresa, com
procedimentos técnicos de acompanhamento de controle de qualidade em busca de
índices de produtividade: a avaliação foi posta como centro do processo educativo, o
referencial norteador das relações entre professor e aluno. A semelhança com a estrutura
de empresa se dá pelo fato de inserir desde a educação infantil o acompanhamento
bimestral de dados estatísticos
O princípio motriz da atividade educativa foi tomado pela concepção de que mais
importante que o conhecimento é a forma como ele é desenvolvidoxii
1) Organizar e dirigir situações de aprendizagem; 2) Administrar a progressão das
aprendizagens; 3) Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação;
4) Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho; 5) Trabalhar em
equipe; 6) Participar da administração escolar; 7) Informar e envolver os pais; 8)
xii Newton Duarte tratou dessa questão em Sociedade do conhecimento ou sociedade das ilusões. Campinas: Autores Associados, 2004.
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Utilizar novas tecnologias; 9) Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; 10)
Administrar a própria formação.
Esses indicativos, quando colocados no atual contexto da vida escolar cumpre um
papel bem específico: o educador na atualidade cumpre diversos papéis que lhe são
exigidos no dia a dia, diversas tarefas que ultrapassam a sua formação inicial de
educador. Além do planejamento dos conteúdos a serem desenvolvidos, da organização
das atividades a serem realizadas e dos procedimentos de avaliação, os professores
também hoje são responsáveis pelo atendimento de crianças com necessidades
especiais, tarefas que exigem formação específica para o devido acompanhamento,
cuidam da higiene, desempenham tarefas burocráticas, relatórios diários e bimestrais
acerca do desenvolvimento de seu trabalho e resultado junto aos alunos.
Semanalmente os professores se reúnem com o coordenador pedagógico, mas o
encontro é destinado exclusivamente à formação didática. As reuniões mensais de
planejamento são dedicadas às questões mais gerais relativas à condução da escola,
programações etc. O acompanhamento da atividade do professor se dá através dos
relatórios entregues aos coordenadores pedagógicos que oferece devolutiva escrita de
seu parecer posteriormente. Contudo, o professor desempenha isoladamente suas tarefas
de organização dos materiais a serem utilizados no período de 20 horas que lhe é
concedido para trabalhar com as crianças.
Após o processo de municipalização a Prefeitura pôde movimentar uma verba
maior na educação, houve modernização da infra-estrutura, aquisição de materiais,
ampliação da biblioteca, todavia, a modernização dos equipamentos e materiais não
foram traduzidos em melhores condições de trabalho e ensino. A lógica de trabalho
estabelecida alterou acirradamente as relações entre professores e aluno. O centro da
atividade educativa passou a se concentrar no acompanhamento do desenvolvimento
psicolingüístico da criança, condição que subordina o trabalho educativo à permanente
avaliação. A avaliação conduz o processo educativo.
A avaliação diagnóstica foi introduzida com o objetivo de estimulara a criança a
exteriorizar a sua escrita:Diagnóstico da Escrita
Figura da borboleta_______________________
Figura da lagarta__________________________
Figura do Avião____________________________
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Figura da locomotiva_______________________
Depois passou a ser realizada com maior freqüência a avaliação do processo de ensino-
aprendizagem:FICHA DE AVALIAÇÃO INDIVIDUAL:
Nome da criança:Professora: Turma: Ano: 1996
Desenho:Março Julho Novembro1234
1 – Garatuja desordenada (formas imprecisas sem direção) 2 – Garatuja ordenada (traço contínuo circular intencional)3 – Pré-esquema (desenho intencional, desenha o que sabe e não o que vê)4 – Esquemática (a figura humana é facilmente reconhecida, é detalhista) Observações: __________________________________________________________________________
Linguagem Escrita: Março Julho Novembro1234567
1 – Não domina a escrita do nome2 – Domina a escrita do nome (A – sem plaquinha, B – com plaquinha)3 – Garatuja ( são os riscos e diferenciam-se dos desenhos)4 – Pré-silábico (série igual ou diferenciada de grafias)5 – Silábico sem valor sonoro (utiliza um símbolo para cada sílaba sem se preocupar com os sons das letras)6 – Silábico com valor sonoro (utiliza um símbolo para cada sílaba preocupando-se com o som das sílabas).7 – Reconhece e nomeia algumas letras do alfabeto. Observações: ____________________________________________________________
Matemática:Março Julho Novembro12345
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1 – Não controla quantidades, nem registra os pontos 2 – Controla quantidades, porém não consegue registrar 3 – Controla quantidades e faz o registro correspondente 4 – Utiliza símbolos indecifráveis 5 – Utiliza o numeral ao registrar.
