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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Élio de Assis Políticas públicas referentes à recuperação de aprendizagem implantadas na rede estadual de ensino de São Paulo: o que pensam professores dos anos finais do ensino fundamental DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO SÃO PAULO 2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Élio de Assis

Políticas públicas referentes à recuperação de aprendizagem implantadas na rede

estadual de ensino de São Paulo: o que pensam professores dos anos finais do ensino

fundamental

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

SÃO PAULO

2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Élio de Assis

Políticas públicas referentes à recuperação de aprendizagem implantadas na rede

estadual de ensino de São Paulo: o que pensam professores dos anos finais do ensino

fundamental

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Tese apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título de

Doutor em Educação: Psicologia da Educação

sob a orientação do Prof. Dr. Antonio Carlos

Caruso Ronca.

SÃO PAULO

2015

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Banca Examinadora

_______________________________

Prof. Dr. Antonio Carlos Caruso Ronca

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP

Orientador

______________________________

Prof. Dr. André Figueiredo Rodrigues

Universidade Estadual Paulista – UNESP/Assis

_______________________________

Profa. Dra. Marina Pinheiro Fortunato

Faculdades Guarulhos - FG

_______________________________________

Profa. Dra. Mitsuko Aparecida Makino Antunes

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP

_____________________________________

Profa. Dra. Wanda Maria Junqueira de Aguiar

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP

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A questão escolar interessa-me muitíssimo.

Antonio Gramsci, 1931.

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Dedico esta tese a minha companheira amada

Márcia Batista da Silva Assis, que Deus colocou,

generosamente,na minha vida;

Para minha filha Eloah Batista da Silva Assis, que

inicia sua jornada no Ensino Fundamental em escola

pública no momento que concluo a tese;

A minha mãe Alzira Rodrigues de Assis que, com

bravura, honestidade e amor, serve de exemplo para toda

família;

Ao meu pai Eliziário de Assis (in memorian);

Ao meu cunhado, amigo e irmão Professor José

Carlos da Silva (in memorian), que me apoiou no início

do magistério.

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AGRADECIMENTOS

Terminada a tese afirmo que cresci intelectualmente, mas aprendi mesmo o que é ser

melhor professor com o querido Prof. Dr. Antonio Carlos Caruso Ronca que me orientou com

“amorosidade”.

À Profa. Dra. Zilma de Moraes Ramos de Oliveira pelas contribuições no exame de

qualificação.

Ao Prof. Dr. André Figueiredo Rodrigues pelo apoio incondicional.

À Profa. Dra. Mitsuko Aparecida Makino Antunes. Suas aulas envolventes motivaram

ainda mais este trabalho.

À Profa. Dra. Wanda Maria Junqueira de Aguiar. Nossa querida Ia.

À Profa. Dra. Marina Pinheiro Fortunato pela valiosa contribuição.

Aos professores do Programa Educação: Psicologia da Educação pelo acolhimento e

aprendizagem nestes anos de Mestrado e Doutorado.

Ao Edson, Secretário do Programa, que sempre se prontificou em ajudar.

Às amizades que construí nas aulas e nos cafés. As conversas com os colegas de classe

sempre foram boas e divertidas.

Aos professores, professoras e escolas participantes da pesquisa.

Nestes anos de magistério, meus amigos funcionários de escola, professores,

coordenadores, diretores e supervisores sempre me motivaram para conclusão desta etapa da

minha vida profissional. A eles agradeço profundamente! A eles devo, ainda, este trabalho.

São eles que com sutileza e ousadia mantêm a escola pública.

Aos meus familiares que compreenderam minha ausência em muitos momentos e que

sentem orgulho de ter o primeiro “Doutor” na família.

Ao contribuinte que possibilitou o financiamentodesta tese através do programa

“Bolsa Mestrado e Doutorado”, instituído pela Secretaria de Estado da Educaçãode São

Paulo.

As minhas alunas e alunos de ontem e de hoje.

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POLÍTICAS PÚBLICAS REFERENTES À RECUPERAÇÃO DE APRENDIZAGEM

IMPLANTADAS NA REDE ESTADUAL DE ENSINO DE SÃO PAULO: O QUE

PENSAM PROFESSORES DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

RESUMO

O propósito desta pesquisaé entender como os projetos de recuperação de aprendizagem e as

questões relativas ao direito à aprendizagem têm sido apreendidos por professores dos anos

finais do ensino fundamental da rede pública estadual de São Paulo. Para isso,pesquisamos

nas resoluções instituídas pela Secretaria de Estado da Educação o tema Recuperação de

Aprendizageme constatamos que em uma década foram implementadas nove resoluções que

tratam sobre o tema. Entrevistamos professores que ministram aulas nos anos finais do ensino

fundamental e, por meio dos procedimentos de análise e interpretação de dados denominado

Núcleos de Significação (AGUIAR; OZELLA, 2013), concluímos que as políticas públicas

em educação na rede estadual de São Paulo induzem professores ao modelo de escola seletiva

e excludente quando reforçam que a simples melhoria dos índices de avaliação externa

representam a Melhoria da Qualidade da Educação. Constata-se que não existe um projeto de

educação voltado para as classes populares no Estado de São Paulo, mas sim um modelo de

organização do ensino fundamental dividido em três etapas que promove reprovações,

exclusão no interior da escola e aprofundamento das desigualdades sociais, econômicas e de

escolarização. Os pretensos projetos de recuperação de aprendizagem configuram-se como

álibi das administrações públicas em educação na rede estadual de ensino de São Paulo para

justificar a ineficiência do modelo adotado, assim, culpabiliza alunos, professores e

comunidade pela não garantia do direito humano à educação. É urgente romper com tais

políticas públicas excludentes que estigmatizam crianças e jovens, como se a diferença social

e de escolarização fosse um movimento natural em uma sociedade harmoniosa. Defendemos

políticas públicas centradas na formação política dos professores e na percepção das relações

de poder que constituem a realidade histórica das sociedades e da educação.

Palavras-chave: Direito à Educação; Núcleos de Significação; Políticas Públicas em

Educação; Psicologia Sócio-Histórica; Recuperação de Aprendizagem.

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STATE OF SAO PAULO POLICIES UPON RECUPERATION OF LEARNING IN

PUBLIC SCHOOLS: THE THOUGHTS OF MIDDLE SCHOOL TEACHERS ABOUT

THEIR IMPLICATIONS.

ABSTRACT

The goal of this research is to understand how middle school teachers evaluate the

recuperation of learning programs implemented by the Department of Education of Sao Paulo

State, as well as to know what they think about issues concerning students` right for

education. In order to do so, we have searched the state law on education and found out that

nine resolutions on Recuperation of learningwere implemented within a decade. Besides, we

have interviewed middle school teachers to understand their view upon these issues. By

studying all the data collected, analyzed by the means of core meaning methodology

(AGUIAR; OZELLA, 2013), we can say that state policies for public education has misled

teachers towards a selective and excluding school by stating that better performance of

students on external assessments, by itself, can be read as representative of Higher Quality

Education. We verify that the State of Sao Paulo does not have an education project for lower

class students, but a model of basic education divided into three different levels, which

promotes students` failure and exclusion inside the school. Therefore, an educational system

that deepens the socio-economic and educational inequalities. The so-called learning

recuperation projects are the alibi of public school administration of the state school system

for justifying the inefficiency of the model. Thus, blaming students, teachers and community

by not ensuring the human right to education. It is urgent to break with supposed public

policies that stigmatize children and teenagers, as if social and educational differences were a

natural movement in a harmonious society. We believe in policies for public school based on

political education of teachers and on the perception of power relationship, which constitutes

the historical reality of society and education.

Keywords: Right for Education; Core Meaning; Public Policies; Socio-historical psychology;

Recuperation of Learning.

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LISTA DE SIGLAS

ACT – Admitido em Caráter Temporário

ANDE – Associação Nacional de Educação

ANPED – Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação

APEOESP – Associação dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo

ATPC – Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo

CAQi – Custo Aluno-Qualidade inicial

CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade

CEB – Câmara de Educação Básica

CF – Constituição Federal

CIE – Centro de Informações Educacionais

CIMA – Coordenadoria de Informação, Monitoramento e Avaliação Educacional

CNE – Conselho Nacional de Educação

CONAE – Conferência Nacional de Educação

EaD – Educação a Distância

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

EF – Ensino Fundamental

EM – Ensino Médio

ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

FIES – Financiamento Estudantil

IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

IDESP – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica de São Paulo

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

PA – Professor Auxiliar

PBF – Programa Bolsa Família

PDT – Partido Democrático Trabalhista

PDS – Partido Democrático Social

PFL – Partido da Frente Liberal

PIB – Produto Interno Bruto

PISA – Programme for InternationalStudentAssessment - Programa Internacional de

Avaliação de Estudantes

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Pnad – Pesquisa nacional por amostra de domicílios

PL – Projeto de Lei

PNE – Plano Nacional de Educação

PRONATEC – Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego

PROUNI – Programa Universidade para Todos

PT – Partido dos Trabalhadores

PUCSP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

RC – Recuperação Contínua

RI – Recuperação Intensiva

SARESP – Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo

SE – Secretaria da Educação

SEESP – Secretaria Estadual de Educação de São Paulo

UNICAMP – Universidade de Campinas

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LISTA DE TABELAS

Tabela I – Analfabetismo na faixa de 15 anos ou mais – Brasil – 1900/2000 26

Tabela II – Taxas de rendimento no ensino fundamental – 2011 – Brasil 46

Tabela III – Taxas de rendimento no ensino fundamental – 2012 – São Paulo 46

Tabela IV- Aprovação/Abandono no ano final do EF – Brasil 1996/2011 47

Tabela V - Reprovação – Anos iniciais e anos finais do EF – Brasil 47

Tabela VI - Reprovação – Anos iniciais e anos finais do EF – São Paulo 47

Tabela VII- Ensino Fundamental 8 Anos – Rede Estadual de São Paulo - Taxas

de Reprovação por Série 1996 – 2012

48

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LISTA DE QUADROS

Quadro I. Síntese da Resolução SE nº 2/12 53 00

Quadro II. Artigos 4º, 5º, 6º e 7º da Resolução SE nº 53/14 56

Quadro III. Escola Caminho – Tipo de atendimento e número de alunos 70

Quadro IV. Escola Caminho – Quadro de profissionais da educação 71

Quadro V. Escola Caminho – Estrutura física 72

Quadro VI. Escola Alegria – Tipo de atendimento e número de alunos 73

Quadro VII. Escola Alegria – Quadro de profissionais da educação 74

Quadro VIII. Escola Alegria – Estrutura física 75

Quadro IX. Professores entrevistados - Escola Caminho e Escola Alegria 76

Quadro X. Pré-Indicadores– Entrevista 1 – Professor Antonio – Matemática 81

Quadro XI. Pré-Indicadores – Entrevista 2 – Professora Beatriz – Português 90

Quadro XII. Pré-Indicadores – Entrevista 3 – Professor Carla – Matemática 96

Quadro XIII.Pré-Indicadores – Entrevista 4 – Professora Diana – Português 100

Quadro XIV.Núcleo de Significação - A escola não cumpre seu principal

objetivo que é a aprendizagem dos alunos e os professores reafirmam a

concepção de escola seletiva

108

Quadro XV.Núcleo de Significação – O alicerce da exclusão e das

desigualdades no interior da escola: A reprovação escolar para “esses que

não tem jeito”

113

Quadro XVI. Núcleo de Significação. As formas de recuperação da

aprendizagem oferecidas aos alunos na última década não apresentaram

resultados. A recuperação contínua com apoio do professor auxiliar como

esforço da escola e dos professores para garantir à aprendizagem dos alunos

118

Quadro XVII. Núcleo de Significação. Do discurso pelo direito à educação

ao abandono da escola: O professor indignado “parece que somos o

problema” e os alunos “que não estão sabendo aproveitar”. O professor não

se reconhece e não reconhece o aluno como cidadão de direitos

122

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APÊNDICES

1. Roteiro para entrevista 150

2. Transcrição da entrevista com o professor Antonio 152

3. Transcrição da entrevista com a professora Beatriz 162

4. Transcrição da entrevista com a professora Carla 169

5. Transcrição da entrevista com a professora Diana 173

ANEXOS

1. Resolução SE nº 53/14 180

2. Resolução SE nº 73/14 185

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 16

Apresentação 18

CAPÍTULO 1

DIREITO À APRENDIZAGEM E UNIVERSALIZAÇÃO DO ENSINO 22

1.1 O “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”: educação pública, laica e

obrigatória

22

1.2 A Constituição Federal de 1946: embates ideológicos na Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional. Lei nº 4.024/61

26

1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: manutenção do poder e

negação de direitos

29

1.4 A redemocratização do Brasil e a Constituição Federal de 1988 32

1.4.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394/96 36

1.4.2 O Plano Nacional de Educação. Lei nº 13.005/14

38

CAPÍTULO 2

O PROCESSO ENSINO APRENDIZAGEM NA PERSPECTIVA DA

GARANTIA DO DIREITO À APRENDIZAGEM

42

2.1 Sobre estudos que tratam do tema “Recuperação de Aprendizagem” 42

2.2 A persistência da reprovação escolar e a negação do direito à educação 45

2.3 A reorganização da progressão continuada e os mecanismos de apoio escolar. A

proposta atual de Recuperação da aprendizagem na rede pública estadual de São

Paulo

49

CAPÍTULO 3

MÉTODO

As contribuições da teoria sócio-histórica para compreensão do fenômeno educativo 58

3.1 A escolha metodológica: A pesquisa de abordagem qualitativa 66

3.2 O percurso de entrada no campo de pesquisa: as escolas e os professores

participantes

69

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CAPÍTULO 4

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS E INFORMAÇÕES

4.1 Procedimentos de análise de dados e informações 79

4.2 Levantamento dos Pré-Indicadores e Indicadores 80

4.3 Núcleo de Significação 1- A escola não cumpre seu principal objetivo que é a

aprendizagem dos alunos e os professores reafirmam a concepção de escola seletiva

108

4.3.1 Análise do Núcleo de Significação 1 110

4.4 Núcleo de Significação 2 - O alicerce da exclusão e das desigualdades no interior

da escola: A reprovação escolar para “esses que não têm jeito”

113

4.4.1 Análise do Núcleo de Significação 2 116

4.5 Núcleo de Significação 3 - As formas de recuperação da aprendizagem oferecidas

aos alunos na última década não apresentaram resultados. A recuperação contínua

com apoio do professor auxiliar como esforço da escola e dos professores para

garantir a aprendizagem dos alunos

118

4.5.1 Análise do Núcleo de Significação 3 120

4.6 Núcleo de Significação 4 - Do discurso pelo direito à educação ao abandono da

escola: O professor indignado “parece que somos o problema” e os alunos “que não

estão sabendo aproveitar”. O professor não se reconhece e não reconhece o aluno

como cidadão de direitos

122

4.6.1 Análise do Núcleo de Significação 4

124

CONSIDERAÇÕES FINAIS

127

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 137

APÊNDICES

150

ANEXOS

180

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16

INTRODUÇÃO

Há mais de vinte anos trabalhando na área da educação, conheci experiências

significativas das escolas para garantir a aprendizagem dos alunos, mas, na maioria dos casos,

conheci muitos problemas enfrentados por estas escolas por não termos um projeto

educacional consistente e políticas públicas estruturantes que imprimam o sentido de urgência

que a educação pública merece.

As políticas públicas em educação na rede estadual de ensino de São Paulo têm

priorizado os denominados projetos de “Recuperação de Aprendizagem” como instrumento

para garantir o direito à aprendizagem das crianças, adolescentes e jovens. Foi este fato que

me motivou a estudar como os projetos de recuperação de aprendizagem e às questões

relativas ao direito à aprendizagem têm sido apreendidos pelos professores dos anos finais do

ensino fundamental.

Por dois motivos limitaremos este estudo àrede estadual de ensino de São Paulo: pela

importância da rede paulista no cenário brasileiro e por ter construído minha carreira

profissional nesta rede de ensino, de professor a Supervisor de Ensino.

Priorizaremos estudos teóricos e marcos legais sobre a consolidação do direito à

educação e universalização do ensino no Brasile as políticas públicas referentes aos

denominados “Projetos de Recuperação” na rede estadual de ensino do Estado de São Paulo

naúltima década. Para alcançar este propósito este trabalho será estruturado em seis capítulos.

No primeiro capítulo Direito à aprendizagem e universalização do

ensinodescreveremos comoo direito à educação e a universalização do ensino foram se

solidificando como conquista de direitos sociais nas Constituições Federais e nas Leis de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

No segundo capítulo O processo ensino aprendizagem na perspectiva da garantia do

direito à aprendizagemteceremos breves comentários sobre estudos recentes que abordam o

tema recuperação. Descreveremos os projetos de recuperação implantados na rede estadual de

ensino de São Paulo na última década e o projeto atual denominado “Professor Auxiliar”.

No terceiro capítulo trataremos do método que direciona este trabalho. Apresentaremos

como a teoriasócio-históricapode contribuir para a compreensão do fenômeno educativo e a

transformação da realidade social e escolar. Descreveremos a escola e os professores

participantes desta pesquisa e elaboraçãodo roteiro para as entrevistas semiestruturadas.

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17

No quarto capítulo apresentaremos a análise das informações através dos “Núcleos de

Significação” (AGUIAR; OZELLA, 2013) como pressuposto teórico metodológico para

compreensão das significações que os professores atribuem aos projetos de recuperação e as

questões relativas à garantia do direito à aprendizagem.

Nas considerações finais discutimos como as políticas públicas em educação têm

como objetivo garantir o direito constitucional à educação. Apresentam-se como possibilidade

de enfrentamento das desigualdades econômicas, sociais e de escolarização, porém, no caso

estudado, não cumprem essa função e, ao contrário, os projetos e as resoluções reforçam o

ideário da reprovação escolar, da seletividade e da exclusão no interior da escola. A proposta

educacional, da Secretaria da Educação de São Paulo, apresenta fragilidades. Consideramos

urgente romper com pretensas políticas públicas que excluem no interior da escola e

estigmatizam crianças, adolescentes e jovens como se fosse um movimento natural em uma

sociedade harmoniosa.

Defendemos políticas públicas estruturantes centradas na formação política dos

professores e na percepção das relações de poder que constituem a realidade histórica das

sociedades e da educação.

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18

Apresentação

O final da década de 1960 tem a marca do endurecimento da ditadura civil/militar no

Brasil. O Ato Institucional nº 5 (AI-5) de 13 de dezembro de 1968, justificava “legalmente” o

regime de exceção, a censura e a arbitrariedade de um Estado repressor e concentrador de

renda.

No dia 17 de janeiro de 1968 nasci como oitavo filho de uma família de nove filhos

em um bairro periférico da Cidade de Guarulhos. Pais com pouca instrução formal e

trabalhadores assalariados. Minhas possibilidades de entrar na escola, continuar e ser

aprovado eram poucas.

Em 1975 ingressei no ensino primário (1º grau) em uma escola estadual do município

de Guarulhos.

Foi neste período de contradição entre a expansão do ensino primário e a dificuldade

em permanecer em uma organização escolar em que as diversas formas de exclusão ditam os

caminhos da “capacidade individual” para não ser reprovado e das dificuldades de uma

família de assalariados em manter os filhos na escola que aos nove anos de idade o destino

levou meu pai.

Trago na memória aquele homem sem escolarização formal que, já acometido pela

doença, pouco enxergava, mas quando ouvia pela televisão ou pelo rádio as vozes de políticos

representantes direta e indiretamente da ditadura militar pedia silêncio aos filhos e depois

fazia gestos e caretas imitando-os. Só depois de conhecer a história do nosso país pude

entender o motivo de tais gestos e caretas: a discordância de meu pai em relação aos ditames

ditatoriais.

Em 1982 concluí a 8ª série do 1º grau. Em clima de abertura política, guardo na

lembrança as aulas da professora de História que, com relação afetiva com os alunos, com

competência pedagógica marcante, utilizava em suas aulas o livro História da Riqueza do

Homem, de Leo Huberman. Suas aulas eram empolgantes, diferentes em relação aos demais

professores, seu carisma associado à qualidade das aulas era tal que a maioria dos alunos

possuía o livro de referência, comprado a alto custo na época.

Para a formatura de 8ª série a mesma professora ensaiava junto aos alunos formandos

a música Cancióncon todos, de Mercedes Sosa, guardo na memória o refrão:

Canta conmigo, canta

Hermano americano

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19

Libera tu esperanza

Conun grito enla voz!

