o que é etnometodologia - garfinkel
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Traduo
GARFINKEL, H. O que
etnometodologia? In: ______. Studies in
ethnomethodology. Cambridge: Polity
Press, 1996 [1967]. Cap. 1. P. 1-34. Crditos da traduo
A traduo foi feita pela empresa Actra Tradues,
na pessoa de Adauto Vilella (diretor e tradutor), e o
estabelecimento do texto final, pelos professores Dr.
Paulo Cortes Gago (Departamento de Letras) e Dr.
Raul Francisco Magalhes (Departamento de
Cincias Sociais), da Universidade Federal de Juiz de
Fora.
Reviso tcnica e estabelecimento do texto final:
prof. Dr. Paulo Cortes Gago e prof. Dr. Raul
Francisco Magalhes
Apresentao da traduo1
Paulo Cortes Gago e Raul Francisco Magalhes
Apresentamos ao pblico brasileiro a
traduo do primeiro captulo da obra
seminal, Studies in Ethnomethodology
(Estudos de Etnometodologia), escrita pelo
socilogo Harlod Garfinkel (1917-2011) e
publicada pela primeira vez em 1967.
Garfinkel j era ento professor da Universidade da Califrnia, Los Angeles (UCLA),
onde desenvolveu a maior parte de sua carreira e
tornou-se professor emrito. 1 Agradecemos prof Dra.. Anne W. Rawls da
Bentley University que gentilmente permitiu a
publicao sem custos do presente captulo e ao prof.
Dr. Frdric Vandenberghe do IESP/UERJ que
mediou essa solicitao. Agradecemos especialmente
coordenao do Programa de Ps-Graduao em
Lingustica da UFJF, representada poca pela prof.
Dra. Maria Cristina Lobo Name, por ter-nos
disponibilizado os recursos pblicos necessrios para
viabilizar a traduo. Pela mesma razo cabe-nos
agradecer ao prof. Jess Souza que fomentou parte
desse projeto com recursos do Pronex-FAPEMIG.
Agradecemos tambm ao Prof. Dr. Berthold elze,
da Universidade de Passau (Alemanha), como um
dos incentivadores iniciais do projeto de traduzir para
o Portugus textos essncias em Etnometodologia por
ocasio de sua visita UFJF, como professor
visitante do Departamento de Cincias Sociais, em
2008. Agradecemos por fim profa. Marcella
Beraldo, da comisso editorial da Teoria & Cultura,
que acolheu com entusiasmo a idia de publicar esta
traduo.
O captulo em questo O que etnometodologia? pode ser entendido como o estudo que lana a pedra angular do
programa etnometodolgico: a idia, contida
na famosa passagem, de que as atividades pelas quais os membros produzem e
gerenciam situaes de afazeres cotidianos
organizados so idnticas aos procedimentos
empregados pelos membros para tornar
essas situaes relatveis (1996 [1967], p. 1). Esse aforismo vem sendo estudado e
discutido desde ento como um programa de
investigao microssociolgica das
estruturas da ao social. Ele gerou
inmeros desdobramentos, dentro e fora da
teoria sociolgica, sendo o mais eloqente a
anlise da conversa, derivada da leitura
socioligustica do trabalho que Garfinkel.
A verso que utilizamos aqui 6
reimpresso do livro, de 1996. A obra
original rene no total oito captulos, que
podem ser desmembrados como oito estudos
independentes sem que haja prejuzo de
compreenso, embora todos concorram para
apresentar um mesmo programa
etnometodolgico, que esperamos em tempo
relativamente breve disponibilizar por
inteiro para os leitores da lngua portuguesa.
Boa leitura!
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GARFINKEL, H. O que
etnometodologia? In: ______. Studies in
ethnomethodology. Cambridge: Polity
Press, 1996 [1967] 2
.
Os estudos a seguir buscam tratar
atividades prticas, circunstncias prticas e
raciocnio sociolgico prtico como tpicos
de estudo emprico e, ao dedicarem s
atividades mais comuns do cotidiano a
ateno usualmente dispensada a eventos
extraordinrios, procuram estud-las como
fenmenos em si. A recomendao central
2 Primeira traduo por Adauto Vilela. Reviso
tcnica e estabelecimento do texto final por Paulo
Cortes Gago (Programa de Ps-Graduao em
Lingustica, UFJF) e Raul Francisco Magalhes
(Programa de Ps-Graduao em Cincias Sociais,
UFJF).
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desses estudos a de que as atividades pelas
quais os membros produzem e gerenciam
situaes de afazeres cotidianos organizados
so idnticas aos procedimentos empregados
pelos membros para tornar essas situaes
relatveis. O carter reflexivo ou encarnado de prticas de relato e dos prprios relatos forma o cerne da
recomendao. Quando falo de relatvel,
meus interesses direcionam-se para questes
como as seguintes: eu quero dizer
observvel-e-relatvel, ou seja, disponvel
para os membros como prticas situadas de
olhar-e-dizer. Quero dizer, tambm, que tais
prticas consistem em uma realizao sem
fim, contnua, contingente; que elas so
conduzidas e feitas acontecer sob os
auspcios dos mesmos afazeres ordinrios
que, ao organiz-las, as descrevem; que as
prticas so realizadas pelas partes daquelas
situaes, de cuja habilidade, conhecimento
e direito ao funcionamento detalhado
daquela realizao (sua competncia) elas
obstinadamente dependem, reconhecem,
usam e tomam como dados; e o fato de que
aceitam sua competncia sem questionar em
si fornece s partes as caractersticas
distintivas e especficas de uma situao e,
claro, fornece tambm recursos, problemas,
projetos e todo o resto.
Helmer e Rescher3
resumiram algumas
caractersticas estruturalmente equivocadas
dos mtodos e resultados obtidos por
pessoas que fazem sociologia, leigas e
profissionais, para tornarem observveis
atividades prticas. Os autores observam
que as prescries so como-lei, restritas espao-temporalmente e frouxas, quando os relatos dos membros de atividades
cotidianas so usados como prescries para
localizar, identificar, analisar, classificar, e
para tornar reconhecvel ou para orientar-se
em ocasies comparveis. Por frouxa, entende-se que, embora sejam
intencionalmente condicionais em sua forma
lgica, a natureza das condies tal que, freqentemente, no podem ser completa ou
3 Olaf Helmer and Nicholas Rescher, On the
Epistemology of the Inexact Sciences, p-1513 (Santa
Monica, California: RAND Corporation, 13 de
outubro, 1958), p. 8-14.
inteiramente explicadas. Os autores citam como exemplo uma declarao do sculo
XVIII sobre tticas de navegao vela.
Eles apontam que a declarao, como
condio de teste, faz referncia ao estado
da artilharia naval.
Ao elaborar as condies (sob as
quais tal declarao se sustentaria) o
historiador delineia o que tpico do
lugar e do perodo. As implicaes
completas de tal referncia podem ser
vastas e inesgotveis; por exemplo. . .
a artilharia logo se ramifica, via
tecnologia de trabalhar metal, em
metalurgia, minerao, etc. Assim, as
condies que so operativas na
formulao de uma lei histrica
podem, apenas, ser indicadas de uma
forma geral, e no so,
necessariamente, articuladas de forma
exaustiva, na maioria das vezes, na
verdade, no se pode esperar de fato
que o sejam. Essa caracterstica de tais
leis aqui designada como frouxido.
. . .
Uma conseqncia da frouxido
de leis histricas no serem
universais, mas meramente quase-
gerais, no sentido de que admitem
excees. Uma vez que as condies
que delimitam a rea de aplicao da
lei so freqentemente no-articuladas
de forma exaustiva, uma suposta
violao da lei pode ser explicvel
pela demonstrao de que uma
precondio legtima, mas at ento
no-formulada, no satisfeita no caso
em considerao.
Considere-se que isso vale em
qualquer caso especfico, e vale no por
causa do sentido da quase-lei, mas por causa das prticas especficas e reais dos
investigadores.
Alm disso, Helmer
e Rescher
apontam que,
Pode-se considerar que as leis
contm uma advertncia tcita do tipo
usualmente ou mantendo-se
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constantes todos os outros fatores. Uma lei histrica no , assim,
estritamente universal, visto que
deveria ser considerada aplicvel a
todos os casos dentro do alcance de
suas condies explicitamente
formuladas ou formulveis; pelo
contrrio, pode-se considerar que ela
formula relaes que prevalecem em
geral, ou melhor, que prevalecem
como regra. Chamaremos tal lei de quase-
lei. Para que a lei seja vlida, no
necessrio que nenhuma exceo
aparente ocorra. necessrio apenas
que, se uma exceo aparente ocorrer,
que seja apresentada uma explicao
adequada, que demonstre a
caracterstica excepcional do caso em
questo e que estabelea a violao de
uma condio apropriada, at ento
no formulada, da aplicabilidade da
lei.
Essas e outras caractersticas podem
ser citadas pela fora com que descrevem
prticas de relato dos membros. Assim: (1)
Sempre que um membro precisa demonstrar
que determinado relato analisa uma situao
real, ele invariavelmente faz uso de prticas
de et cetera, a menos que e deixa pra l para demonstrar a racionalidade de sua realizao. (2) O carter preciso e sensato da
questo que est sendo relatada
estabelecido por uma indicao que narrador
e ouvinte fazem um ao outro de que cada um
dar ao outro quaisquer entendimentos no
declarados que se faam necessrios. Muito,
portanto, do que realmente narrado no
mencionado. (3) Durante o tempo de sua
produo, os relatos podem exigir que o
ouvinte esteja disposto a aguardar por aquilo que ser dito, para que a significncia
presente do que foi dito torne-se clara. (4)
Tal como conversas, reputaes e carreiras,
as particularidades dos relatos so
construdas, passo a passo, a partir de seus
usos reais e as referncias a eles. (5) Para
adquirir sentido, os materiais de um relato
dependem fortemente de seu
posicionamento serial, de sua relevncia
para os projetos de quem ouve ou do
desenrolar das ocasies organizacionais de
seu uso.
