o sujeito, os contextos e a abordagem psicossocial para pessoas que...
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O SUJEITO, OS CONTEXTOS E A
ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
PARA PESSOAS QUE USAM
DROGAS
Eixo Políticas e Fundamentos
aberta.senad.gov.br
APRESENTAÇÃO
Neste módulo, discutiremos, a partir do sujeito que faz uso de álcool e de outras drogas, os
principais aspectos psicossociais que devemos considerar para melhor compreender a
problemática desse uso e as abordagens possíveis. Para isso, procuramos: (a) caracterizar a noção
de sujeito como um ser social e historicamente constituído; (b) explorar os componentes da
abordagem psicossocial do uso de substâncias psicoativas; (c) enfatizar a importância da família
como protagonista dessa realidade; (d) apresentar alguns meios de como abordar a família como
fator fundamental para essa compreensão; (e) situar, de forma geral, os impactos na família do
uso abusivo dessas substâncias; e (f) caracterizar o que seja rede social significativa e o papel da
comunidade nessa realidade, além de enfatizar a importância da reinserção social dos sujeitos
que fazem uso de álcool e de outras drogas.
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AUTORIA
Ileno Izídio da Costa
http://lattes.cnpq.br/5956172125060001
Doutor em Psicologia Clínica pela Universidade de Brasília (UnB).
Professor adjunto do Departamento de Psicologia Clínica da UnB e
coordenador de Projetos Especiais do Instituto de Psicologia, do Grupo
Personna, do Grupo de Intervenção Precoce nas Psicoses e do Curso de
Especialização em Saúde Mental, Álcool e outras Drogas da mesma
universidade. Presidente da Associação de Saúde Mental do Cerrado.
O SUJEITO, OS CONTEXTOS E A ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
O SUJEITO, OS CONTEXTOS E A ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
PARA PESSOAS QUE USAM DROGAS
SITUAÇÃO PROBLEMATIZADORA
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Figura 1: História em quadrinhos que retrata a história do personagem João e de outros sujeitos que cruzaram sua vida.
Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Após ler a história em quadrinhos até o final, você conheceu a história de João e de outros
sujeitos que formam sua rede familiar (sua mãe e seu irmão) e social (os seus colegas de rua, o
Antônio Carlos, que é redutor de danos, e a Regina, uma profissional da saúde).
Considerando esse contexto, procure refletir sobre os vários aspectos que fizeram parte da
história de João e que influenciaram a sua experiência com o uso de drogas.
O SUJEITO, OS CONTEXTOS E A ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
PARA PESSOAS QUE USAM DROGAS
O QUE É SUJEITO?
O conceito de sujeito é amplo. Podemos dizer que faz referência à pessoa em relação com o
mundo, ou seja, é um ser que tem consciência e experiências únicas, a partir de seu
relacionamento com outros seres; isto é, somos sujeitos em relação aos outros e às coisas
existentes no mundo, e aí se encontra o sentido de nossa existência.
A noção de sujeito faz referência à pessoa em relação ao mundo, ou seja, ao “ser” que
interage com a realidade (sujeito histórico), que pertence a um determinado espaço
(sujeito social) e que sofre e exerce influências culturais (sujeito cultural).
Figura 2: Representação das distintas dimensões que fazem parte da constituição do sujeito. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Um aspecto importante do sujeito é a sua relação com o seu próprio corpo, que tem uma
dimensão biológica dada, mas que, ao mesmo tempo, se organiza socialmente sobre a base das
emoções experimentadas em diferentes sistemas de relações – como as relações familiares, de
classe, etnia, gênero, entre outras. Assim, o corpo é, também, um histórico de relações do sujeito,
sendo, portanto, composto por aspectos sociais e culturais. Todo esse conjunto é capaz de
cultivar emoções que contemplam as relações de sua realidade.
Essa visão de sujeito sócio-histórico-cultural remete a diversos momentos da vida do sujeito, pois,
ao pertencer a um determinado espaço social – isto é, um contexto de vida –, ele também está
construindo sua própria condição existencial – ou seja, a maneira pela qual o sujeito se insere no
mundo.