Com o tempo compreendi que aquela professora propunha mais que a formação de

seus alunos. Pretendia, de fato, contribuir para transformar a realidade e proporcionar

conhecimento crítico a todos. Em tempos de expansão do 1º grau, prosseguir os estudos no 2º

grau era outro desafio. No início da década de 1980, na cidade de Guarulhos, somente duas

escolas centrais e uma localizada em bairro de classe média ofereciam o 2º grau público e

gratuito, desde que o ingressante fosse aprovado no “vestibulinho”.

“Vestibulinho” era o nome dado à prova aplicada para selecionar os “melhores

alunos”, o que de fato mascarava a realidade da falta de vagas nas escolas públicas.

Prestei o “vestibulinho” na escola localizada no bairro de classe média, distante do

centro da cidade. O motivo é que as duas escolas centrais eram concorridas e o número de

inscritos para o “vestibulinho” era enorme, tornando mínima minha possibilidade de

aprovação, por isso, a opção por escola mais distante. Prestado o “vestibulinho” não fui

aprovado em primeira chamada, a escola oferecia cem vagas para o 1º ano do 2º grau.

Somente no mês de abril minha mãe foi comunicada sobre desistência de alunos e a

possibilidade em efetuar minha matrícula.

Comparecemos aquela noite para efetuar a matrícula. A informação da atendente da

secretaria da escola foi direta e objetiva: os documentos deveriam ser entregues no dia

seguinte, a taxa da Associação de Pais e Mestres paga em banco indicado e que minhas notas

de primeiro bimestre seriam zeradas, pois não frequentei as aulas.

Só depois de muito tempo, já atuando como professor, fui entender a última frase

expressa pela atendente naquela noite, que ressoava como veredicto: “pode vir assistir às

aulas a partir de amanhã, porém vai ter que estudar muito, já perdeu o primeiro bimestre e

suas notas serão todas zeradas neste período”.

ConcluI o 1º ano do 2º grau naquela escola com muita dificuldade em acompanhar os

estudos, mas, principalmente, pela dificuldade econômica por que passava minha família.

No ano de 1983 cursei o 1º ano do 2º grau no período noturno e trabalhava como

operário em indústria do ramo têxtil em condições degradantes. A fábrica não possuía

refeitório, a jornada era de 48 horas semanais e éramos obrigados a cumprir horas extras aos

sábados e domingos.

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20

O horário de término das aulas era às 23h, o ônibus só passava às 23h30min , chegava

a casa aos 30 minutos e acordava às 5h30min para o trabalho. Para um garoto de 15 anos as

jornadas de trabalho e escolar ocupavam toda a vida.

Em 1984 solicitei transferência para uma escola mais próxima da minha casa, que

naquele ano começou a atender o 2º grau noturno, sem necessidade de “vestibulinho”.

Não sabia da existência das Universidades Públicas. Aprovado no vestibular de uma

faculdade privada iniciei o curso de Estudos Sociais em 1986, com duração de quatro anos,

com a possibilidade de optar no 3º ano pela licenciatura em História, Geografia ou Sociologia.

Optei pela licenciatura em História. Opção óbvia marcada pela professora que me ensinou a

ler a História da Riqueza do Homem e a cantar a liberdade latino-americana.

Desempregado, iniciei o curso universitário, contei com o apoio de um cunhado que

na época havia concluído o curso de Matemática e já atuava como professor, além de possuir

um pequeno comércio administrado por minha irmã. Fui morar com eles, ajudava no pequeno

comércio e eles pagavam minha faculdade.

Em 1987, no segundo ano do curso de Estudos Sociais, fui informado por meu

cunhado que a escola em que ele trabalhava precisava de professor para as aulas de Educação

Moral e Cívica na 6ª série e Organização Social e Política Brasileira para 8ª série. Apresentei-

me para a Diretora da Escola que prontamente solicitou meu Registro Geral, verificou se a

foto conferia com meu rosto e me indicou a sala que deveria entrar para “dar aulas”

imediatamente porque os alunos estavam sem professor.

O movimento de formação universitária e a prática docente inicial como

professor/aluno transformou radicalmente minha vida aos 20 anos. Já não dependia

financeiramente da ajuda familiar,enxergava-me como potencializador de mudanças e via na

educação este caminho. Começava a compreender os movimentos de discussão em torno da

Constituinte de 1987 e da Constituição de 1988.Participava ativamente da militância política

através do “Núcleo de Bairro”, época de pintar estrelas em tecido vermelho com recursos do

“Núcleo” e, com muita dificuldade, eleger um único vereador com pouquíssimos votos.

Entusiasmado pela educação, pela coragem política de membros do “Núcleo de Bairro” –

trabalhadores, donas de casa e jovens – e trabalhando em uma escola estadual do próprio

bairro, pude concluir minha graduação em Estudos Sociais, com licenciatura plena em

História.

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Meu bom relacionamento com os alunos e com a comunidade, a empolgação com a

escola e a proximidade com os problemas reais da vida dos alunos e moradores do bairro, o

gostar de jogar futebol aos finais de semana com alunos e comunidade, os campeonatos,

festas e semanas culturais traçavam um horizonte de possibilidades e incertezas.

Possibilidades de provocar mudanças e construir coletivamente uma sociedade melhor,

incertezas por não compreender as contradições presentes no cotidiano escolar. Por que notas?

Por que reprovação? Por que muitos na escola afirmam que parte dos alunos “não tem jeito” e

“não aprendem”? Questões que me inquietavam e que fui cúmplice: concordei com muitas

reprovações de alunos.

Guardo na lembrança casos de alunos reprovados em uma única disciplina por não

terem alcançado a nota mínima em um só bimestre. Depois, com minhas dúvidas, leituras e

práticas, pude entender melhor o que é a escola e a educação.

O livro Cuidado! Escola. Desigualdade, domesticação e outras saídas, prefaciado por

Paulo Freire e escrito em 1980, por Babette Harper, ClaudiusCeccon, Miguel Darcy de

Oliveira e Darcy Rosiska de Oliveira foi um dos marcos para a compreensão do movimento

contraditório que me encontrava deparando com o que eu e a escola praticávamos.

Em 1992, motivado por uma supervisora de ensino, fui cursar Pedagogia e em 1996

assumi a coordenação pedagógica da escola em que trabalhava há oito anos.

No ano seguinte, fui convidado a trabalhar com formação de professores na Oficina

Pedagógica da 1ª Delegacia de Ensino de Guarulhos e após um ano retornei para a mesma

escola como vice-diretor. No ano de 2002 assumi o cargo de Diretor de Escola Titular, optei

por uma escola que atendia os anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio.

Em 2008 fui designado Supervisor de Ensino e em dezembro de 2012, por aprovação

em concurso público, assumi o cargo de Supervisor de Ensino Titular.

Nestes últimos dez anos cursei especialização em Gestão Escolar na Universidade de

Campinas e concluí o Mestrado em Educação no programa de Psicologia da Educação da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, além de ministrar aulas no curso de Pedagogia

e na Pós-Graduação em Gestão Escolar.

Como Supervisor de Ensino, que vivenciou toda carreira no magistério estadual,

reconheço que ser professor em um país com profundas injustiças econômicas e sociais, não é

tarefa fácil. Mas, tenho convicção teórica de que outros caminhos para educação são

possíveis.

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CAPÍTULO 1

DIREITO À APRENDIZAGEM E UNIVERSALIZAÇÃO DO ENSINO

Apresentaremos o tema Direito à aprendizagem e universalização do ensino, a partir

da história política do nosso país, dos excertos de textos constitucionais e das Leis de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Não dissociamos a história da história da educação

e privilegiamos o movimento dialético para entendimento do fenômeno educativo. Precisamos

conhecer a estrutura social a que pertencemos para compreender a escola que temos e o

modelo de educação institucionalizada que representamos. A escola é parte e todo desta

sociedade, é constituída e constitui as relações de forças e de poder existentes.

A história política da República Brasileira é intercalada entre os períodos

democráticos e os regimes de exceção, marcadamente o Estado Novo(1937-1945) e a

Ditadura Civil/Militar (1964-1985). Nos períodos intercalados de democracia política e

regimes de exceção, as Constituições de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1988

constituíram um aparato legal que possibilitou a formulação das Leis de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional - LDBEN nº 4.024/61, Lei de Reforma do Ensino de 1º e 2º Graus nº

5.692/71 e a atual LDBEN nº 9.394/96.

1.1 O “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”: educação pública, laica e obrigatória

A história da educação no Brasil apresenta o debate em torno de questões sobre

escolarização com temas que investigamos há décadas. Um destes temas é a forma como

organizamos a escolarização das crianças, o direito à aprendizagem e a universalização do

ensino. Este debate intensifica-se e toma corpo com os “Pioneiros da Educação Nova”.

O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, publicado em 1932, foi redigido por

Fernando de Azevedo e assinado por Anísio Teixeira, Sampaio Dória, Lourenço Filho, Cecília

Meireles, Paschoal Leme entre outros. Reuniu teses básicas em linhas gerais, ainda que

divergências na concepção de educação dos seus idealizadores existissem. O Manifestoé claro

em relação ao entendimento da educação como uma função pública, laica, gratuita e

obrigatória no ensino elementar. Este movimento, iniciado na década de 1920, na reforma

empreendida por Sampaio Dória, questiona a forma que organizamos a escola e a

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escolarização formal de nossas crianças e adolescentes, a descentralização do sistema escolar

e a renovação metodológica.

Otaíza de Oliveira Romanelli, no livro História da Educação no Brasil, afirma que os

pioneiros não questionavam a nova ordem vigente do Estado Getulista.

Estava a favor da ordem que então se implantava e não a questionava. Mas

estava também consciente da defasagem existente entre a nova situação

econômica e social e a escola tradicional. A sua luta era contra a escola

tradicional, não contra o Estado burguês. (ROMANELLI,1978,p.151)

A década de 1930 é representativa na história política do Brasil. É o momento

histórico conhecido pela figura de Getúlio Vargas.

É neste cenário, do Estado Getulista e do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, que

buscamos as explicações iniciais em torno do direito à aprendizagem e a universalização do

ensino. Boris Fausto, historiador brasileiro, escreveu:

A partir de 1930, as medidas tendentes a criar um sistema educativo e

promover a educação tomaram outro sentido, partindo principalmente do

centro para a periferia (...) o Estado tratou de organizar a educação de cima

para baixo, mas sem envolver uma grande mobilização da sociedade; sem

promover também uma formação escolar totalitária que abrangesse todos os

aspectos do universo cultural (FAUSTO,1988, p.337)

A política educacional ficou nas mãos do Ministro da Educação Francisco Campos,

de novembro de 1930 a setembro de 1932, preocupou-se basicamente com o ensino

secundário e universitário. Francisco Campos foi o redator da Carta de 1937 que instaurou o

Estado Novo e em 1964 colaborou ativamente com a legislação autoritária após a derrubada

do Presidente João Goulart

Francisco Campos (...) homem forte de vários processos de radicalização

autoritária, no Brasil, mais uma vez participa do processo socorrendo o

governo. A constituição ditatorial de 1937 será obra de sua „engenharia

política‟. Aliás, quando Anísio Teixeira foi afastado em 1935, o jurista

mineiro ocupou o seu lugar. (BICCAS; FREITAS, 2009, p. 110)

Neste momento histórico, a partir de 1930, com a efetivação do Estado Getulista e o

embate com as linhas gerais dos liberais, os pioneiros da educação, os rumos da educação

nacional estavam postos. De um lado, os educadores liberais defendiam o ensino público

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como primordial e o corte de subvenções do Estado às escolas religiosas e, do outro lado, a

Igreja Católica enfatizava o papel da escola privada e defendia o ensino religioso. O governo

Vargas não assumiu claramente nenhuma das posições, mas inclinou-se pela corrente católica

e entre os reformadores liberais somente Lourenço Filho assumiu posto no governo. Anísio

Teixeira foi perseguido pelo governo Vargas.

O sistema educacional no Brasil vai se modelando entre os avanços reformistas da

nova ala liberal, representada pelos Pioneiros, e pela ala liberal conservadora, representada

pelas posições oligárquicas e religiosas. Afirma Romanelli:“As constituições e a legislação do

ensino representam, daí para cá, uma tentativa constante de acomodação dessas duas alas.

Mas a prática educacional continuou a representar o predomínio das velhas

concepções”.(ROMANELLI,1978, p. 151)

Recorremos à história para compreendermos o movimento de interesses e motivações

políticas em torno do tema educação. A educação não se explica por si mesma. A educação é,

dialeticamente, todo e parte das relações de poder.

O predomínio das velhas concepções permanece quase que inabalável no incipiente

sistema educacional brasileiro.

A Assembleia Constituinte é instalada em 16 de julho de 1934 e traz a marca do

governo getulista com maior poder ao governo federal, o voto obrigatório e secreto a partir

dos 18 anos e o direito de voto às mulheres. Contraditoriamente proibia o voto aos mendigos

e aos analfabetos, leia-se negros e pobres, que com a Abolição da Escravidão em 1888 e a

Proclamação da República em 1889, estavam à mercê das transformações do modelo liberal

conservador que se solidificava. (CARVALHO, 2013)

Os “benefícios” do republicanismo chegaram à classe dominante reafirmando os ideais

da livre iniciativa, mas pouco chegou à grande parcela da população. A Constituição Federal

de 1934, no título referente à família, educação e cultura, estabelecia o princípio do ensino

primário gratuito e da presença obrigatória à escola.

Artigo 149 – A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela

família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a

brasileiros e a estrangeiros domiciliados no país, de modo que possibilite

eficientes fatores da vida moral e econômica da nação, e desenvolva num

espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana.

(CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1934)

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A Constituição de 1934 é a primeira legislação em que o direito à instrução pública é

mencionado independentemente da situação socioeconômica da pessoa. A Constituição de

1934 foi revogada pelo Presidente Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937, o Congresso

foi dissolvido e as liberdades individuais suspensas, entre outras mudanças inspiradas no

fascismo italiano. Getúlio Vargas outorgou a Constituição de 1937 e instalou no país o Estado

Novo. A marca autoritária do Estado Novo garante mais uma vez os interesses da classe

dominante e um Estado organizado para suprir os interesses econômicos e políticos desta

classe.

A Constituição de 1937, nos artigos 128 e 129, do capítulo sobre educação e cultura,

foi assim redigida:

Artigo 128 - A arte, a ciência e o ensino são livres à iniciativa individual e a

de associações ou pessoas coletivas públicas e particulares. É dever do

Estado contribuir, direta e indiretamente, para o estímulo e desenvolvimento

de umas e de outro, favorecendo ou fundando instituições artísticas,

científicas e de ensino.

Artigo 129 - A infância e a juventude, a que faltarem os recursos

necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos

Estados e dos Municípios assegurar,pela fundação de instituições públicas de

ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação

adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais.

O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos

favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever de Estado. Cumpre-

lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e

subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou

associações particulares e profissionais.

É dever das indústrias e dos sindicatos econômicos criar, na esfera da

sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus

operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e

os poderes que caberão ao Estado, sobre essas escolas, bem como os

auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo Poder Público.

(CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1937)

Buscamos no texto constitucional de 1937 a instituição oficial da divisão do sistema

educacional entre escola para a elite e escola para os pobres. O que é a “possibilidade de

receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências

vocacionais?”Entendemos, dentro do ideário liberal, que aptidões e tendências vocacionais

significam o esforço pessoal, de responsabilidade única do indivíduo, sem variáveis.

O texto constitucional trata o sistema educacional dentro do arcabouço legal, e afirma

o “dever da Nação, do Estado e dos Municípios assegurar a possibilidade de receber uma

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educação adequada”. Não se trata de um Direito, mas uma possibilidade de receber educação

adequada. Na Constituição de 1937 o direito à educação sequer estava mencionado.

A escola seletiva se afirma na Constituição de 1937, dentro dos propósitos teóricos dos

educadores brasileiros fortemente influenciados pelo médico, psicólogo e educador suíço,

ÉdouardClaparède (1873-1940), que propunha à época as ideias de uma escola que oferece a

cada um a educação que lhe convinha. As interpretações do pensamento positivista de

Augusto Comte (1798-1857) e Émile Durkheim (1858-1917) influenciaram diretamente

educadores como Fernando de Azevedo com os propósitos de coesão social, funcionalidade

da estrutura social e formação de uma elite pensante.

Nesta perspectiva da educação liberal no Estado Getulista, Anísio Teixeira, que foi

aluno e discípulo do filósofo e educador norte americano John Dewey (1859-1952) propõe

uma escola única e democrática para um homem novo, uma escola que contribua com os

mecanismos que constroem e solidificam a democracia. Eis o motivo que levou Anísio

Teixeira a não ocupar cargo público e ser perseguido durante o Estado Novo.

1.2 A Constituição Federal de 1946:embates ideológicos na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional - Lei nº 4.024/61

Nas décadas de 1920 a 1940, momento de transição de uma economia agroexportadora

marcada pela crise econômica mundial de 1929, para uma economia de substituição de

importações em um período entre guerras, a educação no Brasil apresenta declínio no índice

de analfabetos considerando-se a população de 15 anos ou mais, passando dos 65% em 1920

para 56,1% em 1940, como podemos observar na tabela abaixo:

Tabela I – Analfabetismo na faixa de 15 anos ou mais (Brasil, 1900/2000)

Ano

População de 15 anos ou mais

Total

(em milhares)

Analfabeta

(em milhares)

Taxa de

analfabetismo

1900 9.728 6.348 65,3

1920 17.564 11.409 65,0

1940 23.648 13.269 56,1

1950 30.188 15.272 50,6

1960 40.233 15.964 39,7

1970 53.633 18.100 33,7

1980 74.600 19.356 25,9

1991 94.891 18.682 19,7

2000 119.533 16.295 13,6 Fonte: IBGE. Mapa do Analfabetismo no Brasil, 2010, p.6.

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Podemos observar que no período do governo Getulista houve pequena expansão do

ensino escolar não atendendo aos princípios liberais da democratização do ensino. Se de um

lado o Estado Novo favoreceu diretamente o modelo econômico liberal com a legislação e a

infraestrutura industrial necessária ao seu desenvolvimento, no cenário da educação pública e

na formação de mão de obra qualificada avançou timidamente.

A eleição de 1945 tem como marca o apoio de último momento de Getúlio Vargas ao

candidato Eurico Gaspar Dutra, seu Ministro da Guerra. Dutra era um candidato que não

entusiasmava, mas o apoio do Presidente Vargas traz para seu lado a massa dos trabalhadores.

Getúlio Vargas foi eleito Senador pelo Partido Social Democrata do Rio Grande do Sul. A

máquina política da ditadura getulista mostrou-se eficiente também na captação de votos em

momentos de democracia política.

O panorama político das discussões sobre a nova Constituição de 1946 ocorre em

torno de questões fundamentais. A nova Constituição tem a marca do liberalismo democrático

afastando-se, assim, da Carta de 1937 que fundamentou o Estado Novo Autoritário Getulista.

Em seu artigo 141, parágrafo 5º temos que: “É livre a manifestação do pensamento

sem que dependa de censura”e no parágrafo 7º: “É inviolável a liberdade de consciência e

crença”. (Constituição Federal, 1946)

Neste momento histórico os Pioneiros da Educação Nova retomam os valores

defendidos na Constituição de 1934: “Da Educação e da Cultura - Artigo 166 - A educação é

direito de todos e será dada no lar e na escola. Deve inspirar-se nos princípios de liberdade e

nos ideais de solidariedade humana”. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1946)

Neste panorama de abertura liberal-democrática, a Constituição de 1946 afastava-se da

ideologia liberal-aristocrática presente no início do século XX no Brasil, como escreveu

Romanelli:

Os princípios liberais da Carta de 1946, que asseguravam direitos e garantias

individuais inalienáveis, estavam visivelmente impregnados do espírito

democrático tão próprio das reivindicações sociais do século em que

vivemos. Foi assim, pois, que, ao aliar garantias, direitos e liberdades

individuais, com intervenção do Estado para assegurar essas garantias,

direito e liberdade a todos, a Constituição de 1946 fugiu à inspiração da

doutrina econômica liberal dos séculos anteriores para inspirar-se nas

doutrinas sociais do século XX. Nisso ela se distanciava também da

ideologia liberal-aristocrática esposada pelas nossas elites, no antigo regime.

(ROMANELLI,1978,p. 171)

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Nestes novos tempos republicanos a nova Constituição traz em sua proposta a

descentralização e autonomia para os agentes da educação.

