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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

CONHECENDO LINGUAGEM E DESPERTANDO O INTERESSE DA

LEITURA DOS DOCUMENTOS LEGAIS DA ESCOLA

Maria Francisca Cavalcante de Melo Destro1

Helena Izaura Ferreira²

RESUMO. Em atendimento ao Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE este artigo destaca os estudos sobre a Linguagem, para favorecer o interesse da leitura sobre os documentos legais que regem a Educação Pública. O encaminhamento das ações pedagógicas, cada vez mais se distancia dos documentos legais e se fragiliza no interior da escola. Vivenciando a escola pública de constantes modificações, que exige pedagogos e professores comprometidos com os determinantes legais, propomos, pelos estudos sobre a linguagem subjacente aos textos dos documentos educacionais, o reconhecimento da necessidade de constantemente nos remetermos aos mesmos, pois, definem ações e determinam as orientações do fazer pedagógico das escolas. Para reconhecer o uso da linguagem e da legislação educacional, na organização do trabalho pedagógico da escola pública, utilizamos o método de abordagem da psicologia histórico-cultural de Vygotsky, da pedagogia histórico-crítica de Saviani e da didática de Gasparin. Encaminhamos momentos de leituras, reflexões, discussões e análises de autores como Almeida, Tuleski, Possari e Neder, Libâneo, Galuch e Sforni, Saviani e Smolka. Desenvolvemos por meio da linguagem, enquanto produtora dos signos sociais, estudos sobre a legislação educacional e a identificamos direta ou indiretamente, em nossas práticas diárias. Os obstáculos que encontramos nessa tarefa, como resistência em ler e em olhar para o pouco hábito na busca dos respaldos legais das ações burocráticas que aproximam as práticas escolares do campo teórico e legal, foram literalmente entendidos e despertaram a todos e todas para a atividade do ler e interpretar.

PALAVRAS-CHAVE: Linguagem. Legislação Educacional. Pedagogo. Educação

Pública.

1 INTRODUÇÃO

Percebendo nos educadores, o distanciamento dos documentos legais para

encaminhamento das práticas educativas, propomos aprofundar o conhecimento

teórico da linguagem, para tornar a leitura técnica dos documentos educacionais,

uma constante no interior da escola pública.

Para compreender como o conhecimento teórico e metodológico sobre

linguagem, se manifesta na escola e como seu aprofundamento pode abrir

possibilidades para o interesse de leituras diferenciadas, como dos documentos

1 Professora Pedagoga da rede estadual de ensino do Estado do Paraná e participante do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, turma 2013, Pedagogia. E-mail: [email protected]² Professora Mestre do Departamento de Pedagogia da UNESPAR – Campus Campo Mourão e Orientadora do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE. E-mail: [email protected]

legais e outras, realizamos uma ação participativa, oferecendo um curso de

extensão destinado aos pedagogos e docentes da rede estadual de educação do

Colégio Estadual Doutor Osvaldo Cruz – Ensino Fundamental e Médio, do município

de Campo Mourão, Paraná.

Verificamos que as reflexões realizadas no decorrer do curso, levaram os

participantes a problematizar os conceitos sobre linguagem e legislação

educacional.

Os encaminhamentos das leituras, análises, discussões e sínteses,

ampliaram o conhecimento do docente sobre a prática pedagógica, enquanto

formadora de leitores, escritores e atores sociais e oportunizaram o repensar das

posturas profissionais carregadas de intenções econômicas, políticas e sociais.

O curso possibilitou uma reflexão coletiva para enfrentar aspectos

desafiadores e conflitantes relacionados às questões que impedem o processo de

ensinar para que aconteça o aprender.

Evidenciou a necessidade constante da formação continuada, que permita

superar práticas educacionais de pouco conhecimento teórico e de sucesso limitado.

Adotamos no grupo de estudos, um caderno temático consumível, contendo textos

sobre linguagem, políticas educacionais, LDB 9394/96, Projeto Político Pedagógico,

Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná e Regimento

Escolar para discussão e debate.

Com oito encontros de quatro horas, além de leituras complementares e

indicação de vídeos, o conteúdo estudado ficou registrado no caderno didático, no

momento da sistematização dos resultados das discussões do grupo de trabalho,

cuja opinião será anunciada ao analisar os depoimentos coletados no decorrer do

curso de extensão. Os comentários serão citados por meio das siglas PEDA1, para

professora pedagoga e PROF1, PROF2, PROF3, PROF4, PROF5, PROF6, PROF7

e PROF8, para as oito professoras cursistas.

