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PARA CHEGAR AO CEARÁ, COMPREENDER O BRASIL: A FUNDAÇÃO DO
IHGB, DO INSTITUTO DO CEARÁ E DO NACIONALISMO.
Ana Alice Miranda Menescal1
Resumo: O presente artigo busca analisar a trajetória de formação da identidade
cearense, através do sentimento nacional. Partindo da fundação do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro e em busca de uma pretensa homogeneização do nacionalismo no
Brasil foram fundados na segunda metade do século XIX os institutos históricos locais.
Deste modo, fez-se uma separação dos nacionalismos em prol do grande projeto de
fundação da nação brasileira, ou seja, a setorização das histórias locais em busca da
completude da história nacional. A fundação do Instituto do Ceará, já no final do século
XIX, é decorrente do incentivo do IHGB para a fundação dos institutos locais. O
Instituto do Ceará dá início às suas atividades assumindo uma postura semelhante à dos
primeiros anos do IHGB, utilizando metodologia bastante semelhante em busca da
fundação de sua própria história, de seu próprio sentimento nacional.
Palavras-chave: IHGB, Instituto do Ceará, Nacionalismo.
O século XIX foi uma época de grandes transformações para o Brasil. Em
menos de cem anos, o território passou de colônia portuguesa à república. Foi colônia
até o ano de 1808, quando a família real e sua Corte aqui desembarcaram para
estabelecer residência. As motivações fundamentais para essa transferência2 foram a
invasão das tropas napoleônicas à Portugal e a inquestionável fonte de riquezas que o
Brasil representava para o império português. O Rio de Janeiro tornou-se sede de
governo, mas só em 1815 foi elevado à categoria de reino, pertencendo agora ao
chamado Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.
1 Doutoranda em História (Área: História e Cultura do Brasil) – Universidade Clássica de Lisboa (UL);
Bolsista de Doutorado – Fundação de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Ceará
(FUNCAP); Mestre em Filosofia – Universidade Estadual do Ceará (UECE); Especialista em Estudos
Clássicos – Universidade Federal do Ceará (UFC); Licenciada em História – Universidade Federal do
Ceará (UFC). E-mail: [email protected] 2 A ideia da transmigração para o Brasil não surgiu com a ameaça napoleônica, quando Primeiro Ministro
do Rei D. José I, o Marquês de Pombal havia indicado o procedimento à família real. Sobre a vinda e
permanência da família real no Brasil conferir, por exemplo, de Lília Moritz Schwarcz, A longa viagem
da biblioteca dos reis (São Paulo: Companhia das Letras, 2002); de Thomas O‟Neil, A vinda da família
real portuguesa para o Brasil (São Paulo: José Olympio, 2007); de Jurandir Malerba, A Corte no exílio
(São Paulo: Companhia das Letras, 2000); de Keila Grinberg e Ricardo Sales (org.), O Brasil Imperial,
volume I, 1808-1831 (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009); da Revista do IHGB, A transferência
da corte portuguesa para o Rio de Janeiro (1967), A viagem da família real para o Brasil: 1807-1808
(1997), entre outros.
2
A terceira mudança veio com a Revolução Liberal do Porto3, movimento que
ganhou espaço na sociedade, tendo por justificativa fundamental a necessária restituição
da honra da nação portuguesa. O receio da sociedade, ressentida pelas dificuldades da
época, era de Portugal se tornar “colônia da colônia”. Daí a exigência do regresso das
Cortes e da recolonização do Brasil. Algumas das reivindicações foram atendidas, D.
João VI e parte das Cortes retornaram, ficando o Brasil sob o comando do príncipe-
regente D. Pedro I (D. Pedro IV de Portugal).
Com a nova situação do território, foi necessário a D. Pedro I proclamar a
independência, sendo coroado, após o reconhecimento pela antiga metrópole, Imperador
do Brasil4. Esta foi a quarta grande transformação. A medida tinha o claro intuito de
manter a unidade territorial, evitando a fragmentação ocorrida na América espanhola5.
Os caminhos trilhados por Portugal pareciam, desde muito cedo, antever o que poderia
conduzir sociedade colonial tão diversa, em território tão extenso, ao processo de
desmembramento. Em razão do receio de fragmentação, o governo não autorizou, por
exemplo, o estabelecimento de universidades na colônia portuguesa até que houve a
“real” necessidade, com a transferência da Corte.
Os jovens de família mais abastada realizavam seus estudos na Universidade
de Coimbra. Essa formação fez dos letrados brasileiros um grupo relativamente
homogêneo. E essa homogeneidade intelectual contribuiu para facilitar a centralização
3 Com a transferência da família real e das Cortes para o Brasil, a atuação da Inglaterra sobre o território
português era crescente. Não suportando o que consideravam descaso de D. João VI e das Cortes, os
portugueses defendiam que Portugal deveria ter de volta à condição de sede do Reino, sendo esta a razão
da revolta. 4 Há quem defenda que tudo não passou de jogada política de D. João VI e D. Pedro I. A ideia de que
havia um acordo entre pai e filho é recorrente nos escritos sobre a independência, entretanto, outros
estudiosos defendem o oposto, afirmando que a situação não era tão previsível. Os seguidores da segunda
tendência sustentam sua ideia em situações como a demora de Portugal em reconhecer o Brasil
independente e o alto custo do título de reconhecimento pela antiga metrópole. Sobre o processo de
independência conferir de Keila Grinberg e Ricardo Sales (org.), O Brasil Imperial, volume I, 1808-1831
(Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009); de José Murilo de Carvalho e Lúcia Maria Bastos Pereira
das Neves (org.), Repensando o Brasil do Oitocentos: cidadania, política e liberdade (Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2009); de Alberto da Costa e Silva (coord.), Crise colonial e independência 1808-
1830 (Rio de Janeiro: Objetiva, 2011), entre outros. 5 Na América espanhola, a postura assumida pelos antigos colonizadores foi muitíssimo distinta da opção
portuguesa. Logo foram instaladas universidades no território, dando aos habitantes a possibilidade de
formação em sua própria terra. É, muitas vezes, atribuído à essa política o processo de independência das
colônias, fragmentação territorial e fundação de governos republicanos. José Murilo de Carvalho
apresenta a seguinte análise: “a política espanhola de criar universidades nas colônias permitiu a
formação de elites locais e impediu o efeito unificador produzido por Coimbra” (CARVALHO, José
Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Teatro de sombras: a política imperial. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 39). Aparentemente, esta política educacional diferenciada
determinou a lentidão do processo político brasileiro que teve por desfecho o fim do império e
estabelecimento da república no Brasil.
3
do poder imperial e o projeto de nacionalidade do Estado. A partir do momento de
diversificação da formação foi possível identificar no Brasil a dissemelhança de
pensamentos e posturas. O interesse por outras instituições de ensino superior surgiu
devido aos altos custos de manutenção dos estudantes durante o período de formação.
Os cursos em Coimbra eram longos, oito anos para Medicina e nove anos para
Teologia, daí a procura por outros de curta duração, em Montpellier, Edimburgo e
Bordéus.6
Conhecimento e estudo vêm acompanhados da compreensão do entorno, assim,
a manutenção da unidade territorial ficava cada vez mais difícil, pois, à medida que a
sociedade se instruía, os questionamentos sobre a atuação portuguesa no Brasil
aumentavam. Mesmo com a aparente homogeneidade dos letrados, havia questões que
uma formação relativamente comum não conseguiria vencer. Enquanto quem vivia mais
próximo à Corte e tinha mais acesso às vantagens oriundas do contato era, geralmente,
mantido dentro de relativa satisfação, quem vivia em províncias mais distantes e mais
pobres, com pouca ou nenhuma voz junto à Corte, se ressentia do descaso com suas
questões.
