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OBZ - a solução adequada para os municípios financeiramente desequilibrados,
em contexto de SNC – AP
Francisco José Alveirinho Correia, CC n.º 41 270
Área Temática: Contabilidade Orçamental
Palavras chave: orçamento base zero, contabilidade pública, finanças locais, plano oficial de
contabilidade das autarquias locais, sistema de normalização contabilístico para as administrações
públicas.
Metodologia de investigação usada: M8 Other
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Resumo
Glossário
Introdução
1 – Enquadramento
2 – O que é o OBZ
2.1 – Conceito
2.2 – Pontos fortes e fracos
2.3 – Requisitos para a sua implementação
2.4 – Limitações na sua aplicação
3 – Municípios financeiramente desequilibrados - principais práticas adotadas
3.1 – A nível do sistema contabilístico
3.1.1 – Regras previsionais
3.1.2 – Compromissos anos futuros
3.2 – A nível das finanças locais
3.2.1 – O sistema financeiro
3.2.2 – Endividamento
4 – Discussão da solução de aplicabilidade do OBZ em contexto SNC-AP
4.1 – O estado da matéria
4.2 – A ineficácia dos mecanismos adotados
4.3 – O OBZ e os municípios financeiramente desequilibrados
4.4 – O impacto e as exigências do SNC-AP
5 – Conclusões
6 – Referências Bibliográficas
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Resumo
O Orçamento Base Zero (OBZ), consubstanciado num processo orçamental, de utilização cíclica,
ignorando o passado, constitui uma ferramenta de gestão virada para resultados, visando a redução de
custos e estruturas, permite a eliminação de ineficiências e sobreposições, fomenta a transparência e
favorece a comunicação e a “accountability” e, bem assim, pode servir de elo motivador na administração
autárquica para os intervenientes no processo, apesar das experiências públicas negativas de insucesso e
de abandono desta técnica já registadas.
Durante os últimos 40 anos, na Administração Autárquica vigoraram três sistemas contabilísticos e seis
leis das finanças locais, sendo hoje inquestionáveis os aspetos positivos decorrentes dos referidos
sistemas. Todavia, algumas das suas fragilidades, aliadas a muita imprudência financeira, a uma onda
despesista cíclica eleitoral e à inobservância de algumas regras e procedimentos contabilísticos,
conduziram vários municípios a uma situação de forte desequilíbrio financeiro, até mesmo de “falência
técnica”. Não obstante a criação nos últimos 10 anos de vários mecanismos legais, com clara intenção
corretiva e de apoio financeiro, esses municípios ainda não conseguiram inverter a situação, limitando-
se a gerir os pagamentos em atraso e a procurar diminuir o nível de endividamento, sem que se vislumbre
o tão almejado equilíbrio financeiro.
Com a adoção próxima do Sistema de Normalização Contabilístico para as Administrações Públicas
(SNC – AP), suas exigências ao nível da uniformização de procedimentos e do aumento da fiabilidade
da consolidação de contas, a imposição legal do OBZ a esses municípios, devidamente regulamentada
no quadro do atual regime jurídico de finanças locais, poderia constituir, por um lado, um caso de
sucesso, contrariando assim algumas experiências internacionais, ao mesmo tempo que poderia constituir
um verdadeiro ensaio, que poderia ser estendido, com sucesso e, no futuro, a outros setores da
administração pública e, por outro lado, um instrumento facilitador da implementação segura e adequada
do SNC-AP, designadamente em matéria de contabilidade e relato orçamental e do cumprimento da
LCPA.
Palavras chave: Orçamento base zero, contabilidade pública, finanças locais, plano oficial de
contabilidade das autarquias locais, sistema de normalização contabilístico para as administrações
públicas
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Abstract
The Zero Based Budgeting (ZBB), embodied in a budget process, of cyclic use, ignoring the past,
constitutes a management tool seeking for results, aiming at the reduction of costs and structures, allows
the elimination of inefficiencies and superposition, fosters transparency, “accountability” and
communication, and may also serve as the motivating link to those who are involved in this process,
despite the negative experiences of failure and abandonment already registered with this model.
During the last 40 years, three accounting systems and six laws on local finances were in force in Local
Government, being unquestionable nowadays the positive aspects arising from such systems. However,
some of its weaknesses, combined with a lot of financial recklessness, to a electoral cyclical spender
wave and failure to comply with certain rules and accounting procedures led several municipalities to a
strong financial imbalance and even on a "technical failure" status. Despite the creation, in the last 10
years, of various legal mechanisms, with clear corrective intention and financial support, these
municipalities have failed to reverse the situation and continue managing merely late payments and
seeking to reduce the level of debt, without a glimpse of the much desired financial equilibrium.
With the upcoming adoption of the Accounting Normalization System for Public Administrations (SNC
-AP), and their requirements in terms of standardization of procedures and the increasing of the reliability
of the consolidated accounts, the legal imposition of ZBB on these municipalities, properly regulated
under the current legal system of local finance, could be on the one hand, a case of success, thus
contradicting some international experience at the same time it could be a real test, which could be
extended, and successfully, in the future, to other sectors of public administration and, on the other hand,
an instrument facilitating the safe and proper implementation of the SNC-AP, in particular what concerns
accounting and financial reporting and compliance with the Law of Commitments and Delayed Payments
(LCPA).
Keywords: zero-based budgeting, public accounting, local finance, official plan of accounting of local
government, accounting normalization system for public administrations.
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Glossário
AMR – Ações Mais Relevantes
CRP – Constituição da República Portuguesa
DGAL – Direção Geral das Autarquias Locais
EUA – Estados Unidos da América
FAM – Fundo de Apoio Municipal
IGF – Inspeção Geral de Finanças
IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis
IRS – Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares
GOP – Grandes Opções do Plano
LCPA – Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso
LEO – Lei de Enquadramento Orçamental
LOE – Lei do Orçamento de Estado
OBZ – Orçamento Base Zero
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
OE – Orçamento do Estado
PAEL – Programa de Apoio à Economia Local
PIB – Produto Interno Bruto
POCAL – Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais
POCP – Planos Oficial de Contabilidade Pública
PPTH – Programa Pagar a Tempo e Horas
PPI – Plano Plurianual de Investimentos
PREDE – Programa de Regularização Extraordinária das Dívidas do Estado
RAFE – Regime de Administração Financeiro do Estado
RFALEI – Regime Financeiro das Autarquias Locais e Entidades Intermunicipais
RJAEL – Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local e das Participações Locais
SNC-AP – Sistema de Normalização Contabilístico para as Administrações Públicas
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Introdução
O presente trabalho técnico, focado no âmbito do processo orçamental municipal, visa aferir sobre a
aplicabilidade e respetiva viabilidade do OBZ, aos cerca de 33 municípios que atualmente se encontram
ainda financeiramente desequilibrados. Apesar dos pontos fortes e fracos desta “filosofia” orçamental,
tentar-se-á demonstrar as suas virtudes e vantagens, num contexto de latente endividamento legal, que
teimosamente tem persistido, não obstante a criação de vários mecanismos tendentes ao equilíbrio
financeiro.
Assim, após um breve enquadramento no ponto 1, onde são abordados de uma forma muito breve o OBZ
e a existência de muitos municípios desequilibrados financeiramente, segue-se o ponto 2, que desenvolve
de uma forma mais pormenorizada, com vista a perceber-se a técnica, os pontos fortes e fracos, os
requisitos para a sua implementação e limitações do OBZ. Em seguida, no ponto 3, enumeram-se as
causas determinantes do desequilíbrio financeiro dos municípios, quer em sede do sistema contabilístico,
especialmente em relação aos compromissos de anos futuros e regras previsionais, quer a nível da lei das
finanças locais, designadamente em matéria de financiamento e dos limites legais ao endividamento.
Em contexto de uma próxima adoção do SNC-AP, no ponto 4, é apresentada a discussão de uma solução
baseada na aplicabilidade do OBZ aos municípios financeiramente desequilibrados, o estado atual da
matéria, a ineficácia dos mecanismos legais criados nos últimos dez anos, é também abordada, ainda que
de uma forma breve, colocando toda a pertinência num exercício “base zero”, por forma à adoção de um
adequado controlo de gestão e, concomitantemente, à redução da despesa desses municípios.
A terminar, no ponto 5, são apresentadas umas breves conclusões sobre a temática abordada, seguindo-
se-lhe a bibliografia consultada.
1 – Enquadramento
O OBZ foi criado em 1969, nos Estados Unidos da América (EUA), mais concretamente na Texas
Instruments, por Pyhrr (1981), no âmbito da racionalização da gestão. Esta ferramenta de gestão,
consubstanciada numa técnica orçamental, tem vido a ser aplicada quer no sector privado, quer no sector
público, mostra-se ao nível do seu conteúdo técnico, muito mais restrita do que noutros sistemas, porque
se limita quase exclusivamente à hierarquização seletiva da alocação de recursos e à sua quantificação
orçamental.
