paulo bruscky_ intervenções e deslocamentos de sentido no espaço urbano
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8/12/2019 Paulo Bruscky_ Intervenes e Deslocamentos de Sentido no Espao Urbano
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Paulo Bruscky: Intervenes e Deslocamentos de Sentido no Espao Urbano
Paulo Bruscky: Interventions and Displacements of Sense at the Urban Space
esumo
Paulo Bruscky um artista brasileiro reconhecido internacionalmente pela sua ampla produointermdia que abrange trabalhos com xerox, arte postal, poesia visual, desenho, pintura,
apropriao, colagem e fotografia !lm disso o artista desenvolveu in"meras performances,
interven#es urbanas, instru#es, xerofilmes e livros de artista $om o ob%etivo de refletir sobre
possveis desdobramentos da arte contempor&nea na esfera urbana so tecidas rela#es entre
algumas de suas proposi#es artsticas durante as dcadas de '( e )( e as pr*ticas situacionistas
iniciadas na +rana em meados do sculo a partir dos escritos de -uy./rnst 0ebord e da revista
1nternacional 2ituacionista 3124 2o apresentados trabalhos reali5ados por Bruscky, nos quais a
cidade e seus ocupantes tem um papel central em sua concepo e reali5ao, um recorte que
paralelamente dialoga com alguns termos situacionistas como deriva, desvio e psicogeografia
Palavras!chave:Paulo Bruscky, cidade, situacionista, interveno urbana.
Abstract
Paulo Bruscky is a Bra5ilian artist recogni5ed internationally for his great intermedia art production
that includes 6orks 6ith xerox, mail art, visual poetry, dra6ing, painting, appropiation, collage and
photography +urthermore the artist developed several performances, urban interventions,
instructions, xerofilms and artists7 books 8ith the aiming to reflect about contemporary art and the
urban sphere, connections are made bet6een some of his artistic propositions made during the
decades of 9:'(s and 9:)(s and the situationist practices initiated in +rance in the ;(th century as
from the 6ritings of -uy./rnst 0ebord and the 2ituationist 1nternational maga5ine 3124
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Introdu$o
=uando fui preso pela ditadura militar, que desgovernou o Brasil a partir de 9:>?,
vivi involuntariamente isso que disse 0uchamp e tomei como epgrafe na pr*tica@
quando, mais chocado que surpreso com meu trabalho, um agente federal disseA
7/nto se eu arrancar um pedao desse piso e colocar na parede isso arte7 Ca
poca, o piso era vulcapiso /u respondiA 72e vocD colocar, no 2e eu colocar que
arteE7 Passei perto de apanhar Paulo Bruscky 3+F/1F/, ;((>, p :)4
! problem*tica da arte contempor&nea no contexto urbano recorrente na obra de v*rios
artistas e historicamente marcada por diversos movimentos de vanguarda 0esde os dadastas e
surrealistas, passando pelos situacionistas e o grupoFluxus, inovadoras e inusitadas proposi#es
deram incio G pr*tica de olhar, ocupar e transformar o ambiente citadino 2ob esse panorama
abordo proposi#es do artista intermdia Paulo Bruscky que problemati5am a cidade, seus
ocupantes e microuniversos tecendo algumas rela#es com as propostas e a#es situacionistas em
meados do sculo !rtistas, intelectuais e ativistas, os situacionistaestavam interessados numa
arte que, rompendo os padr#es modernos, seria diretamente ligada G cidade e G vida urbana
3B/F/C2: teve 9;
n"meros publicados 3idem4 !lguns desses conceitos sero citados no presente artigo, tais como
deriva, desvio e psicogeografia ! fim de facilitar o entrosamento do leitor com a estratgia
situacionista transcrevo o trecho da revista 12 nJ9 que fa5 meno aos termos em questo
situacionistaK L que se refere G teoria ou G atividade pr*tica de uma construo de
situa#es 1ndivduo que se dedica a construir situa#es Membro da 1nternacional
2ituacionista
psico%eo%rafiaK /studo dos efeitos exatos do meio cartogr*fico, conscientemente
plane%ado ou no, que agem diretamente sobre o comportamento afetivo dos
indivduos
34
derivaK Modo de comportamento experimental ligado Gs condi#es da sociedade
urbanaA tcnica de passagem r*pida por ambiDncias variadas 0i5.se tambm, mais
particularmente, para designar a durao de um exerccio contnuo dessa
experiDncia
34desvio K abreviao da expressoA desvio de elementos estticos pr.fabricados
1ntegrao de produ#es artsticas, atuais ou passadas, em uma construo superior
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do ambiente Ceste sentido, no pode haver pintura ou m"sica situacionista, mas um
