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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
MAPAS CONCEITUAIS E EXPERIMENTOS:
POSSIBILIDADES NO ENSINO DA FÍSICA
Ariane Alves Amaral Augusto1
Silvio Luiz Rutz da Silva²
RESUMO: Este artigo apresenta a experiência da implementação do caderno
pedagógico “Mapas Conceituais e Experimentos: Possibilidades no Ensino de Física”,
produção didático-pedagógica integrante do Programa de Desenvolvimento
Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. O projeto de intervenção
pedagógica foi desenvolvido entre março e setembro de 2013 e implementado no
Ensino Médio em Blocos do Colégio Estadual Wolff Klabin, em Telêmaco Borba, no
primeiro semestre de 2014, propondo-se a estimular as práticas experimentais para
aperfeiçoamento da construção de conceitos físicos de Termodinâmica, além de utilizar
a escrita de mapas conceituais como objeto educacional e ampliar as possibilidades de
relação dos fenômenos físicos ao cotidiano do aluno, ou seja, contribuir com a
aprendizagem significativa. As atividades propostas foram desenvolvidas a partir dos
conteúdos de Termodinâmica, conforme o Plano de Trabalho Docente (PTD) da
segunda série do Ensino Médio, e estruturadas de forma a contemplar: explanação
inicial, construção de mapa conceitual inicial, desenvolvimento de prática experimental,
reescrita do mapa conceitual e síntese integradora, com a finalidade de que os alunos
pudessem relacionar os conteúdos de Física da segunda série com sua prática social,
desenvolvendo o gosto pela ciência física e melhorando o rendimento escolar.
PALAVRAS-CHAVE: Física. Experimentos. Mapas conceituais.
1. Introdução
Partindo da necessidade de refletir sobre as razões pelas quais os alunos
do Ensino Médio, na disciplina de Física, apresentam desinteresse e rendimento
insuficiente no Colégio Estadual Wolff Klabin, em Telêmaco Borba, Paraná,
Brasil, o presente artigo discute as possibilidades da utilização de metodologias
alternativas ao famoso “quadro e giz”, que aliado a matematização dos
conteúdos, tem impedido a maioria dos alunos do ensino médio a vislumbrar a
disciplina de Física como parte de sua prática social.
1 Graduada em Matemática; Esp. em Didática e Metodologia do Ensino e Mídias Integradas na Educação; Professora PDE/SEED 2013 na disciplina de Física; [email protected] ² Prof. Dr. em Ciência dos Materiais; DEFIS/UEPG; [email protected]
Ao buscar conhecimentos prévios, interesses dos alunos e desenvolver a
construção de conceitos físicos por meio de mapas conceituais e atividades
experimentais, discute-se aqui a possibilidade de melhorar a qualidade das aulas
e o rendimento dos alunos da segunda série do ensino médio.
Foi evidenciado no decorrer da implementação do Caderno Pedagógico
“Mapas Conceituais e Experimentos: Possibilidades no Ensino de Física”, no
primeiro semestre de 2014, que a utilização de práticas experimentais que
relacionam o conteúdo da disciplina e o cotidiano dos alunos, assim como a
escrita de mapas conceituais são alternativas metodológicas possíveis e que
podem em alguma medida auxiliar os professores no processo ensino
aprendizagem do conteúdo estruturante Termodinâmica.
A grande maioria dos professores de Física da Rede Pública Estadual
paranaense considera, a partir de reflexões sobre as Diretrizes Curriculares
Orientadoras da Educação Básica, que a experimentação é “mais um
componente, não o único, na implementação de uma proposta de ensino
centrada no conhecimento.” (DCOE – Física, p. 74).
É consenso ainda entre os professores e pesquisadores que as atividades
experimentais podem – e devem – também relacionar os conceitos da disciplina
a partir de aspectos cotidianos. Contudo, ao considerar a necessidade de
relacionar os conceitos estudados ao cotidiano, por vezes, na busca de
significação para os conteúdos, muitos dos professores, acabam confundindo
aprendizagem significativa com contextualização do conteúdo.