Observações: ________________________________________________________
Socialização: Março Julho Novembro1234567
1- Possui espírito de liderança2 – Não possui iniciativa própria.3 – Interage com os demais colegas.4 – Não interage com os colegas.5 – possui colegas fixos.6 - Imita comportamentos.7 – Não se adapta às regras.8 – Necessita da presença de um adulto.9 – Agressividade. Observações: _______________________________________________________________________ A partir de 2003 a avaliação se concentrou inteiramente no processo de
desenvolvimento da língua escrita, a preocupação de se produzir índices elevados de
alfabetização, sem levar em consideração as diversas áreas da ciência que contribuem
no processo de desenvolvimento do raciocínio. O controle da Secretaria da Educação
sobre a atividade do professor passou a ser mais intenso através das avaliações
bimestrais:Descrição do documento:
A B C D E F G
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1.ª Sondagem de escrita das turmas de 6 anos da EMEB
Lourenço Filho
Mar
cia
Cris
tina
Mar
gare
te
Mar
li
Luci
Mar
cia
Ana
Mar
ia
Tota
l
Pré-silábico 15 10 1 7 19 52
Silábico sem Valor 2 4 10 2 1 19
Silábico com Valor 9 9 15 11 2 46
Silábico alfabético 0 0 0 3 0 3
Alfabético 0 0 0 1 0 1
Total 26 23 26 24 22 121
A cobrança pelo resultado provocou a redução do número de horas reservadas
para a brincadeira e atividades como brincadeiras de roda e jogo simbólico perderam o
espaço no processo de formação das crianças.
Os pensadores clássicos:
Esse conjunto de atividades que norteou a educação infantil até o final da década
de 1980 evidencia uma educação ainda influenciada, pelos princípios que regeram a
educação desde o Renascimento, com a proposta de Comenius, e o Iluminismo com a
proposta de Rousseau, que de certo modo perdurou no decorrer do século XX: os
princípios de educação inspirados na Paidéia, voltado para a formação ampla – no
sentido da apropriação do conhecimento científico e da formação das virtudes e da
sensibilidade. Era considerado importante para formação da criança tanto a apropriação
das línguas e da cultura, quanto o desenvolvimento artístico e das virtudes. Todavia,
esses princípios foram confundidos com os procedimentos educativos pautados por uma
relação mais rígida entre professores e alunos adotada pela escola, fato que justifica a
observação de Dermeval Saviani ao ressaltar em seu livro Escola e Democracia que a
crítica exaustiva da Escola Nova à Escola Tradicional combateu os seus defeitos e
descartou também suas qualidades. A busca pela formação cultural e científica mais
uma vez foi posta à margem do ensino pelas inserções das idéias de Jean Piaget na
educação ao criticar a veiculação de culturas e conquistas das gerações passadas às
crianças sob a justificativa de se construir a autonomia e valorizar o conhecimento
produzido pelo indivíduo:
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(...) é função da educação o desenvolvimento da personalidade, ou, de
preferência e mesmo essencialmente, cabe-lhe moldar os indivíduos
de acordo com um modelo condizente com as gerações anteriores e
suscetível de conservar valores coletivos? Quando nas tribos
primitivas, o adolescente é submetido às cerimônias rituais de
iniciação e recebe, durante meses a fio, em uma atmosfera de tensão
emotiva e de respeito místico, os segredos sagrados que haverão de
transformar sua mentalidade de criança livre e cuja posse permitirá
que seja ele agregado ao clã dos adultos, está claro que o objetivo
principal dessa educação não é o pleno desenvolvimento da
personalidade, mas pelo contrário, a submissão da mesma ao
conformismo social e a conversão integral das representações
coletivas. Pois seria o caso de nos perguntarmos se, em uma escola
tradicional e a submissão dos alunos à autoridade moral e intelectual
do professor, bem com a obrigação de registrar a soma de
conhecimentos indispensáveis ao bom êxito nas provas finais não
constituem uma situação social funcionalmente bastante próxima dos
ritos de iniciação e voltada para o mesmo objetivo geral: impor às
jovens gerações o conjunto das verdades comuns, isto é, das
representações coletivas que já asseguraram a coesão das gerações
anterioresxiii
Piaget expressamente descartou a presença das ciências humanas na formação das
crianças ao considerá-las um veículo de dominação de uma geração sobre a outra, bem
como lançou sobre o professor o estigma de uma autoridade moral que precisava ser
destituída, processo que se concretizou nas décadas posteriores.
