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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Contribuições do letramento crítico para o ensino de
língua inglesa na escola pública
Claudiney Alfredo Pimenta1
Alessandra Coutinho Fernandes2
RESUMO Este artigo tem como objetivo apresentar e comentar o projeto que elaborei e implementei em uma escola pública no estado do Paraná, como pré-requisito do Programa de Desenvolvimento Educacional do Paraná (PDE), do qual participei no biênio 2013-2014. O projeto que desenvolvi visava investigar como o trabalho com o letramento crítico em aulas de língua inglesa poderia contribuir para o ensino dessa língua em escolas públicas. O referencial teórico que embasou o projeto que desenvolvi, e sobre o qual comento neste artigo, é o letramento crítico. Na perspectiva do letramento crítico, o professor, juntamente com os alunos, tem o papel de desconstruir pressupostos sobre as várias narrativas presentes no dia a dia. Na ótica do letramento crítico, os questionamentos são persistentes e procuram investigar como as verdades são construídas. Portanto, há um processo de desconstrução, no ambiente escolar. Nesse processo, criam-se novas perguntas, gerando novas dúvidas (Edmundo, 2012). Ao implementar meu projeto no Colégio Estadual Alfredo Chaves, para alunos do 9º ano do ensino fundamental, pude perceber que os alunos apresentaram mais entusiasmo nos debates e leituras propostos no projeto e mostraram-se gradativamente mais interessados no aprendizado da língua inglesa. Introdução
Conforme o site do dia a dia educação, o PDE – Programa de
Desenvolvimento Educacional do estado do Paraná – é regulamentado pela Lei
Complementar no 130, de 14 de julho de 2010, e estabelece o diálogo entre os
professores do ensino superior e os da educação básica, através de atividades
teórico-práticas orientadas. O objetivo do PDE é proporcionar aos professores da
rede pública estadual de ensino subsídios teórico-metodológicos para o
desenvolvimento de ações educacionais sistematizadas, que resultem na produção
de conhecimento e em mudanças qualitativas na prática escolar da escola pública
paranaense.
O PDE tem duração de dois anos e é composto por quatro etapas. Na
primeira etapa do programa, os professores elaboram um projeto de intervenção
pedagógica, que deverá ser, posteriormente, implementado na escola pública
1 Colégio Estadual Alfredo Chaves, professor. 2 Universidade Federal do Paraná, professora.
estadual em que trabalham. Na segunda etapa do programa, os professores
elaboram as atividades que aplicarão aos alunos durante a implementação do
projeto. Durante essas duas primeiras etapas, os professores participantes do PDE
ficam integralmente afastados de suas atividades de sala de aula. No segundo ano
do programa, os professores retomam 75% de suas atividades nas escolas em que
trabalham, dedicando os 25% restantes às atividades relacionadas ao PDE. Dessa
forma, na terceira etapa do programa, os professores trabalham na implementação
de seus projetos e coordenam seus GTRs – Grupos de Trabalho em Rede. Por fim,
na quarta e última etapa do programa, os professores dedicam-se à elaboração de
artigos acadêmicos sobre os projetos que desenvolveram.
Como professor PDE no biênio 2013-2104, escolhi desenvolver meu projeto
na linha de estudo intitulada: os gêneros discursivos e textuais, leitura e produção
textual e oralidade em sala de aula, com foco na noção de língua inglesa como
atividade social, histórica, cultural e cognitiva. Minha fonte de inspiração foi a
necessidade de lidar com os desafios que enfrento como professor de inglês em
uma escola pública no município de Colombo, no Paraná.
Como referencial teórico para meu projeto, adotei a perspectiva do letramento
crítico (LC), que compreende a língua como prática social. Dentro dessa
perspectiva, busca-se superar abordagens de ensino da língua inglesa que
demonstram preocupação apenas com a decodificação e a repetição de estruturas
linguísticas ensinadas, muitas vezes, de forma descontextualizada da realidade do
aluno e sem nenhuma preocupação com a formação crítica do cidadão.