Ao buscar as relações entre o conteúdo e o cotidiano dos alunos, não se
pode minimizar a realidade de que o conhecimento historicamente produzido não
“cabe” no cotidiano. Essa discussão é feita por Santos (2005, p. 59), que diz:
“limitar-se a discutir aspectos do cotidiano que interessam ao aluno, é negar-lhe
a possibilidade de ampliar horizontes.” Dessa forma, além de criar as metáforas
para que o conhecimento seja mais próximo do aluno o professor tem que
“cuidar” para não superficializar o conteúdo, esvaziando-o dos seus significados
científicos.
O desenvolvimento dos conteúdos de Termodinâmica, (assunto abordado
na segunda série, conforme a PPC do Colégio), sempre considerando suas
relações cotidianas pode “empobrecer” as possibilidades de relação entre o
conteúdo e o conhecimento prévio do aluno.
Por outro lado, para que se estabeleça aprendizagem significativa, há
necessidade de que o professor não apenas saiba que o educando traz um
conhecimento empírico, espontâneo, das suas relações cotidianas, mas também
que aguce as contradições dos alunos e localize “as limitações desse
conhecimento, quando cotejado com o conhecimento científico, com a finalidade
de propiciar um distanciamento crítico do educando, ao se defrontar com o
conhecimento que ele já possui” (DELIZOICOV, ANGOTTI e PERNAMBUCANO;
2002, p.199). É mister partir, de alguma forma, daquilo que o aluno sabe, quer
esteja cientificamente correto ou não.
Nesse sentido foi necessário estabelecer o diálogo com os alunos, de tal
modo que se possibilitasse aos mesmos a prática de resgatar conhecimentos,
de pesquisar, de solicitar maiores informações, de problematizar o conteúdo. Tal
procedimento se fez necessário, pois mesmo as construções científicas ou
conceitos aceitos como corretos, foram passíveis de questionamentos, e a
professora chamou atenção dos alunos para o fato de que não há verdades
absolutas, e que a Ciência está em construção. Não há nada pronto e acabado,
mesmo nas Ciências denominadas “exatas”.
A “aprendizagem significativa caracteriza-se pela interação entre o novo
conhecimento e conhecimento prévio” (MOREIRA e VEIT; 2010, p.89),
conhecimento este que por vezes não é “encontrado” por meio das práticas
pedagógicas comumente utilizadas. Dessa maneira se propôs que a construção
de mapas conceituais fosse aliada do professor e dos alunos na “descoberta” de
caminhos de aprendizagem mais eficazes e significativos.
1.1. Sobre os mapas conceituais
Os mapas conceituais foram utilizados nessa proposta como objeto
educacional, pois a elaboração de mapas conceituais são uma estratégia para
elencar os conhecimentos prévios ou espontâneos dos alunos com relação aos
conceitos sendo estudados, possibilitando que os alunos reflitam sobre seus
próprios processos cognitivos, resultando em uma aprendizagem significativa.
(MOREIRA e VEIT; 2010, p.101).
Para que se efetivasse uma aprendizagem significativa, levou-se em
consideração, pelo menos três condições no preparo das aulas (conforme
NOVAK e CAÑAS, 2010):
1. O material a ser utilizado devia ser conceitualmente claro e
apresentado com linguagem e exemplos relacionáveis com o
conhecimento anterior do aprendiz.
2. O aprendiz devia possuir conhecimento anterior relevante.
3. O aprendiz precisava ter vontade de aprender de modo significativo.
A construção dos mapas conceituais permitiu ao professor visualizar as
relações que os alunos já realizavam, assim como propiciou a terceira condição,
despertando no aluno a vontade de aprender, a partir do momento em que se
envolveu na construção dos mapas.
Considerando Almeida (2004, p.23), que nos diz que quando permitimos
que os alunos expressem suas ideias, por escrito ou oralmente, eles vão criando
sobre o que aprendem, e tomam consciência do que aprenderam, e que o
professor por sua vez, é capaz de compreender se o que os alunos estão
transmitindo é resultado de um processo de aprendizagem significativo.
Nesse sentido, vale ressaltar as ideias do professor Marco Antonio
Moreira (2005):
Os conhecimentos prévios dos alunos são explicações que são reformulações da experiência. Tais explicações podem ser aceitas no contexto cientifico ou não. No primeiro caso, são válidas por que atendem aos critérios de validade da ciência; no segundo, podem ser validas porque são aceitas no cotidiano. Então, ambas são validas dependendo de onde são aceitas. E essas explicações se dão na linguagem.
