pesquisa sobre expertise: perspectivas e...
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ISSN141J·J89X
Resumo
Telllue!1Psicologia dilSBP·2001.VoI9n' 3.223·237
Pesquisa sobre expertise: perspectivas e limitações'
Afonso Galviío UniH.'r~'idad;: Calólica de Brasília
Diferenças entre o conhecimenlO de erpalS e n1l.0 nperlise em qualquer domínio é algo que sempre desafiou lanlO ciemislas qUlImo público em geral. Pesquisas têm indicado que o desempenho superior do e:rperr pode
ser explicado a partir de algumas características básicas de scu comportamento. Por exemplo, expert.1 demonstram melhor memória para material significant~ li" 'lue não .. e:rperlr ~ represenlam problemas de
modo mai5 elahorado. empregando diferentes estratégias para resolvê .. los. Este trabalho apresema dados de algumas pesquisas recentes na área de experlise que traiam sobre os aspectos comuns li" ambiente no qual li
expcrtisc se desenvolve, o conceito e importàneia 110 es tudo individual deliberado pam o alcance da erperlisc e falore" motivacionais que SUSlentam o aprendizado de longa duração em áreas como música instrumen tal,
fisica . tênis e literatura. São mencionadas três gerações de modelos que tentam explicar a e.xperlise. A
conclusão oferece uma pequena análise das implicações da pesquisa sobre experli3e para estudos da criatividade c ooucaç~o como um todo. bem como sobre S~ limitaçõcs e pe~pcctivas futuros
PalaYl'u·tilll: experlise, estudo deliberado, aprendizagem. modelos cognitivos. talento
Research on expertise: perspectives and limitations
AbstraCI
DifT~"fL'TlCCS bctween e.xpert and non .. expcrt knowledge in any domain has challcnged buth researçhers and the
general poblic. Researeb soggests that experts' SUp"rior performance eapacity ean bc explail1~d in tcrnlS of
some basic !"eatUleS 01" tbeir bchavioUT. For cxample. experts show bclter memory Ihan non experts for significant material and represent problems in a more elaboratc manner, using diflerenl stralegies to solve them. This paper reviews researcb in lhe arca ofexpertise conceming the cnvironment in wbich it de\"elnps.
the concept and role of deliberate praetice to achie\"C cXpcrlisc, as well as tbe motivmional faclors Ihal support long .. terrn lcarning in lIn'as such as instrumental mosic perfonnanc<,. tenois and IIteraturc. Tbree generalions
of models Ibat try to cxplain cxpertisc are mentioned. The conclusion ofTers a brief analysis on lhe implications ofexp<:rtisc rcscareb 10 domains 50ch as ercalivity and cducation aS ~ ",bole. ~nd ~boul ilS li",its
and futuretesearchpcrspectives
Kel wonh: expcrti sc, deliberatc practicc, leaming. cognitivc models , lalcnl.
I. Trabalho aprescotado no Simpósio CriatÍ>'idade e Experlúe:falares facililudora a seu desenvolvimento. XXXI Reuni~o
Anual de Psicologia da Sociedade Brasileira de Psicologia. Kio de Janeiro - RJ , outubro de 2001.
Endereço para correspondência: Condomínio Vivendas Bela Vista, modo R,casa 13, CEP: 73.070 .. 018, Sobrddinbo - DF
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Introdução
Diferenças entre a perfonnancc de experts e
não-experts em qualquer domínio é algo que sempre
desafiou a compreensão tanto de cientistas quanto do
pÍlblicoem geral. Pesquisas suger~m que a capacidade
perfonnãtica superior do expert pode ser explicada a
partir de algumas características básicas do seu comportamento. Por exemplo, experl~' demonstram
melhor memória para "material significante" do que
nilo-experls (DcGroot, 1966), e representam problemas de modo mais elaborado, empregando diferentes estratégias para resolvê-los. A capacidade superior do expert tem como base um conhecimento
sólido 03 área especifica. adquirido através de estudo individual deliberado, sistemático c extensivo (Green e Gilhooly, 1992), que sobrevive a limitações de ordem motivacional, ambiental e pessoal (Ericsson,
Tesch-Romer e Kramp, 1993).
Estudos laboratoriais sobre o desenvolvimento
da expertise s.1Io antigos a ponto de se confundirem
com a própria história da pesquisa experimental
psicológica (Galvão, 2000a). Por exemplo, dois
estudos de 8ryan e Harter (1897; (899) defendem que
uma habilidade específica se desenvolve numa série
de fases intennediadas por p/a/eaus (momentos em
que, apesar da prática deliberada, a aprendizagem fica
aparentemente estacionada) que permitem a
automatização de uma sub-habilidade que leva o
aprendizado proceder a uma próxima fase. Embora a
possibilidade de observação experimental dep/uleuU$
seja algo questionável, a hipótese de sua existência
permanece plausível (Galvão, 2oooa). No emaoto, os
experimentos antigos estavam mais preocupados em
resolver problemas especificos que otimizassem. por
exemplo, a produção industrial do que em oferecer
teorias que pudessem JuslÍfiear aspedos comuns da
experrise em campos dislÍntos. Tal situação começou
a mudar no final dos anos quarenta com os trabalhos
de De Groot (1946/1965) sobre experrise em xadrez,
que influenciou toda uma geração de pesquisadores a
se dedicarem 11 área a partir de diferentes p<W<IIJigmas.
Surgiu então um tipo de pesquisa interdiseiplinar que
tomou rumos ainda mais claborados a partir de um
artigo de Chase e Simon (1973) propondo uma teoria
geral para a estrutura da expertisc que fosse capaz de
oferecer previsõcs empíricas para a performance
experr em uma variedade dc dominios, incluindo
música, xadrez, medicina, futebol e outros. Para
Chase e Simon. a maioria das modalidades dc
experlise resultavam de vastas quantidades de
conhecimento acumulados numa área espedfica e de
mecanismos de retenção baseados em certos padrões
adquiridos durante muitos anos de experiência no
domínio. Por domínio deve-se entender qualquer área
específica tal como xadrez, fisica, música, futebol
Ge nética e experlise
Uma das primeir~ pesquisas sobre experlise,
desenvolvida por Sir Francis Galton nas Ilhas Britânicas,
apoiava a visão de que a expertise t:m di Vt:JllOS dominios
resultaria de causas inatas. Por trás dessa idéia, estava a
dcscobcrta de que indivíduos eminentes quase sempre
tinham parentes também eminentes (Galton, 18691
1979). A conclusão natural de Galton foi de que a
eminência ocorria em conseqüência de habilidade
natural herdada. Tal abord.1gem "gem:tica" da experlise
é ainda influente, especialmente entre pessoas leigas.
