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1 PARECER JURÍDICO EMENTA : NEPOTISMO. APLICAÇÃO NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE N. 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CASOS DE INCIDÊNCIA. TRATA-SE DE PARECER JURÍDICO EM RELAÇÃO À SÚMULA VINCULANTE N. 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, QUE TRATA DA VEDAÇÃO DA CONTRATAÇÃO DE PARENTES PARA OCUPAR CARGOS EM COMISSÃO OU DE CONFIANÇA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA, ABORDANDO OS RECENTES QUESTIONAMENTOS E PEDIDOS DE PROVIDÊNCIAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AOS MUNICÍPIOS. É O BREVE RELATÓRIO. PASSAMOS A OPINAR. a) Introdução 1. O debate quanto ao tema do Nepotismo não é recente. A palavra Nepotismo (do latim nepos, neto ou descendente ) é o termo utilizado para designar o favorecimento de parentes , não concursados, daqueles ocupantes de cargos de direção, chefia ou assessoramento, em detrimento de pessoas mais qualificadas, especialmente

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PARECER JURÍDICO

EMENTA: NEPOTISMO. APLICAÇÃO NORMATIVA

DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS.

INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE N. 13

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CASOS DE

INCIDÊNCIA.

TRATA-SE DE PARECER JURÍDICO EM RELAÇÃO À SÚMULA

VINCULANTE N. 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, QUE TRATA DA VEDAÇÃO DA

CONTRATAÇÃO DE PARENTES PARA OCUPAR CARGOS EM COMISSÃO OU DE CONFIANÇA NA

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA, ABORDANDO OS RECENTES

QUESTIONAMENTOS E PEDIDOS DE PROVIDÊNCIAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AOS

MUNICÍPIOS.

É O BREVE RELATÓRIO.

PASSAMOS A OPINAR.

a) Introdução

1. O debate quanto ao tema do Nepotismo não é recente. A palavra

Nepotismo (do latim nepos, neto ou descendente) é o termo utilizado para designar o

favorecimento de parentes, não concursados, daqueles ocupantes de cargos de direção,

chefia ou assessoramento, em detrimento de pessoas mais qualificadas, especialmente

2

no que diz respeito à nomeação ou elevação de cargos na administração pública direta

ou indireta no Executivo, Legislativo e no Judiciário.

2. A partir da decisão no Recurso Extraordinário 579951-4, relator

o Ministro Ricardo Lewandowisk, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula

Vinculante n. 13, vedando os atos de nepotismo:

SÚMULA VINCULANTE Nº 13

“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha

reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive,

da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa

jurídica investido em cargo de direção, chefia ou

assessoramento, para o exercício em cargo em comissão ou de

confiança, ou ainda, de função gratificada na administração

pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União,

dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a

constituição federal.”

3. Em seu voto, o Ministro Ricardo Lewandowisk, relator do

Recurso Extraordinário que deu origem à Súmula Vinculante n. 13, destacou que

“embora existam diversos normativos no plano federal que vedam o nepotismo,

inclusive no âmbito desta Corte, tal não significa que apenas leis em sentido formal

ou outros diplomas regulamentares sejam aptos a coibir a nefasta e anti-republicana

prática do nepotismo. É que os princípios constitucionais, longe de configurarem

meras recomendações de caráter moral ou ético, consubstanciam regras jurídicas de

caráter prescritivo, hierarquicamente superiores às demais e positivamente

vinculante, como ensina Gomes Canotilho1”.

1 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional, Coimbra: Almedina, 1992, p. 352.

3

4. Em atenção ao enunciado da Súmula Vinculante n. 13, podemos

extrair de plano algumas conclusões objetivas, embora outras tantas ficarão a mercê de

apreciação jurisdicional.

b) O grau de parentesco para a Súmula

5. A Súmula limitou o grau de parentesco até o terceiro grau,

excluindo, portanto, a incidência sobre os primos, uma vez que estes são considerados

de 4º grau. Nessa primeira análise, é bom frisar que os parentes abrangidos pela decisão

vinculante, são: maridos, esposas, companheiros, pais, avós, bisavós, filhos, netos,

bisnetos, irmãos, sobrinhos, tios, sogros, sogras, cunhados, genros e noras.

6. Noutro vértice, a referência para aplicação da decisão não se

limita exclusivamente ao titular do Poder Executivo, Legislativo ou do Judiciário, como

por exemplo, o Prefeito ou Presidente da Câmara. A Súmula considerou a vedação para

a contratação de parentes, sendo estes considerados em referência à “autoridade

nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção,

chefia ou assessoramento”. Isso nos leva a entender que a vedação é em relação aos

parentes até o terceiro grau, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa

jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, ou seja, os

parentes dos secretários municipais, com autonomia de nomeação, estão abrangidos pela

proibição.

c) Mesma Pessoa Jurídica e Nomeações Recíprocas

7. A expressão “mesma pessoa jurídica” refere-se à existência ou

não de independência e autonomia financeira e administrativa entre as três esferas da

Federação. Assim, há que se entender como pessoa jurídica uma entidade específica

pertencente a um ente da federação. O artigo 2º da Constituição Federal dispõe que

“são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o legislativo, o executivo

e o judiciário”.

4

8. Portanto, a Prefeitura Municipal (Poder Executivo) e a

Câmara de Vereadores (Poder Legislativo), são pessoas jurídicas distintas. Desta

forma, a nomeação de pessoas que se enquadram na condição de cônjuge, companheiro

ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de vereadores,

na Prefeitura Municipal (Poder Executivo), não caracterizaria, à luz do texto sumular,

um caso de nepotismo, a não ser quando evidenciado, a nomeação recíproca na Câmara

de Vereadores (Poder Legislativo).

9. Assim, o texto da súmula leva ao entendimento de que as

nomeações não podem ocorrer simultaneamente entre as pessoas jurídicas, sob

pena de configurar nepotismo cruzado ( caráter recíproco ), que segundo ARNALDO

SILVA JÚNIOR2 em sua obra “Dos Servidores Públicos Municipais”, consiste na “troca

de nomeações recíprocas, entre integrantes de Poderes distintos”.

10. Como fato exemplificativo, estaria configurado nepotismo

cruzado no caso de nomeação de pessoa com grau de parentesco com Prefeito

Municipal para ocupar cargo no Poder Legislativo, com a ocorrência de reciprocidade,

ou seja, nomeação de parente de Vereador a cargo no Poder Executivo.