Focada em resultados, pretende assim romper com o passado e eliminar a prática habitual da técnica do
incrementalismo, adotada quase sempre de forma automática, em especial, em sede de despesas correntes
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(funcionamento). Poder-se-á mesmo afirmar que o OBZ tem subjacente uma alteração substancial no
ajustamento do processo orçamental e do orçamento, à real capacidade de recursos disponíveis, sejam
eles de natureza financeira, material ou humana.
Perfeitamente delimitado às funções planeamento e execução orçamental, o OBZ estratifica o orçamento
em funções, projetos e ações com vantagens para os municípios, enfatizando estudos, atividades e
investimentos, analisando-os de forma individual e isolada, na medida em que permite a elaboração de
pacotes de decisões que são objeto de discussão e possibilitam a sua avaliação económico-financeira de
forma individual para cada uma das atividades e funções. Viabiliza e fomenta não só uma correta tomada
de decisões ao nível estratégico, mas também adequadas políticas de trabalho ao menor custo possível,
porquanto permite conhecer com precisão os encargos legais, éticos e sociais, na medida em que também
personaliza as atividades futuras, define os métodos de trabalho e permite, assim, a oportunidade de
ajustar os municípios à satisfação das necessidades locais.
Por outro lado, os autarcas passam a ser adequadamente responsabilizados e avaliados, situação vista
num contexto de órgão colegial e equipa, podendo constituir um estímulo bastante positivo para os eleitos
que, ao acompanharem a sua execução e através da comparação entre o previsto e o realizado, lhes
permite uma rápida alteração e modificação em tempo oportuno e de forma mais adequada.
O OBZ posiciona-se assim como uma ferramenta de planeamento que pode proporcionar aos autarcas
uma razoável segurança, no exercício rigoroso de escolhas de novas soluções não descurando os riscos
inerente e a responsabilidade subjacente.
Por outro lado, a problemática dos municípios desequilibrados financeiramente tem sido objeto de
discussão no seio do Poder Local, no sentido de se encontrarem as justificações tendentes a compreender
o seu percurso gestionário, em sede do sistema de informação contabilístico e da Lei das Finanças Locais,
suas decisões controversas, erros de gestão, imprudências, irregularidades, práticas orçamentais
inadequadas e procedimentos sem observância das leis, princípios e regras vigentes.
Também a independência orçamental e a submissão ao princípio da tutela de legalidade, meramente
inspetiva, aliada a uma insuficiência de receitas, para fazer face a volumoso valor de despesas, têm tido
forte impacto e grandes implicações no estrito cumprimento, designadamente dos sucessivos regimes
legais de endividamento.
Ao longo destas últimas quatro décadas o poder local viu publicar seis Leis das Finanças Locais. Se as
primeiras quatro, regulamentando a capacidade de endividamento quer a curto, quer a médio prazos,
colocaram o enfoque no incentivo ao investimento através do recurso ao endividamento, as duas mais
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recentes (2007 e 2013), centraram-se no endividamento líquido, passando a relevar as limitações ao
endividamento, sendo de salientar que os limites legais estabelecidos nunca estiveram diretamente
relacionados com o nível das receitas municipais, em especial as arrecadadas.
De salientar que os municípios portugueses, à semelhança dos governos locais dos países da Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), estão sujeitos a regras de disciplina
orçamental, como seja, a do equilíbrio orçamental e dos limites à despesa, à orçamentação da receita, ao
endividamento e à autonomia fiscal1. Em matéria de receita, embora não exista qualquer limitação, tem
sido uma prática comum o empolamento orçamental, baseado em desajustadas previsões orçamentais,
que as regras previsionais previstas no Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL),
não conseguiram resolver.
Tem sido também sintomático o empolamento dos orçamentos municipais, em resultado de práticas
adotadas na sua elaboração, o incumprimento dos limites legais de endividamento municipais, bem como
a ineficácia dos contratos de saneamento e reequilíbrio financeiros municipais, situações que conduziram
ao desequilíbrio financeiro de cerca de centena e meia de municípios.
Também o limite legal de endividamento, quer de médio e longo prazo, quer mesmo o líquido, nunca
esteve relacionado com o volume de receita de cada município, tendo, com a atual lei em vigor, sido
reportada à dívida total do grupo autárquico, que passou a incluir, não só o município, mas também as
entidades participadas.
Contudo, a adoção de vários mecanismos legislativos que visaram corrigir a situação dos municípios
desequilibrados, não surtiu o efeito desejado, pelo que mais de três dezenas continuam ainda num estado
longínquo do equilíbrio financeiro. Após a adoção de vários mecanismos com objetivos corretivos, e
caminhando-se rapidamente para a implementação do SNC-AP, com forte incidência ao nível da
contabilidade e relato orçamental, o OBZ surge assim como um instrumento de gestão que pode resolver
de uma vez por todas, o problema do desequilíbrio financeiro de cerca de 33 municípios.
1 Conselho de Finanças Públicas. Análise dos determinantes de desequilíbrio financeiro nos municípios portugueses.
Consultado em janeiro de 2016: http://www.cfp.pt/wp-content/uploads/2014/05/Seminario-fin-locais.pdf
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2 – O que é o OBZ
2.1 – Conceito
O OBZ é um tipo de orçamento “de baixo para cima” que parte do princípio de que na sua elaboração
não devem ser consideradas as receitas e as despesas realizadas nos exercícios anteriores, nem mesmo
os saldos que transitam da gerência anterior, como é o caso dos municípios, por gozarem de autonomia
administrativa, financeira e deterem património próprio.
Este tipo de orçamento rompe, assim, com o passado de qualquer município. É a partir de um detalhado
programa de planeamento das atividades e funções a prosseguir, que se procede à elaboração do
orçamento que deve ter subjacente uma clara definição das metas e objetivos a atingir, bem como das
necessidades de recursos, sejam eles humanos, materiais e financeiros, definidos num quadro realista e
tendo em atenção a situação económica, financeira e patrimonial do respetivo município.
Todavia, o sucesso da metodologia subjacente ao OBZ reside no facto das direções política (eleitos
locais) e técnico-administrativa (dirigentes) deverem possuir sólidos conhecimentos sobre a legislação
vigente, a estrutura orgânica aprovada, regulamento interno, planos, normas, regras e princípios
aplicáveis, do mapa de pessoal aprovado e atividades desenvolvidas.
De salientar que o conhecimento exigido às direções política e técnico-administrativa deve ser bastante
minucioso e apurado, porquanto na elaboração do orçamento para determinada atividade ou função,
implica saber quantos postos de trabalho são necessários, qual o nível remuneratório a praticar e os
requisitos dos respetivos conteúdos funcionais. Só na posse de toda a informação detalhada e necessária,
se poderá optar com rigor pelas despesas envolvidas, incluindo as diversas despesas correntes e de capital
que caem na área de responsabilidade de cada interveniente que, por sua vez, devem sustentar os seus
objetivos, estabelecendo um programa de monitorização para poder acompanhar de forma permanente a
execução do OBZ, introduzindo as correções julgadas necessárias, desde que devidamente
fundamentadas.
2.2 – Pontos fortes e fracos
O OBZ evidencia vários pontos fortes decorrentes da sua implementação que segundo Alveirinho (2007),
podem ser resumidas da seguinte forma:
a) melhoria dos documentos previsionais - Quadro Plurianual, Grandes Opções do Plano
(GOP), Ações Mais Relevantes (AMR) e Orçamento - na medida em que, na sequência
de um adequado planeamento das atividades municipais previstas, são fixados e
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aprovados objetivos realistas e que servirão de base a decisões mais racionais,
eficientes e eficazes em termos de alocação de recursos disponíveis;
b) identificação e fixação de níveis de despesa corrente e de capital, através da aprovação
de pacotes de despesas para cada atividade, com a possibilidade de relevar os custos e
os proveitos, separando-os dos outros custos gerais do município;
c) apuramento, à priori, a alocação de recursos para a prossecução das metas e dos
objetivos fixados e privilegiam-se os aspetos qualitativos, em especial, em sede de
execução física;
d) adoção das melhores soluções melhores e mais baratas, ou seja, o máximo de resultados
com o mínimo dispêndio possível;
e) identificação das atividades e funções que podem ser reduzidas, que podem ser
desnecessárias ou que se encontram em duplicado, permitindo hierarquizar e dentro
destas estabelecer prioridades ao nível de projetos e ações, os quais devem ser incluídos
no Plano Plurianual de Investimentos (PPI), consoante a sua hierarquização;
f) avaliação do grau de importância de cada unidade orgânica da estrutura orgânica
nuclear e flexível dos municípios, posicionando-as por ordem de importância, podendo
ocasionar, se for caso disso, a redistribuição da alocação de recursos entre elas;
g) avaliação do desempenho dos trabalhadores e dirigentes dos departamentos, divisões,
serviços municipais e unidades orgânicas;
h) apuramento de erros, omissões e desvios e facilitando as correções e ajustes necessários
a um bom desempenho funcional e profissional;
i) fomenta e melhora contínua da comunicação e respetivos canais, entre a direção
política e a direção técnico-administrativa municipal.
