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Universidad del País Vasco/Euskal Herriko Unibertsitatea
(UPV/EHU), Donostia-San Sebastián, 26 y 27 de enero de 2012
2012-ko urtarrilaren 26 eta 27an
Actas/Aktak
Comité científico/Komite zientifikoa
Comité de Organización Antolaketa taldea
Secretaría técnica/Idazkaritza teknikoa
Apoya/Bermatzen du:
Colabora:
ESCREVER PARA CONSTRUIR CONHECIMENTO
A REVISÃO DE LITERATURA POR ALUNOS DE PÓS-
GRADUAÇÃO
José António BRANDÃO CARVALHO
(Instituto de Educação � Universidade do Minho, Braga � Portugal) [email protected]
Resumo Neste texto, analisa-se o modo como alunos de mestrado desenvolvem um processo de revisão de literatura e identificam-se as suas dificuldades. O estudo realizado baseia-se na análise de diferentes produtos escritos e ainda num questionário no qual os alunos referiam as dificuldades sentidas na realização de diferentes tarefas: leitura de vários textos; elaboração de um esquema/plano síntese; redacção de um texto de extensão limitada utilizando normas de referência e citação pré-estabelecidas (estilo APA). Os resultados evidenciam dificuldades decorrentes do facto de, para a maioria dos alunos, ser a primeira vez que se confrontavam com um trabalho desta natureza e sugerem a necessidade de uma maior implicação da escrita nas tarefas de construção de conhecimento, contribuindo para a qualidade da aprendizagem dos alunos. Abstract Writing to learn � how graduate students perform a literature review In this presentation we analyse Portuguese master students� problems and difficulties when performing different writing tasks involved in a literature review (reading the sources, selecting and registering relevant content; drawing the text plan; writing the literature review; referring and quoting using a reference style - APA). The study is based on two kinds of data: a) the analysis of students� written works, organised in a portfolio; b) a questionnaire focussing on the difficulties felt by students when performing different tasks involving writing. The analysis of student´s works revealed problems and difficulties that may be related with the difference between the literacy tasks they were used to perform in their graduation studies and those that they are requested to develop at the post-graduation level. They also show the necessity of engaging students in literacy practices in order to enhance learning.
1. Introdução O estudo que aqui se apresenta tem por objetivos descrever o modo como
alunos de cursos de pós-graduação (mestrado) realizam uma revisão de literatura e
identificar os principais problemas que se lhes colocam na realização dessa tarefa. A
decisão de levar a cabo tal estudo decorreu da constatação de que muitos desses
alunos revelavam dificuldades sempre que lhes era solicitada a produção de textos
escritos, nomeadamente de textos de natureza académica.
Divide-se este texto em duas partes: na primeira, faremos um breve
enquadramento teórico no qual analisaremos os papéis que a escrita desempenha na
escola e descreveremos o contexto português, à luz do qual, na secção final deste
artigo, interpretaremos os resultados do estudo que vamos descrever; a segunda parte
centra-se no estudo realizado, descrevendo-se a metodologia seguida e apresentando-
se os seus resultados.
2. A Escrita na Escola A escrita tem que ser vista como algo mais do que um conteúdo, de carácter
processual, que os alunos aprendem e desenvolvem na escola. Usada com frequência
como meio de comunicação pedagógica, a escrita está implicada num conjunto
grande e diversificado de tarefas que os alunos desenvolvem no contexto académico.
A expressão do conhecimento aprendido constitui uma das principais funções
que a escrita desempenha na escola, algo que é particularmente relevante nas
situações em que o aluno está sujeito a avaliação. Para evidenciar o aprendido, os
alunos devem não só dominar os conteúdos do âmbito de uma determinada área
disciplinar mas também ser capazes de o exprimir por escrito. Em muitos casos, a
falta de sucesso do aluno pode não decorrer do facto de ele não saber uma
determinada matéria escolar mas sim da sua incapacidade para veicular esse
conhecimento em linguagem verbal, na sua forma escrita.