11. Acerca do nepotismo cruzado, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE

MINAS GERAIS assevera que:

EMENTA: Mandado de Segurança. Indicação por

desembargador do Tribunal de Justiça de parente (sobrinha) de

juiz de direito da primeira instância, para ocupar cargo de

confiança no segundo grau. Não configurada a hipótese

normativa definida como nepotismo. Nepotismo: designação por

autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica

investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, com

favorecimento de familiares (cônjuge, companheiro ou parentes

2 SILVA JÚNIOR, Arnaldo. Dos Servidores Públicos Municipais. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

5

em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau)

para cargos e/ou funções públicas em detrimento de pessoas

mais qualificadas, sem vínculo parental. Servidora indicada

que reúne as condições técnicas para ocupar a função, não

possui parentesco com a autoridade nomeante, não possui

parentesco com servidor da mesma pessoa jurídica investido

em cargo de direção, chefia ou assessoramento, e não se trata

de nepotismo cruzado. Não configurada a hipótese da Súmula

Vinculante n. 13 do STF. Observância aos princípios da

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência no serviço público. CR/88, art. 37, 'caput'. Direito

líquido e certo, do impetrante, ferido com a suposta

incompatibilidade, vez que não configurada a hipótese

classificada como nepotismo. Necessidade de razoabilidade do

julgador ao aplicar a norma ao caso concreto, vez que deve

estar atento e sensível à dinâmica dos fatos sociais, sob pena

de cega afronta aos direitos fundamentais individuais e

sociais, pilares da Constituição da República de 1988 e do

Estado Democrático de Direito. Concessão da ordem em

atenção aos princípios da igualdade e do direito ao trabalho,

além da aplicação do princípio da vedação ao retrocesso social.

CR/88, arts. 1º incisos III e IV, 5º caput, 6º, 7º inciso I, 170, 193.

Conceder a segurança, com a confirmação da liminar.

(Processo nº 1.0000.08.473603-2/000(1); Relator Roney

Oliveira; Publicado em 17/07/2009 – g. nosso)

12. Tem-se, portanto, que inexistente qualquer indício de “troca de

favores” entre o Legislativo e Executivo, não há que se falar em nepotismo cruzado, na

medida em que não há reciprocidade de nomeações.

6

d) Servidores Efetivos

13. O que se extrai de todo o debate em relação ao nepotismo, é que

os servidores efetivos, não podem – aí sim a plausibilidade do argumento da capacidade

técnica e da impossibilidade de restrição por parentesco – ser privados de nomeação

para cargos de confiança, de chefia, direção ou assessoramento em virtude do

parentesco. Neste caso, já encontra afastado o atentado ao princípio da moralidade, e,

até mesmo, verificado o cumprimento do requisito da capacidade técnica e da

impessoalidade, uma vez que o parente, nesta situação, já integrou a Administração

Pública de forma independente e isonômica, ou seja, foi aprovado em concurso público.

14. A Súmula nos leva a entender também, que a vedação é em

relação aos parentes até o terceiro grau tanto da autoridade nomeante ou de servidor da

mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia e assessoramento, ou seja,

os parentes dos servidores efetivos não estão abrangidos pela proibição, haja vista

que estes não possuem autonomia de nomeação para o favorecimento de parente

seu.

15. Nessa hipótese não poderá haver subordinação hierárquica, isto

porque, considera-se como situação geradora da incompatibilidade aquela em que haja

relação de subordinação em grau de chefia. Assim não havendo qualquer relação direta

ou indireta de subordinação hierárquica entre o servidor efetivo e o ocupante de cargo

comissionado, descaracterizado está o nepotismo.

16. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça já se manifestou

em caso semelhante ao aqui analisado:

"CONSULTA - NEPOTISMO - RESOLUÇÃO CNJ 07/2005 -

SERVIDORA CONCURSADA - CÔNJUGE OCUPANTE DE

CARGO COMISSIONADO - INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO

DE SUBORDINAÇÃO" (PP n° 321, Rel. Cons. MARCUS

FAVER, DJ: 15/08/2006).

7

"CONSULTA - NEPOTISMO - RESOLUÇÃO CNJ 07/2005 -

CÔNJUGES OCUPANTES DE CARGOS COMISSIONADOS

- INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO

ENTRE AMBOS - INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE

PARENTESCO COM MAGISTRADO OU COM

OCUPANTES DE CARGO DE DIREÇÃO E

ASSESSORAMENTO" (PP nº 385, Rel. Cons. ANTÔNIO

UMBERTO DE SOUZA JÚNIOR, DJ: 24/07/2006).

17. Há precedente do CNJ no sentido de que o exercício de cargo

efetivo com subordinação hierárquica a parente é incompatível com os princípios

constitucionais da impessoalidade e da eficiência (PP nº 272, rel. Cons. Germana de

Moraes). Vejamos:

“À vista destas ponderações, entendo que, muito embora o

provimento em cargo efetivo mediante concurso público

observe os princípios constitucionais da Administração

Pública, o exercício do cargo efetivo com subordinação

hierárquica a parente, como no caso concreto, de filhas

subordinadas ao pai Desembargador, não se compadece com o

significado e o alcance dos princípios constitucionais da

impessoalidade e da eficiência”

e) Autoridade Nomeante

18. Como já abordado, o nepotismo se caracteriza pela relação de

parentesco entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado. Logo, a relação de

parentesco entre pessoas em um mesmo órgão público, por si só não caracteriza

nepotismo, na medida em que deve ser observada a existência de parentesco direto

com a autoridade nomeante, que por sua vez deverá obter uma relação de

hierarquia e subordinação com o servidor nomeado.

8

19. A doutrina especializada de ARNALDO SILVA JÚNIOR3, ao

comentar acerca da Súmula Vinculante nº 13, esclarece que: “Na mesma linha de

raciocínio, não há a caracterização do nepotismo quando ocorre o grau de parentesco

entre dois servidores efetivos que ocupavam cargos comissionados na mesma pessoa

jurídica, ainda mais, quando um deles não é autoridade nomeante. Tal fato não pode

ser sequer mencionado como ato de nepotismo, uma vez que, o que a norma

constitucional preconiza é justamente essa situação, onde se prioriza a nomeação de

servidores efetivos para os cargos de confiança ou comissionados da Administração

Pública”.