Ainda, segundo Alveirinho (2007), o insucesso deste processo orçamental, permite também, enumerar
um conjunto de pontos fracos, ou seja, de problemas e obstáculos subjacentes à sua implementação ou
aplicação, como sejam:
a) nem sempre é possível obter o apoio da direção política para este tipo de metodologia
orçamental;
b) existe sempre muita dificuldade em optar pela alternativa mais favorável, seja mediante
critério técnico, de risco económico, financeiro, de resultado, seja pela experiência ou
mesmo pelo “feeling”;
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c) é bastante difícil escolher indicadores ou rácios, dentro de sua grande diversidade, que
permitam medir o que efetivamente é necessário avaliar;
d) nem sempre as intenções, as necessidades, as decisões e as soluções aprovadas
encaixam nas GOP, designadamente as AMR;
e) pode gerar problemas internos entre eleitos e mesmo dirigentes nas hierarquização e
priorização das atividades, podendo mesmo provocar choques de interesses e
incompatibilidades;
f) cria receios nos eleitos e dirigentes que têm de apresentar e justificar com alguma
antecedência as suas atividades e ações, ficando assim comprometidos com as decisões
tomadas;
g) o processo de decisão envolve mais pessoas o que torna a comunicação mais morosa,
pesada e crítica.
2.3 – Requisitos para a sua implementação
Possuindo os municípios como documentos previsionais as GOP e o Orçamento, sendo a primeira dos
quais constituído pelas AMR e o PPI, parecem, assim, estarem reunidos os principais formalismos para
a aplicabilidade do OBZ. Todavia, existem outros requisitos específicos que devem também ser
cumpridos, como sejam:
a) Identificação de cada responsável autárquico, bem como a sua área de competências;
b) Existência de uma contabilidade de custos, conforme estatuída no POCAL que permita
apurar o custo das funções, das atividades, projetos e ações, bem como o custo unitário
dos produtos, bens e serviços;
c) Justificação por parte de cada responsável autárquico (órgão executivo, presidente ou
vereador com competência delegada), não só quanto pretendem gastar, mas também
em quê e como tencionam fazê-lo;
d) Responsabilização pela execução das atividades a desenvolver, bem como da
competência exclusiva dos autarcas que devem justificar detalhadamente não só os
objetivos, mas também todos os recursos necessários, respetivos custos, alternativas
adicionais e consequência decorrentes da sua não execução.
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2.4 – Limitações na sua aplicação
Regendo-se os municípios também pelo principio da legalidade, suportados em leis, sistemas e princípios
e de gestão pública, nem sempre as respetivas regras, procedimentos e métodos se encontram
corretamente implementados ou em funcionamento, pelo que, por vezes, se constata que determinados
requisitos, que se revelam necessários à boa implementação do OBZ, não permitem que o objetivo seja
alcançado.
A este propósito refira-se que ainda existem alguns municípios que, apesar do POCAL ter entrado em
vigor no ano de 2002, ainda não têm implementada a contabilidades de custos, sendo no âmbito desta, a
definição dos centros de custos, uma tarefa fundamental para o sucesso do OBZ, pois só com esta vertente
contabilística em funcionamento, poderá ser obtida a informação contabilística detalhada sobre os custos
das atividades, funções, bens, produtos e serviços.
Por outro lado, deverá existir e em vigor, uma adequada estrutura orgânica, suportada na nuclear e na
flexível, suportada num atualizado e moderno regulamento interno, bem com o um sistema de informação
contabilístico que permitam obter, em cada momento, o grau de execução orçamental das funções,
programas, ações, produtos, bens e serviços, bem como informação precisa e rigorosa sobre os respetivos
custos da respetiva execução física.
Outro requisito essencial necessário ao sucesso do OBZ, prende-se com a necessária formação dos eleitos
e dirigentes, situação que, regra geral não se verifica, em especial em relação aos autarcas. Um bom
funcionamento dos canais de comunicação é também fundamental para que a informação chegue ao local
certo, na hora certa e possa ser utilizada em tempo útil. Também um bom trabalho e espírito de equipa,
muitas vezes difícil de conseguir, designadamente ao nível dos órgãos executivos e deliberativos, uma
vez que o regime jurídico das autarquias locais não prevê ainda governos locais monocolores.
Como nota final, mas não menos importante, saliente-se que o OBZ é aconselhável em determinadas
situações que deve ser aplicado periodicamente como forma de, através de um processo de planeamento,
orçamentação e controlo, se justifiquem todas as despesas e quais os recursos a afetar na prossecução das
atribuições municipais. A ser assim, e dado que o mandato autárquico é de quatro anos, cada novo
executivo municipal deveria elaborar o Quadro Plurianual, o PPI para os quatro anos e os respetivos
OBZ, ou seja, romper com o passado e eleger melhores opções decisórias, com vista à elaboração de um
conjunto de boas decisões composto pelas atividades a desenvolver, com vista à recuperação financeira.
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3 – Municípios financeiramente desequilibrados - Principais práticas adotadas
3.1 – A nível do sistema contabilístico
3.1.1 – Regras previsionais
As regras previsionais previstas no POCAL visam constituir-se como um instrumento referencial de
uniformização dos critérios de previsão, especialmente da receita e fixam, regra geral, critérios baseados
na média da receita arrecadada nos últimos 24 meses que antecedem a elaboração dos orçamentos, como
é o caso dos impostos, das taxas e das tarifas. Também as transferências financeiras apenas podem ser
inscritas com a efetiva atribuição pela entidade competente, com exceção das receitas comunitárias e os
produtos de empréstimos que só podem ser considerados, após a sua contratação. Contudo, para a
previsão de venda de bens de investimento, constata-se uma grande lacuna legislativa, não existindo
qualquer regra reguladora, pelo que o equilíbrio orçamental foi sempre obtido, até aos orçamentos de
2014, por via do empolamento desta rubrica.
Essa foi a principal razão dos orçamentos municipais terem registado sempre um forte empolamento,
com o objetivo de dar cobertura a elevados montantes de despesa comprometida e para as quais não
dispunham de disponibilidades financeiras, aliada à falta de articulação das despesas assumidas com as
receitas efetivamente cobradas, permite concluir que a elaboração e aprovação dos documentos
previsionais, não evidenciavam aderência à realidade, no tocante à previsão das receitas, conduzindo,
necessariamente a execuções orçamentais desequilibradas.
Muito bem andou o legislador, mas julgamos que tarde demais, ao fixar no art.º 253 da Lei n.º 83-C/2013,
de 31/12 – Lei do Orçamento do Estado (LOE) para o ano de 2014, que “os municípios não podem, na
elaboração dos documentos previsionais para 2015, orçamentar receitas respeitantes à venda de bens
imóveis em montante superior à média aritmética simples das receitas arrecadadas com a venda de bens
imóveis nos últimos 36 meses que precedem o mês da sua elaboração”, norma que veio reduzir
drasticamente o valor global dos orçamentos municipais, combatendo desta forma simples, mas objetiva
e eficaz, o sistemático empolamento que vinha sendo praticado.
Poder-se-á então concluir que a inexistência de regras previsionais para aquelas receitas de capital,
conduziu os municípios a uma sobrevalorização orçamental das receitas, as quais viabilizavam a
realização da quase totalidade da dotação das despesas, situação que esteve na origem de inúmeras ruturas
de tesouraria municipais, por força do baixo nível registado na arrecadação de receitas.
Aliás, esta conclusão encontra-se plasmada no Relatório de “Controlo do Endividamento e da Situação
Financeira da Administração Local Autárquica” da Inspeção Geral de Finanças – Inspeção Geral das
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Finanças (IGF) 2, que concluiu, sobre a referida situação ”Manifesta inaptidão das regras previsionais
do POCAL (ponto 3.3.), pois o seu eventual cumprimento não é suficiente para evitar o empolamento
orçamental, que é realizado através da sobrevalorização das receitas previstas em rubricas para as quais
não existe regra previsional (especialmente, a venda de bens de investimento).”