São muito diversos os géneros textuais envolvidos em situações de avaliação
em contexto académico. O relatório, o ensaio, a revisão de literatura, a resposta
escrita às questões de um teste ou de um exame são alguns desses géneros,
provavelmente os mais frequentemente utilizados. A sua produção pressupõe não só
competências de escrita de carácter genérico mas também outras que têm a ver com a
respetiva especificidade.
No entanto, e para além do já referido, a escrita desempenha outros papéis
relevantes na escola, um dos quais, pela importância que lhe é reconhecida, merece
algum destaque � o de ferramenta ou instrumento de aprendizagem. Vista nesta
perspetiva, a escrita pode aparecer implicada ao longo de todo um ciclo de
aprendizagem que integra momentos de natureza diversa: momentos dedicados à
receção/aquisição de conhecimento, em que a escrita pode ser usada para tomar
notas no decurso de exposições orais (aulas, conferências, etc.) ou para registar,
numa ficha de leitura, as ideias principais de um texto que se lê; momentos virados
para a organização, elaboração ou reestruturação do conhecimento, nos quais a
construção de esquemas ou mapas de conceitos ou a elaboração de sínteses e
resumos podem desempenhar relevantes funções; finalmente, os momentos, já acima
referidos, em que o aluno transmite ou expressa o conhecimento aprendido.
O contributo da escrita para a aprendizagem tem sido evidenciado por muitos
autores, inscritos em campos teóricos diferenciados.
Numa perspetiva cognitiva, releva-se o papel da escrita no quadro de processos
complexos, como o reprocessamento de conceitos, a colocação de hipóteses, a
interpretação, a síntese, o confronto de ideias, que o sujeito deve consciencializar
tendo a vista a seleção das estratégias mais apropriadas à consecução dos objetivos
que pretende alcançar. Isso facilita a emergência de estratégias cognitivas mais
complexas, propiciando o desenvolvimento de formas de raciocínio mais elaboradas.
A escrita ajuda o indivíduo a estruturar o pensamento e, ao explicitar as ideias, a
aprofundar a compreensão; facilita ainda a reformulação de ideias nos processos de
revisão dos textos à medida que vão sendo produzidos (Emig, 1977; Martlew, 1983;
Applebee, 1984; Rivard, 1994; Olson, 1995; Klein,1999; Armbruster, McCarthey &
Cummins, 2005).
Igualmente relevantes podem ser considerados os factores que decorrem da
dimensão discursiva, nomeadamente aqueles que resultam da necessidade de
configurar o conhecimento no quadro de géneros textuais com características
específicas, o que obriga o aprendente a articular forma e conteúdo e a considerar a
dimensão retórica (Klein, 1999). Neste enquadramento, os géneros discursivos,
definidos por Camps (2005:21) como �formas de enunciados mais ou menos estáveis
que configuram e são configurados pelas pessoas que partilham o mesmo contexto de
comunicação�, adquirem uma enorme relevância. A formatação do conhecimento
num determinado género textual é assim apontada como uma das dimensões em que
a escrita favorece a aprendizagem e a promoção do conhecimento de natureza
conceptual uma vez que obriga o aluno a dar resposta às expectativas, convenções e
formas de raciocínio próprias de um determinado domínio científico. A expressão do
conhecimento pressupõe o domínio dos padrões utilizados por uma comunidade
científica para dar forma ao conhecimento próprio da sua área. Daqui decorre que
aprender é não só adquirir conceitos mas também conhecer os meios de os
representar e comunicar, isto é, assumir a identidade e o discurso do especialista
(Rivard, 1994; Hand & Prain, 2002; Jewitt, 2006).