2 APROFUNDANDO A LINGUAGEM E SE INTERESSANDO PELOS

DOCUMENTOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO PÚBLICA

No primeiro encontro, os cursistas participaram com diversos exemplos e

comentários pessoais, evidenciando suas vivências e em breves situações

mencionaram alguns autores. Houve interesse em respaldar a prática da regência

de sala, fundamentada na linguagem, nos autores propostos, pois, compreendendo

os encaminhamentos promovidos no espaço escolar, os acertos pedagógicos

surgem naturalmente.

Conclusão observada na colocação da PROF2, quando escreve: “O tema

linguagem foi amplamente discutido, muitas hipóteses levantadas e após a busca

nos textos teóricos, tudo ficou bem esclarecido.”

A linguagem é, portanto, a base da comunicação, da interação social do homem com o meio e com outras pessoas num processo sócio-cultural que se torna tão natural em seu dia-a-dia que ele muitas vezes se esquece de rever esta habilidade, podendo com isto ser empobrecida ao longo do tempo, tornando-o menos eficiente. (ALMEIDA, 2001, p. 1)

Em diversos momentos foi mencionado que a linguagem precisa ser mais

utilizada e compreendida pelos falantes da escola pública. Usando símbolos e

signos ela desenvolverá uma linguagem articulada, vivenciada no contexto de uma

situação, como nos alerta Bakhtin apud, Possari e Neder (2001, p. 6), no conceito de

símbolos e signos.

Mas, para que isso seja possível, isto é, que haja a interpretação do símbolo, é preciso que os homens estejam socialmente organizados, que formem uma unidade social, para que o sistema de signos possa se constituir. É necessário, num processo de interlocução, de diálogo, que o interlocutor e o ouvinte pertençam à mesma comunidade de signos.

Uma linguagem que requer entendimento de ser “um processo de criação e

elaboração cultural, que se baseia na capacidade do homem de imaginar, de

simbolizar e de comunicar as experiências vividas” (SMOLKA, 1985, s/p).

Enfatizando essa visão da linguagem na escola, Smolka (1985, s/p) nos diz:

A linguagem escrita, como uma possibilidade de registro dessas experiências pessoais e dessas relações e interações sociais, articuladas, acumuladas e elaboradas, constitui uma forma do conhecimento humano e consiste num valor cultural. Pode-se dizer ou assumir que a sociedade de hoje depende da linguagem escrita e é orientada por ela. Mas, levando-se em conta a realidade brasileira, isto pode ser adequado apenas para uma pequena parcela da população que, além de conviver diariamente com este tipo de "mensagem" do meio, é chamada a interpretar esta linguagem convencionalmente. Ou seja, apenas conviver com este elemento no meio não quer dizer que se o interprete necessariamente. Fazer sentido da linguagem escrita é atribuir-lhe um valor cultural e a linguagem escrita, como um valor cultural, pode ser mais ou menos relevante em um contexto, ou pode ser mesmo irrelevante, dadas às condições das tradições orais. Dito de outro modo, o enfoque, o "recorte” que se faz do mundo para interpretá-lo e significá-lo, é baseado na percepção que cada um tem deste mundo, mas este "perceber" o mundo é apontado, compartilhado e reconhecido pelo outro. Vygotsky diria que o conhecimento do mundo passa pelo outro (1978). Assim, a leitura que se faz do mundo é uma leitura contextual, uma leitura social, uma leitura cultural.

A necessidade da linguagem se confirma na fala das professoras que

comentam ser o assunto da linguagem bastante instigante. Lendo, assistindo vídeos

e realizando debates muito se aprende. Fica ainda a certeza que muito tem para se

apropriar e assim, realizar práticas completas, que compreendam linguagem a serviço

da função social e sistematizada da escola. Linguagem, como meio de conhecer a

diversidade de nossos alunos e alunas. Linguagem, que atendendo a todos e todas,

oportunize a interação do conhecimento escolar para crescimento pessoal e

superação das diferenças sociais.

É importante também que as pessoas se sintam livres para se expressar, criar, livrando-se dos preconceitos, da timidez, do medo, dos bloqueios psicológicos e outros que possam surgir. Ao nos apossarmos desta linguagem, é possível conhecer o corpo e utilizá-lo nas inter relações com o meio e com outras formas de linguagem. (ALMEIDA, 2001, p. 2)

Despertados com o aprofundamento teórico de linguagem, o encontro 5 e 6

resgatou pela leitura e análise das políticas educacionais, os documentos que regem

atualmente a Educação Básica Pública.