uso desses recursos 39:I) apudB/F/C2>4
! deriva e a psicogeografia no correspondem apr*ticas essencialmente artsticas, porm,
pela via experimental e inventiva provocam uma ruptura no modo convencional de apreenso doespao urbano, proporcionando assim novas experiDncias estticas e afetivas ! ideia de perambular
pela cidade remonta ao conceito de flneurde Baudelaire em 9)>H no textoLe peintre de la vie
moderne3A pintura da vida modernaK traduo prNpria4 3B/F/C2
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est* inserido ! maioria dessas a#es foram efDmeras e inditas, pois rompiam completamente com
a premissa de obra dur*vel, seu consumo era imediato e Oessencialmente avesso G conservao sob
a forma de mercadoria 312 nJ?, 9:>( apud B/F/C2
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em 9:)9, Bruscky reali5ou em parceria com o artista 0aniel 2antiago e com a prefeitura da cidade
do Fecife o pro%etoArtdoor no intuito de propor novas maneiras de olhar a cidade e subverter
modelos %* estabelecidos !rtistas brasileiros e estrangeiros oriundos de ;I pases participaram da
mostra e fi5eram cerca de 999 outdoorsespalhados pelas ruas !o apropriarem.se de um meio de
comunicao caracterstico da publicidade e subverterem sua funo, os artistas abriam campo para
que uma indita experiDncia esttica ocorresse Qouve uma reinveno na din&mica local, a
paisagem urbana tornou.se algo mais que OdepNsito para propagandas e an"ncios comerciais Ls
passantes tiveram a possibilidade de aprovar ou no as obras expostas, ou mesmo de percebD.las no
ambiente ou no ! exposio livre e no.comercial driblava a lNgica convencional do sistema de
arte voltado aos museus e galerias ! cidade revelou.se como potencial local expositivo e criativo,
como numa fuga de sua definio enquanto ambiente funcional e supostamente no.artstico
Ls artistas criaram a expressoArtdoorespecialmente para esta exposio que foi pioneira
no Brasil por apropriar.se de outdoorscomo superfcie e da prNpria cidade como espao expositivo
3+F/1F/, ;((>, p ::4 L arquivo Bruscky e a arte correio foram indispens*veis para a reali5ao
da mostraA os artistas participantes foram convidados atravs de postais, e os trabalhos foram
enviados ao Fecife atravs da mesma rede de arte postal internacional, que possui mais de H(((
nomes catalogados 3idem4 /m 9:); houve a !" #xposi$%o de Artdoor, tambm em Fecife, mas
infeli5mente no tive acesso a qualquer material mais detalhado sobre !t mesmo a primeira
exposio de 9:)9 est* escassamente documentada com relao a material para pesquisa
&" #xposi$%o 'nternacional de Artdoor, 9:)9
2obre a 9R /xposio 1nternacional de !rt.door os artistas declararamA
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Ca art.door, a arte sai das requintadas galerias e dos arcaicos museus e toma forma
em carta5es espalhados pela cidade, que transformada num grande espao artsticoA
H:?; mS de obras de arte em exposio L artista, no %u5o final, sendo %ulgado pela
populao 3o que intimidou a participao de v*rios artistas, principalmente os
pseudomuralistas, os 2iqueiros da vida4, numa exposio sem fins comerciais, onde
a propaganda cede seu lugar para trabalhos das mais variadas tcnicas, desde os mais
tradicionais regionalistas, at as propostas mais recentes da arte contempor&nea
3poemas visuais, carimbos, xerox, propostas, etc4, com a participao de ;)> artistas
de ;I pases, d* oportunidade aos artistas e ao povo de presenciar o que est*
acontecendo em todo o mundo Paulo Bruscky e 0aniel 2antiago 3+F/1F/, ;((>, p
::4
Para 0ebord, Oa vida cotidiana a medida de tudoA da reali5ao K ou melhor, da no.reali5ao K das rela#es humanas@ da utili5ao do tempo vivido@ da pesquisa na arte@ da poltica
revolucion*ria 3B/F/C2HH por Maurcio de Cassau 3+F/1F/, ;((>, p ))4 $om uma
imensa fita vermelha, o artista Ofechou a ponte 0iante da desconcertante situao, pedestres e
carros pararam por cerca de quarenta minutos at que algum resolveu desamarrar a fita 3idem4 L
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vdeo que documentou a ao esteve em exposio na ;:R Bienal se 2o Paulo em ;(9( /m
Artexpocorponte 39:';4 as pontes da Boa Uista e 0uarte $oelho foram ocupadas pelos participantes
da ao que, munidos de carta5es, trocavam sinais ativando e estabelecendo uma comunicao
singularA as pontes, sobre o rio $apibaribe, so paralelas o que permitiu a interao dos dois grupos
atravs dos carta5es 3idem, p )'4 Propondo novas estratgias de uso e interao para com lugares.