Mas há também pesquisadores que acreditam ser
possível identificar diferenças estlUturais básicas no
sistema nervoso que talvez intcnnedcicm diferenças
estáveis na perfonnancc expert de individuos, o que seria
análogo ao modo como fatores genéticos influenciam
altura, cor dos cabelos e pele e outras caracteristicas
fisicas das pessoas (Ericssoo e cols., 1993). Explicações para a cxperti.·e baseadas na noç~o de '"talcnto" ou
herança genética resultam da idéia dc que alguma
capa\:idade que a pessoa traga consigo desde o
nascimento e seletivamente facilita a aquisição de
babilidade de alto nivel está presente em algumas
pessoas, mas nào em outras. Pesquisadores que
acreditam na noç~o de talento usam correlatos
biológicos de habilidades específicas (por exemplo,
música), algumas raras em autistas sm'unts e algumas
excepcionais espontâneas aparentemente presentes em
crianças para explicar que algumas pessoas são
competentes. em termos de apresentarem uma
pcrfonnance de alto padr:lo em alguma coisa porque
nascem competentes (Howe, Davidson c Sloboda,
1998) Em contrnste com essa Jl'OOição, investigações
longitudinais em uma variedade de áreas têm demonstr.ldo, de modo cada Ve7 mais convincente, que diferenças nas primeiras experiências de vida, preferências, hábitos, oportunidades e, principalmente, estudu individual deliberado qualitativa c quantitativamente eficiente são os principais detenninantes da
obtenção da capacidade performática experto Por exemplo, para alguém se tomar jogador de xadrez capaz de disputar tcrneios intcrnaciooais, são necessários pelo menos dez anos de preparação sistemática (Simon e Chase, 1973). Na composição músical, a prepardç~u pode levar qna.sc vinte anos (Hayc:s, 1981), enquanto, na música instrumental,oestudo de Ericsson ecols. (1993) reveluu que viulinistM estndantes de conservatório superior atingem em tomo de dez mil horas de estudo individualdeliberadoe00121 anos de idade. Em gemi,
pesquisas têm confinnado que, rui maioria das áreas, são ncres<.áriospelo menos dez anos de estudo individual deliberado para que a crpertil"C seja alcançada. Isso é
particularmente verdade para a mú~ica inslnunenUI (Susniak, 1985, 1990), mat.:mã!Íc3 (Gustin, 1985), tênis (Moosaas, 1985) e ciência e litcratura(Lchman, 1953).
Delinindoexpertise
A literatura sobre expertise e áreas associadas que se desenvolveu nos últimos cem anos parece não sepreocuparernexplomrurnadefiniçãodeexpcrtise, embora alguns textos tratassem do assunto de modo passageiro (e.g. Cunis. 1986; Logan, 19S5;t::ricsson e coú. , 1993). Assim, na ausência de uma definição mais sistemática do tenno quc seja compartilhada por pesquisadores da área, scni usado um significado abstraído dc abordagens tcóricas c experimentais do assuntoeomrcspaldonostmhalhosdtalgunsautor~ s
importantes da área (e.g. Frcnsçh c Sternberg, 1989; Ericsson e cols. 1993; Sluboda, Oavidsun, Howt: t: Moore, 1996). Designa-sc expertise à capacidade, adquirida através dt prática ou ~studo individual
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deliberado, de d~sempenhar particulannent~ bem uma tarefa espccífica de urndominio.
A ddinição acima proposta estrutura-se a partir de pelo menos três ingredient~s que servem como substmto a priori no tratamento do tema: (I) Estlldo individual de1iberado; (li) Qualidade daperfonnance; e (lll) Noção de domínio específico. Há uma relação entre expulise c prática ou estudo individual deliberado de um domínio especifico. Pesquisas de Ericsson e coliJ·. (1993), que rcvisamm mais de um
séculodeestudn~naáreadeaprendizagcmcaquisição
de habilidade, eoncluímm que o estudo individual deliberadodcrnanda uma tarefa bt:m ddinida, com um nível dc dificuldade apropriado para o indivíduo, fccclbackinfonnativoeoportunidadespararepetiçãoe correção de erros.
Pesquisadores têm usado participantes com variadosniveisdeexperiência,oquelevaaeettostipos de problemas que precisam ser equacionados.
Participantes considerados experts cm cstudos quc comparam a perfonnance de experls com novatos têm mais de 10 anos de experiencia na área de amação em trabalhos que foca1wull jogos (Chase e Simon, 1973; DeGroot, 1946/1965) e música (Ericsson, Tesch-Romer e Kramp, 1990; Sloboda, Oavidson e Howc, 1994; Galvão, 2000b), enquanto e~1l1dus l."Ill
áreas acadêmicas tais como fisica (Larkin, 1983) e mat(!lllátiea (Schoenfeld e Hemnann, 1982) têm usado
participantes com variados níveis de experiência, incluindo graduados e t:studantes universitários avançados. Um proh1cma aqui ~ que expcrts com difcrcntes níveis de experiêneia num domínio, embora possam ser comparados com nJjo-cxpert.!, podem nJjo
apresentar as mesmas diferenças produzidas por experls-novatos em tennos de mecanismos cognitivos subjacentes. Aliás, pesquisa de minha autoria (Galvoo,
2000b) sugeriu imjX)rtantes diferenças na seleção e organização de material de estudo entre músicos f'~rtscomdifercntesnívcisdecxpcriênciacsrceífica
acumulada, cmbora isso não tenha indicado que as estratégias dt: t:studo dosmt:llos experientes fosst:lll necessariamente menos eficientes que as dos mais experientes.
