os valores naturais sadianos

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    Ano I - N 04 - Maio de 2002 - Quadrimestral - Maring - PR - Brasil - ISSN 1519.6178

    Os Valores Naturais Sadianos [1]

    Taitson Alberto Leal dos Santos[2]

    RESUMO:

    Em grande parte das obras do Marqus de Sade, seno em todas, surge o elemento educador, aquele que, por meiodo discurso, retira o indivduo da virtude e o leva a uma vida de crimes e excessos. Os valores sadianos, bem comotoda sua filosofia e sua libertinagem, esto calcados na Natureza, este agente universal que traa metas para suascriaturas.

    O artigo procura discorrer sobre esta educao sadiana e sobre o papel da Natureza no pensamento deste filsofo,literato e libertino: Sade.

    Palavras-chave: Sade tica - educao libertina natureza humana.

    The Sadianes Naturals Values

    Abstract

    In majority of the Marquis of Sades books, otherwise in all, sprout the educator element, that one which, throughfrom discurse, removes the individual of the virtue and bring him tu a life of crimes and excess. The sadianesvalues, likes all his philosophy and his libertinism has foundations in the nature, this universal agent that trace goalto your creatures.

    This article, comment about this sadiane breeding and about the function of the nature in the thought of thisphilosopher, writer and libertine: Sade.

    Keywords: Sade ethics libertine breeding nature human.

    Sade, emA Filosofia na Alcova, deseja educar. De imediato inicia sua obra com a epgrafe Ame prescrever sua leitura filha: nada mais educador! Contudo, o educar supe valorese o Marqus os tem! sobre estes valores que gostaria de discorrer.

    No Emlio, Rousseau preconizava que desenvolvendo as potencialidades naturais da crianaela se afastaria dos males sociais tornando-se com isso um adulto bom. O que sustentavasua hiptese era a crena na bondade natural do homem. Em Sade, a natureza tambm o

    modelo, mas no pode ser avaliada em termos de valores morais (BORGES, 1999, p. 214).

    Numa concepo materialista, quem legisla o que ser o bem e o mal to somente ohomem. Natureza pouco importa tais conceitos ou valores, pois no tem finalidade e noserve a uma razo superior entretanto, conforme Holbach, a natureza inteligvel eracional, pois pode ser compreendida e explicada pelo homem. Sabe-se que Sade seinteressa muito pelosphilosophes do sc. XVII La Metrie, Holbach, dentre outros todavia,leu-os bem ao seu modo, tomando-lhes o que lhe interessava. Percebemos claramente naobra sadiana um tlosna Natureza, com a palavra o Marqus:

    - Est bem. Quer dizer, atravs de certos gostos que me foram dados pela Natureza terei servido osdesgnios dela, a qual, lanando as sua criaes atravs de destruies, s me inspira a idia de destruioquando tem necessidade de criaes. (...) E quando preferindo a sua felicidade dos outros destri tudo oque encontra ou o aflige, ter feito outra coisa alm de servir a Natureza, cujas mais seguras inspiraes lheimpem ser feliz, no importando seja custa de quem for? A idia de amor ao prximo uma quimeraque devemos ao cristianismo, no Natureza.(...)- Mas esse homem a que se refere um monstro.- O homem de quem falo o homem da Natureza (SADE, 1971, p. 147-48).

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    A Natureza, em Sade, tem metas traadas para suas criaturas: um agenteoniscientedistinto de Deus. A Natureza sadiana no pode ser tomada como um deus (ou Deus), masantes, segundo suas palavras, um agente universal. Cito:

    Mas, dir-se- a este propsito, Deus e a natureza so a mesma coisa. No um absurdo? A coisa criada serigual ao criador? Pode um relgio ser igual ao relojoeiro? A natureza no nada, prossegue-se, Deus que tudo. Outra bobagem! H necessariamente duas coisas no universo: o agente criador e o indivduo criado.Ora, qual este agente criador? Eis a nica dificuldade que preciso resolver, a nica pergunta que preciso responder (SADE, 1999, p. 39).

    Sade desenvolve a idia, respondendo sua prpria questo, de que o movimento inerente matria e que as combinaes deste movimento nos so desconhecidas. Conclui, ento,bem ao seu estilo, que a matria, devido sua energia, cria, conserva e mantm a tudo: asplancies, as esferas celestes... Tudo isso, ao ser contemplado, nos enche de emoo erespeito e qual a necessidade, ento, de se buscar um agente estranho a tudo isso, uma vezque tudo isso que admiramos no passa de matria em ao?

    Segundo o criador da Sociedade dos Amigos do Crime, as virtudes, calcadas na moralreligiosa, so contra a Natureza Humana, impedindo-a de ser feliz. Sade constri umafilosofia em que o incesto, o assassinato, o roubo e os excessos libertinos so fundamentadosna Natureza. Sendo a natureza um princpio criador onisciente, que tem metas traadas paraas suas criaes. Ocupa, portanto, o lugar de Deus. A natureza, em Sade, deus destitudode divindade" (BORGES, 1999, p. 220-21).