Foi nas províncias mais desvalidas que começou a se pensar a questão nacional
no Brasil, mesmo sem a compreensão da abrangência do termo. As reivindicações eram
muito próprias das regiões, assim, podemos compreender esse sentimento nacional
como algo intrínseco à região e não da nação em si. Extensão territorial, distinções
étnicas, geográficas, econômicas e políticas não oferecem campo propício para a
unidade, mas cabia ao Imperador evitar o desmembramento da nação.
O que fazer? D. Pedro I respondeu essa pergunta com a força necessária.
Manteve a unidade à ferro e fogo enquanto esteve no governo, enfrentando movimentos
separatistas e de oposição. A intensa presença portuguesa à frente da política e
administração do território complicava a situação do Império, ao fim e ao cabo, o Brasil
permanecia sob o controle português, mesmo sendo “independente”. Com um
imperador lusitano, filho do Rei da antiga metrópole, e portugueses na linha de frente
do governo, todos com a clara intenção de manutenção da ordem e da unidade de uma
nação que sequer deveria fazer parte de seus interesses ou afazeres, permanecia o Brasil,
6 Cf. SILVA, Maria Beatriz Nizza da. A Cultura Luso-Brasileira. Da reforma da Universidade à
independência do Brasil. Lisboa: Editorial Estampa, 1999.
4
mesmo reconhecido como nação independente, sob uma espécie de custódia do Reino
de Portugal.
Das antigas academias ao IHGB: história, política e literatura em questão.
No século XVIII, antes da suposta efetivação da independência do Brasil
surgiram as primeiras associações e academias de intelectuais em terras brasileiras. Sua
existência parece ligada à necessidade de promover a cultura, afinal o Brasil não era
mais lugar de ignorantes e o crescente número de letrados requeria diálogo, estudo e
explanação das coisas da terra. Os bem-nascidos, grandes responsáveis pelas academias
não eram apenas homens de letras, em geral, também estavam ligados à política no
Brasil. Assim, contribuíam para as letras, a política e a história da futura nação.
Entretanto, é preciso compreender que em finais do século XVIII e princípio do século
XIX, não havia sistematização da História do Brasil. Até 1822, o Brasil sequer era uma
nação independente, portanto, a História estudada era a do velho continente. Deste
modo, as representações da história brasileira eram encontradas dentro da literatura
produzida no Brasil. E quem compunha esses escritos eram os homens formados em
terras europeias que organizaram as primeiras academias de intelectuais no Brasil. Os
leitores e críticos dessa produção eram, geralmente, os próprios associados, um público-
alvo fora dos seus salões era quase inexistente.
Como era de se esperar, a literatura brasileira em formação seguia os passos
daquela produzida na Europa, assim, os temas giravam em torno dos filhos da terra e do
progresso, sendo este último o objeto de desejo da intelectualidade brasileira. É preciso
ressaltar que as academias ilustradas contribuíram imenso para a fundação da História
do Brasil, em princípio uma história associada à literatura, repleta de imagens míticas e
de impressões sobre as maravilhas da terra. Sendo constituídas por homens de letras,
nasciam como modelos elitistas e os escolhidos não conquistavam espaço na
agremiação por seus dotes intelectuais; o ingresso se dava, fundamentalmente, por
razões econômicas ou políticas. As agremiações de letrados muito fizeram pela História
do Brasil, de início através da literatura; em seguida, passando por uma fase
memorialista, geralmente, com base em relatos orais, responsável por uma história sem
os rigores científicos; e, finalmente, a produção historiográfica pensada a partir da
concepção de história-ciência. Todos os passos dados em direção à profissionalização
5
da produção historiográfica no Brasil foram inspirados nos conhecimentos adquiridos
na Europa.
Com a independência do Brasil, a sociedade começou a se ocupar das questões
ligadas à identidade brasileira. No país, agora independente, aparentemente senhor de si,
a ideia de nacionalidade ou brasilidade surge ainda através da perspectiva literária,
especificamente com o período do romantismo, voltado para a caracterização das coisas
do Brasil, de suas gentes, da natureza, do progresso. Mesmo se tratando de literatura
romântica, já é possível, por volta de 1846, encontrar estudos mais apurados para essa
produção. Nesta época, já quase não se faz uma literatura que trate das coisas do Brasil
sem base em outros escritos. A referencia à outras obras e indicação de fontes é mais
constante.7
Do desejo e da necessidade de “fazer” a história da nação, nasce o Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), no ano de 1838. O IHGB inicia suas
atividades, inspirado no modelo do Instituto Histórico de Paris e servindo de molde para
agremiações posteriores. Segundo Lília Schwarcz, o intuito das agremiações deste tipo
era: “construir uma história da nação, recriar um passado, solidificar mitos de fundação,
ordenar fatos buscando homogeneidades em personagens e eventos até então
dispersos”8. O projeto do IHGB correspondia à necessidade do império de criar vínculos
entre o imperador e a população. Destarte, o IHGB foi fundado, e logo recebeu as
bênçãos imperiais. Não apenas bênçãos pela simpatia ao trabalho desenvolvido, mas um
bom apoio financeiro que chegou a contar 75% da receita do Instituto, por exemplo, no
ano de 18439.
Com a fundação do IHGB, a história ganha destaque, sendo vista como
“amálgama da sociedade”10
e efetivada como “expressão da identidade nacional”11
.
Passa a ser utilizada como instrumento para a construção da identidade nacional, como
recurso para demonstrar o processo de civilização implantado no Brasil e o progresso da
7 Um bom exemplo dessa postura na produção do romantismo brasileiro é Gonçalves Dias; em seus
Primeiros Cantos, encontramos notas explicativas sobre a necessidade de leituras prévias para
compreender seus escritos e sobre os termos de origem indígena utilizados ao longo das poesias. Cf.
DIAS, Gonçalves. Primeiros Cantos – poesias. Rio de Janeiro: Eduardo e Henrique Laemmert, 1846. 8 SCHWARCZ, Lília Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil –
1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 99. 9 GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. Historiografia e nação no Brasil: 1838-1857. Rio de Janeiro:
EdUERJ, 2011. Edições Anpuh. p. 75. 10
WEHLING, Arno. Estado, História e Memória: Varnhagen e a construção da Identidade Nacional.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 29. 11
Idem.