20. Consoante este entendimento, não há que se falar em nepotismo

no ato de nomeação de parente de servidor ocupante de cargo em comissão que não

goza de qualquer poder de decisão no ente ao qual pertence, não determinando escolhas

administrativas e, consequentemente, não possuindo autonomia para o favorecimento de

seu parente.

21. Outro caso que descaracteriza a prática de nepotismo é a

nomeação de parente de servidor comissionado que não seja a autoridade nomeante do

ato. Sobre o assunto, eis o precedente do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS,

verbis:

“EMENTA: ANULATÓRIA - SERVIDORES DETENTORES DE

FUNÇÃO PÚBLICA - PARENTES DE MAGISTRADO -

EXONERAÇÃO - RESOLUÇÃO Nº. 07/CNJ - PORTARIA Nº.

1.858/05 - LEGALIDADE - PROCESSO ADMINISTRATIVO -

DESNECESSIDADE - SERVIDORES OCUPANTES DE CARGO

EM COMISSÃO - MARIDO E MULHER/PAI E FILHA -

INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE PARENTESCO COM

MAGISTRADO E DE HIERARQUIA ENTRE ELES -

3 Silva Júnior, Arnaldo. Dos Servidores Públicos Municipais. Editora Del Rey, 2009. p. 270/271.

9

EXONERAÇÃO - NULIDADE - PRESIDÊNCIA DO TJMG -

PERSONALIDADE JUDICIÁRIA - DECADÊNCIA -

CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA. O servidor

designado a título precário para exercer função pública, não

possui vínculo empregatício com a Administração e, por força de

sua própria natureza, tem o provimento submetido à

discricionariedade do Poder Público, sendo exonerável à

dispensa de prévia instauração de processo administrativo.

Inexistindo subordinação hierárquica entre cônjuges ou entre

pai e filha, servidores ocupantes de cargo de provimento em

comissão, e nem qualquer vínculo de parentesco dos mesmos

com membros do Tribunal de Justiça do Estado de Minas

Gerais, não há falar em hipótese considerada como prática de

nepotismo, de acordo com a interpretação contida na alínea "I"

do Enunciado Administrativo nº 01 c/c o inciso III do art. 2° da

Resolução nº 07/2005, ambos do CNJ”. (Autos nº.

1.0024.06.930803-9/002(1). Rel. Edílson Fernandes. Publicação:

06/02/2009 – g. nosso).

22. De acordo com a correta exegese, não há nepotismo entre

servidores comissionados e efetivos designados para cargo comissionado, quando não

há qualquer relação de parentesco com a autoridade nomeante, e ainda, quando não

existente relação de hierarquia e subordinação entre tais servidores.

f) Nomeação de agentes Políticos

23. É importante ressalvar, consoante o entendimento explicitado pela

nossa Corte Suprema nos julgamentos que deram origem à Súmula Vinculante 13, que a

vedação ao nepotismo não alcança a nomeação para cargos políticos.

24. Para tanto, é necessário uma breve explanação sobre a

diferenciação entre servidores públicos strictu sensu e agentes políticos. Senão vejamos.

10

25. Conforme ensina a abalizada doutrina de Celso Antônio Bandeira

de Mello, a expressão agentes públicos “é a mais ampla que se pode conceber para

designar genérica e indistintamente os sujeitos que servem ao Poder Público como

instrumentos expressivos de sua vontade ou ação (...)”4 Dentro desta conceituação estão

os servidores públicos strictu sensu e os agentes políticos.

26. Os servidores strictu sensu são aqueles que entretêm uma relação

profissional com o Poder Público, mediante uma vinculação contratual (celetista) ou

legal (estatutária). Sua atuação é pautada pela vinculação estrita as normas e

procedimentos previamente estabelecidos, sem que haja margem para tomada de

decisões mais complexas.

27. Por sua vez os agentes políticos “são os titulares dos cargos

estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o

arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder”5.

28. Os agentes políticos compõem cargos estruturais na organização

política da União, Estado, Município e Distrito Federal, por isso, integram o arcabouço

fundamental do Poder e, são formadores da vontade superior do Governo. Assim, são

agentes políticos o Presidente da República, os Governadores, os Prefeitos e os

respectivos vices, Ministros e Secretários de Estado e Municipais, bem como os

Senadores, Deputados e Vereadores. Há vinculação de natureza política, não

profissional, entre estas pessoas e os cargos que ocupam, sendo que aos agentes

políticos incumbem as funções de dirigir, orientar e estabelecer diretrizes para o Poder

Público.

29. Com razão, Arnaldo Silva Júnior ressalta que “o foco da

definição e conceituação está em distinguir essa categoria [agentes políticos] como

4 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Adminsitrativo. Malheiros: São Paulo, 22ª Ed. p. 235 5 Idem, p. 238

11

sendo àqueles que respondem efetivamente pela decisão política da administração

pública, em suas esferas e Poderes, determinado os modelos de administração e

planejamento, e, sobretudo, com autonomia de atividade estratégica com autoridade de

comando de ações executivas.”6

30. Apesar de não constar expressamente na Súmula Vinculante nº

13, o relator Ministro Ricardo Lewandowisk fez constar em seu voto, em atenção ao

Princípio da Separação dos Poderes, que “considerando hígida a nomeação do agente

político”, ou seja, correta, perfeita, fazendo excluir do ponto de incidência da regra do

nepotismo as nomeações para os cargos dos agentes políticos ou de governos.

31. Assim, conforme exposto pelo Ministro Carlos Ayres7, em

entrevista “não há nepotismo entre o Presidente da República e seus Ministros, os

governadores de Estados e seus secretários e os prefeitos e seus secretários

municipais. A filosofia da decisão é a de que o governo tem direito de comprar

livremente os cargos de governo” (g. nosso).

32. É ponto incontroverso que a Súmula não vedou a contratação de

parentes de autoridade nomeante para os cargos políticos. Sendo assim, é plenamente

legal a contratação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por

afinidade, até o terceiro grau da autoridade nomeante para os cargos políticos, quais

sejam: Secretarias Municipais e Estaduais e Ministros de Estado.

33. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já enfrentou matéria similar no

Recurso Extraordinário 579.951/RN:

"Agravo Regimental em Medida Cautelar em Reclamação.

Nomeação de irmão de Governador de Estado. Cargo de

Secretário de Estado. Nepotismo. Súmula Vinculante nº 13.

Inaplicabilidade ao Caso. Cargo de Natureza Política. Agente

6 JÚNIOR, Arnaldo Silva. Dos servidores públicos municipais. Del Rey: Belo Horizonte, 2008, p. 6 7 Portal de Notícias da Globo – 21/08/2008 às 19:00 – http:/gl.globo.com/noticias/política

12

Político. Entendimento Firmado no Julgamento do Recurso

Extraordinário 579.951/RN. Ocorrência de Fumaça do Bom

Direito (Grifos Nossos)"

34. E mais!

AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR EM

RECLAMAÇÃO. NOMEAÇÃO DE IRMÃO DE GOVERNADOR

DE ESTADO. CARGO DE SECRETÁRIO DE ESTADO.

NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE Nº 13.

INAPLICABILIDADE AO CASO. CARGO DE NATUREZA

POLÍTICA. AGENTE POLÍTICO. ENTENDIMENTO

FIRMADO NO JULGAMENTO DO RECURSO

EXTRAORDINÁRIO 579.951/RN. OCORRÊNCIA DA

FUMAÇA DO BOM DIREITO. 1. Impossibilidade de

submissão do reclamante, Secretário Estadual de Transporte,

agente político, às hipóteses expressamente elencadas na

Súmula Vinculante nº 13, por se tratar de cargo de natureza

política. 2. Existência de precedente do Plenário do Tribunal:

RE 579.951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE

12.9.2008. 3. Ocorrência da fumaça do bom direito. 4. Ausência

de sentido em relação às alegações externadas pelo agravante

quanto à conduta do prolator da decisão ora agravada. 5.

Existência de equívoco lamentável, ante a impossibilidade

lógica de uma decisão devidamente assinada por Ministro desta

Casa ter sido enviada, por fac-símile, ao advogado do

reclamante, em data anterior à sua própria assinatura. 6.

Agravo regimental improvido.( Rcl 6650 MC-AgR / PR –

Paraná; Relatora Ellen Gracie; Publicado em 16/10/2008 – g.

nosso)

13

35. A Ministra Ellen Gracie, em seu voto proferido no julgamento do

recurso supracitado, brilhantemente fundamentou que “a nomeação de parentes para

cargos políticos não implica ofensa aos princípios que regem a Administração

Pública, em face de sua natureza eminentemente política” e segue afirmando que nos

termos da Súmula Vinculante 13, STF, as nomeações para cargos políticos não estão

compreendidas nas hipóteses nela elencadas, sendo impossível “submeter o caso do

reclamante – nomeação para o cargo de Secretário Estadual de Transporte, agente

político – à vedação imposta pela referida Súmula Vinculante, por se tratar de cargo

de natureza eminentemente política. [...].” (Rcl 6.650-MC-AgR, Rel. Min. Ellen

Gracie, julgamento em 16-10-08, Informativo 524).

36. Não destoa deste entendimento o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE

MINAS GERAIS:

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE

INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - FALTA DE

PROCURAÇÕES DOS AGRAVADOS - FINALIDADE

ATENDIDA - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO -

IRREGULARIDADE SANADA - ARTIGO 526 DO CÓDIGO DE

PROCESSO CIVIL - CUMPRIMENTO - NEPOTISMO -

SÚMULA VINCULANTE NÚMERO 13 - APLICABILIDADE

AOS CARGOS ADMINISTRATIVOS - VEDAÇÃO QUE NÃO SE

ESTENDE AO CARGO DE SECRETÁRIO MUNICIPAL -

PRELIMINARES REJEITADAS E RECURSO PARCIALMENTE

PROVIDO. A exigência de juntada das cópias das procurações

outorgadas pelas partes a seus advogados (CPC, art. 525, I)

tem por finalidade viabilizar a comunicação dos atos

processuais praticados no curso do agravo, de forma que, se

não foi totalmente observada, mas os procuradores dos

agravados tomaram ciência do recurso e compareceram

voluntariamente nos autos, se defendendo, tem-se como sanada

a irregularidade, ante a ausência de prejuízo. O prazo de 3

14

dias, previsto no artigo 526 do Código de Processo Civil, é para

que o agravante requeira a juntada aos autos da cópia da

petição do agravo de instrumento e dos documentos que o

acompanharam, viabilizando o exercício do juízo de retratação,

sendo irrelevante o fato da juntada ter se concretizado somente

após o transcurso do prazo, desde que tal se dê antes do

julgamento do recurso. À luz da decisão proferida no

julgamento do Recurso Extraordinário de nº. 579951, e do

conteúdo da súmula vinculante nº. 13, editada recentemente

pelo Supremo Tribunal Federal, é vedada a prática do

nepotismo em relação aos cargos administrativos, SENDO,

PORÉM, ADMITIDA A NOMEAÇÃO DE PARENTES PARA

OS CARGOS POLÍTICOS. (Processo nº 1.0498.08.010759-

8/001; Relator Moreira Diniz; Publicado em 07/10/2008 – g.

nosso).

37. E ainda:

EMENTA: EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO

EXISTENTE. ACOLHIMENTO - OBRIGAÇÃO DE FAZER -

IRREGULARIDADE DA CITAÇÃO - NULIDADE - ART. 225,

VI, DO CPC - NEPOTISMO - CARGO POLÍTICO - SÚMULA

VINCULANTE Nº 13 - INAPLICABILIDADE.- A inobservância

da formalidade prevista mo art. 225, VI, do CPC, acarreta a

nulidade da citação. - Inteligência do artigo 247 do Código

Processual Civil, as citações e as intimações serão nulas,

quando feitas sem observância das prescrições legais- As

nomeações para cargos políticos não se subsumem às

hipóteses elencadas na Súmula n.13, e, portanto, não há que se

falar em descumprimento da obrigação de fazer estipulada na

Cláusula Quinta do TAC, já que as nomeações do cunhado e

do irmão do atual Prefeito para os cargos políticos nos quais

15

foram empossados não violam a Constituição Federal.