Redirecionamento e inversão dos princípios da educação.
Embora o pensamento de Jean Piaget tivesse sido introduzido na formação dos
professores no final da década de 1970, somente na segunda metade da década seguinte
foi de fato incorporado na educação infantil. Após as eleições de 1988, com a posse de
Luiz Roberto Alves como secretário de educação do Município de São Bernardo do
Campo, diversas mudanças passaram no que diz respeito às diretrizes educacionais, fato
que gerou muitas expectativas e discussões em torno das novas propostas que estariam
por ser efetivadas. Todavia, as modificações desencadeadas tanto no plano
organizacional, quanto no plano pedagógico acompanhou os padrões propostos pelos
xiii PIAGET, Jean. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro, Livraria JOSÉ OLYMPO Editora- UNESCO, 1973, p. 59.
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movimentos vigentes na educação em âmbito nacional: o construtivismo e a
psicolingüística eram postas como alternativas na pré-escola, numa oposição a
elaboração de um planejamento prévio e sistematizadoxiv. As discussões em torno da
nova proposta de ensino impulsionaram a discussão entre secretaria de educação e a
professoras da rede de ensino para a elaboração de um novo currículo publicado em
1992: A Educação Infantil em São Bernardo do Campo: Uma Proposta Integrada para
o Trabalho em Creches e EMEI’sxv. A elaboração do Currículo contou com a
coordenação e assessoria pedagógica de Regina Lúcia Scarpa Leite, professora
integrante da Escola da Vila, e supervisão técnica da Profª. Drª. Zilma Cardoso Ramos
de Oliveira. O Currículo estabelecia como linha mestra a construção da autonomia da
criança, trabalho que deveria ser desenvolvido através da referência teórica de Piaget,
Vigotski e Wallon, bem como apresentava indicativos para as professoras
desenvolverem atividades em torno da Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, Artes,
Brincadeiras e Jogos.
Para divulgar os resultados do currículo junto às educadoras foi necessário
ampliar a equipe técnica através de concurso interno para garantir a presença de
orientadores pedagógicos e psicólogos nas escolas. A cada bimestre foram promovidos
encontros regionais entre as escolas como forma de aglutinar a formação de professores
e desenvolver trabalho de equipe entre a equipe técnica, no qual eram freqüentemente
utilizados textos de Ruben Alves, e por vezes excertos de Nietzsche. Na sala de aula
muitas professoras conseguiam concretizar atividades que propiciavam a realização de
experiências na área da ciência, realização de teatros, leitura de histórias acompanhada
com músicas – atividade que despertava muita satisfação entre as crianças e contato
com a escrita. As professoras possuíam certa margem de liberdade para desenvolver o
planejamento e as atividades com as crianças. Em muitas escolas as professoras
conseguiram desenvolver um trabalho de equipe e planejar atividades e passeios que
estivessem articulados com o planejamento.
Novamente a educação infantil passou por impactos a partir de 1996 com a
incorporação de novos paradigmas que paulatinamente foram sendo introduzidos nos
princípios norteadores da educação infantil, como a discussão sobre os temas
xiv A defesa de uma educação espontânea pode ser encontrada no livro Paixão de Conhecer o Mundo, de Madalena Freire, Paz e terra, 1987, e no livro Para onde vai a educação?, de Jean Piaget, Livraria JOSÉ OLYMPO - Editora- UNESCO, 1973.xv EMEI: Escola Municipal de Educação Infantil.