Neste artigo, comento sobre o projeto que desenvolvi com base no LC, sobre
sua implementação e sobre as discussões que tive com outros professores da rede
pública no GTR que coordenei.
Pressupostos teóricos do letramento crítico
Nos últimos anos, os inegáveis avanços tecnológicos, sociais e econômicos
ocorridos em nossa sociedade cada vez mais globalizada tornou o ensino de inglês
um constante desafio para os professores das escolas públicas. Por esse motivo, o
professor de inglês precisa estar cada vez mais preparado, e um aspecto que pode
contribuir fortemente para que esses professores tenham uma melhor compreensão
de suas práticas pedagógicas é o conhecimento e o estudo de métodos e
abordagens de ensino que embasam tais, competências e conhecimentos, assim
como suas relações com a sociedade e o tempo que vivemos (Vilaça, 2008, p. 73).
No entanto, de acordo com Motta (2008, p. 6), observando o cotidiano das
salas de aula, verifica-se que muitas abordagens de ensino de língua inglesa ainda
priorizam tão e somente a decodificação e repetição de estruturas, com pouco ou
nenhum significado para nossos alunos, sendo muitas vezes utilizadas de forma
descontextualizada da realidade em que estes vivem. Conforme os PCNs -
Parâmetros Curriculares Nacionais (1998, p. 54), o estudo repetitivo de palavras e
estruturas apenas resultará no desinteresse do aluno em relação à língua
estrangeira.
De acordo com Leffa (2008, p. 16) embora os PCNs não proponham uma
metodologia específica de ensino de línguas, sugerem uma abordagem
sociointeracional, com ênfase no desenvolvimento da leitura, que se justifica pelas
necessidades dos alunos e condições de aprendizagem.
Diante deste quadro, adotar uma nova postura pedagógica frente aos
desafios que surgem na sociedade atual e assumir a responsabilidade de
desnaturalizar os discursos hegemônicos é uma atitude de intervenção na nossa
sociedade. O letramento crítico (doravante LC) entende a linguagem como discurso,
rejeitando a ideia de linguagem como uma mera estrutura linguística fixa, neutra e
descontextualizada. No LC, a linguagem passa a ser vista como um fenômeno
carregado de significados sócio culturais e históricos; e se configura de forma
heterogênea, complexa e plural. Para Bakhtin (1998, p. 95 apud DCEs, 2008, p. 55),
“a palavra está carregada de um conteúdo de um sentido ideológico ou vivencial. É
assim que compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam
em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida”.
Freire (2005, p. 151 apud Menezes, 2011, Menezes) fala de maneiras
‘ingênuas’ de ler o mundo baseando-se no sentido comum, onde os significados são
tomados como dados e incontestáveis e representam uma forma de saber elaborado
a partir da “experiência”. Segundo Freire (2005, 157 apud Menezes) no processo de
desenvolvimento da percepção crítica, passa-se da consciência do senso-comum,
para a consciência da conexão e da diferença entre estar no mundo e estar com o
mundo.
De acordo com Menezes (2011), na concepção do letramento não se deve
apenas entender como o texto está no mundo; é preciso também entender como o
texto e a leitura do texto estão com o mundo, nos termos de Freire. Sendo assim,
tanto o autor de um texto quanto o leitor são produtores e construtores de
significação através da linguagem. Ou seja, nossos significados e valores têm
origem nas coletividades e no mundo a que pertencemos. Portanto, uma análise
crítica é aquela que focaliza a origem histórica dos significados que atribuímos a
textos e das leituras que produzimos, enquanto autores e leitores de textos.
Na perspectiva do letramento crítico, aulas de língua inglesa devem ser um
espaço em que os professores desenvolvem atividades que possibilitam aos alunos
uma reflexão crítica de sua própria identidade em relação à sociedade diversa,
assim como uma reflexão crítica do mundo. Ou seja, o ensino de língua inglesa, sob
a ótica do letramento crítico, possibilita ao sujeito perceber-se como integrante e
participante da sociedade.