Dessa maneira, sabe-se que, à medida que o sujeito se insere na sociedade, ele acrescenta um
pouco mais à sua história pessoal e constitui-se, cada vez mais, sujeito atuante e participante de
sua própria subjetividade.
SUJEITO E SUBJETIVIDADE
SUJEITO E SUBJETIVIDADE
Sujeito e subjetividade são temas que não se separam. A subjetividade caracteriza-se pela
possibilidade de os sujeitos, por meio das várias formas de expressão, concretizarem sua
condição humana, a partir das experiências vividas, seus significados e sentidos, definidos no
contexto do espaço psicossocial em que se constituem.
O sujeito, então, é um agregado de relações sociais. A conversão das relações sociais em sujeito
social se faz por meio da diferenciação e da apropriação que ele realiza do que foi partilhado com
os outros, tornando-se um ser singular, ao mesmo tempo que troca experiências com os outros.
Assim, também podemos falar em subjetividade social.
Momento Cultural
A música Mistério do Planeta foi escrita por Luiz Galvão e Moraes Moreira, ambos
integrantes do grupo Os Novos Baianos, banda de sucesso no Brasil entre as
décadas de 60 e 70. A música foi lançada em 1972, no álbum Acabou Chorare, e
sua letra aborda um tema muito interessante e importante para este módulo: a
questão do sujeito. Já no título da canção podemos perceber que esse não é
assunto fácil – um mistério do planeta. A noção de sujeito nos permite
compreender a complexidade da vida em sociedade, apontando para a
necessidade de percebermos que tanto somos constituídos pela sociedade e
pelas relações sociais e culturais quanto somos protagonistas nesses processos.
Mistério do Planeta (http://www.vagalume.com.br/os-novos-baianos/misterio-do-
planeta.html#ixzz44ZxCCpQI)
Vou mostrando como sou e vou sendo como posso.
Jogando meu corpo no mundo,
andando por todos os cantos
e pela lei natural dos encontros,
eu deixo e recebo um tanto.
E passo aos olhos nus ou vestidos de lunetas.
Jamy Gomes de Melo Novos Baianos Mistério do Planeta Compartilhar
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Passado, presente,
participo sendo o mistério do planeta.
O tríplice mistério do stop,
que eu passo por e sendo ele no que
fica em cada um.
No que sigo o meu caminho
e no ar que fez e assistiu.
Abra um parênteses,
não esqueça que independente disso
eu não passo de um malandro.
De um moleque do Brasil,
que peço e dou esmolas.
Mas ando e penso sempre com mais de um,
por isso ninguém vê minha sacola.
Fonte: Novos Baianos (1972).
A subjetividade, vista dessa forma, é compreendida como um processo de produção no qual
existem múltiplos componentes, resultantes da apreensão que o ser humano realiza,
permanentemente, a partir de diversos elementos do contexto social. Nesse sentido, valores,
ideias e significados ganham um registro singular, tornando-se matéria-prima para a expressão
dos afetos vividos e base para os relacionamentos interpessoais e vínculos de redes psicossociais.
O sujeito, a partir das relações que vivencia no mundo, produz significações que lhe permitem
singularizar os objetos coletivos. Assim, todo processo de construção do sujeito é realizado na
relação com os grupos e redes sociais. Inserido nesse cenário de múltiplas singularidades que se
entrecruzam, o sujeito, ao realizar sua história, também realiza a dos outros, sendo, por isso,
produto e produtor da sociedade e participante ativo de seu tempo.
O ser humano e seu projeto de vida possuem uma origem e uma finalidade, e a sociedade
apresenta os limites e as possibilidades – culturalmente construídos para ordenar a realidade – de
elaboração e de construção desse projeto.
O projeto de vida deve considerar as expectativas do sujeito em relação ao seu futuro e às suas
possibilidades reais, enfatizando as escolhas pessoais na definição das estratégias para atingir
esse futuro e assumindo a responsabilidade pelas decisões e comportamentos adotados.