De referir ainda que esta situação teve sempre um forte impacto no aumento dos prazos médios de
pagamento dos municípios que viram o seu stock da dívida aumentar significativamente, sendo de
salientar que em dezembro de 2014, segundo a Direção Geral das Autarquias Locais (DGAL) 3, cerca de
67 municípios ainda evidenciavam prazos superiores a 90 dias.
3.1.2 – Compromissos anos futuros
Ao longo dos últimos anos foi adotado, pela maioria dos municípios que atualmente evidenciam um
elevado grau de desequilíbrio e de endividamento, um irregular procedimento contabilístico, por
omissão, ao nível da contabilidade orçamental, mais concretamente em matéria de encerramento e
abertura de contas da classe zero, em sede de fecho de contas e transição de saldos.
Com efeito, de acordo com o estipulado no Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP) e no POCAL,
em sede de contabilidade de compromissos, no final de cada exercício económico, torna-se necessário
analisar e apurar os compromissos assumidos e registados na conta 027-Compromissos e verificar se
foram ou não processados, liquidados (252) e pagos (11/12) nesse exercício, ou se, pelo contrário, não
deram origem a pagamentos, devendo, neste caso, transitar para o exercício seguinte e ser objeto dos
seguintes movimentos de regularização na classe zero:
Orçamento Exercício Corrente
Compromissos ---------------------------------------------------- 027/026
Cabimentos -------------------------------------------------------- 026/023
Orçamento exercício corrente ------------------------------------ 023/01
Orçamentos exercícios futuros - Compromissos ---------------- 04/05
2 Inspeção Geral de Finanças. (2010). Controlo do Endividamento e da Situação Financeira da Administração Autárquica -
Resultados Globais e Fragilidades do Quadro Legal.
3 Direção Geral das Autarquias Locais. (2014). Lista do prazo médio de pagamento registado por município em dezembro de
2014.
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Com todas as contas saldadas, deve então encerrar-se o ano económico ao nível da contabilidade
orçamental, ficando assim também saldadas as contas 04 – Orçamento – exercícios futuros e 05 -
Compromissos – exercícios futuros.
Contudo, no início do ano seguinte, o montante dos Compromissos – exercícios futuros e do Orçamento
– exercícios futuros, como explica o POCAL, deverão obrigatoriamente ser registados a débito da conta
01 – exercício corrente, por contrapartida da conta 021 – Dotação inicial da despesa, sendo
posteriormente registados nas contas 023 – Dotações disponíveis, 026 – Cabimentos e 027 –
Compromissos, ficando assim registados nos compromissos do novo ano, no caso de dizerem respeito
exclusivamente a esse ano. Caso contrário, deverá ser evidenciada na conta 04 – Orçamento – exercícios
futuros, por contrapartida da conta 05 – Compromissos – exercícios futuros.
Ora, este procedimento foi, desde a implementação do POCAL, omitido, ignorado e violado por muitos
municípios, revelando um grande desconhecimento deste importante procedimento contabilístico de
fecho e abertura de contas. O seu cumprimento obrigaria, logo após o carregamento inicial do orçamento
corrente (01), à inscrição, cabimentação e compromisso dos encargos assumidos e não pagos no ano
anterior, como aliás decorre da contabilidade de compromissos prevista no artigo 10.º do Regime de
Administração Financeira do Estado (RAFE), que obriga ao registo das obrigações decorrentes da lei ou
contratos, como primeiro movimento da gestão do novo ano económico.
A esta irregularidade também se refere o Relatório de “Controlo do Endividamento e da Situação
Financeira da Administração Local Autárquica” da IGF 2, ainda que de uma forma breve e “tímida”,
quando se reportou à qualidade e fiabilidade da informação financeira, tendo referido “Não utilização,
de forma sistemática e adequada das relativas a compromissos de exercícios futuros (04 e 05)” quando,
na realidade, se tratava de uma omissão grave que condicionava de forma substancial a execução
orçamental do ano seguinte, na medida em que a operação de cabimentar e efetuar os compromissos
transitados do ano anterior, reduziria logo à partida as dotações iniciais disponíveis em cada novo
orçamento. Acresce que a adoção deste procedimento, aliás obrigatório e previsto no POCAL, evitaria o
endividamento de muitos municípios, uma vez que serviria de “travão” à execução da despesa, por
inexistência de dotações disponíveis, no decurso dos diversos exercícios económicos.
Acrescente-se que, no caso dos municípios, a inexistência do período complementar de despesa, veio
beneficiar e facilitar os procedimentos anuais de encerramento e abertura de contas transitadas, bem
como o respeito por alguns princípios orçamentais e contabilísticos, designadamente o da anualidade
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(fazendo coincidir o ano económico com o ano civil) e da continuidade (operam continuamente, com
duração ilimitada).
3.2 – A nível das finanças locais
3.2.1 – O sistema financeiro
Os contributos decorrentes das sucessivas leis das finanças locais que se mostraram decisivas para a
consolidação do Poder Local, foram, regra geral, responsáveis em geral pelo grande desenvolvimento
económico e social das autarquias locais, pelo que se poderá depreender o bom desempenho legislativo
das mesmas que, sem grandes complexidades e dificuldades interpretativas, permitiram obter um
resultado global muito positivo ao nível da satisfação das necessidades das populações e coletividades
locais que, desde o 25 de Abril de 1974, permitiram colmatar diversas lacunas ao nível do abastecimento
de água, saneamento básico, desenvolvimento económico, acessibilidades, educação, cultura, turismo,
desporto, lazer, etc.
Se melhores resultados não foram alcançados, apenas pode ser explicado pela escassez de recursos
colocados à disposição do poder local, uma vez que empregando cerca de 24% a 25% dos funcionários
públicos, cujo peso das despesas de pessoal representava cerca de 7% a 8% do Produto Interno Bruto
(PIB), evidenciava um endividamento que nunca ultrapassou mais de 4% da dívida pública portuguesa,
apresentando, no entanto, níveis de investimentos reprodutivos superiores a 50% do investimento público
total, naturalmente alavancado pelos fundos comunitários.
Todavia, uma leitura atenta das referidas leis, permite-nos também concluir pela existência de alguns
pontos negativos, consubstanciados na incerteza e na descontinuidade das linhas e medidas orientadoras,
em resultado de várias ruturas com os sistemas anteriores vigentes, quer ao nível da repartição dos
recursos públicos pelas autarquias locais, quer no plano das inovações e das diversas limitações no acesso
ao crédito a curto, médio e a longo prazos e, ainda, em relação a uma grande dependência do Poder
Central, patenteada nas leis anuais do Orçamento de Estado, nas quais eram definidas e fixadas as
respetivas transferências, tendo levado a uma desmobilização de muitas autarquias na potenciação das
suas receitas próprias, e bem assim, na procura de uma situação de independência financeira (relação
entre receitas próprias e as receitas totais).
Ficou igualmente demonstrado que os municípios nem sempre souberam utilizar os poderes tributários
transferidos pelo Poder Central, pelo que a utilização da fiscalidade foi sempre muito reduzida, não
desempenhando, assim, o papel que o legislador lhe cometeu, no sentido de poder assumir-se como um
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instrumento de correção da escassez, ou do excesso, na arrecadação de receitas, tributando ou isentando,
consoante os casos, no sentido da condução a um equilíbrio financeiro municipal.
De referir ainda a excessiva carga burocrática, associada aos sistemas financeiros vigentes, por força da
criação das plataformas de suporte, que têm de ser alimentadas com volumosa informação, muitas vezes
despicienda e em duplicação, a par de uma falta de transparência informativa e “accountability”
(“prestação de contas”). A estas situações deve aliar-se ainda uma enorme passividade dos órgãos de
controlo de 1.º e 2.º níveis que permitiram, não só o elevado nível de endividamento da maioria dos
municípios, mas também a falta de acompanhamento daqueles que, evidenciando uma situação de
desequilíbrio estrutural ou de eminente rutura financeira, nada lhes foi imposto ou aplicado, antes pelo
contrário, foi sempre disponibilizado um mecanismo de apoio na resolução, em especial, das pontuais
dificuldades de tesouraria.
Acrescente-se que a atual lei em vigor também não pode ser totalmente levada à prática, porquanto ainda
hoje se aguarda, passados mais de dois anos, a publicação da regulamentação prevista no seu artigo 47.º
que estabelece que o Plano Plurianual e os Orçamentos Municipais devem ser “regulados por decreto-
lei, a aprovar até 120 dias após a publicação da presente lei.”
3.2.2 – Endividamento
Apesar dos princípios da autonomia do poder local e da descentralização se encontrarem consagrados na
Constituição da República Portuguesas (CRP), o sistema de financiamento local, vigente desde o 25 de
abril de 2014, evidenciou sempre uma forte dependência do Poder Central, quer através das
transferências que o Orçamento de Estado consagra anualmente, quer mediante acordos de cooperação
técnica e financeira que permitiam a celebração de contratos programa de desenvolvimento ou de
contratos de reordenamento litoral, que ao mesmo tempo criavam uma grande discricionariedade entre
os municípios que a eles se candidatavam e os viam aprovados.