Foi neste clima político liberal-democrático da Constituição de 1946 que o Ministro da

Educação Clemente Mariani institui uma comissão de educadores para estudar e propor um

projeto de reforma geral da educação nacional.

Lourenço Filho presidiu a comissão encarregada de propor um anteprojeto de

diretrizes e bases da educação nacional. Somente em 1961, treze anos após intensas

divergências políticas, foi aprovado o texto final da Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional nº4.024/61.

As lutas políticas, travadas em torno das discussões sobre a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional nº 4.024/61, foi em torno do embate entre a educação pública e a

educação privada. Os rumos tomados, durante os treze anos de elaboração desta lei,orbitaram

nesta discussão. Entre osdefensores da escola pública e gratuita destacou-se o Professor de

Sociologia da Universidade de São Paulo, Florestan Fernandes.

Assim se constituiu o embate político e ideológico entre a igreja católica e o setor

privado contra o grupo ligado aos ideais escolanovistas. O Deputado Carlos Lacerda

representava a ala política conservadora, aglutinando os interesses das congregações católicas.

As reações do movimento Campanha em Defesa da Escola Pública, que culmina com o

Manifesto dos Educadores(1959), liderado por Fernando de Azevedo, consegue emplacar

avanços na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, todavia as forças conservadoras

se sobrepõem ao direito à educação pública e os interesses da classe dominante predominam

no texto legal de 1961.

A complexidade da luta política em torno dos rumos da educação nacional foi

arregimentada pelas forças conservadoras e o texto final publicado pouco avançou em relação

ao direito à educação. O texto final foi assim publicado em 1961:

TÍTULO II - Do Direito à Educação

Art. 2º A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola.

Parágrafo único. À família cabe escolher o gênero de educação que deve dar

a seus filhos.

Art. 3º O direito à educação é assegurado:

I - pela obrigação do poder público e pela liberdade de iniciativa particular

de ministrarem o ensino em todos os graus, na forma de lei em vigor;

II - pela obrigação do Estado de fornecer recursos indispensáveis para que a

família e, na falta desta, os demais membros da sociedade se desobriguem

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dos encargos da educação, quando provada a insuficiência de meios, de

modo que sejam asseguradas iguais oportunidades a todos.(LDBEN – Lei nº.

4.024/61).

1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: A manutenção do poder e a negação

de direitos

Um Estado liberal forte que promovesse o capitalismo nacional era um dos objetivos

dos governos populistas. Juan Domingo Perón, na Argentina, e Getúlio Vargas, no Brasil, são

representantes deste modelo político e da política econômica que o conduz. Reduzir a

rivalidade entre as classes e promover a colaboração das classes através do Estado era a

maneira de superar as diferenças e não permitir que os interesses individuais se

sobreponhamaos interesses e aspirações de todo o povo. Este era o ideário dos governos

populistas na América Latina.

No Brasil, o Estado Novo Getulista e a política populista já não dão conta em atender

às aspirações da burguesia industrial que avança nos centros urbanos. O país, tipicamente

rural, dá lugar a uma sociedade urbana industrial fomentada em uma burguesia nacional,

dependente do capital Estatal e do capital externo.

No período pós-guerra afirma-se a supremacia política e econômica dos Estados

Unidos da América sobre os países latino-americanos e suas economias. Não interessa mais à

burguesia nacional que se estabeleça um governo de posição dúbia ou articulador de

interesses das diferentes classes e camadas sociais. O capital estrangeiro, em especial dos

Estados Unidos da América, é quem vai ditar as regras da economia e defender os interesses

do capital internacional, poucoimportarão os modelos políticos ou suas variações, importarão,

sim, a expansão capitalista e a garantia da hegemonia norte- americana.

O espírito nacionalista da época, amplamente construído pela propaganda de Estado, e

a eleição direta de Getúlio Vargas associado à entrada do capital estrangeiro no Brasil e os

rumos da política imperialista norte americana, oferecem condições para a criação do grande

monopólio estatal do petróleo no Brasil.

Os interesses entre a política econômica nacionalista construída no segundo governo

de Getúlio Vargas (1951-1954) e no governo Juscelino Kubitschek (1956-1961), associados

ao crescimento dos investimentos de capital americano no país, apontam para uma

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contradição sobre os rumos econômicos a serem tomados por nossa elite local: o

desenvolvimentismo nacionalista ou o capital americano.

O modelo cultural e econômico norte-americana ganha espaço, a indústria

automobilística e a indústria de bens de consumo duráveis é quem dão as ordens.

Neste cenário que se configurava no momento da “Guerra Fria” prevaleceram a força

bélica e os interesses econômicos dos Estados Unidos da América. A sutileza da classe

dominante urbano-industrial em apropriar-se das vantagens que se colocavam com o capital

internacional e a organização de um Estado liberal que mantinha e ampliava tais interesses,

foi a fórmula encontrada.

Com cenário econômico, político e social que se configurava, o caminho

representativo dos interesses das classes dominantes estava posto: no campo econômico as

alianças com o capital internacional e as ações de infraestrutura nacional para sustentar a

ampliação da acumulação de capital pelas classes dominantes; no campo político o fim do

Estado de Direito: censura e proibição da atuação dos partidos políticos; no campo social a

censura e repressão aos movimentos sociais e às vozes intelectuais. O golpe militar de 1964 é

a representação da nova ordem do capital internacional: autoritarismo político e segurança

nacional para combater os “subversivos”.

A Constituição de 1967 impõe a eleição indireta para Presidente da República, a

suspensão das garantias dos Magistrados e o controle do Legislativo. Atos Institucionais

serviram para legitimar as ações dos governos militares e justificara proibição de qualquer

manifestação política, a censura aos meios de comunicação e a intervenção em Estados e

Municípios. O mais conhecido Ato Institucional foi o AI-5, visava a combater inimigos

internos do regime, rotulados como “subversivos”, “comunistas” e todos aqueles que

questionavam a “ordem”.

O Nacional Desenvolvimentismo era sepultado e o capital nacional submetido aos

interesses do capital estrangeiro. O novo modelo político econômico demonstra-se

concentrador de renda e gerador de desigualdades sociais, a urbanização desenfreada e os

baixos salários criam o cenário de miserabilidade das classes populares na década de

1970/1980.

A Constituição de 1967, no Título IV, Artigo 168, estabelecia que:A educação é

direito de todos e será dada no lar e na escola; assegurada a igualdade de oportunidade, deve

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inspirar-se no princípio da unidade nacional e nos ideais de liberdade e de solidariedade

humana.

No mesmo Artigo 168, parágrafo 3º, inciso II, estabelece que o ensino dos sete aos

quatorze anos é obrigatório para todos e gratuito nos estabelecimentos primários oficiais. No

inciso VI afirma a liberdade de cátedra.

A Emenda Constitucional nº1/69 “legitima” a ditadura militar e o “direito de todos” à

educação deve inspirar-se “no princípio da unidade nacional”. A ideia de unidade nacional

neste momento da história política do país significa manter a ordem.

O que era liberdade de cátedra, no inciso VI da Constituição de 1937, passa a ser no

Artigo 176, inciso VII, da Emenda Constitucional nº 1/69 a “liberdade de comunicação de

conhecimentos no exercício do magistério, ressalvado o disposto no artigo 154”

Art. 154. O abuso de direito individual ou político, com o propósito de

subversão do regime democrático ou de corrupção, importará a suspensão

daqueles direitos de dois a dez anos, a qual será declarada pelo Supremo

Tribunal Federal, mediante representação do Procurador Geral da República,

sem prejuízo da ação cível ou penal que couber, assegurada ao paciente

ampla defesa. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1967)

O direito à educação é submetido ao dever de obedecer à ordem e não abusar do

direito individual e coletivo para não “subverter” o regime.

É neste momento histórico que a escolarização se expande para a maior parte da

população em um movimento de instrução técnica para servir as necessidades do capital

nacional e internacional, porém adverte Biccas e Freitas:

A disseminação da escola pública no Brasil não foi consequência da natural

e inexorável da industrialização. Ou seja, será necessário desvendar o

complexo campo da construção de direitos políticos da sociedade civil, (e

escolarizar os filhos na escola pública é, antes de tudo, um direito político),

para atender à forma social que a escola adquiriu quando se espalhou.

(BICCAS; FREITAS, 2009, p.108)

É neste movimento histórico que em 11 de agosto de 1971 é promulgada a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN nº 5.692/71.

Entre as principais características desta LDBEN podemos destacar no artigo 4º, a

previsão do chamado “Núcleo Comum” e da “Parte Diversificada” no currículo, de acordo

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32

com as peculiaridades de cada região; no artigo 7º, a inclusão das disciplinas de Educação

Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde; no artigo 11º, o

ensino obrigatório dos sete aos quatorze anos, já estabelecido pela Constituição de 1967, e no

artigo 43, dinheiro público “preferencialmente” às instituições de ensino público.

Vale destacar que estas características apontam para uma LDBEN que revestiu a

escola de uma pretensa autossuficiência, contemplando a ideia de que os professores teriam o

papel de especialistas técnicos. O professor passa a ser aquele que aplica e transmite o manual

técnico, a função do aluno é responder às comandas. A pedagogia predominante ficou

conhecida como tecnicista, assim definida por Saviani:

A partir do pressuposto da neutralidade científica e inspirada nos princípios

de racionalidade, eficiência e produtividade, essa pedagogia advoga a

reordenação do processo educativo de maneira a torná-lo objetivo e

operacional. De modo semelhante ao que ocorreu no trabalho fabril,

pretendeu-se a objetivação do trabalho pedagógico. (...)Se na pedagogia

tradicional a iniciativa cabia ao professor e se na pedagogia nova a iniciativa

deslocou-se para o aluno, na pedagogia tecnicista o elemento principal

passou a ser a organização racional dos meios, ocupando o professor e o

aluno posição secundária. A organização do processo converteu-se na

garantia da eficiência, compensando e corrigindo as deficiências do

professor e maximizando os efeitos de sua intervenção. (SAVIANI,2013,

p.16-17)

1.4 A redemocratização do Brasil e a Constituição Federal de 1988

No início da década de 1970 o Produto Interno Brasileiro (PIB) crescia com uma das

maiores taxas das economias capitalistas do mundo. O parque industrial brasileiro expandia e

modernizava. A agricultura foi estimulada pela importação e pela alta do consumo interno. Na

esfera econômica o discurso era da prosperidade do “país do futuro”, na esfera política o

discurso era o da “ordem” e da “justiça”. No final da década de 1970 o regime militar

enfraquecido economicamente, pelas crises econômicas sucessivas desde a crise do petróleo

em 1973, começa a enfrentar a insatisfação popular devido ao descontrole inflacionário e o

desemprego.

Em 1979, os metalúrgicos, os professores em São Paulo e os bancários em todo país

lideram as maiores greves contra o “arrocho salarial” e a inflação e pelos direitos políticos

plenos. A década de 1980 abre-se com a insatisfação popular e o movimento pelas eleições

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diretas para Presidente da República, conhecidopopularmente como “Diretas Já”. Os setores

da classe dominante que apoiavam a ditadura militar já não se sustentavam, a pressão popular

pela abertura política e a crise econômica exigiam uma nova organização política do país.

As entidades organizadas da educação nacional como a Associação Nacional de

Educação (ANDE), a Associação Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Educação

(ANPED), o Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), a Associação dos

Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP) lideraram as chamadas

Conferências Nacionais de Educação que, em 1986, na Cidade de Goiânia, elaboraram a

Carta de Goiânia(CBE, 1986) que desvelava o quadro estarrecedor da educação brasileira:

insuficiência de vagas, altíssima evasão escolar e analfabetismo. A Carta de Goiânia foi

assim resumida por Biccas e Freitas:

1- A educação escolar é direito de todos os brasileiros e será gratuita e laica nos

estabelecimentos públicos, em todos os níveis de ensino;

2- Todos os brasileiros têm direito à educação pública básica comum, gratuita e

de igual qualidade, independentemente de sexo, cor, idade, confissão

religiosa e filiação política, assim como de classe social ou de riqueza

regional, estadual ou local;

3- O ensino fundamental, com 8 anos de duração, é obrigatório para todos os

brasileiros, sendo permitida a matrícula a partir dos 6 anos de idade;

4- (...)

5- É obrigação do Estado oferecer vagas em creches e pré-escolas para crianças

de 0 a 6 anos e 11 meses de idade, com caráter prioritariamente pedagógico;

6- São assegurados aos deficientes físicos, mentais e sensoriais serviços de

atendimento pelo Estado, a partir de zero ano de idade, em todos os níveis de

ensino;

7- É dever do Estado prover o ensino fundamental, público e gratuito, de igual

qualidade, para todos os jovens e adultos que foram excluídos da escola ou a

ela não tiveram acesso na idade própria...

8- (...)

9- O ensino de 2º grau, com 3 anos de duração, constitui a 2ª etapa do ensino

básico e é direito de todos (...);

10- O ensino, em qualquer nível, será obrigatoriamente ministrado em língua

portuguesa, sendo assegurado aos indígenas o direito à alfabetização na

língua materna e portuguesa;

11- Será definida uma carreira nacional do magistério(...);

12- (...) 13- As Universidades públicas devem ser parte integrante do processo de

elaboração da política de cultura, ciência e tecnologia do país (...);

14- (...) 15- Os recursos públicos destinados à educação serão aplicados exclusivamente

nos sistemas de ensino criados e mantidos pela União, Estados e Municípios;

16- (...) 17- (...)

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18- É permitida a existência de estabelecimentos de ensino privado, desde que

atendam às exigências legais e não necessitem de recursos públicos para sua

manutenção (...) (BICCAS; FREITAS 2009, p.314-315)

Eram dadas as cartas para discussão sobre as questões educacionais no país. A Carta

de Goiânia serviu de referência para as discussões do Fórum de Educação na Constituinte

1987/88 em Defesa do Ensino Público e Gratuito. (BICCAS e FREITAS,2009, p.316).

As discussões sobre a escola pública e gratuita na Constituinte 1987/88 foram

acaloradas. Grupos mais à esquerda ligados ao Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido

Democrático Trabalhista (PDT) colocavam-se contra os lobbies sustentados pelas elites e a

favor da escola pública e gratuita.

Pressões e confrontos organizados por setores ligados ao setor conservador, chamado à

época de Centrão, reuniam figuras políticas que representavam os grandes empresários,

banqueiros e latifundiários que pretendiam manter inalteradas as estruturas do Estado

brasileiro concentrador de riquezas nas mãos da classe dominante. Este grupo era

representado principalmente por deputados e senadores do Partido da Frente Liberal (PFL) e

do Partido Democrático Social (PDS), herdeiros do regime militar, reacionários a qualquer

proposta de cunho social e defensores do chamado “Estado Mínimo” dentro de um conceito

neoliberal promovido pelas alas conservadoras de diversos países, em especial na Inglaterra

no governo da Primeira Ministra Margaret Thatcher (1979-1990), com políticas econômicas

centradas na privatização dos serviços públicos, na desregulamentação do setor financeiro e

na flexibilização do trabalho.

Estes dois grupos compuseram o tom da Constituição Federal de 1988 e que

destacamos alguns pontos importantes em relação à educação:

Artigo 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da Família,

será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao

pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania

e sua qualificação para o trabalho.

Artigo 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte

e o saber;

III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas (...) ; e

IV – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais.

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a

garantia de:

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I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não

tiveram acesso na idade própria;

II – progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino

médio;(...) (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988)

Sobre o artigo 208 acrescentamos os avanços obtidos recentemente com a Emenda

Constitucional nº 59 de 2009:“I - educação básica obrigatória e gratuita dos quatro aos

dezessete anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não

tiveram acesso na idade própria”. (EMENDA CONSTITUCIONAL nº 59/09)

Observamos no texto constitucional de 1988 as conquistas obtidas em relação aos

textos constitucionais anteriores que alternaram avanços e retrocessos. O Direito à Educação,

que era na Constituição de 1934 “direito de todos” e deveria “ser ministrada, pela família e

pelos Poderes Públicos”, na Constituição outorgada de 1937, de inspiração fascista, passa a

ser “dever do Estado contribuir, direta e indiretamente(...)” e a Constituição de 1946, no

momento do fim da 2ª Grande Guerra e da redemocratização retoma o ideário liberal

democrática da Carta Magna de 1934: “A educação é direito de todos e será dada no lar e na

escola”.

No texto constitucional de 1967 o Direito à Educação é submetido à ideia de “unidade

nacional” e a organização tecnicista necessária ao modelo de desenvolvimento da época.

Neste momento históricoa expansão do ensino decorre mais das lutas e conquistas em direção

à construção de direitos políticos pela sociedade civil organizada do que pelas mãos

autoritárias do Estado.

A Constituição de 1988, promulgada na efervescência da redemocratização, no seu

novo ordenamento jurídico estabelece a educação como direito de todos e dever do Estado e

da família. Significatico avanço em termos de direitos sociais.

Os direitos sociais conquistados na Constituição Federal de 1988: “educação de jovens

e adultos que não tiveram acesso à escolarização na idade própria”; o “atendimento

especializado a ser oferecido aos deficientes” e o “atendimento em creche e pré-escola às

crianças de até seis anos de idade”, representam e consolidam o ideal da escola pública como

direito.

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36

1.4.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394/96

A LDBEN tornou-se uma peça menor se comparada aos sonhos acalentados

por muitos educadores. Porém, em relação a vários aspectos, tornou-se

expressão de vitória para anseios populares que há décadas aguardavam

encaminhamento. (BICCAS; FREITAS,2009, p.332)

Oito anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988, mais precisamente em

20 de dezembro de 1996, é sancionada pela Presidência da República a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional – LDBEN nº 9.394/96.

O anteprojeto desta nova LDBEN baseava-se nos ideais da Carta de Goiânia, já

mencionada anteriormente. Porém, o Poder Executivo, representado à época pelo Presidente

Fernando Henrique Cardoso e seu Ministro da Educação e Cultura Paulo Renato Costa Souza,

apoiou o texto final protocolado pelo Senador Darcy Ribeiro, que representava mais

claramente os interesses dos grupos políticos ligados aos conservadores. O texto final passou

por modificações diversas que objetivavam conciliar as forças políticas do cenário nacional.

Apesar das manobras políticas articuladas pela Presidência da República para não

apoiar o texto do anteprojeto apresentado após as discussões promovidas pelos Fóruns e

Conferências de Educação, a LDBEN n° 9.394/96 apresentou avanços que descreveremos

brevemente:

- O direito à educação afirma-se como direito subjetivo, direito do cidadão e dever do

Estado. O cidadão que não tiver acesso à escola e seu direito garantido poderá requerê-lo

juridicamente;

- A educação infantil e a Educação de Jovens e Adultos passaram a fazer parte da

Educação Básica. Também é garantido o direito à educação aos jovens e adultos que não

tiveram acesso à educação na idade correta;

- A organização da escolarização pública e gratuita dos sete aos quatorze anos poderá

ser organizada em séries anuais, períodos semestrais, por grupos não seriados, por ciclos,

enfim, pode ser organizada nas diversas formas que contribuam para combater a evasão e a

repetência. O regime de progressão regular poderá ser substituído pelo regime de progressão

continuada; e

- A avaliação da aprendizagem dos alunos não se limitará aos conhecimentos

escolares, outras experiências de aprendizagem e conhecimento são permitidas possibilitando

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assim a classificação e reclassificação em anos ou séries distintas obedecendo à idade

cronológica. Os aspectos qualitativos devem prevalecer sobre os quantitativos ao longo do

período do ano ou ciclo nas avaliações da aprendizagem contínuas e cumulativas.

A LDBEN n° 9.394/96 não representou os anseios dos movimentos sociais discutidos

nas Conferências de Educação e apresentadas na Carta de Goiânia(1986), porémos avanços

alcançados foram substanciais e não podem ser negados. Neste conjunto de avanços em

relação à garantia de direitos, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/90

é uma das mais representativas legislações mundo afora.

A legislação por si só não dá conta das mudanças sociais e do combate às

desigualdades sociais e econômicas, mas é inegável que representam passos importantes de

apoio à luta política por mudanças mais profundas.

Entre as mudanças legais recentes a Emenda Constitucional nº 59/09 torna o ensino

obrigatório para população dos quatro aos dezessete anos e amplia os programas

suplementares para todas as etapas da Educação Básica e a Lei nº 12.796/13em seu Artigo 6º

determina que “é dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação

básica a partir dos quatro anos deidade”.