Em resumo, o sentido (ou o fato)
reconhecvel, ou o carter metdico, ou a
impessoalidade, ou a objetividade dos
relatos no so independentes das ocasies
socialmente organizadas de seus usos. Suas
caractersticas racionais consistem no que os
membros fazem com os relatos, no que
entendem deles nas ocasies reais socialmente organizadas de seus usos. Os
relatos dos membros esto reflexiva e
essencialmente vinculados, pelas suas
caractersticas racionais, s ocasies
socialmente organizadas de seus usos, visto
que so caractersticas das ocasies
socialmente organizadas de seus usos.
Esse vnculo estabelece o tpico
central de nossos estudos: a relatabilidade
racional das aes prticas enquanto
realizao prtica contnua. Quero
especificar o tpico revisando trs de seus
fenmenos problemticos constituintes.
Sempre que estudos de ao prtica e
raciocnio prtico esto em questo, eles
consistem no seguinte: (1) na distino
programtica no satisfeita e na
substituibilidade entre expresses objetivas
(livres de contexto) e expresses indexicais;
(2) na reflexividade essencial
desinteressante de relatos de aes prticas; e (3) na analizabilidade de aes-
em-contexto enquanto realizao prtica.
A distino programtica no satisfeita
entre expresses objetivas e expresses
indexicais e sua substituibilidade
As propriedades exibidas por relatos
(por serem elas caractersticas das ocasies
socialmente organizadas de seus usos) esto
disponveis em estudos de lgicos como
propriedades de expresses e sentenas
indexicais. Husserl4 falava de expresses
cujo sentido no pode ser decidido por quem
ouve sem que, necessariamente, este saiba
ou presuma algo sobre a biografia e os
4 In Marvin Farber, The Foundation of
Phenomenology (Cambridge, Massachusetts: Harvard
University Press, 1943), p. 237-238.
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propsitos do usurio da expresso, sobre as
circunstncias da elocuo, sobre a trajetria
prvia da conversa ou a relao especfica
de interao real ou potencial que existe
entre quem se expressa e quem ouve.
Russel5 observou que as descries que as
envolviam aplicavam-se, em cada ocasio
de uso, a apenas uma coisa, porm, a coisas
diferentes em ocasies diferentes. Tais
expresses, escreveu Goodman6, so usadas
para fazer proposies inequvocas cujo
valor de verdade, no obstante, parece
mudar. Cada uma de suas elocues,
expresses, constitui uma palavra e se refere a uma determinada pessoa, tempo ou
lugar, nomeia algo no nomeado por alguma
rplica da palavra. Sua denotao relativa
ao falante. Seu uso depende da relao do
usurio com o objeto do qual a palavra trata.
O tempo, para uma expresso indexical
temporal, relevante para aquilo que
nomeia. De forma semelhante, a regio
exata que uma expresso indexical espacial
nomeia depende da localizao de sua
elocuo. Expresses indexicais e
proposies que as contm no podem ser
livremente repetidas; em um dado discurso,
nem todas as rplicas so tambm tradues
delas. A lista pode ser estendida
indefinidamente.
Existe uma concordncia
virtualmente unnime entre estudantes do
raciocnio sociolgico prtico, leigos e
profissionais, sobre as propriedades de
expresses indexicais e de aes
indexicais. Existe tambm uma
concordncia impressionante (1) que,
embora expresses indexicais tenham enorme utilidade, elas so incmodas para um discurso formal; (2) que a distino entre expresses objetivas e
expresses indexicais no
procedimentalmente apropriada, mas
inevitvel para qualquer um que faa
cincia; (3) que sem a distino entre
5 Bertrand Russell, Inquiry into Meaning and Truth
(New York: W. W. Norton & Company, Inc., 1940),
p. 134-143. 6 Nelson Goodman, The Structure of Appearance
(Cambridge, Massachusetts: Harvard University
Press, 1951), p. 287-298.
expresses objetivas e indexicais, e sem o
uso preferencial de expresses objetivas,
os xitos de investigaes cientficas
rigorosas e generalizantes lgica, matemtica, algumas das cincias fsicas so ininteligveis, as vitrias iriam
fracassar, e as cincias inexatas teriam que
abandonar suas esperanas; (4) que as
cincias exatas so distinguveis das
cincias inexatas pelo fato de que, no caso
das cincias exatas, a distino entre
expresses objetivas e expresses
indexicais, e a substituio de umas pelas
outras para a formulao de problema,
mtodos, achados, demonstrao
adequada, evidncia adequada e todo o
resto tanto uma tarefa real quanto uma
realizao real, enquanto que, no caso das
cincias inexatas, a disponibilidade da
distino e da substituibilidade de tarefas,
prticas e resultados reais permanecem
imperceptivelmente programtica; (5) que
a distino entre expresses objetivas e
indexicais, na medida em que essa
distino composta pelas tarefas do
investigador, seus ideais, suas normas,
recursos, realizaes e todo o resto,
descreve a diferena entre as cincias e as
artes, por exemplo, entre a bioqumica e o
documentarismo cinematogrfico; (6) que
termos e sentenas podem ser distinguidos
reciprocamente de acordo com o
procedimento de avaliao, que torna seus
caracteres decidveis como expresses
indexicais ou objetivas; e (7) que em
qualquer caso especfico, apenas
dificuldades prticas impedem a
substituio de uma expresso objetiva por
uma expresso indexical.
As caractersticas das expresses
indexicais motivam estudos metodolgicos
incessantes, direcionados a sua soluo. De
fato, as tentativas de livrar as prticas
cientficas desses incmodos conferem, a
cada cincia, seu carter distintivo de
preocupao e produtividade em relao a
questes metodolgicas. Estudos
empreendidos por pesquisadores
profissionais das atividades prticas de
uma cincia qualquer proporcionam-lhes
ocasies incontveis de lidar, de forma
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rigorosa, com expresses indexicais.
So incontveis as reas nas cincias
sociais, em que a prometida distino e a
prometida substituibilidade ocorrem. As
prometidas distino e substituibilidade
so sustentadas por imensos recursos (e
elas prprias os sustentam) direcionados a
desenvolver mtodos para anlises
robustas de aes prticas e de raciocnio
prtico. As aplicaes e os benefcios
prometidos so imensos.
No obstante, sempre que aes
prticas so tpicos de estudo, a prometida
distino e substituibilidade de expresses
objetivas por indexicais permanece
programtica em todo caso especfico e em
toda ocasio real, na qual a distino ou a
substituibilidade devem ser demonstradas.
Em todo caso real, sem exceo, sero
mencionadas condies, cujo
reconhecimento demandar um
investigador competente, tal que, naquele
caso especfico, os termos da
demonstrao possam ser relaxados e,
contudo, a demonstrao ainda ser
considerada adequada.
Aprendemos com lgicos e
lingistas, que concordam de forma
virtualmente unnime sobre certas
condies, quais so algumas dessas
condies. Para textos longos ou longos cursos de ao, para eventos em que as aes dos membros so
caractersticas dos eventos que suas aes
esto realizando, ou sempre que expresses
no so usadas ou no so apropriadas
como substitutas de expresses indexicais,
as demonstraes reivindicadas pelo
programa so satisfeitas como questo de
gerenciamento social prtico.
Sob tais condies, expresses
indexicais, por causa de sua prevalncia e
outras propriedades, apresentam imensos,
obstinados e irremediveis transtornos s
tarefas de lidar, de forma rigorosa, com
fenmenos de estrutura e de relevncia em
teorias de provas de consistncia e de
computabilidade, e s tentativas de
recuperar a conduta real, quando esta
comparada conduta suposta e fala
comum, com todas as suas particularidades
estruturais. Valendo-se de suas
experincias com o uso de pesquisas por
amostragem e do desenho e aplicao de
mensuraes de aes prticas, de anlises
estatsticas, de modelos matemticos e de
simulaes por computador de processos
sociais, socilogos profissionais
conseguem documentar incessantemente
os modos como a distino e a
substituibilidade programticas so
satisfeitas e dependentes das prticas
profissionais de demonstrao socialmente
gerenciadas.
Em resumo, sempre que estudos de
aes prticas esto envolvidos, a
distino e substituibilidade sempre
realizada apenas para todos os fins
prticos. Por conseguinte, recomenda-se
que o primeiro fenmeno problemtico
seja composto pela reflexividade das
prticas e resultados das cincias nas e das
atividades organizadas da vida cotidiana,
sendo isso uma reflexividade essencial.
A reflexividade essencial
desinteressante dos relatos
Para membros engajados em
raciocnio sociolgico prtico como veremos em estudos recentes, para o
quadro de funcionrios no Centro de
Preveno ao Suicdio de Los Angeles,
para equipes que usam pronturios
clnicos psiquitricos na Universidade da
Califrnia em Los Angeles (U.C.L.A.),
para alunos de ps-graduao
codificadores de registros psiquitricos,
para jurados, para indivduos
intersexuados gerenciando mudana de
sexo, para socilogos pesquisadores
profissionais seus interesses direcionam-se para o que decidvel para fins prticos, luz desta situao, dada a natureza real das circunstncias, e coisas semelhantes. Circunstncias prticas e
aes prticas referem-se, para eles, a
muitas questes srias e
organizacionalmente importantes: a
recursos, objetivos, desculpas,
oportunidades, tarefas e, claro, a bases
para discutir ou predizer a adequao dos
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procedimentos e dos achados que
produzem. Uma questo, contudo,
excluda de seus interesses: aes prticas
e circunstncias prticas no so, em si,
um tpico, muito menos um tpico
exclusivo de suas investigaes; nem so
suas investigaes, voltadas a tarefas da
teorizao sociolgica, realizadas para
formular o que compe essas tarefas
enquanto aes prticas. Em nenhum caso
a investigao das aes prticas
realizada de modo que a equipe possa ser
capaz, antes de tudo, de reconhecer e
descrever o que est sendo feito. Menos
ainda so as aes prticas investigadas de
modo a explicar aos praticantes sua
prpria fala sobre o que esto fazendo.