m
Um segundo elemento tomado por garantido na
definição antcnonnente apresentada envolve a noção
de qualidade em relação à pcrfonnancc. Aqui há dll3S considerações a fazer que percorrem caminhos levemente distintos, cmoora relacionadO/; e levam em conta tantO Ullla comparação das definições fonnais de
experlise e inteligência, quanto uma análise da noçt\o de qualidade pcrfol1llática como conceito socialmente
construído. Em relação ao primeiro aspecto, pode-se
apontar que tanto intdigência quanto eJ:pertise são conceitos operacionalmente definidos a partir de diferenças individuais. Por exemplo, o que diferencia ex:pert$ de não-experts é wna suposta superioridade no produto do raciocinio dos primeiros, da mesma fonna como pensadores supostamente mais inteligentes resolvem problemas de modo qualitativamente melhor
que pensadores tidos como m<:nos inteligentes. Tal analogia tem sido considerada tão seriamente que
alguns pesquisadores usam expertise e inteligêm;i~
como termos sinônimos (Ceci e Liker, 1986; Wagner e
Stcmberg, 1986) ou argumentam que o raciocínio
experr pode ser visto como um caso especial de
raciocínio inteligente (Frensch e Sternberg, 1989). ror
outro lado, a qualidade da performance envolve
também um referencial social coletivamente
construido. Isso significa quc oprodutoda performance
aperl vai tcr seu reconhecimento condicionado à
relevância e lugar deste produto dentro de uma dada
cultura. Assim, diferentes domínios acabam por ter
diferentes níveis de atribuição de importância, o que
influencia o modo como diferentes gerações de pessoas envolvidas com o domínio se dedicam a ele, contribuindo ou não para um apcrfeiçoanlento cada vez
maior da área. Finalmente, há, na definição de
experlise, também a noção de "domínio específico·'.
Isso leva a uma idéia de experlise como derivada de
prática índividual deliberada ao invés de, \XII" exemplo,
herança genétjça. Embom, teoricamente, nada impel;a
alguém de ser experr em mais de um domínio, experrise em um domínio não necessariamente aparece como
conseqüência de expertise em outro domínio. Logo, tal
perspectiva nega a noção de um fator <Og" que poderia
difeTeTlciar padrões de perfonnancc numa variedade de
tarefas.
, ..... Teorias da expertise
As primeiras tentativas de elaborar uma teoria geral da experlise (Newell, Shaw e Simon, 1958;
Newcll c Simon, 1972) desenvolveram o conceito de
resolução expert de problemas como busca serial,
deternlinada a partir da especificação de um pequeno
número de métodos heurísticos tais como "análise de
meios e fins'· e "subida de montanha". aplicáveis em
um amplo número de dominios com mínimo ou
nenhum conhecimento sobre conteúdos específicos
de cada dominio. Assumia-se, aqui, o exl'er/ como alguém panicularmente habilidoso em termos de
busca heurística geral. A técnica heurística opera
como um veículo para a formulação criativa que
tenta a redução do espectro de possiveis respostas
p~ra um problema. Em outras palavras, a solução
para um problema estava relacionada com buscas
dentro do espaço do problema onde movimentos
~ltemativos eram considerados. Este procedimento era desenvolvido a partir da aplicação de metados
gerais de resolução de problemas em qualquer
dominio, independentemente de seu conteúdo. Tal
visão levava à idéia de que, quanto mais alguém
soubesse sobre métodos gerais, mais acurada seria
sua capacidade de resolver problemas. Isto talvez
fossc válido no contexto dos problemas simples que
caracterizavam as pesquisas experimentais de
primeira geração. No entanto, em dominios
semanticamente ricos (áreas acadêmicas em geral),
processos de resolução de problemas envolvem
consideravelmente mais que métodos gerais. Estudos em xadrez (Chase e Simol!, 1973;
DeGroot, 1965), fisiea (Chi, Fcltovitch e Glaser,
1981; Larkin, McDermott. Simon c Simon 1980) e
vários outros domínios concluíram que ~ experliseera erucialmente dependente do conhecimento detalhado de um domínío o qual influenciava tanto habilidades
especiais de memória quanto padrõt:s de inferência.
Estratégias heurísticas gerais foram entendidas como métodos fracos, usados mais por novatos que por
experl!i. Com o reconhecimento de que a performance
experl dependia de conhecimento específico de um
domínio, esta primeira abordagem foi substituída por
uma segunda geraçAo de teorias que se dc,jicou a um
'~I.llexpertise 121
estudo mais daborado da resolução de problemas, conseqüência da passagem do conhecimento
usando o método ecologicamente válido da análise de declarativo para o procedimental e tem sido usada
protocolo. Emrou-se, enlão, muna área de resolução para explicar a aquisição de habilidade experl em
de problemas complexos que passava a ser par- várias áreas, incluindo geometria (Anderson,
tkulannente importante para teorias cognitivas por Greeno, Kline e Neves, 1981), programação de demandar a integração de processos báskos tais como computadores (Pirollj e Anderson, 1985) e música
memória, atenção e raciocinio. Como a idéia de (Sloboda, 1985). O modelo é composto de três partes
experti5eeSlaVa relacionada a fazer alguma coisa bem, principais: memória dedarativa, procedimental e de
o estudo do aprendizado procedimental se tomou tão trabalho. A memória declarativa representa uma rede
importante quanto o do conhecimento declarativo. semântica de conceitos interconectados com
Além disso, a área de resolução de problemas capacidade de ativação variada. A memória
complexos tinha importantes aplicações práticas em procedimental são regras de produção, enquanto a
termos de mundo real (Holyoak, 1994). memória de trabalho contém as infonnações do
A abordagem da segundageraçãodc tcóricosera momento. O conhecimeoto armazenado pela
baseada numa "arquitetura" cognitiva chamada mcmória dedarativa podc ser relatado, já que não
"sistema de produção serial" (Newell, 1973), está amarrado a situações especificas. Envolve, por
desenvolvida em interação com a área de inteligência exemplo, conhecimento de fatos sobre o mundo. O artificial (ciêncIas da mente) etomou-sea base da teoria conhecimento proçedimental não pode ser expresso.