Resultantes de amplos debates promovidos pelo Conselho Nacional de Educaçãoo

Parecer CNE/CEB nº 07/10 e as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação

Básica – Resolução CNE/CEB nº 04/10, representam os princípios e diretrizes gerais da

Educação Básica. Este movimento, ancorado no Conselho Nacional de Educação,

proporcionou a criação de dispositivos legais que inspiram sistemas de ensino a promover

políticas públicas que ultrapassem os problemas educacionais que enfrentamos há décadas,

entre eles, a elaboração de políticas de gestão, do currículo, dos projetos políticos

pedagógicos, da formação e valorização dos professores e, enfim, da garantia do direito ao

acesso, à permanência e a uma boa escola para todos.

Outras Diretrizes1 foram publicadas e constituem um arcabouço de disseminação de

princípios norteadores para a Educação Básica Nacional que fortalecem o ideário do Plano

1Parecer CNE/CP nº 03/2004 – Resolução nº 01, 17/06/2004 – Institui Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-

Brasileira e Africana;

Parecer CNE/CEB nº 23/2007 – Resolução nº 2, 28/04/2008 – Estabelece Diretrizes complementares,

normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação básica

do Campo;

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Nacional de Educação (PNE) -Lei nº 13.005/2014, notoriamente a construção do Sistema

Nacional de Educação, como previsto no Artigo 13 desta lei: “O poder público deverá

instituir, em lei específica, contados 2 (dois) anos da publicação desta Lei, o Sistema Nacional

de Educação, responsávelpela articulação entre os sistemas de ensino, em regime de

colaboração, para efetivação das diretrizes, metas eestratégias do Plano Nacional de

Educação”.

1.4.2 O Plano Nacional de Educação – Lei nº 13.005/14

NoIV Seminário de Educação Brasileira. PNE em foco: Políticas de

responsabilização, regime de colaboração e sistema nacional de educação, promovido em

2013 pelo Centro de Estudos Educação e Sociedade – CEDES, sediado na Universidade de

Campinas/Unicamp, na mesa redonda Direito à educação no Brasil e Sistema Nacional de

Educação: Articulações necessárias para sua garantia, o Professor Dermeval Saviani iniciou

afirmando sobre o “Proclamado Direito à Educação e o protelado dever do

Estado”.(SAVIANI, 2013)

Um dos propósitos deste Seminário foi abordar

(...) as condições e possibilidades de se assegurarum padrão equitativo de

financiamento em países marcados pelas desigualdades entre os diferentes

níveis de governo. A efetivação de um Sistema Nacional de Educação

deverá considerar, além das mencionadas situações de desigualdade, aquelas

relacionadas às diferenças de classe na estrutura federativa do Estado

Parecer CNE/CEB nº 20/2009 - Resolução nº 5, 17/12/2009 – Fixa Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Educação Infantil;

Parecer CNE/CEB nº 13/2009 - Resolução nº 4, 02/10/2009 – Institui Diretrizes Operacionais para o

Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial;

Parecer CNE/CEB nº 11/2010 – Resolução nº 7, 14/12/2010 – Fixa Diretrizes Curriculares Nacionais

para o Ensino Fundamental de nove anos;

Parecer CNE/CEB nº 05/2011 – Resolução nº 2, 30/01/2012 – Define Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Ensino Médio;

Parecer CNE/CP nº 08/2012 – Resolução nº 1, 30/05/2012 – Estabelece Diretrizes Nacionais para a

Educação em Direitos Humanos;

Parecer CNE/CEB nº 13/2012 – Resolução nº 5, 22/06/2012 – Define Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Escolar Indígena na Educação Básica;

Parecer CNE/CP nº14/2012 – Resolução nº 2, 15/06/2012 – Estabelece as Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Ambiental;

Parecer CNE/CEB nº 16/2012 – Resolução nº 8, 20/11/2012 – Define Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica.

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brasileiro e às condições espaciais nas áreas urbanas e rurais, entre outras.

(CEDES,2013, p.9)

Acompanhar e avaliar o PNE, que é uma política de Estado, em um país com a

diversidade regional, econômica, social e de escolarização como o Brasil,articulando a criação

de um Sistema Nacional de Educação é o nosso desafio para garantir o que determina a

Constituição Federal de 1988, que proclama a educação como “direito de todos e dever do

Estado e da família”e ainda afirma que “o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito

público subjetivo”. Essas conquistasforam ampliadas coma Emenda Constitucional nº59/09:

“direito à educação dos quatro aos dezessete anos”, e pela Lei nº12.796/13 que afirma a

obrigatoriedade da educação básica a partir dos quatro anos deidade.

Os debates em torno de um Plano para a educação nacional não estão acima dos

interesses econômicos, políticos e ideológicos que constituem as forças sociais que disputam

a hegemonia no poder. Fato é que o Plano Nacional de Educação (PNE) tramitou por três anos

e meio no Congresso Nacional e no Senado Federal onde as forças hegemônicas

conservadoras alteraram sutilmente alguns pontos como os que tratam das questões de

igualdade de gênero, raça e orientação sexual na escola, que haviam sido discutidos

amplamente naConferência Nacional de Educação2 (CONAE, 2010) e ampliadas nas

Emendas apresentadas pelos movimentos sociais.

Outro fato que marca a importância deste debate é que a construção do PNE a partir do

Projeto de Lei (PL 8.035/20103) encaminhado pelo Presidente Luis Inácio Lula da Silva e

pelo Ministro da Educação Fernando Haddad, em 15 de dezembro de 2010, só foi aprovado

pela Câmara dos Deputados e pelo Senado e sancionado pela Presidenta Dilma Rousseff em

25 de junho de 2014 (Lei nº 13.005/14). A demorada tramitação e os debates acirrados em

torno do financiamento da educação e fonte dos recursosdemonstra que as forças

hegemônicas da Câmara dos Deputados e Senado Federal estão articuladas para preservar

2A Conferência contou com a participação de 4 milhões de pessoas e foi organizada em etapas

municipais, estaduais, distrital e federal, discutiu as diretrizes para o PNE a partir da situação da

educação no Brasil. 3A primeira versão do PL 8035/2010 recebeu mais de 2900 emendas, o maior número desugestões já

recebido por um projeto de lei desde a Constituição Federal. Isso significa que hámuitos interesses em

jogo e também há muita vontade e compromisso da sociedade civil emparticipar da definição dos

rumos da educação no Brasil. Encarte “PNE pra valer – Campanha Nacional pelo Direito à Educação/

2013”. Disponível em: <http://pnepravaler.org.br/>. Acesso em: 15 dez. 2013.

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suas posições no debate educacional. Essas forças se organizam em Organizações Não-

Governamentais e Institutos que defendem interesses de grupos econômicos4.

O debate pela aprovação da aplicação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do país

em políticas públicas em educação foi um dos avanços neste PNE, porém, foram várias as

críticas de que o Plano não atendeu às expectativas discutidas e aprovadas na Conferência

Nacional de Educação (CONAE, 2010).

A Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e o

recém aprovado Plano Nacional de Educação são as bases para construção do Sistema

Nacional de Educação. No Sistema Nacional de Educação serão definidas as competências

comuns, autonomia federativa, articulação e responsabilidades entre os sistemas de ensino

Federal, Estadual, Distrital e Municipal, que deveram atuar em regime de colaboração.

O Plano Nacional de Educação suscita ainda outras discussões urgentes como a

regulamentação da Lei nº 12.858 que destina parte dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal e

dos royalties do petróleo para educação. Outra urgência é a construção democrática dos

planos estaduais e municipais de educação.

Como anunciamos no início o “proclamado direito à educação” tem no Plano Nacional

de Educação e na criação de um Sistema Nacional de Educação a oportunidade de alavancar e

garantir o direito à educação para todos e superar o “protelado dever do Estado”.Como

escreveu Saviani:

Contudo, como sabemos, importa distinguir entre a proclamação de direitos

e a sua efetivação. A cada direito corresponde um dever. Se a educação é

proclamadacomo um direito e reconhecido como tal pelo poder público, cabe

a esse podera responsabilidade de prover os meios para que o referido direito

se efetive. Eisporque se impôs o entendimento de que a educação é direito

do cidadão e dever doEstado. E, para dar cumprimento a esse dever

garantindo, em consequência, o direitoaeducação, os principais países se

empenharam, a partir da segunda metade do século XIX, em implantar os

respectivos sistemas nacionais de educação, erigidos nocaminho efetivo para

universalizar a escola básica. Vê-se, pois, que o papel do SistemaNacional

de Educação é dar efetividade àbandeira da escola pública

universal,obrigatória, gratuita e laica. (SAVIANI, 2013, p.745)

4Grupos econômicos das grandes corporações, representados por Organizações Não Governamentais e

Institutos, pregam suposta neutralidade nas questões educacionais e apóiam às políticas gerencialistas

em educação, principalmente a meritocracia e a privatização. Defendem ainda uma organização do

currículo através da padronização, em forma de apostilamentos, e o controle do trabalho docente por

“especialistas” de empresas de assessoria pedagógica. (ADRIÃO, 2009; FREITAS, 2012)

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O PNE apresentou avanços graças à participação e organização da sociedade civil que,

nos últimos anos, em uma permanente pressão junto ao Congresso Nacional,conseguiu a

aprovação dos pontos que tratam da elaboração do Sistema Nacional de Educação Básica

(Sinaeb), a equiparação de salários dos profissionais do magistério das redes públicas ao de

profissionais com escolaridade equivalente e a implementação do Custo Aluno-Qualidade

Inicial (CAQi), em que a União deverá complementar financeiramente todos estados e

municípios que não conseguirem atingir o valor do CAQi. Porém o parágrafo 5º do artigo 5º

manteverecursos públicos para as parcerias público-privadas quando contabiliza como

investimento em educação pública o Prouni (Programa Universidade para Todos), o Fies

(Financiamento Estudantil), Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e

Emprego) e o convênio com creches e pré-escolas privadas. A destinação de recursos públicos

para as parcerias público-privadas teve forte apoio dos grupos econômicos ligados às

Universidades Privadas no Congresso Nacional, principalmente aquelas que oferecem a

modalidade de Ensino a Distância (EaD).

Apresentamos neste capítulo,Direito à aprendizagem e universalização do ensino,

como historicamente este ideário foi se constituindo na sociedade brasileira em movimentos

de avanços e retrocessos. O nosso propósito maior é entender como os projetos de

recuperação de aprendizagem e às questões relativas ao direito à aprendizagem têm sido

apreendidos pelos professores dos anos finais do ensino fundamental e resgatar a história da

educação, da legislação e da construção de políticas públicas recentes foi fundamental. No

próximo capítulo discutiremos a questão da garantia do direito à educação a partir da

organização do processo ensino-aprendizagem.

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42

CAPÍTULO 2

O PROCESSO ENSINO -APRENDIZAGEM NA PERSPECTIVA DA GARANTIA DO

DIREITO À APRENDIZAGEM

Como discutimos no capítulo anterior a garantia do direito à educação para todos

avançou significativamente no campo legal, porém, consideramos que, mesmo com o debate

intenso nas últimas décadas, avançamos timidamente no campo didático-metodológico. Ainda

carregamos aquilo que Mizukami tratou como abordagem tradicional:“uma abordagem do

processo ensino-aprendizagem que não se fundamenta implícita ou explicitamente em teorias

empiricamente validadas, mas numa prática educativa e na sua transmissão através dos anos”.

(MIZUKAMI,1986,p.7)

Neste campo didático-metodológico, em que pouco avançamos, é comum a discussão

sobre a organização da escolarização organizada em ciclos de aprendizagem. Diversos

estudos (ARROYO, 1999; FERNANDES, 2005;FREITAS,2007;MAINARDES, 2007;

ALAVARSE,2009) têm apontado que a proposta de uma escola organizada em ciclos de

aprendizagem pressupõe uma nova organização curricular e cultural no interior da escola.

Este é nosso desafio: o direito à educação não significa apenas que as crianças entrem e

permaneçam na escola, mas, a garantia de que aprendam em uma escola organizada para

atender a todos.

Neste estudo, que tem foco na rede estadual de ensino de São Paulo, optamos por

discutir esse tema a partir dos projetos denominados Recuperação de Aprendizagem. Para

isso, realizaremos breve revisão bibliográfica sobre o tema; descreveremos os projetos de

recuperação de aprendizagem implantados na rede estadual na última década e;

descreveremos a atual proposta de recuperação de aprendizagem conforme a Resolução SEnº

53/14. Discutiremos este tema centralizando nos anos finais do ensino fundamental, campo

desta tese.

2.1 Sobre estudos que tratam do tema Recuperação de Aprendizagem

O tema recuperação de aprendizagem tem sido discutido em diversas pesquisas na

última década, sempre associado à questão da reprovação escolar.

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Vitor Henrique Paro, no livro “Reprovação Escolar, renúncia à educação” (2001),

comenta pesquisa que realizou em escola da rede pública municipal de São Paulo em 1999.

Um dos problemas levantados pelo autor é “a resistência docente à promoção de estudantes

do ensino fundamental” (PARO, 2001,p.16). Neste estudo o tema recuperação foi inevitável e

é assim apresentado:

Mas a recuperação, paralela ou a posteriori, se for destacada do processo

escolar normal, parece constituir mais um remendo do que solução. Já que

não se conseguiu fazer com que parte dos alunos alcançasse o desempenho

esperado, dá-se-lhe reforço e recuperação. Por que não tomar medidas que

evitem o problema, tornando o ensino efetivamente eficaz, em vez de só

remediá-lo? Se a recuperação surge como medida paralela – ou posterior –

ao processo normal de ensino, como elemento corretor ou “recuperador”

desse processo, ela assume já uma conotação de certo modo negativa, ao

reconhecer que o processo “normal” de aprendizagem não se deu da forma

que se desejava. A prescrição desse remédio já traz embutida uma

reprovação ao mal que ele pretende corrigir ou “recuperar”. (PARO, 2001, p.

136-137)

Elliot (2009) em estudo realizado no Programa de Pós-Graduação em Educação:

Currículo, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 2009, intitulado “Estudos de

Recuperação Paralela na Proposta Curricular do Estado de São Paulo (Gestão 2007-2010)”,

teve como objetivo analisar criticamente os projetos de recuperação paralela e reforço

constantes na proposta curricular da rede estadual de ensino de São Paulo. Na pesquisa de

campo, com produção de dados através de entrevistas com alunos dos anos iniciais, registrou

como eles percebem os projetos de recuperação e a relação destes com a aprendizagem. A

pesquisadora constatou:

(...) que há um enorme distanciamento entre o prescrito pela legislação e o

que ocorre na prática no contexto escolar. Leis, decretos, deliberações e

resoluções relacionadas a projetos de recuperação têm servido, apenas, ao

oferecimento de uma resposta formal à demanda de superar o fracasso

escolar. (...) Aos idealizadores desse projeto para a educação paulista

reservou-se a implantação de estudos de recuperação sem que os professores

participassem, sem que se levassem em conta as especificidades de cada

escola. Nesse sentido, o professor passou a ser um mero reprodutor dessas

políticas públicas que recebem a marca de um governo centralizador e do

aluno, um recipiendário delas” (ELLIOT, 2009, p.138)

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Outro importante estudo foi desenvolvido por Caldas (2010). Utilizando-se do

referencial teórico da psicologia histórico-cultural a pesquisadora discute a recuperação

escolar como estratégia pedagógica da escola para auxiliar os alunos que não aprendem. A

pesquisa, do tipo etnográfica, utilizou entrevistas com alunos, mães, professoras e

coordenadoras, além de documentos oficiais, legislações e observação participante. Afirma

que a pesquisa mostrou grande distanciamento entre as propostas oficiais e sua concretização

na escola e que o sentido da recuperação configura-se mais como espaço de

“impossibilidades” do que de “potencialidades”.“O processo de recuperação escolar revelou

um efeito esmagador para os envolvidos. Sofrimento e sentimentos negativos em relação às

atividades exercidas na escola foram relatados por alunos, professoras, coordenadora

pedagógica, diretora e mães”. (CALDAS, 2010, p.223).

E completa afirmando que o oferecimento da recuperação passa a ser retórica quando a

principal razão de ser da escola não foi cumprida:

A recuperação põe-se como medida para solucionar as dificuldades

encontradas pelos alunos em seu processo de aprendizagem, no entanto, à

medida que sua concretização na escola aponta muito mais para a

discriminação e rotulação do que para a superação dos obstáculos, é possível

afirmar que a recuperação escolar vem sendo instrumento de mascaramento

da realidade e, consequentemente, de alienação. (CALDAS, 2010, p.212)

Jacomini(2010)analisando as concepções de pais e alunos sobre a progressão

continuada e a implantação dos ciclos na rede municipal de São Paulo, discute as políticas de

contenção da reprovação “como tentativa de mudar o eixo ordenador da escola e como meio

de impulsionar a discussão e a luta pela construção de uma qualidade social da escola para

todos” (JACOMINI, 2010, p.251). No nosso entendimento a recuperação oferecida aos que

não aprenderam constitui apenas um movimento dos governos para justificar suas políticas

em educação que se têmconfigurado como acríticas e que não atacam a origem do problema:

o eixo ordenador da escola permanece sustentado sobre bases seletivas, homogeneizadoras e

excludentes.

Jeffrey (2011) reafirma em suas pesquisas sobre a progressão continuada e as políticas

de não reprovação na rede estadual de ensino de São Paulo “o fato de o professor não ser

incorporado ativamente no processo de implementação da medida pela SEE-SP e do

conservadorismo pedagógico que caracteriza, historicamente, o posicionamento destes

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profissionais diante das mudanças” (JEFFREY, 2011, p.20). Podemos considerar que este é o

circulo vicioso deste processo: as políticas de não reprovação são formuladas por

especialistas do governo, não contam com a participação dos professores e comunidade

escolar e, tão pouco, alteram o eixo ordenador conservador e tradicional da escola e, a

recuperação da aprendizagem, é o grande mote que sintetiza o fracasso escolar dos que não

aprendem e precisam de nova oportunidade.

Gualtieri e Lugli (2012) afirmam que a questão do fracasso escolar“é um problema

multifacetado e historicamente persistente para o qual a solução não será jamais elaborada de

modo isolado nem se viabilizará se não for alterado o modelo de organização escolar vigente”

(GUALTIERI; LUGLI, 2012, p.13). As práticas naturalizantes da escola para justificar o

fracasso escolar são reforçadas por projetos de recuperação pensados e elaborados por

equipes técnicas dos órgãos centrais dos governos que, comumente, fixam modelos

específicos de Turmas de Recuperação, de Recuperação de Ciclo, de Recuperação nas Férias

e outros, configurando e reforçando a lógica da exclusão no interior da escola “já que a

exclusão física tem sido praticamente impossível, por força da lei e considerada, além disso,

como indício de falta de competência pedagógica”(GUALTIERI; LUGLI, 2012, p.82)

As pesquisas têm apontado para a presença do ideário da reprovação5 escolar presente

no discurso dos gestores, professores, pais e alunos. A crença na reprovação escolar ainda

persiste como medida de austeridade, de controle, de disciplinamento e de auxílio para

melhoria do ensino e os projetos de recuperação de aprendizagem são suportes deste modelo

perverso para justificar que alguns não aprendem.

2.2 A persistência da reprovação escolar e a negação do direito à educação

Para iniciarmos esta discussão sobre a persistência da reprovação escolar na rede estadual

de ensino de São Paulo reproduzimos duas tabelas que apresentam as Taxas de Rendimento no

ensino fundamental- 2011 no Brasil (tabela II) e, Taxas de Rendimento no ensino fundamental –

2012 em São Paulo (tabela III)

5 Optamos neste trabalho por utilizar a expressão Reprovação Escolar por ser o termo comumente

utilizado nas escolas pelos alunos, pais, professores e gestores. Na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional – LDBEN 9394/96 é comum o termo promoção.

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Tabela II – Taxas de rendimento no ensino fundamental (Brasil, 2011)

Brasil Total Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º

1996

Aprovação

71,8 72,2 71,4 - 63,1 72,2 77,2 81,1 63,6 71,2 75,7 81,2

2011

Aprovação

87,6 91,2 83,3 96,5 91,9 87,1 90,9 90,5 80,1 83,4 85,2 85,4

1996

Reprovação

13,9 14,6 12,7 - 18,5 16,2 12,2 9,0 16,7 13,5 10,2 7,1

2011

Reprovação

9,6 7,3 12,4 2,1 6,7 11,4 7,5 7,8 15,3 12,7 10,7 10,3

1996

abandono

14,3 13,2 15,9 - 18,4 11,6 10,6 9,9 19,7 15,3 14,1 11,7

2011

Abandono

2,8 1,5 4,3 1,4 1,4 1,5 1,6 1,7 4,6 3,9 4,1 4,3

Fonte: IBGE/Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 2011. Adaptado pelo autor.