Por exemplo, a equipe do Centro de
Preveno ao Suicdio de Los Angeles
achou completamente incongruente
considerar de forma sria que eles
estivessem to engajados em seu trabalho
de certificar a causa mortis, quanto uma
pessoa que tenta cometer suicdio, e eles
poderiam combinar seus esforos para
garantir um reconhecimento inequvoco
do que realmente aconteceu. Dizer que eles no esto
interessados no estudo de aes prticas no reclamar, nem apontar uma
oportunidade que eles deixam escapar, nem
uma revelao de erro, nem um
comentrio irnico. Tambm no o caso
que, por no estarem interessados, os membros estejam excludos da teorizao sociolgica. Nem suas investigaes
impedem o uso da regra da dvida, nem
esto eles impedidos de tornar as atividades
organizadas da vida cotidiana
cientificamente problemticas, nem seu
comentrio insinua que haja uma diferena
entre interesses bsicos e aplicados em pesquisa e em teorizao.
O que significa, ento, dizer que eles
no esto interessados em estudar aes prticas e raciocnio sociolgico prtico? E
qual a importncia de uma tal declarao?
Existe uma caracterstica dos relatos
dos membros que, para eles, de uma
relevncia to singular e predominante que
controla outras caractersticas em seu
carter especfico, enquanto caractersticas
reconhecveis e racionais de suas
investigaes sociolgicas prticas. Tal
caracterstica a seguinte. A respeito do
carter problemtico de aes prticas e da
adequao prtica de suas investigaes, os
membros tomam como dado que um
membro deve, desde o incio, conhecer as situaes nas quais ele deve operar, caso
suas prticas devam servir de medida para
transformar as caractersticas especficas e
localizadas dessas situaes em um relato
reconhecvel. Eles tratam como a questo
de fato mais passageira o fato de que os
relatos dos membros, de todos os tipos, em
todos os seus modos lgicos, com todos os
seus usos e para todo mtodo de os reunir,
sejam caractersticas constituintes das
situaes que tornam observveis. Os
membros conhecem essa reflexividade,
exigem-na, contam com ela e dela fazem
uso para produzir, realizar, reconhecer ou
demonstrar a adequao-racional-para-
todos-os-fins-prticos de seus
procedimentos e achados.
No somente os membros os jurados e os outros tomam essa reflexividade como dada, mas reconhecem,
demonstram e tornam observveis, uns para
os outros, o carter racional de suas prticas
reais (e isso significa: de suas prticas
ocasionais), enquanto consideram tal
reflexividade como uma condio
inaltervel e inevitvel de suas
investigaes.
Quando proponho que os membros
no esto interessados em estudar aes prticas, no quero dizer que os membros
tero nenhum, um pouco ou muito desse
interesse. Que "no esto interessados tem a ver com prticas razoveis, com
argumento plausvel e com descobertas
razoveis. Tem a ver com tratar relatvel-para-todos-os-fins-prticos como uma questo a ser descoberta, exclusivamente,
unicamente e completamente. Para os
membros, estar interessado consistiria no seu empreendimento de tornar observvel o
carter reflexivo de atividades prticas; examinar as prticas engenhosas de
investigao racional como fenmenos
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organizacionais sem pensar em corretivos
ou ironia. Os membros do Centro de
Preveno ao Suicdio de Los Angeles
agem como membros sempre que se
engajam em investigaes sociolgicas
prticas: mesmo que quisessem, eles no
poderiam ter essa reflexividade.
A analisibilidade de aes-em-contexto
como uma realizao prtica
De formas infinitamente variveis, as
investigaes dos membros so
caractersticas constituintes das situaes
que analisam. Da mesma forma, suas
investigaes tornam-se reconhecveis para
os membros como adequadas-para-todos-
os-fins-prticos. Por exemplo, no Centro
de Preveno ao Suicdio de Los Angeles,
so realizaes organizacionais prticas
que as mortes tornem-se relatveis-para-
todos-os-fins-prticos.
Organizacionalmente, os procedimentos do
Centro de Preveno ao Suicdio visam a
realizar a relatabilidade racional de mortes
por suicdio como caractersticas
reconhecveis das situaes nas quais a
relatabilidade ocorre.
Nas ocasies reais de interao, tal
realizao , para os membros,
onipresente, no problemtica e lugar-
comum. Para os membros que fazem
sociologia, transformar tal realizao em
um tpico de investigao sociolgica
prtica parece inevitavelmente exigir que
eles tratem as propriedades racionais das
atividades prticas como
antropologicamente estranhas. Com isso, quero chamar a ateno para prticas
reflexivas, tais como as seguintes: em suas prticas de relato, o membro torna
familiar atividades comuns da vida
cotidiana reconhecveis como atividades
familiares e comuns; em cada ocasio em
que um relato de atividades comuns
usado, elas so reconhecidas como uma outra primeira vez; o membro trata os processos e resultados da imaginao como contnuos em relao a outras
caractersticas observveis das situaes,
nas quais elas ocorrem; proceder de tal
forma que, ao mesmo tempo em que o
membro, no meio das situaes reais testemunhadas, reconhece que as situaes
testemunhadas tm um sentido realizado,
uma facticidade realizada, uma
objetividade realizada, uma familiaridade
realizada, uma relatabilidade realizada,
para o membro, os comos organizacionais dessas realizaes so no
problemticos, so vagamente conhecidos
e so conhecidos apenas no fazer, que
feito de forma habilidosa, confivel,
uniforme, com uma enorme padronizao e
como uma questo no relatvel.
Essa realizao consiste em os
membros fazerem, reconhecerem e usarem
etnografias. Essa realizao , para os
membros, um fenmeno normal, e no
percebido. E da mesma forma no
conhecida que a realizao comum, ela ,
para nossos interesses, um fenmeno
impressionante, pois, em suas formas no
conhecidas, ela consiste em (1) usos pelos
membros de atividades cotidianas
concertadas como mtodos com os quais
pode-se reconhecer e demonstrar as
propriedades isolveis, tpicas, uniformes,
a repetio potencial, a aparncia conexa, a
consistncia, equivalncia,
substituibilidade, direcionalidade,
anonimamente descritvel e engenhosa em resumo, as propriedades racionais de
expresses indexicais e aes indexicais.
(2) O fenmeno consiste, tambm, na
analizabilidade de aes-em-contexto,
dado que, no s no existe um conceito de
contexto-em-geral, mas tambm todo uso
de contexto por si, sem exceo, essencialmente indexical.
As propriedades reconhecidamente
racionais de suas investigaes de senso
comum seu carter reconhecidamente consistente, ou metdico, ou uniforme, ou
engenhoso, etc. so, de alguma forma, resultados das atividades concertadas dos
membros. Para a equipe do Centro de
Preveno ao Suicdio, para codificadores,
para jurados, as propriedades racionais de
suas investigaes prticas consistem, de
alguma forma, no trabalho concertado de
tornar evidente (a partir de fragmentos, de
-
provrbios, de observaes passageiras, de
rumores, de descries parciais, de
catlogos de experincia codificados, porm essencialmente vagos e coisas
semelhantes) como uma pessoa morreu na
sociedade ou por quais critrios pacientes
foram selecionados para tratamento
psiquitrico, ou quais dentre os veredictos
alternativos estavam corretos. O de alguma
forma o ponto crucial da questo.
O que etnometodologia?
A marca registrada do raciocnio
sociolgico prtico, onde quer que ocorra,
que ele busca solucionar as propriedades
indexicais da fala e da conduta dos
membros. Inmeros estudos metodolgicos
so voltados para a tarefa de fornecer aos
membros uma soluo para expresses
indexicais nas tentativas permanentes dos
membros, com o uso rigoroso de
idealizaes para demonstrar a
observabilidade das atividades organizadas
nas ocasies reais por meio de
particularidades situadas de fala e conduta.
As propriedades de expresses
indexicais e de aes indexicais so
propriedades ordenadas. Estas consistem
em um sentido organizacionalmente
demonstrvel, ou em facticidade, ou em
uso metdico, ou em concordncia entre
membros de uma mesma cultura. Suas propriedades ordenadas so compostas por
propriedades racionais demonstrveis de
expresses indexicais e aes indexicais.
Essas propriedades ordenadas so
realizaes contnuas das atividades
comuns concertadas dos investigadores. A
racionalidade demonstrvel das expresses
indexicais e das aes indexicais mantm,
ao longo da trajetria de sua produo
gerenciada pelos membros, o carter de
circunstncias prticas tornadas rotineiras,
familiares e ordinrias. Enquanto processo
e resultado, a racionalidade produzida de
expresses indexicais consiste em tarefas
prticas, sujeitas a todas as exigncias da
conduta organizacionalmente situada.
Eu uso o termo etnometodologia para me referir investigao das
propriedades racionais de expresses
indexicais e outras aes prticas como
realizaes contnuas e contingentes de
prticas engenhosas da vida cotidiana. Os
artigos deste volume tratam essa realizao
como o fenmeno de interesse. Eles
buscam especificar suas caractersticas
problemticas, recomendar mtodos para
seu estudo, mas, acima de tudo, considerar
o que ns podemos aprender de forma
definitiva sobre elas. Meu propsito no
restante deste captulo caracterizar a
etnometodologia, o que fao apresentando
trs estudos do funcionamento dessa
realizao, seguidos de um conjunto
conclusivo de polticas de estudo.