ACP(abn:viaçãoparaalÚlpliveconlrolofthought)de Trata-se de um conhecimento automatizado e
Anderson (1987). Explicações para o desenvolvimento orientado para situações especificas (e.g. o tipo de
da expertise, nessa perspectiva, foram articuladas e conhecimento usado na adição de números). A
empirkamcntc motivadas a partir das teorias de infonnaçlio armazenada na memória de produção
agrupamento (chunking) de Rosenbloom e Ncwel1 toma a fonna de regras de produção executadas
(1986) e da teoria da compilação de conhedmentos quando coincidem com o conteúdo da memória de
(Anderson, 1982, 1983, 1987, 1993). De aoordo com a trabalho. A memória procedimental pode também
teoria do chunking, quando uma série de regras de ser aplicada a si mesma através de proçessos de
produção é aplicada para resolver um problema aplicação, em que novas produções são aprendidas
específico. uma nova regra é criada incorponmdo a pelo cxame dc produçõcs existentes.
série de regras para obter uma solução. Assim, se uma O processo de compilação de conhecimento
pessoa enCQOtraumasituaçilo-problemanoestado "a" e envolve dois subprocessos, procedimentalização e
precisa alcançar um objetivo representado por um composição. Na procedimcntalização, o eonheci-
estado 'T', prccisa aplicar uma cadeia de regras memo declarativo é transformado em conhecimento
hierarquizadas. A regra I muda cstado "a" para "b", a de produção. Durante tentativas de resolver um pro-
regra 2, muda "b" para "c" e assim por dianle, até o blema, um elemento de conhecimento declaralivo
estado "f' ser alcançado. Com a prática, ocorre o ocorre repetidamente em relação a um $ubobjetivo processo de chllnking, que criaria uma nova regrn Quando isso acontece, uma nova regra de produção é contendo as coodiçõcs relevantes capazes de promover criada em que o conhecimento declarativo se toma
a mudança da situação '·a" para a situação "f' em um um padrão (o "se eu faço isso") e a parte executada,
único passo. O fatode o problema passar a serresolvido uma ação ("então obtenho isso"). Tal mudança resul-
em um único passo, ao invés de numa série de passos, ta na diminuiçllo da verbalização e aumento do auto-provoca um decréscimo no tempo empreendido para a matismo na resolução do problema. Um outro proce·
resolução do problema. dimcnto na compilação do conhecimento é a eompo-
A teoria da compilação de conhedmenlO de sição, que, basicamente, envolve um corte de produ-
Anderson explica a aquisição de habilidade como çõcs desn«cssárias numa seqüência de produções.
Tcntativas iniciais de resolução de um problema fre- novatos (Anderson, BoyJe e Reiser, 1985). A prática qüentemente envolvem o uso de falsos caminhos e deliberada nem sempre resulta em melhora eontinua estratégias im:orrelas. Porém, >;om a prática na reso- da performance (Ericsson e Staszcwsky, 19&9), o que lução de problemas do mesmo tipo, apn:nde-se a Já havia sido sugerido na noção de plaleau nos dois ignorar as estratégias fracas e produzir soluções csrudosdc Brian c Harter(1897 e 1899)anterionnente correla1;.Asregrasdeproduçãopodemseraindarefi- mencionados. Além disso, diversos estudos nadas pelo aumento da capacidade de generali:z.alj'ão mnstraram uma falta de constância em procedimentos e discriminação, o que leva a uma rapidez ainda cxperls em diferentes áreas, o que indica que a alj'ão maior na resolução de problemas, que ocorrem em experr não corresponde necessariamente a uma
conseqüência da prática deliberada. A teoria da com- maneira singular de resolver prohlema~ pilação de conhecimento é consistente com a teoria Pcsquisadores (e.g. Ericsson e Smith, 1994) de desenvolvimento de automatismo como resultado passaram a considerar a idéia de diferentes tipos de de prática de liberada numa tarefa especifica (ShifTrin expalúe que poderianl ser classificados a panir de duas
c Sehncider, 1977) categorias básicas: e.xpertise de rotina e adaptativa. Apesar de sua complcxidade, diversos Exp<Crlil rotineirO/; são C3p3Z~S d~ r\:Solver problemliS,
problemas foram encolllrados n3 explicalj'ão para a cuja cstnJ.lura é familiar, rápida e dicientem<:nte, m3S expcrrisc oferecida pela segunda geração de teóricos apenas razoavelmente capazes de lidar com situações Algumas situalj'õcs de performance experr inves· novas_ &perlS adaptativos são capazes de inventar tigadas contrariavam aspecto~ do modelo da segunda novos procedimentos a partir desuaexperlisepara lidar
geração (Holyoak, 1994). Por exemplo, experls com situações novas. Assim, a cxpcrlise adaptativa algumas vezes obtêm perfonnance medíocre. Em envolveria um conhecimento conceitual mais profundo cerl3s ár~3s, tal como literalur3 (Scardamalia e do dcminio que seria dependente das condições nas l3ercit~r, 1(94), i!Xperls têm de trahalhar mais que quais se faz o aprendizado (Hatano e lnagaki, 1986) não-experts para completar uma tarefa. Há alguns Em resumo. o aprendizado direcionado para o estudos que >;ontradizem argumentos dos teóricos da entendimento c busca livre para frente sem ser segunda geração sobre como novatos se tomam dominado por um objetivo especifico leva à e.xperlise
e.xperl~. Um estudo de Adelson (1984) descobriu que adaptativa lIu,: pode ser obst:JVada em mlÍsicos de jau novatos tinham melhor memória para detalhes de ou habilidade numérica das crianças que vendem coisas códigos computacionais que experIs. Teorias da na rua. Já o aprendizado dominado por ohjetivos segunda geração sugerem que soluções para especificos, análise de meios c fins c cnvolve a problemas alcançadas por meio de métodos fracos aquisilj'ão dc habilidades muito especificas e precisas (e.g. análise de meios e fins) oferecem Wlla primeira leva a um tipo de capacidade experl voltada para a exp~riência de compilação dc conhecimentos c, rcsoluç!lo de problemas de rotina tal como presente no conseqüentemente. do desenvolvimento da experlise trabalho de músicos clássicos e mat~maticos No entanto estudos na arca de álgcbra_(Owen c academicos. Sweller, 1985; Sweller, Mawer e Ward, 1983) Devido ás dificuldades encontradas para demonstrar3m que a resolulj'ão de problemas nessa explicar aspectos da performance e:tperr usando o ár~a por meio da amilise de meios e fins dificulta a paradigma da compilação dc conhecimento, alguns pcrfonnance em testes transfercneiais subseqüentes pesquisadores têm apontado a necessidade de uma Vários outros dnones da performance <'.:I:[",rl, tal abordagem leórica de tt"Tceira geralj'~o, qu~ Holyoak
como evidenciado pela segunda geração de teóricos (1994) apresentou com o nome de conexionismo foram questionados. As estratégias de busca dos simbólico. Aqui, há uma tentativa de unir idéias experrs não são sempre para frente, a panir do bas~adas em modelos simoolicos (incluindo os de problema, mas para trás, ás vezes, tal como as dos segunda geração) c modelos eoncxionistas. Estes
sugerem redes de unidades processadoras rela- conhecer, de modo eada vez mais preciso, os
tivamente simples e in!erconectadas. Decisões são difcrentes procedimentos de resolução de problemas
baseadas em interações entre conexões simples e cmpregados por novatos, aprendizes de nivcl
múltiplas que operariam em paralclo. A grandc intennediário e avançado. O seguinte passo foi o dc
vantagem desse tipo dc operação, em comparação à tcntar entender todo o processo de aquisição dc
compilação de conhecimento, é que ela explica expertise em termos de processo de aprendir..ado de
melhor a expertise adaptativa, isto é, a perfonnance longo prazo. Se os primeiros estudos se dedicavam a
de tarefas levemente diferentes das situações de descnvolvermodelosdeperfonnanceexpen,agora há
rotina, procedimentalizadas, tal corno previsto no a preocupação com as mudanças no processo de
modclo de Anderson. Entretanto, cmhora haja alguns perfonnancc que ocorrem :i. medida que a pessoa se
estudos que já estão usando esta nova abordagem em transfonna progressivamente de novato em expert.