No vídeo a seguir, produzido para a 6ª Edição do Curso Prevenção dos Problemas Relacionados ao
Uso de Drogas – Capacitação para Conselheiros e Lideranças Comunitárias – 2014, o psiquiatra
Jairo Bouer entrevista o Prof. Dr. Ileno Izídio da Costa. Nele, você perceberá a importância de
compreendermos o sujeito, a fim de podermos propiciar um tratamento adequado aos problemas
relacionados ao uso de drogas.
https://www.youtube.com/watch?v=zHxk5ZF4Dmk
O SUJEITO, OS CONTEXTOS E A ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
PARA PESSOAS QUE USAM DROGAS
POR UMA ABORDAGEM PSICOSSOCIAL
A abordagem psicossocial compreende que a nossa história de vida é marcada pelas relações em
rede, cujas estruturas social e familiar, bem como as experiências culturais, manifestam-se no dia
a dia, constituindo o sujeito em sua totalidade, que afeta o mundo e por ele é afetado. Essa
abordagem enfatiza a interação e a interdependência dos fenômenos biopsicossociais e busca
pesquisar a natureza dos processos dinâmicos do homem em sua vivência cotidiana. Contempla,
portanto, articulações entre o que está na ordem da sociedade e o que faz parte da subjetividade,
do psíquico, concebendo o sujeito na multidimensionalidade da vida, na qual estão envolvidos
aspectos de interação entre o físico, o psicológico, o ambiente natural e o social.
Nessa perspectiva, as relações do sujeito com suas redes familiar e comunitária passam a ocupar
um lugar privilegiado, convocando os atores sociais envolvidos a participarem da compreensão
dos processos em que estão inscritos e a se responsabilizarem pela transformação do seu
entorno. Assim, uma ação psicossocial tenta compreender a complexidade do ser humano em
seus processos de troca e no desenvolvimento de ligações baseadas nas experiências construídas
individual e coletivamente.
Figura 3: Representação das distintas configurações familiares e suas relações. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Essa prática, que se volta para o sofrimento ou para os problemas decorrentes da dimensão
psicossocial, ressalta ações dirigidas à atenção ao usuário, em uma perspectiva integral, o que
requer o questionamento de posições reducionistas, voltadas somente para as intervenções
bioquímicas e direcionadas às perspectivas da doença do usuário.
Assim, o cuidado essencial com o ser humano deve ser fundamentado em uma visão que supere
as dicotomias corpo/mente, sujeito/objeto, saúde/doença, individual/social e outras tantas
cisões, configurando-se como uma prática apoiada em perspectivas em que a
interdisciplinaridade seja um desafio constante.
Para que possamos especificar melhor a complexidade envolvida na abordagem psicossocial,
destacamos três dimensões fundantes: a família, a comunidade e a rede social.
A família é a unidade básica da sociedade, formada por sujeitos com ancestrais em
comum ou ligados por laços afetivos. É a primeira referência da pessoa, mediadora entre
o sujeito e a sociedade. É onde aprendemos a perceber o mundo e a nos situarmos nele. É
um dos grupos responsáveis por nossa formação pessoal.
Saiba Mais
Você sabia que o termo família é derivado do latim famulus, que significa escravo
doméstico? Esse termo foi criado na Roma Antiga para designar um novo grupo social
que surgiu entre as tribos romanizadas, ao serem introduzidas na agricultura e também
na escravidão legalizada.
Famulus: que serve, lugar em função de.
Fa-ama: casa.
Famulo: do verbo facere, que faz, que serve.
A partir da década de 1960, a família passou por muitas modificações: o número de separações e
divórcios aumentou; a religião foi perdendo sua força, não mais conseguindo segurar casamentos
com relações insatisfatórias; a igualdade passou a ser um pressuposto em muitas relações
matrimoniais.
No século XXI, costuma-se falar da “crise da instituição família”. Não se trata, porém,
propriamente do enfraquecimento da instituição família, mas de inúmeras transformações que
ela vem sofrendo em sua interioridade, em função de mudanças socioculturais contemporâneas:
novas relações entre os sexos, maior controle da natalidade e a inserção massiva da mulher no
mercado de trabalho; ao mesmo tempo, o homem aprendeu a ser mais cuidadoso nas relações
familiares e nos trabalhos domésticos. Veja, no infográfico a seguir, alguns dados acerca das
atuais configurações familiares no Brasil que apareceram no Censo 2010.