Tabela III – Taxas de rendimento no ensino fundamental (São Paulo, 2012)

São Paulo Total Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º

1996

Aprovação 83,8 86,8 80,5 95,0 75,7 88,6 92,3 75,0 79,2 83,2 87,8

2012

Aprovação 93,0 97,3 91,4 - - - 95,2 94,4 93,9 92,5 84,7

1996 Reprovação 8,6 8,9 8,3 - 19,7 7,7 3,9 12,3 9,1 6,2 3,4

2012 Reprovação 4,9 1,8 6,0 - - - 3,9 3,4 4,1 5,0 11,3

1996

abandono 7,6 4,3 11,2 5,0 4,6 3,7 3,8 12,7 11,7 10,6 8,8

2012

Abandono 2,1 0,9 2,6 - - - 1,0 2,1 2,1 2,5 4,0

Fonte: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação

educacional, 2012. Adaptado pelo autor.

Em 1996 a aprovação escolar no Brasil era de 71,4% nos anos finais do Ensino

Fundamental. Em 2011 este número subiu para 83,3%, um acréscimo de 11,9% no número de

alunos que obtiveram aprovação no final do ensino fundamental.

O abandono escolar em 1996 era de 15,9% e em 2012 foi de 4,3%, uma redução de

11,6%. Avanço considerável que apresenta resultado de políticas públicas de acesso e

permanência na escola, entre elas o Programa Bolsa Família (PBF), criado em 2003, que tem

em seus objetivos o “Reforço do direito de acesso das famílias aos serviços básicos nas áreas

de saúde, educação e assistência social, por meio das condicionalidades, o que contribui para

as famílias romperem o ciclo da pobreza entre gerações” (Secretaria Nacional de Renda de

Cidadania – Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – 2009).

Resumimos na tabela IV essas informações:

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Tabela IV- Aprovação/Abandono no ano final do ensino fundamental (Brasil,

1996/2011)

Aprovação - ano final do Ensino Fundamental 1996 - 71,4% 2011 – 83,3%

Abandono - ano final do Ensino Fundamental 1996 – 15,9% 2011 – 4,3%

Fonte: IBGE/Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 2011. Adaptado pelo autor.

A partir destes dados, relacionados à aprovação e abandono escolar, constatamos que

avanços foram obtidos nos últimos quinze anos, porém persistem números alarmantes em

relação à reprovação escolar.

A porcentagem de alunos reprovados no ano final do Ensino Fundamental no Brasil

era de 12,7%, em 1996,e em 2011 este número foi de 12,4%, de acordo com a tabela II –

Brasil, representada neste recorte (tabela V)

Tabela V - Reprovação – Anos iniciais e anos finais do ensino fundamental (Brasil, 1996-

2011) Brasil Total Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º

1996

Reprovação

13,9 14,6 12,7 - 18,5 16,2 12,2 9,0 16,7 13,5 10,2 7,1

2011

Reprovação

9,6 7,3 12,4 2,1 6,7 11,4 7,5 7,8 15,3 12,7 10,7 10,3

Fonte: IBGE/Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 2011. Adaptado pelo autor.

Em São Paulo (tabela VI – recorte da tabela III) a reprovação escolar passa de 3,4%,

em 1996, para 11,3% no ano final do ensino fundamental em 2012. As variações apontadas

correspondem, no entendimento deste pesquisador, às distorções e alterações das políticas

públicas em educação implantadas na rede de ensino de São Paulo que pouco alteraram este

cenário.

Tabela VI - Reprovação – Anos iniciais e anos finais do ensino fundamental(São Paulo,

1996/2012) São Paulo Total Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º

1996

Reprovação 8,6 8,9 8,3 - 19,7 7,7 3,9 12,3 9,1 6,2 3,4

2012

Reprovação 4,9 1,8 6,0 - - - 3,9 3,4 4,1 5,0 11,3

Fonte: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação

educacional, 2012. Adaptado pelo autor.

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Em São Paulo a partir de 1997, com a instituição do regime de progressão continuada

no ensino fundamental, os números se invertem quando verificamos a reprovação escolar.

Tabela VII- Ensino fundamental de8 Anos – Rede Estadual de São Paulo - Taxas de

Reprovação por Série (São Paulo, 1996/2012)

Série

1ª Série 2ª Série 3ª Série 4ª Série 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série Ano

1996 - 19,7 7,7 3,9 12,3 9,1 6,2 3,4

1997 - 9,0 2,7 1,2 5,1 4,2 3,4 2,5

1998 0,8 1,5 0,8 1,5 2,9 2,7 2,4 2,1

1999 0,9 1,1 1,2 4,8 4,0 4,0 3,9 3,8

2000 1,1 1,1 1,1 6,5 5,1 5,2 5,3 5,9

2001 1,1 1,1 1,0 10,0 5,3 5,0 5,3 8,6

2002 1,4 1,3 1,3 6,2 5,3 6,2 6,1 8,6

2003 1,5 1,3 1,3 7,9 4,9 5,3 6,4 11,1

2004 2,0 1,6 1,4 8,4 5,3 6,1 6,8 13,9

2005 2,0 1,5 1,4 7,8 5,6 6,1 7,3 14,5

2006 2,4 1,7 1,7 8,7 6,3 6,9 7,9 16,4

2007 2,3 1,8 1,6 8,6 6,0 6,5 7,7 17,0

2008 1,7 1,2 1,1 7,0 5,2 5,9 7,1 15,4

2009 1,6 1,0 1,0 5,8 4,5 4,8 6,3 14,5

2010 - 1,1 1,0 5,3 3,4 4,2 5,3 12,3

2011 - - 1,3 5,3 3,8 4,4 6,1 13,7

2012 - - - 3,9 3,4 4,1 5,0 11,3 Fonte: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação

educacional, 2013. Adaptado pelo autor.

A reprovação escolar nas séries iniciais em 1996 chegava ao patamar de 19,7% e nas

séries finais caía para 3,4%.

No ano de 2005, oito anos após a instituição da progressão continuada, os números

apresentam reprovação escolar de 2,0% na primeira série; 7,8% na 4ª série; e o salto para

14,5% na 8ª série.

Em 2012 os números apresentam reprovação escolar de 3,9% na 4ª série e 11,3% na 8ª

série.

Os dados apresentados demonstram que pouco avançamos na garantia do direito à

educação em São Paulo, que é o Estado mais rico da Federação. Os números apenas se

invertem, antes reprovávamos na entrada (2ª série – 1996 – 19,7%). Hoje reprovamos na

saída (8ª série – 2012 – 11,3%), sem considerar os que são reprovados no percurso devido aos

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49

mais diversos fatores, entre eles a falta de um projeto político pedagógico consistente que dê

conta das variáveis que se apresentam no cotidiano escolar.

A seguir apresentaremos brevemente as Resoluções da Secretaria Estadual da

Educação na última década (2003-2013). Ao final apresentaremos a Resolução SEESP nº

53/14 que reorganiza a progressão continuada e os mecanismos de apoio escolar (Professor

Auxiliar) que tem em seu alicerce o propósito de “melhoria da qualidade da Educação Básica

(...) mediante o desenvolvimento de um ensino que assegure efetiva aprendizagem dos

alunos”, porém prevê que aquele aluno “que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o ciclo deverá permanecer por mais um ano em uma classe de recuperação

intensiva”(Resolução SEnº 53/14), o que, a princípio, reforça o ideário da reprovação escolar.

2.3 A reorganização da progressão continuada e os mecanismos de apoio escolar. A proposta

atual de Recuperação da aprendizagem na rede pública estadual de São Paulo

Para analisar os dados apresentados anteriormente sobre reprovação escolar é preciso

conhecer as políticas públicas da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo implantadas

na última década, que evidenciam os mecanismos de apoio escolar, conhecidos como

recuperação de aprendizagem.

Segundo o Centro de Informações Educacionais da Secretaria de Estado da Educação

(CIE-SEE, 2012) a rede estadual de ensino de São Paulo atende 4.383.648 alunos em 5.578

escolas com 233.533 professores e 60.624 funcionários. As 5.578 escolas são atendidas por

91 Diretorias Regionais de Ensino que, por sua vez, são subordinadas as Subsecretarias de

Articulação Regional e outras Coordenadorias, segundo o Decreto Estadual nº 57.141, de 18

de julho de 2011.

Na última década, a Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo, através

de Resoluções, implantou diversos projetos de recuperação/reforço nas escolas.

Elencamos e comentamos brevemente as principais desde 2003 e observamos que

foram nove Resoluções no espaço de uma década. Consideramos que as constantes alterações

na forma de disciplinar a recuperação afeta negativamente o cotidiano escolar e a prática

pedagógica dos professores.

- Resolução SE nº 135/03: Dispõe sobre o processo de atribuição de classes, turmas e

aulas dos projetos e modalidades de ensino que especifica. Disciplina a atribuição de classes e

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50

aulas dos projetos Correção de Fluxo (Aceleração) dos Ciclos I e II e de Recuperação de

Ciclo (I e II);

- Resolução SE nº 15/05: Dispõe sobre estudos de recuperação contínua e paralela na

rede estadual de ensino. Define recuperação contínua e recuperação paralela. A equipe escolar

deverá apresentar projeto proposto pelo Conselho de Classe/série para homologação pela

Supervisão de Ensino e Dirigente Regional de Ensino. Ciclo I (1º ao 4º ano) 3 aulas semanais,

Ciclo II (5º ao 8º ano) 2 aulas semanais, no pós-aulas;

- Resolução SE nº 32/05: Altera dispositivos da Resolução SE Nº 15/2005 que dispõe

sobre a recuperação paralela, no Ensino Fundamental das escolas estaduais. Escolas que

atendem em três turnos e/ou curso ciclo II (5º ao 8º ano) noturno poderão desenvolver aulas

de recuperação aos sábados;

- Resolução SE nº 01/06: Dispõe sobre o processo de atribuição de classes, turmas e

aulas de projetos e modalidades de ensino aos docentes do Quadro do Magistério. Estabelece

critérios e procedimentos para o processo de atribuição de classes;

- Resolução SE nº 40/08: Dispõe sobre estudos de recuperação na rede estadual de

ensino. Define, no artigo 1º, recuperação contínua, paralela, intensiva, de ciclo. Afirma e

evidencia que “os indicadores de aprendizagem do aluno evidenciados nas avaliações

externas, principalmente no Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São

Paulo (Saresp), demonstram a necessidade de efetiva ação [recuperação] para melhoria da

qualidade de ensino”.

Art. 1º - A recuperação da aprendizagem constitui mecanismo colocado à

disposição da escola e dos professores para garantir a superação de

dificuldades específicas encontradas pelos alunos durante o seu percurso

escolar e ocorre de diferentes formas, a saber:

I - contínua: a que está inserida no trabalho pedagógico realizado no dia a

dia da sala de aula, constituída de intervenções pontuais e imediatas, em

decorrência da avaliação diagnóstica e sistemática do desempenho do aluno;

II - paralela: destinada aos alunos do ensino fundamental e médio que

apresentem dificuldades de aprendizagem não superadas no cotidiano

escolar e necessitem de um trabalho mais direcionado, em paralelo às aulas

regulares, com duração variável em decorrência da avaliação diagnóstica;

III - intensiva: destinada aos alunos do ensino fundamental e médio que

apresentem necessidade de superar dificuldades e competências básicas

imprescindíveis ao prosseguimento de estudos em etapa subsequente, a

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ocorrer em períodos previamente estabelecidos e na conformidade dos

procedimentos a serem estabelecidos em ato normativo próprio;

IV - de ciclo: constitui-se em um ano letivo de estudos para atender aos

alunos ao final de ciclos do Ensino Fundamental que demonstrem não ter

condições para prosseguimento de estudos na etapa posterior.(Resolução SE

nº 40/08)

- Resolução SE nº 18/09: Dispõe sobre estudos de recuperação nas escolas da rede

estadual de ensino. Acrescenta no artigo 5º § 4º, aulas de recuperação no “período de recesso

do mês de julho (...) será ampliada para quatro aulas diárias, a fim de atender os alunos que

ainda não têm domínio satisfatório das competências lingüísticas e lógico-matemáticas”.

Reforça a avaliação externa (Saresp) como indicador da aprendizagem do aluno. A Instrução

da Coordenadoria de Ensino e Normas Pedagógicas (CENP), de 26/03/2009, acrescenta que

as aulas de recuperação “poderão ser desenvolvidas antes ou após o término das aulas diárias,

desde que assegurada a regularidade das demais atividades previstas pela escola”;

- Resolução SE nº 93/09: Dispõe sobre estudos de recuperação aos alunos do ciclo II

do ensino fundamental e do ensino médio, das escolas da rede pública estadual. O artigo 3ºe o

artigo 4º desta resolução possibilitavam maior autonomia para a escola organizar os projetos,

além de tornar a jornada do professor da recuperação mais objetiva, passando de 2 aulas na

pré ou pós-aula, como determinavam as resoluções anteriores, para blocos de 10 aulas

organizados de acordo com o projeto. O grande entrave desta resolução foi que os alunos

frequentariam as aulas de recuperação no contraturno, o que dificultou o trabalho da escola e

do professor por várias razões, entre elas: transporte escolar; motivação dos alunos para

retornar à escola no contra-turno; dificuldade de parte dos professores em diversificar a aula

no contra-turno, entre outras.

Artigo 3º - As unidades escolares com classes de ensino regular de ciclo II

do ensino fundamental e/ou de ensino médio passarão a contar com

conjuntos indivisíveis de 10 (dez) aulas de Língua Portuguesa e de 10 (dez)

aulas de Matemática, destinadas ao desenvolvimento das atividades de

recuperação que se fizerem necessárias ao longo do ano letivo, na seguinte

conformidade:

I - escolas com até 15 (quinze) classes, 1 (um) conjunto de cada disciplina;

II - escolas com 16 (dezesseis) a 29 (vinte e nove) classes, 2 (dois) conjuntos

de cada disciplina, e

III - escolas com 30 (trinta) ou mais classes, 3 (três) conjuntos de cada

disciplina.

Artigo 4º (...)

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52

Parágrafo único - Caberá à Equipe Gestora, juntamente com os professores

responsáveis pela recuperação, organizar as formas e o tempo de

atendimento necessários à superação das dificuldades dos alunos.

Artigo 5º - o apoio aos alunos do ciclo II e/ou do ensino médio que

necessitem de atendimento específico dar-se-á:

I - prioritariamente, em grupos de alunos do mesmo nível de ensino,

organizados por classe/série, por dificuldades de aprendizagem ou por outros

critérios;

II - em caráter excepcional, e de forma individualizada, para aqueles alunos

que necessitam, temporariamente, de um trabalho específico.(Resolução SE

nº 93/09)

A seguir aprofundaremos a explicação sobre as Resoluções mais recentes: Resolução

SE nº 02/12; Resolução SE nº 74/13 e Resolução SE nº 53/14. Esta última trata sobre a

reorganização do ensino fundamental em regime de progressão continuada e os mecanismos

de apoio escolar (Professor Auxiliar).

- A Resolução SE nº 02/12 que dispõe sobre mecanismos de apoio escolar aos alunos

do ensino fundamental e médio da rede pública estadual, merece destaque. Foi anunciada

como um dos alicerces do programa Educação Compromisso de São Paulo implantado pelo

Governo do Estado em 15 de outubro de 2011 como eixo do projeto que pretende melhorar a

qualidade da educação “para que alcancemos nosso objetivo de posicionar a rede estadual de

ensino entre os 25 melhores sistemas de educação do mundo até 2030”(SEE/Coordenadoria

de Gestão da Educação Básica, 2012).

O Programa “Educação Compromisso de São Paulo” (2011), apresenta cinco eixos

(SÃO PAULO, 2011):

1- Valorizar e investir no desenvolvimento do capital humano;

2- Aprimorar as ações e a gestão pedagógica com foco no resultado dos alunos;

3- Mobilizar, engajar e responsabilizar a rede, os alunos e a sociedade em torno do

processo ensino-aprendizagem;

4- Viabilizar mecanismos organizacionais e financeiros; e

5- Lançar as bases de um novo modelo de escola e um novo regime de carreira do

magistério.

Para viabilizar os eixos 2 e 3 do Programa “Educação Compromisso de São Paulo”, a

Secretaria da Educação publicou a Resolução SE nº 2/12, que dispõe sobre “mecanismos de

apoio escolar aos alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual”.

A referida Resolução assim inicia:

O Secretário da Educação, considerando:

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53

- o direito de o aluno apropriar-se do currículo escolar de forma contínua e

bem sucedida, nos ensino fundamental e médio;

- a pluralidade de características e de ritmos de aprendizagem dos alunos no

percurso escolar;

- a necessidade de atendimento à diversidade de demandas apontadas nos

diferentes diagnósticos escolares;

- a importância da adoção de alternativas operacionais diversificadas que

promovam aprendizagens contínuas e exitosas; e

- a importância de mecanismos de apoio que subsidiem a atuação do

professor nas suas atribuições de organização, desenvolvimento,

acompanhamento e avaliação do ensino e da aprendizagem do aluno,

resolve:(Resolução SE nº 2/2012)

Apresentamos quadro resumo da Resolução SE nº 2/12

Quadro I. Síntese da Resolução SE nº 2/12 Artigo 3º

(Resolução SE

nº 2/12)

Estabelece

duas formas

de

Recuperação

RECUPERAÇÃO

CONTÍNUA

RECUPERAÇÃO INTENSIVA

I – Recuperação Contínua,

com atuação de Professor

Auxiliar (PA) em classe regular

do ensino fundamental e médio,

em conjunto com o professor da

turma;

II – Recuperação Intensiva no ensino fundamental, constituindo

classes (RI) em que se desenvolverão atividades de ensino

diferenciadas e específicas

Quem pode

ser Professor

Auxiliar

(PA)?

I - docente titular de cargo, que

se encontre na situação de adido,

sem descaracterizar essa

condição, ou a título de carga

suplementar de trabalho;

Como?

Estrutura-se em quatro etapas:

II - docente

ocupante de

função-

atividade,

(categoria

F), para

composição

ou

complement

ação de sua

carga

horária de

trabalho;

III -

candidatos à

contratação

temporária.

Somente poderá

haver atribuição,

como Professor

Auxiliar, na

comprovada

inexistência de

classe ou de aulas

que lhes possam

ser atribuídas, no

processo regular

de atribuição, em

nível de unidade

e Diretoria de

Ensino.

1- classe do 4º ano, constituída por alunos

que, após os 3 (três) anos anteriores,

continuem demandando mais oportunidades

de aprendizagem...

2- organizada como classe do 5º ano,

constituída por alunos que necessitem de

estudos específicos, na seguinte

conformidade:

alunos

egressos do 4º

ano que

continuem

demandando

mais

oportunidades

de

aprendizagem..

.

alunos que apresentem, ao

término do 5º ano,

resultados insatisfatórios

que impliquem a

necessidade de frequentar

mais 1 (um) ano letivo,

podendo, de acordo com o

diagnóstico de suas

dificuldades,integrar uma

classe de RI ou uma classe

regular de 5º ano...(média

20 alunos por sala)

3- organizada como classe do 7º ano,

constituída por alunos que, egressos do 6º

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54

ano, continuem demandando mais

oportunidades de aprendizagem...

4- organizada como classe do 9º ano,

constituída por alunos que necessitem de

estudos específicos, na seguinte

conformidade:

alunos

egressos do 8º

ano que

continuem

demandando

mais

oportunidades

de

aprendizagem..

.

alunos que apresentem, ao

término do 9º ano,

resultados insatisfatórios

que impliquem a

necessidade de frequentar

mais 1(um) ano letivo,

podendo, de acordo com o

diagnóstico de suas

dificuldades,integrar uma

classe de RI ou uma classe

regular de 9º ano... (média

20 alunos por sala)

Qual a função

do Professor

Auxiliar?

...terá como função precípua

apoiar o professor responsável

pela classe ou disciplina no

desenvolvimento de atividades

de ensino e de aprendizagem, em

especial as de recuperação

contínua, oferecidas a alunos dos

ensinos fundamental e médio,

com vistas à superação de

dificuldades.

Quem indica os

alunos para RI?

Professores indicam no Conselho Final

Como?