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transversais e a realização de projetos que deveriam ser desenvolvidos paralelamente às
atividades regulares. Essas diretrizes foram aprofundadas em 1997 com a difusão dos
Parâmetros Nacionais Curriculares, período em que a Secretaria de Educação, Cultura e
Esportes junto à equipe técnica começaram a implementar formas de avaliação e
acompanhamento do trabalho das professoras, e as escolas passaram a contar com a
presença mais freqüente de psicólogas e orientadoras pedagógicas, não apenas para
contribuir na condução das atividades pedagógicas, como auxiliar no acompanhamento
de crianças que necessitavam de atenção especial com a reorientação para inclusão.
A rede de ensino da Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo atingiu o
ápice de suas transformações com a incorporação do Ensino Fundamental através da
municipalização no ano de 1998, sob a condução do Secretário de Educação, Cultura e
Esportes Admir Ferro, momento em que foi ampliado consideravelmente a quantidade
de cargos auxiliares e da equipe técnica, que se dividiu em Equipe de Orientação
Técnica Infantil (EOT – Infantil), Equipe de Orientação Técnica Fundamental (EOT –
Fundamental), EJA, e Educação Especial. As Escolas Municipais de Educação Infantil
(EMEI’s) transformaram-se em Escolas Municipais de Ensino Básico (EMEB’s), e de
certo modo, passaram a ser subordinadas ao ensino fundamental a partir da
municipalização ao aproximar os objetivos oferecidos pelas duas esferas de educação.
Passou a ser determinado como meta a alfabetização das crianças aos seis anos, bem
como a formação de educadores através do Curso Professores Alfabetizadores (PROFA)
oferecido pelo MEC e monitoramento da Secretaria de Educação Cultura e Esportes.
Apesar do investimento na formação dos professores, existem várias casos de crianças
que chegam à terceira série sem estarem alfabetizadas.
A meta central estabelecida pelos condutores da Secretaria de Educação, Cultura
e Esportes a partir daí é a alfabetização fundamentada na psicolingüística de Emília
Ferreiro e para garanti-la foi criado um acompanhamento mais intenso das atividades
dos professores, freqüentemente subordinados à avaliação, assim como, sobre o
processo de aprendizagem das crianças. Para atingir esse fim, o ano de 2001 foi
consagrado como meta da rede de ensino a reflexão sistemática sobre o processo de
avaliação. E aí surgiu uma inversão: toda atividade tem sido considerada em si uma
avaliação, que se expressa na quantificação permanente dos resultados. Os professores
da educação infantil, diante da insegurança de não conseguir alcançar a meta
estabelecida de crianças alfabetizadas, ou pelo menos garantir que elas se tornem
silábicas-alfabéticas, reduziram a margem de realização de outras atividades.
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Conforme anexo 1, da página 11, no ano de 2005 foi acentuado o rigor sobre as
avaliações em torno do acompanhamento do processo de desenvolvimento da escrita,
mais precisamente sobre o acompanhamento das hipóteses de escrita das crianças de 6
anos. Na página 12, do anexo 1, também evidencia hierarquia montada para garantir o
acompanhamento do processo de construção da escrita pela criança. Contudo, toda a
estrutura montada tem como foco principal garantir a alfabetização. O processo
posterior ocupa segundo plano, dito de outra forma, todas as esferas do processo
educativo são subordinadas à produção de dados estatísticos.
Considerações finais:
Pelo breve relato pautado nos subsídios oferecidos pelo Serviço de Orientação
Técnica, no currículo publicado em 1992, em planos de avaliação e planejamentos foi
possível identificar as diversas transições sofridas pela educação infantil da rede
municipal de ensino da Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo. Há, sem
dúvida, diversos aspectos ainda a serem levantados, como também faz-se necessário
uma pesquisa mais abrangente sobre as condições e os processos de ensino-
aprendizagem. Porém, alguns fatores têm sido constatados: além da excessiva rigidez na
orientação e cumprimento das atividades e uma dedicação maior para levar as crianças à
construção da escrita, ocorre um maior distanciamento na relação entre professores e
crianças. A educação infantil ficou séria: pouca alegria sob o processo de avaliação
permanente focado nos resultados.