RACIOCNIO SOCIOLGICO
PRTICO: FAZENDO RELATOS EM
SITUAES DE ESCOLHA DE SENSO COMUM
O Centro de Preveno ao Suicdio
de Los Angeles (CPS) e o Gabinete de
Mdicos Examinadores e Legistas de Los
Angeles juntaram foras em 1957 para
conferir status cientfico s Certides de
bito dos Legistas dentro dos limites das certezas prticas impostas pelo estado da
arte. Os casos selecionados de morte sbita no natural, sobre os quais havia dvida quanto a serem suicdio ou outras modalidades de morte foram
encaminhados pelo Mdico Examinador-
Legista ao CPS, com o pedido de que fosse
feita uma investigao, chamada autpsia psicolgica7.
7 As referncias a seguir contm relatrios sobre o
procedimento de autpsia psicolgica desenvolvido no Centro de Preveno ao Suicdio de Los Angeles:
Theodore J. Curphey, "The Forensic Pathologist and
the Multi-Disciplinary Approach to Death," in Essays
in Self-Destruction, ed. Edwin S. Shneidman
(International Science Press, 1967), in press;
Theodore J. Curphey, "The Role of the Social
Scientist in the Medico-Legal Certification of Death
from Suicide," in The Cry for Help, ed. Norman L.
Farberow and Edwin S. Shneidman (New York:
McGraw-Hill Book Company, 1961); Edwin S.
Shneidman and Norman L. Farberow, "Sample
Investigations of Equivocal Suicidal Deaths," in The
Cry for Help; Robert E. Litman, Theodore J.
Curphey, Edwin S. Shneidman, Norman L. Farberow,
-
119
As prticas e interesses da equipe do
CPS, para realizar suas investigaes em
situaes de escolha de senso comum,
repetiam as caractersticas das
investigaes prticas encontradas em
outras situaes: em estudos de
deliberaes do jri com casos de
negligncia; na seleo de pacientes para
tratamento psiquitrico ambulatorial feita
pelas equipes das clnicas; na codificao
de contedos de pronturios clnicos em
uma planilha de codificao seguindo
instrues de codificao detalhadas, feita
por alunos de ps-graduao em
sociologia; e em incontveis
procedimentos profissionais na conduo
de investigao antropolgica, lingstica,
scio-psiquitrica e sociolgica. As
seguintes caractersticas no trabalho do
CPS foram reconhecidas e francamente
admitidas, por uma equipe, como
condies predominantes de seu trabalho e
como questes a serem consideradas na
avaliao da eficcia, eficincia ou
inteligibilidade de seu trabalho e somaram o testemunho do CPS ao de
jurados, pesquisadores e todos os demais:
(1) Um interesse permanente de
todas as partes pela concertao temporal
das atividades; (2) um interesse pela
questo prtica par excellence: O que fazer agora?; (3) um interesse da parte do investigador em evidenciar sua
compreenso de O Que Qualquer Um Sabe sobre como as situaes, nas quais teve que realizar suas investigaes,
funcionam e seu interesse em faz-lo nas
ocasies reais, nas quais as decises seriam
tomadas pela sua conduta exibvel na
escolha; (4) questes que, na fala, podem
ser consideradas como programas de produo, leis de conduta, regras de tomada de deciso racional, causas, condies, teste de hipteses,
and Norman D. Tabachnick, "Investigations of
Equivocal Suicides," Journal of the American
Medical Association, 184 (1963), 924-929; and
Edwin S. Shneidman, "Orientations Toward Death: A
Vital Aspect of the Study of Lives," in The Study of
Lives, ed. Robert W. White ( New York: Atherton
Press, 1963), reprinted in the International Journal
of Psychiatry, 2 (1966), 167-200.
modelos, regras de inferncia indutiva e dedutiva, na situao real, foram tomadas como dadas e dependeram de serem
formadas por receitas, provrbios, slogans
e planos de ao parcialmente formulados;
(5) exigia-se dos investigadores que
tivessem conhecimento e habilidades para
tratar da situao do mesmo tipo, para as quais regras de tomada de deciso racional e todo o resto eram destinadas de modo a ver (ou eram requisitados por aquilo que faziam para garantir) as
caractersticas objetivas, efetivas,
consistentes, completa e empiricamente
adequadas, ou seja, as caractersticas
racionais de receitas, profecias, provrbios,
descries parciais em uma ocasio real do
uso das regras; (6) para aquele que toma
as decises prticas, a ocasio real, enquanto um fenmeno em si, exercia
prioridade esmagadora de relevncia,
qual regras de deciso (ou teorias de tomada de deciso) estavam, sem exceo,
subordinadas de modo a avaliar suas
caractersticas racionais, e no o contrrio;
(7) finalmente, e talvez de forma mais
caracterstica, todas as caractersticas
precedentes (junto com um sistema de alternativas do investigador, seus mtodos
de deciso, suas informaes, suas escolhas e a racionalidade de seus relatos e
aes) eram partes constituintes das
mesmas circunstncias prticas, nas quais
os investigadores faziam o trabalho de
investigao uma caracterstica, que os investigadores, se fossem reivindicar e
reconhecer a praticidade de seus esforos,
conheceriam, exigiriam, com a qual
contariam, tomariam como dada, usariam e
glosariam.
O trabalho de investigao realizado
pelos membros do CPS era parte integrante
de seu ofcio dirio. Reconhecidas pelos
membros da equipe como caractersticas
constituintes de seu trabalho dirio, suas
investigaes eram, por isso, intimamente
conectadas s condies de trabalho, a
diversas sries internas e externas de
relatrio, superviso e reviso, e a
prioridades de relevncias similares, fornecidas organizacionalmente para
-
avaliaes do que era realisticamente, praticamente ou razoavelmente necessrio fazer ou do que poderia ser
feito, o quo rapidamente, com quais
recursos, vendo quem, falando sobre o que,
por quanto tempo, e assim por diante. Tais
consideraes forneciam a Ns fizemos o que podamos e, para todos os interesses
razoveis, aqui est o que encontramos suas caractersticas de sentido, de fato
organizacionalmente apropriado, de
impessoalidade, de anonimato, de
finalidade, de reprodutibilidade ou seja, de um relato apropriadamente e
visivelmente racional da investigao.
Era necessrio que os membros, em
suas competncias ocupacionais,
formulassem relatos do que ocorreu-
realmente-para-todos-os-fins-prticos.
Realmente fazia referncia inevitvel s tarefas ocupacionais dirias e ordinrias.
Apenas os membros tinham o direito de
invocar tais tarefas como fundamentos
apropriados para tornar aceitvel o carter
razovel do resultado sem necessidade de
especificao. Em ocasies de desafio,
tarefas ocupacionais ordinrias eram
citadas, explicitamente, na parte relevante. Do contrrio, tais caractersticas eram descartadas do
produto. Em seu lugar, um relato de como
a investigao foi feita preenchia o como-
isso-foi-feito-realmente da forma
apropriada para demandas usuais,
resultados usuais, prticas usuais e a fala
usual da equipe do CPS falando como
profissionais bona fide sobre demandas
usuais, resultados usuais e prticas usuais.
Um dentre diversos ttulos
(relacionados causa mortis) tinha de ser
atribudo a cada caso. A coleo consistia
em combinaes legalmente possveis de
quatro possibilidades elementares morte natural, acidente, suicdio e homicdio
8.
8 As combinaes possveis incluem as seguintes:
morte natural; acidente; suicdio; homicdio; possvel
acidente; possvel suicdio; possvel morte natural;
(entre) acidente ou suicdio, no determinado; (entre)
morte natural ou suicdio, no determinado; (entre)
morte natural ou acidente, no determinado; e (entre)
morte natural ou acidente ou suicdio, no
determinado.
Todos os ttulos eram aplicados de forma a
no apenas resistir s variedades de
equvoco, ambigidade e improviso que
surgiam em toda ocasio real de seu uso,
mas esses ttulos eram aplicados de forma a
levar quela ambigidade, ao equvoco e
improvisao. Fazia parte do trabalho no
apenas que o equvoco um problema talvez um problema mas tambm que os praticantes eram direcionados para aquelas
circunstncias de modo a levar
ambigidade ou ao equvoco, a levar
improvisao ou a levar temporalizao e
a todo o resto. No que o investigador, tendo
uma lista de ttulos, realizasse uma
investigao que prosseguia gradualmente
para estabelecer os fundamentos para a
escolha dentre eles. A frmula no era
Aqui est o que fizemos e, dentre os ttulos-meta de nossa pesquisa, este ttulo
interpreta, finalmente, e de uma forma
melhor, o que descobrimos. Em vez disso, os ttulos eram continuamente confirmados e
prognosticados. A investigao era
fortemente guiada pelo uso que o
investigador fazia de situaes imaginadas,
nas quais o ttulo seria usado por uma ou outra parte interessada, incluindo o falecido,
e isso era feito pelos investigadores de modo
a decidir, usando quaisquer dados que fossem descobertos, que aqueles dados podiam ser usados para disfarar, caso fosse
necessrio disfarar, ou equivocar, ou
explicar, ou guiar, ou exemplificar, se
necessrio fosse. A caracterstica
predominante de uma investigao era o fato
de que nada sobre ela permanecia garantido,
a no ser as ocasies organizadas de seus
usos. Assim, uma investigao de rotina era
aquela, em que o investigador usava
contingncias especficas para realizar, e
dependia de contingncias especficas para
reconhecer e tornar aceitvel a adequao
prtica de seu trabalho. Quando avaliada por
um membro, ou seja, examinada a respeito
de prticas reais para faz-la acontecer, uma
investigao de rotina no aquela realizada
pelas regras ou de acordo com as regras.
Parecia consistir muito mais em uma
investigao abertamente reconhecida como
insuficiente, mas da mesma forma que
-
121
insuficiente, sua adequao reconhecida e,
para ela, ningum est particularmente
oferecendo ou pedindo explicaes.