O ensino da língua inglesa na sociedade contemporânea requer o
aprofundamento dos usos específicos da língua inglesa pelos aprendizes não-
nativos. Segundo Edmundo (2012, p. 48), McKay (2002, p. 103) aponta
a necessidade dos educadores apropriarem-se da LI numa perspectiva local para delinearem pedagogias que sejam adequadas aos seus contextos de ensino. O argumento de McKay a favor da construção de práticas pedagógicas locais de ensino é que a visão de inglês como língua internacional reforça generalizações, inclusive no tocante às metodologias de língua. Esta visão, segundo a autora, desconsidera as particularidades dos sujeitos, alunos e professores dos diferentes contextos, e reflete uma visão de cultura como uma entidade homogênea e fixa de uma região específica.
Sendo assim, na abordagem do LC, é preciso levar em consideração as
diferenças individuais de cada aluno – diferenças tais como gênero, faixa etária,
assim como o conhecimento de mundo que o aluno possui e as características
locais, regionais e culturais do contexto social em que o aluno está inserido.
Levando em consideração tais diferenças, os professores abrem espaço para que
seus alunos expressem diferentes interpretações acerca dos temas discutidos
durante as aulas de inglês.
De acordo com os PCNs (1998, p. 72), deve-se enfatizar, inicialmente, o
conhecimento do aluno e os tipos de textos com os quais esteja mais familiarizado
como usuário de sua língua materna, para facilitar seu engajamento discursivo. Os
conteúdos também devem ser abordados, considerando-se a diversidade de
contextos de vida das crianças brasileiras. Levando-se em consideração tais
necessidades especificas, o professor saberá determinar quais os conteúdos mais
apropriados, principalmente no que se refere ao conhecimento de mundo dos
alunos.
Conforme as DCEs (2008, p. 56), além de desenvolver a proficiência
linguística dos alunos, o ensino das línguas estrangeiras modernas deve também
contribuir para a formação de cidadãos críticos e transformadores da realidade que
os cerca.
A teoria social crítica, que visa à formação de um cidadão crítico e
transformador, postula que os significados são sempre contestáveis e estão
relacionados a lutas sociais decorrentes da posse desigual de conhecimento de
poder. Segundo Edmundo (2012, p. 66), a teoria social crítica acredita que as
desigualdades podem ser expostas através da crítica e reconstruídas, por meio da
linguagem. Ou seja, através de atividades propostas em sala de aula, o professor
pode levar o aluno a refletir sobre crenças, atitudes e valores que colaboram para a
permanência de desigualdades sociais e, então, propor novos mecanismos para
construção de uma realidade social menos desigual.
Na perspectiva do letramento crítico, o professor, juntamente com os alunos,
tem o papel de desconstruir pressupostos sobre as várias narrativas presentes no
dia a dia. Na ótica do letramento crítico, os questionamentos são persistentes e
procuram investigar como as verdades são construídas. Portanto, há um processo
de desconstrução, no ambiente escolar. Nesse processo, criam-se novas perguntas,
gerando novas dúvidas. Nessa visão, o questionamento passa a ser compreendido
como um estímulo de busca de novas perspectivas e realidades construídas, não
simplesmente descritas (Edmundo, 2012, p. 69 e 70). O letramento crítico permite ao
sujeito conhecer e ser capaz de analisar a língua estrangeira como uma prática
social.
Entender a linguagem como prática social pressupõe compreender que há
uma relação dialética entre linguagem e sociedade. Ou seja, questões sociais são
também questões discursivas e vice-versa. Segundo as Diretrizes Curriculares
(2008, p. 53) (...) o ensino de língua inglesa deve constituir um espaço em que o aluno reconheça e compreenda a diversidade linguística e cultural, de modo que se envolva discursivamente e perceba as possibilidades de construção de significados em relação ao mundo que vive. Espera-se que o aluno
compreenda que os significados são sociais e historicamente construídos e, portanto, passíveis de transformação na prática social.