Contudo, face à elevada dependência estatal e ao fraco nível de arrecadação de receitas próprias, os
municípios, fortemente enraizadas no despesismo inerente aos ciclos eleitorais, porquanto, se pretendia
“apresentar obra”, foram sempre resolvendo os seus problemas de financiamento com o recurso ao
crédito (que se foi tornando mais difícil e caro) e aos contratos de locação financeira, para além do recurso
a outas práticas que tão pouco assentavam no princípio da legalidade (títulos da dívida, factoring,
transformação de empréstimos de curto em médio e longo prazo e omissão de registo de faturas).
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Concomitantemente, ao longo dos anos, as sucessivas leis foram fixando limites ao endividamento legal
municipal, os quais foram alterados e modificados de forma avulsa e descontinuada, situação que não se
mostrou eficaz, pois em 2006, já 57 municípios tinham ultrapassado o limite legal de endividamento, não
obstante a prática legislativa de excecionar daquele, vários tipos de empréstimos.
Com efeito, as últimas leis das finanças locais foram contemplando várias exceções, como por exemplo,
os empréstimos e amortizações destinados ao financiamento de projetos, seja com comparticipação
comunitária, seja com programas de reabilitação, seja ainda com investimentos na recuperação de
infraestruturas municipais afetadas por situações de calamidade pública. A estas situações, acresce uma
outra, que foi consagrada na LOE, no caso, os empréstimos relacionados com o Euro 2004 que vieram
introduzir sérias distorções no conceito de endividamento líquido e que conduziram alguns municípios a
situações de “falência técnica” (o passivo excede o valor do ativo, ou seja, situação líquida negativa), em
virtude da totalidade do valor daqueles empréstimos contraídos, não contarem para o limite legal de
endividamento.
Esta situação de alguma complexidade que se mostrou de difícil controlo, gerando mesmo alguma
confusão, foi recorrentemente contornada e ultrapassada, chegando-se a constatar que muitos municípios,
possuindo uma fraca capacidade financeira e contando com vários empréstimos excecionadas,
evidenciavam sempre uma razoável capacidade legal de endividamento, se comparados com outros que
não detinham quaisquer empréstimos excecionados.
Para o forte nível de endividamento local, também contribuiu o facto da despesa pública local, sempre
desligada do nível de arrecadação de receitas, raras vezes ter obedecido a critérios de hierarquização e
de seletividade da mesma, tendo registado um crescimento desmesurado, quer com a realização de
algumas obras desproporcionadas e descontextualizadas das reais necessidades locais, implicando
elevados custos de manutenção, conservação e funcionamento, quer ainda com a criação de empresas e
associações locais que passaram a proliferar pelos mais diversos municípios e que dependiam quase
exclusivamente dos orçamentos municipais, os quais começaram a mostrar-se insuficientes, não só para
financiar toda a atividade dos respetivos grupos municipais, mas também para sustentar a crescente
despesa social local.
Aliás, a onda crescente de criação de empresas municipais apenas começou a sofrer um revés, com a
publicação da Lei 50/2012, de 31/8, que aprovou o Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local e
das Participações Locais (RJAEL), uma vez que a necessidade destas em obter cada vez mais recursos
financeiros, começou desde logo a provocar problemas à gestão e sustentabilidade financeira dos
19
municípios. Assim, das cerca de 325 empresas locais existentes, no final de 2011, mais de um terço já
foram extintas, tendo a quase totalidade dos cerca de 12 000 trabalhadores sido integrados nos respetivos
municípios.
De referir ainda que o atual regime das finanças locais Lei n.º 73/2013, de 3/9, no seu artigo 56.º, veio
introduzir e bem, um mecanismo de alerta precoce, sempre que a dívida total atinja ou ultrapasse a média
da receita corrente líquida cobrada nos três exercícios anteriores, ou que a dívida total prevista atinja ou
ultrapasse 1,5 vezes a média da receita corrente líquida cobrada nos três exercícios anteriores. O mesmo
mecanismo aplica-se ainda quando um município registar, durante dois anos consecutivos, uma taxa de
execução inferior a 85% da receita prevista no orçamento respetivo, esperando-se, assim, no futuro, uma
maior eficácia, relativamente a eventuais situações de desvios das respetivas execuções orçamentais.
A alteração ao conceito de dívida total, que passou a englobar a totalidade dos passivos das entidades do
grupo municipal, ou seja, para além das dívidas do município, passa a incluir também as referentes às
entidades participadas, situação que que reflete de uma forma mais consentânea a realidade municipal
em matéria de endividamento legal.
4 – Discussão da solução de aplicabilidade do OBZ, em contexto de SNC-AP
4.1 – O estado da matéria
4.1.1 – A nível nacional
Desde longa data que em Portugal se vem falando das medidas que deveriam ser adotadas no âmbito da
Reforma da Administração Pública, entre as quais, se tem vindo a abordar a técnica da base zero, sem
que, todavia, alguma vez se tenha passado das palavras à prática.
Muito recentemente Moreno (2014), veio relembrar que o que se ouviu sobre o Orçamento do Estado
(OE) projetado para 2015 fazia-o seriamente recear que a história orçamental que viveu há 35 anos se
viesse a repetir, afirmando que “a minha curiosidade, o meu interesse e a minha adesão à filosofia e aos
princípios fundadores de orçamento base zero nasceram nessa época (1980) e ainda hoje me
acompanhavam”.
Cravinho (2000), numa reflexão sobre o novo paradigma da Organização e Gestão da Administração
Pública, enfatizou o compromisso Português de passar a elaborar o OE de acordo com a metodologia da
base zero, em oposição ao incrementalismo habitual onde se arbitram crescimentos da despesa com base
em orçamentos anteriores.
20
Por outro lado, Jorge (2001) concluiu que “a principal razão porque o OBZ ainda está “vivo” no Setor
Público é porque é uma solução conveniente (do nosso ponto de vista, apenas teoricamente) para aqueles
cujas intenções são mudar radicalmente a estrutura, políticas e programas das organizações públicas.”,
tendo ainda acrescentado que a “utilização do OBZ, essencialmente no sentida de aumentar a qualidade
da despesa pública, em nossa opinião e considerando as experiências falhadas noutros países, fará com
que aqueles objetivos se fiquem pelo campo das “boas intenções”, resultando a iniciativa num acréscimo
considerável de esforço financeiro para o País, para não se alcançar o pretendido.”, pondo assim em causa
os resultados que se iriam obter se um elevado investimento no OBZ fosse efetuado, não obstante a sua
forte teoria de sustentação.
Mais tarde, Passos Coelho sugeriu que o Governo na preparação do OE para 2011, adote aquilo que os
economistas chamam de OBZ”, ou seja, ”obrigar toda a gente a explicar o que quer fazer com o dinheiro
que propõe vir a receber” (Simões, 2010).
Posteriormente, em 2011, já como Primeiro Ministro, afirmou igualmente, aquando da apresentação do
Documento Verde para o Setor Local, que considerava essencial que se caminhasse no sentido de ter os
chamados OBZ nas 308 câmaras municipais, para garantir a sustentabilidade financeira dos municípios.
Embora a atual Lei de Enquadramento Orçamental (LEO), aprovada pela Lei nº Lei n.º 151/2015 de 11/9,
nada refira sobre o OBZ, de referir que a oitava alteração à anterior LEO, consagrava um título
“Orçamentação de base zero”, composto pelos artigos 21.º- A - “Processo de orçamentação de base
zero”, artigo 21.º-B –“Análise e avaliação da orçamentação de base zero”, artigo 21.º- C - “Aplicação da
orçamentação de base zero às empresas públicas”, artigo 21.º - D - Adoção da orçamentação de base zero
pelos institutos públicos e pelas entidades públicas empresariais” e artigo 21.º- E “Enquadramento
orçamental da orçamentação de base zero” que, não obstante o requisito legal, nunca chegou a ser
implementado em Portugal.
Saliente-se que também nas disposições finais do mesmo diploma, no seu artigo 98.º encontrava-se
definida a “Regulamentação da orçamentação de base zero”, estabelecendo que “para efeitos do previsto
nos artigos 21.º -A e seguintes, compete ao Governo definir: a) A adaptação ao processo de orçamentação
de base zero das regras relativas ao modo e à forma de definição concreta dos programas e medidas a
inscrever no Orçamento do Estado e das respetivas estruturas; b) O modo de aplicação do processo de
orçamentação de base zero na organização e elaboração dos orçamentos dos serviços e fundos
autónomos, no orçamento da segurança social, bem como no âmbito dos programas plurianuais dos
21
serviços públicos nas áreas da saúde, educação, segurança social, justiça e segurança pública.” que
igualmente nunca passou do papel.