Figura 4: Dados acerca das diversas possibilidades de configuração de lares brasileiros. Fonte: IBGE (2010), adaptado por
NUTE-UFSC (2016).
Houve, também, mudanças referentes aos relacionamentos entre casais separados e recasados,
superação de preconceitos em relação à homossexualidade, entre outros aspectos, que levaram à
constituição de diferentes configurações familiares.
Figura 5: Imagem que ilustra as diversas configurações familiares. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
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FORMAS DE CONHECER (MAPEAR) A FAMÍLIA
Para conhecer a família, é importante compreender como foi constituída na sua história. Nesse
sentido, é essencial buscar conhecer as pessoas que fazem parte da sua formação, a comunidade
e a rede social das quais ela faz parte e como se dão essas relações. Quando conseguimos analisar
todo esse contexto, várias ações desses indivíduos podem ser compreendidas. Abordaremos, a
seguir, instrumentos que auxiliam no levantamento dessas informações.
Genograma
Genograma
Genograma é a representação gráfica da família na qual são apresentados seus diferentes
membros e gerações, o padrão de relacionamento estabelecido entre eles e suas principais
relações; ou seja, ilustra a organização e a disposição de componentes que se inter-relacionam de
maneira particular e recorrente. Desse modo, a estrutura familiar compõe-se de um conjunto de
sujeitos com condições, posições e interação particulares.
Figura 6: Representação das diferentes relações entre membros de uma família. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Ecomapa
Ecomapa é o diagrama das relações entre a família e a comunidade. Ele nos auxilia a avaliar os
apoios e suportes disponíveis e a utilização deles pela família. Representa a força, o impacto e a
qualidade de ligação entre a família e a comunidade, ou rede, como veremos adiante.
O Ecomapa fornece uma visão ampliada da família, uma vez que desenha a estrutura de
sustentação e retrata a ligação dela com o mundo. Esse instrumento demonstra, portanto, a
conexão das circunstâncias do meio ambiente com o vínculo entre os membros familiares e os
recursos comunitários.
Figura 7: Representação das distintas relações entre familiares e demais redes sociais (como amigos, instituições, entre
outras). Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Mapa de Rede
É o campo relacional total do sujeito. A rede social integra todas aquelas pessoas que o sujeito
reconhece e qualifica como significativas. O mapa de redes expressa, de forma gráfica, as relações
de proximidade entre as redes sociais significativas do sujeito, expressando a presença ou
ausência do apoio social. Pode ser um ótimo instrumento para a intervenção no diagnóstico de
situações e de intervenções no campo psicossocial, em especial nos problemas relacionados ao
uso de álcool e de outras drogas.
Figura 8: Representação do caminho de relações que o sujeito estabelece/pode estabelecer em sua
comunidade. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Numa abordagem sistêmica, defende-se que a família exerce, por exemplo, uma importante
função para o sujeito que faz uso problemático de álcool e de outras drogas. Ela se organiza de
modo a atingir um equilíbrio dentro do sistema, mesmo que, para isso, inclua a codependência
entre os sujeitos envolvidos.
Sabemos que a família desempenha papel fundamental não só na relação com seus membros
mas também na relação com o Estado, na perspectiva de instituição social decisiva para o
desenvolvimento do processo de integração/inclusão social de seus membros.
Figura 9: Apresentação de conceitos que explicam os diversos sistemas de relações dos sujeitos. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Assim, a família, por meio da construção da autonomia e da independência de seus membros,
deve favorecer a formação de um sujeito capaz de organizar sua própria vida e responsabilizar-se
por suas relações sociais, fortalecendo a manutenção de laços afetivos já existentes e formando
novos laços.