6
nação12
. Mas a própria brasilidade ainda havia de ser construída, sendo esta a função
primordial do Instituto: produzir uma história da nação, de modo que esta fosse
compartilhada por intelectuais e pelo restante da sociedade13
. A intencionalidade da
agremiação é realizar a sistematização da História do Brasil, a partir da história-ciência,
utilizando documentos, não mais apenas através da literatura. Daí surgem os embates
entre literatos e aqueles que se autodesignavam historiadores. Os historiadores do
século XIX tomavam para si o direito e o dever de fundar a história da nação brasileira,
atribuindo menos importância àqueles que produziam literatura, pois afirmavam que o
rigor científico estava longe da produção literária. Assim, literatura seria para as
senhoras e história-ciência para os estudiosos e para a sociedade.14
Sobre a relação entre literatura e história na construção da História do Brasil é
importante destacar que, com a revisão de funções e reformulação estrutural do IHGB
no fim da década de 1840, a tipologia dos textos produzidos para a Revista é modificada
por sugestão de D. Pedro II. Apesar da atuação declarada em seus estatutos, voltada
para as áreas de história e geografia, conforme as duas comissões indicadas
inicialmente, a antiga produção do IHGB ia da publicação de documentos, às traduções
e textos literários. Após a reformulação, os estatutos priorizavam as áreas de história,
geografia e etnologia. O próprio Imperador afirmou em discurso na sessão de 15 de
dezembro de 1849, “como primeiro socio, e primeiro interessado no progresso do
Instituto”15
os benefícios que a reforma interna do IHGB acarretaria, afirmando:
Sem duvida, Srs., que a vossa publicação trimestral tem prestado
valiosos serviços, mostrando ao velho mundo o apreço, que tambem
no novo merecem as applicações da intelligencia; mas para que esse
alvo se attinja perfeitamente, é de mister que não só reunaes os
trabalhos das gerações passadas, ao que vos tendes dedicado quasi que
unicamente, como tambem, pelos vossos proprios, torneis aquella a
que pertenço digna realmente dos elogios da posteridade: não dividi
pois as vossas forças, o amor da sciencia é exclusivo, e, concorrendo
todos unidos para tão nobre, util, e já difficil empreza, erijamos assim
um padrão de gloria á civilisação da nossa patria.1617
12
Cf. GUIMARÃES, 2011. 13
WEHLING, op cit. 14
Cf. GUIMARÃES, 2011. 15
212ª SESSÃO em 15 de Dezembro de 1849. Revista do IHGB, 12 (16), out-dez, 1849, p. 551. 16
Idem, p. 552. 17
Mantivemos a grafia do texto original e o mesmo procedimento será tomado nas demais citações de
material retirado das revistas do IHGB e do IC, bem como de outros textos que possuam a escrita como
marca de seu tempo.
7
Para alcançar os objetivos indicados por Pedro II, foram ampliadas as
comissões, destacando-se as de arqueologia, etnografia e línguas indígenas. Com a nova
postura é possível perceber o crescente interesse por uma instituição mais exigente e
mais “científica” em sua produção, o que de certa forma, promove a profissionalização
do instituto.
O destaque da história em detrimento da literatura se deve à necessidade de
promover a visibilidade da civilização e do progresso não apenas dentro do Brasil, mas
fora dele. O interesse era mostrar para a Europa que do outro lado do Atlântico não
havia apenas a possibilidade de desenvolvimento, mas este existia efetivamente e era
divulgado pela Revista do IHGB.
Sobre a concepção de história do IHGB, a inspiração no modelo do Instituto
Histórico de Paris o fez seguir muitos dos passos do instituto iluminista, assim, a
história é compreendida como elemento necessário à humanidade para que esta
compreenda seu processo evolutivo e possa alcançar o conhecimento da totalidade do
corpo social. No caso brasileiro, a história ainda aparece como forma de controle da
sociedade, uma vez que, ao recém-criado Estado, é necessário estabelecer vínculo entre
homem e nação, através da fundação da identidade nacional, abrindo o caminho para a
aceitação do governo imperial. Portanto, se a história tem, para o IHGB esta função,
cabe ao historiador o papel político-ideológico de apresentar os acertos do passado
demonstrando aos seus contemporâneos o caminho para a “verdadeira felicidade”, a
saber: o patriotismo, aceitação e respeito às instituições do governo monárquico, a
religiosidade e os bons hábitos18
. Ou seja, entre as funções do historiador estava o
estabelecimento de uma moral com tendência monárquico-católica, auxiliando desta
maneira àquele que era o sustentáculo maior do IHGB em seus primórdios, D. Pedro II.
A questão política, evidenciada no papel do historiador do IHGB demonstra
sua extensa ligação com o Estado, patente pela benção do Imperador e pela
transferência do instituto para as dependências do paço imperial, no ano de 1849. A
intencionalidade por traz do vínculo fica mais aparente na frequente presença de Pedro
II nas sessões da agremiação, em requerimentos de apoio financeiro à pesquisa19
e na
ideologia exposta nos escritos de membros do IHGB sobre a contribuição da história
para o Estado. Portanto, os interesses políticos de promoção da monarquia, exaltação da
18
GUIMARÃES, 2011. p. 126. 19
Cf. GUIMARÃES, op. cit.
8
imagem do Imperador e formação do caráter nacional andavam de mãos dadas com o
objetivo “maior” do IHGB de construir e solidificar a História do Brasil.
O Estado brasileiro necessitava construir uma identidade nacional que
integrasse a diversidade de povos e as imensas diferenças sociais e econômicas.
Portanto, a questão da nacionalidade ia além de interesses próprios do imperador e do
prestígio social adquirido pelos sócios do IHGB que deram início à produção
historiográfica da nação, havia a necessidade real de encontrar o que Aristóteles chamou
de “justo termo”, um ponto de ligação entre os três grandes grupos humanos. Karl
Friedrich Philipp von Martius, ao indicar os caminhos para a escrita da História Geral
do Brasil, refere-se à formação da população brasileira lembrando que
estes elementos de natureza muito diversa, tendo para a formação do
homem convergido de um modo particular três raças, a saber: a de côr
de cobre ou americana, a branca ou Caucasiana, e emfim a preta ou
ethiopica. Do encontro, da mescla, das relações mútuas e mudanças
d‟essas três raças, formou-se a actual população, cuja historia por isso
mesmo tem um cunho muito particular.20
Por esta particularidade surge a, aparentemente, inevitável associação entre
Estado e História em busca da fundação da identidade nacional. Assim, a associação
entre política e história fica ainda mais patente, pois o projeto nacional do IHGB era
também projeto político do Estado. Dentro deste encaixavam-se as mais variadas
questões, a língua portuguesa, eleita como língua nacional; a educação pública de
caráter nacional, sendo aos poucos afinada com os interesses do Estado-nação; a
questão geográfica e de fronteiras, importantes para o reconhecimento territorial e este,
por sua vez, para estabelecimento dos limites de atuação do império.
IHGB e Institutos locais: fundação da nacionalidade? Separar para juntar:
criando uma teia de nacionalismos.
Fundar o sentimento nacional em busca do fortalecimento da unidade
territorial, estabelecendo a nação. Para dar início ao processo e em auxílio ao Império, o
IHGB desde o princípio incentiva a produção de estudos monográficos regionais21
,
20
MARTIUS, Karl Friedrich Philipp von. Como se deve escrever a História do Brasil. Revista do IHGB,
Rio de Janeiro, 6 (24), jan/1845, 381-403, p. 381-382. 21
WEHLING, 1999. p. 38.
9
entretanto, é perceptível o ideal de centralização dos conhecimentos em suas próprias
dependências. Não era de se admirar que essa opção fosse feita, uma vez que a
centralização era parte da postura do governo imperial, sendo natural a instituição seguir
os passos ditados pelo seu patrono. Assim, tudo que se prestasse a contribuir para o
estabelecimento da História do Brasil deveria ser encaminhado para a biblioteca do
Instituto Histórico22
. Dessa necessidade de angariar informações úteis à fundação da
História nacional decorre a criação dos institutos locais em várias províncias, pois os
sócios do IHGB não seriam suficientes para agregar situações específicas das demais
regiões.