modelos de inteligência artificial (e.g. COlre!!, 1985; No momento, pesquisas sobre a aprendizagem
Shastri e Aijanagadde, 1990), trata-se ainda de algo humana procedem a partir de diversas dimensões. Por
muito introdutório para ser identificado corno uma exemplo, num nível mais básico, há estudos sobre
tendência capaz dc substituir a abordagcm da mcmória e aprendizagem verbal (Kintsch, 1994) e a
segunda geração. I'ara tan!o, s(lo necessárias mais neurofisiologia dos processos elementares de
pesquisas em diferentes áreas aprendizagem eSquire, 1992). Em Olltra dimL"Tlsão, há
uma tradiçao de esrudos de aprendizagem na ár~a de
inteligência anificial que, por meio da metáfora
Educação e o desenVIIlvimenlo da expertise no longo prazo
Ao incluir domínios semanticamente ricos, li
pesquisa sobre resolução de problemas tomou-se
panieulamlente relevante para as áreas de educação,
aprendizagem e expenise. Em tais domínios. há a
necessidadc de uma grande quantidade de
infonnaçõcs apriori para que se resoh'a um problema
(nha~kar e Simon, 1977). Domínios ricos podem ser
fonnais ou não fonnais, de acordo com o tipo de
encaminhamento de solução de problema exigido. Por
exemplo, a árca de geometria é considcrada um
domínio scmântico rico fornlal por envolver um alto
grau de conhecimcnto cspecífico c depender de
princípios lógicos consensuais. Em contraste, a
psicologia é um domínio rico não fonnal. onde pode, por exemplo, havcr amplas divergências sobre o
tratamento de sintomas neuróticos sc comparadas as perspectivas de comportamentalistas e psicanalistas
(Larkin, 1981). Ambos têm conhecimento sobre o
assunto, mas não têm princípios consensuais.
A partir dos anos ~tenta, estudos começaram a
~oncentrar-se nas estratégias de resolução de
problemas e estruturas de conhecimcnto dc novatos c expens numa \"aried~de de dumínius.lslO possibilitou
computacional, tentam entender como o cérebro
humano processa dados (Scidcnberg e McClelland,
1989). Ilá tambem uma série de estudos na área de
aprendizagcm e instrução cujo objetivo é criar
ambientes que otimizem o processo de aprendizagem.
Conhecimentos derivados da pesquisa sobre cxpertise
têm sido utilizados aqui com o objetivo de fazer com
que mais pessoas consigam atingir níveis mais altos de
competência em áreas espccíficas. É importante
cnfatizar que nada há nas pesquisas sobre cxpertiseque
indique ser tal capacidade especifica somente de wn seleto grupo de pessoas. Pelo contrário, quanto mais se
esruda tais processos, mais forte é a crença de que
qualquer pessoa podc tomar·se um expert. Por cxcmplo, um mecanismo fundamental para
a aquisição de experrise, a retenção baseada em pa.