Portanto, foi importante que a professora estivesse atenta as expressões
escritas e explicadas oralmente pelos alunos na construção dos mapas, pois
estas podiam indicar conceitos que foram (ou não) aprendidos.
Para que a elaboração dos mapas conceituais na sala de aula pudesse
auxiliar a professora a compreender quais as relações que seus alunos eram
capazes de fazer sobre os conteúdos estudados, a atividade foi realizada de
acordo com o seguinte roteiro (adaptado de NOVAK e CAÑAS; 2010):
Iniciar com uma área de conhecimento que seja bastante familiar aos
alunos que irão elaborar o mapa conceitual;
Criar um contexto (texto, atividade, problema, imagem, filme, etc.) no qual
se possa estabelecer a questão focal, ou seja, o conteúdo que se
pretende explorar;
Identificar conceitos-chave que se aplicam a esse domínio. O ideal é que
se escrevam entre quinze e vinte e cinco conceitos – partindo do mais
geral e inclusivo para o mais específico e menos geral;
Elaborar um mapa conceitual preliminar. Os conceitos listados
anteriormente podem, ou não, serem todos utilizados e uma sugestão é
escrevê-los em “post-it”;
Revisar o mapa preliminar (o que envolve adicionar e/ou suprimir
conceitos);
Buscar ligações cruzadas, isto é, identificar o modo como se relacionam
todos os conceitos;
Estabelecer palavras que interliguem conceitos;
Identificar e escolher e as ligações cruzadas mais evidentes e úteis;
Finalizar o mapa posicionando os conceitos com clareza em uma
estrutura estética pra apresentação final.
É importante destacar que não existe um “mapa certo”, um “modelo” ou
“base” para construção de qualquer mapa conceitual, pois cada um dos mapas
construídos em sala de aula no contexto dessa proposta foi interpretado como
uma das muitas possíveis representações de um conceito.
Após as interferências, análises, descrições, sínteses de atividades
experimentais e produção de novos mapas conceituais, pode-se confrontar o
conhecimento considerado como prévio ou espontâneo, com o conhecimento
científico apropriado construído no decorrer das aulas que resultaram da
construção inicial, ao se proceder a análise dos mapas.
1.2. Sobre as práticas experimentais
As práticas experimentais propostas tiveram como objetivo contribuir para
a construção do conhecimento, trabalhando com os conceitos de Termodinâmica
indicados pelo Plano de Trabalho Docente (PTD) para a segunda série do Ensino
Médio, extraído da Proposta Pedagógica Curricular da disciplina de Física do
Colégio Estadual Wolff Klabin em Telêmaco Borba.
Cabe aqui levar em conta a reflexão de Almeida (2004, p.30), que diz:
“Embora seja indispensável para uma boa aprendizagem da Física que um
estudante tenha aulas no laboratório, este tipo de aulas não é uma panaceia
universal, (...)”, ou seja, não tivemos a pretensão de ter nas aulas de laboratório
o “remédio” para todos os males da falta de rendimento dos estudantes na
disciplina.
Como afirmado anteriormente, a experimentação é um dos componentes
necessários à implementação de uma proposta de ensino cujo centro é o
conhecimento. Na busca desse conhecimento, o papel do componente
experimental, no processo ensino-aprendizagem, foi desenvolvido por meio de
atividades que permitiam ao aluno refletir e questionar. (DCOE Física 2008 p.
74; ROSA 2003, p. 25).
Nesse sentido, ao propor práticas experimentais, levou-se em
consideração que as mesmas deveriam partir das discussões sobre os
conteúdos, tendo em vista os conhecimentos prévios ou espontâneos dos
alunos, e foram problematizadas pelo professor, em conformidade com as
proposições das DCOE – Física (2008, p.73).
As DCOE - Física (2008) ainda indicam que a experimentação não deve
servir apenas para explicar um fenômeno físico, mas deve permitir aos
estudantes a formulação de hipóteses que expliquem as questões
problematizadas. Assim, conforme Rosa (2003): “o ensino experimental
apresenta uma significativa contribuição no âmbito da relação entre os conceitos
científicos e os conceitos cotidianos”, o que fortaleceu a construção do
conhecimento.