Era preciso estruturar a história do Brasil e das regiões, convencendo a todos
da importância dos acontecimentos ainda pouco estudados, algumas vezes apenas
supostos, para criar, na diversidade dos grupos sociais, o sentimento nacional e a
unidade da nação. No Art. 2º dos estatutos do IHGB, temos: “se ramificará nas
províncias do Imperio para mais fácil desempenho dos fins que se propõe”23
, assim,
foram criados, à sua semelhança, por exemplo, o Instituto Arqueológico, Histórico e
Geográfico Pernambucano (IAHGP) em 1862, o Instituto do Ceará (Histórico,
Geográfico e Antropológico) em 1887 e o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia
(IGHB) em 1894. Entretanto, mesmo com todo o incentivo à necessária
representatividade das províncias, a questão não deveria voltar-se para particularismos
regionais e sim para o interesse de forjar a história da nação. Portanto, questões
demasiado específicas ficavam de fora dos interesses pensados pelo IHGB para os
institutos históricos provinciais.
Deste modo, cada instituto fundado se associava ao projeto que unia Estado e
IHGB, contribuindo, com documentação disponível em arquivos, paróquias, acervos
pessoais e acervos estrangeiros, além de alguns estudos sobre aspectos caros à
construção da história nacional. É preciso destacar que a contribuição historiográfica
que o IHGB esperava das províncias acarretava um sentido de história inclusiva, ou
seja, as províncias contribuindo para a história geral da nação. Por isso, exclusivismos
históricos ou historiográficos eram rechaçados.24
22
GUIMARÃES, 2011. p. 127. 23
EXTRACTO dos Estatutos. Revista do IHGB. Rio de Janeiro, Tomo I, 1º trimestre de 1839, 18-20, p.
18. 24
Sobre a questão, destaca Manoel Luís Salgado Guimarães: “Inspirados no desejo de conhecer a fundo o
país, os cientistas ocupados com essa tarefa, com muito acerto, também se voltavam para os
10
O próprio von Martius, em seu premiado Como se deve escrever a História do
Brasil, afirma a necessidade de estabelecer um objetivo uno entre as províncias,
excluindo ideias políticas imaturas, a saber, republicanas e utópicas, como o autor
refere, para fazer do Brasil um “Todo Unido”25
e ainda:
deve o historiador patriotico aproveitar toda e qualquer occasião afim
de mostrar que todas as Provincias do Império por lei organica se
pertencem mutuamente, que seu propicio adiantamento só póde ser
garantido pela mais intima união entre ellas.
(...)
Nunca esqueça, pois, o historiador do Brasil, que para prestar um
verdadeiro serviço á sua patria deverá escrever como auctor
Monarchico-Constitucional, como unitario no mais puro sentido da
palavra.
Da citação de Martius, percebemos o quanto era alimentada esta questão da
história e do historiador carregarem consigo o sentido político-ideológico da promoção
da centralização do poder imperial e, especialmente, da monarquia-constitucional como
modelo ideal de governo para a totalidade do Brasil.
É importante ressaltar que na década de 70, do século XIX, teorias como, o
positivismo, o evolucionismo, o social-darwinismo e o naturalismo adquirem força em
território brasileiro, trazendo mudanças no modo de pensar, afastando a perspectiva
romântica e estabelecendo o que se pretendia por história-ciência. A difusão de ideias
partia não só das faculdades, mas também dos próprios Institutos.
Acerca do Ceará, sabemos que a atividade intelectual começa a transparecer
para a sociedade cearense no mesmo período. Eduardo Lúcio Guilherme Amaral nos
informa que no sétimo decênio do oitocentos já “vivia a Província [...] quadro de
vigorosa expressão intelectual, com a fundação de vários círculos letrados na capital e
no interior”26
. Exemplos disto são a Academia Francesa, o Reform Club27
, o Gabinete
Cearense de Leitura e o Cosmos Científico. Houve, ainda, uma tentativa de criação do
acontecimentos históricos nas diversas províncias, entendendo-as como parte da história do Império
como um todo.
Porém, não se tratava de salientar as peculiaridades e idiossincrasias das diversas regiões, mas antes de
acentuar o que tinham em comum. Expressão do conceito de Estado centralizado, era o fato que o IHGB,
sediado no Rio de Janeiro, se ocupava dessa tarefa. Por assim dizer, a central chamava a si o
conhecimento oriundo e a respeito das províncias.” (GUIMARÃES, 2011. p. 163-164). 25
MARTIUS, op. cit., p. 402. 26
AMARAL, Eduardo Lúcio Guilherme. Barão de Studart: memória da distinção. Fortaleza: Museu do
Ceará; Secretaria da Cultura e Desporto do Ceará, 2002. p. 33. 27
Cf.: AZEVEDO, Sânzio de. A Academia Francesa do Ceará. Fortaleza: Casa José de Alencar/UFC,
1971; BARREIRA, Dolor. A Academia Francesa do Ceará. In: BARREIRA, Dolor. História da
Literatura Cearense. (Ed. Fac-similar). Fortaleza: Instituto do Ceará, 1986; CAMPOS, Eduardo.
Capítulos da História da Fortaleza do século XIX – o social e o urbano. Fortaleza: UFC, 1985.
11
Instituto do Ceará em 1877, mas, por questões políticas, não vingou. Somente dez anos
depois, o Instituto do Ceará foi fundado de fato, sua Revista veio no mesmo ano e junto
com ela a publicação de documentos e análises relativas à identidade, à participação
política do Ceará frente ao Império, aos povos indígenas da região, entre outros temas.
O Instituto do Ceará: trajetória e fundação do “nacionalismo local”.
O Instituto do Ceará (Histórico, Geográfico e Antropológico) iniciou suas
atividades em 4 de março de 1887, tendo por objetivo principal “tornar conhecidas a
historia e a geographia da provincia e concorrer para o desenvolvimento das lettras e
sciencias”, conforme Art. 1º § 1º de seus estatutos28
. O destaque social e político da
instituição se devia à representatividade de seus membros, reconhecidos intelectuais da
sociedade cearense, alguns ligados ao ensino atuando, na Província, como professores
do Liceu do Ceará, da Escola Normal ou da Escola Militar, outros eram políticos,
médicos e jornalistas29
.
Diferindo das diretrizes dos primeiros anos do IHGB, o Instituto do Ceará
indica em seus estatutos já à época de sua fundação, a produção de um texto dos
candidatos a membros da agremiação, para submissão à comissão avaliadora. Portanto,
apesar do valor atribuído na formação dos institutos ao destaque social dos membros,
em fins do século XIX, a exigência de profissionalização da produção dos institutos já é
parte dos regulamentos das agremiações, o que condiz com a reformulação do IHGB e
de seus estatutos em finais da década de 1840.
Além da visibilidade profissional, o envolvimento político, mesmo não dizendo
respeito à cargos diretos, era forte. E a própria atuação intelectual dos doutos do
Instituto do Ceará não ficava limitada a esta agremiação, segundo Eduardo Lúcio G.
Amaral,
28
ESTATUTOS do Instituto do Ceará. Revista Trimestral do Instituto do Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo
I, Anno I, 9-11, 1887, p. 9. 29
Sobre a composição do Instituto do Ceará, conferir: OLIVEIRA, Almir Leal de. O Instituto Histórico,
Geográfico e Antropológico do Ceará – memória, representações e pensamento social (1887-1914). São
Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2001. TESE DE DOUTORADO NÃO
PUBLICADA; AMARAL, 2002, entre outros.