(Processo nº 1.0347.09.011350-2/002(1); Relator Wander

Marotta; Publicado em 12/02/2010 – g. nosso)

38. Quanto à inaplicabilidade da Súmula aos cargos políticos,

encontra-se pacificada a jurisprudência dos tribunais brasileiros, senão vejamos:

“Tratando-se de nomeação do filho do Vice-Prefeito do

Município para o cargo de Secretário Municipal... cargo

político – resta evidenciada, ante o recente e reiterado

entendimento jurisprudencial da Corte Suprema, a

inaplicabilidade da Súmula Vinculante n. 13 da mesma Corte

ao caso...” (TJ-PR – 4ª Câmara Cível. AI N. 0592649-2. DJ:

18.06.09)

39. Por fim:

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Município de Ilhabela.

Nepotismo. Esposa e irmã de Prefeito nomeadas Secretarias

Municipais. Cargos políticos. Inaplicabilidade da Súmula

Vinculante n° 13, conforme interpretação que lhe vem sendo

dada pelo próprio Supremo Tribunal Federal. Decisão

agravada que recebeu a petição inicial de ação de

improbidade, em relação às duas nomeações e de outros

servidores parentes do co-réu Prefeito. Pedido que, no tocante

às duas nomeações, deve ser rejeitado desde logo. Decisão

agravada que deve ser parcialmente reformada para tal

finalidade, improcedente a alegação de nulidade feita pelo

agravante. Agravo provido em parte. (TJ-SP - Seção De Direito

Público Voto N° 192/09 10a Câmara De Direito Público Agravo

De Instrumento N° 868.308-5/4 Comarca: Ilhabela. DJ:

2.03.09)

16

g) Nomeação anterior a posse do agente político

40. A prática de nepotismo pressupõe o favorecimento de cônjuge,

companheiro, ou parentes na nomeação para cargos de provimento em comissão.

41. Imperioso ressaltar que nos casos de nomeação de parente de

agente político anterior à sua posse, não há configuração da prática de nepotismo,

isto porque quando o servidor foi nomeado não existia o vínculo de parentesco ou

afinidade com o Vereador, Prefeito ou Secretários Municipais, haja vista que não

integravam os quadros de funcionários da Prefeitura Municipal.

42. De acordo com a redação da Súmula Vinculante nº 13, a

existência de qualquer dos vínculos apontados, constitui impedimento que deve ser

observado no momento da nomeação. Nesse sentido, “não há nepotismo quando a

designação ou nomeação do servidor tido como parente para a ocupação do cargo

comissionado ou de função gratificada for anterior ao ato de posse do agente ou

servidor público gerador da incompatibilidade” (STJ - (RMS 26.085/RO; Relator

Ministro Arnaldo Esteves Lima; Publicado em 28/09/2009).

43. O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, recentemente, já

assentou entendimento sobre a questão:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITO

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO

CAUTELAR - EXONERAÇÃO DE SERVIDOR OCUPANTE DE

CARGO COMISSIONADO NA CÂMARA MUNICIPAL -

NEPOTISMO - NOMEAÇÃO ANTERIOR AO SURGIMENTO

DO VÍNCULO DE PARENTESCO POR AFINIDADE -

FUMAÇA DO BOM DIREITO - PRESENÇA - RISCO DE

DANO - REINTEGRAÇÃO IMEDIATA - CABIMENTO -

17

CARGO DE LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO -

DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO -

OBRIGAÇÃO GENÉRICA DE NÃO NOMEAR OUTRA

PESSOA PARA O CARGO DURANTE O CURSO DA AÇÃO

PRINCIPAL - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO

PARCIALMENTE PROVIDO. - As práticas de nepotismo

pressupõem o favorecimento de cônjuge, companheiro, ou

parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro

grau, na nomeação para cargos de provimento em comissão;

assim, se há prova de que as nomeações do agravante para o

cargo de Secretário da Presidência da Câmara Municipal de

Muriaé e, posteriormente, para o de Diretor Legislativo da

mesma Casa, ocorreram antes de seu casamento com a filha

de um vereador, e se não existe indício de que houve ajuste

prévio para burlar a proibição geral de prática de nepotismo,

justifica-se a suspensão liminar da portaria 359/2009, que

exonerou o servidor. - Em se tratando de cargo comissionado,

marcado pela livre nomeação e exoneração, não há como impor

ao Poder Público a obrigação genérica de não exonerar o

agravante e de não nomear outra pessoa para o cargo, durante

o período de tramitação da ação cautelar e da ação principal.

(Processo nº 1.0439.09.104017-0/001(1); Relator Moreira Diniz;

Publicado em 05/11/2009 – g. nosso)

44. Desta maneira, sendo a nomeação anterior à eleição ou à

composição nos quadros da Administração do servidor determinante da

incompatibilidade, não há configuração de nepotismo, na medida em que a

situação é pré-existente (princípio da anterioridade), não existindo favorecimento

algum.

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h) Vínculos Conjugais

45. Outra questão que merece ser tratada no presente parecer, é em

relação à configuração do nepotismo quanto aos vínculos afetivos e conjugais, no que

diz respeito ao namoro, noivado, União Estável e casamento.

46. Primeiramente, tratando-se do namoro e noivado como fato

caracterizador do nepotismo, o Advogado Geral da União, Antônio Dias Toffoli, em

entrevista concedida quanto ao eventual ato ilegal do Presidente do Senado, José

Sarney, ao negociar a contratação do namorado de sua neta, afirmou que "do ponto de

vista legal, estritamente jurídico, não existe ilegalidade, pode se falar em uma

eventual imoralidade. Aliás, nesse caso nem se pode aplicar o nepotismo, pois não há

uma relação de vinculo, de casamento, mas de namoro"8.

47. Sobre o assunto, o Relator do Tribunal de Justiça de Minas

Gerais, Desembargador Moreira Diniz, categoricamente afirmou em julgamento que “o

simples namoro do agravante com a filha do vereador não seria suficiente para

marcar sua nomeação como um ato de nepotismo” (Processo nº 1.0439.09.104017-

0/001(1); Publicado em 05/11/2009). Aplicando-se este entendimento, por analogia,

aos casos que envolvam noivado.

48. O namoro pode ser confundido com a União Estável, sendo o

requisito "objetivo de constituição de família" o elemento diferenciador entre os dois,

que deve ser aferido em cada caso, de acordo com suas circunstâncias específicas.

