paísfazmapeamento deáguassubterrâneas · de recarga do guarani, por-que ela é muito sensível....
TRANSCRIPT
%HermesFileInfo:H-4:20111026:
H4 Especial QUARTA-FEIRA, 26 DE OUTUBRO DE 2011 O ESTADO DE S. PAULO
✽
Entrevista: José Luiz Albuquerque, do IPT
PLANETA
Karina Ninni
Mais da metade dos municípiosbrasileiros utiliza águas subterrâ-neas para abastecer a população– e pouco se sabe sobre elas. Paramapear esse tesouro sob o solo,a Agência Nacional de Águas(ANA) está coordenando o mo-nitoramento dessas grandes re-servas subterrâneas de águas,chamadas de aquíferos. O objeti-vo é criar uma agenda nacionalpara a gestão integrada dos re-cursos hídricos subterrâneos ede superfície.
Na mira estão os AquíferosAçu, Urucuia, Jandaíra e as águassubterrâneas da Amazônia. OAquífero Guarani, o mais estuda-do, tem um plano específico vol-tado para as áreas metropolita-nas, sob as quais ele se encontra.
Segundo aANA,39%dos muni-cípios brasileiros – ou 2.153 cida-des – são integralmente abasteci-dos por águas subterrâneas, en-quanto 14% também usam águassuperficiais. O restante dependedas superficiais,mas a pressãoso-bre elas aumenta a importânciadas que estão no subsolo.
Os aquíferos são formações ro-chosas que permitem que a águase infiltre e se movimente emseu interior. A ANA contabilizano Brasil 27 sistemas aquíferosimportantes, tanto para abaste-cimento público como para aagricultura, que usa na irrigaçãoparte da água subterrânea dispo-nível no País.
“Os aquíferos são reservas es-tratégicas”, afirma Paulo Varel-la, diretor da ANA. “Sabemos, deantemão, que há problemas aoredor das grandes cidades, prin-cipalmente ligados à falta de sa-
neamento”, afirma.Entre as principais preocupa-
ções dos especialistas está a ca-pacidade de preservação da qua-lidade dos recursos encontra-dos entre as rochas, no subsolo.Urbanização desordenada, usointensivo de pesticidas nas la-vouras, reflorestamento, salini-zação e outros estão levando au-toridades e estudiosos a pensarsobre a gestão dessas reservas.
Os aquíferos possuem as cha-madas “áreas de recarga”, locaispor onde a água da chuva se infil-tra e recarrega o sistema. Nessasáreas há maior vulnerabilidadeda contaminação vinda da super-fície. Elas geralmente correspon-dem a afloramentos e locais on-de a “capa” protetora, que podeser uma rocha, é fraturada ouapresenta “janelas” (desconti-nuidades).
Em São Paulo, que usa 80% dototal retirado anualmente pelosquatro países que têm recursosdo Aquífero Guarani (Brasil, Ar-gentina,Paraguai eUruguai),aSe-cretaria de Meio Ambiente já dis-cute a criação de lei que instituauma área de proteção e recupera-ção de mananciais específica pa-ra o afloramento do Guarani.
Vulnerabilidade. De acordocom levantamento coordenadopelo Instituto de Pesquisas Tec-nológicas (IPT), ligado ao gover-no paulista, cerca de 4 mil km² daregião de proteção proposta sãoconsiderados altamente vulnerá-veis à contaminação (mais infor-mações nesta página).
Além de levar em considera-ção a proteção natural que osaquíferos têm, os especialistasobservam a persistência e a mo-bilidade dos contaminantes quea reserva pode estar recebendo.
“Quando há quantidade o su-ficiente, é só uma questão detempo até os contaminantes che-garem às águas subterrâneas, pe-la persistência. Agora, há conta-minantes que se degradam ou
que não chegam mesmo”, expli-ca Ricardo Hirata, professor doInstituto de Geociências daUSP.
“Metais pesados, por exem-plo, se movem pouco e ficam pre-sos. Já os nitratos são muito mó-veis e persistentes”, diz Hirata.
Ele afirma que os fertilizantesnitrogenados, aterros e lixões, re-des de esgoto com vazamentos elocais de estoque de matéria-pri-ma industrial são as fontes decontaminantes que mais preocu-pam os especialistas.
É consenso que a qualidade das
águas do Guarani é ainda muitoboa. Mas há preocupação com oexcessodeexploraçãoeorebaixa-mentodosníveisdeáguanascida-desque maisutilizamos recursos.