Importa ainda referir um aspeto muito relevante quando se trata da produção de
géneros textuais de natureza académica e que tem a ver com o reconhecimento da
autoria do conhecimento expresso num texto, o que exige um tratamento adequado
das fontes textuais em que ele se baseia, com especial atenção para os modos de as
referir ou de as citar. Esse processo implica o uso de convenções próprias, que são
estabelecidas no contexto em que os textos são gerados e usados. É, portanto,
fundamental que um aluno saiba como fazer uma referência ou uma citação, como
utilizar um determinado estilo de referência, em suma, como usar um conjunto de
formas fixas adotadas e reconhecidas pela sua comunidade científica e características
dos textos nela produzidos.
3. O contexto Português O papel da escrita nos processos de construção do conhecimento e na
promoção da aprendizagem está reconhecido no currículo português desde 1991,
sendo referido e valorizado em variados documentos que desde então foram sendo
emanados do Ministério da Educação (Carvalho, 2005).
Considerando que a escrita é uma ferramenta de aprendizagem cujo domínio
constitui um importante fator de sucesso escolar, esses documentos propõem que o
aluno domine as técnicas de composição de diversos tipos de texto e desenvolva
capacidades de escrita de carácter não-compositivo, como o registo e a tomada de
notas, essenciais a um bom desempenho académico:
[o aluno deve] �dominar as técnicas de escrita compositiva para elaboração de
conhecimento, redigir projectos de trabalho, resumir textos informativos e reduzir
um texto a esquema, escrever notas a partir de textos lidos ou de comunicações
orais, para reter informação ou para a reorganizar, e usar a escrita como forma de
organização do pensamento.� (Sim-Sim, Duarte & Ferraz, 1997:81)
Tais ideias são frequentemente reiteradas, estando expressas nos programas das
diferentes disciplinas escolares, relevando-se a importância do que se designa como
o eixo do conhecimento translinguístico, que remete para �a relação da língua com a
aquisição de outros saberes a que ela dá acesso e que por seu intermédio são
representados� (Ministério da Educação, 2009:14). Considera-se ainda que o
desenvolvimento das capacidades de uso da linguagem �conduz directamente à
estruturação de um pensamento próprio por parte do sujeito linguístico e à
configuração de todo o conhecimento que o sistema de ensino potencia, incluindo o
acesso a práticas e a bens culturais que pelo idioma e no idioma se afirmam e
sedimentam.� (ibidem)
Contudo, um levantamento das práticas de literacia em contexto de sala de
aula, feito no âmbito de vários estudos, com recurso a inquéritos a professores ou à
análise de manuais escolares (Carvalho, Pimenta, Ramos & Rocha, 2006, Carvalho,
Silva & Pimenta, 2007; Dionísio, Viseu & Melo, 2011), evidencia a prevalência de
práticas tradicionais, no quadro das quais a escrita é sobretudo usada numa
perspetiva de reprodução de conhecimento, sendo raras as situações potenciadoras da
elaboração e transformação desse mesmo conhecimento.
A nível do ensino superior, os problemas dos alunos no domínio da escrita são
frequentemente referenciados pelos professores. A necessidade de formação para
dotar os alunos de competências de escrita, que lhes permitam responder
adequadamente às exigências deste nível de ensino, é referida por muitos
coordenadores de cursos e programas nos respetivos relatórios de avaliação. Esta
realidade está, de algum modo, retratada em alguns estudos focalizados nas práticas
de literacia dos alunos do ensino superior (Carvalho & Pimenta, 2007; Carvalho,
2008) que evidenciam as dificuldades dos alunos na leitura de textos científicos, no
registo e organização da informação, na estruturação dos textos e no uso das
convenções próprias da escrita académica, nomeadamente nos processos de
referência e citação. De acordo com esses estudos, o recurso à escrita por parte dos
alunos visa sobretudo o registo do que é dito, escrito ou projetado nas aulas e a
expressão dos conhecimentos em contextos de avaliação. A escrita para elaborar
conhecimento, relacionar conteúdos ou clarificar ideias parece ser muito menos
frequente.