É importante que o professor entenda que o discurso se realiza na prática
social através de uma infinidade de textos – orais, escritos, visuais – que se
manifestam em diversos contextos sócio-históricos. Portanto, é válido desenvolver
trabalhos com gêneros discursivos variados em sala de aula.
O trabalho com diferentes gêneros leva os alunos a perceberem a língua
como uma “arena de conflitos” (BAKHTIN, 1999, apud Edmundo, 2013, p. 158). Isto
porque tal trabalho favorece a percepção de que os significados não estão latentes
na estrutura da língua (Edmundo, 2013, p. 158). Ou seja, precisam ser analisados
criticamente e contestados.
Assim, o trabalho pedagógico, sob a ótica do letramento crítico, configura-se
como uma abordagem pedagógica que visa a uma leitura crítica de mundo. O
letramento crítico debruça-se sobre o caráter ideológico da língua, sendo o
desenvolvimento da consciência crítica do mundo seu principal objetivo. No
letramento crítico, a língua assume um caráter libertador, pois é pelo intermédio da
crítica aos significados imbuídos no discurso e pela criação de um discurso
alternativo que se dá a construção de um cidadão consciente (CERVETTI;
PARDALLES; DAMICO, 2001 apud VALERIO, 2013). Em outras palavras, no
letramento crítico, o aluno aprende a língua para transformar a si mesmo e a
sociedade. Em última instância, conforme Valério (2013), o letramento crítico é um
instrumento de poder e transformação social.
Elaboração da produção didático-pedagógica
Durante a elaboração da produção didático-pedagógica, que ocorreu no
segundo semestre do ano de 2013, preocupei-me em produzir um material
fundamentado na concepção teórica do LC, levando em consideração fatores como
a necessidade de abordar um conteúdo que fizesse parte do contexto em que os
alunos estivessem inseridos, para então, escolher um tema que fosse adequado à
realidade social e local dos alunos. Por isso, antes de produzir o material, fiz uma
pesquisa de campo por amostragem com base em um questionário que visava
observar os temas de maior interesse dos alunos em duas turmas de 8º ano do
ensino fundamental – no total, 52 alunos do Colégio Estadual Alfredo Chaves, onde
leciono e onde, posteriormente, fiz a implementação do meu projeto, participaram da
pesquisa.
Para minha pesquisa de campo, elaborei um questionário em que perguntei
se os alunos gostavam de inglês, se eles tinham facilidade em aprender, se os
agradava o método utilizado pelo professor de inglês, quais os temas que eles
gostariam que fossem abordados nas aulas de inglês, qual era a matéria que eles
mais gostavam, entre outros pontos. Eu sugeri alguns temas amplos como cultura,
tecnologia, ética, saúde, esporte, tecnologia, etc. Após conferir os resultados, pude
observar que 36% dos alunos disseram que gostariam de estudar tecnologia, 29%
esporte, 15% cultura, 8% ética e cidadania, 6% saúde, 4% meio ambiente, 2%
outros. Quando perguntados sobre sua matéria preferida, 33% responderam
Educação Física, 12% ciências, 12% história, 12% artes, 10% língua portuguesa,
9% língua inglesa, 8% matemática, e 1% geografia. Como podemos perceber, entre
os alunos pesquisados, os resultados mostraram que a maioria gostaria que fossem
abordados temas como tecnologia, esporte e cultura nas aulas de inglês.
Com base nos dados colhidos, confeccionei minha produção didática, sob a
forma de uma unidade temática, contemplando os temas esporte e cultura, que
estavam entre os mais votados pelos alunos. Como teríamos a Copa do Mundo no
Brasil em julho de 2014, todos os textos dessa unidade temática foram escolhidos
de forma a incluir apenas questões sobre "The 2014 World Cup in Brazil", reunindo
textos com diferentes posicionamentos em relação ao tema. Acho que foi uma
decisão acertada para testar as contribuições do LC na escola pública porque no
período da Copa os meios de comunicação abordaram amplamente o assunto – o
que foi muito positivo para nossas discussões em sala de aula.