Pela realização de práticas experimentais no laboratório, tendo em vista
os protocolos e as preparações adequadas, os alunos foram desafiados a
aprender. Neste sentido, Almeida (2004, p. 31) descreve algumas atitudes para
se levar em consideração num trabalho realizado em laboratório:
À exposição prévia das ideias dos alunos que vão efectuar (sic) as
experiências;
À discussão dos tipos de montagens experimentais utilizados e dos
cuidados a ter nessas montagens, com vista aos resultados esperados e
às aproximações efectuadas (sic);
À abordagem consciente dos conceitos envolvidos na experiência;
À consequente realização experimental – efectuada (sic) nas condições e
com os cuidados que lhe são indicadas pelo professor;
Aos cuidados a ter nas medições e à noção de erro experimental;
À compreensão das observações efectuadas (sic), sejam estas as
previstas ou diferentes das previstas;
À consolidação de esquemas conceptuais correctos (sic) ou à eventuais
alterações a introduzir nos seus esquemas prévios de entendimento das
leis e dos conceitos físicos envolvidos na experiência em causa;
Tendo em vista que recentes pesquisas (TAKAHASHI e outros, 2013, p.7)
apontam que os estudantes têm uma expectativa positiva no que tange realizar
atividades experimentais para compreensão do conteúdo, pode-se constatar
entre os alunos uma aceitação positiva da proposta, inclusive por que alguns
deles nunca haviam realizado qualquer atividade experimental no laboratório do
colégio, e participaram ativamente de todas as propostas feitas.
2. A implementação e o debate com os professores da Rede Estadual de
Educação
Seguindo as estratégias definidas no pré-projeto, aliadas a
implementação desenvolvida com auxílio do caderno pedagógico “Mapas
Conceituais e Experimentos: Possibilidades no Ensino de Física”, as atividades
foram realizadas de acordo com o Plano de Trabalho Docente (PTD) e a
Proposta Pedagógica Curricular (PPC) do Colégio, conforme as Diretrizes
Curriculares Orientadoras do Estado (DCOE) do Paraná para a disciplina de
Física.
Tais atividades foram direcionadas no sentido de serem diversificadas,
motivadoras, possibilitando sempre a compreensão dos conteúdos por meio de
diálogo, construção de mapas e a reflexão sobre essa construção. Além disso,
houve participação ativa dos alunos nas atividades de laboratório, pois as ideias
foram aprimorando-se conforme se debatia a construção dos mapas de
conceitos, concomitantemente a realização das práticas experimentais, o que
permitiu que os conceitos fossem construídos e assimilados pela turma durante
o processo.
O apoio da equipe pedagógica do Colégio foi imprescindível para que a
implementação fosse um sucesso. Principalmente no que tange a logística de
aulas, falta de professores, trocas de horários e permissão para as “idas e
vindas” ao laboratório de Física, pois sempre que há movimentação dos alunos
em horários de aula há também os inconvenientes próprios dessa
movimentação, mas que sempre foram superados de forma positiva, não
havendo nenhuma ocorrência para registro.
Na verdade, o que se percebeu entre a equipe é que tal movimentação e
o deslocamento dos alunos ao laboratório foi uma inovação dentro do Colégio e
que despertou o interesse inclusive nos alunos de outras turmas, que não
participavam do projeto, mas sempre estiveram atentos ao que se realizava, e
solicitavam participar também.
Concomitante a implementação do projeto em sala de aula, no primeiro
semestre de 2014, houve a participação dos professores da Rede Estadual de
Educação do Paraná no curso de formação na modalidade a distância
denominado Grupo de Trabalho em Rede (GTR), no qual 17 professores
inscreveram-se para discutir a proposta “Mapas Conceituais e Experimentos:
Possibilidades no Ensino de Física”, o que enriqueceu a proposta sob vários
aspectos.
2.1. A utilização do laboratório
(...) as atividades desenvolvidas em laboratório necessitam de uma identificação não só com os elementos vinculados aos domínios específicos dos conteúdos, mas com questões de ordem social, humana, ética, cultural e tecnológica presentes na sociedade contemporânea. (ROSA, 2003, p.26)
Nessa perspectiva foram consideradas as atividades experimentais
propostas no Caderno Pedagógico que foi utilizado durante a implementação do
projeto, sempre relacionando-as aos conceitos físicos e aos conhecimentos
prévios dos alunos, suscitando discussões em sala de aula sobre as possíveis
relações com o meio social em que convivem.