O conhecimento e uso da legislação educacional na organização do trabalho

pedagógico, precisa ter a clareza das intenções que a mesma objetiva nas

determinadas conduções. Nada está desligado da ideologia dominante.

Saviani (1989, p.134), ainda chama a atenção quando argumenta que a

“legislação do ensino constitui um referencial privilegiado para a análise crítica da

organização escolar”. Saviani (1989, p. 155) sintetiza dizendo:

Em suma: o estudo da legislação se revela um instrumento privilegiado para a análise crítica da organização escolar porque, enquanto mediação entre a situação real e aquela que é proclamada como desejável, reflete as contradições objetivas que, uma vez captadas, nos permitem detectar os fatores condicionantes da nossa ação educativa. A partir daí torna-se possível romper com a visão ingênua do processo educativo.

Mas a ação dos pedagogos e dos professores, no interior da escola voltada

para conhecimento da legislação do ensino se faz longe desta clareza. Requerendo

o resgate dos interesses da legislação que rege a escola pública brasileira

buscamos Saviani (2006, p. xx) que argumenta:

A legislação constitui o instrumento através do qual o Estado regula, acentuando ou amenizando as tendências em marcha. Assim, à luz do contexto, revelam-se ao mesmo tempo a falácia e a eficácia da legislação. A falácia diz respeito às esperanças nela depositadas e que ela não pode realizar. A eficácia consiste nas consequências ou não, que ela acarreta.

Podemos ainda, observar as análises de Libâneo (2010, p. 2) quando

esclarece as políticas públicas para a Educação Básica, traduzida na Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº9394/96), pela forte presença das

orientações internacionais.

O objetivo deste texto é assim buscar ligações entre proposições emanadas da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em 1990, em Jomtien, Tailândia, e as políticas públicas para a educação básica praticadas nestes 20 anos pelo governo brasileiro. Essa Conferência, em que produziu um documento histórico denominado Declaração Mundial da Conferência de Jomtien, foi a primeira de outras conferências realizadas nos anos seguintes em Salamanca, Nova Delhi, Dakar, etc., convocada, organizada e patrocinada pelo Banco Mundial. No Brasil, o primeiro documento oficial resultante da Declaração de Jomtien e das demais conferências foi o Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003), no Governo Itamar Franco. Em seguida, estiveram presentes nas políticas e diretrizes para a educação do Governo FHC (1995-1998; 1999-2002), tais como: ampliação do acesso, financiamento e repasse de recursos financeiros, descentralização da gestão, Parâmetros Curriculares Nacionais, ensino à distância, sistema nacional de avaliação, políticas do livro didático, LDB nº 9394/1996, entre outras, assim como nos oito anos do Governo Lula (2003-2006; 2007-2010).

Notadamente o autor esclarece que as leis que regem nosso ensino traduzem

muito bem as políticas educacionais do Banco Mundial, que atendendo o interesse

econômico-social, assim designado para o enfoque empresarial que prepara o aluno

para o mercado de trabalho, promove o declínio da escola pública brasileira voltada

para formação do aluno cidadão, crítico e participativo.

Ainda que possamos enfrentar dificuldades de desnaturalizar as leituras dos

documentos oficiais que estruturam o trabalho de nossas escolas, precisamos mover

ações que permitam enxergar a realidade que vivemos e entender nela o poder de

encaminhar a função social da escola.

Isso, denunciado pelas autoras Galuch e Sforni (2011, p. 61), traduz bem a

falsa naturalização de nossos documentos regulamentadores, já que

contextualizados num período em que os estudos acadêmicos se fundamentavam

nos pressupostos do Materialismo Histórico-Dialético (MARX).

Apesar de se observar a forte presença das orientações internacionais tanto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96) como nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino fundamental e médio, nos Parâmetros Curriculares Nacionais a ideia de adaptação dos sujeitos às necessidades do capital não está tão explícita, tampouco a preocupação exacerbada com a manutenção da ordem social tal como pode ser observado no Relatório Delors. Isso não significa que este objetivo não se faz presente nesses documentos norteadores da organização curricular da educação básica. Dentre outros fatores, talvez isso esteja relacionado ao fato de que, no Brasil, na elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais foi necessário o diálogo com as pedagogias críticas que buscaram orientar a prática educativa na década de 1980, como a Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos e a Pedagogia Histórico-Crítica. Essas pedagogias que se fundamentam em pressupostos do Materialismo-Histórico estavam fortemente presentes nos cursos de formação de professores e nos debates acadêmicos desse período. Assim, alguns termos dessas teorias foram

apropriados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, mas os seus significados foram reconfigurados, adaptando-se às políticas internacionais. Isso gera dificuldade para a compreensão da perspectiva de formação presente nesses documentos, sem que se busque o contexto de sua elaboração.