O que os membros esto fazendo em
suas investigaes sempre de interesse dos
outros, no sentido de que tais pessoas em
particular, localizadas organizacionalmente
e localizveis, adquirem interesse luz do
relato feito pelo membro do CPS sobre o
que quer que seja relatado como tendo
realmente acontecido. Tais consideraes contriburam fortemente para a caracterstica
percebida das investigaes, que foram
direcionadas, no seu curso, por um relato,
para o qual a reivindicao ser antecipada
de que, para todos os fins prticos, ele
correto. Assim, durante o curso de sua
investigao, a tarefa do investigador
consistia em fazer um relato sobre como
uma pessoa especfica morreu em sociedade,
um relato que fosse contado adequadamente,
suficientemente detalhado, claro, etc., para
todos os fins prticos.
O que realmente aconteceu, durante o curso da investigao para se chegar at a,
bem como aps esse o que realmente aconteceu ter sido inserido no arquivo e ser decidido o ttulo, pode ser constantemente
revisto, bem como constantemente
prognosticado, luz do que podia ter sido
feito, ou do que poder ser feito com essas
decises. Quase no novidade que, no
curso de uma deciso, o seu resultado era
sempre revisto e prognosticado luz das
conseqncias antecipadas dessa deciso.
Aps uma indicao ter sido feita e o mdico
legista ter assinado o atestado de bito, o
resultado pode ser ainda, como eles dizem,
revisado. Pode ainda ser tomada uma deciso que precisa ser revisada mais uma vez.
Os investigadores queriam muito ser
capazes de garantir que poderiam aparecer,
no final, com um relato de como a pessoa
morreu, que permitisse ao mdico legista e a
sua equipe, defenderem-se de acusaes de
que aquele relato era incompleto, ou de que
aquela morte acontecera de forma diferente
de, ou em contraste com ou em contradio
com aquela que os membros envolvidos
alegaram. A referncia no , nem
exclusiva, nem completamente relativa s
reclamaes dos sobreviventes. Tais
questes so tratadas como uma sucesso de
episdios, a maioria delas sendo
estabelecidas bem rapidamente. As grandes
contingncias consistiam em processos
persistentes, que se assentavam no fato de o
gabinete de mdicos legistas ser uma
repartio estatal. As atividades do gabinete
de legistas produzem relatrios contnuos
das atividades do gabinete. Esses relatrios
so sujeitos a reviso como produtos de
trabalho cientfico do mdico legista, sua
equipe e seu consultor. As atividades do
gabinete so mtodos para realizar relatrios
que sejam cientficos-para-todos-os-fins-
prticos. Isso envolvia escrever como um procedimento de garantia para que um
relatrio, por ter sido escrito, fosse colocado
em um arquivo. O fato de que um
investigador faz um relatrio por isso transformado em uma questo para registro
pblico para o uso de outras pessoas apenas
parcialmente identificveis. Seus interesses
em por qu, ou como, ou o que fez o
investigador teriam, em algum aspecto
relevante, a ver com a sua habilidade e
direito como profissional. Mas os
investigadores sabem tambm que outros
interesses vo informar a reviso, pois o trabalho do investigador ser escrutinado
para ver a adequao-cientfica-para-todos-
os-fins-prticos como reivindicaes
socialmente gerenciadas dos praticantes.
No apenas para os investigadores, mas para
todas as partes, relevante o que foi realmente descoberto para-todos-os-fins-
prticos? que consiste inevitavelmente em o quanto voc pode descobrir, o quanto voc
pode revelar, o quanto voc pode explicar, o
quanto voc pode esconder, o quanto voc
pode sustentar como no sendo do interesse
de algumas pessoas importantes, incluindo
investigadores. Todos eles adquiriram um
interesse por causa do fato de que
investigadores, por conta de um dever
ocupacional, estavam surgindo com
relatrios escritos de como, para-todos-os-
fins-prticos, pessoas-realmente-morreram-
e-esto-realmente-mortas-na-sociedade.
As decises tm uma
-
conseqencialidade inevitvel. Com isso
quer-se dizer que investigadores precisavam
dizer em tantas palavras o que realmente aconteceu?. As palavras importantes eram os ttulos que eram atribudos a um texto
para recuperar esse texto como a
explicao do ttulo. Mas em que um ttulo atribudo consiste como um ttulo
explicado no , a qualquer tempo especfico, para algum dizer com qualquer
finalidade, mesmo quando proposto em tantas palavras. De fato, que ele seja proposto em tantas palavras, que, por exemplo, um texto escrito fosse inserido no arquivo do caso, fornece fundamentos de direito que podem ser invocados de modo a
aproveitar as tantas palavras que tero sido usadas como relato da morte. Vistos em
relao a padres de uso, os ttulos e os
textos que os acompanham possuem um
conjunto aberto de conseqncias. Em
qualquer ocasio de uso dos textos, pode
restar para ser visto o que pode ser feito com
eles, ou o que eles iro alcanar, ou o que
permanece feito por enquanto, ficando pendentes as maneiras pelas quais o
ambiente daquela deciso pode organizar-se
para reabrir o caso, ou registrar uma queixa ou encontrar um problema e assim por diante. Tais maneiras so, para a
equipe do CPS, como padres, indubitveis;
mas, enquanto processos especficos para
faz-las acontecer, so, em toda ocasio real,
imprecisas.
As investigaes do CPS comeam
com uma morte que o mdico legista acha
duvidosa quanto causa mortis. Essa morte
eles usam como um precedente, atravs do
qual vrias formas de viver em sociedade
que poderiam terminar com essa morte so
descobertas e lidas no que restou; nos fragmentos disto ou daquilo, como o corpo e
seus pertences, vidros de remdio, bilhetes,
pedaos e peas de roupa, e outros
memorabilia coisas que podem ser fotografadas, coletadas e embaladas. Outros
restos tambm so coletados: rumores, observaes passageiras e histrias materiais dos repertrios de quem quer que possa ser consultado via trabalho
comum de conversas. Esses pedaos e peas
quaisquer que uma histria ou uma regra ou
um provrbio podem tornar inteligvel so
usados para formular um relato
reconhecivelmente coerente, padro, tpico,
necessrio, uniforme, engenhoso, ou seja,
um relato profissionalmente defensvel e
por isso, para os membros, um relato
reconhecivelmente racional de como a
sociedade trabalhou para produzir aqueles
restos. Esse ponto de vista ficar mais
defensvel se o leitor consultar qualquer
manual padro de patologia forense. Nele
ser encontrada a inevitvel foto de uma
vtima com a garganta cortada. Fosse o
legista usar tal viso para indicar a equivocidade da causa mortis, ele diria algo
como: Nos casos em que o corpo parece com aquele da fotografia, voc est diante
de uma morte por suicdio porque a ferida
mostra os cortes hesitantes que acompanham a ferida maior. Pode-se
imaginar que esses cortes sejam os restos de
um procedimento pelo qual a vtima fez
primeiro diversas tentativas preliminares de
um tipo hesitante e, ento, desferiu o golpe
mortal. Outros cursos de ao so
imaginveis tambm, e, assim, cortes que
parecem cortes hesitantes podem ser
produzidos por outros mecanismos.
preciso comear pela imagem real e
imaginar como diferentes cursos de ao
poderiam ter sido organizados de tal forma
que aquela fotografia seria com ela
compatvel. Pode-se pensar na imagem
fotografada como uma fase-da-ao. Em
qualquer imagem real h um curso de ao
com o qual essa fase exclusivamente
compatvel? Essa a pergunta do mdico
legista. O legista (e a equipe do CPS) pergunta
isso com respeito a cada caso especfico, e,
por isso, seu trabalho de chegar a uma
decidibilidade prtica quase inevitavelmente
exibir a seguinte caracterstica predominante
e importante. A equipe do CPS deve realizar
essa decidibilidade com respeito aos estes: devem comear com este tanto; esta viso;
esta nota; esta coleta do que quer que esteja
ao alcance da mo. E o que quer que esteja
l bom o bastante, no sentido de que o que
quer que esteja l no apenas servir como
-
123
serve. Faz-se com que o que quer que esteja
l sirva. No quero dizer com fazer servir que um investigador do CPS contente-se
facilmente ou que ele no busque mais
quando deve. Em vez disso, quero dizer: o o
que quer que seja com o qual ele tem que
lidar, isso o que ter sido usado para se ter
descoberto, para se ter tornado decidvel, a
maneira como a sociedade operou para ter
produzido aquela fotografia, para ter
alcanado aquela cena como seu resultado
final. Dessa forma, os restos na lmina
servem no apenas como um precedente,
mas como uma meta para as investigaes
do CPS. O que quer que os membros do
CPS tenham que encarar deve servir como o
precedente com o qual ler os restos de modo
a ver como a sociedade podia ter operado
para ter produzido o que que o
investigador tem no final, na anlise final e em qualquer caso. O que a investigao pode alcanar o que a morte
alcanou.
RACIOCNIO SOCIOLGICO PRTICO:
SEGUINDO INSTRUES DE
CODIFICAO
Muitos anos atrs, meus colegas e eu
empreendemos a anlise do experimento da
Clnica Ambulatorial da U.C.L.A. de modo
a responder questo Por quais critrios so seus candidatos selecionados para
tratamento?. Para formular e responder a essa questo, utilizamos uma verso de um
mtodo de anlise de grupo utilizado por
Kramer e associados9 para descrever
caractersticas de ingresso e fluxo de
pacientes em hospcios. (Os captulos seis e
sete narram outros aspectos dessa pesquisa.)
Sucessivas atividades de primeiro contato, entrevista de admisso, teste psicolgico, reunio de admisso, internao e alta foram concebidas com o uso do diagrama de rvore da Figura 1.
Qualquer caminho entre o primeiro contato
9 M. Kramer, H. Goldstein, R. H. Israel, and N. A.
Johnson, "Applications of Life Table Methodology to
the Study of Mental Hospital Populations,"
Psychiatric Research Reports of the American
Psychiatric Association, June, 1956, p. 49-76.
e o trmino era chamado de trajetria.