comuns do espao urbano, o artista cria a passagem para a fuga, para a investigao de novas
abordagens da arte, do cotidiano, da vida
Artexpocorponte, 9:';
Bruscky explora o l"dico e o inesperado no espao urbano coletivo tomando a realidade
como um imprevisvel %ogo a ser inventado e reinventado constantemente, onde criatividade e acaso
se complementam /mArtemc()ado39:';4, novamente em parceria com 0aniel 2antiago, o artista
prop#e uma exposioVconcurso de c*gados na Pracinha do 0i*rio, centro de Fecife, onde uma
banca %ulgadora elegeria o c*gado ornamentado de forma mais original 3+F/1F/, ;((>, p ':4
Percebe.se uma inusitada aluso G caracterstica cultura carnavalesca da cidade em questo, um
desfile de c*gados fantasiados uma proposio bastante inusitada de carnaval fora de poca !
utili5ao do espao p"blico expande.se para a criao de inditas experimenta#es coletivas
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$onvite para Artemc()ado, 9:';
2eguindo a mesma linha l"dica e descontrada, Bruscky e 0aniel 2antiago reali5am
Artemp* 39:';4, uma convocatNria para uma exposio onde cada convidado deveria comparecer
com sapatos de pares diferentes 3+F/1F/, ;((>, p ':4 1nteressava aos artistas provocar o
estranhamento do cotidiano a partir da subverso do uso do ob%eto e revelar Oa ironia resultante de
seu desuso e de sua inutilidade 3idem, p H;4 L problema contextuali5ado aqui vai alm da ao
corriqueira di*ria, aborda o cotidiano como um todo que absorve completamente o indivduo,
transformando.o num ser autTmato, tirando dele as rdeas de sua prNpria existDncia e lanando.o
num fluxo desenfreado de afa5eres e formalidades Para 0ebord, Oa enorme pobre5a da organi5aoconsciente, a falta de criatividade das pessoas na vida cotidiana expressam a necessidade
fundamental de inconsciDncia e de mistificao numa sociedade exploradora, numa sociedade da
alienao 3B/F/C24 ! fragmentao do tempo e seu consequente
preenchimento por diversas atividades va5ias de sentido tornam o indivduo distanciado de suas
verdadeiras vontades e dese%os O! vida cotidiana torna.se assim a vida privada, domnio da
separao e do espet*culo 3idem4 Feinventando esse mesmo con%unto di*rio de atividades,
reformulando seu conte"do, o cotidiano ganha faces m"ltiplas, imprevisveis e org&nicas !s
interven#es de Bruscky demonstram como possvel despertar diante do fluxo caNtico urbano,
como pode.se vivenci*.lo questionando.o e transformando.o
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+ala, 9:'?