49. Diante da omissão da Súmula Vinculante nº 13, não se vislumbra

qualquer impedimento para contratação de namorado(a)/noivo(a) de servidor(a) público

para desenvolver cargo em comissão que compõe a estrutura política da Administração

Pública, não havendo que se falar em Nepotismo.

8 Advogado-geral da União diz que Sarney não praticou nepotismo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u601102.shtml> Publicado em: 27 de julho de 2009.

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50. O mesmo não acontece com a União Estável e o casamento. A

Constituição Federal, ao conservar a família, fundada no casamento, reconhece como

entidade familiar a união estável, a convivência pública, contínua e duradoura de um

homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto, sem vínculo matrimonial,

estabelecida com o objetivo de constituir família, desde que tenha condições de ser

convertida em casamento por não haver impedimento legal para sua convolação9. É o

que determina o art. 173, §§ 1º e 2º do Código Civil.

51. Ademais, o artigo 226, §3º da Constituição Federal10, reconhece a

União Estável como unidade familiar. Nesse sentido, a União Estável é uma união

duradoura de pessoas livres de sexos diferentes, que não estão ligadas entre si por

casamento civil, porém, o novo Código Civil, legislação específica (Lei 9.278/96) e as

recentes jurisprudências, estabelecem que a União Estável produz os mesmos efeitos e

direitos matrimoniais às partes como se casados fossem.

52. Destaca-se que o texto da Súmula Vinculante nº 13,

explicitamente reconhece a proibição da nomeação de cônjuge de autoridade nomeante

ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou

assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou emprego em livre

investidura, funções de confiança ou gratificadas. Assim, fica proibida a nomeação de

cônjuge ou companheiro (agentes administrativos) de: Prefeito e Vice, Presidente

da Câmara Municipal, Vereadores, Secretários Municipais; Chefe de Gabinete,

Divisão ou Seção, dentre outros, para o exercício de cargo em comissão.

53. No entanto, como anteriormente dito, a relação nepotista deve ser

observada no momento da nomeação, seja por ausência de relação conjugal, ou pelo

9 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 5º volume: direito de família. 20ª ed., 2005. Editora Saraiva. 10 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento;

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fato do cônjuge/companheiro não estar investido em cargo de chefia, assessoramento ou

direção naquela época.

54. É de ser observado o vínculo conjugal existente no momento da

nomeação. Nesse sentido, havendo a dissolução do casamento ou União Estável com

o servidor público gerador da incompatibilidade antes de sua nomeação, não há

que se falar em configuração de nepotismo, uma vez que o vínculo de parentesco

foi desfeito com a dissolução do casamento ou União Estável, através da separação

judicial ou divórcio. É o que estabelece o artigo 1.571 do Código Civil11.

55. Oportuno frisar que na linha reta (sogro, sogra, genro e nora), a

afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável, conforme

dispõe o artigo 1.595, §2º do Código Civil12, sendo que havendo nomeação entre esses

parentes, há expressa afronta à Sumula Vinculante nº 13.

56. O casamento e a união estável com servidor investido em cargo

de direção ou de assessoramento não são considerados hipóteses geradoras de

incompatibilidade para efeito de aplicação da Súmula Vinculante quando realizados

após as nomeações, pelos motivos já expostos neste parecer.

57. Assim, não há incompatibilidade, quando dois servidores que

ingressam na Administração Pública por meios totalmente distintos e que, ao momento

da nomeação não possuíam grau de parentesco, e que, ao longo da prestação do

serviço público, desenvolveram laços de afinidade, iniciaram relacionamento amoroso e

contraíram casamento ou iniciaram união estável.

11 Art. 1.571. A sociedade conjugal termina: I - pela morte de um dos cônjuges; II - pela nulidade ou anulação do casamento; III - pela separação judicial; IV - pelo divórcio. 12 Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade. § 1o O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro. § 2o Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável.

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i) As relações de parentesco em pequenos Municípios

58. É sabido que a Súmula tem dificultado o funcionamento dos

órgãos públicos em cidades pequenas, visto que grande parte dos munícipes mantém

algum vínculo de parentesco com mandatários políticos ou com ocupantes de cargo de

chefia ou assessoramento.

59. A Súmula Vinculante aplica-se aos casos de livre nomeação para

cargos em comissão de parentes de autoridades nomeantes, pouco importando a

capacidade técnica, formação profissional ou competência do nomeado para a

assunção da função, restando evidente a amplitude da proibição, porquanto a norma

resguarda a isonomia e moralidade em seus padrões mais amplos e irrestritos,

influenciada pela ótica de supremacia da probidade administrativa.

60. Embora se perceba a abrangência das restrições aplicadas por

intermédio da Súmula elaborada pelo STF, muitos defendem a tese de que as proibições

das nomeações de parentes sejam, de alguma forma, limitadas aos órgãos ou às esferas

de poder e proporcionalmente aplicadas às peculiaridades do caso concreto.

61. Acontece que a interpretação da referida norma é taxativa,

inexistindo até o presente momento, doutrinadores ou julgados a respeito de uma nova

análise do texto, especialmente quanto à capacidade técnica e formação profissional de

parente de autoridade nomeante para a ocupação de cargo em comissão. Trata-se hoje,

de interpretação e aplicação objetiva.

62. A respeito desse assunto, o Ministro Relator Marco Aurélio ao

julgar a ADI 1.521-4, reafirmou a essencialidade dos princípios da moralidade e

impessoalidade na Administração Pública:

“(...) A um só tempo, mediante normas desse feitio, presta-se

homenagem à justiça, na mais basilar acepção do termo,

permitindo-se a quem de direito alcançar o patamar pelo qual

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pagou o preço do esforço, da dedicação e competência. Por

outro lado, usando da cartilha dos diletantes do Neoliberalismo,

tão em voga nas altas esferas dirigentes do País, cabe lembrar

que o mérito é a fórmula eficiente para chegar-se à qualidade

total desejada aos serviços públicos, ditos essenciais. Ora,

como é possível compatibilizar tais assertivas com a

possibilidade de nomeação de parentes próximos para ocupar

cargos importantes – e até estratégicos – cargos de direção nas

repartições públicas comandadas pelo protetor?