12
Quase todos participaram, uma vez na vida pelo menos, de algum
grêmio literário cearense. A moda intelectual do momento primava
pela inserção nesses grêmios, verdadeiras congregações de interesses
intelectuais, políticos e estéticos, que tiveram ampla penetração em
toda a Província, desde o início da década de 70 do século XIX30
A formação desse grupo de intelectuais, por certo, estava ligada à Escola de
Direito de Recife, pois alguns dos nomes do Instituto do Ceará completaram seus
estudos naquele centro de formação31
. É importante lembrar que a distância da Corte
colocava Ceará e Pernambuco em condição semelhante quanto à possibilidade de
representação política no Brasil. Deste modo, em Recife, segundo Lília Schwarcz, os
“pesquisadores viviam ao menos a certeza que representavam a vanguarda científica no
Brasil”32
e, atrevemo-nos a dizer que a condição dos intelectuais cearenses aproximava-
se à dos pernambucanos. Apesar das diferenças econômicas existentes entre as
Províncias, no convívio e nas discussões sobre as teorias em voga nas décadas de 1870
e 1880, os filhos de ambas estavam juntos nos mesmos círculos e em proximidade de
condições, por sua distância do centro político e diminuição de poder com a
centralização do governo. 33
Quanto às características da produção do Instituto do Ceará, inicialmente a
associação entre religião e ciência era bastante aparente nas abordagens de seus sócios e
até certo ponto, o convívio foi possível entre homens de fé e homens de ciência, o que
correspondia à postura do governo imperial e ao IHGB. Entretanto, o crescente processo
de laicização da sociedade letrada ia aos poucos levando o Instituto para uma situação
de descrédito pelos intelectuais de sua terra. Comprovando o convívio inicial de fé e
ciência entre os membros do Instituto do Ceará, em 1889 tomou posse como associado,
Thomaz Pompeu de Sousa Brasil, capitalista cearense, defensor do cientificismo e
maçom. Seu discurso fazia alusão à estagnação da fé e a incansável atividade da
ciência34, porém, mais evidente que sua defesa do cientificismo é a colocação final da
30
AMARAL, 2002. p. 31-32. 31
Idem, p. 34. 32
SCHWARCZ, 1993. p. 150-151. 33
Lembramos aqui que Pernambuco e Ceará estiveram sob o mesmo governo até o ano de 1799. E,
mesmo após a separação, as relações políticas permaneceram, estiveram juntos na Revolução
Pernambucana (1817), na Confederação do Equador (1824), na articulação em prol do estabelecimento da
maioridade de D. Pedro II (1840). Após 1840, com a centralização do poder, simbolizada por D. Pedro II,
a visibilidade política das duas províncias diminui, pela distância do centro político da nação. 34
Disse Pompeu: “Merecimento houvesse nessa quietude, intencional do espírito, e seriam estes os
eleitos da fè, os patriarcas do immobilismo, por terem sacrificado todos os gozos corporeos á sua
aquisição, a almejada morte da faculdade de pensar.
13
sessão de posse que, apesar de não apresentar indicação da autoria, condiz com o
posicionamento da grande maioria dos afiliados do Instituto. Assim: “A‟ parte
divergencias de criterio na apreciação das cousas, o „Instituto do Ceará‟ acaba de ter
uma victoria. Saudando o novo luctador, nada mais posso fazer do que apontar lhe a
liça. Seja bem vindo”35
. É perceptível, pelo citado, que mesmo com posicionamento
distinto, o Instituto reconhece o valor do novo sócio e o recebe na mesma.
Com o fim do Império, com a Constituição de 1891 e com a separação entre o
Estado e a Igreja, o processo de laicização, já evidente na sociedade, é firmado por lei.
A política conservadora e a Igreja foram perdendo espaço na recém-instalada República
Brasileira. Este fato não dissipou dos homens da agremiação suas condutas e ideais
cristãos. Permanecia no Instituto do Ceará a tentativa de manter a união entre ciência e
fé e, justamente pela maioria de seus sócios acreditarem na superioridade da fé, grande
parte das publicações da agremiação eram documentos ou, quando muito, textos
biográficos, com o mínimo de interferência do autor, o que, segundo Eduardo Lúcio G.
Amaral demonstra o pudor em confundir os espaços da fé e da ciência36
.
Decerto a trajetória do Instituto do Ceará sofreu com a perda do Barão de
Studart no final da década de 1930. Sua dedicada atuação como pesquisador e
compilador de documentos sobre a história do Ceará lhe conferiram grande destaque
entre os membros do Instituto e o reconhecimento de seus companheiros ainda em vida.
Sobre o barão, disse Thomas Pompeu Sobrinho:
Como sustentáculo do INSTITUTO DO CEARÁ, agremiação cultural
que já venceu mais de meio século de preciosa vida e probidoso labor,
levando ao mundo inteiro a contribuição honesta e desinteressada do
nosso esfôrço no setor das indagações geo-históricas e etnológicas, foi
insuperável o Barão de Studart. Isto lhe valeu o honroso título de
PRESIDENTE PERPÉTUO DO INSTITUTO, com que, já há anos,
resolveram os sócios do respeitável sodalício demonstrar a sua
admiração e o seu reconhecimento pela inexcedível dedicação, pela
energia, pela constância e pela inteligência postas sem restrição ao
serviço da velha instituição.37
Mas viver é o contrário disto: e na concorrência vital das intelligencias primam as que são ennergicas e
dispõem de noções mais completas sobre a evolução do individuo e das sociedades.” (SOUSA BRASIL
FILHO, Thomaz Pompeu de. Discurso proferido pelo Sr. Dr. Thomaz Pompêu na sessão de 12 de Março
de 1889 por occasião de sua posse de socio effectivo. Revista Trimestral do Instituto do Ceará,
Fortaleza, v.2, Tomo III, Anno III, 106-117, 1889. p. 107). 35
Idem, p. 117. 36
AMARAL, 2002. p. 47. 37
A PALAVRA dos do Instituto. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo Especial,
dedicado ao Barão de Studart, Anno LII, 108-118, 1938, p. 110-111.
14
Com a morte de seu principal membro, o Instituto do Ceará, através de seus
associados, tomou para si o epíteto de Casa do Barão de Studart, reconhecendo a
importância do intelectual. Além da significativa perda, a dificuldade seguinte foi a
criação de uma nova instituição, a Universidade Federal do Ceará, que disputaria o
posto de mais importante círculo de pensamento do Estado38
. Apesar da impossibilidade
de superar a concorrente, o Instituto permaneceu em funcionamento e manteve suas
publicações ininterruptamente.
É importante destacar que a proclamação da República no Brasil acontece
quando o Instituto do Ceará tinha, ainda, menos de três anos de funcionamento.
Aparentemente, não houve grandes mudanças na postura de seus associados ou mesmo
em sua produção. Ora, se pensarmos a proclamação da república do ponto de vista dessa
camada da sociedade que possuía mais recursos, mais conhecimento e, na medida do
possível, mais influência, foi esse percentual da população que promoveu o chamado
golpe da maioridade, o que permitiu a manutenção da unidade nacional; que apoiou o
governo de D. Pedro II, enquanto havia interesse na manutenção do império e, para
finalizar, foi o mesmo que organizou o golpe político-militar que pôs fim ao Império e
iniciou a república.
O cenário político mudou, mas as personagens eram praticamente as mesmas.