A nível legislativo, a anterior LEO – Lei n.º 91/2001, de 20/8, que contou com 8 alterações, e que foi
recentemente revogada pela nova LEO - Lei n.º 151/2015, de 11/9, consagrava no seu Titulo III –
Conteúdo e Estrutura do Orçamento do Estado, Capítulo I – Secção II – Orçamentação de Base Zero.
Apesar daquele normativo definir o processo de orçamentação, a análise e avaliação, estabelecendo a sua
aplicação às empresas públicas, institutos públicos e entidades públicas empresariais, bem como o seu
enquadramento orçamental, estes procedimentos, embora se mantenham em vigor durante três anos, nos
termos do n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 151/2015, de 11/9, foram abandonados pela nova Lei, o que denota
que esta técnica jamais se poderá vir a aplicar aos conteúdos e estrutura do OE.
4.1.2 – A nível internacional
As aplicações do OBZ que são mais frequentemente referenciadas a nível internacional, a nível do Setor
Público, como casos de insucesso, reportam-se aos EUA, mais concretamente ao Departamento
Americano da Agricultura, cuja experiência foi apenas de um ano (1962) e quando Jimmy Carter o adotou
ao ano fiscal de 1973, no Estado da Geórgia e também o pretendeu implementar no Processo Orçamental
Federal (1977).
Todavia, no setor privado, contam-se muitos casos de sucesso, como foi o caso da Texas Instruments
Inc., para além de muito recentemente existirem casos de sucesso em organizações de menor dimensão,
mas com elevada performance, como são os casos da Ambev, Lojas Americanas, Grupo Pão de Açúcar,
Santos Brasil, ALL; Dasa, Coral, todas do Brasil, país onde o OBZ está bastante enraizado e tem vindo
a evidenciar bons níveis de estudo, investigação, implementação, aplicação prática e desenvolvimento.
4.2 - A ineficácia dos mecanismos adotados
Segundo o Conselho de Finanças Públicas 1, cerca de 66% dos mecanismos de ajuda com vista à
recuperação financeira dos municípios foram ineficazes, podendo concluir-se que, não obstante a atenção
prestada pelo legislador para com os municípios desequilibrados, os resultados obtidos são bastante
negativos. Com efeito, a análise da legislação a seguir referenciada, ressalta que, na última década, o
legislador parece que pretendeu sempre “premiar” os municípios desequilibrados e que excederam
largamente a sua capacidade legal de endividamento, com a criação de um conjunto de medidas pontuais,
com vista a apoiar a sua recuperação financeira e que a seguir se abordam de uma forma muito breve.
22
4.2.1 – Programas diversos
Em 2008 foram publicados o “Programa Pagar a Tempo e Horas” (PPTH) - Resolução do Conselho de
Ministros n.º 34/2008, de 14/2 e, de seguida, o “Programa de Regularização Extraordinária das Dívidas
do Estado” (PREDE) – Resolução do Conselho de Ministros n.º 191-A/2008, de 27/11, medidas que não
surtiram o efeito desejado, apenas permitiram resolver alguns problemas de tesouraria a alguns
municípios.
Em março de 2013, na sequência da entrada em vigor da Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso
– LCPA, Lei n.º 8/2012, de 21/2, foi publicado o “Programa de Apoio à Economia Local” (PAEL) - Lei
n.º 43/2012, de 28/8, que disponibilizou cerca de mil milhões de euros para os municípios procederem
ao pagamento das dívidas aos fornecedores, com mais de 90 dias, dos quais apenas foram utilizados
pouco mais de 600 milhões.
4.2.2 – Saneamento e reequilíbrio financeiro municipal
Os contratos de empréstimos para fazer face a planos de saneamento e de reequilíbrio financeiros
municipais foram, desde sempre, um instrumento para acorrer a situações de desequilíbrio conjuntural e
estrutural, se bem que nem sempre se mostraram eficazes, quer pela inadequação de levar à prática
algumas das medidas previstas nos respetivos planos, quer por falta de acompanhamento e avaliação dos
mesmos. Também o desajustamento patenteado entre as diversas leis das finanças locais e o regime
previsto no Dec. - Lei n.º 38/2008, de 7/3, que densifica as regras referentes aos regimes jurídicos do
saneamento financeiro municipal e do reequilíbrio financeiro municipal, não favoreceram e potenciaram
as vantagens de tais instrumentos, tanto mais que em 31/12/2011 (data marcante para a “entrada em
vigor” da LCPA), 174 municípios encontravam-se em situação de desequilíbrio conjuntural e, 50 em
desequilíbrio estrutural.
De qualquer forma, em 31/12/2013, apenas cerca de 31 municípios encontravam-se em desequilíbrio
conjuntural e 34 em desequilíbrio estrutural, cuja dívida rondava os 2 000 milhões de euros, ou seja,
cerca de um terço da dívida total dos municípios portugueses. Até à presente data, aquela terá sido
reduzida para cerca de metade do valor registado em 31/12/2011 (12 000 milhões de euros, equivalente
a cerca de 4% da dívida pública portuguesa).
23
4.2.3 - Fundo de Apoio Municipal - FAM
Mais recentemente, foi publicado o Fundo de Apoio Municipal – FAM, criado pela Lei n.º 53/2014, de
25/8, previsto no art.º 64 da Lei n.º 73/2013, de 3/9 – Regime Financeiro das Autarquias Locais e das
Entidades Intermunicipais (RFALEI), que segundo Ferreira e Oliveira (2014), veio impor uma restrição
da autonomia municipal, consiste num mecanismo que visa não só a recuperação financeira dos
municípios que se encontrem em situação de rutura financeira, mas também a prevenção de situações de
rutura financeira. Este Fundo é constituído por um valor total de 650 milhões de euros, financiados em
50% pelo Estado e 50% pelos municípios e que para estes, irá render juros, dado o seu carácter mutualista.
Até à presente data ainda não chegaram aos 17 municípios candidatos quaisquer montantes referentes à
fase regular dos financiamentos pretendidos pelos municípios desequilibrados, tendo apenas 6,
evidenciando sérias dificuldades financeiras, recebido 25 milhões para fazer face a despesas urgentes
(apoio transitório de urgência essencialmente para pagar salários) e que serão descontados quando
receberem os respetivos montantes que vierem a ser aprovados.
O objetivo do reequilíbrio financeiro subjacente ao FAM, prevê um conjunto de medidas para os
municípios financeiramente desequilibrados, tais como a adoção de taxas máximas de participação
variável no Imposto sobre o Rendimento sobre as Pessoas Singulares (IRS), da derrama, do Imposto
Municipal sobre Imóveis (IMI), revogação de benefícios fiscais e isenção de taxas, cuja concessão seja
da competência do município, identificação de novos preços e tributos municipais, bom como património
municipal e serviços alienar, e limitação da despesa corrente, no tocante à racionalização dos custos com
pessoal e da elaboração de um plano de redução de pessoal e de aquisição de bens e serviços.
O FAM surgiu assim como o último recurso para “salvar” alguns municípios de uma situação de rutura
financeira irreversível (Ferreira & Oliveira, 2014), mas tal missão só será possível com uma mudança
estrutural que passe pela racionalização da despesa e pela maximização da receita municipal e, se os
mesmos “mudarem de vida”, devendo otimizar a gestão do seu património. Simultaneamente, defendem
uma maior responsabilização dos eleitos locais e uma mudança de comportamentos, devendo, no entanto,
salvaguardar os interesses dos credores e das populações locais.
O FAM está atualmente a ser objeto de um estudo tendente à introdução de ajustamentos, tendo em vista
conferir uma maior celeridade aos respetivos processos, uma vez que quase ano e meio depois da sua
aprovação, ainda nenhum município recebeu o montante pretendido, por força de ainda não ter sido
“visado” qualquer processo pelo Tribunal de Contas.
24
De referir ainda que a criação do FAM tem sido alvo de várias críticas, não só pela atividade parabancária
que desenvolve, mas também pela perceção de que parece “tirar a uns para dar a outros”, sem que
qualquer sinal de discriminação positiva tivesse sido prescrito na lei, em relação aos municípios que se
encontram em situação de equilíbrio financeiro, designadamente em matéria de financiamento ao
investimento reprodutivo.
4.3 – O OBZ e os municípios financeiramente desequilibrados
Os municípios defrontam-se, atualmente, com diversos problemas entre eles o de natureza orçamental,
decorrente dos pagamentos em atraso e do elevado nível de endividamento.