Ressalvo que de modo algum estou a menosprezar a capacidade

desse ou daquele indicado. A ênfase é outra: cuida-se aqui de

evitar facilidades óbvias, bem ao gosto das medidas

profiláticas. Até porque quem merece não precisa de favores:

quem faz por onde insiste, faz questão de demonstrar a que

veio, num ritual típico de vaidade humana, buscando cargos

elevados em entidades públicas onde parente próximo não

possui influência maior. (...)”

63. Quis dizer o excepcional jurista que, aquele cidadão que possui

capacidade técnica, formação profissional e competência para assumir as atribuições de

um cargo de confiança, não teria a necessidade de ser nomeado por parente, haja vista

suas aptidões, qualidades e talentos. Não há portanto, a hipótese de flexibilização da

norma, em se tratando do argumento de que em pequenos municípios a nomeação de

parentes é algo inevitável. Até porque, mesmo sob o fundamento da capacidade técnica,

já se encontra o permissivo legal para a nomeação nos cargos de natureza política, o que

afasta sobremaneira, a alegação de insuperável obstáculo para montagem de equipe de

governo.

j) O nepotismo como improbidade administrativa

64. Atualmente, está em grande debate em nosso ordenamento

jurídico se a prática de nepotismo configuraria ato de improbidade administrativa, por

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ofensa aos princípios administrativos incertos no artigo 11 da Lei 8.429/92, quais sejam

os princípios da moralidade administrativa, impessoalidade e legalidade. Isto porque em

recente julgamento, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu que:

65. Sobre o tema, oportuno colacionar julgamento do TRIBUNAL DE

JUSTIÇA DE MINAS GERAIS:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA - NEPOTISMO - ELEMENTO SUBJETIVO

(DOLO NA HIPÓTESE DO ART. 11 DA LEI 8.429/92) -

AUSÊNCIA - NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO

ERÁRIO OU DE ENRIQUECIMENTO POR PARTE DO

AGENTE - ATO DE IMPROBIDADE NÃO CONFIGURADO. A

conduta do agente público, embora irregular, nem sempre

pode ser tipificada como ímproba. É indispensável a presença

de conduta dolosa do agente público ao praticar o ato de

improbidade administrativa, especificamente por violação aos

princípios da Administração Pública (art. 11 da Lei 8.429/92),

que admite manifesta amplitude em sua aplicação; caso

contrário, não ocorrerá o ilícito previsto na lei. (Processo nº

1.0554.07.013468-5/001(1); Relator Geraldo Augusto;

Publicado em 10/11/2009 – g. nosso)

66. Nos casos que envolvam nepotismo, há que se verificar e analisar

detidamente cada caso, a situação de cada servidor, especialmente, o ato, a origem de

sua situação funcional, o ingresso no serviço público, quem contratou ou nomeou e,

ainda, a situação atual, com a finalidade de identificar atos que atentem contra os

princípios da Administração Pública, se há dano e se houve dolo ou má-fé do

administrador.

67. A existência por si só de ato caracterizador de nepotismo, não é

suficiente à caracterização de ato ímprobo. É imprescindível que seja constatado a

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ocorrência de dano ao erário, enriquecimento ilícito, dolo ou má-fé por parte da

autoridade nomeante.

68. Para Alberto Ferracini, "entende-se por ato de improbidade má

qualidade, imoralidade, malícia. Juridicamente, lega-se ao sentido de desonestidade,

má fama, incorreção, má conduta, má índole, mau caráter" (Improbidade

Administrativa, Julex Edições, 1997, p. 16).

69. Igualmente, necessário que se verifique se o servidor nomeado

tenha efetivamente prestado serviços ao ente Municipal, em razão dos quais recebeu a

devida remuneração pecuniária. No mesmo sentido, é necessário fazer prova quanto a

capacidade para desenvolvimento da função, aptidão para o cargo e desenvolvimento do

trabalho para o qual fora designado. Se esses requisitos não são capazes de afastar a

caracterização do nepotismo, são aptos a desconstituir a improbidade do ato.

70. Em reforço à tese de inexistência de ato de improbidade

administrativa, haja vista a ausência de má-fé ou dolo por parte da autoridade nomeante,

a lição de Maria Sylvia Zanella di Pietro sobre o tema:

"O enquadramento na lei de improbidade administrativa exige

culpa ou dolo por parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum

ato ilegal seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou

dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele realmente a

presença de um comportamento desonesto. A quantidade de

leis, decretos, medidas provisórias, regulamentos, portarias

torna praticamente impossível a aplicação do velho princípio de

que todos conhecem a lei. Além disso, algumas normas admitem

diferentes interpretações e são aplicadas por servidores

públicos estranhos à área jurídica. Por isso mesmo, a aplicação

da lei de improbidade exige bom-senso, pesquisa da intenção

do agente, sob pena de sobrecarregar-se inutilmente o

Judiciário com questões irrelevantes, que podem ser

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adequadamente resolvidas na própria esfera administrativa. A

própria severidade das sanções previstas na Constituição está a

demonstrar que o objetivo foi o de punir infrações que tenham

um mínimo de gravidade, por apresentarem conseqüências

danosas para o patrimônio público (em sentido amplo), ou

propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para

terceiros. A aplicação das medidas previstas na lei exige

observância do princípio da razoabilidade, sob o seu aspecto de

proporcionalidade entre meios e fins.

(...)

Sem um mínimo de má-fé, não se pode cogitar da aplicação de

penalidade tão severas como a suspensão dos direitos políticos

e a perda da função pública” (Direito Administrativo. 14 ed.

São Paulo: Atlas, 2002, p. 688-689).

71. Ademais, é de se atentar que, com a devida contraprestação

pecuniária em função da efetiva prestação dos serviços, inexiste conduta maliciosa por

parte da autoridade nomeante, visando obter vantagem pessoal ou causar

qualquer prejuízo ao erário.