Como acredito que o LC pode estar associado a uma abordagem
comunicativa, apesar de não ser meu foco, no material que confeccionei, além de
produzir exercícios de reflexão sobre os diversos discursos que circulam na
sociedade, e que valorizam os conhecimentos prévios dos alunos, também elaborei
atividades que desenvolvessem, tanto quanto possível, as habilidades linguísticas,
orais e escritas, de meus alunos.
Implementação do material pedagógico na escola
O material didático que elaborei como forma de intervir pedagogicamente na
escola em que trabalho – Colégio Estadual Alfredo Chaves – foi aplicado a alunos
do nono ano do ensino fundamental, que se disponibilizaram a participar do projeto
no contraturno das aulas regulares, durante o primeiro semestre do ano letivo de
2014.
As aulas foram ministradas no laboratório de informática da escola, no
período da tarde, de 06 de março à 10 de junho, às terças feiras, cumprindo as 32
horas de implementação previstas no projeto.
Inicialmente, considerei a possibilidade de implementar meu projeto
pedagógico em todas as turmas, no período da manhã. No entanto, devido ao
planejamento inicial das aulas que fora baseado no conteúdo do livro didático
escolhido pelos professores da escola, e ao número excessivo de alunos por turma,
resolvi aplicá-lo no contraturno.
Na primeira aula, expliquei aos alunos que o meu papel durante as aulas seria
o de professor mediador das discussões, e que as reflexões levantadas a respeito
do tema “The World Cup in Brazil” não se esgotariam em apenas uma reflexão com
base no senso comum, era preciso buscar reflexões mais críticas e aprofundadas
sobre o tema. Dessa forma, estaríamos constantemente levantando
questionamentos sobre os temas a serem discutidos.
Durante a aplicação, foram utilizados diversos textos orais, escritos e
multimodais, com base no tema “The 2014 World Cup in Brazil”. Os textos
escolhidos apresentavam diferentes pontos de vista acerca do assunto, e foram
amplamente discutidos em sua relevância social, política e econômica.
A unidade temática que desenvolvi foi subdividida em quatro partes. A
primeira delas tinha como tema central a leitura de um texto jornalístico, publicado
no New York Times, intitulado “Brazil’s world cup winners Support protests”. Nessa
subtemática, antes de trabalhar com o texto, reproduzi um vídeo postado pelo
Deputado Romário, em que este apoiava os protestos pacíficos ocorridos no ano de
2013 e criticava os gastos excessivos com a copa. Após o trabalho com o vídeo,
lemos o texto “Brazil’s world cup winners Support protests”, que mencionava as
críticas do deputado e salientava a preocupação do autor do texto com os protestos
ocorridos no país que iria sediar a Copa do Mundo.
A segunda parte trazia um vídeo, intitulado “The 2014 FIFA World Cup is
coming!”, que tinha um posicionamento diferente em relação ao primeiro texto. O
vídeo trabalhado nessa segunda parte possuía o objetivo de divulgar uma
propaganda da FIFA sobre a Copa do Mundo, e mostrava as belezas naturais do
Brasil e um pouco da nossa cultura. Nesse vídeo, jogadores de futebol famosos
como Neymar, Julio Cesar, David Luiz, entre outros diziam em português frases
impactantes, com legendas em inglês tais como: “The World Cup has a Brazilian
Face”, “Brazil is the Country of Football”, entre outras.
O terceiro texto que trabalhamos foi um vídeo um vídeo do youtube em que
uma jovem, chamada Carla, nascida no Brasil e residente no exterior, fazia um
discurso acalorado e expunha os motivos pelo qual não iria à copa do mundo no
Brasil, revelando um posicionamento diferente do segundo texto.