De outro lado, também é identificado maior rigidez nas relações entre a equipe
técnica da secretaria de educação e os professores, que são avaliados freqüentemente e
precisam apresentar relatórios acompanhados de avaliação do próprio trabalho. Todavia,
as diversas medidas implementadas não têm sido traduzidas em melhores condições de
ensino e resultados mais satisfatórios. Pelo contrário, o ritmo de trabalho introduzido na
educação infantil tem apresentado crianças mais agitadas e ansiosas, professores
sobrecarregados pelas diversas demandas a que são submetidos, condições que os levam
a serem mais sérios, indiferentes e distantes afetivamente, características que não
condizem com a ambiência da educação infantil.
As diretrizes de ensino incorporadas nos último dez anos promoveram uma
mudança radical na educação e porque não dizer na história da educação: a escola
efetivamente transformou-se em espaço de educação adequada à sociedade de massas
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ao estabelecer como centro norteador os freqüentes levantamentos estatísticos,
perspectiva que reduz a educação à esfera quantitativa focada na produção de
resultados. Ao fixar metas de desenvolvimento infantil centrada nos aspectos cognitivos
deixa para terceiro plano a formação da individualidade como um todo: a educação dos
afetos e da sensibilidade, a formação científica e cultural. A defesa inicial de construção
da autonomia da criança acaba se concretizando simplesmente pelo fato de que na
ausência das diversas áreas do conhecimento a criança fica desprovida de elementos
para pensar e se posicionar diante da vida. Dessa forma, a escola desperdiça energia e
inteligência quando a criança atravessa uma das fases mais ricas da vida, quando existe
o desejo imenso de aprender e a aprendizagem é quase que imediata.
Todavia, é preciso ressaltar que os malefícios da supressão da formação científica e
cultural recaem principalmente nas séries posteriores e atingem de forma visceral os
indivíduos porque lhes desmontam a teleologia, minam as condições que lhes
permitiriam pensar a partir de um conhecimento prévio o suficiente para agir no mundo:
uma ação orientada pela leitura de possibilidades inscritas na realidade e a livre escolha
de alternativas. Ao contrário do que defende Jean Piaget, a relação dos indivíduos com
as gerações anteriores através do acesso à cultura e às diferentes áreas da ciência lhe
permite a apropriação da riqueza produzida pela humanidade: o conhecimento. Essa
relação lhe permite também o desenvolvimento da sua individualidade e subjetividade
na medida em que tem contato com diferentes produções humanas, tem acesso a
diferentes culturas e problemas sociais e diversas condições históricas, somente aí
poderá superar o pequeno círculo em que se encontra para considerar o outro como ser
da mesma espécie. Como defende J. J. Rousseau em Ensaio sobre a origem das línguas,
quando os homens reconhecerem outros indivíduos que não fazem parte do seu pequeno
grupo familiar como seres da mesma espécie estará sendo dado o primeiro passo para a
superação da barbárie.
agora sim, ajustada ao construtivismo e à psicolingüística proposta por Emília Ferreiro
Documentos:
Currículo – Secretaria de educação, Cultura e Esportes. Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo, 1992.
Subsídio número 9. São Bernardo do Campo: Serviço de Orientação Técnica, 1968.
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Referências Bibliográficas:
DUARTE, Newton. Sociedade do conhecimento ou sociedade das ilusões. Campinas: Autores Associados, 2004.
PIAGET, Jean. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro, Livraria JOSÉ OLYMPO Editora- UNESCO, 1973.
ROMANELLI, Otaísa O. A história da educação no Brasil: 1930-1973. Petrópolis: Vozes, 1978.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. São Paulo, Cortez/Autores Associados, 1988.___________Pedagogia Histórico-Crítica – primeiras aproximações. Campinas, Editora Autores associados, 2003, 8ª edição revista e ampliada.
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