drões, refletc li aquisição de conhecimento integrndoe
bem organizado que propicia urna estrutura para a representação que vai além de características supcrlícia·
is. Assim, para a experri.\·c se desenvolver, o conheci·
mento deve ser adquirido de um modo conectado e ar·
ticulado que pennita tanto inferência e raciocínio,
quanto o acesso a ações procroimentalizadas. O co
nhecimento, organizado dcssa fonna, propicia um esquema para o pensamento e atividade cognitiva
131
como um todo. O conhecimento estruturado deriva de um ambiente de aprendizagem que ofere<:C oponuni
dadcs para a resolução de problemas, raciocínio analógico, inferência, interpretação e transferência de
aprendizagem para novas situaçÕt:s que requerern capacidade adaptativa (OlaStr, 19%). Durante o curso
da aprendi7..agem expert, ocorrCTn processos de ideali· zação e elaboração que fortalecem a estrutura do conhecimento c seus agrupamentos (c/llmh) e padrões (Simollton, 1996). Conhecer a estrutura
desses processos implica usar o quejâ conhecemos
sobre a experli$e e competência humana em geral,
para aplicá-la na educação
Glaser (1996) sugere que o processo de aquisiçãodecapacidadeexpertenvolveumamudança gradual na responsabilidade pelo processo de aprendizagem, inicialmente baseada em apoio
externo. tomando-se cada vez mais intemalizada e auto-regulada a medida que a e:cperlisl! se desenvolve
e a performance se aprimora. Tal idéia encontra apoio
numa grande quantidade de estudos empíricos sobre o
assunto (e.g. Eriesson e co/s. 1993; Sloboda c cols .•
1996; HaJ1am, 1997, Galvão, 2000a). O processo de
formação do experl pode ser pensado em relação a três
fases interativas: apoio externo, transição c
auto-regulagem. A fase de apoio externo diz re:;peito
a uma estrutura ambiental na forma de professores,
pai, mlle, escola que oferece apoio não somente em
termos fisicos (suporte material) como também na
forma de pres5ÕeS para que uma rotina dc estudos scja
mantida. A fase: de transição é caracterizada por um
decréscimo da pressão externa e aumento na organil.aç!lo do aprendizado. especialmente em termos de orientação de estudo individual deliberado
Finalmente, há a fase de auto-regulagem, em que o aprendiz exerce razoável controle não somente sobre
o ambiente de aprendi:wgem, como também sobre os
processosdeorganizaçãodomaterialaseraprendido. A auto-regulação envolve a habilidade de
interrogar. negociar c testar uma representação de
modo a pcTIllitir que a aprcndi:wgem ocorra e novos
níveis possam ser alcançados. Parn tanto. é necessário estabelecer objetivos ou normas de estudo, controle
sobn: o próprio progresso,usandocslrntégias tais como
"" .. monitoramento, elaboração e gerenciamento de esforço
(Como, 1989). atraso de graüficaç.llo. auto-instruçãoe auto-avaliação (Zimmcrman, 1989). Tais aspectos
dctenninarãooulJasdecisõcs, tais como conlÍnuar ou
não alocando tempo para o estudo específico. bem como mudanças nas estratégias de aprendi/.agem (Thiede e DWlJosky, 1999). Em geral, pessoas que
alcançam 3 experfise foram estudantes auto-regulados
que tonlaram para si grande parte da responsabilidade
sobre seu processo de aprcndi:wdo em tennos de
metacognição. comportamento e motivação. A
auto-regulação pode ser caracterizada pelo uso de
estratégias tais como organi:wção c tr.lrlSfonnação de
infornlação, seqüenciamentode aprendizagem, busca
de informação,cnsaio c prática eeslrntégias de auxílio
de memória. A percepção positiva sobrc a allto-cficâcia
é um componente fundamental do aprendizado auto-regulado quc pan:cccstarrclacionado a melhores estratégias de aprendizagem (Kurtz e Borkowsky,
1984). melhor comportamento de automonitoramento
(Kuhl. 1985), COtTelação positiva com a persistência na
tarefa (Zimmerman c Ringle, 1981), escolha da tarefa
(Bandura e Sehunk, 1981; Zimmerman. 1985),
atividades efetivas de estudo (Thomas, Iventosch e
Roh\\"er, 1987», aquisição de habilidade (Sehunk,
J984)e resultados acadêmicos (Thomas e co/s. 1987).
A auto-regulação toma-se mais fácil quando os e:r:perlS
desenvolvem automatieidade nos processos mais
básicos. integrando as unidades da performance, pois o
tempo de estudo pode ser aplicado aos processos de
nivelelevado.
Além da auto-regulação, há vários outros
aspectos tambt.'tn importantes na aprendi:wgem experl
tais como uUlofeedbuck e feedbuclc externo. O aurofeed/xlck envolve uma capacidade para monitorar aspectos específicos do aprendi:wdo, tendo como
parâmetro referenciais estáveis representados
internamente, enquanto o feedback externo é o tipo oferecidoporprofessoreseoulrnspessoascompetentes
na área especifica. Entre as funções dofeedback
externo está a de proporcionar o aprendizado de
técnicas efetivas de estudo individual deliberado, que
incluem monitorar o estudo individual, aperfeiçoando
técnicas e desenhando situações que permitam a
auto-análise e o alcance por conta própria de níveis desenvolvimento de outras estratégias de apren-mais elevados de perfocmance. Em outras palavrns, dizagem continuada. Hoje, há uma forle tendéncia de aqui estudantes apremlem a aprender (Galvão 2000a). concentrar pesquisas no procçsso de estudo individual A capacidade pard obter aulofeedback varia de acordo do expt:rI em áreas espedficas e utilizando abordagens com a natureza do material apreendido e o nível de mais ecologicamente válidas. Simplesmente acom-domíniojáalcançadopeloaprendizdeexpert.Músicos, panhar o modo como um fisico resolve um problema
por exemplo, para \:onseguirem julgar a própria específico não e suficiente. É necessário entendê-lo em pcrfocmance, têm de ouvir o que tocam para comparar sua rotina diária: que livros lê, como lê, que tipo de sua performance com um padrão interno idealizado ou preocupação o acompanha, o que o motiva ou padrão externo (interpretação de 001 outro músico) que desmotiv3, a cOOlpelÍtividade no ambiente de trabalho, sirva de parâmetro, além de monitorar aspectos em que momento está da vida profissional, que tipo de kinoesthelicos inerentes á perfonnance (Galvão e ambições ainda guarda. Com este tipo de trabalho
Kcmp, 1999). Slohoda (1996) argumenta que a focalizando diferentes níveis de experiêneia pro-imitaçào da expressividade e algo temicamente dificil, fissional, é possível oferecer um mapa não só sobre que requer do aprendiz o aprendizado de técnieas eficientes de estudo individual, mas também
