paixão pela floresta, américa economía brasil março 2013

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34 AméricaEconomia Março, 2013 EMPREENDEDORISMO TURISMO Apostar alto, com pouco capital, é uma armadilha na qual já caíram muitos empreendedores. A lição também foi aprendida pelo costarriquenho Felipe Koberg, fundador da Veragua Rainforest David Cornejo, de Santiago D epois de terminar seus estu- dos de administração na uni- versidade de Southern Missis- sippi (EUA) em 1993, Felipe Koberg voltou para a Costa Rica e pas- sou um mês em um terreno de 1.300 mil hectares na floresta tropical, a 40 minutos do porto de Limón e do Mar do Caribe, de propriedade de sua família. Saiu des- sa experiência com uma picada do mos- quito tropical papalomoyo e uma ideia de negócios: um projeto turístico para aque- la bela paisagem. “Meu pai era empresário madeireiro e me parecia um crime ver essas árvores cortadas. Era mais razoável mostrá-las aos visitantes”, diz Koberg. Mas o Cari- be costarriquenho é um território difícil. Naquela época, mal atraía turistas e nem tinha infraestrutura para recebê-los. Em 1995, Koberg passou a oferecer um ro- teiro de arvorismo na propriedade, mas o negócio não prosperou. O empreendedor dedicou-se a outros negócios e a questão ficou na gaveta por nove anos. Mas a flo- resta continuava chamando, e ele montou uma equipe com dois amigos de adoles- cência: Eric Fulmmer, MBA pela Kello- gg, e Martí Jiménez, MBA por Harvard. “Felipe era a inspiração, Eric os números e Martí o que executa”, afirma Juan Car - los Barahona, professor da Incae Business School e autor, junto com Andrey Elizon- do, do artigo “Veragua Rainforest: bioi- novação e liderança responsável” (2009). A ideia era atacar o mercado dos cru- zeiros americanos que visitavam o vizi- nho porto de Limón, algo que em 2004 já parecia factível. Os três sócios viaja- ram para a Flórida, nos Estados Unidos, e confirmaram o interesse dos empresá- rios do setor. “Vinham muitos cruzeiros Paixão pela floresta e não havia uma oferta de qualidade para o porto de Limón”, afirma Martí Jiménez. Segundo dados do Instituto Costarrique- nho de Turismo, Limón receberia 165 mil turistas em 2006 e a taxa de crescimento poderia alcançar 10% ao ano. A ideia era criar um parque na flores- ta tropical chuvosa da Costa Rica. Ima- ginavam um mirante, pontes suspensas e uma loja de artesanato. Mas precisavam de um diferencial, que foi encontrado em uma cachoeira na parte alta do terreno, de onde se podia ver o mar do Caribe. Defi- niram um espaço de 78 hectares e com- praram o terreno do pai de Koberg e seus sócios. O lugar era atraente, mas era pre- ciso melhorar a acessibilidade. Para isso, acrescentaram um teleférico. E, em busca de valor agregado, somaram uma assesso- ria científica biológica. Em aliança com o INBio (Instituto Nacional de Biodiversi- Cachoeira, o diferencial que ajudou a erguer o projeto do parque EMP_VERAGUA.indd 34 2/27/13 5:28 PM

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34 AméricaEconomia Março, 2013

EMPREENDEDORISMOTURISMO

Apostar alto, com pouco capital, é uma armadilha na qual já caíram muitos empreendedores. A lição também foi aprendida pelo costarriquenho Felipe Koberg, fundador da Veragua Rainforest David Cornejo, de Santiago

D epois de terminar seus estu-dos de administração na uni-versidade de Southern Missis-sippi (EUA) em 1993, Felipe

Koberg voltou para a Costa Rica e pas-sou um mês em um terreno de 1.300 mil hectares na floresta tropical, a 40 minutos do porto de Limón e do Mar do Caribe, de propriedade de sua família. Saiu des-sa experiência com uma picada do mos-quito tropical papalomoyo e uma ideia de negócios: um projeto turístico para aque-la bela paisagem.

“Meu pai era empresário madeireiro e me parecia um crime ver essas árvores cortadas. Era mais razoável mostrá-las aos visitantes”, diz Koberg. Mas o Cari-be costarriquenho é um território difícil. Naquela época, mal atraía turistas e nem tinha infraestrutura para recebê-los. Em 1995, Koberg passou a oferecer um ro-

teiro de arvorismo na propriedade, mas o negócio não prosperou. O empreendedor dedicou-se a outros negócios e a questão ficou na gaveta por nove anos. Mas a flo-resta continuava chamando, e ele montou uma equipe com dois amigos de adoles-cência: Eric Fulmmer, MBA pela Kello-gg, e Martí Jiménez, MBA por Harvard. “Felipe era a inspiração, Eric os números e Martí o que executa”, afirma Juan Car-los Barahona, professor da Incae Business School e autor, junto com Andrey Elizon-do, do artigo “Veragua Rainforest: bioi-novação e liderança responsável” (2009).