Em termos de avaliação, podemos afirmar que os testes de carácter sumativo
ainda constituem o meio mais comum de a realizar em qualquer um dos níveis de
ensino, com exceção do 1º ciclo do ensino básico que funciona em regime do
monodocência. No final do ensino básico e do ensino secundário, há exames
nacionais nas disciplinas nucleares do currículo. Testes, designados por frequências,
e exames semestrais/anuais têm sido também, ao longo dos anos, a forma mais
comum de avaliação no ensino superior, sobretudo ao nível dos cursos de graduação.
Só recentemente, como resultado das reformas decorrentes do Processo de Bolonha,
é que outros processos de avaliação (ensaio, trabalho de projeto, trabalho prático,
apresentação oral) passaram a ser mais frequentes. A nível de pós-graduação,
sobretudo nas áreas de Educação, Humanidades, Ciências Sociais, a revisão de
literatura ou o ensaio sempre constituíram a forma mais comum de avaliação, ao
contrário do que acontecia em domínios como as Ciências Exatas ou a Engenharia
em que a avaliação por teste ou exame era também frequente nos cursos de mestrado.
4. O estudo Como foi dito no início, o estudo realizado visava a consecução de dois
objetivos:
1) descrever o modo como os alunos de um curso de Mestrado em
Educação realizavam uma revisão de literatura;
2) identificar as principais dificuldades que a realização dessa tarefa lhes
colocava.
O estudo foi realizado no contexto de uma das disciplinas desse curso,
Metodologia da Investigação em Educação. Essa disciplina, que integra o 1º
semestre do plano de estudos, visa dotar os alunos dos conhecimentos e das
competências necessárias para a realização de um projeto de investigação que
fundamente a sua dissertação de mestrado. Está organizada em duas vertentes: uma,
de caráter teórico, centrada na caraterização da investigação no campo educacional,
seus paradigmas, opções metodológicas e respetivos fundamentos teóricos e
epistemológicos; outra, de natureza mais prática, focada na construção de
instrumentos de recolha de dados e nas técnicas de análise de dados.
No âmbito dessa disciplina, e como elemento relevante para a sua avaliação
(com um peso de 50%), os alunos realizam uma tarefa de revisão de literatura que
comporta três fases:
1) leitura, com tomada de notas, de um conjunto de capítulos/artigos
científicos sobre os conteúdos da disciplina;
2) elaboração do plano de um texto que sintetize o conteúdo dos textos lidos
na fase anterior;
3) produção e edição desse texto, com o número máximo, de 1500 palavras,
usando um estilo de referência definido (APA).
Terminada a tarefa, os alunos entregam um portefólio que integra os produtos
construídos em cada uma das fases da tarefa.
No final do semestre é ainda distribuído aos alunos um questionário que tem
como objetivo identificar as suas perceções sobre o trabalho realizado.
O estudo baseou-se na análise de conteúdo dos vários produtos construídos e
das respostas às questões do inquérito que se centravam nas dificuldades sentidas na
realização das tarefas. Participaram no estudo 70 alunos, tendo respondido ao
questionário apenas 55. Os alunos participantes eram, na sua maioria, professores do
Ensino Básico/Secundário, nas áreas de Português, História, Ciências e Matemática.
5. Resultados Apresentam-se a seguir os resultados da análise dos diferentes produtos:
5.1 Fichas de Leitura No que se refere às notas de leitura, podemos encontrar três formas de
organização: texto, esquema, combinação de texto e esquema. O formato mais
comum é o texto, sendo o esquema o menos frequente.
Em termos do volume de informação contido no texto, foram também
consideradas três categorias: notas detalhadas, notas sintéticas, sumários. A maior
parte das fichas é bastante detalhada, sendo as outras categorias muito menos
frequentes.