...ouvido o professor responsável

pela classe ou disciplina,

simultaneamente às atividades

desenvolvidas no horário regular

de aula, mediante atendimento

individualizado ou em grupo,

que propicie condições

necessárias ao aluno para

aprender nas situações de ensino

asseguradas à classe.

Quem assume a

turma no ano

seguinte?

Professores, na ocasião do Conselho Final,

poderão ser indicados a assumir a turma no

ano seguinte.

Critérios sobre

número

mínimo de

alunos em sala

de aula para

comportar

Professor

Auxiliar

Mínimo de 25 alunos no ensino

fundamental

Mínimo de 30 alunos no ensino

médio

Como é a

atribuição de

aulas das turmas

de RI?

A atribuição de classes e de aulas de

recuperação intensiva dar-se-á conforme as

regras do processo regular de atribuição de

classes e aulas.

Número de

aulas para

atuação do

Professor

Auxiliar

- Nos anos iniciais do ensino

fundamental até 10 aulas em

cada classe;

- Nos anos finais do EF e no EM

poderão contar com até 3 (três)

Professores Auxiliares e poderão

ser desenvolvidas em até 3 (três)

aulas semanais por classe e no

horário regular de aula. Três

aulas semanais por classe

A quem compete

à montagem das

turmas de RI?

Caberá à equipe gestora, ouvido o professor

da classe ou da disciplina, decidir sobre a

utilização dos mecanismos de apoio escolar,

de que tratam os incisos I e II do artigo 3º,

em reunião do Conselho de Classe/Ano, com

parecer do Supervisor de Ensino da unidade

escolar e homologação do Dirigente Regional

de Ensino.

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55

divididas por até três disciplinas.

Máximo 30 aulas semanais, mais

ATPC.

- A Resolução SE nº 74/13 dispõe sobre a reorganização do Ensino Fundamental em

Regime de Progressão Continuada.

Em 02 de outubro de 2014 a Resolução SE nº 53/14 revoga as Resoluções SE nº 02/12

e a Resolução SE nº 74/13.

- Resolução SE nº 53/14: Dispõe sobre a reorganização do ensino fundamental em

regime de progressão continuada e sobre os mecanismos de apoio escolar aos alunos dos

ensinos fundamental e médio nas escolas estaduais. Esta Resolução é um agrupamento das

Resoluções SE nº 02/12 e SE nº 74/13.

Para o nosso propósito, que discute a questão dos projetos de recuperação de

aprendizagem e da reprovação escolar, essa resolução é fundamental. Apresentamos os

Artigos 4º, 5º, 6º e 7º da Resolução SE nº 53/14:

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Quadro II. Artigos 4º, 5º, 6º e 7º da Resolução SE nº 53/14 Rede Estadual de Ensino de São Paulo - Resolução SE nº 53/14.

Grifos meus.

Artigo 4º - Os Ciclos de Aprendizagem, compreendidos como espaços temporais interdependentes e

articulados entre si, definem-se ao longo dos nove anos do Ensino Fundamental, na seguinte conformidade:

I - Ciclo de Alfabetização, do 1º ao 3º ano;

II - Ciclo Intermediário, do 4º ao 6º ano; e

III - Ciclo Final, do 7º ao 9º ano.

Artigo 5º - O Ciclo de Alfabetização (1º ao 3º ano) tem como finalidade propiciar aos alunos a

alfabetização, o letramento as diversas formas de expressão e de iniciação ao aprendizado de Matemática,

Ciências, História e Geografia, de modo a capacitá-los, até o final deste Ciclo, a fazer uso da leitura, da

linguagem escrita e das diversas linguagens utilizadas nas diferentes situações de vida, dentro e fora do

ambiente escolar.

§ 1º – Ao final do 3º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades previstas

para o Ciclo de Alfabetização, de que trata o caput deste artigo, deverá permanecer por mais um ano

neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 2º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de estudos no Ciclo de

Alfabetização, deverá continuar sua aprendizagem no Ciclo Intermediário.

Artigo 6º - O Ciclo Intermediário (4º ao 6º ano) tem como finalidade assegurar aos alunos a continuidade e

o aprofundamento das competências leitora e escritora, com ênfase na organização e produção escrita, em

consonância com a norma padrão, nas diferentes áreas de conhecimento.

§ 1º – No 4º e no 5º anos do Ciclo Intermediário, o ensino será desenvolvido, predominantemente,

por professor regente de classe e, a partir do 6º ano, por professores especialistas nas diferentes disciplinas

do currículo.

§ 2º – Caberá à equipe gestora e aos professores que atuam no Ciclo Intermediário promover

condições pedagógicas que assegurem aprendizagens necessárias à transição do ensino desenvolvido por

professor regente de classe e do desenvolvido por docentes especialistas.

§ 3º – Ao final do 6º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades previstas

para o Ciclo Intermediário, de que trata o caput deste artigo, deverá permanecer por mais um ano neste

Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 4º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de estudos no Ciclo

Intermediário, deverá continuar sua aprendizagem no Ciclo Final.

Artigo 7º - O Ciclo Final (do 7º ao 9º ano) tem como finalidade assegurar a consolidação das aprendizagens

previstas para este Ciclo, contemplando todo o currículo escolar estabelecido para o Ensino Fundamental.

§ 1º - Os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, promovidos em regime de progressão parcial,

com pendência em até 3 (três) disciplinas, poderão iniciar a 1ª série do Ensino Médio, desde que tenham

condições de se apropriar, concomitantemente, dos conteúdos das disciplinas pendentes do Ensino

Fundamental e das disciplinas da 1ª série do Ensino Médio.

§ 2º - Ao final do 9º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades previstas

para o Ciclo Final, na forma a que se refere o caput deste artigo, deverá permanecer por mais um ano

neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 3º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de estudos no Ciclo

Final, deverá concluir o Ensino Fundamental.

O que observamos nos artigos 4º, 5º, 6º e 7º da Resolução SE nº53/14 é a divisão do

ensino fundamental emtrês etapas de três anos cada, onde pode haver reprovação ao final de

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cada uma das etapas. Entendemos que, por possibilitar reprovação do aluno, durante o percurso

no ensino fundamental, o termo ciclo não é adequado, por isso, utilizamos o termo etapa.

Na rede estadual o aluno que for reprovado, dentro do que a legislação prevê, completará

o ensino fundamental em 12 anos se, com otimismo ingênuo, não houver evasão como resultado

das reprovações, contrariando a meta 2 do Plano Nacional de Educação – Lei nº

13.005/14:“universalizar o ensino fundamental de 9 (nove) anos para toda a população de 6

(seis) a 14 (quatorze) anos e garantir que pelo menos 95% (noventa e cinco por cento) dos alunos

concluam essa etapa na idade recomendada, até o último ano de vigência deste PNE”.

A Resolução SE nº 53/14 mantém a expressão “deverá permanecer por mais um ano

neste ciclo” que, no nosso entendimento, reafirma que a escola poderá reprovar os alunos ao

final do Ciclo de Alfabetização (1º ao 3º ano), ao final do Ciclo Intermediário (4º ao 6º ano) e

ao final Ciclo Final (7º ao 9º ano), o que contraria inclusive, no caso do Ciclo de

alfabetização, Parecer do Conselho Nacional CNE/CEB nº 11/10 e a Resolução CNE/CEB nº

07/10, que recomendam que os primeiros anos do ensino fundamental sejam organizados sem

reprovação escolar:

Artigo 30 § 1º Mesmo quando o sistema de ensino ou a escola, no uso de sua

autonomia, fizerem opção pelo regime seriado, será necessário considerar os

três anos iniciais do Ensino Fundamental como um bloco pedagógico ou um

ciclo sequencial não passível de interrupção, voltado para ampliar a todos

os alunos as oportunidades de sistematização e aprofundamento das

aprendizagens básicas, imprescindíveis para o prosseguimento dos estudos.

(RESOLUÇÃO CNE/CEB nº 7/10, grifos meus.)

Entendemos que “não passível de interrupção” significa dizer que no 1º, 2º e 3º anos

do Ensino Fundamental não poderá haver reprovação de alunos.

Legislar em educação com a perspectiva de que o aluno “deverá permanecer por

mais um ano”, como estabelecido na resolução SE nº 53/14, é reafirmar o sintomático papel

da escola seletiva e a negação do direito humano à educação.

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58

CAPÍTULO 3

MÉTODO

As contribuições da teoria sócio-histórica para compreensão do fenômeno educativo

Entre as explicações, acríticas e ingênuas, comumente utilizadas para justificar a

reprovação e o abandono escolar está a de que os alunos foram incapazes de aprender e suas

famílias não acompanharam a vida escolar de seus filhos.

Também de maneira ingênua atribuímos à escola a solução dos problemas sociais dos

mais diversos, como se a escola fosse a redentora dos problemas sociais, e capaz de resolver

tais problemas por meio de pretensos projetos e programas difundidos por governos e pela

iniciativa privada. A ideia da escola redentora da sociedade foi assim anunciada por Luckesi

como uma das tendências interpretativas sobre a função e o papel da escola e da educação:

A primeira das tendências – a tendência redentora - concebe a sociedade

como um conjunto de seres humanos que vivem e sobrevivem num todo

orgânico e harmonioso, com desvios de grupos e indivíduos que ficam à

margem desse todo. Ou seja, a sociedade está “naturalmente” composta com

todos os seus elementos; o que importa é integrar em suas estruturas tanto os

novos elementos (novas gerações), quanto os que, por qualquer motivo, se

encontram à sua margem. Importa, pois, manter e conservar a sociedade,

integrando os indivíduos no todo social. (LUCKESI, 1994, p.38)

A escola vista como redentora dos problemas sociais é uma forma de tratar o

complexo fenômeno da educação, a retenção e a evasão escolar, de forma reducionista.

Os reducionismos têm no liberalismo seu alicerce. O liberalismo, fundamento

ideológico do capitalismo, tem o individualismo como um dos conceitos fundamentais para

justificar e interpretar a sociedade e definir o indivíduo. É este conceito fundamental do

liberalismo, o individualismo, que tem alimentado as interpretações reducionistas sobre

educação. Sobre o individualismo Bock escreveu:

O individualismo, como valor subjacente à doutrina liberal, acredita terem os

homens propriedades universais e os indivíduos, em sua particularidade,

características e atributos diversos, e é de acordo com eles que ficam

determinados seus lugares sociais. O indivíduo escolhe, dedica-se e

responsabiliza-se pelo desenvolvimento desses atributos, que são, na

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verdade, seu potencial, potencial este que deve encontrar condições ideais

para seu desenvolvimento. Dadas as condições sociais adequadas, o

indivíduo torna-se o único responsável pelo seu sucesso ou fracasso.

(BOCK, 1999, p.39)

Focalizar no indivíduo a responsabilidade pelo seu fracasso ou sucesso no processo de

escolarização tem sido a tônica das organizações escolares, dos currículos, dos métodos e das

avaliações da aprendizagem. A escola, da forma como tem sido organizada, tem-se justificado

através do caráter seletivo das suas práticas, representando aquilo que é determinado pelas

estruturas econômicas e sociais do modelo capitalista: o mérito pessoal, a responsabilização

individual e a ética do mercado.

As organizações escolares preconizam o ajuste dos alunos fracassados ao modelo

existente sem questionar as práticas escolares e tão pouco questionam as estruturas

econômicas e sociais do modelo capitalista e as políticas públicas subjacentes desta

organização do Estado que, em tese, deveria garantir o direito à educação.

Em anos de prática em sala de aula e na gestão escolar na rede estadual de São Paulo

observamos que os alunos reprovados ou encaminhados para os projetos de recuperação da

aprendizagem, nas suas formas mais variadas, são os apontados como aqueles que não

aprendera‟, que não dominaram determinado conteúdo tradicionalmente estabelecido, que

não alcançaram determinado resultado.

Em estudo recente Caldas aponta a seguinte contradição apresentada pelos

participantes do estudo que realizou:

Contraditoriamente, embora haja nos discursos de quase todos os

participantes clareza a respeito das falhas estruturais e do impedimento da

concretização eficaz de políticas públicas ou de medidas educacionais,

como a recuperação, a responsabilização pelos resultados insatisfatórios

continua recaindo sobre os indivíduos (ora alunos, ora suas famílias, ora

professores) (CALDAS, 2010, p.215)

As escolas elaboram suas práticas e se organizam em relação à aprendizagem e ao

conhecimento humano em um arcabouço teórico positivista.

Bock, explicando o materialismo histórico e dialético, escreve que o positivismo pode

ser apresentado, de forma simplificada, a partir de três ideias principais:

Os fenômenos humanos e sociais são regulados por leis naturais que

independem da ação do homem;

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Se esses fenômenos são regulados por leis naturais, devemos então utilizar

métodos e procedimentos das ciências naturais para desvendar essas leis;

Também segundo o modelo das ciências naturais, as ciências humanas e

sociais devem orientar-se pelo modelo da objetividade científica.

Para o positivismo, é possível, com esforço e método, construir

conhecimento, deixando de fora os interesses e valores sociais. (BOCK,

2011,p.32)

A naturalização das relações humanas se constitui a partir da noção de natureza

humana, da interpretação positivista dos fenômenos sociais. O fenômeno educativo é então

naturalizado e as decorrências analisadas como ahistóricas.

As sociedades se organizam de diferentes formas e a educação é a ação social,

objetiva, organizada e sistematizada, que corresponde ao projeto social predominante, no

caso, o capitalismo.

Contraditoriamente é, também na escola que o conhecimento historicamente

produzido e as possibilidades de modificá-los ou perpetuá-los como imutáveis e definidos

podem se dar.

Entendemos a escola e a educação na perspectiva de fenômeno educativo complexo

que,se por um lado reproduz a ordem instituída, por outro carrega contradições e

possibilidades de transformação.

Neste caminho o papel do aluno e do professor ultrapassa o simples ato de

ensinar/aprender. Aluno e professor são seres humanos que se apropriam da experiência

cultural da humanidade e intervêm no mundo como sujeitos históricos determinados

dialeticamente. A educação é uma produção histórica e um ato político (FREIRE,2002).

É nesta perspectiva, da teoriasócio-histórica que se sustenta nos pressupostos

filosóficos, teóricos e metodológicos do materialismo histórico e dialético desenvolvidos por

Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), que acreditamos ser possível

transformar radicalmente este modelo de educação que se restringe ao conhecimento como

algo imutável e determinante.

Para melhor compreendermos o método desenvolvido por Karl Marx para o estudo da

sociedade burguesa, recorremos ao que Engels escreveu em 1890 no clássico Do socialismo

utópico ao socialismo científico:

A concepção materialista da história parte da tese de que a produção, e com

ela a troca dos produtos, é a base de toda a ordem social; de que em todas as

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sociedades que desfilam pela história, a distribuição dos produtos, e

juntamente com ela a divisão social dos homens em classes ou camadas, é

determinada pelo que a sociedade produz e como produz e pelo modo de

trocar os seus produtos. De conformidade com isso, as causas profundas de

todas as transformações sociais e de todas as revoluções políticas não devem

ser procuradas nas cabeças dos homens nem na ideia que eles façam da

verdade eterna ou da eterna justiça, mas nas transformações operadas no

modo de produção e de troca; devem ser procuradas não na filosofia, mas na

economia da época que se trata. (ENGELS,1986, p.54)

Aguiar e Bock afirmam que o materialismo histórico e dialético ultrapassa a

dicotomização positivista entre sujeito e objeto:

O materialismo histórico e dialético buscou superar a dicotomia; pensou a

relação sujeito e objeto como uma relação dialética; pensou a relação do

pesquisador com a realidade a ser conhecida de forma distinta; incorporou a

contradição e o movimento da realidade como princípios. (AGUIAR;

BOCK, 2011,p.159)

E o método na perspectiva da teoria sócio-histórica é:

Entendido, para além de sua função instrumental, como algo que nos permite

penetrar no real, objetivando não só compreender a relação sujeito-objeto,

mas a própria constituição do sujeito, produzindo um conhecimento que se

aproxime do concreto, síntese de múltiplas determinações. (AGUIAR;

BOCK, 2011, p.163)

A psicologia sócio-histórica oferece metodologia para compreensão deste movimento

de contradições na sala de aula e no interior da escola, nas práticas escolares e nos fazeres

pedagógicos. Possibilita superar certas dicotomizações inauguradas com ideário positivista do

século XVIII e XIX e ainda presente nas análises sobre escola e educação.

Nesta perspectiva entendemos que a teoria sócio-histórica possibilita compreensão da

escola real, da sua dinâmica e cultura e do homem como sujeito concreto que,se por um lado é

afetado e constituído nas e pelas relações de dominação, também é capaz de, como sujeito

histórico, intervir e mudar a realidade. Deste modo, verifica-se que tal perspectiva teórica

nega o pensamento educacional liberal e as práticas pedagógicas centradas nos reducionismos

e no individualismo manifesto na ideia do esforço/sucesso pessoal que justificam a

reprovação e o abandono escolar como responsabilidade única e individual. Assim, a

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abordagem sócio-histórica oferece possibilidade de análise crítica do fenômeno educativo, da

escola real que temos.

A noção de categoria é elemento essencial na constituição do método, “é o

pensamento categorial e teórico que permitirá o acesso às determinações do fenômeno”

(AGUIAR; BOCK, 2011,p.163).

Entendemos categorias de análise como abstração do real, como constructos

abstrato/intelectivos (AGUIAR;BOCK,2011, p.163) que pretendem explicar os movimentos

da realidade. As categorias de análise buscam explicar o movimento da realidade no empírico,

articulando com o todo dialeticamente.

As categorias de análise na perspectiva sócio-histórica não são conceitos, são

orientadoras de análise que “devem dar conta de explicitar, descrever e explicar o fenômeno

estudado em sua totalidade” (AGUIAR, 2011, p.95)

A construção das categorias de análise tem a intenção de explicar o movimento do

real, assim, constitui um tipo de explicação que vai para além da aparência, já capta as

determinações, os movimentos de contradição.

Recorremos a Netto para reafirmar que as categorias de análise da teoria sócio-

histórica têm alicerce fundado na teoria social e metodológica de Marx.

A orientação essencial do pensamento de Marx era de natureza ontológica e

não epistemológica (Lukács,1979): por isso, o seu interesse não incidia sobre

um abstrato „como conhecer‟, mas sobre „como conhecer um objeto real e

determinado‟ – Lennin, aliás, sustentava, em 1920, que o espírito do legado

de Marx consistia na „análise concreta de uma situação concreta‟ (NETTO,

2011, p. 27)

...o método de Marx não resulta de operações repentinas, de intuições geniais

ou de inspirações iluminadas. Antes, é o produto de uma longa elaboração

teórico-científica, amadurecida no curso de sucessivas aproximações ao seu

objeto (NETTO, 2011, p.28)

Entre as categorias de análise da teoria sócio-histórica entendemos que a categoria

Mediação, a categoria Historicidade e a categoria Significações são decisivas para apreensão

das significações que professores dos anos finais do ensino fundamental atribuem aos projetos

de recuperação da aprendizagem na rede estadual paulista.

A seguir definiremos as categorias de análise Mediação; Historicidade e Significações.

É fundamental o entendimento de que as categorias de análise se completam, não são

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63

independentes, ao contrário,articulam-se para entendermos a complexa e contraditória

realidade do fenômeno estudado.

Mediação

A categoria mediação é uma categoria metodológica que dá rumo às demais, que

articula e explicita o fenômeno permitindo entender o sujeito social e individual na sua

relação com o mundo e suas contradições. Na definição de Aguiar e Machado é:

... aquela que possibilita uma análise não dicotômica da realidade,

permitindo a apreensão da dialética objetivo-subjetivo, externo-interno,

afetivo-cognitivo etc., evitando-se posições que tornam um dos polos da

relação e o pensam de forma isolada, constituindo-se a si próprio.

(AGUIAR; MACHADO, 2012, p.29)

A categoria mediação possibilita a superação das visões naturalizantes,permite

superarmos as interpretações estáticas, metafísicas, apresentadas em análises sobre o

fenômeno educativo. O fato analisado, a partir da categoria da mediação, oferece o estudo do

fenômeno e sujeitos dentro de sua dialeticidade e das contradições que os constituem.

Os homens se constituem na relação com o mundo material. Essa relação, dialética e

histórica, de mediação com o mundo material é fundamental para compreender o sujeito em

sua totalidade, sem perder sua individualidade.

As categorias de análise explicam algo fundamental para o materialismo dialético, a

não dicotomização do fenônemo e a superação do monismo,em que múltiplo e uno constituem

uma unidade, mas não são iguais. A categoria mediação permite entender como professor,

aluno, escola e as políticas públicas constituem relações individuais em que um constitui o

outro.