Assim, o pedagogo e o professor devem se dedicar ao conhecimento das leis

escolares, lendo, analisando, refletindo e agindo além do que parece ser. Buscando

sempre o histórico da produção desses documentos legais. Que não tendo nada de

direto em sua linguagem, requer acesso frequente e até mesmo, diário, para poder

ser compreendido em toda sua extensão e intenção. Em que se justifica conhecer a

linguagem para interpretar as leis educacionais nacionais, estaduais e municipais.

A clareza sobre o papel do pedagogo é reforçado por Saviani (1985, p. 27)

em seu discurso de patrono de turma, do curso de pedagogia, em que se

compromete com a democratização do encaminhamento pedagógico das atividades

escolares enquanto “domina sistemática e intencionalmente as formas de

organização do processo de formação cultural que se dá no interior das escolas” e

desenvolve seu verdadeiro papel cultural, no sentido de que o pedagogo,

Empenhem-se no domínio das formas que possam garantir as camadas populares o ingresso na cultura letrada, vale dizer, a apropriação dos conhecimentos sistematizados. E, no interior das escolas, lembrem-se sempre que o papel próprio de vocês será provê-las de uma organização tal que cada criança, cada educando, em especial aquele das camadas trabalhadoras, não veja frustrada a sua aspiração de assimilar os conhecimentos metódicos, incorporando-os como instrumento irreversível, a partir do qual será possível conferir uma nova qualidade as suas lutas no seio da sociedade.

Nesse sentido, fica evidente que, fazendo parte de um contexto histórico,

determinante pelos complexos econômicos do trabalho, da linguagem e da

educação, devemos empenhar em visualizar as consequentes ações pedagógicas

que encaminhamos no dia a dia das escolas públicas. Reforçados pela linguagem

explícita e implícita, que acompanha as relações de produção do trabalho didático-

pedagógico, desenvolvido pelo professor e pelo pedagogo da escola pública.

3 OS RESULTADOS ALCANÇADOS E ENCAMINHAMENTOS FOCADOS NA

PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA

O material didático utilizado no curso de formação “Linguagem e legislação:

organizadoras das ações cotidianas do professor pedagogo da escola pública

paranaense”, apresenta uma sequência de encaminhamentos, pautados na proposta

didática de Gasparin.

No primeiro encaminhamento está a provocação do conteúdo anunciado,

onde indagações foram feitas e de maneira ampla todas observadas, anotadas e

reservadas para posterior comparação. O segundo momento, focando o estudo na

leitura bibliográfica, se destacou as ideias principais e significativas para o instante

de anunciar os novos conhecimentos adquiridos. O momento seguinte, que

chamamos de garimpando o estudo, oportunizou a troca de experiências e

conhecimentos, por meio da participação, o grupo apresentou, discutiu, analisou e

verificou a aplicabilidade ou pertinência dos apontamentos dos textos para a

realidade escolar.

Prosseguindo ocorreu a manifestação do estudo, onde se fez a

sistematização dos resultados das discussões do grupo de trabalho. Concluindo, se

fez o encaminhamento da socialização do entendimento dos fatos analisados e

relacionados aos temas estudados. Essa produção do grupo de estudo apresentou

as possibilidades de compromissos com o avanço do processo de ensinar e

aprender da escola pública paranaense.

Observamos que, no momento do grupo manifestar o aprendizado e de

socializá-lo no interior do espaço escolar, alguns limites o impediram de existir,

como: o estreito espaço de tempo, o grande número de textos e a resistência a

divulgar o novo.

Assim, para modificar o comportamento do pedagogo e do professor da

escola pública, muito se faz necessário. Precisamos ler mais e ultrapassar a visão

naturalista de enxergar toda situação pela aparência ingênua que demonstra ter. No

imediatismo das situações enfrentadas no dia a dia da escola, esquecemos que tudo

tem intenção de ser.