Os antigos monarquistas tornaram-se os republicanos e o perfil do Instituto do Ceará
pouco sofreu alterações com a mudança de governo. Ao longo dos anos, obviamente, as
transformações internas ficam mais evidentes, com o ingresso de homens de ciência, no
lugar dos falecidos homens de fé, por exemplo. A atuação do historiador do Instituto do
Ceará vai se adequando às necessidades do novo governo. A historiografia, inicialmente
utilizada para introduzir o Ceará na História do Brasil, destacando e, algumas vezes,
criando valores sobre sua contribuição para o estabelecimento da nação, além da óbvia
promoção da civilização estabelecida pelos portugueses e assumida pelos homens de
38
A fundação da Universidade Federal do Ceará data do ano de 1954, sendo constituída pela união da
Faculdade de Direito, Faculdade de Farmácia e Odontologia, Escola de Agronomia, Faculdade de
Medicina, todas já em funcionamento na cidade de Fortaleza. Apesar de ter diminuído a importância do
Instituto do Ceará, podemos afirmar que o movimento em prol da criação desta primeira universidade do
estado teve início dentro do próprio Instituto, pois o primeiro reitor era um dos letrados do seu quadro de
sócios, desde o ano de 1943. Tendo se pronunciado sobre a necessidade da criação da nova instituição em
conferência proferida no Instituto Brasil-Estados Unidos, no dia 11 de novembro de 1948. O texto da
citada conferência foi publicado pela Revista do Instituto do Ceará em 1949. Sobre a questão, cf.
MARTINS FILHO, Antonio. Uma Universidade para o Ceará. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza,
v.1, Tomo LXIII, Ano LXIII, 5-19, 1949; AMARAL, 2002.
15
letras do lugar, ganha ares mais independentes da nação, buscando a ligação da
população da antiga província com sua própria história ou aquela que lhe era atribuída.
Portanto, valores distintos abordando uma questão única, o sentimento nacional, a
identidade, elementos que ligam o homem à história, ao seu lugar de origem.
Mesmo fundado quase 50 anos após o IHGB, Instituto do Ceará inicia seus
trabalhos ainda com uma abordagem muito semelhante à da instituição nacional,
privilegiando a publicação de documentos, deixando em segundo plano os trabalhos
autorais. Outro aspecto importante é que, por longo período, a ligação do Instituto do
Ceará com a Europa foi mais constante que o contato interprovincial. Jornais, revistas e
correspondências vindas do velho continente chegavam, em muitos casos, antes do que
era produzido no próprio território. Uma explicação possível para a semelhança do
Instituto do Ceará aos primeiros tempos do IHGB é a necessidade de autoafirmação da
província perante a nação.
O Instituto do Ceará, a pesquisa e a apresentação de documentos: metodologia(s).
Os intelectuais do Instituto do Ceará tomaram para si a responsabilidade de
fundar a História do Ceará, através da busca incansável de documentos que dissessem
respeito à sua origem, mas sem esquecer o compromisso com uma suposta verdade
histórica. Obviamente a postura assumida não era privilégio destes senhores. De modo
geral, os filiados aos Institutos Históricos do Brasil pressupunham a mesma atitude.
Mesmo após a modificação do método historiográfico do IHGB, os Institutos Históricos
privilegiavam num primeiro momento a publicação de documentos.
No caso do Ceará, pode tratar-se apenas de opção metodológica inicial, tendo
em vista que, no ano de fundação do Instituto do Ceará, a produção do IHGB já tinha
quarenta e nove anos e a do IAHGP contava vinte e cinco anos, enquanto a academia
cearense despontava. Portanto, a escolha metodológica pode estar vinculada à sua
necessidade momentânea de inserção na história nacional e interesse em exaltar o
processo civilizatório começado pelos portugueses, continuado pelo IC em busca do
destaque da Província no contexto brasileiro.
Expressar a metodologia empregada para utilização dos documentos é
apontamento recorrente nos artigos da Revista. Paulino Nogueira era um dos
intelectuais que ressaltava o cuidado em seguir aquilo o que os documentos
16
evidenciavam. Por exemplo, ao iniciar sua série de artigos intitulada Presidentes do
Ceará, faz a seguinte afirmação:
Em materia de historia, nos documentos acho, nos documentos deixo,
sem me preoccupar com os individuos. Quem vier após de mim ha de
se convencer de que fui tão fiel á verdade historica quanto respeitador
das conveniencias sociaes que, como os casos, ás vezes podem mais
do que as leis.39
Trata-se de citação acerca de um tipo de produção muito específica, pois
alguns dos artigos escritos para esta série referem-se à fatos quase contemporâneos ao
autor, portanto bastante suscetíveis à contestação de outros40
. Entretanto, nos serve
como exemplo dos procedimentos, pois o objetivo dos intelectuais vinculados ao
Instituto do Ceará não era criar polêmicas em torno de seus escritos, mas trazer à tona a
veracidade dos fatos.
Empenhando-se em contribuir para a fundação da ideia de nação brasileira, o
Instituto do Ceará apresenta documentos sobre a história mais antiga da Província. As
fontes eram desconhecidas e, por isso, poderiam parecer numerosas sendo grandes as
dificuldades para realizar a coleta de material. Os membros do Instituto agiam por conta
própria, não havia nenhum tipo de incentivo ou colaboração financeira do governo para
despesas com viagens, estadias ou transcrição de documentos. Ainda assim, recorrendo
aos arquivos locais, nacionais e estrangeiros, os intelectuais do Instituto foram aos
poucos fundando sua história, inicialmente em função da nação, depois em função do
Ceará, compilando inúmeros documentos sobre os primórdios da terra e de suas gentes.
Material disponibilizado, atualmente, nos arquivos do Instituto.
Em sua maioria, os membros da agremiação dividiam suas atividades pessoais
com a pesquisa, coleta de documentos e produção dos textos para a Revista do Instituto.
Com grande destaque para a atuação do Barão de Studart41
, por sua dedicação, trabalho
39
NOGUEIRA, Paulino. Presidentes do Ceará. Revista Trimestral do Instituto do Ceará, Fortaleza,
v.1, Tomo IV, Anno IV, 40-71, 1890, p. 41-42 (grifo nosso). 40
Ibidem. 41
Para conhecer a biografia do Dr. Guilherme Studart (Barão de Studart), cf.: Revista do Instituto do
Ceará, Fortaleza, Tomo Especial, dedicado ao Barão de Studart, Anno LII, 1938; e, Revista do Instituto
do Ceará, Fortaleza, Tomo Especial, 1º Centenário de nascimento do Barão de Studart, Anno LXX,
1956.
17
e produção em prol do Instituto e da História do Ceará42
. Sobre o Barão, afirma José
Honório Rodrigues:
Na historiografia local ninguém se avantajou ao Barão de Studart, no
amor ao estudo, na vastidão da pesquisa, na capacidade de realização.