A família é muito importante na construção de qualquer processo de compreensão do usuário e
de intervenção na sua realidade, e deve ser incluída, desde o começo, em todas as ações em
saúde. Torna-se, pois, fundamental conhecê-la em suas potencialidades e fraquezas, suas redes e
suas determinações para o levantamento das possibilidades de mudanças. Assim, a família
deveria ser protagonista de todo o processo de acompanhamento do sujeito.
Por intermédio da consideração familiar, torna-se possível dar atenção às angústias de todos os
membros e oferecer informações fundamentais para se compreender, de modo mais abrangente,
o sofrimento do sujeito usuário de drogas, assim como o de cada um que constitui esse grupo
social. Saber abordar, avaliar, acompanhar e tratar a família torna-se, portanto, imperioso.
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PARA PESSOAS QUE USAM DROGAS
A FAMÍLIA E O CONTEXTO DE USO E ABUSO DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS
O impacto que a família sofre com o uso problemático de álcool e de outras drogas por um de
seus membros é correspondente às reações que vão ocorrendo com o sujeito que as utiliza.
Podemos resumir esse impacto por meio de quatro estágios pelos quais a família passa,
progressivamente.
Figura 10: Representação do impacto que a família sofre com o uso problemático de álcool e de outras drogas. Fonte: NUTE-
UFSC (2016).
1. Mecanismo de negação, tensão e desentendimento. As pessoas deixam de falar sobre o que
realmente pensam e sentem em relação ao problema do uso de substâncias psicoativas.
2. A família demonstra muita preocupação com essa questão e tenta controlar o uso da
substância, bem como as suas consequências físicas e emocionais no campo do trabalho e no
convívio social. Mentiras e cumplicidades relativas ao uso problemático de álcool e outras drogas
instauram um clima de segredo familiar. A regra é não falar do assunto, mantendo a ilusão de que
as drogas e o álcool não estão causando problemas na família.
3. A desorganização da família começa a ocorrer. Seus membros assumem papéis rígidos e
previsíveis. Os familiares assumem responsabilidades de atos que não são seus. Assim, o usuário
problemático perde a oportunidade, muitas vezes, de perceber as consequências do abuso de
álcool e de outras drogas.
É comum ocorrer uma inversão de papéis e funções; por exemplo, a esposa passa a assumir todas
as responsabilidades da casa em decorrência do alcoolismo do marido, ou a filha mais velha
passa a cuidar dos irmãos em consequência do uso de álcool e outras drogas por parte da mãe.
4. Exaustão emocional. Nessa fase, é comum o surgimento de graves distúrbios de
comportamento e de saúde em vários membros da família. A situação fica insustentável, levando
ao afastamento dos membros e gerando rupturas familiares.
É fundamental que as famílias sejam incluídas em diferentes processos de atenção
psicossocial – promoção da saúde
(http://www.aberta.senad.gov.br/modulos/capa/promocao-da-saude-no-contexto-
dos-problemas-relacionados-ao-uso-de-drogas) e cuidado
(http://www.aberta.senad.gov.br/modulos/capa/o-cuidado-ao-usuario-de-drogas-
na-perspectiva-da-atencao-psicossocial) e incentivadas em seu protagonismo.
Para Pensar...
Lembre-se de que, embora tais estágios definam um padrão da evolução do
impacto das substâncias, não se pode afirmar que, em todas as famílias, o
processo será o mesmo. Indubitavelmente, porém, existe uma tendência de os
familiares se sentirem culpados e envergonhados por terem um de seus membros
nessa situação. Muitas vezes, devido a esses sentimentos, a família demora muito
tempo para admitir o problema e procurar ajuda externa e profissional, o que
corrobora com o agravamento e o desfecho do caso.
A família e o contexto cultural são fatores importantes na determinação do padrão do consumo
de álcool e de outras drogas. Há várias evidências de que os padrões culturais têm papel
significativo no desenvolvimento dos problemas relacionados ao uso dessas substâncias. As
culturas que, por exemplo, seguem rituais estabelecidos de onde, quando e como beber têm
menores taxas de uso abusivo de álcool, se comparadas àquelas culturas que simplesmente
proíbem seu uso. Assim, o que é ou não socialmente aceitável depende das características da
família e da comunidade em questão – seus valores, sua cultura (o álcool não é socialmente
aceitável em comunidades muçulmanas, por exemplo) – e não necessariamente do risco que a
droga representa em si mesma.