Ressalta-se aqui que alguns dos alunos participantes do projeto, apesar
de serem alunos do colégio desde a 5ª série (6º ano) do ensino fundamental,
nunca estiveram no laboratório, nem nas aulas de ciências, nem no primeiro ano
do ensino médio.
Logo, na primeira aula no laboratório, foi necessário apresentar o espaço
para todos, declarar as regras básicas para permanência e utilização daquele
local, assim como deixá-los a vontade para explorar o ambiente, perguntar sobre
os equipamentos, contarem suas impressões, expectativas e ainda esclarecer
quaisquer dúvidas sobre os procedimentos.
Nas aulas seguintes foram realizadas práticas simples, como martelar
uma moeda e “embrulhar” um termômetro num cachecol de lã. Os alunos
preencheram uma tabela, na qual indicavam o que eles achavam que
aconteceria, antes que fosse realizada a prática (como investigação do
conhecimento prévio). Muitos se surpreenderam ao constatar que sua opinião
era completamente diferente daquilo que realmente acontecia, principalmente
quando a temperatura não subia no termômetro “embrulhado”, o que rendeu
muita discussão e a compreensão dos conceitos de calor e medidas de
temperatura (construção de conceitos cientificamente aceitos).
Como professora da Rede Estadual de Educação há quase 20 anos, a
utilização do espaço do laboratório, ou até mesmo da sala de aula, para a
realização das práticas experimentais propostas foi um desafio, mas a escolha
realizada para encaminhar metodologicamente a proposta empreendeu uma
mudança de postura da própria prática pedagógica, o que resultou um salto
significativo para compreensão das dificuldades dos alunos na construção de
conceitos cientificamente aceitos.
No GTR, alguns participantes indicaram que não utilizam o espaço do
laboratório em seus respectivos colégios por várias razões, das quais destacam-
se:
O número de alunos por turma é muito grande e é muito
complexo organizar atividades laboratoriais (MRSS)
De modo geral, todos os colegas participantes do GTR
consideraram que a utilização do laboratório é necessária, que
não há laboratórios devidamente equipados, que os professores
precisam ainda de mais formação nessa área, que muitos dos
que realizam atividades experimentais o fazem de forma
demonstrativa. (AM)
De acordo com a implementação realizada, percebeu-se que quando os
alunos são instigados a aplicar seus conhecimentos de maneira participativa,
“escolhendo” os conceitos a serem construídos nas aulas a partir de seus
conhecimentos prévios, desenvolvendo uma aprendizagem significativa, o
professor acaba rompendo com tais “fatalismos” (FREIRE, 2000, p.129).
Outro destaque, no que foi discutido entre os professores participantes do
GTR, foi que, ao levar os alunos ao laboratório, “deve-se ter cuidado com os
objetivos” (RV), no sentido de não ser apenas uma atividade estanque,
desvinculada do PTD da turma ou daquele conceito que se está construindo –
no caso do calor, por exemplo, rompendo com as teorias do flogístico e do
calórico.
De forma geral, na interação entre os colegas participantes ficou
evidenciada a relação que fazem entre o uso do laboratório e o aumento no
interesse e desenvolvimento do aluno na disciplina, por tornar as aulas
motivadoras e interessantes.
Comprovadamente houve uma melhora na participação e interesse,
principalmente quando realizou-se uma Mostra Cientifica, no final do mês de
maio, onde os alunos apresentaram diversas práticas experimentais
relacionadas a Termodinâmica, resultado de pesquisas que eles mesmos
realizaram, buscando materiais alternativos e relações entre as práticas
experimentais com os conceitos físicos estudados.
As turmas foram divididas em grupos menores, que ficaram responsáveis
pelo seu “stand” e o rodízio nas explicações e apresentações para todas as
turmas do Colégio (20 no período da manhã e 7 no período da tarde, perfazendo
aproximadamente 800 visitantes durante todo o dia da Mostra).