Desenvolvendo um esforço contínuo, persistente e positivo, procurou
na Inglaterra, França, Holanda e Itália a matéria-prima reveladora do
passado brasileiro.43
O próprio Studart, em carta endereçada ao amigo Capistrano de Abreu, datada
de 26 de junho de 1893, afirma seu interesse pelas pesquisas em história e geografia,
além do exercício da medicina44
em benefício dos mais carentes
Eis-me aqui de novo restituído ao pátrio torrão, após uma ausência de
12 meses e volto animado para lidar como nunca por entre papeis
velhos e quase ilegíveis; mudou-se o cenário apenas. Verdade é que os
doentes procuram-me como dantes ou mais ainda (pois venho dalém
do Atlântico e só vale o que cheira a estrangeiro, pensa o povo que
trago no bôlso algum elixir de longa vida) e anteponho a tudo o
exercício da profissão médica, mas estou resolvido a dar às pesquisas
de história e geografia pátrias todo o tempo que dela me sobrar.45
Sobre os louros recebidos por suas pesquisas, Studart tem o reconhecimento,
também, de Capistrano de Abreu que, em carta de 18 de junho de 1893, elogia a
dedicação do Barão à história e geografia de sua terra, ressaltando a importância de seu
contributo para os estudos históricos e o destaque do Ceará frente aos outros estados da
região46
. Ressaltemos que a maior parte do acervo do Instituto do Ceará corresponde à
compilação de documentos realizada por Studart ao longo dos anos em que esteve à
frente da produção e publicação da Revista do Instituto do Ceará.
Voltando à ideia de verdade histórica e seu inverso, a inverdade histórica, na
produção do Instituto, o destaque permanece para o Barão de Studart e seu intenso
42
É importante lembrar, uma vez mais, que àquela época o historiador era uma espécie de compilador de
documentos. Se tomarmos a concepção que afirmavam ter de si próprios, não era parte de seus atributos o
questionamento das fontes documentais ou a interpretação dos documentos; apenas a exposição seca, e,
pretensamente imparcial e objetiva do material para conhecimento da sociedade. No discurso dos
historiadores do Instituto do Ceará assim deveria ser exercida a função. 43
RODRIGUES, José Honório. A pesquisa histórica no Brasil. 3. ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional; MEC, 1978. (Coleção Brasiliana). p. 95-96. 44
Studart concluiu seus estudos de Medicina na Faculdade de Medicina da Bahia, doutorando-se em
1877. 45
AMARAL, Eduardo Lúcio Guilherme. Correspondência cordial: Capistrano de Abreu e Guilherme
Studart. Fortaleza: Museu do Ceará/Secretaria de Cultura, 2003. (Coleção Outras Histórias). p. 96. 46
Idem, p. 111.
18
trabalho de pesquisa; correspondendo ao fazer historiográfico de seu tempo, a história
escrita pelo intelectual foi realizada a partir de incansável levantamento documental, em
busca da comprovação da verdade, por isso mesmo, percebemos em seus escritos uma
análise voltada para o que se poderia considerar, a seu tempo, inverdades históricas, por
não corresponderem aos documentos. O Barão deixa a sua preocupação clara em vários
de seus escritos, como no artigo Francisco Pinto e Luiz Figueira – o mais antigo
documento existente sobre a história do Ceará, publicado na Revista do Instituto do
Ceará de 1903, quando afirma:
Ayres de Cazal (Corografia Brasílica, vol. 2º p.219) inventa a
existencia de uns presidios na costa do Ceará, dos quaes tirou Pero
Coelho alguma gente para executar o projecto que felizmente
conseguiu deixando o Indio sujeito á Coroa de Portugal.
O projecto a que se refere (...) é forçoso dizer, não ha o que aproveitar
em beneficio da verdade...
Taes prezidios Portuguezes na costa, anteriores á vinda de Pero
Coelho e aos quaes prejudicava a alliança dos Francezes com o
principal Mel Redondo, são fructo apenas da imaginação do auctor.
O que ha de verdadeiro é que ao chegar ao districto do Ceará, o
capitão-mór muniu-se de auxiliares, mas esses foram indios
domesticados alli moradores.(grifo do autor)47
Ao mesmo tempo em que atenta para as inverdades de uns, Studart também
demonstra respeito e cuidado ao referir-se a outros, como é o caso de Francisco Adolfo
de Varnhagen. No mesmo artigo, o intelectual afirma que o pai da História nacional
parece apadrinhar Pero Coelho ao indicar um nome diferente para identificar como
algoz dos indígenas, livrando Coelho da acusação. Percebemos o zelo pela memória de
Varnhagen na declaração do Barão que afirmou: “Pode ter sido tudo assim, pode
Varnhagen ter encontrado, e longe de mim suspeital-o de forjador de documentos, a Provisão
Regia de 19 de Setembro de 1606 ordenando a prisão e processo de João Soromenho”48
.
A preocupação com a verdade continua ao longo do artigo, seja sobre o destino
de Pero Coelho ao fim de sua viagem, seja sobre o local do enterramento do Padre
Francisco Pinto, morto na divisa entre as fronteiras dos atuais Estados do Ceará e Piauí,
nomeadamente na Serra da Ibiapaba, após ataque de índios inimigos. Studart faz um
47
STUDART, Barão de. Francisco Pinto e Luiz Figueira – o mais antigo documento existente sobre a
história do Ceará. Revista Trimestral do Instituto do Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo XVII, Anno XVII,
52-96, 1903. p. 53-54. 48
Idem, p. 59.
19
constante cruzamento de dados entre diversos documentos e autores que analisam a
mesma época em busca do veredito sobre os fatos ocorridos.
Em outro artigo, desta vez sobre Martin Soares Moreno, o intelectual, continua
perseguindo a verdade histórica, e demonstra o valor dado aos documentos, por
exemplo, na passagem onde afirma, “não conheço manuscripto algum que trate de Pero
Coelho; o que delle se sabe acha-se em obras já dadas á imprensa”49
. A condição
relativa à falta de referências documentais parece incomodar o Barão, pois este os
considera a fonte da verdade e defende que através deles, dos documentos, se pode ter a
certeza dos fatos.
E o que é essa pretendida verdade histórica? Como sabemos, para grande parte
da historiografia oitocentista, documentos válidos são aqueles considerados oficiais
pelas entidades ou instituições às quais caberia atribuir-lhes valor, legitimando os
registros escritos de um fato. Assim, neste caso específico, julgamos ser verdade
histórica a comprovação do fato através de documentos válidos. Entretanto, seguindo as
ideias de Paul Ricoeur, qualquer documento não é nada além de uma infinidade de
possibilidades hermenêuticas50
. Não só a escrita daquele documento que é tomado por
verdade histórica está repleta de ideologias condicionantes, como sua análise também
se encontra amparada por uma carga ideológica. Deste modo, a compreensão do
documento estará condicionada à experiência do leitor51
. Seguindo concepção
heideggeriana, o autor afirma:
A primeira função do compreender é a de nos orientar numa situação.
O compreender não se dirige, pois à apreensão de um fato, mas à de
uma possibilidade de ser [...] compreender um texto, diremos, não é
descobrir um sentido inerte que nele estaria contido, mas revelar a
possibilidade de ser indicada pelo texto.52
Assim, a suposta verdade histórica, norte dos intelectuais do Instituto do
Ceará, cai por terra, pois as ideias de objetividade e neutralidade, determinantes de sua
produção, dizem respeito à ideologia de sua época. Portanto, as conclusões às quais
49
STUDART, Barão de. Martin Soares Moreno, o fundador do Ceará. Revista Trimestral do Instituto
do Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo XVII, Anno XVII, 177-228, 1903. p. 189. 50
Cf. RICOEUR, Paul. Interpretações e Ideologias. Rio de Janeiro: F. Alves, 1990; a mesma postura
pode ser verificada em História e Memória de Jacques Le Goff, especialmente no capítulo intitulado
“Documento/monumento” (São Paulo: Unicamp, 1994). 51
Cf. RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa. São Paulo: Papirus, 1997, t. 3. 52
RICOEUR, 1990. p. 33, grifo nosso.