O quarto texto tratava de um trecho da reportagem “Brazil might not be ready
to host the 2014 World Cup and the Olympic Games”, em que o autor, Stephen
Wade, mostrava uma preocupação quanto à estrutura do Brasil para receber um
evento de grande porte como a copa do mundo, dando como exemplo o incidente
ocorrido com o Papa Francisco em 2013. Durante a breve estada do Papa no Brasil,
uma multidão de fieis cercou seu automóvel, impedindo seus agentes de segurança
de ajudá-lo diante de tal circunstância.
Ao iniciar cada uma dessas partes, eu propunha um warm up, que consistia
em um debate que visava valorizar o conhecimento de mundo dos alunos, assim
como suas crenças e valores em relação aos diversos temas trabalhados nos textos
alvo. Após o warm up, eu solicitava ao grupo que fizesse um círculo ao meu redor.
Durante a leitura do texto e ao assistirem os vídeos, pedia que fossem destacando
palavras e expressões que pudessem ajudá-los na compreensão do texto/vídeo,
como números, nomes próprios, verbos, palavras parecidas com o português, e
palavras-chave para a compreensão do texto/vídeo. Especificamente, após trabalhar
com os textos, dividia a turma em pequenos grupos e pedia que eles lessem
novamente o texto e respondessem as perguntas dos exercícios relativos à
compreensão do texto.
Cada uma das partes em que estava subdividida a unidade temática que
elaborei terminava com uma atividade de produção escrita. Como eu trabalhei com
alunos do nono ano, não determinei que os alunos produzissem seus textos em
inglês, mas motivei-os a pelo menos a tentar, com a ajuda de dicionários e recursos
tecnológicos. O objetivo dessa atividade era sistematizar toda a informação e
reflexão proporcionadas durante os debates feitos em sala.
A título de exemplo de como se dava o andamento das aulas a partir da
perspectiva do LC, faço a seguir um relato da segunda aula em que eu reproduzi um
trecho do vídeo em que o Deputado Romário apoia os protestos ocorridos no Brasil
em junho de 2013 e critica os gastos excessivos com a Copa do Mundo. Após
reproduzir o vídeo, mediei uma discussão sobre os gastos com a Copa do Mundo e
os vários discursos presentes na mídia a favor ou contra o evento, dando como
exemplo as falas na mídia dos ex-jogadores de futebol, Ronaldo e Romário, que
apresentam opiniões divergentes em relação aos gastos com a Copa. Eu perguntei
a eles por que os discursos deles divergiam? Quem eles representam? E quais
seriam, na opinião deles, as vantagens e desvantagens do Brasil ser sede da copa
do mundo? Os alunos citaram como benefícios a melhoria da infraestrutura nos
aeroportos e a possível entrada de capital estrangeiro no Brasil. E como pontos
negativos citaram o gasto excessivo de recursos advindos do governo, que
poderiam ser direcionados a áreas como educação e saúde, e a carência de
investimentos nessas áreas.
Também levantei alguns pontos tais como qual seria a imagem do Brasil no
exterior e falei um pouco sobre a riqueza natural e cultural do Brasil. Percebi, em
alguns momentos durante a discussão, que alguns dos alunos tinham pouca ou
nenhuma informação sobre o tema Copa do Mundo, pois não acompanhavam os
noticiários.
O último texto que lemos foi “Brazil´s World Cup Winners support Protests”.
Iniciamos a leitura desse texto, destacando principalmente o título, que já dizia muito
sobre seu conteúdo. Pedi a eles que lessem cada parágrafo e destacassem as
palavras-chave que pudessem ajudá-los a entender o contexto. Pedi também que
fizessem os exercícios de “reading” e que assinalassem as questões relativas às
ideias principais e secundárias do texto. Depois, fiz novamente a leitura do texto com
os alunos durante a correção da atividade de reading.