2.2. Aspectos cotidianos do conteúdo
Ao professor cabe contribuir para o desenvolvimento das capacidades dos alunos, (...) desafiando-os para que expliquem o que pensam estar a perceber, forçando-os a aplicar os conceitos e leis em causa a contextos diferentes, encorajando-os a discutir situações físicas diferentes, ou seja, guiando-os na utilização da física para a compreensão dos fenômenos do dia-
a-dia. (ALMEIDA, 2004, p.19)
A partir dessa reflexão, uma das primeiras atividades propostas para a
turma foi assistir a abertura de um famoso desenho animado: “Os Flintstones”, e
solicitar que os alunos discutissem as evoluções humanas desde a idade da
pedra. Nessa discussão, destacaram-se principalmente entre os alunos as
tecnologias da informação e comunicação, e foi necessária a intervenção da
professora para que se direcionasse aos conteúdos pretendidos dentro do PTD.
As discussões em sala de aula renderam uma infinidade de relações entre
a Física e o cotidiano dos alunos, desde as roupas que usam até a fabricação
de papel, uma realidade bem presente na vida dos telemacoborbenses, por
causa de uma fábrica de papel e celulose que é a principal atividade econômica
na região, instalada há mais de cem anos na cidade. Todo processo fabril é
complexo, mas a utilização de máquinas térmicas foi um “gancho” importante no
desenvolvimento do conteúdo.
Outro aspecto importante, que inclusive foi citado por uma participante do
GTR, foi a necessidade de situar o conteúdo trabalhado historicamente, nas
palavras dela:
Quando li o caderno temático, me chamou a atenção, logo no início, quando você cita que devemos falar sobre o aspecto cotidiano, mas não devemos parar aí, a Física é uma ciência e o conhecimento científico deve ser valorizado. O aspecto histórico do estudo da Termodinâmica é importante para isso. Este estudo alterou a história da humanidade! (CE)
Durante a implementação, o contexto histórico, principalmente no que
tange as teorias do calórico e flogístico e a diferença entre calor e temperatura,
foi amplamente discutido. Assim como a contextualização da Revolução
Industrial e as máquinas térmicas, onde foi discutido em sala de aula um episódio
da TV Escola (Legendas da Ciência: “Queimar” – disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=0-VlYTgXE9Y).
Ao realizarem as pesquisas para a Mostra Cultural realizada no Colégio,
os alunos procuraram relacionar as práticas experimentais com os conceitos
estudados, mas também indicaram em seus trabalhos as relações com o assunto
e sua prática social, enriquecendo suas apresentações com exemplos cotidianos
que desmistificaram a disciplina para muitos que passaram pelos stands
montados.
Vale ressaltar o depoimento de uma professora pedagoga do Colégio, que
relatou: “nunca imaginei a Física desse jeito”. Ela relatou ainda que, no “seu
tempo” nunca havia relacionado o conteúdo da disciplina considerada por ela, a
mais difícil de todas, com tantas situações cotidianas.
2.3. Mapas conceituais
Com relação a utilização dos mapas conceituais como objeto educacional,
a princípio foi realizada uma pequena oficina, nas primeiras aulas do início do
semestre, com o objetivo de apresentar os mapas conceituais como ferramenta
útil no processo de aprendizagem.
Dessa forma, o primeiro mapa construído foi geral, toda a turma foi
contribuindo e escrevendo no quadro de giz, tentando relacionar os conceitos
que haviam discutido em pequenos grupos e anotado em folhas de papel,
percebendo quais eram os mais relevantes e quais seriam descartados, num
processo que gerou uma boa primeira impressão.
Um dos participantes do GTR declarou que o mapa conceitual:
É uma ferramenta didática muito importante, mas o professor deve, antes de apresentar esse método, preparar exatamente o que será apresentado no mapa conceitual para não gerar dúvidas nos alunos. (RVWLF)
Porém num primeiro momento, ao contrário do que declarou o colega
participante do GTR, não há como nesse processo prever exatamente o que será
apresentado, embora durante as discussões fosse necessária a intervenção da
professora de forma a encaminhar os conceitos que seriam pertinentes ao
conteúdo escolhido para implementação do projeto.
Nas aulas que seguiram o desenvolvimento do projeto, ficou evidente que
alguns alunos tinham facilidade em relacionar os conceitos por meio de mapas,
enquanto que outros apresentaram muita dificuldade. Assim como comentou o
participante do GTR:
É normal que nos primeiros mapas apresentem bastante dificuldade, mas depois que eles entendem começam a gostar
e se interessam em fazer. (IGM)
Alguns dos professores participantes do GTR colocaram-se temerosos
com a utilização da ferramenta de mapas conceituais, pois não haviam ainda
estudado acerca do tema, nem tentado aplicar em nenhuma de suas aulas.