72. Em situações análogas, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS

GERAIS asseverou que:

ADMINISTRATIVO - CONTRATAÇÃO DE PESSOAL SEM

CONCURSO PÚBLICO - RESPONSABILIDADE DE

PREFEITO - INEXISTÊNCIA DE CONDUTA DESONESTA -

AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. Não configurado o

enriquecimento ilícito do administrador público e nem prejuízo

ao erário municipal, mas inabilidade do administrador,

incabíveis as punições previstas na Lei n. 8.429/92. Recurso a

que se dá provimento. (TJMG, Apc. 1.0000.00.273807-8/000,

26

Relator Desembargador Kildare Carvalho, 3ª. Câmara Cível, DJ

29.11.2002)

73. No mesmo sentido:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITO

ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA

POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - CONTRATAÇÃO

DE SERVIDORES SEM CONCURSO PÚBLICO - OFENSA AO

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE - AUSÊNCIA DE DANO AO

ERÁRIO, ENRIQUECIMENTO ILÍCITO OU MÁ-FÉ -

RECURSO DESPROVIDO. Apesar de demonstrada a prática de

ato em desacordo com os princípios norteadores da

Administração Pública, consistente na contratação de

servidores sem a realização de concurso público, a imposição

das penalidades previstas no artigo 12 da lei federal 8.429/92

depende da ocorrência de dano ao erário, enriquecimento

ilícito e/ou má-fé do agente público; o que, se não for

comprovado, leva à improcedência da ação. (Processo nº

1.0720.05.019410-2/001(1); Relator Moreira Diniz; Publicado

em 13/05/2009 – g. nosso)

74. Não restam dúvidas de que a Administração Pública deve

respeitar os princípios máximos da Constituição Federal, sobretudo os princípios da

moralidade e impessoalidade administrativa. Contudo, tão importante quanto o respeito

aos princípios constitucionais, é a cautela que se deve ter em imputar a um gestor

público a pecha da improbidade.

75. Serve muito a advertência do ilustre Desembargador do Tribunal

de Justiça de Minas Gerais, Geraldo Augusto: “o dolo não se presume, não se baseia

em hipóteses, em indícios; há de se encontrar devidamente comprovado para importar

27

na responsabilização do agente” (Processo nº 1.0554.07.013468-5/001(1); Publicado

em 10/11/2009 – g. nosso).

76. Apesar das ponderações, o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em

recente julgamento datado de 10/02/2010, se pronunciou expressamente no sentido de

que o nepotismo afronta a moralidade e a impessoalidade da administração pública,

mesmo nos casos em que os serviços efetuados por parente de autoridade nomeante,

foram prestados com dedicação e eficiência, o que culmina em ofensa ao artigo 11 da

Lei de Improbidade Administrativa. Vejamos:

ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA –

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – NEPOTISMO –

VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

– OFENSA AO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 –

DESNECESSIDADE DE DANO MATERIAL AO ERÁRIO.

1. Ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do

Estado de Santa Catarina em razão da nomeação da mulher do

Presidente da Câmara de Vereadores, para ocupar cargo de

assessora parlamentar desse da mesma Câmara Municipal.

2. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o

ato de improbidade por lesão aos princípios administrativos

(art. 11 da Lei 8.249/1992), independe de dano ou lesão

material ao erário.

3. Hipótese em que o Tribunal de Justiça, não obstante

reconheça textualmente a ocorrência de ato de nepotismo,

conclui pela inexistência de improbidade administrativa, sob o

argumento de que os serviços foram prestados com 'dedicação e

eficiência'.

4. O Supremo Tribunal, por ocasião do julgamento da Ação

Declaratória de Constitucionalidade 12/DF, ajuizada em defesa

do ato normativo do Conselho Nacional de Justiça (Resolução

7/2005), se pronunciou expressamente no sentido de que o

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nepotismo afronta a moralidade e a impessoalidade da

Administração Pública.

5. O fato de a Resolução 7/2005 - CNJ restringir-se

objetivamente ao âmbito do Poder Judiciário, não impede – e

nem deveria – que toda a Administração Pública respeite os

mesmos princípios constitucionais norteadores (moralidade e

impessoalidade) da formulação desse ato normativo.

6. A prática de nepotismo encerra grave ofensa aos princípios

da Administração Pública e, nessa medida, configura ato de

improbidade administrativa, nos moldes preconizados pelo art.

11 da Lei 8.429/1992.

7. Recurso especial provido. (Processo nº REsp 1009926 / SC;

Relatora Ministra Eliana Calmon; Publicado em 10/02/2010 – g.

nosso)

77. Importante transcrever o entendimento sufragado pelo SUPERIOR

TRIBUNAL DE JUSTIÇA, segundo o qual "o tipo do artigo 11 da Lei 8.429/92 para

configurar-se como ato de improbidade, exige conduta comissiva ou omissiva dolosa"

(REsp 534575, rel. Min. Eliana Calmon, DJU 29.3.04).

78. Com essa ressalva, voltamos ao entendimento da

imprescindibilidade de comprovação de uma conduta atentatória aos princípios

constitucionais além da simples nomeação de uma pessoa com grau de parentesco. A

inexistência de Lei, por exemplo, (local ou federal) que proíba a nomeação de parentes

ou afins para os cargos públicos, já foi objeto de afastamento do entendimento da

ocorrência de violação dolosa dos princípios da administração, haja vista que não existia

ato normativo regulamentador no momento da nomeação. É o que estabelece o Tribunal

de Justiça Mineiro:

EMENTA: AÇÃO DE NULIDADE - NEPOTISMO -

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - NÃO CONFIGURAÇÃO

- RECURSO IMPROVIDO. A prática de nepotismo não

29

configura ato de improbidade administrativa, por não restar

demonstrado a violação dolosa aos princípios da

Administração Pública e por não haver legislação local que

proíba. (Processo nº 1.0479.07.130381-8/001(1); Relator Alvim

Soares; Publicado em 05/06/2009 – g. nosso)

79. Podemos até concluir que, diante da ausência de norma ou ato

normativo que proibia o nepotismo, antes da edição da Súmula Vinculante nº 13 -

aprovada na Sessão Plenária do Supremo Tribunal Federal em 21/08/2008 - , todas

aquelas nomeações realizadas anteriormente não são passíveis de incorrer em ato de

improbidade.

80. São essas as considerações, reafirmando que a matéria enfrentada

neste parecer ainda é muito recente, carecendo, portanto, de um volume maior de

decisões judiciais para apreciação das variáveis que se encontram presentes na

interpretação do texto da Súmula Vinculante. Assim sendo, a cautela na atuação como

gestor público se faz ainda mais recomendável.

S.M.J. É O NOSSO PARECER.

Uberlândia, 22 de abril de 2010.

ARNALDO SILVA JÚNIOR

OAB/MG 72.629