Recentemente, um estudo fi-nanciado pelo Banco Mundial re-velou que o Guarani não tinhatanta água assim como se pensa-va. “As pessoas diziam que erauma reserva de 30 mil km³ deágua. Isso é irreal. Porque nós nãotemos acesso a toda essa água. Te-mos acesso, na área confinada, acerca de 2,1 mil km³ – mais os 40km³ de recarga anual”, explica ogeólogo Ricardo Hirata, da USP.
Segundoele,usamosanualmen-tecercade1km³deáguadoGuara-ni: 94 % no Brasil, 3% no Uruguai,2% no Paraguai e 1% na Argentina.Cerca de 80% do total é usado pa-ra abastecimento público e 15%,para processos industriais.
Se a disponibilidade de uma re-serva que atrai atenção e investi-mentos ainda não é consenso, opotencialdeaquíferosrecém-des-cobertos, como o Alter do Chão,naRegiãoNorte,étotalmentedes-conhecido. No ano passado, umaequipe da Universidade FederaldoPará(UFPA)divulgouadesco-berta de uma reserva entre Pará,AmazonaseAmapá queseria bemmaior do que o Guarani.
“Aindanãosabemosnadasobreela. Temos de fazer mapas de flu-xo hídrico subterrâneo para saberquaisas regiões de recarga etrans-formá-lasemáreadeproteçãoam-biental”, explica Milton Matta,geólogo da UFPA.
O Alter do Chão abastece100% de Santarém (PA) e quasetoda Manaus (AM). “Não sabe-mos, por exemplo, as consequên-cias do plantio de soja em Santa-rém. E como não conhecemos asáreas de recarga, não podemosmedir as dimensões do proble-ma”, diz Matta. Por essa razão, aANA destinou R$ 4,5 milhões pa-ra um mapeamento da hidrodi-nâmica das águas subterrâneasda Amazônia.
Paísfazmapeamentodeáguassubterrâneas
‘Guarani precisa delei específica em SP’Especialista afirma que área de 26.100 km²deve ser protegida para evitar contaminações
● Ribeirão Preto, no interior deSão Paulo, é 100% abastecidapelo Aquífero Guarani. A cidadetem mais de mil poços tubulares.O Departamento de Águas e Es-goto de Ribeirão (Daerp) possui95 poços em operação, produzin-do cerca de 127 mil m3/ano.
“O nível do aquífero ali na re-gião vem rebaixando muito. Exis-tem locais, sobretudo no centroda cidade, onde não se pode maisfazer poço. São áreas restritas”,afirma José Luiz Galvão de Men-donça, geólogo do Departamentode Águas e Energia Elétrica(Daee), do Estado. Desde 1960, orebaixamento do reservatório foida ordem de 50 a 60 metros naregião central da cidade.
Segundo Mendonça, os poçosoutorgados no Guarani em SãoPaulo são: 266 para o abasteci-mento público, totalizando36.534 m3 de água por hora; 320para uso industrial, mineração esanitário/industrial (21.575 m3 deágua por hora); e 131 para usorural, num total de 14.552 m3 deágua por hora. / K.N.
Agência reguladoraprepara monitoramentode aquíferos e liberaverba para mapearreservas na Amazônia
Um levantamento realizadoa pedido da Secretaria Esta-dual de Meio Ambiente deSão Paulo e publicado nesteano está servindo de base pa-ra a discussão de uma novalei. O objetivo é estabelecerum plano de proteção am-biental para a área de aflora-mento do Aquífero Guaraniem São Paulo. O estudo foicoordenado pelo técnico Jo-sé Luiz Albuquerque, do IPT,que falou ao Estado:
● Por que há necessidade deproteger as áreas de aflora-mento do Guarani?Como toda formação do gê-nero, o Guarani tem áreas demaior e de menor vulnerabili-dade. As áreas onde ele aflo-ra são naturalmente mais sus-cetíveis. A Lei 9.866 versa so-bre as Áreas de Proteção e Re-cuperação de Mananciais.Embora não seja voltada ape-nas para os superficiais, aaplicação da lei acabou cen-trada neles, até porque sãomais vulneráveis. Surgiu, en-tão, na Coordenadoria Esta-dual de Recursos Hídricos, aideia de um trabalho na áreade recarga do Guarani, por-que ela é muito sensível.