Durante a implementação, percebi que o ensino a partir da perspectiva do LC,
propicia ao aluno a oportunidade de falar e de expressar suas opiniões. Aos poucos,
consegui conquistar a confiança dos alunos que foram adquirindo mais segurança
para se comunicar, tanto quanto possível, na língua alvo ao longo do processo.
Dentro do que pude experimentar, pareceu-me que o LC pode ser um grande
aliado do professor para formar alunos capazes de refletir criticamente sobre os
diversos discursos presentes na mídia e na sociedade. Durante a implementação de
meu projeto, percebi que os alunos aprenderam a respeitar a diversidade de
opiniões em sala e aos poucos começaram a perceber e questionar discursos
ideológicos que têm por finalidade levar as pessoas a reproduzirem determinadas
crenças e valores.
Contribuições do Grupo de Trabalho em Rede
Conforme o site do dia a dia educação, o GTR – Grupo de Trabalho em Rede
– consiste em uma atividade do PDE, que se caracteriza pela interação virtual entre
os professores PDE e os demais professores da Rede Pública Estadual, viabilizando
discussões teórico-práticas sobre as especificidades da realidade escolar. O GTR
também busca promover a inclusão virtual dos professores participantes como forma
de democratizar o acesso da Educação Básica aos conhecimentos teórico-práticos
específicos das áreas/disciplinas trabalhadas no Programa.
Na primeira fase do GTR que coordenei, socializei meu projeto de intervenção
pedagógica e compartilhei reflexões teóricas acerca do letramento crítico com meus
colegas. Entre os pontos que foram discutidos, posso citar: 1) pontos a serem
considerados na adoção da perspectiva do LC; 2) a contribuição do LC no ensino de
língua inglesa na escola pública; e 3) a viabilidade do projeto para o ensino da língua
inglesa na escola pública.
Entre os professores participantes, dois eram técnicos pedagógicos de ensino
de Língua Estrangeira Moderna – LEM nos Núcleos Regionais – NREs; havia
também uma professora pedagoga; os demais eram professores de inglês,
totalizando 09 participantes concluintes, interessados em conhecer e ou ampliar
seus conhecimentos acerca do letramento crítico.
Em nossas discussões, os professores participantes demonstraram
compartilhar da opinião de que devemos ensinar a língua inglesa sob uma
perspectiva mais crítica, contribuindo, assim, para tornar nossos alunos mais
reflexivos quanto aos discursos que circulam na mídia e na sociedade. Os
professores participantes também concordaram que é importante levar em conta os
conhecimentos prévios dos alunos, de forma que estes comecem a se perceber
como participantes ativos na sociedade e no aprendizado de LEM. No entanto, eles
apontaram que tornar o ensino de LEM significativo para nossos alunos não é uma
tarefa fácil, porque muitos de nossos alunos não vêem sentido no aprendizado da
língua inglesa. Em nossas interações online, pudemos perceber que aos poucos
estamos mudando essa cultura de que o inglês não é importante, e assim,
gradativamente, estamos despertando o gosto pelo aprendizado do inglês em
nossos alunos.
Na segunda fase do GTR, a fase da apreciação da produção didático-
pedagógica e reflexão sobre a relevância da produção didático-pedagógica para a
realidade da escola pública, refletimos sobre: 1) as contribuições da produção
didático-pedagógica para a prática em sala de aula, tomando como base a realidade
das escolas dos professores participantes; 2) a relevância da produção didático-
pedagógica para o ensino de língua inglesa nas escolas dos professores
participantes; e 3) a viabilidade da produção didático-pedagógica para o ensino da
língua inglesa nas escolas dos professores participantes.
Nessa segunda fase, destaco um importante questionamento levantado:
como dar uma aula, sob a ótica do LC, sem deixar de lado o ensino da estrutura da
língua inglesa? Discutimos que para não perder o foco do ensino da língua alvo, ao
trabalharmos com textos, devemos propor atividades de leitura, que ajudem os
alunos a compreender a ideia geral desses textos, sem necessariamente precisar
entender cada palavra isoladamente. Dessa forma, podemos utilizar algumas
estratégias tais como pedir aos alunos que leiam o texto rapidamente, em busca da
ideia principal do texto; podemos também perguntar a eles qual o vocabulário do
texto que eles conhecem, quais vocábulos se parecem com os da língua portuguesa
– de forma a dar confiança aos alunos para tentarem ler textos em inglês.