    Ora, sendo natural, por que assim no o somos? A resposta do Divino Marqus que nuncadeixamos de seguir nosso impulsos naturais, entretanto, somos como que forados a todoinstante a control-los e impedi-los. Isso se deve ao fato do homem ter optado por seguir aum Ser onipotente e onisciente e Seus mandamentos. Destas leis metafsicas universaissurgem as virtudes, que tendem a impedir os excessos naturais ao homem, afastando-o daNatureza. Diz o Marqus: "Haver algum sacrifcio feito a essas falsas divindades que valhaum s minuto dos prazeres que sentimos ultrajando-as? Ora, a virtude no passa de umaquimera cujo culto consiste em imolaes perptuas, em inmeras revoltas contra asinspiraes do temperamento. Sero naturais tais movimentos? Aconselhar a natureza o que

    a ultraja?" (SADE, 1999, p. 37).Outro dado importante quanto a no entrega de si s leis naturais o que diz respeito vozda natureza: a natureza, me de todos, s nos fala de ns mesmos, afirma. Entretanto,nem todos podem ouvi-la somente o fazem os indivduos que se encontram preparados:tarefa esta para a educao. A educao libertina visa a supresso das virtudes e o incentivoao assassinato, ao roubo, ao gozo... Aes essas encontradas na natureza, pois sonecessrias a ela:

    Nossas aes no pesam, no tem substncia moral alguma. So ecos, reflexos, efeitos dos processosnaturais. Nem sequer so crimes: O crime no tem realidade alguma melhor dizendo, no existe apossibilidade do crime porque no h maneira de ultrajar a natureza[Histria de Juliette]. Profan-la umaforma de honr-la com nosso crimes, a natureza elogia a si prpria. E isso tambm uma iluso de nossa

    incurvel vaidade: a natureza no sabe nada, no quer nada de ns. E nada podemos contra ela. Nossosatos e nossas abstenes, o que chamamos virtude e crime, so imperceptveis movimentos da matria(PAZ, 1999, p. 61).

    Conforme Augusto Contador Borges, os libertinos estes, os que ouvem a Natureza - so osindivduos capazes de reproduzir no ambiente humano, materialmente, as condiesnaturais. A diferena existente entre o libertino e o filsofo tnue: qui, os filsofosestejam mesmo aqum dos libertinos, uma vez que estes alm de serem intrpretesracionalistas da Natureza, tambm desempenham, em meio s Suas criaturas, Sua Vontade.E, aos que se opem a estas premissas, responde-lhes o Marqus: no h nada de horrvelna libertinagem porque o que ela inspira tambm se encontra na natureza (SADE, 1999, p.102).

    A Natureza, no pensamento de Sade, necessria e imprescindvel. Toda sua filosofia e sualibertinagem esto argumentadas segundo os princpios naturais. Tudo o que parece errado,segundo a virtude, certo, visto na Natureza. Todas as aes que parecem chocar as leis, ouas instituies humanas podem ser demonstradas na Natureza, dir o libertino. Com seusargumentos enraizados na Natureza, Sade se livra de extensas explicaes: o que natural

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    no se discute, ademais, se natural, no h lugar para a moral (PAZ, 1999, p.60). Datantas crticas s suas obras, considerando-as cansativas ou repetitivas. Sade no desenvolvelongamente seus discursos, limita-se a repetir diversas vezes o que afirmou anteriormenteao discorrer sobre a destruio, o incesto, o roubo, a sodomia, o autor rapidamentedesenvolve sua retrica e parece chegar sempre ao mesmo lugar: natural, poisencontramos as mesmas aes na Natureza. Os nicos valores a serem seguidos so osencontrados na Natureza - aceitando a contradictio in adjectoexistente. Aps esta concluso,seus personagens passam imediatamente prtica, entregando-se os impulsos queterminaram de teorizar.

    Bibliografia Consultada

    BORGES, Augusto Contador. A Revoluo da Palavra Libertina. In: SADE, Marqus de. AFilosofia na Alcova, SP: Editora Iluminuras, 1999.PAZ, Octavio. Um mais alm ertico: SADE trad. Wladir Dupont, SP: Mandarim, 1999.SADE, Marqus de. A Filosofia na Alcova: ou, Os Preceptores Imorais, Traduo,

    posfcio e notas de Augusto Contador Borges. SP: Editora Iluminuras, 1999.SADE, Marqus de. A Verdade: e outros textos Lisboa: Antgona, 1989.SADE, Marqus de. Ciranda dos Libertinos, Trad. Contador Borges SP: Max Limonad,s.d.SADE, Marqus de. Escritos Filosficos e Polticos Venda Nova: M. Rodrigues, 1971.SADE, Marqus de. Os Crimes do amor: e A arte de escrever ao gosto do pblico Porto Alegre: L&PM,1991.

    [1] Artigo produzido sob apoio da FAPESP.[2] Professor de Filosofia das Faculdades SENAC de Turismo e Hotelaria.

    mailto:[email protected]