Historicidade

A educação é um fenômeno social constituído historicamente pelos homens na sua

atividade e pela sua atividade, articulando e desarticulando aspectos internos e externos

dialeticamente, é fenômeno complexo.

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64

Sujeito e sociedade constituem o processo histórico, produzem e reproduzem ideias,

conceitos, formas de organização política e institucional. São históricos, produzidos e

reproduzidos no movimento da realidade.

Marx quer dizer que o estudo de qualquer fenômeno da realidade

implica compreendê-lo a partir de e na realidade concreta de que é

parte, e não compreendê-lo abstraindo-se essa realidade, retirando-o

dela como se o fenômeno dela independesse.(ANDERY; SÉRIO,

2007, p.418)

Vygotsky (1194; 2001) tem no pensamento marxista sua base teórica e desenvolve em

seus estudos a ideia do comportamento humano. Entende o comportamento humano como

fenômeno histórico socialmente determinado. A relação indivíduo/sociedade é uma relação de

interação dialética do homem com seu meio cultural. A cultura é elemento fundamental neste

processo de constituição do sujeito neste processo dialético.

As sociedades modernas têm na educação escolar sua principal forma de transmissão

de cultura. De forma geral denominamos de educação todo processo de transmissão cultural

que as diferentes sociedades produzem. Laraia afirma:

O homem é resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é herdeiro

de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a

experiência adquiridas pelas numerosas gerações que o antecederam. A

manipulação adequada e criativa desse patrimônio cultural permite as

inovações e invenções. Estas não são, pois, o produto da ação isolada de um

gênio, mas o resultado do esforço de toda uma comunidade. (LARAIA,

2004, p.45)

A educação, em sentido amplo, corresponde ao “esforço de toda uma

comunidade”para que seus membros conheçam, participem e reelaborem criticamente todo o

patrimônio histórico cultural produzido pelas sociedades.

A educação, especificidade humana, é um ato de intervenção no mundo. A escola é

composta de seres humanos que transformam e são transformados pelo trabalho e suas

relações sociais. Paulo Freire sintetiza em um dos seus escritos:“Lido com gente não com

coisas” (FREIRE,2002, p.163), e completa:

Nenhuma teoria da transformação político-social do mundo me

comove, sequer, se não parte de uma compreensão do homem e da

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65

mulher enquanto seres fazedores da história e por ela feitos, seres da

decisão, da ruptura, da opção. (FREIRE, 2002,p.146)

Aguiar e Machado (2012, p.30), apoiadas em Vygotsky, observam duas dimensões da

historicidade: a “dialética geral das coisas” no seu sentido geral, e a “história humana”, no

sentido restrito. Observam ainda que as duas dimensões se constituem dialeticamente. A

“dialética geral das coisas” contraria a ideia da história tradicional, a história factual como

uma sucessão de feitos e grandezas organizados cronologicamente, mas sim como

“movimento que expressará sempre as condições objetivas de um determinado momento

histórico e, nesta medida, as contradições presentes nesse momento” (ANDERY; SÉRIO,

2007, p.407). A história humana é a história do homem, sua história e a relação com outros

homens, transformando e sendo transformado.

Bock e Gonçalves tratam a historicidade como noção básica da Psicologia Sócio-

Histórica, “o que significa ter como ponto de partida a concepção de que todos os fenômenos

humanos são produzidos no processo histórico de constituição da vida social.” (BOCK;

GONÇALVES, 2009, p.138).

Pensar a educação como fenômeno complexo exige “reconhecer a produção do

fenômeno a partir da materialidade e da historicidade das relações sociais” (BOCK;

GONÇALVES, 2009, p. 151).

Significações

Entendemos a categoria significação como fundamental para os objetivos do nosso

trabalho: apreensão das significações que professores dos anos finais do ensino fundamental

atribuem aos projetos de recuperação da aprendizagem na rede estadual paulista.

Os homens, compreendidos em sua historicidade, constituídos dialeticamente na

mediação entre o social e o individual, são seres que se comunicam, interagem e socializam

suas experiências de vida, detrabalho, familiares e escolares. É por meio das

significações,articulação de sentidos e significados, que constituem processo cognitivo e

afetivo que se comunicam e socializam suas experiências individuais e sociais, são produtos

da história humana. Seguindo a lógica dialética, destacamos que sentidos e significados,

apesar de comporem uma unidade, são entendidos como unidade de contrários. São duas

categorias que se constituem mutuamente, sem serem iguais, mantendo tensão dialética entre

si. O significado é uma generalização que se refere a um objeto produzido pelos homens e que

oferece a possibilidade de comunicação e mediação. O sentido é a articulação dos eventos

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66

subjetivos constituídos pelosujeito frente a algum fenômeno. Nesta perspectiva o homem é

entendido como único, singular e histórico, pois em todas as suas expressões revela o social, a

história, a cultura convertidos em produções singulares. Assim, ao mesmo tempo em que

expressa o social, também revela sua singularidade, produz o novo, cria e recria significados

sociais e sentidos subjetivos.

Nesta relação em que um constitui o outro, o social constitui o indivíduo e o indivíduo

constitui o social, os significados e sentidos são mediadores das relações historicamente

construídas. Neste trabalho utilizamos a categoria significação por ser formada pelas

categorias sentido e significado que são distintas, porém, não podem ser compreendidas

isoladamente.

Para os propósitos deste trabalho,que trata sobre o que pensam professores dos anos

finais do Ensino Fundamental sobre os projetos de recuperação de aprendizagem e às questões

relativas ao direito à aprendizagem, a categoria significações é fundamental, pois permite

recriar significados sociais e sentidos subjetivos das relações historicamente construídas por

esses professores sobre a escola, a educação, a sociedade, os alunos e seu papel neste

processo.

A análise, por meio das significações que professores atribuem aos projetos de

recuperação de aprendizagem, pretende não só constatar a relação apontada, mas explicitar os

processos constitutivos, discutir o como isto ocorre, criando melhores condições de

pensarmos e analisarmos a realidade, de aprendermos os processos educativos para além de

sua aparência enganosa, e isto, segundo Vygotsky é fazer ciência.

3.1 A escolha metodológica: A pesquisa de abordagem qualitativa

A entrevista semiestruturada foi o instrumento para produção de dados nesta pesquisa

de abordagem qualitativa.

O fato de ser Supervisor de Ensino na rede estadual de ensino de São Paulo e, nos

últimos vinte anos, ter atuado como professor, coordenador pedagógico e diretor de escola,

permitiu um conhecimento mais apurado das realidades escolares e da atuação dos

professores em suas variáveis dentro do processo educativo e do fenômeno maior das políticas

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67

públicas em educação. Fato que permitiu fusão entre o instrumento utilizado, a entrevista

semiestruturada, e a experiência profissional deste pesquisador.

Construímos um roteiro de entrevista que apresentamos no exame de qualificação.

(apêndice1)

A partir deste roteiro entrevistamos uma professora que ministrava aulas de

Matemática nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.

A escola em que a professora ministrava aulas localiza-se na zona norte da cidade de

São Paulo. A escolha por essa escola foi aleatória no site da Diretoria de Ensino a qual

pertencia. A escolha da professora foi por indicação do Diretor da escola.

O atendimento da escola e da professora a este pesquisador foi positivo e agradável.

Foi disponibilizado espaço na biblioteca para realizarmos a entrevista que durou

aproximadamente 25 minutos. A escola encontrava-se em reforma geral e a biblioteca estava

desorganizada e desativada. A entrevista ocorreu normalmente. Transcrita a entrevista

observamos que foi pouco significativa para os objetivos a que nos propúnhamos.

Para essa entrevista inicial optamos por informar que este pesquisador atuava também

como Supervisor de Ensino na rede estadual, apesar do dilema ético em que nos

encontrávamos, pois, sabemos que historicamente a figura do Supervisor de Ensino que, ora

evidencia-se como fiscalizador do Estado e ora como agente pedagógico, ainda mantém no

imaginário docente a ideia do antigo Inspetor Escolar. (PARO, 1996; LIBÂNEO, 2004).

Pretendíamos realizar entrevistas com número maior de professores do chamado ciclo

II do ensino fundamental6, mas observamos que um universo maior de professores não seria

representativo para os objetivos da tese, fato confirmado no exame de qualificação pela Banca

Examinadora.

O que nos levou à decisão, de não entrevistar muitos professores, foi o fato de que

nesta entrevista com a professora, em que utilizamos o roteiro como orientador do nosso

trabalho, retomamos o ensinamento de André (2005) e verificamos que não seria um grande

número de participantes da pesquisa que traria qualidade aos dados e informações produzidos,

mas sim a flexibilidade do pesquisador, a compreensão do fenômeno estudado e a cadeia de

relações deste pesquisador com o tema.

6 O ciclo II correspondia aos quatro últimos anos do Ensino Fundamental organizado em oito anos na rede

estadual de ensino de São Paulo.

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68

Subjacente ao uso dessas técnicas etnográficas existe o princípio da

interação constante entre o pesquisador e o objeto pesquisado, princípio esse

que determina fortemente a segunda característica da pesquisa do tipo

etnográfica, ou seja, que o pesquisador é o instrumento principal na coleta e

análise dos dados. Os dados são mediados pelo instrumento humano, o

pesquisador. O fato de ser uma pessoa o põe numa posição bem diferente de

outros tipos de instrumentos, porque permite que ele responda ativamente às

circunstâncias que o cercam, modificando técnicas de coleta, se necessário,

revendo as questões que orientam a pesquisa, localizando novos sujeitos,

revendo toda a metodologia ainda durante o desenrolar do trabalho.

(ANDRÉ, 2005, p. 28-29)

A convivência, a aproximação com professores, a experiência construída

coletivamente nas escolas e na Diretoria Regional de Ensino (DRE) e a prática docente como

professor durante anos na Educação Básica e, nos últimos anos, no Ensino Superior, foram

fundamentais para construção de um novo roteiro de entrevista. O roteiro de entrevista foi

refeito com a intencionalidade de provocar reflexões mais amplas sobre nosso objeto de

estudo: Como os projetos de recuperação deaprendizagem e as questões relativas ao direito à

aprendizagem têm sido apreendidos pelos professores dos anos finais do ensino fundamental.

As questões, nesse caso, deverão ser formuladas de forma a permitir que o

sujeito discorra e verbalize seus pensamentos, tendências e reflexões sobre

os temas apresentados. O questionamento é mais profundo e, também, mais

subjetivo, levando ambos a um relacionamento mais recíproco, muitas vezes,

de confiabilidade. Frequentemente, elas dizem respeito a uma avaliação de

crenças, sentimentos, valores, atitudes, razões e motivos acompanhados de

fatos e comportamentos. Exigem que se componha um roteiro de tópicos

selecionados. As questões seguem uma formulação flexível, e a sequência e

as minúcias ficam por conta do discurso dos sujeitos e da dinâmica que

acontece naturalmente. (ARNOLDI; ROSA, 2006, p. 30-31)

Este segundo roteiro foi assim organizado a partir dos seguintes temas:

Apresentação do pesquisador

Sobre os seus alunos

Sobre a aprendizagem dos alunos

Os projetos de recuperação e o professor auxiliar

Promoção e retenção escolar

A organização da escola para atender os alunos

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Questões sociais e aprendizagem

Seriação, progressão continuada e ciclos de aprendizagem

Seletividade escolar e inclusão escolar

Participação dos professores, alunos e comunidade na escola

Políticas públicas em educação na rede estadual de ensino de São Paulo

Direito à aprendizagem

Direito à educação

(Roteiro de entrevista, 05/02/2014)

3.2 O percurso de entrada no campo de pesquisa: as escolas e os professores participantes

Definido o roteiro para entrevista semiestruturada escolhemos duas escolas da zona

norte da Cidade de São Paulo através do site da Secretaria de Estado da Educação de São

Paulo (www.educacao.sp.gov.br). A escolha destas duas escolas foi intencional. Procuramos,

para ampliar a possibilidade de análise, escolas que atendem grande número de alunos e

professores e pela disposição do prédio escolar. Descrevemos a seguir as escolas denominadas

Escola Caminho e Escola Alegria7.

A Escola Caminho

A Escola Caminho, criada na década de 1990, atende crianças e adolescentes dos anos

finais do ensino fundamental (6º, 7º, 8º e 9º) e ensino médio8 e localiza-se em bairro

residencial, mas em avenida movimentada com comércio local, comércio informal e empresas

de transporte de cargas.

A maioria dos alunos e suas famílias moram no próprio bairro e, aproximadamente,

600 alunos dos períodos da manhã e tarde residem em bairros adjacentes e são atendidos pelo

programa de transporte escolar.

A comunidade, em geral, é composta de trabalhadores sem elevada qualificação

profissional. As residências no entorno não têm acabamento concluído, são de alvenaria e em

muitos casos são cobertas por telhados frágeis que acumulam calor. Os bairros adjacentes são

marcados por ruas estreitas e as casas construídas sem planejamento em áreas de ocupação

7 O nome das escolas é fictício para preservar o sigilo.

8 Neste estudo utilizamos a terminologia ensino fundamental de nove anos e ensino médio organizado

em três séries anuais.

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70

popular, resultante da crise habitacional e da marcante desigualdade econômica e social que

impera no país mesmo com os tímidos avanços das últimas décadas.

Sem diferença dos demais centros urbanos a violência social contra mulheres, jovens e

crianças é marcante. O bairro também é caracterizado pelo alto índice de violência entre os

jovens, segundo os professores entrevistados.

Em relação aos aspectos físicos da Escola Caminho pudemos observar o cuidado da

equipe escolar em manter a limpeza e a organização dos espaços. Porém, o excesso de grades

e portões causa constrangimento na entrada principal. Para termos acesso ao balcão da

secretaria escolar que, por sua vez, é gradeado e tem vidro temperado o que não permite

aproximação direta entre atendentes e atendidos, é preciso passar antes por um portão

gradeado e automático.

Por ser uma construção relativamente nova possui dois andares e não existe nenhuma

área verde ou espaço de convivência, que no entendimento deste pesquisador é fundamental

para a organização de um ambiente educativo.

O quadro III apresenta o tipo de atendimento e número de alunos;o quadro IV os

profissionais da educação e o quadro V a estrutura física da Escola Caminho.

Quadro III. Escola Caminho – Tipo de atendimento e número de alunos

Escola Caminho

18 salas de aula,

46turmas e 1.670

alunos.

Ensino Fundamental Ensino Médio

6º 7º 8º 9º 1º 2º 3º

Manhã - - - 7 turmas

242

alunos

5 turmas

196

alunos

4 turmas

142

alunos

2 turmas

76 alunos

Tarde 5

turmas

182

alunos

6

turmas

194

alunos

7 turmas

243

alunos

- - - -

Noite - - - - 1 turma

42 alunos

5 turmas

192

alunos

4 turmas

161

alunos

Fonte: Secretaria da Escola Caminho.

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71

QuadroIV. Escola Caminho – Quadro de profissionais da educação. Escola Caminho - Total de 102 profissionais da educação

Gestores Professores Agentes de

Organização Escolar

Terceirizados

1 Diretor de Escola

designado

Português e Inglês

08 titulares

07 “F9”

08 titulares

03

merenderias

2 vices-diretores

designados

Matemática

05 titulares

07 “F”

01 designado Gerente

de Organização Escolar

04 serventes

de escola

1 professor coordenador

de apoio à gestão

pedagógica

História

03 titulares

02 “F”

03 contratados de forma

precária por um ano.

-

2 professores

coordenadores designados

Geografia

02 titulares

03 “F”01 “O10

- -

2 professores mediadores

designados

Biologia e Ciências

03 titulares

02 “F”02 “O”

- -

2 professores na sala de

leitura designados

Física/Química

01 titulares

02 “F”02 “O”

- -

3 professoras readaptadas

pelo Departamento de

Perícias Médicas do

Estado de São Paulo

Educação Física

03 titulares

- -

- Artes

02 titulares

01 “F”

- -

- Filosofia/Sociologia

01 titulares

02 “F”

- -

- 04 professores auxiliares de

português

02 professores auxiliares de

matemática

04 professores substitutos

(Projeto de Apoio à

Aprendizagem)

- -

Fonte: Secretaria da Escola Caminho.

9 Professores “F” regidos pela Lei Complementar nº 1.093/2008 que garante estabilidade aos professores que já

eram Admitidos em Caráter Temporário (ACT) antes de 2008. 10

Professores “O”.É chamado de categoria “O” o professor contratado nos termos da L.C. 1.093/2009. A

contratação é feita após a aprovação do candidato em processo seletivo simplificado; é uma contratação bastante

precária. O servidor fica vinculado para fins previdenciários ao INSS e sua assistência médica se dá pelo SUS,

não pelo IAMSPE. É no SUS, e por sua iniciativa, que deve ser feito o exame admissional para ingresso. O

contrato só pode ser feito quando houver necessidade da prestação do serviço e, no caso do magistério, isso se dá

apenas após a atribuição de aulas e antes do término do ano letivo. O contratado que ficar sem aulas não terá

necessariamente rescindido o seu contato de trabalho, podendo ter aulas atribuídas que surjam na vigência de seu

contrato, se concordar. Se não concordar, permanecerá vinculado pelo prazo de vigência do seu contrato, sem ser

todavia remunerado. (Fonte:http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/professor/manual-do-professor-2013/#cato)

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72

QuadroV. Escola Caminho – Estrutura física

Estrutura física da Escola Caminho

18 salas de aula

01 sala dos professores

01 sala da Direção

01 sala dos vices-diretores

01 sala da coordenação pedagógica e do professor coordenador de apoio à gestão pedagógica

01 sala da Secretaria Escolar

01 sala (espaço adaptado) para os professores mediadores

01 sala de leitura

01 sala de informática (programa Acessa Escola)

01 quadra de esportes coberta

01 espaço adaptado para prática de Voleibol

01 pátio coberto de aproximadamente 1.500 m² com 16 mesas e bancos para refeição

01 pátio descoberto de aproximadamente 1.000 m²

01 sala de vídeo/reuniões

04 sanitários (masculino e feminino) para professores e administração

10 sanitários para alunas

06 sanitários para alunos

01 cozinha para preparo da merenda escolar

01 depósito para produtos da merenda escolar

01 estacionamento para aproximadamente 20 automóveis Fonte: Secretaria da Escola Caminho.

A Escola Alegria

A Escola Alegria, criada na década de 1980, atende alunos dos anos finais do

nsinofundamental (6º, 7º, 8º e 9º anos) e ensino médio (1º, 2º e 3º anos).

O bairro, localizado na zona norte de São Paulo, apresenta características de

loteamento legalizado, as ruas do entorno são pavimentadas e as residências bem conservadas.

Outro bairro próximo apresenta características semelhantes, mas as ruas são mais estreitas e

as casas sem acabamento e com garagens adaptadas para o comércio informal, bares, lojas e

igrejas. É deste bairro que a escola recebe a maioria dos seus alunos.

A atividade econômica principal das famílias dos alunos é o trabalho formal no centro

da cidade de São Paulo em funções que exigem baixa escolaridade: porteiros, seguranças,

empregadas domésticas, faxineiras. Parte das famílias trabalha na informalidade no próprio

bairro ou nas imediações que atendem ao comércio local.

O prédio escolar foi construído em terreno plano e necessita de ampla reforma. A

entrada principal dos alunos é ligada diretamente ao corredor das salas de aula, apesar de ter

amplo pátio coberto e área externa ao pátio arborizada, porém subutilizada,e quadra esportiva

coberta. É precária a conservação nas áreas de pátio e nas calçadas externas.

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73

A entrada para o atendimento da secretaria escolar é por um portão lateral sem

nenhuma indicação. O balcão da secretaria segue o padrão da maioria das escolas, permite

pouco acesso do público para o atendimento. É cercado de grades. A entrada dos professores e

funcionários ocorre por esse portão e, logo após, por porta de ferro automática acionada por

funcionário da secretaria.

O quadro VI apresenta o tipo de atendimento e número de alunos; o quadro VII os

profissionais da educação e o quadro VIII a estrutura física da Escola Caminho.

Quadro VI. Escola Alegria – Tipo de atendimento e número de alunos

Escola Alegria

14 salas de aula,

40turmas e 1.542

alunos.

Ensino Fundamental Ensino Médio

6º 7º 8º 9º 1º 2º 3º

Manhã - - - 7 turmas

272

alunos

4 turmas

162

alunos

2 turmas

78

alunos

1 turma

42

alunos

Tarde 4 turmas

142

alunos

5turmas

171

alunos

5 turmas

179

alunos

- - - -

Noite - - - - 3 turmas

126

alunos

4 turmas

176

alunos

5 turmas

194

alunos

Fonte: Secretaria da Escola Alegria.