A ideia era atacar o mercado dos cru-zeiros americanos que visitavam o vizi-nho porto de Limón, algo que em 2004 já parecia factível. Os três sócios viaja-ram para a Flórida, nos Estados Unidos, e confirmaram o interesse dos empresá-rios do setor. “Vinham muitos cruzeiros

Paixão pela floresta

e não havia uma oferta de qualidade para o porto de Limón”, afirma Martí Jiménez. Segundo dados do Instituto Costarrique-nho de Turismo, Limón receberia 165 mil turistas em 2006 e a taxa de crescimento poderia alcançar 10% ao ano.

A ideia era criar um parque na flores-ta tropical chuvosa da Costa Rica. Ima-ginavam um mirante, pontes suspensas e uma loja de artesanato. Mas precisavam de um diferencial, que foi encontrado em uma cachoeira na parte alta do terreno, de onde se podia ver o mar do Caribe. Defi-niram um espaço de 78 hectares e com-praram o terreno do pai de Koberg e seus sócios. O lugar era atraente, mas era pre-ciso melhorar a acessibilidade. Para isso, acrescentaram um teleférico. E, em busca de valor agregado, somaram uma assesso-ria científica biológica. Em aliança com o INBio (Instituto Nacional de Biodiversi-

Cachoeira, o diferencial que

ajudou a erguer o projeto do parque

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Paixão pela fl oresta

Foto

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ação

dade), estabeleceram um jardim de coli-bris, um borboletário, um criadouro de répteis e um ranário diurno e noturno. E os cientistas do INBio acabaram tornan-do-se parte da atração.

ARVORISMO NO VÁCUO“A princípio, pensamos em um investi-mento de US$ 250 mil, em seis meses”, afi rma Jiménez. O projeto completo cus-tou US$ 8 milhões, entre ativos fi xos e ca-pital de giro. Para reuni-los, montaram o clássico mix de fundos próprios, investi-mentos de conhecidos e uma dívida com um banco local. Para Barahona, da Incae, os sócios prenderam-se “ao que realmente iria diferenciá-los, e não mudaram a ideia principal diante das difi culdades”.

O parque Veragua Rainforest abriu em 4 de julho de 2008, com Koberg co-mo CEO. Os visitantes foram contatados através de agências de viagens que admi-nistravam as rotas de cruzeiros que pas-savam por Limón. Mas, dois anos depois, a frequência dos cruzeiros não foi a espe-rada. A infraestrutura portuária costarri-quenha nunca melhorou, os trabalhado-res do setor estavam frequentemente em

unir esforços e fazer um pacote com to-dos”, afi rma Koberg. “Mas o banco pre-cisava de uma decisão imediata e a Nature Air estava entrando, e precisava de tem-po”, acrescenta.

Aceitaram a oferta da Global Destina-tions, cujo fundador, Michael Greve, pôs como condição que não fossem mais só-cios. “Eric e Felipe estavam dispostos a continuar envolvidos, mas a Global não quis”, comenta Jiménez, o único que con-tinua na Veragua como sócio e CEO.

Ao se sacrifi car como sócio, Koberg conseguiu a sobrevivência do parque. A ideia concebida nove anos antes começou a tomar vida, executada agora por outros: a carga fi nanceira da Veragua reduziu-se, a dívida foi refi nanciada e todo o pessoal operacional foi mantido. Em julho próxi-mo o parque passará a barreira dos cinco anos, já sem a asfi xia fi nanceira de 2012.

Desde então, o empresário workaho-lic e amante das motocicletas dedica-se a outros empreendimentos. Um deles é a exploração de intercâmbios comerciais com a China, com sua empresa Factory Direct. “O ensinamento que aplico agora é não superdimensionar; é melhor come-çar pouco a pouco, sem perder o controle”.

Voltar à fl oresta? Koberg não descar-ta a possibilidade. No fi m das contas, do terreno de seu pai e sócios ainda so-bram 1.222 hectares. Talvez um hotel que complemente a Veragua Rainfo-rest, especula.

greve e o Estado dava pouco ou nenhum apoio ao turismo em Limón.

Esta baixa nas projeções não compli-cou o parque diante dos credores, inves-tidores e colaboradores. O acordo com o INBio consistia em uma percentagem por ingresso ao parque. Mas, em 2010, as fi -nanças não permitiam mais assumir se-quer esses custos. Eles cortaram a relação com o Instituto e começaram a trabalhar na pesquisa científi ca com a Universida-de da Costa Rica, sem o custo da percen-tagem sobre os ingressos. ”Foi uma deci-são pela sobrevivência”, explica Jiménez.

Como o personagem Klaus Kinski no fi lme Fitzcarraldo, que queria levar a ópe-ra à selva, Koberg apegava-se a sua ideia original, com uma determinação que foi reconhecida pela AméricaEconomia atra-vés do prêmio Excelência Empresarial 2012. No fi m do ano, a situação era crítica e a empresa precisava de refi nanciamen-to. “Não havia um retorno para pagar de imediato uma dívida alta”, explica Full-mer. E os investidores não estavam dis-postos a colocar mais dinheiro, como ha-viam feito desde a inauguração do parque. Em novembro de 2012, o banco lhes deu um ultimato. Jiménez, Fulmmer e Koberg reuniram-se para tomar uma decisão.

As opções eram duas: aceitar como in-vestidores a empresa turística e de cru-zeiros Global Destinations, proposta por Jiménez, ou a companhia aérea Nature Air, proposta por Fulmmer. “Eu propus

Teleférico, passarelas e assessoria científi ca para agregar valor

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