discriminações finas entre passagem musical sobre o elhos geral do qual o expert fuz parte. intencionada e mudanças em deÚllhes 4ue gerarão a individualidade da expressão. Para que tal processo
ocorra. é necessária a transformação da informação Expertise e criatividade: mais sobre naturela x ambiente numa representação mental na forma de padrões que ineorporam habilidades procedimentais. À medidaql1e Discutiu-se, até agora, a experlise como a experiência 3wnenta, aprendizes tomam-se cada vez fenõmeno geral de caracteristicas relativamente
mais eficientes na combinação e elabora~ão destes homogêneas. Há, porém, o lato de que experts na elementos de conhecimento. Neste contexto, uma mesma área de atuação exibem características
imponante questão para a aprendizagem diz respeito a particulares que ocorrem como conseqüência de como, durante o estudo individual delilx:rddo, essas diferenças individuais constantemente subexplor.ulas
estruturas de COllhecimento e suas habilidades pela literatura especializada. Simonton (1996) sugere associadas são aprimoradas. As regras ccslrutégias que que, em cada domínio, haja um grupo de experlS que, experu usam em seu processo de aprendizado embora não necessariamente estando no topo da dependem de contextos específicos e derivam de wna tradição performática do dominio, além de possuírem capacidade de diagnosticar problemas e decidir sobre conhecimento e habililidade caracteristicas da
asme\horesformasderesolvê-los(Galvão,2000b).No experlise, possuem também uma capacidade pouco entanto, mesmo considerando que estratégias comumpardinventareadicionarnovasrepresentaçõcs dependem de um cuntexto, isto não sib'flifica que e conhecimentos que chegam, em alguns casos, a professores não possam instruir alunos sobre revolucionar o domínio. Talvc"L este seja o easo de Reti estratégias gcrdis de aprt:Jldizagem. e Nicmzovich no xadrez, Kandinsky na pintura e
A aquisição e manutenção da experlise Schocmberg na cumposi<,:àu musical, que tiveram um envolvem, portanto, a ineorporação de um repertório de papel inovador em suas respectivas áreas. Simonton estra.tégias de aprendizado,ondeo aprendiz sai de uma sustenta que esse tipo de criatividade envolve situação de relativa dependência do ambiente externo e simplesmente uma capacidade particularmente vai-setomalldocada."czmaiseonfiante emsuaflTÓpria eompelCTlte de rcconhcel"T e resolver problemas por capacidade de automonitoramento. Depois que meio de buscas de problemas-espaços múltiplos. aprendizcssetomam experlI, a situação de aprendizado Assim, há a possibilidade de produzir trabalho criativo independente torna-se ainda mais crucial e envolve o explorando o espaço de representação dos problemas,
m ,~
instrumentos e estrategias de resolução, não se pm:w. Um exemplo constantemente evocado (e.g. limitando somente àquilo que o presente estado de Sloboda, 19~5, Howe, 1996), justamente pela desenvolvimento de uma área apresente. Tal foi o caso polêmica que provoca é o do compositor Mozart
d~ Schocrnbcrg, 'lu\: fl'P'-'TISOll a:; leis da hamlOllia Entre scu~ diversos feitos \:slão o de que começou 11
tradicional e criou um sistema dodecafônico que compor música aos quatro anos de idade, aos seis já
pennitiu muitas dimensões de redirecionamento para 11 conseguia notável desempenho no violino enocravoe
composição musical limes de chegarã adolescência foi clIpazJt:esc:reverde
Se, por um lado, experlJ são geralmente vistos cor 11 partitura completa da obra Miserere. do
como indivíduos criativos particulannente hábeis para compositor Aliegri, tendo-a ouvido somente duas 3cessar, organizar e integrar conhecimentos. por outro, vezes. As explicações mais comuns para o fenômeno hã elementos implícitos na atuação do expert que Mozartsãodequesuacapacidadeperfonnáticainieial podemrepresentarwnabarreiraaodesenvolvimentoda era um mistcrio só compreensívcl sc accitannos a l-TÍatividade. Diversas pesquisas (e.g. Adelson, 1984; idéia de que cle nasceu sabendo_ Trata-se, portanto, de Fren.>ch e Sterm:berg, 1989; Hecht e Proffitt, 1995; talento inato, talve<: herdado dc seu pai, Leopold Galvão, 2000a) têm demonstrado uma tendência de Mozan, também músico. Apesar da força que a expcrts se tomarem muito rigidos em relação a eertos tradição cultural ocidental deu a tal ponto de vista, pontos de vista ou modos de fazer ccisas, de forma que psicólogos que pesquisam a experrise oferecem encontrammuitadifieuldadeparaobservareapreender explicações alternativas para o comportamento situações a partir de perspectivas diferentes daqucla.~ musical de Mozan. Como lIowe (19%) sustenta, os com 3S quais estilo habituados. Adelson (1984) usou feito;; 3cim3 descritos, 3inda que notaveis, podem ser este argumento para explicar o fato de novatos compreendidos a partir de argumentos que deixem de apresentarem melhor memória de códigos com- 13do aspectos misteriosos e sublimes. Por ext:rllplo, put3cionais que experts. Tal rigidez t.1mbém pode estar como div~r.';as pesquisas sugerem (e.g. Ericsson e presente no próprio processo de estudo individual eols. 1993; Sloboda e cols_ 1994; Hallam, 1997), o del iberado. Pesquisa anterior sobre estudo individual desempenho instrumental inidal de Mozart niio estava deliberado de mÍlsicos profissionais (Galvão, 2()()()a) completamente em discordância com o que seria indicou que mÍlsicos experientes não se preocupam em csperado de uma criança daqucla idade que recebeu aprimorar e.>trntégias de aprendi.-;agem. Desenvolvem treinamento musical imensivo. Mozart começou a um rt:pertório de estratégias de resolução de problemas envolver-se com composição musical muito jovem, que se toma automlítico e permitc poueo espaço para no entanto suas primeiras composições mais inovações. Em contraste, profissionais em início de elaboradas só começaram a aparecer depois de mais carreira sào mais abertos a inovações e questio- de dez anos de estudo individual intensivo e namentos sobre métodos de aprt;'lldiL.agem. dc1ibcrado (Hayes, 19!! I). QU31l10 à sua capacidade de