-
Desejvamos saber quais
caractersticas dos pacientes, da equipe
clnica, de suas interaes e da rvore
estavam associadas com cada carreira. Os
registros clnicos foram nossas fontes de
informao, dentre os quais os mais
importantes eram os formulrios de
inscrio para admisso e os contedos dos
pronturios de caso. De modo a obter um
registro contnuo de casos de transaes
paciente-clnica, desde o momento do
contato inicial de um paciente at sua alta,
um Formulrio de Carreira Clnica foi criado e inserido nas pastas de caso. Uma
vez que os pronturios clnicos contm
relatrios fornecidos pela equipe clnica de
suas prprias atividades, praticamente todas
essas fontes de dados resultaram de
procedimentos de auto-relatrio.
Dois alunos de ps-graduao de
sociologia da UCLA examinaram as
informaes de 1.582 pronturios clnicos
para preencher os itens da Planilha de
Codificao. Um procedimento
convencional de confiabilidade foi criado e
conduzido com o objetivo de determinar a
quantidade de concordncia entre
codificadores e entre tentativas sucessivas
de sua codificao. De acordo com o
raciocnio convencional, a quantidade de
concordncia fornece um conjunto de
fundamentos para conferir crdito aos
eventos codificados de eventos clnicos
reais. Uma caracterstica crtica de
avaliaes de confiabilidade que a
concordncia entre codificadores consiste na
concordncia sobre os resultados finais.
Ningum se surpreendeu quando o
trabalho preliminar mostrou que, de modo a
realizar a codificao, os codificadores
estavam presumindo um conhecimento das
mesmas formas organizadas da clnica das
quais os procedimentos de codificao
deveriam produzir descries. Mais
interessante ainda, tal conhecimento
pressuposto parecia necessrio e foi
consultado de forma muito deliberada
sempre que, por quaisquer razes, os
codificadores precisassem ser convencidos
de que haviam codificado o que realmente aconteceu. Isso se dava independente de haverem ou no encontrado contedos
ambguos nos pronturios. Tal procedimento punha abaixo qualquer
-
125
reivindicao de que mtodos atuariais de
interrogar os contedos dos pronturios
haviam sido usados, no importando o quo
aparentemente claras fossem as instrues
de codificao. A concordncia sobre os
resultados da codificao estava sendo
produzida por um procedimento
contrastante com caractersticas
desconhecidas.
Para descobrir mais sobre o
procedimento que nossos alunos usaram, o
procedimento de confiabilidade foi tratado
como uma atividade problemtica em si
mesma. A confiabilidade dos resultados codificados foi testada perguntando-se como
os codificadores trouxeram realmente os
contedos dos pronturios sob a jurisdio
dos itens da Planilha de Codificao. Por
meio de quais prticas foi atribudo aos
contedos reais dos pronturios o status de
respostas s perguntas dos pesquisadores?
Quais atividades reais compunham as
prticas dos codificadores chamadas de
seguindo as instrues de codificao? Foi criado um procedimento que
produzia informaes de confiabilidade
convencionais de forma que os interesses
originais do estudo fossem preservados. Ao
mesmo tempo, o procedimento permitia o
estudo de como qualquer quantidade de
concordncia ou discordncia havia sido
produzida pelas maneiras reais como os dois
codificadores estavam tratando os contedos
dos pronturios como respostas s questes
formuladas pela Planilha de Codificao.
Porm, em vez de presumir que os
codificadores, no importa como
procedessem, pudessem estar errados em
maior ou menor quantidade, a suposio era
a de que o que quer que os codificadores
fizessem poderia ser considerado como
procedimento correto em algum jogo de codificao. A pergunta era: o que eram
esses jogos? O que quer que os codificadores fizessem era suficiente para
produzir o que encontravam. Como
procediam para encontrar o que
encontravam?
Logo descobrimos a relevncia
essencial para os codificadores, em seu
trabalho de interrogar os contedos dos
pronturios em busca das respostas s suas
questes, de consideraes como et cetera", a menos que, deixa pra l e factum valet (ou seja, uma ao, que do contrrio proibida por uma regra,
considerada correta aps realizada). Por
convenincia, deixe-me chamar a essas
consideraes de ad hoc e a sua prtica de ad hocao. Os codificadores usaram as mesmas consideraes ad hoc de modo a
reconhecer a relevncia das instrues de
codificao para as atividades organizadas
da clnica. Apenas quando essa relevncia
era clara, os codificadores ficavam
convencidos de que as instrues de
codificao analisadas realmente
encontravam os contedos dos pronturios
de modo a permitir que os codificadores
tratassem os contedos dos pronturios
como relatrios de eventos reais. Por fim, as consideraes ad hoc foram
caractersticas invariantes das prticas de
seguir as instrues de codificao. Tentativas de suprimi-las e de, ao mesmo
tempo, reter um sentido inequvoco para as
instrues produziam confuso por parte
deles.
Vrias facetas do novo estudo de confiabilidade foram desenvolvidas, a
princpio de modo a verificar se esses
resultados poderiam ser estabelecidos
solidamente e, aps estar claro, para minha
satisfao, que eles o poderiam, para
explorar as conseqncias para o carter
sociolgico geral dos mtodos de
interrogao dos codificadores (assim como
de mtodos contrastantes) e tambm para o
trabalho envolvido em reconhecer ou
reivindicar que algo fora feito por regra que uma ao havia seguido ou sido
governada pelas instrues. Consideraes ad hoc so
consideraes invariavelmente relevantes
para decidir o ajuste entre o que podia ser
lido nos pronturios clnicos e o que o
codificador inseria na planilha de
codificao. No importando o quo
definitiva e elaboradamente as instrues
haviam sido escritas, e a despeito do fato de
-
que regras de codificao atuariais estritas10
poderiam ser formuladas para cada item, e
com as quais os contedos dos pronturios
podiam ser mapeados para a planilha de
codificao, contanto que fosse levada
adiante a reivindicao de que as entradas da
Planilha de Codificao relatavam eventos
reais das atividades dos clnicos, ento, em
cada caso, e para cada item, et cetera, a menos que , deixa pra l e factum valet acompanhavam a compreenso do
codificador sobre as instrues de
codificao enquanto formas de se analisar
os contedos reais dos pronturios. Seus
usos tornavam possvel, tambm, que o
codificador lesse os contedos de uma pasta
como um relatrio sobre os eventos que a
Planilha de Codificao fornecia e
formulava como eventos do diagrama de
processamento.
Normalmente, pesquisadores tratam
tais procedimentos ad hoc como modos
imperfeitos de escrever, reconhecer e seguir
as instrues de codificao. A viso
predominante sustenta que um bom trabalho
requer que pesquisadores, ao estender o
nmero e a clareza de suas regras de
codificao, minimizem ou mesmo
eliminem as ocasies em que et cetera e outras prticas de ad hocao seriam
usados.
Tratar as instrues como se as
caractersticas ad hoc em seu uso fossem
uma amolao, ou tratar sua presena como
fundamento para reclamar sobre a
incompletude das instrues, muito
parecido com reclamar que, se as paredes
de um prdio fossem simplesmente
retiradas do caminho, seria possvel ver
melhor o que estava sustentando o telhado.
Nossos estudos mostraram que
consideraes ad hoc so caractersticas
essenciais de procedimentos de codificao.
A ad hocao necessria se o pesquisador
quiser captar a relevncia das instrues
para a situao especfica e real que
10
M. Kramer, H. Goldstein, R. H. Israel, and N. A.
Johnson, "Applications of Life Table Methodology to
the Study of Mental Hospital Populations,"
Psychiatric Research Reports of the American
Psychiatric Association, June, 1956, p. 49-76.
pretende analisar. Para cada ocasio
especfica e real de busca, deteco e
atribuio de contedos dos pronturios a
uma categoria prpria o que quer dizer, na trajetria da real codificao tais consideraes ad hoc tm prioridade
irremedivel sobre os to falados critrios
necessrios e suficientes. No o caso de os critrios necessrios e suficientes serem procedimentalmente definidos pelas
instrues de codificao. Nem o caso de
prticas ad hoc, tais como et cetera, ou deixa pra l, serem controladas ou eliminadas em sua presena, uso, nmero
ou ocasies de uso tornando instrues de
codificao to precisas quanto possvel.
Em vez disso, consideraes ad hoc so
consultadas pelos codificadores e prticas
de ad hocao so utilizadas de modo a
reconhecer aquilo sobre o que as
instrues esto definitivamente falando.
Consideraes ad hoc so consultadas pelos
codificadores de modo a reconhecer
instrues de codificao como definies operacionais de categorias de codificao. Elas operam como fundamentos e como
mtodos para apresentar e assegurar que as
reivindicaes dos pesquisadores foram
codificadas de acordo com critrios
necessrios e suficientes. A ad hocao ocorre (sem, acredito
eu, qualquer possibilidade de soluo),
sempre que o codificador assume a posio
de membro socialmente competente do
arranjo cujo relato ele busca montar e,
quando, a partir dessa posio, ele trata os contedos reais dos pronturios como postos
em uma relao de significao de confiana
para com o sistema nas atividades clnicas. por assumir a posio de membro competente em relao aos arranjos
cujo relato ele busca realizar que o
codificador pode ver o sistema no contedo real do pronturio. Isso ele faz de
um jeito algo parecido com o de algum
precisar conhecer as formas metdicas do
uso do ingls de modo a reconhecer uma
elocuo como uma palavra-em-ingls ou
saber as regras de um jogo para entender um
movimento-em-um-jogo, dado que maneiras
alternativas de entender uma elocuo ou
-
127
um jogo de tabuleiro so sempre
imaginveis. Por isso, o codificador
reconhece o contedo do pronturio por
aquilo que ele realmente ou pode ver sobre o que uma nota na pasta 'est
verdadeiramente falando. Isso posto, se o codificador deve ser
convencido de que ele detectou uma
verdadeira ocorrncia clnica, ele deve tratar
os contedos reais dos pronturios como
representantes permanentes da ordem-
social-nas-e-das-atividades-clnicas. Os
contedos reais dos pronturios se
apresentam, para as maneiras ordenadas das
atividades clnicas, como representaes
deles; eles no descrevem a ordem, nem so
evidncias da ordem. o uso que o
codificador faz dos documentos do
pronturio como funes-de-sinais para o
que quero chamar a ateno, ao dizer que o
codificador deve conhecer a ordem das
atividades dos clnicos para as quais ele est
olhando de modo a reconhecer o contedo
real como uma aparncia-de-ordem. Uma
vez que o codificador pode ver o sistema no contedo, possvel para o codificador
estender e, fora isso, interpretar as
instrues de codificao - para ad hoc-las
de forma a manter a relevncia das instrues de codificao para os contedos
reais e, dessa maneira, formular o sentido do
contedo real de forma que seu significado,
mesmo que transformado pela codificao,
seja preservado aos olhos do codificador
como um evento verdadeiro das atividades
reais da clnica.