Poderá então o OBZ dar uma resposta positiva e concreta a este problema de desequilíbrio financeiro?
Até ao momento, quase nenhum município tentou adotar o OBZ, situação que denota uma fraca
preferência e adesão por esta técnica orçamental.
A sua não adoção prende-se, em geral, com o facto do desconhecimento generalizado desta técnica
orçamental. Com efeito, debatendo-se vários municípios com desequilíbrios financeiros com uma forte
escassez de recursos, apenas podem encontrar no OBZ um valioso instrumento de avaliação das
alternativas, na medida em que lhes permite aplicar os recursos de uma forma mais económica, eficiente
e eficaz, através de um conjunto de decisões que terão de ser previamente aprovadas pela direção política.
Outra virtude, é que permite quantificar corretamente quando se pode e deve gastar, mediante uma
priorização das atividades e funções a prosseguir e dos recursos necessários à prossecução das mesmas.
Ao questionar se as atividades e funções atualmente desenvolvidas devem continuar a ser realizadas, este
instrumento orçamental permite aferir sobre as que têm de ser reduzidas, subdimensionadas ou mesmo
abandonada, para que os respetivos recursos possam financiar outras atividades, programas ou projetos
e ações mais relevantes e prioritárias.
Por outro lado, no plano da execução orçamental, o seu acompanhamento permanente permite corrigir e
alterar objetivos e metas, numa perspetiva dinâmica e racional de alocação de recursos.
Em face de um conjunto de cerca de três dezenas de municípios financeiramente desequilibrados e com
um elevado nível de endividamento, poder-se-ão encontrar no OBZ várias vantagens com vista à
prossecução do reequilíbrio financeiro e a redução do endividamento, a curto e médio prazo.
Com efeito, esses municípios possuem habitualmente estruturas pesadas em custos fixos,
designadamente em despesas com pessoal e assim torna-se muito difícil reduzir de forma rápida a sua
despesa corrente, sob pena de se inviabilizar a prossecução e desenvolvimento das atribuições e
25
competências municipais. Todavia, não raras vezes, esses municípios têm-se visto confrontados com
medidas legislativas apertadas de contenção orçamental que visam a redução gradual da despesa, como
foi o caso da LCPA, que, no entanto, não produziu os efeitos esperados, encontrando-se atualmente em
revisão e aguardando-se a quinta alteração à Lei, no âmbito do OE para 2016.
Note-se que a DGAL4 vem divulgando mensalmente um conjunto de municípios que continuam a violar
a LCPA, evidenciando permanentemente fundos disponíveis negativos, abrangendo em dezembro de
2015, um total de 33 municípios, correspondente a um terço do total das entidades públicas que não
cumprem a Lei dos Compromissos.
Acrescente-se que relativamente às despesas correntes, é sempre possível reduzi-las gradualmente,
podendo mesmo ser fixadas na base zero. Entre estas despesas, ressaltam os apoios ou subsídios
atribuídos a outras entidades ou associações, as horas extraordinárias, ajudas de custo, os contratos de
tarefa ou avença, as aquisições de bens e serviços.
Por outro lado, outra vantagem do OBZ que pode ser explorada nesses municípios, prende-se com o facto
de não ser necessário aplicá-lo a todas as funções, departamentos, divisões e unidades orgânicas. A título
experimental, poderá ser aplicado só a uma ou mais unidades orgânicas e, se redundar em sucesso, poder-
se-á estender a outros departamentos ou divisões.
Outra vertente positiva do OBZ, centra-se no facto de se mostrar um instrumento útil na alocação de
recursos pelos diversos departamentos, tendo em conta a necessidade de definição das prioridades das
atividades, a participação da gestão na tomada de decisões e, ainda, das eventuais compensações que
podem vir a ser feitas entre funções, serviços, programas, atividades, ações e tarefas.
Igualmente a participação dos responsáveis na elaboração dos orçamentos conduz à melhoria acentuada
da qualidade dos orçamentos, porquanto cada um terá que justificar os gastos que pretende realizar
anualmente e, também a uma melhor compreensão dos objetivos, alocação de recursos e utilização dos
adequados canais de comunicação.
Como desvantagens, poderão ser destacadas, entre outras, as seguintes situações:
a) a implementação e aplicação do OBZ ocupa demasiado tempo aos intervenientes, implica
muito trabalho diário, prejudicando a gestão corrente que é primordial nos municípios, face ao
elevado volume de solicitações diárias e à carga burocrática subjacente a cada processo; e
4 Direção Geral das Autarquias Locais. (2014). Lista dos municípios que se encontram em incumprimento nos termos dos n.ºs
5 e 6 do artigo 7.º do Dec. Lei n.º 127/2012, de 21/6, alterado e republicado pelo Dec. Lei n.º 99/2015, de 2/6. Reporte de
dezembro de 2015.
26
b) tratando-se de funções, atividades, programas e ações “incontroláveis”, ou seja, de funções
cuja prossecução decorre da lei e, por isso, oriundas do Estado que por sua vez, não podem ser
cortadas de forma radical e são por isso, muitas vezes, inoperantes.
4.4 – O impacto e as exigências do SNC-AP
O SNC-AP foi para criado para ultrapassar os pontos fracos e as fragmentações que o atual sistema
contabilístico, em especial, a vertente do relato orçamental, vinham evidenciando, e insere-se no âmbito
da nova reforma da contabilidade pública que tem por base a nova LEO - Lei n.º 151/2015, de 11/9 e o
SNC-AP.
O novo subsistema de contabilidade orçamental vai assim registar algumas melhorias no processo
orçamental, em resultado da adoção da IPSAS 24 – Apresentação de Informação Orçamental nas
Demonstrações Financeiras e da NCP 26 – Contabilidade e Relato Orçamental, permitindo conhecer, em
cada momento, designadamente os cabimentos, os compromissos, as obrigações e os pagamentos
líquidos, respetivos valores e a transitar. Também no âmbito do novo ciclo orçamental da despesa,
englobando a dotação orçamental, o cabimento, o compromisso, a obrigação e o pagamento, deixa de
existir a fase de autorização de pagamento. Quanto aos períodos futuros, passa a contemplar também o
orçamento da receita, contrariamente ao POCP que só considerava a despesa. De salientar ainda que as
novas demonstrações orçamentais vão permitir conhecer, entre outras, os cabimentos, compromissos,
obrigações e receitas liquidadas e o grau de execução orçamental da despesa e receita.
Outro aspeto não menos importante em contexto de implementação do SNC-AP, prende-se com o facto
de os municípios terem de continuar a cumprir a LCPA, embora num regime mais flexível, que deverá
ser previsto na LOE para o ano de 2016, designadamente em matéria de cálculo de fundos disponíveis,
uma vez que mais de trinta municípios, nos últimos quatro anos, ainda nunca apresentaram fundos
positivos e continuam em funcionamento, sem que qualquer tipo de penalidade recaia sobre a respetiva
gestão.
A este propósito, convirá questionar se a contabilidade orçamental adota um regime de base de caixa, na
elaboração do orçamento e, de caixa modificada, na sua execução, como será possível neste último
regime os municípios financeiramente desequilibrados poderem registar legalmente os compromissos,
quando os fundos disponíveis evidenciados vêm sendo negativos?
Será que as demonstrações e os indicadores orçamentais não serão afetados por esta situação
anteriormente descrita que tende a transformar-se em carácter estrutural?
27
Saliente-se que qualquer despesa só poderá ser autorizada, processada e paga se o respetivo compromisso
tiver sido assumido nos termos das regras e procedimentos previstos na LCPA, ou seja se existirem para
o efeito, dotação orçamental disponível e fundos disponíveis.
Por fim, saliente-se que as entidades públicas que vão adotar pela primeira vez o SNC-AP, devem, entre
outras, reconhecer todos os seus ativos e passivos nos termos das normas de contabilidade pública, não
devendo omitir qualquer bem, direito e obrigação, situação que poria em causa a fiabilidade,
fidedignidade da mensuração de todos os ativos e passivos, tarefa que deverá ter subjacente muito rigor
contabilístico para que a sua relevação seja o mais aderente possível à realidade.
5 – Conclusões
5.1. Ao longo de mais de quarenta anos de democracia local, vigoraram em Portugal três sistemas
contabilísticos completamente diferentes, mas tendencialmente convergentes no sentido de uma
contabilidade autárquica mais moderna, útil, informativa e integrada, bem como mais de seis leis de
finanças locais com aspetos bastante positivos, no entanto, evidenciando algumas situações
descontinuadas que vieram a prejudicar a consolidação sustentável do poder local.