Explieaçõcs para a expert~\'e têm sido subsi- memorização, trata-st: de algo impressionante, mas diadas por modelos computacionais que têm obtido convincentemente clarificado pela pesql.lisa psi-algum sucesso ao simular aspectos da cológica sobre memória. Diversos estudos (DeGroot, humana, mesmo em domínios artísticos 1966; Chi e Ceci, 1987; Howe, 1989) indicam que música e artes plásticas. Mas é realmente suficiente cxperlS possuem alta capacidade de memorização d", para explicar a natureza variada da expertise tal como materi31 espedtíco de sua área de estudo. pm>entc em, por ",xemplo, Moart, Bach, Picasso e Pesquisadores, que não concordam eom a idéia Joyce? 1Iá uma tendeneia entre pcsquisadorcs·em detalentoinatoparaexplicarocasoMozart,baseiam-se expertise d", rnfatiz.ar a capacidade do experr como em uma variedade de argumentos. Por exemplo, para aprendid3, iSlOé, como conseqüência de condições que o argumento ''talento'' seja completo, é preciso adequadas de aprcndi7--11gem sustentadas no longo especificar sua forma, como sua presença é detectada e
modocomo opem. Como não há infonnaçàouesse tipo, área ainda tem muilllS limitações cuja superação parece argumentos aqui acah.am tomand(}-sc circulares. Howe depender de uma abordagem mais interdisciplinar. A (1996) tem o cuidado de reconhecer que há a própria pesquisa do presente autor sobre expenise
possibilidade de certos indivíduos excqx;ionais lerem mu,ical (Galvão, 2000a) mostrou que, na vida real, a
nascidocomcaractcrísticasespeciaiscontribuindopara aprendizagem expert resulta de interações entre
suas habilidades. No entanto para explicar o caso situações não consideradas nem pelas ainda incipientes Mozart dessa fomla, é preciso estabelecer de modo teorias de terceira geração ou simbólico-çoncxionistas
prceisodoquc sc constituem tais características. A idéia O aprendizado em algumas arcas parece influenciado, de que uma habilidade pode ser diretamente herdada entre outras coisas, por ro::;poslas afetiva", isto é, por um
tamnem não e convincente,já que gcnes não funciomun tipo de envolvimento emocional com o produto li ser como um processo de "tudo-ou-nada" implícito na apreendido. bto talvez exemplifique wna situação ainda
visão genera1i7..ada, emtxm incorreta, de que uma pouco investigada sobre a interação entre enlOção e
habilidade pode simplesmente ser herdada de um cognição. O éstudo individual deliberado, que muitos
parente. pesquisadores colocam como scndo o mais importante
Tais argumentos, apc.sar de seu aparente rigor aspcçto da experli.se, objetiva o alcan~ de respostas científico, também não propõem respostas convinccntcs automáticas. No entanto o mooo como expel1s abordam
para as diferenças individuais entre expens. Foi problemas parcçe ser também automático. Isto é, mencionado anteriormente ql.lC wna conseqüência da possuem uma espécie de repertório de domínio expel1i.scé urna eerta rigidez de ponto de vista. ExfX'I1S se especifico parcialmente adaptado a diferentes problemas
tomam tiio envolvidos com uma perspectiva que não e uma capacidade de monitorar a adequação de
conseguem aceitar suas limitações (Stemberg, 1996) respostas,modifieandoestratégiasdeaprendizagempara
Isso pan.-ce ser verdade também para os expel1s que alcançar objetivos freqUentemente reavaliados à medida csrudam apens. Tlá urna tendência aqui d~ huscar ou que o aprendi7.ado pmgrid~. Isso não significa. que
interpretar evidência que dê sustClltação às nossas experts sempre resolvam problemas eficientemente. crenças, mesmo em face de dados indefinidos ou Pelo contrário, em meu próprio estudo, ficou daro que
contraditórios. Pesquisadores em e.xpertüe. tendem a objetivos constantemente eram apenas parciahnente minimi7..ar o papel das diferenças individuais no atingidos, o que indica uma limitação no repertório de
desenvolvimento de habilidades e enfatizar o papel da resolução de problemas. Isto é particulanncnte relevante ambientação. Talvez., porquc. como diz Sternbcrg, na sc os problemas forem do tipo··mal-deJ"inido". Aescclha
base desta lTrnça esteja a idéia politicamente co!Tt1a de de estmtégias de estudo individual, no caso de meu
que, se trabalhannos o suficiente, podemos ser o que estudo, era também influenciada pelos signifi~ados
quiscnnos, o que representa um legítimo ideal de particulares que os cxperl.~ atribuíam à siruação-igualdade. No entanto a igualdade de oportunidade não problema. Aqu~ há a impressão de que tais significados
pode ser confundida com igualdade de habilidade. A são cognitivos somente ate lUTI el'ltO ponto, já que maioria das pesquisas nessa área dá sustentação á idéia parecem interagireom respostas intuitivas sobre a~ quais de diferenças individuais em habilidades, embora haja sabemos muito pollCt,. TalveT isto implique, como muito confusão sobre que proporção dessa:; diferenças e Kemp (1996, 1(97) mantem, investigar o conha:imt:Jlto
ambiental, inata ou interativa também em um outro nível, cuja nalllrew é mllito mais
sentimental que cognitiva.
Finalmente, é importante enfatizar que, para
Conclusão além da controvérsia natureza/ambientaçào, a pesquisa sobre a expel1ise ohjctiva o entendimento de
EmlXll1l a~ pesquisa~ M>bre exr.erli.\e tenham sido trajetórias de aprendizagem. Isto envolve perguntas capazes de oferecer algumas interessantes cxplicaç&s tais como: qual a amhientação do p-xf"'n quando
sobre as maneiras corno novatos se tomam "xp"rl.\·, a novato'! Por que se envolveu com aquela área
espedfica?Quetipodepapelteveescola,professorcs, pcssoassignifícantesem sua vida? Qual sua rotina de
estudo? Que tipo de desaíios e rrustrações teve? Que
momentos foram especialmente importantes em sua
vida tanto em termos pessoais quanto de seu domínio
de experlise? Como é a rotina de estudo individual do
experl em teonos de sua estrutura e organização? Que
estratégias de estudo individual são comuns a diversos
tipos deexperlise?Que estratégias de uma area podem
ser transferidas para outra area? A resposta a tais
questõesimplicarácontribuiçõesparaoeonhecimento
em wna série de dimensões. Por exemplo, poderemos
fonnar melhores médicos, professores, músicos e
fazer com que musicos aprendam a partir da
experiência de médicos e com que professores
aprendam com músicos. Podemos também
desenvolvere aprimorar métodos de estudo individual
que facilitem a aprendizagem e entender de modo
integrado processos motivacionais de longo prazo.
Em resumo, entender as diversas dimensões da
aprendizagem experl possibilita a compreensão não
somente de processos de aprendizagem, mas também
da estrutura de funcionamento da mente humana
como um todo.
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Recebido em: 1911112001
Aceito em: 2510412003