Para além dos aspetos referentes à organização e ao volume de informação
incluída nas fichas, interessou-nos também a questão da elaboração dessa informação
na medida em que isso pode constituir um indicador do modo como o indivíduo se
apropria do conhecimento recolhido das fontes. Neste aspeto, tanto podemos
encontrar um elevado grau de elaboração como o contrário, isto é, a mera reprodução
de partes dos textos lidos. As fichas mais elaboradas evidenciam não só os aspetos
essenciais de cada texto como as relações existentes entre eles, graficamente
representadas de forma variada (organização em colunas, caixas, ligação por linhas
ou setas, etc.). Do lado contrário, a menor elaboração traduz-se normalmente na
transcrição, por vezes na paráfrase, de partes dos textos lidos, sendo o único
princípio organizador visível o que a própria fonte evidencia através de títulos e
subtítulos. Essa transcrição é, por vezes, bastante detalhada, o que poderá indiciar
alguma dificuldade na seleção do que é verdadeiramente importante.
Planos de texto
A maioria dos planos de texto apresentados é uma espécie de índice ou lista de
conteúdos, em que a ordenação dos diversos itens constitui o único indicador da
lógica que presidiu à organização dos diferentes tópicos abordados. Em alguns dos
casos, a introdução de subsecções no interior de um tópico permite inferir alguma
hierarquização dos conteúdos. É reduzido o número de planos que se apresentam
elaborados e evidenciam claramente os princípios que presidem à estruturação da
informação e as relações existentes entre os diferentes aspetos. Por vezes, é também
possível encontrar uma indicação das fontes em que cada um dos assuntos pode ser
encontrado.
Em termos genéricos podemos inferir, a partir da análise dos planos de texto,
alguma dificuldade na realização da tarefa, não se percebendo, em muitos deles, a
lógica subjacente à sua organização; outros problemas são ainda notórios: alguma
redundância e um certo desequilíbrio, traduzidos na omissão de alguns tópicos
relevantes e no detalhe dado a outros menos importantes. Um outro indicador de
dificuldade pode ser extraído do facto de um número significativo de alunos não ter
apresentado o seu plano de texto.
Os problemas detetados ao nível dos planos de texto estão naturalmente
presentes nos textos a que deram origem.
5.2 Textos Os textos produzidos no final do processo evidenciam um conjunto de
características reveladoras das dificuldades sentidas pelos alunos na realização das
várias tarefas que integram a revisão de literatura. Essas dificuldades são visíveis a
vários níveis, nomeadamente no que diz respeito à organização lógica e coerente do
conteúdo dos textos. Estes caracterizam-se por uma certa redundância e repetição,
motivadas pela não associação e pela falta de síntese da informação referente a um
tópico abordado em mais do que um dos textos-fonte. Daqui decorre que o princípio
organizador de alguns dos textos que constam dos portefólios dos alunos seja o da
mera sucessão da informação recolhida em cada um dos textos lidos. Um outro
problema que emerge da análise dos textos tem a ver com a avaliação da relevância
de cada um dos aspetos do conteúdo, havendo tópicos importantes que são tratados
com ligeireza ou até ignorados, enquanto outros, claramente menos relevantes, são
abordados detalhadamente.
Outra dimensão que se revela problemática é a que tem a ver com a utilização
das normas de referência e citação. Instados a usar a norma da APA, por ser aquela
que é usada nas publicações na instituição que frequentam, os alunos têm dificuldade
em fazê-lo em várias situações: na identificação de textos referidos ou citados nas
fontes lidas, frequentemente assumidos como se, de facto, tivessem sido consultados;
no modo de enquadrar e destacar as citações; nas referências a capítulos de livros,
muitas vezes identificados pelo nome do editor ou organizador da coletânea e não
pelo pelo(s) nome(s) do(s) seu(s) autor(es). Tal acontece apesar de o estilo de
referência adotado ter sido objeto de análise e discussão nas aulas, com a
apresentação de variados exemplos, e de os alunos, avisados da relevância deste
aspeto no âmbito dos géneros textuais de natureza académica, poderem recorrer a um
manual previamente disponibilizado.