Assim começaram a considerar essa possibilidade, incentivados por outros
participantes que já utilizam os mapas conceituais como objetos educacionais e
relataram isso no fórum para o grupo, conforme segue um dos relatos:
Há um tempo desenvolvo as práticas com mapas conceituais com meus educandos, o ensino aprendizagem realmente ocorre de uma forma no qual o educando assimila de concretamente o ensino da física não ficando apenas no conceito abstrato e matemático da disciplina. (MRSS)
Assim, a cada conceito estudado, foram construídos mapas, às vezes
individualmente, no caderno, outras vezes de forma coletiva, no quadro de giz,
alguns, em pequenos grupos, apresentados em cartazes, mas de forma geral
sempre buscando atingir o máximo possível de relações entre conceitos que
foram se “avolumando” no decorrer das aulas, permitindo novas relações e
interpretações das práticas sociais a partir de conceitos científicos e não
empíricos.
2.4. Interdisciplinaridade
No decorrer da implementação, a professora de Química dos blocos
interessou-se em participar do projeto, pois os próprios alunos associaram o
conteúdo de termoquímica que ela estava desenvolvendo com o que estavam
aprendendo na disciplina de física. Desse modo, alguns alunos ao realizarem
sua pesquisa para realização de experimentos para a mostra do final do
semestre optaram por ressaltar a química e a ligação dessa com a disciplina de
física.
Essa interdisciplinaridade espontânea por parte dos alunos tornou as
pesquisas muito ricas em conteúdo, assim como estreitou os laços entre as
professoras que planejaram continuar seguindo essa metodologia no segundo
semestre e em anos vindouros.
Dessa forma, ressalta-se que esse trabalho extrapolou o que se havia
pensado nos momentos anteriores à implementação e o desenvolvimento do
projeto no ambiente escolar ganhou de toda comunidade escolar uma aceitação
positiva, inclusive com relatos de outros colegas que após participarem da
mostra e perceberem o envolvimento dos alunos expressaram o desejo de
participar conosco de uma próxima edição da mostra (pretendida para todo final
de semestre a partir de então).
2.5. Alunos inclusos
Outro fator que vale a pena destacar nesse artigo de conclusão do
Programa PDE, foi a inclusão de alunos com deficiência. Nas turmas de
implementação do Projeto, segundas séries do Ensino Médio em Blocos,
estavam matriculados uma aluna cadeirante, outra com sérias dificuldades de
locomoção (utiliza andador), um aluno surdo com laudo de déficit de
aprendizagem e mais uma aluna surda. Quatro alunos especiais em sua maneira
de ser, viver e principalmente, compreender ciência.
Toda classe é heterogênea por natureza, ainda mais tratando-se do
ensino médio em blocos do Colégio Estadual Wolff Klabin, que agrega alunos
oriundos das mais diversas regiões da cidade, e que tem, por princípios descritos
em seu Projeto Político Pedagógico, um olhar atento a diversidade e inclusão de
todos os alunos, com trabalhos de sensibilização e conscientização de todo
corpo docente dos desafios que essa escolha proporciona aos educadores.
Assim, ao desenvolver a implementação da proposta e deparar-se com
tal realidade, foram necessários alguns ajustes e adaptações para que os alunos
citados pudessem participar de todas as etapas planejadas. Destaca-se o
esforço das meninas com dificuldades de locomoção quando tínhamos aulas no
laboratório, pois precisavam da ajuda dos colegas, aguardavam a abertura de
um portão lateral exclusivo ao final da rampa de acesso, tinham que ficar na
bancada mais próxima da porta, entre outras questões logísticas, sendo que
nenhum desses “entraves” permitiu qualquer problema no desenvolvimento de
suas atividades.