COMUNIDADE: UMA ABORDAGEM NECESSÁRIA
“Comunidade”, do latim communitas, pode ser definida em função dos laços de parentesco,
localização geográfica, constituição territorial, interesses políticos, crença religiosa, composição
étnica, características físicas ou problemas de saúde ou de saúde mental compartilhados por uma
coletividade.
O conceito de comunidade engloba não somente o conjunto de pessoas que a formam,
mas também as complexas relações sociais que existem entre seus membros, o sistema
de crenças que professam e as normas sociais que a regem. Exatamente por isso, a
apreciação da singular complexidade de cada comunidade é essencial para a
compreensão dos sujeitos que nela se inscrevem e, consequentemente, de como as
pessoas tomam decisões que afetam sua saúde e seu bem-estar.
REDES SOCIAIS SIGNIFICATIVAS
O homem, como ser social, estabelece sua primeira rede de relação no momento em que vem ao
mundo. A interação com a família, como vimos, confere-lhe o aprendizado e a socialização, que se
estendem para outras redes sociais. É pela convivência com grupos e pessoas que se moldarão
muitas das características pessoais determinantes da identidade social de um indivíduo. Surgem,
nesse contexto, o reconhecimento e a influência dos grupos como elementos decisivos para a
manutenção do sentimento de pertencimento e de valorização pessoal.
Todo sujeito carece de aceitação, e é na vida em grupo que ele irá externar e suprir essa
necessidade. Os vínculos estabelecidos tornam-se intencionais, definidos por afinidades e
interesses comuns. Nesse sentido, o grupo passa, então, a influenciar comportamentos e atitudes,
funcionando como ponto em uma rede de referências composta por outros grupos, pessoas ou
instituições, cada qual com uma função específica na vida da pessoa.
Figura 11: Representação das relações mais próximas e significativas do sujeito. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Rede social significativa é o conjunto de relações interpessoais concretas que vinculam
sujeitos a outros sujeitos, tecendo laços de reciprocidade e cooperação. Esse conceito
vem se ampliando dia a dia, à medida que se percebe o poder da cooperação como
atitude que enfatiza pontos comuns em um grupo para gerar solidariedade e parceria.
Na análise de redes sociais, a função do apoio e/ou suporte social é central para se pensar
processos de intervenção psicossocial, pois descreve o conjunto de pessoas que oferecem ajuda e
apoio, de forma real e duradoura, ao sujeito ou à família.
Assim, pensar em apoio social remete às relações pessoais significativas, constituídas em forma
de redes.
Glossário
Suporte social é uma forma de relacionamento interpessoal, grupal ou comunitário, que
fornece ao sujeito um sentimento de proteção e apoio, capaz de propiciar redução do
estresse e favorecer o bem-estar psicológico.
Figura 12: Representação de dois aspectos do apoio social: as relações primárias e as relações secundárias. Fonte: NUTE-
UFSC (2016).
REINSERÇÃO SOCIAL
REINSERÇÃO SOCIAL
Para entendermos o processo de reinserção, ou reintegração social, é necessário que nos
reportemos ao conceito de exclusão. Como já citado anteriormente, exclusão é o ato pelo qual
alguém é privado ou excluído de determinadas funções. A exclusão social implica, pois, uma
dinâmica de privação por falta de acesso aos sistemas sociais básicos, como família, moradia,
trabalho formal ou informal, saúde, entre outros.
A reinserção assume o caráter de reconstrução das perdas, e seu objetivo é a capacitação da
pessoa para exercer em plenitude o seu direito à cidadania. O exercício da cidadania para o
sujeito em tratamento significa o estabelecimento ou o resgate de uma rede social comprometida
devido ao uso problemático da droga. Nesse cenário, focar somente na abstinência da droga
deixa de ser o objetivo maior do tratamento, pois a maior dificuldade do dependente é
justamente não conseguir interromper o uso, geralmente relacionado à sua situação de
vulnerabilidade, decorrente da fragilidade de seus vínculos sociais. Assim, a reinserção social
torna-se, nesse milênio, o grande desafio para o profissional que se dedica à área do uso
problemático de álcool e de outras drogas.