Concluímos que é importante que o professor tenha a percepção de que o aluno não
lê um texto em inglês de forma linear. Ele vai organizando a leitura do texto de
acordo com seus conhecimentos prévios da língua alvo e sua intuição. É importante
que o professor não perca o foco do ensino da língua estrangeira, pois o ensino de
língua a partir da perspectiva do LC não precisa estar dissociado do ensino da
língua alvo.
Na terceira e última etapa do GTR, pude socializar os avanços e desafios
enfrentados durante a fase de implementação pedagógica. No fórum, relatei e discuti
as experiências e os resultados parciais observados no desenvolvimento do meu
projeto na escola. Ensinar a língua inglesa ou qualquer outra língua estrangeira é
sempre um desafio para todos nós. Considero o LC, mais do que uma perspectiva
de ensino, uma postura que o professor deve ter em relação ao ensino de línguas.
Eu optei por relatar cada uma das aulas para que os professores pudessem sentir os
resultados do meu trabalho na prática e para que pudessem registrar suas
considerações sobre as possíveis melhorias na implementação do projeto a cada
aula.
No fórum, discutimos qual poderia ter sido o impacto e as
vantagens/desvantagens de ter implementado meu projeto no horário regular das
turmas. Se isso tivesse ocorrido, o projeto teria atingido um público muito mais
amplo, porém a não obrigatoriedade fez com que participassem os alunos que
realmente tinham vontade de aprender coisas novas, de participar das discussões,
ampliar as formas de conhecimento. Discutimos também como conforme os relatos
de aula a aula os alunos foram adquirindo mais confiança neles mesmos nos
debates e perdendo um pouco da vergonha de interagirem na língua inglesa.
Acredito que como fiz os relatos, aula a aula, foi mais fácil para os
professores visualizarem os avanços obtidos a cada dia, e posso dizer seguramente
que as considerações dos professores acerca da implementação contribuíram para
reforçar minha crença de que o LC pode e deve ser adotado em escolas públicas.
Considerações finais
Este artigo teve como objetivo relatar sobre o projeto que desenvolvi durante
minha participação no PDE, em que busquei investigar como o letramento crítico
pode contribuir para tornar o ensino da língua inglesa mais atraente e eficiente na
escola pública.
A implementação de meu projeto foi o ponto alto de todo o período de estudo
dedicado ao PDE. Acredito que essa etapa do processo me possibilitou alcançar
uma mudança significativa na minha postura como professor e na minha prática
pedagógica em sala de aula, já que me indicou novos caminhos possíveis para
tornar o ensino de inglês mais significativo e prazeroso para meus alunos.
Percebi que o ensino de inglês sob a perspectiva do LC, possibilitou aos
meus alunos o hábito de pensar criticamente e rever seus valores, crenças e
atitudes, no que diz respeito aos temas discutidos nos textos escolhidos.
De uma forma geral, o letramento crítico possibilita aos alunos se
questionarem como os diversos discursos que circulam na sociedade representam o
mundo a partir de determinadas perspectivas. No caso dos meus alunos, eles
aprenderam que esses discursos não são neutros, nem imparciais. Eles também
aprenderam a respeitar as opiniões dos colegas, e a valorizar suas próprias
opiniões, desenvolvendo a percepção de que elas podem ser mudadas a partir de
novas leituras e reflexões sobre o mundo, não havendo, portanto, verdades
absolutas. Ou seja, de certa forma, posso dizer que meus alunos aprenderam a ler
a sociedade em seu dinamismo; e isso tendo acontecido nas aulas de inglês
modificou positivamente a relação dos alunos com a disciplina.
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PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação.
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