20
chegavam a partir da leitura de manuscritos condiziam apenas com uma possibilidade
de compreensão da mensagem contida no documento.
Para afirmar a impossibilidade do homem de ser neutro e objetivo Hans-Georg
Gadamer, afirma:
não podemos nos abstrair do devir histórico, situar-nos longe dele,
para que o passado se torne, para nós, um objeto...Somos sempre
situados na história...Pretendo dizer que nossa consciência é
determinada por um devir histórico real, de tal forma que ela não
possui a liberdade de situar-se em face do passado.53
Desta maneira, a análise documental exposta pelos doutos do Instituto do Ceará
é utilizada simplesmente para a fundação de uma ideologia, ainda que de forma
inconsciente54
. E, pensando o uso dos documentos, temos Durval Muniz de
Albuquerque Júnior destacando a função do historiador:
O historiador conta uma história, narra; apenas não inventando os
dados de suas histórias. Consultando arquivos, compila uma série de
textos, leituras e imagens deixadas pelas gerações passadas, que, no
entanto, são reescritos e revistos a partir dos problemas do presente e
de novos pressupostos, o que termina transformando tais documentos
em monumentos esculpidos pelo próprio historiador, ou seja, o dado
não é dado, mas recriado pelo especialista em História.55
Mesmo não se referindo propriamente à lógica historiográfica dos Institutos
Históricos, na passagem citada, Durval Muniz tangencia a prática dos intelectuais
dessas agremiações. Recorrendo aos documentos, esses letrados encharcados das teorias
de sua época e de uma suposta neutralidade científica, se pensarmos o final do século
XIX e início do XX, esculpiam (e frisamos, apenas esculpiam!) a história pretendida
verdadeira, marcados, como é obvio, por toda a mesmidade que lhes cabia. Para
perceber a questão da mesmidade, recorremos à Adam Schaff. O autor afirma:
53
GADAMER, Hans-Georg. Kleine Schriften. 1. Philosophie Hermeneutik, Tübigen, 1967 apud
RICOEUR, 1990. p. 40. 54
Importa ressaltar a época em que a produção desses intelectuais foi pensada. Diante disto, a ideologia
construída por eles deve ser compreendida a partir de seu universo cultural. Não há propriamente uma má
intenção na atitude assumida por aqueles historiadores. A reflexão aqui exposta leva isto em conta. Nossa
intenção é, portanto, apresentar uma chave interpretativa capaz de oferecer subsídios teóricos para
compreensão dos nossos documentos. 55
ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. História: a arte de reinventar o passado. Ensaios de
teoria da história. Bauru, SP: EDUSC, 2007. p. 62-63.
21
O historiador – sujeito que conhece – é um homem como qualquer
outro e não pode libertar-se das suas características humanas: não é
capaz de pensar sem as categorias de uma língua determinada, possui
uma personalidade socialmente condicionada no quadro de uma
realidade histórica concreta, pertence a uma nação, a uma classe, a um
meio, a um grupo profissional, etc., com todas as conseqüencias que
tudo isto implica no plano dos estereótipos que aceita
inconscientemente, em geral, da cultura de que é ao mesmo tempo
uma criação e um criador, etc.56
Por não possuírem a compreensão de serem incapazes das pretensas
neutralidade e objetividade, ou seja, a não liberdade afirmada por Schaff, os intelectuais
do Instituto do Ceará seguiram utilizando os documentos em busca da legitimação da
história local. Recortando do passado somente o que interessava ao modelo
historiográfico da época, em busca da criação de memórias históricas para a população
cearense, fragmentando o processo histórico e cristalizando57
momentos que, segundo
seus preceitos, caracterizavam o princípio da luz, da civilização trazida pelos
portugueses e continuada pelos doutos do Instituto.
Como dissemos, interessa-nos apontar para o fato de que o velho Barão e seus
pares não possuíam esses elementos teóricos à disposição. Em razão disto seguiam com
a preocupação do respeito aos documentos, acreditando, ou afirmando acreditarem, na
não interferência nos escritos originais pelo trabalho desenvolvido por eles.
Obviamente que ao longo dos anos as ideologias mudaram, o convívio de
vertentes de pensamento diversas ficou mais evidente e há a publicação de imensa
variedade de estudos historiográficos, teóricos, filosóficos, sociológicos, entre outros.
Há, também, a publicação de documentos avulsos, compilações documentais, biografias
e elogios biográficos, memórias, crônicas, catálogos bibliográficos e tantas outras
modalidades consideradas menores ou ultrapassadas para os moldes historiográficos
atuais, praticados nas universidades. Contudo, é preciso considerar a contribuição dos
Institutos Históricos, pois, por longos anos, foram estas instituições que buscaram os
documentos e produziram a historiografia nacional, germinando as sementes para
possibilitar muito do mister do historiador pós 1930. Além de, em certos casos, a
criação das universidades estar vinculada ao empenho de sócios dos institutos, às
discussões realizadas dentro das agremiações ou em nome destas, como é o caso do
Ceará.
56
SCHAFF, Adam. História e verdade. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 284. 57
ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2007. p. 206.
22
Referências Bibliográficas
Fontes
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A PALAVRA dos do Instituto. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo
Especial, dedicado ao Barão de Studart, Anno LII, 108-118, 1938.
ESTATUTOS do Instituto do Ceará. Revista Trimestral do Instituto do Ceará,
Fortaleza, v.1, Tomo I, Anno I, 9-11, 1887.
EXTRACTO dos Estatutos. Revista do IHGB. Rio de Janeiro, Tomo I, 1º trimestre de
1839, 18-20.
MARTIUS, Karl Friedrich Philipp von. Como se deve escrever a História do Brasil.
Revista do IHGB, Rio de Janeiro, 6 (24), jan/1845, 381-403.
NOGUEIRA, Paulino. Presidentes do Ceará. Revista Trimestral do Instituto do
Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo IV, Anno IV, 40-71, 1890.
SOUSA BRASIL FILHO, Thomaz Pompeu de. Discurso proferido pelo Sr. Dr. Thomaz
Pompêu na sessão de 12 de Março de 1889 por occasião de sua posse de socio effectivo.
Revista Trimestral do Instituto do Ceará, Fortaleza, v.2, Tomo III, Anno III, 106-
117, 1889.
STUDART, Barão de. Francisco Pinto e Luiz Figueira – o mais antigo documento
existente sobre a história do Ceará. Revista Trimestral do Instituto do Ceará,
Fortaleza, v.1, Tomo XVII, Anno XVII, 52-96, 1903.
STUDART, Barão de. Martin Soares Moreno, o fundador do Ceará. Revista
Trimestral do Instituto do Ceará, Fortaleza, v.1, Tomo XVII, Anno XVII, 177-228,
1903.
Bibliografia Consultada
ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. História: a arte de reinventar o passado.
Ensaios de teoria da história. Bauru, SP: EDUSC, 2007.
23
AMARAL, Eduardo Lúcio Guilherme. Barão de Studart: memória da distinção.
Fortaleza: Museu do Ceará; Secretaria da Cultura e Desporto do Ceará, 2002. (Coleção
Outras Histórias).
AMARAL, Eduardo Lúcio Guilherme. Correspondência cordial: Capistrano de Abreu
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