O processo de reinserção começa com a avaliação social, momento em que se mapeia a vida do
sujeito em aspectos significativos que darão suporte à retomada de seu projeto originário ou à
construção de um novo projeto de vida.
Figura 13: Ilustrações referentes à reinserção social em distintos ambientes e atividades: trabalho, casa, lazer,
esporte. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Faz-se necessário, por isso, assumir uma postura de acolhimento do sujeito, na qual a atitude
solidária e a crença na capacidade de ele construir e/ou restabelecer sua rede social irão
determinar o estabelecimento de um vínculo positivo, isto é, uma parceria na qual a porta para a
ajuda estará sempre aberta, desde que o trânsito seja de mão dupla.
Assim, devemos entender a reinserção social como um processo longo e gradativo, que implica,
inicialmente, a superação dos próprios preconceitos, nem sempre explícitos.
Os assuntos individuais e sociais de maior relevância no contexto do sujeito devem ser discutidos
abertamente, com o objetivo de estimular uma consciência social mais participativa, resgatando
a sua autoestima.
No site do Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas (OBID), você encontrará
diversas pesquisas, cartilhas e materiais relacionados ao tema das drogas.
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Síntese Reflexiva
Neste módulo, você pôde ver como a noção de sujeito é um tema complexo e amplo,
mas muito importante para compreender as especificidades e singularidades das
vivências de cada um na relação com o mundo e, assim, pensar conjuntamente em
estratégias de intervenção condizentes com cada situação que, de fato, se
proponham a integrar socialmente os usuários. Vimos, ainda, como é importante
compreendermos as noções de sujeito e contexto de maneira complementar e
relacional, entendendo as diversas determinações que designam a vida de um
usuário de drogas. É nesse sentido que a abordagem psicossocial se destaca e
fundamenta processos de atenção nos quais o usuário passa a ser protagonista do
seu processo de cuidado, sempre articulado com suas redes de relações – família,
comunidade e demais relações significativas.
Vamos, então, refletir: por que muitas das ações de prevenção e tratamento, na
atualidade, ainda continuam a se pautar em uma visão reducionista, focando sua
ação na substância e na repressão ao uso? Você vê aí uma contradição com o que
aprendeu neste módulo?
REFERÊNCIAS
Textos
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Imagens
GOELDI, O. Chuva. 1957. 1 xilogravura, color 2/12, 22 cm x 29,5 cm. Acervo: Coleção Frederico
Mendes de Morais. 1 fotografia digitalizada por Centro Virtual Goeldi, color. Altura: 600 pixels.
Largura: 779 pixels. 72 dpi. 207 KB. Formato JPEG. In: CENTRO VIRTUAL GOELDI [on-line]. Rio de
Janeiro: [s.n.], 2015. Disponível em:
<http://www.centrovirtualgoeldi.com/img_bd/000232_G.jpg
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Músicas
GALVÃO, L. MORAES, M. Mistério do Planeta. In: NOVOS Baianos. Acabou Chorare. Salvador: Som
Livre, 1972. 1 LP. Faixa 1, lado 2. Disponível em: <http://www.vagalume.com.br/os-novos-
baianos/misterio-do-planeta.html#ixzz44ZxCCpQI (http://www.vagalume.com.br/os-novos-
baianos/misterio-do-planeta.html#ixzz44ZxCCpQI>)>. Acesso em: 23 maio 2016.
Vídeos
CURSO Prevenção dos Problemas Relacionados ao Uso de Drogas: Capacitação para Conselheiros
e Lideranças Comunitárias. 6. ed. Entrevista com o Prof. Dr. Ileno Izídio da Costa. Entrevistador:
Jairo Bouer. Produção: Núcleo Multiprojetos de Tecnologia Educacional da Universidade Federal
de Santa Catarina. Florianópolis: NUTE-UFSC, 2014. 1 vídeo (12min), son. color.