Precisamos ter claro que a concepção de escola que defendemos nas

orientações curriculares do Paraná, com base na Teoria Histórico-Cultural de

Vygotsky, requer compreensões do papel da linguagem mediada pelo outro.

Vejamos essa clareza na citação de Libâneo.

Diferentemente dessa concepção de escola e de aprendizagem, a teoria histórico-cultural, a partir das contribuições de Vygotsky e de seus seguidores, postula que o papel da escola é prover aos alunos a apropriação da cultura e da ciência acumuladas historicamente, como condição para seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral, e torná-los aptos à reorganização crítica de tal cultura. Nessa condição, escola é uma

das mais importantes instâncias de democratização social e de promoção da inclusão social, desde que atenda à sua tarefa básica: a atividade de aprendizagem dos alunos. Tal aprendizagem não é algo natural que funciona independentemente do ensino e da pedagogia. As mudanças no modo de ser e de agir decorrentes de aprendizagem dependem de mediação do outro pela linguagem, formando dispositivos internos orientadores da personalidade. Tal como expressa Vygotsky, trata-se de uma reconstrução individual da cultura num processo de interação com outros indivíduos: o que inicialmente são processos interpsíquicos converte-se em processos intrapsíquicos. Sendo assim, a intervenção pedagógica por meio do ensino é imprescindível para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral. Pelo ensino, opera-se a mediação das relações do aluno com os objetos de conhecimento, criando condições para a formação de capacidades cognitivas por meio do processo mental do conhecimento presente nos conteúdos escolares, em associação com formas de interação social nos processos de aprendizagem lastreados no contexto sociocultural (LIBÂNEO, 2009, In: LIBÂNEO, 2012, p. 25-26).

A formação se pautou nos estudos da linguagem e dos documentos

gerenciadores e reguladores da educação, como Políticas Educacionais, LDB

9394/96, Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Estado do Paraná (DCE),

Projeto Político Pedagógico (PPP) e Regimento Escolar. Algo muito apreciado pelos

professores e pedagogos do Colégio Estadual onde ocorreu a implementação dessa

proposta. Conforme observamos nas anotações expressas por uma participante

pedagoga (PEDA1):

Percebemos que a LDB 9394/96 foi aprovada atendendo as demandas da UNESCO (Relatório Jacques Delors). Tem como meta alcançar 4 pilares: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver junto e aprender a ser. O principal objetivo da escola é manter a estabilidade social, que todos vivam em harmonia, que o trabalhador, o pobre, se conforme com sua condição e a reconheça como imutável. Portanto, não sendo capaz de lutar por causas sociais, por seus direitos de igualdade, faz do trabalhador um ser passível.

Sobre o Projeto Político Pedagógico (PPP), a mesma pedagoga (PEDA1)

comenta que por sua experiência percebe nos professores a compreensão de que o

PPP é só um documento que atende as solicitações burocráticas, não é um

documento de base teórica dos encaminhamentos no interior da escola.

Destacamos os comentários da professora participante (PROF6) quanto a

importância de estudar os fundamentos do Regimento Escolar.

Pode-se dizer que não tivemos ainda um Regimento Escolar, verdadeiramente democrático. Enquanto documento que nos rege e nos orienta, precisamos conhecê-lo para argumentar e contra-argumentar em nosso cotidiano escolar. Ao conhecê-lo melhor, podemos cobrar de determinados segmentos suas tarefas.

Na intenção de justificar o valor dessa implementação no interior da escola,

diversos comentários reforçaram a sua necessidade, que colaborando com a

formação continuada dos educadores, muito respalda o campo teórico das práticas

realizadas nas escolas. Notamos isso na apreciação da professora participante

(PROF3):

Este curso foi tudo muito “chão da escola”. É o que nós vivemos todos os dias. Ás vezes, não nos damos conta, nem sabemos, ou melhor, relembramos da força que temos, da responsabilidade do nosso trabalho na escola com os educandos, o quanto nos exige. O triste é pensar que fazemos tudo tão automático, que o tempo vai passando e os alunos vão passando por nossas mãos e, muitas vezes, acabamos não fazendo o que deveríamos. O que eu penso, é que não podemos parar! Precisamos estudar para poder pensar em iniciar uma transformação com conhecimento da causa!

As observações retratam o crescimento na compreensão dos fatos históricos

que determinam os encaminhamentos dos documentos educacionais. Isto é

pontuado por PROF1 quando registra sua opinião no último encontro e diz:

Fazer a leitura desses documentos tão amplos e complexos nos proporcionou momentos de leituras, conversa e muita discussão. Importante, pois, abordavam vários temas poucos conhecidos por nós. Mesmo sendo curto o tempo, nos proporcionou o nascer de um novo olhar sobre o universo escolar.