● Qual o tamanho dessa área?Em São Paulo, ela tem 15 milkm². Mas estamos propondouma área de proteção de 26mil km², porque acrescenta-mos uma “área de seguran-ça”, para garantir a eficiênciada proteção. Ela engloba 105municípios e corresponde acerca de 10,5% da área do Es-tado, que é de 247 mil km².
● E quais são as principais
preocupações em relação aela?A urbanização desordenadaé uma delas, que pode ter co-mo consequência a produ-ção de esgoto disposto incor-retamente, a impermeabiliza-ção de áreas de recarga...Também há uma preocupa-ção com as frentes agrícolas.Cerca de 91% das áreas decultura foram classificadascom potencial elevado decontaminação da água sub-terrânea. Há muito plantiode cana no norte de São Pau-lo. É preciso que sejam adota-das boas práticas agrícolas.
● Quantos quilômetros corres-pondem à área naturalmentemais vulnerável do Guarani?Cerca de 4 mil km² da regiãode proteção proposta sãoconsiderados altamente vul-neráveis à contaminação eoutros 12 mil km² têm índicemédio de vulnerabilidade.
● Como transformar em áreaprotegida 10% de um Estadotão densamente ocupado?Estamos respeitando tudo oque já está regulamentado: asÁreas de Proteção Permanen-te (APPs, como topos de morroe margens de rios), as áreas deinclinação, que por lei já nãopodem ser ocupadas. Não setrata de proibir atividades naárea a ser protegida. Trata-sede redobrar os cuidados comos locais mais vulneráveis.
● A quantas anda a discussãodo projeto?A secretaria está discutindocom os comitês de bacias. Te-mos uma minuta de lei e esta-mos colhendo opiniões. / K.N.
Nível de água emRibeirão baixou60 m em 50 anos
���������
���� �
���������
��������
�������
�������
������
�����
����������
������������
�� ������������
����������
�
�
��
�
���
��
��
������� ��!�"�#"�#
����� ������
� �����
���� �����"���'"(��)*��#!#+�!���(#��#�������#"+#�(#���*��#!#+�!���(#�(#�#",�),��#"+��#�"-���*��."���#�+/"�)�$���(#���
��������������� �������
�� ������������
�
�
�
��
���0�0� �
�����������
��
���������
�
�
����0���
����
���1���
!� ��������
���0�
������������� !�"#���"�$�������
��
��
��
%
������
�����
� &�'���������� �(��������)
��
��
��
%
������
�����
�$*�+��*��,�-$�"�.�-�*�*��$���"�-*#���"�$��/�+#$����$�01#
���2� �������2�����
�3&�� ����
�)��& ����&�
��� ���& ���
� ��������&�
��������������������������� �����������������������������������
��������������&����� ��� ���� ���
����������� & ������������
% ��& ��������� ����&�������
% ��& ������� ����&�������
%!#��2'#���(#!%��#!��!�+#$�(�
��
��
���
��
��
��
��
��
�
��
�
� �
��
����� �&������ ������� �������
4567 8776
��� �&��9)�
�� ���
��+#�*��+#$����$�01#
%!#��'!��"�
%!#���"('�+!��)
���0�0� �
�����������
����0���
����
���1���
!� ��������
���0�
�������� ������������1��3���������4�������������0��0������0����������*�0�4�����������������1�����������5�������6��������������7����1���������������������8�0�������� ��9�0����0����4�������
:;;�4<=>
?;;�4<@>
=;;�4<A>
B;;�4<:?>
C;;�4<:C>
@;;�4<:D>
E;;�4<?:>
D;;�4<?B>
A;;�4<?E>
:5;;;�4<=;>
����� ��)�
�������
�����������
������� ��
�������
����������
���������
������������
:5:;;�4<==>
:5?;;�4<=@>
:5=;;�4<=A>
:5B;;�4<B?>
:5C;;�4<BC>
� ������ ��&���
���: ����� �����
�������
� �����&���
������&�& �
��������������
�
��
�
�
��
�
�������9��&�������������� �
� &�'���������� �(��������)
����� �&������ ������� �������
�������� �����&�&
� ������ �����&�&
%HermesFileInfo:H-5:20111026:
O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 26 DE OUTUBRO DE 2011 Especial H5
‘Emdez anos faltará águanolitoral do Nordeste’
O sistema Barreiras, que vai doEspírito Santo à Região Norte,margeando o litoral, é outra re-serva estratégica com proble-mas. A salinização e a contamina-ção por nitrato, oriundo de fos-sas e esgotos, são as mais graves.