5.3 Questionário Como atrás se disse, o estudo envolveu ainda um questionário que visava
recolher as perceções dos alunos sobre o trabalho realizado. O questionário incluía
questões de resposta aberta que tinham como objetivo a identificação das
dificuldades sentidas. Analisadas as respostas a essas questões, pode concluir-se que
os alunos revelam alguma consciência dos seus problemas já que aquilo que dizem
vai de encontro ao que é evidenciado pela análise dos diferentes produtos (fichas de
leitura, planos de texto, textos) que atrás foi apresentada.
Das respostas dos alunos às questões colocadas, podemos identificar um
conjunto de problemas relacionados com:
- a organização das notas de leitura;
- a seleção de informação;
- o resumo e a síntese do conteúdo dos textos;
- a relação e a integração de diferentes tópicos;
- a citação, a paráfrase e a referência aos autores lidos;
- a reunião de toda a informação num texto com um número limitado de
palavras;
- a elaboração da lista de referências bibliográficas.
Dentre os problemas elencados, os mais frequentemente referidos são os
seguintes: a relação e a integração de diferentes tópicos (36 referências), a seleção de
informação (27); a citação e a referência (15); a organização das notas de leitura (10).
Para além destes problemas, os alunos referem ainda outros, decorrentes de
fatores extrínsecos, concretamente a leitura de textos noutras línguas (havia um texto
em inglês e outro em castelhano) ou a falta de tempo para realizar um trabalho tão
complexo, tendo em conta que a maioria deles tinha o estatuto de estudante-
trabalhador.
6. Conclusão O estudo demonstra as dificuldades sentidas pelos alunos na realização das
tarefas de leitura e escrita que tiveram de levar a cabo. Elas são evidentes nos
produtos resultantes das diferentes tarefas realizadas, sendo também reconhecidas
pelos próprios sujeitos nas respostas às questões que sobre isso foram colocadas.
Essas dificuldades têm a ver com a leitura e seleção da informação relevante, com a
organização e síntese dessa informação e com o uso das normas e convenções que
caraterizam os géneros textuais de natureza académica, nomeadamente as associadas
aos processos de referência e citação das fontes consultadas.
Constatou-se também, a partir das respostas ao questionário, que havia alunos
que não estavam familiarizados com o género textual que tiveram que produzir,
tendo alguns deles reconhecido que era a primeira vez que se confrontavam com tais
práticas de literacia e que, por essa razão, tinham sentido alguma dificuldade em
perceber o que deles se esperava.
Podemos considerar que, para além das que decorrem da natureza do conteúdo
da disciplina em que o estudo foi realizado (para a maioria, a metodologia de
investigação em educação constituía um saber completamente novo e muito diferente
dos saberes com que normalmente trabalhavam), há um conjunto de dificuldades que
tem a ver com o percurso escolar dos alunos e com as práticas de literacia que no seu
decurso foram desenvolvidas e com as quais se familiarizaram.
Como atrás se disse, na escola portuguesa, tais práticas estiveram, ao longo dos
tempos, muito mais implicadas em tarefas de reprodução de conhecimento do que em
atividades visando a sua construção e elaboração, sendo raras as situações em que a
escrita foi vista como uma ferramenta de aprendizagem. Estamos perante uma
questão que, apesar de estar identificada e reconhecida como relevante nos
documentos de natureza curricular, não está ainda resolvida.
A sua resolução poderá passar pela implementação de práticas que, nos
diferentes ciclos de ensino, nas diferentes disciplinas e pelo recurso à leitura e à
escrita, envolvam os alunos na construção das suas próprias aprendizagens. Esta
opção será porventura mais eficaz do que a implementação de programas
especificamente virados para o desenvolvimento de competências de leitura e escrita,
nos quais as atividades tendem a aparecer algo distantes de contextos reais de uso da
linguagem de que a própria escola constitui exemplo.
O envolvimento dos alunos em práticas de literacia que adquirem sentido à luz
dos objetivos que permitem alcançar tornará os alunos mais capazes de dar resposta
às tarefas com que se deparam na sua vida académica, preparando-os, ao mesmo
tempo, para enfrentar os desafios com que se depararão ao longo da sua vida na
escola e para além dela.
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