Co 1 2alo de !rte -lobal de Pernambuco, em 9:'?, Bruscky reali5ou o pro%eto +alaque
consistia numa mala abandonada no local expositivo para a livre manipulao dos visitantes
3+F/1F/, ;((>, p )(4 L ob%eto, como esperado pelo artista, saiu dos limites fsicos da exposio e
ganhou as ruas, sendo transportado aleatoriamente no espao urbano ! continuidade do pro%eto
acontecia casualmente na medida em que os indivduos escolhiam ou no interagir com o ob%eto
/m ;((9 o pro%eto foi reali5ado mais uma ve5 ! perambulao pelas ruas da cidade uma ao
recorrente em diversos trabalhos do artista L andar descompromissado seria um potencial ponto de
partida para a criao de novas maneiras de vivenciar a cidade, como um retorno ao nvel O( de
reconhecimento, experimentar um novo &ngulo, outra maneira de olhar, algo %* visto, %* conhecido
O! deriva seria uma apropriao do espao urbano pelo pedestre atravs da ao do andar sem
rumo 3B/F/C2
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Oexibiu obras comoA Avenida uararapes - noite, . rio api0ari0e visto do 12 andar do #dif3cio
4eresa ristina e A madru)ada na Avenida onde da Boa 5ista 3idem4 !qui Orealidade e
representao se confundem, a arte se reali5a num tempo.espao real no Ocampo da experiDncia da
perambulao citadina 3+F/1F/, 9::', p >(4 Procedimento que, se por um lado revela a cegueira
di*ria, por outro reconecta o indivduo aos lugares e detalhes que lhe so afetivos, que se vD tal qual
o psicogeNgrafo situacionista
! psicogeografia estudava o ambiente urbano, sobretudo os espaos p"blicos,
atravs das derivas e tentava mapear os diversos comportamentos afetivos diante
dessa ao b*sica do caminhar na cidade 34 ! psicogeografia seria ento uma
geografia afetiva, sub%etiva, que buscava cartografar as diferentes ambiDncias
psquicas provocadas basicamente pelas deambula#es urbanas que eram as derivas
situacionistas 3B/F/C2
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(onclus$o
!presentando sucintamente esses pro%etos artsticos, elucido a import&ncia da obra de Paulo
Bruscky, este artista nacional de pro%eo internacional L fato de terem ocorrido h* mais de duas
dcadas os torna ainda mais pertinentes para o contexto da arte contempor&nea atual, considerando,
alm disso, que constituem apenas um recorte da intensa e diversa produo do artista 0iante da
amplitude de tal tra%etNria, a bibliografia existente se revela restrita e, de certo modo, desconhecida,
evidenciando a import&ncia e necessidade de novas incurs#es neste campo to vasto e ainda pouco
investigado que a tra%etNria de artistas brasileiros fora do eixo Fio.2o Paulo cu%a produo se deu
numa poca de efervescDncia poltica e de atuaodas vanguardas
Mergulhar no extenso repertNrio de obras desenvolvidas por Paulo Bruscky %* constitui porsi sN permitir.se a uma deriva de ideias, experiDncias e desdobramentos ! partir de proposi#es
inusitadas, o artista subverte a funcionalidade imposta pelo cotidiano a um determinado lugar, a um
determinado con%unto de pessoas desviando.os para breves momentos l"dicos, crticos, insNlitos
Cum perodo histNrico marcado por grandes esforos das autoridades nacionais para manter a
ordem estabelecida, Bruscky insistiu em, fr*geis porm efetivas, fissuras para provocar a
transformao e reconfigurao do entorno, ainda que temporariamente Cessa perspectiva, as
investiga#es da arte no meio urbano, da arte e poltica, arte e p"blico esto longe de um
esgotamento, nota.se a quantidade de a#es que surgem em diversas cidades brasileiras, artistas,
coletivos, ativistas e pessoas em geral movem.se numa consciDncia m"tua da necessidade de se
apropriar, de ocupar, de ativar os espaos p"blicos Bruscky mostra como, com to pouco e de
forma simples e sincera, possvel alterar significativamente o contexto em que se est* inserido,
deixando a impresso de que pequenas tentativas de alterao do meio em que se vive facilmente
podem ganhar propor#es sem limites
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efer)ncias Biblio%r*ficas
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1nternacional 2ituacionista n"mero 9, %unho de 9:I)@ n"mero ?, %unho de 9:>(
1magens
+F/1F/, $ Paulo Bruscky Arte, Arquivo e Utopia, $ompanhia /ditora de Pernambuco, 2o
Paulo, ;((>, p'), )(, )9, )', )), :)