H diversas conseqncias
importantes:
(1) De forma caracterstica, os
resultados codificados seriam tratados
como se fossem descries desinteressadas
de eventos clnicos, e as regras de
codificao, presumidamente, sustentam a
reivindicao de descrio desinteressada.
Mas se o funcionamento da ad hocao
necessrio para tornar tais reivindicaes
inteligveis, pode-se sempre argumentar e at agora no vi uma resposta defensvel que os resultados codificados consistem em
uma verso persuasiva do carter
socialmente organizado das operaes da
clnica, independente de qual seja a ordem
real, e mesmo sem que o investigador tenha
detectado a ordem real. Em vez de nosso
estudo das carreiras clnicas dos pacientes
(assim como de grande quantidade de
estudos dos vrios arranjos sociais que tm
sido realizados de forma igualmente
convencional) ter descrito a ordem das
operaes da clnica, pode-se argumentar
que o relato consiste em uma maneira
socialmente inventada, persuasiva e prpria
de falar sobre a clnica como um
empreendimento ordenado, j que afinal de contas o relato foi produzido por procedimentos cientficos. O relato seria ele prprio parte da ordem real das
operaes da clnica, de maneira muito
semelhante de algum que trata o relato
de uma pessoa sobre suas prprias
atividades como uma caracterstica de suas
atividades. A ordem real ficaria por ser
descrita.
(2) Outra conseqncia aparece,
quando perguntamos o que deve ser feito
do cuidado que, no obstante, to
assiduamente exercido no desenho e no
uso de instrues de codificao para
interrogar os contedos reais e
transform-los em linguagem da planilha
de codificao? Se o relato resultante ele
prprio uma caracterstica das atividades
dos clnicos, ento talvez no se deva ler
as instrues de codificao como uma
maneira de obter uma descrio cientfica
das atividades dos clnicos, j que esta
presume que a linguagem de codificao,
naquilo sobre o que est falando,
independente dos interesses dos membros
que esto sendo servidos ao us-la. As
instrues de codificao devem ser lidas,
em vez disso, como consistindo em uma
gramtica de retrica; elas fornecem uma
maneira la cincia social de falar de forma a induzir consenso e ao dentro
das circunstncias prticas das atividades
dirias organizadas da clnica, cuja
compreenso espera-se que os membros
tenham por costume. Ao se referir a um
relato da clnica que foi obtido seguindo-
se as instrues de codificao, possvel
para membros com interesses diferentes
-
persuadirem uns aos outros e reconciliar
suas falas sobre os acontecimentos da
clnica de maneira impessoal, enquanto as
questes sobre as quais se est
verdadeiramente falando retm seu
sentido, para os debatedores, como um estado de acontecimentos legtimo ou
ilegtimo, desejvel ou indesejvel,
vantajoso ou desvantajoso para os
participantes da discusso em suas vidas ocupacionais. Ele fornece uma maneira
impessoal de caracterizar seus
acontecimentos, sem que os membros
renunciem a importantes interesses
organizacionalmente determinados sobre
aquilo que o relato, aos seus olhos,
afinal de contas. Aquilo do que trata a ordem clnica cujas caractersticas
verdadeiras, como qualquer membro sabe
que Todo o Mundo Sabe, nunca so da
conta de mais-ningum-naquela-
organizao.
RACIOCNIO SOCIOLGICO
PRTICO: ENTENDIMENTO COMUM
Os socilogos distinguem entre os
significados do produto e do processo de um entendimento comum. Enquanto
produto, compreende-se que um entendimento comum consista em uma
concordncia compartilhada sobre
questes substantivas; enquanto
processo, ele consiste em vrios mtodos pelos quais algo que uma pessoa
diz ou faz reconhecido como estando de
acordo com uma regra. Com seus
conceitos de Begreifen e Verstehen, cada
qual com seu carter distinto enquanto
mtodo e conhecimento, Weber deu aos
socilogos a autoridade para essa
distino.
Uma anlise das experincias de
estudantes ao relatar conversas comuns
sugere que, para qualquer dos casos, para
"produto" ou processo, um entendimento comum consiste em uma trajetria
intratemporal de trabalho interpretativo.
Suas experincias sugerem algumas
conseqncias estranhas dos fatos de que,
em qualquer dos casos, um entendimento
comum tem necessariamente uma estrutura
operacional.
No Captulo dois, relatada uma
pesquisa, na qual estudantes deveriam
relatar conversas comuns, escrevendo, no
lado esquerdo de uma folha de papel, o que
as partes realmente disseram e, no lado
direito, o que eles e seus colegas
entenderam que eles estavam falando. A
seguinte conversa relatada aqui.
MARIDO Dana conseguiu pr uma moeda no
parqumetro hoje sem precisar ser
levantado.
Esta tarde, ao trazer Dana, nosso filho de quatro anos, da
creche para casa, ele conseguiu alcanar alto o suficiente
para pr uma moedinha dentro de um parqumetro,
quando estacionamos numa zona de parqumetros,
enquanto que antes ele sempre tinha que ser levantado
para conseguir alcanar aquela altura.
ESPOSA:
Voc levou ele loja de discos? J que ele ps um centavo no parqumetro, isso quer
dizer que voc parou enquanto ele estava com voc. Eu
sei que voc parou na loja de discos no caminho
de ida para a creche ou no caminho de volta. Foi
no caminho de volta, de forma que ele estava com
voc, ou voc parou l a caminho da creche e em
outro lugar no caminho de volta?
MARIDO No. Ao sapateiro. No. Parei na loja de discos a caminho da creche e
parei no sapateiro a caminho de casa, quando ele
estava comigo.
ESPOSA:
Para qu? Conheo uma razo pela qual voc poderia ter parado no
sapateiro. Qual foi o motivo, de fato?
MARIDO Comprei cadaros novos para os
meus sapatos.
Como voc deve lembrar, eu arrebentei um dos
cadaros dos meus sapatos marrons no outro dia,
-
129
ento eu parei l para comprar cadaros novos.
ESPOSA:
Seus mocassins precisam de saltos
novos urgentemente.
Pensei em outra coisa que voc poderia ter feito
l. Poderia ter levado seus mocassins pretos
que precisam urgentemente de novos saltos.
melhor cuidar logo disso.
Os estudantes preencheram o lado
esquerdo da folha rpida e facilmente, mas
acharam o lado direito incomparavelmente
mais difcil. Quando a tarefa foi passada,
muitos perguntaram o quanto eu queria que
eles escrevessem. medida que eu
progressivamente impunha preciso,
clareza e distino, a tarefa ia se tornando
cada vez mais laboriosa. Finalmente,
quando pedi que eles presumissem que eu
saberia do que eles realmente estavam
falando, apenas lendo literalmente o que
eles escreveram literalmente, eles
desistiram de reclamar que a tarefa era
impossvel.
Embora suas reclamaes tivessem a
ver com a laboriosidade de se ter que
escrever mais, o frustrante mais no era composto do grande trabalho de ter que
reduzir uma montanha com baldes. Eles
no reclamavam que aquilo sobre o que se
falava consistia em contedos amarrados,
tornados to vastos pelo pedantismo, que
lhes faltaria tempo, fora, papel, garra,
bom senso suficientes para escrever tudo sobre o assunto. Ao invs disso, a reclamao e suas circunstncias pareciam
consistir no seguinte: se, para o que quer
que um estudante escrevesse, eu fosse
capaz de persuadi-lo de que aquilo no
estava ainda preciso, distinto ou claro o
bastante e se ele continuasse querendo
consertar a ambigidade, ento ele voltaria
tarefa com a reclamao de que a escrita
em si desenvolvia a conversa como uma
textura ramificada de questes relevantes.
A prpria maneira de realizar a tarefa
multiplicava suas caractersticas.
Que tarefa tinha eu passado para eles
que requeria que eles escrevessem mais, tal que a imposio progressiva de
preciso, clareza e literalidade tornava-a
cada vez mais difcil e finalmente
impossvel, e tal que a maneira de realizar
a tarefa multiplicava suas caractersticas?
Se um entendimento comum consistisse
em concordncia compartilhada sobre
questes substantivas, a tarefa deles teria
sido idntica de socilogos profissionais.