Para os alunos surdos, um interprete em sala de aula permitia que os
assuntos abordados fossem tratados na linguagem de sinais (LIBRAS), e
algumas vezes percebia-se o esforço para compreenderem situações
específicas abordadas em sala de aula, mas assim como relatou a professora
LCRM, os pontos chaves em mapas conceituais ajudaram bastante:
Já trabalhei a alguns anos com várias turmas de deficientes auditivos e eu realmente precisava sintetizar bastante e chamar a atenção através de pontos chaves. Acho que trabalhar com
mapas conceituais com eles é o caminho. (LCRM)
Durante a realização do GTR, vários colegas expressaram ainda ter
dúvidas sobre a adequação pedagógica requerida em lei para alunos inclusos,
mais um desafio a ser solucionado pelos educadores, sempre visando a melhoria
da qualidade da educação para todos.
Ainda assim, no desenvolvimento das atividades desse Projeto, todos na
turma puderam participar de um dos mais bonitos momentos da implementação,
quando a aluna surda demonstrou seu experimento para a mostra no laboratório.
Um experimento simples, todo explicado LIBRAS, que explicava a convecção do
ar. Ela não chegou a apresentar o experimento no dia da mostra, mas superou
as expectativas ao demonstrar a compreensão de conceitos básicos sobre a
propagação do calor diante de toda sua turma, que registrou em vídeo esse
momento.
A inclusão permite que todos, alunos e professores, percebam que as
limitações físicas não impedem o conhecimento. Cada um, dentro de tais
limitações, realiza sua construção e faz diferença na realidade em que vive.
3. Considerações finais
Todo processo de formação continuada proporcionado pelo Programa de
Desenvolvimento Educacional tem como pressuposto que o profissional de
educação possa vislumbrar, voltando a academia e refletindo sobre sua pratica
pedagógica, novas perspectivas para melhoria da qualidade da educação que
ele mesmo desenvolve com seus alunos, a cada turma, a cada aula, a cada novo
conteúdo. Nessa perspectiva, é necessário compreender que:
A formação de um professor nunca está completa. É fundamental que um docente, no exercício de sua profissão, se assuma como um eterno aprendiz (...) e, principalmente, deverá aprender com a necessidade de procurar respostas adequadas às perguntas dos seus alunos. (ALMEIDA, 2004, p. 20)
O diálogo em sala de aula, a criação de um ambiente que permita ao aluno
perguntar, investigar, inquirir, permitirá ao professor novas inquietudes,
necessárias a sua formação, ao seu desenvolvimento, a sua própria
aprendizagem e por consequência, novas práticas pedagógicas, novas
descobertas, novos desafios, pois:
O professor é aquele que organiza o processo de ensino, que constrói sínteses e aceita desafios propostos pela pratica social. Ele não ensina conteúdos por si mesmos; não vê a escola como separada da sociedade. Ele sabe que o conhecimento se torna objetivo quando permite entender o mundo e suas conexões e trabalha para que esse saber seja transferido, pois se trata de um direito básico do homem. Ele busca os meios mais eficientes para transmitir o saber ou indicar onde ele possa ser buscado. Sua tarefa é desvelar o real usando o conhecimento clássico. (SANTOS, 2005, p. 17)
A busca por encaminhamentos metodológicos baseados na
experimentação e na construção de mapas conceituais como ferramenta para
uma aprendizagem efetiva dos conceitos da Física da segunda série do Ensino
Médio em Blocos, indubitavelmente permitiu que os alunos envolvidos na
implementação do Projeto compreendessem não apenas os conceitos
estudados, mas suas aplicações e efeitos em sua pratica social, no seu
cotidiano, no meio em que vivem, possibilitando que interfiram de forma
consciente na sociedade, objetivo final de uma formação escolar de sucesso.
Mesmo assim, nesse momento de finalização de uma jornada de reflexão,
aprendizagem e ação sobre a prática pedagógica, no desenvolvimento de um
Projeto tão expressivo dentro da escola, principalmente no que tange a mudança
de posturas e enfrentamento de desafios, não há como não lembrar Freire, que
diz que a educação demanda três tipos de paciência, a saber: a paciência
pedagógica, experimentada a cada etapa do PDE, pois cada um possui um ritmo
próprio de aprendizagem; a paciência histórica, pois foi nesse momento que se
permitiu essa ação; e a paciência afetiva, pois mesmo tecendo esse projeto de
forma a alcançar o maior sucesso possível, nem sempre todas as pessoas são
simpáticas às propostas de mudança realizadas.
4. Referências bibliográficas
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