5.2. A nível contabilístico foram adotadas práticas imprudentes, irregulares e de relevantes omissões,
consubstanciadas no sistemático empolamento das receitas orçamentais, situações que desvirtuaram
a realidade, a fiabilidade e a fidedignidade da informação financeira e que contribuíram para um
aumento cada vez maior dos pagamentos em atraso e do endividamento municipal. Também as
exceções previstas nas leis das finanças locais, algumas descontinuidades normativas, uma excessiva
carga burocrática, aliada a uma grande passividade dos órgãos de controlo de 1.º e 2.º níveis,
permitiram que a maioria dos municípios caminhasse ao longo dos anos para desequilíbrios
financeiros conjunturais e estruturais.
5.3. Os desequilíbrios financeiros municipais atuais (cerca de 33 municípios encontram-se a funcionar
desde 2012 com fundos disponíveis negativos), encontram justificação nas práticas referidas nos
pontos 5.2 e também na forma como, quando e onde os municípios aplicaram os seus recursos
disponíveis, cuja despesa pública registou, ao longo dos anos, um forte crescimento, especialmente,
em resultado do aumento das receitas locais provenientes do OE e do recurso ao crédito bancário, a
taxas de juro muito convidativas.
5.4. Também os limites do endividamento líquido eram facilmente contornados ao nível dos ativos e
passivos financeiros, não englobando a totalidade das entidades do grupo municipal, pelo que,
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muitos municípios, evidenciando uma boa capacidade legal de endividamento, na realidade,
encontravam-se fortemente endividados e desequilibrados financeiramente, por força dos
empréstimos excecionados, que não contavam para o cálculo dos limites de endividamento.
5.5. O setor empresarial local, foi também responsável por um forte endividamento local, todavia, em
2012, viu aprovar um novo regime legal que veio imprimir um conjunto de novas regras e um maior
controlo sobre as empresas locais, obrigando mais de um terço das empresas existentes a
dissolverem-se, designadamente aquelas que eram deficitárias, registando-se atualmente um maior
controlo sobre a atividade das mesmas.
5.6. Face ao atual desequilíbrio financeiro, ao volumoso valor de pagamentos em atraso e ao elevado
nível de endividamento, abarcando mais de cerca de 10% dos municípios, a aplicação aos mesmos
do OBZ, pode evidenciar várias vantagens com vista à prossecução do seu reequilíbrio financeiro e
à redução do endividamento, não no primeiro ano, mas a médio/longo prazo. Com efeito, os
municípios possuem habitualmente estruturas pesadas em custos fixos e torna-se muito difícil
reduzir de uma forma célere a despesa corrente, sob pena de se inviabilizar o desenvolvimento das
atividades e funções autárquicas.
5.7. Apesar do elevado peso das despesas correntes, com carácter de obrigatoriedade, esses municípios
podem reduzir determinado tipo de despesas, se fixadas na base zero. Entre essas despesas, ressaltam
as relacionadas com o pessoal, horas extraordinárias, ajudas de custo, os contratos de tarefa ou
avença e os apoios ou subsídios atribuídos a entidades ou associações.
5.8. Algumas das vantagens da aplicação do OBZ prendem-se, por um lado, com o facto de não ser
necessário aplicá-lo a todas as funções, departamentos e divisões. A título experimental poderá ser
aplicado só a uma ou mais unidades orgânicas e se se obtiver sucesso, poder-se-á estender a todos
os demais departamentos e divisões. Por outro, o OBZ pode mostrar-se como um instrumento útil
na alocação de recursos pelos diversos departamentos, tendo em conta a necessidade da definição de
priorização das atividades, a participação da gestão na tomada de decisões e ainda das eventuais
compensações que daí podem advir e a ser utilizadas entre programas e ações.
5.9. Também a participação e responsabilização dos responsáveis na elaboração dos orçamentos pode
conduzir à melhoria acentuada da sua qualidade, porquanto cada um terá que justificar os gastos que
pretende realizar nos próximos anos e, também a uma melhor compreensão dos objetivos, racional
alocação de recursos e melhoria dos canais de comunicação. Contudo, as principais desvantagens do
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OBZ, focam-se no facto de ocupar demasiado tempo e exigir muito trabalho, ao mesmo tempo que
prejudica a gestão corrente diária, face ao elevado volume de trabalho burocrático.
5.10. Cerca de 2/3 dos mecanismos de ajuda com vista à recuperação financeira dos municípios foi
ineficaz, entre os quais se incluem o PAEL e o FAM, pelo que se poderá inferir da sua limitada
oportunidade, inadequação e ineficácia, tornando-se necessário monitorizar e avaliar os resultados
obtidos e adotar um novo instrumento alternativo, com maior impacto na resolução da situação dos
desequilíbrios financeiros latentes, tal como o OBZ que não tem em consideração o que ocorreu no
passado.
5.11. Saliente-se que Silveira (2007) afirmou que a flexibilidade é um benefício do OBZ, uma vez que
“pode ser implementado tanto em partes como em todo, em entidades administrativas isoladas, ou
em todo o setor público.”, o que vem confirmar que a sua aplicabilidade aos municípios
financeiramente desequilibrados poderia ser compatível com outros sistemas de administração,
como sejam, a lei das finanças locais e a lei de enquadramento orçamental. Mais concluiu que o
OBZ “pode ser usado em quaisquer atividades, funções, ou operações em que se possa identificar
uma relação custo/benefício – mesmo que esta avaliação seja altamente subjetiva.”, vantagem que
permite identificar prioridades em matéria de pacotes de decisão.
5.12. A este respeito, Bruni e Gomes (2010), referindo-se à necessidade de atualmente ser fundamental
a existência de um controlo mais rigoroso dos custos e das receitas, afirmou que “estudos mostram
que a implementação do OBZ nas organizações tem trazido resultados de redução de custos da ordem
de até 25%, consequentemente aumentando a rentabilidade.”, facto que contraria a ideia que o OBZ,
apresenta muitos argumentos no plano teórico, mas que falha quando levado à prática.
5.13. Por outro lado, só a adoção de medidas tão eficazes como a estatuída no art.º 153.º da LOE para
2014 – Previsão orçamental de receitas das autarquias locais na venda de imóveis, poderão contribuir
para alterar a prática sistemática de empolamento das receitas, de forma a viabilizar os necessários
ajustamentos orçamentais e, consequentemente, a redução da despesa pública, compatibilizando-a
com o nível de arrecadação das receitas.
5.14. Face à desatualização e falta de uma perspetiva estratégica do POCP e do POCAL, o SNC-AP,
poderá revelar-se como um instrumento adequado no sentido de poder vir a eliminar as
fragmentações e inconsistências existentes nos sistemas de informação setoriais públicos,
permitindo aliar a contabilidade orçamental, tão vital em matéria de acompanhamento e controlo da
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gestão das entidades públicas e dos municípios, a uma contabilidade financeira e a não menos
importante contabilidade de gestão.
5.15. A terminar, de referir que como o conceito de compromisso previsto no SNC-AP, é idêntico ao
estabelecido na LCPA, os cerca de 33 municípios que nunca evidenciaram fundos disponíveis
positivos, durante os últimos 4 anos, vão continuar a violar os requisitos legais em matéria de
compromissos, sejam eles pontuais ou permanentes, situação que irá prejudicar a contabilidade e
relato orçamental previstas no SNC-AP.
6 – Referências Bibliográficas
Bruni, A., & Gomes, S. (2010). Controladoria Empresarial – conceitos, ferramentas e desafios.
Salvador-BA: EDUFBA.
Alveirinho, F. (2007). Sobre a aplicabilidade do Orçamento Base Zero (OBZ) às Autarquias Locais.
GESTIN: Revista da Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico de Castelo Branco. Ano III,
4/5, p. 237-242.
Cravinho, J. (2000). Um contributo pessoal para um novo paradigma de organização e gestão da
Administração Pública. 2.º Encontro do INA, Lisboa.
Simões, B. (2010). Governo quer Câmaras Municipais com Orçamento Base Zero. Jornal Negócios.
Ferreira, E., & Oliveira, A. (2014). O Fundo de Apoio Municipal e o Princípio da Autonomia Financeira
das Autarquias. Questões Atuais de Direito Local, 01, p. 61-80.
Jorge, S. (2001). O Interesse do Orçamento de Base Zero (OBZ) para o Sector Público – Porquê o OBZ
ainda está “vivo” no Sector Público?, Revista da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas (TOC),
20, p. 34 - 39.
Moreno, C. (2014). Orçamento Base Zero. Jornal i.
Pyhrr, P. (1981). Orçamento Base Zero – Um instrumento administrativo prático para avaliação das
despesas. Rio de Janeiro: Editora Interciência
Silveira, M. (2007). Orçamento Base Zero e a Aplicação do Cota Base Zero. Porto Alegre: Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Administração.