A tarefa teria sido resolvida, como a
soluo que socilogos profissionais esto
aptos a propor, como se segue:
Os estudantes iriam primeiro
distinguir entre o que foi dito e sobre o que
se estava falando, e ajustar os dois
contedos numa correspondncia entre
signo e referente. O que as partes disseram
seria tratado como uma verso esboada,
parcial, incompleta, mascarada, elptica,
escondida, ambgua ou enganosa do que as
partes falavam. A tarefa consistiria em
preencher o esboo do que foi dito. Aquilo
que foi falado consistiria em contedos
elaborados e correspondentes daquilo que
as partes disseram. Assim, o formato das
colunas da esquerda e da direita estaria de
acordo com o fato de que os contedos do que foi dito eram registrveis, ao se
escrever o que o gravador captasse. A
coluna da direita exigiria que algo mais fosse adicionado. Por ser o esboo do que foi dito o seu defeito, seria necessrio para
os estudantes que olhassem para algum
outro lugar diferente do que foi dito de
modo a (a) encontrar os contedos
correspondentes e (b) encontrar os
fundamentos para discutir porque eles precisariam discutir - a correo da
correspondncia. Por estarem relatando a
conversa real de pessoas especficas, eles
buscariam esses outros contedos naquilo
que os interlocutores tinham em mente, ou naquilo que eles estavam "pensando, ou naquilo em que acreditavam, ou o que eles tencionavam. Alm disso, eles precisariam ter certeza (algum precisaria
dar-lhes a certeza) de que haviam detectado
o que os interlocutores realmente, e no
-
suposta, hipottica, imaginada ou
possivelmente tinham em mente. Quer
dizer, eles precisariam citar aes
observadas maneiras observadas por meio das quais de modo a fornecer fundamentos para a reivindicao de
realmente. Essa segurana seria obtida buscando-se estabelecer a presena, no
relacionamento dos interlocutores, de
virtudes garantidoras tais como eles terem
falado honesta, aberta, cndida e
sinceramente, e outras coisas semelhantes.
Tudo isso para dizer que os estudantes
invocariam seus conhecimentos da
comunidade de entendimentos e seus
conhecimentos das concordncias
compartilhadas para indicar a adequao de
seus relatos do que as partes estavam
falando, ou seja, o que as partes entendiam
em comum. Ento, para qualquer coisa que
os estudantes escrevessem, eles poderiam
presumir que eu, enquanto co-membro
competente da mesma comunidade (as
conversas eram afinal de contas comuns),
deveria ser capaz de enxergar a
correspondncia e seus fundamentos. Se eu
no enxergasse a correspondncia ou se eu
compreendesse os contedos de forma
diferente da deles, ento, contanto que eles
pudessem continuar a presumir minha
competncia ou seja, contanto que minhas interpretaes alternativas no destrussem
meu direito de reivindicar que tais
alternativas precisavam ser levadas a srio
por eles e por mim os estudantes poderiam compreender que eu estava
insistindo para que me fornecessem
detalhamento mais refinado do que as
consideraes prticas pediam. Nesse caso,
eles teriam me acusado de pedantismo cego
e deveriam ter reclamado que, porque
"qualquer um pode enxergar quando, para todos os fins prticos, bastante o bastante,
ningum to cego quanto aqueles que no
querem enxergar.
Essa verso da tarefa deles explica a
razo de suas reclamaes de ter que
escrever mais". Isso tambm explica a razo da crescente laboriosidade, quando
clareza e coisas semelhantes foram
progressivamente impostas. Mas isso no
explica muito bem a razo da
impossibilidade final, pois explica uma
faceta da impossibilidade" da tarefa como a relutncia dos estudantes em ir adiante,
mas no explica o sentido concomitante,
qual seja, o de que os estudantes viam de
alguma forma que sua tarefa era, em
princpio, irrealizvel. Finalmente, essa
verso da tarefa deles no explica de forma
alguma a reclamao que faziam de que a
maneira de realizar a tarefa multiplicava
suas caractersticas.
Uma concepo alternativa da tarefa
pode nos servir melhor. Embora a
princpio possa parecer estranho faz-lo,
suponha que descartemos a suposio de
que, de modo a descrever um uso como
uma caracterstica de uma comunidade de
entendimentos, devamos logo de incio
saber em que os entendimentos comuns
substantivos consistem. Junto com isso,
descarte a teoria dos signos que
acompanha a suposio, de acordo com a
qual um signo e um referente so, respectivamente, propriedades de algo dito
e algo falado, e que, dessa forma prope
que signo e referente esto relacionados
como contedos correspondentes. Ao
descartar tal teoria dos signos, ns
descartamos tambm, por conseqncia, a
possibilidade de que uma concordncia
compartilhada sobre questes substantivas
explique seu uso.
Se essas noes forem descartadas,
ento aquilo sobre o que as partes falaram
no poderia ser distinguido de como as
partes estavam falando. Uma explicao
sobre o que as partes estavam falando
consistiria completamente, ento, em
descrever como as partes estavam falando;
em fornecer um mtodo para dizer o que
quer que deva ser dito, como falar usando
sinnimos, falar ironicamente, falar
metaforicamente, falar de forma crptica,
falar narrativamente, falar de uma maneira
questionadora ou como resposta, mentir,
explicar, jogar com as palavras, e todo o
resto.
Em vez de, e em contraste com, um
interesse pela diferena entre o que foi dito e
sobre o que foi falado, a diferena
-
131
apropriada entre o reconhecimento de uma
comunidade-lingstica de que uma pessoa
est dizendo algo, ou seja, de que estava
falando, de um lado, e de como estava, de
outro lado. Ento, o sentido reconhecido do
que uma pessoa disse consiste apenas e
completamente em reconhecer o mtodo de
sua fala, em ver como ela falou.
Sugiro que no se leia a coluna da
direita como contedos correspondentes da
coluna da esquerda, e que a tarefa dos
alunos de explicar o que os interlocutores
falaram no os envolva na elaborao dos
contedos do que os interlocutores disseram.
Sugiro, em vez disso, que suas explicaes
escritas consistiam em suas tentativas de me
instruir sobre como usar aquilo que as partes
disseram como um mtodo para enxergar o
que os interlocutores disseram. Sugiro que
eu tenha pedido aos estudantes para me
fornecer instrues para reconhecer o que as
partes estavam realmente e certamente
dizendo. Ao persuadi-los de interpretaes alternativas, ao insistir que havia ainda ambigidade, eu os persuadira de que eles
tinham demonstrado a mim apenas o que as
partes estavam supostamente, ou
provavelmente, ou imaginavelmente, ou
hipoteticamente dizendo. Eles entenderam
que isso queria dizer que suas instrues
estavam incompletas; que suas
demonstraes falharam na medida em que
suas instrues estavam incompletas; e que
a diferena entre reivindicaes de
realmente ou supostamente dependiam da completude de suas instrues.
Vemos agora qual foi a tarefa que
exigiu que ele escrevessem mais, que achassem que ela era cada vez mais difcil e,
finalmente, impossvel, e que se tornou
elaborada em suas caractersticas pelos
mesmos procedimentos empregados para
faz-la. Eu lhes havia passado a tarefa de
formular essas instrues de modo a torn-
las cada vez mais precisas, claras, distintas e, finalmente, literais, onde os
significados de cada vez mais e de clareza, preciso, distino, e literalidade
foram supostamente explicados em termos
das propriedades das instrues em si e
apenas das instrues. Eu havia solicitado
deles que aceitassem a tarefa impossvel de
reparar a incompletude essencial de qualquer conjunto de instrues, no
importando o quo cuidadosa ou
elaboradamente elas pudessem ter sido
escritas. Eu havia solicitado deles que
formulassem um mtodo que as partes
tinham usado ao falar como regras de
procedimento a seguir de modo a dizer
aquilo que as partes disseram, regras que
resistiriam a todas as exigncias de situao,
imaginao e desenvolvimento. Eu havia
pedido que descrevessem os mtodos de
falar empregados pelas partes como se esses
mtodos fossem isomrficos com aes em
estrita conformidade com a regra de
procedimento que formulou o mtodo como
questo passvel de instruo. Reconhecer o
que dito significa reconhecer como a
pessoa est falando, ou seja, reconhecer que
a esposa, ao dizer seus sapatos esto precisando urgentemente de saltos, estava falando narrativa, ou metafrica, ou
eufemisticamente, ou em sentido duplo.
Eles se defrontaram com o fato de
que a questo de como uma pessoa est
falando, a tarefa de descrever os mtodos
de fala de uma pessoa no satisfeito por,
e no o mesmo que, mostrar que o que
ela fala est de acordo com a regra de
demonstrar a consistncia,
compatibilidade e coerncia de
significados.
Para a conduta de seus afazeres
cotidianos, as pessoas tomam como dado
que o que dito ser compreendido de
acordo com mtodos que as partes usam
para compreender o que elas esto
dizendo em razo do seu carter claro,
consistente, coerente, compreensvel ou
engenhoso, ou seja, como sujeito a
alguma jurisdio de regras em uma palavra, como racional. Ver o sentido do que dito estar de acordo com o
carter de regra do que foi dito. Acordo compartilhado refere-se aos vrios mtodos sociais para lograr o
reconhecimento do membro de que algo
foi dito-de-acordo-com-uma-regra, e no
conforme um acordo demonstrvel sobre
questes substantivas. A imagem
-
apropriada de um entendimento comum ,
assim, uma operao, mais que a
interseo comum de conjuntos que se
sobrepem.
Uma pessoa fazendo sociologia, seja
sociologia leiga ou profissional, pode
tratar um entendimento comum como
dado concordncia compartilhada sobre
questes substantivas ao tomar como dada
que o que dito ser compreendido de
acordo com mtodos que no precisam ser
especificados, o que quer dizer que
precisam apenas ser especificados em
ocasies especiais. Dado o carter de descoberta
daquilo que o marido e a esposa estavam
falando, seu carter reconhecvel para
ambos acarretava o uso pelos dois e a
atribuio de um para o outro de trabalho
pelo qual o que era dito ou ter sido
entendido como tendo estado de acordo
com sua relao na interao como uma
regra invocvel de sua concordncia,
como um esquema gramatical utilizado
intersubjetivamente para analisar a fala
um do outro, cujo uso estabelecia que eles
iam entender um ao outro de forma que
eles seriam entendidos. Tal regra
estabelece que nenhum dos dois tinha o
direito de evocar o outro para especificar
como isso era feito; nem que um dos dois
podia reivindicar que o outro necessitava
de se explicar.
Em resumo, um entendimento comum,
acarretando tal como faz uma trajetria
temporal interna de trabalho interpretativo, necessariamente possui uma
estru