Na visão pedagógica temos a apreciação da cursista pedagoga (PEDA1) que

escreveu:

Após o término das atividades tenho a certeza de que a contribuição do curso foi muito importante para minha prática escolar, para o dia a dia da minha prática como educadora. Esse tipo de formação é fundamental para os professores. São momentos em que os professores reforçam o conhecimento teórico e ainda, oportuniza a discussão e a troca de experiência entre professores e pedagogos da escola.

Neste sentido, acreditamos que os encontros com pedagogos e professores

se constituíram em um valioso espaço de participação, discussão, reflexão e

interação.

Focando a organização pedagógica do espaço escolar, a participação surgia

de provocações sobre o conhecimento que aos poucos, foi ampliada, ocorrendo um

maior envolvimento entre os participantes, ficando claro pela afirmação de Almeida

(2001, p. 1) que:

[...] o ser humano é um ser falante e o único capaz de raciocinar e utilizar a fala como um instrumento eficaz em todas as suas ações do cotidiano, ele se tornou também o único a se relacionar e se comunicar através de expressão verbal e não verbal.

As discussões foram de grande valor para o crescimento profissional, pois,

respaldadas por mensagens dos vídeos, textos e debates que focavam a

importância da linguagem para o trabalho pedagógico da realidade escolar, deixou

claro que,

[...] todo educador diante de uma criança, deve procurar entender os seus gestos, suas expressões de alegria ou de angústia, ajudando-a num sentido de desvendar aquilo que ainda está oculto e com a qual ela vai se relacionar em seu cotidiano. [...] (ALMEIDA, 2001, p. 2).

E Almeida (2001, p. 2) assegura ainda que,

As formas de linguagem presente no linguajar das pessoas, nos temas transversais de cada comunidade, nas charges (Caricaturas de personagens importantes do meio sócio-cultural e políticos), são algumas das formas destas outras “linguagens”, que geralmente tecem críticas de atitudes, ou outras formas de expressão que se manifestam tão claramente em nossas vidas como em um texto de linguagem verbal, que são, no entanto, desvalorizados e assim não aprendemos a ler estes outros textos.

Nesse contexto, compreendemos que as interpretações sobre a ação

docente, exigem dos profissionais da educação a revisão dos encaminhamentos

didáticos pedagógicos por meio do diálogo constante possível de conduzir um

trabalho sério, consciente e objetivo.

Um trabalho focado na linguagem subjacente aos textos educacionais, que

sob um olhar crítico, poder-se-á compreender pela reflexão e ação as práticas

escolares desenvolvidas no interior da escola pública com a percepção do

comprometimento econômico, político, social e cultural e assim, em diversos

momentos, percebemos nossas limitações.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A guisa de considerações finais, podemos afirmar que dentro do possível

buscamos a aproximação dos autores que nos respaldaram nesses

esclarecimentos, que estão em total sintonia com a real função da Escola Pública, e

na apropriação dos conteúdos historicamente acumulados para formação humana.

Os autores citados de ideias ligadas à concepção histórico-cultural,

relacionados à teoria de Vigotski e à concepção da pedagogia histórico-crítica,

relacionados aos estudos de Saviani, foram a base conceitual do nosso trabalho,

que preocupados em mergulhar nos conceitos teóricos, procuramos apontar

caminhos para estruturar a prática pedagógica escolar de maneira consciente, séria

e de valor para formação de todo ser humano.

Acenamos para uma ação pedagógica repensada na própria realidade

escolar, compreendida para além daquilo que parece ser, e buscando com muita

leitura, análise e reflexão, o que realmente é a verdade, a essência de tudo na

educação, especialmente no âmbito escolar.

Por todos os apontamentos, fica evidente a necessidade constante de

promovermos a formação continuada, que integre professores e pedagogos.

Notamos que muitos educadores, realizam práticas rotineiras que engessam

o fazer pedagógico e se limitam ao uso de linguagem do ponto de vista da disciplina

da Língua Portuguesa. Portanto, cabe refletir e despertar para linguagem como um

todo, aquela que promove a interação com o outro, e assim e só assim, ela

produzirá a apropriação do saber historicamente acumulado e sistematizado em

conteúdos, para todos que nela se encontram.

REFERÊNCIAS

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