Especialistas alertam que, se oconsumo e a ocupação das dunascontinuarem, em cerca de dezanos faltará água para consumono litoral do Nordeste.
“As dunas que existem naspraias protegem a reserva em al-gumas localidades. O problemaé que as elas são muito sensíveise todo mundo quer ocupá-las: oturismo, a indústria de energiaeólica etc. E tudo o que vaza pe-las dunas cai direto no aquífero”,explica Luis Parente Maia, dire-tor do Instituto de Ciências doMar, da Universidade Federal doCeará.
Ele afirma que as partes maissensíveis do sistema ocorrem on-de ele é mais arenoso e há menosargila. O Barreiras é pouco espes-so: em suas áreas mais largas temcerca de 60 metros de espessura.Maia estuda uma região próximaa Fortaleza, onde ficam os bal-neários de Icaraí e do Pacheco.
“Tem pontos em que já há ní-veis de coliforme bastante eleva-dos. Você tem poluição possíveldireta por efluentes líquidos e
por resíduos sólidos, porque nãose recolhe lixo. Ou se joga nosmontes ou se enterra no fundodas casas”, explica ele.
O pesquisador diz que na loca-lidade de Icaraí não existe abaste-cimento por rede. “Só se usaágua de poço.”
Salinização. A ocupação desor-denada e a explotação sem cuida-dos estão acentuando a saliniza-ção das reservas litorâneas doBarreiras.
“Só temos água boa onde háduna, pois aqui, nessa região,não temos bacia sedimentar. Ofundo é granito e lá já há águasalgada por natureza. Mas há um
problema adicional: a superex-ploração da água. Todo mundobombeia sem nenhum controle.O espaço antes ocupado pelaágua doce, que foi retirada, aca-ba invadido pelas águas salgadasdo mar”, explica Maia.
Ele afirma que a situação devepiorar, pois as obras do comple-xo industrial e portuário do Pe-cém, que está sendo ampliado, jápressionam as cidades de Icaraí,Cumbuco e Pacheco. “O que an-tes era um problema isolado nastemporadas, pois estes eram lo-cais de veraneio, pode se tornaruma dificuldade crônica.”
O dentista Aldemir Arruda te-ve uma casa de veraneio na Praia
do Pacheco por 30 anos. “O meupoço tinha 34 metros de profun-didade e a água era salobra. En-tão eu tive de desativar”, explica.
Arruda afirma que precisou ca-var o poço durante um períodode seca muito forte, na década de1980. “Foram cinco anos segui-dos de seca. Nós tínhamos cacim-bas, que são poços mais superfi-ciais, mas todos secaram. Então,tive de cavar este, mais fundo.Mas a água não servia para cozi-nhar nem para banho. Só paralimpeza mesmo. Tínhamos de le-var água de Fortaleza, em galões,para poder usar na praia”, conta.
Arruda afirma que sua casa fi-cava bem próxima a uma antigasalina desativada, entre Caucaiae Fortaleza. “Ali a salinidade éimensa. Aquilo foi desativado,mas as casas ao redor ainda so-frem as consequências”, dizMaia. “Um vizinho tinha uma ca-sa mais próxima da praia, das du-nas. Ele possuía um poço de águaexcelente”, lembra.
Norte. O Barreiras abastece vá-rias cidades litorâneas no Nor-deste e chega até o Amapá, naRegião Norte. A região metropo-litana de Belém (PA) usa 30% deáguas subterrâneas para abaste-cimento público, parte do Barrei-ras e parte de um outro aquíferoque ocorre no local: o Pirabas.
“É um excelente reservatório.Um poço produtivo no Pirabastem vazão média de 600 m³/ho-ra, o que é ótimo”, explica o geó-logo Milton Matta, da Universi-dade Federal do Pará. Ele alerta,porém, para a ocorrência doschamados “poços Amazonas”,vetores de contaminação localda água subterrânea.
“Em Belém há mais de 30 milpoços desses. São buracos cava-dos no chão, sem proteção. Aágua é puxada para cima em latasde manteiga enferrujada. Umcaos.” / K.N.
AILTON CRUZ/AE
Risco. Dunas protegem as reservas de águas subterrâneas
Ocupação desordenadadas dunas causa poluiçãoe salinização doBarreiras, diz especialistade instituto do Ceará
�"��$!%���&�#
%!#��!'!�)
� &�&��& � ����&�& ���&�&�����2�
� �����
&3��&��
����