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74

QuadroVII. Escola Alegria – Quadro de profissionais da educação

Escola Alegria - Total de 102 profissionais da educação

Gestores Professores Agentes de

Organização Escolar

Terceirizados

1 Diretora de Escola

designado

Português e Inglês

04 titulares

06 “F”

05 titulares

03

merenderias

2 vices-diretores

designados

Matemática

04 titulares

06 “F”

01 designado Gerente

de Organização Escolar

04 serventes

de escola

1 professor coordenador

de apoio à gestão

pedagógica

História

02 titulares

02 “F”

07 contratados de forma

precária por um ano.

-

2 professores

coordenadores designados

Geografia

03 titulares

02 “F”

- -

2 professores mediadores

designados

Biologia e Ciências

03 titulares

01 “F”

01 “O”

- -

1 professor na sala de

leitura designados

Física/Química

00 titulares

03 “F”

02 “O”

- -

4 professoras readaptadas

pelo Departamento de

Perícias Médicas do

Estado de São Paulo

Educação Física

02 titulares

01 “F”

- -

- Artes

01 titulares

02 “F”

- -

- Filosofia/Sociologia

00 titulares

03“F”

01 “O”

- -

- 04 professores auxiliares de

português

03 professores auxiliares de

matemática

03 professores substitutos

(Projeto de Apoio à

Aprendizagem)

- -

Fonte: Secretaria da Escola Alegria.

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QuadroVIII. Escola Alegria – Estrutura física

Estrutura física da Escola Alegria

14 salas de aula

01 sala dos professores

01 sala da Direção

01 sala para os vices-diretores, coordenação pedagógica e professor coordenador de apoio à gestão

pedagógica

01 sala da Secretaria Escolar

01 sala ( adaptada no pátio) para os professores mediadores

01 sala de leitura

01 sala de informática (programa Acessa Escola)

01 quadra de esportes coberta

01 pátio coberto de aproximadamente 1.000 m² com 10 mesas e bancos para refeição

01 pátio descoberto de aproximadamente 1.200 m²

01 sala de vídeo/reuniões

03 sanitários (masculino e feminino) para professores e administração

06 sanitários para alunas

04 sanitários para alunos

01 cozinha para preparo da merenda escolar

01 depósito para produtos da merenda escolar

01 estacionamento para aproximadamente 30 automóveis Fonte: Secretaria da Escola Alegria.

Definidas as escolas tivemos o primeiro contato telefônico com asdireções e

agendamos horário para apresentação da proposta de pesquisa e formalização da autorização.

O pesquisador não se identificou como Supervisor de Ensino para evitar desvios na qualidade

da produção das informações.Consideramosa dimensão ética como definidora de qualquer

ação humana,optamos por não se identificar para evitar ser visto como alguém que poderia

estar “fiscalizando” o trabalho da escola e dos professores e interferir negativamente na rotina

escolar e na condução da pesquisa.

Para as entrevistas semiestruturadas solicitamos aos diretores das duas escolas que

permitissem escolhermos dois professores, no quadro de horário de aulas, sendo um de

Língua Portuguesa e um de Matemática.

Após a escolha confirmamos se estes ministravam aulas na unidade escolar em média

há 10 anos e se atuavam nos anos finais do ensino fundamental (8º e 9º anos), o que se

confirmou. Para os nossos objetivos entendemos ser mais indicado entrevistar professores

com mais anos de magistério, apenas como um indicativo de experiência, e das disciplinas

com maior número de aulas semanais (6 aulas).

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76

Quadro IX. Professores entrevistados - Escola Caminho e Escola Alegria

Escolas participantes Professores (as) entrevistados (as)

Escola Caminho

Professor Antonio11

- Matemática

Titular – 12 anos de magistério

Professora Beatriz - Língua

Portuguesa

Categoria “F” – 13 anos de

magistério

Escola Alegria

Professora Carla – Matemática

Categoria “F” – 11 anos de

magistério

Professora Diana – Língua

Portuguesa

Titular – 8 anos de magistério

Agendamos com o Diretor da Escola Caminho o dia e horário para a segunda visita em

que pretendíamos entrevistar o professor Antonio (Matemática) e a professora Beatriz (Língua

Portuguesa). O Diretor atendeu prontamente e solicitou a Professora Coordenadora

Pedagógica que liberasse os professores durante a Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo12

(ATPC) para a realização da entrevista.

Liberado o dia e horário para a segunda visita em que realizaríamos entrevista com o

professor Antonio e professora Beatriz, decidimos chegar horas antes para poder observar e

participar do ambiente escolar, o que para esse pesquisador foi quase rotineiro por conhecer

detalhadamente o funcionamento e organização das escolas públicas estaduais, seus alunos e

professores. O atendimento ao pesquisador foi atencioso e cordial.

Chegado o horário da ATPC a coordenadora pedagógica nos encaminhou para a sala

da coordenação onde poderíamos realizar a entrevista com os professores. Recebi o professor

Antonio e a professora Beatriz nesta sala e expus o que pretendia: objetivos da pesquisa, a

metodologia utilizada e o sigilo das informações. Ambos os professores foram solícitos e

concordaram com os critérios. Informei que a entrevista era individual e faria uso de roteiro

para melhor provocar que“o sujeito discorra e verbalize seus pensamentos, tendências e

reflexões sobre os temas apresentados” (ARNOLDI; ROSA, 2006, p. 30).

Após serem informados que a duração da entrevista seria de, aproximadamente, uma

hora, decidiram consultar a coordenadora pedagógica para que somente a entrevista com o

11

O nome dos professores e professoras é fictício para preservar o sigilo 12

ATPC – Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo. É uma parte da carga horária do professor que é

dedicada a reunião coletiva sob a liderança do Professor Coordenador Pedagógico e do Diretor da

Escola. Os professores com jornada completa de trabalho (32 aulas semanais) participam de 3 aulas

semanais em reuniões coletivas - ATPC - e 5 aulas semanais de ATPL (Aula de Trabalho Pedagógico

Livre, em local de livre escolha pelo professor). Cada aula corresponde a 50 minutos. Completam

assim a jornada semanal de 40 aulas de 50 minutos cada.

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77

professor Antonio fosse realizada naquela data e na semana seguinte com a professora

Beatriz. A coordenadora pedagógica concordou e consideramos uma boa oportunidade de

retornar a escola e prosseguir na observação da rotina da escola.

Realizamos a entrevista (apêndice 2) que foi gravada em áudio, assim como as demais,

com duração de 1 hora e 02 minutos, com o professor Antonio e, posteriormente, pudemos

dialogar com alguns professores sobre temas diversos da educação em que procurei

demonstrar não conhecer a rotina dos docentes e da educação pública estadual paulista. Na

semana seguinte entrevistei a professora Beatriz. A entrevista (apêndice 3) teve duração de 52

minutos e 44 segundos. Concluimos assim as duas entrevistas com professores da Escola

Caminho.

Por meio de contato telefônico agendamos com a Diretora da Escola Alegria o dia e

horário para entrevistar a professora Carla (Matemática) e Diana (Língua Portuguesa) e

sugerimos que fosse em dias diferentes e no horário de ATPC, pela experiência que passamos

na Escola Caminho. A Diretora da Escola Alegria concordou e assim agendamos.

No dia agendado para entrevista comparecemos duas horas antes com o objetivo de

observar a rotina da escola. A Diretora não estava e fomos recebidos por um funcionário da

secretaria. O funcionário não havia sido informado sobre minha presença e consultou a

diretora por telefone. Fui autorizado a entrar, aguardei por trinta minutos, porém não tive

acesso ao interior da escola e à rotina escolar neste dia. Posteriormente o funcionário chamou

a professora Carla que estava em aula vaga aguardando a ATPC e pude finalmente entrevistá-

la.

A recepção da professora não foi muito agradável.Notei certo constrangimento porque

ela não havia sido informada corretamente pela diretora, apenas sabia que ia participar de uma

pesquisa. Informei a professora Carla sobre meus objetivos e ela aceitou em colaborar. Pedi

se era possível ficarmos em uma sala e ela indicou uma pequena sala anexa à secretaria.

Realizei a entrevista (apêndice 4) que teve duração de 41 minutos e 17 segundos. Terminada a

entrevista observei que os alunos do período da manhã já haviam sido liberados e os demais

professores estavam em ATPC.

Na segunda visita fui atendido pela diretorae como cheguei três horas antes consegui

observar melhor a rotina da escola e permanecer aguardando o horário da ATPC da professora

Diana (língua portuguesa) na sala dos professores.

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Expus o que pretendia para a professora Diana: objetivos da pesquisa; a metodologia

utilizada; e o sigilo das informações. Utilizamos a mesma sala anexa à secretaria e a

entrevista (apêndice5) teve duração de 49 minutos e 17 segundos. Concluí assim as duas

entrevistas com professores da Escola Alegria.

Concluídas as entrevistas semiestruturadas e a transcrição realizada por esse

pesquisador, a análise da legislação, conforme capítulo II deste trabalho, e asobservações

acrescidas da experiência deste pesquisador na rede estadual de ensino de São Paulo,

podemos na sequência deste trabalho analisar os dadosproduzidos. Para esse fim

procederemos à análise das informações de acordo com o proposto por Aguiar e Ozella

(2013) na criação dos “Núcleos de Significação”.

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79

CAPÍTULO IV

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS E INFORMAÇÕES

4.1 Procedimentos de análise de dados e informações

Para atender ao nosso objetivo e pela problemática que o tema oferece optamos pelo

procedimento de análise e interpretação de dados denominado “Núcleos de Significação”

(AGUIAR; OZELLA, 2013).

A proposta de análise e interpretação de dados através da produção dos Núcleos de

Significação é uma ferramenta que permite analisar os sentidos e significados presentes no

discurso. O uso da entrevista semiestruturada oferece dados e informações necessárias para

construção dos Núcleos de Significação, além da experiência deste pesquisador no tema a que

se propõe.

Após a transcrição das quatro entrevistas e das diversas leituras feitas por esse

pesquisador iniciamos a construção dos Pré-Indicadores que representam a primeira unidade

de análise que é a palavra com significado, como apresenta Aguiar e Ozella.

Partimos dela [a palavra] sem a intenção de fazer uma mera análise das

construções narrativas, mas com a intenção de fazer uma análise do sujeito.

Assim, temos que partir das palavras inseridas no contexto que lhe atribui

significado, entendendo aqui como contexto desde a narrativa do sujeito até

as condições histórico-sociais que o constitui (AGUIAR ; OZELLA, 2013, p.

308)

É na definição dos Pré-Indicadores que o pesquisador deve atentar para os

objetivos da pesquisa que empreendeu e o problema principal a que se deteve. Afinal,

“são trechos de fala compostos por palavras articuladas que compõem um significado,

carregam e expressam a totalidade do sujeito e, portanto, constituem uma unidade de

pensamento e linguagem”. (AGUIAR ; OZELLA, 2013, p. 309)

Concluídos os Pré-Indicadores passamos aos Indicadores, que já se constituem em

um movimento de análise inicial a partir do exercício das várias leituras da entrevista

transcrita e da construção dos Pré-Indicadores. É na transcrição da entrevista que esse

movimento se inicia. É nos passos dados através da transcrição das entrevistas e na

aglutinação dos Pré-Indicadores que os Indicadores serão construídos e fornecerão pistas para

elaboração dos Núcleos de Significação.

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80

A partir da aglutinação dos Indicadores passamos para elaboração dos Núcleos de

Significação. Neste movimento de construção dos Pré-Indicadores, dos Indicadores e Núcleos

de Significação também consideramos a experiência deste pesquisador na área de estudo a

que se propôs. A escolha metodológica, opercurso de entrada no campo de pesquisa, o

procedimento de análise de dados e informações na perspectiva sócio-histórica, o

conhecimento in loco e a experiência acumulada deste pesquisador sobre as questões

propostas nesta pesquisa enriqueceram os dados produzidos e foram fundamentais na

elaboração dos Núcleos de Significação.

4.2 Levantamento dos Pré-Indicadores e Indicadores

No levantamento dos Pré-Indicadores e Indicadores utilizamos trechos das entrevistas

que apresentam palavras e expressões que melhor indicam os propósitos e objetivos da

pesquisa. Optamos ainda por utilizar cores diferentes nas fontes das letras do Programa

Windows/Office/Word no momento da digitação para melhorar a visualização dos Pré-

Indicadores e Indicadores. As entrevistas completas compõem o apêndice 2,3,4 e 5 deste

trabalho.

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Quadro X. Pré-Indicadorese Indicadores – Entrevista 1 – Professor Antonio –

Matemática

Pré-Indicadores Indicadores

É então... (pensa bastante, sorri...) Vimos que no primeiro

semestre, nos dois bimestres trabalhando a proposta, nos

conteúdos da série, o rendimento é muito baixo. Tivemos, em

Matemática, de 70% a 80% de notas vermelhas,

insatisfatórias. Conversamos com a coordenação para a gente

reagir, mudar. Foi proposto, com a gestão, rever os conceitos

anteriores lá nas quintas e sextas séries para não chegar a esse

abismo que tem na oitava série. No terceiro bimestre, já

conseguimos um aproveitamento de 50% nos 80% que

estavam com nota insatisfatória. Para mim e para os outros

professores, a matéria se tornou mais fácil, mais prazerosa.

Eles estavam conseguindo aprender. Esse resgate que fizemos

dos anos anteriores foi importante. Só que, em contrapartida,

paramos o conteúdo da série um pouquinho e estamos

tentando chegar aos poucos.

Os que aprovam? São os que estudam! Mesmo esses alunos

que são aprovados ainda estão muito abaixo do nível que

esperamos. Dissemos assim: é aluno nota 5, nota 6, porque a

gente tenta avaliar de diversas formas.

Esses alunos que são aprovados demonstram mais interesse,

participam mais, mesmo assim são do nível básico para o

adequado.

Nós temos nesse ano o “professor auxiliar”. Esses alunos que

têm mais dificuldades, abaixo do básico, ficam duas aulas por

semana com esse professor. A gente dá o mínimo mesmo.

Outro espaço, com outro professor, outro ambiente para

trabalhar com essa dificuldade mesmo que é extrema. Mas

tem professor que trabalha assim. Têm outros que trabalham

de outra forma, trabalham dois professores na sala, dividem

os alunos em níveis.

É. Tudo depende das turmas. Nas minhas turmas, eu vejo a

necessidade desse professor trabalhar com o grupo menor.

Nem sempre é menor. A gente viu que está atingindo os

objetivos.

No início do ano, fizemos “provas diagnósticas” para ver o

perfil do aluno e as dificuldades. Através desses resultados, a

gente seleciona os alunos que têm mais dificuldades, que são

mais difíceis.

O rendimento escolar dos

alunos é muito baixo.

Em Matemática a maioria

dos alunos tem notas

vermelhas.

Tentativas da escola e do

professor em garantir a

aprendizagem dos alunos.

“Conversamos com a

coordenação para a gente

reagir, mudar”

O conteúdo do ano/série não

foi ensinado.

Os alunos aprovados estão

muito abaixo do nível para o

ano/série.

Os alunos mais interessados

são aprovados e estão abaixo

do básico

O Professor trabalha o

“mínimo” com os alunos

que têm mais dificuldades.

A dificuldade dos alunos

atendidos pelo professor

auxiliar é “extrema”.

O professor titular e o

professor auxiliar separam

os alunos em níveis de

aprendizagem.

O Professor Auxiliar

trabalha com grupos

menores e atinge os

objetivos.

“Provas diagnósticas” para

selecionar os alunos com

mais dificuldades

Alunos com mais

dificuldades de

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Uma reunião traçando o perfil da sala e dos alunos para ver se

era a melhor maneira de conduzir os alunos para o reforço.

O aluno vem pra escola, pra não perder a vaga e não ser

encaminhado para o Conselho Tutelar. Esse bairro, onde a

gente trabalha, tem bastante. A questão da pobreza também. É

um bairro bem carente, que afeta muito a estrutura familiar.

Crianças que não têm pais são separadas, e isso afeta muito.

O aluno acaba não conseguindo ter o rendimento esperado

por esses fatos.

Sim. Sim. Reprovaria.

É uma questão bem ampla, bem complexa. Esse ano para

mim foi de renovação. Ao voltar o conteúdo, a gente vê que

os alunos têm dificuldades extremas. Então, reprovar um

aluno eu entendo que não ajuda. Quando o aluno reprova a 8ª

série, há dez anos que trabalho com 8ª série, que é final de

ciclo, no ano seguinte, fazendo a 8ª serie novamente, muitas

vezes ele não vai melhorar. A tendência é piorar por causa da

falta de motivação e de empenho. Mas existem alguns casos

de alunos que não abrem o caderno, não fazem as atividades,

que não buscam o conhecimento e acabam reprovando por

desempenho. Então, a gente acaba reprovando esses alunos

que não têm o que fazer, que não têm jeito. Mesmo assim, na

minha visão, no ano seguinte, esse aluno não vai melhorar.

Vai continuar do mesmo jeito.

Talvez, não seja a melhor solução, mas fica difícil encontrar

um caminho para que esses alunos não cheguem à

reprovação. Entender porque esse aluno é assim, que não

consegue entender, porque ele não quer, seria esse meio

termo porque não reprovar os alunos que não têm jeito.

É, a gente fala muito sobre a progressão continuada. Existem

muitas críticas sobre a progressão continuada de 1998. Hoje,

o aluno só é reprovado no final do ciclo, no fundamental I e

no fundamental II. Lembro quando eu era aluno. O aluno era

reprovado por rendimento. Hoje, a gente escuta que o aluno

foi reprovado por faltas. Só será por nota e rendimento no

final de ciclo. O que eu conheço um pouquinho da progressão

continuada está relacionado a essas críticas que nós,

professores, eu me incluo nessa, fazemos: que hoje o aluno

não consegue compreender, entender e mesmo assim ele é

aprovado.

A gente faz muitas comparações: que naquele tempo os

alunos conseguiam aprender e muitos que eram reprovados

aprendizagem “são mais

difíceis”.

Reuniões entre professores

para definir qual aluno deve

fazer reforço.

As questões sociais afetam a

aprendizagem dos alunos.

O professor reprovaria seus

alunos: “Sim, reprovaria”

A reprovação escolar não

ajuda, mas “a gente acaba

reprovando esses alunos que

não têm o que fazer, que não

têm jeito”.

O professor tem dificuldade

em entender o que significa

a reprovação escolar e acaba

reprovando “os alunos que

não têm jeito”.

Os professores atribuem à

progressão continuada o fato

de o aluno que “não

consegue compreender,

entender e mesmo assim ele

é aprovado”.

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evadiam-se. Eu me lembro de que muitos abandonavam a

escola para trabalhar e hoje os alunos de alguma forma,

quando são reprovados, abandonam. Não só o abandono de

não vir para escola, mas o abandono intelectual. Ao reprovar

um aluno, eu acho que, nos anos seguintes, você perde esse

aluno. Talvez não por abandono, mas por falta de motivação

que no ano seguinte é muito grande. A questão da seriação,

não sei explicar bem o que seria.

A gente percebe que o aluno chega ao final de ciclo, na

progressão continuada, sem o conhecimento básico. Agora, eu

não sei se essa questão de você reprovar o aluno interfere no

final do ciclo. Mas nós vimos que o aluno chega hoje ao final

do ciclo da 8ª série sem conhecimentos prévios básicos.

Aí tem uma contradição. Será que reprovar os alunos seria

melhor? Porque, se a gente voltar para alguns anos atrás, a

gente reprovava o aluno. Havia uma taxa de reprovação muito

grande e isso não resolvia o caso dos alunos reprovados. Mas

aprovar também não dá, né?

Isso é pouco discutido na escola. A gente já comentou de

ciclo de dois anos. É, talvez fosse a solução. Em vez de você

deixar do sexto até o nono ano para recuperar o aluno, por

que não de dois em 2 anos?

Muitas vezes é angustiante. Muitas vezes, a gente prepara

uma aula que você acredita que vá durar aqueles cinquenta

minutos, ou cem minutos, duas aulas, e acaba se estendendo

por uma semana inteira. Às vezes, eu preparo uma atividade

considerada básica e duas aulas acabam se tornando seis,

porque os alunos têm essa dificuldade, esse nível de

conhecimento muito básico. Uma grande defasagem que é

mesmo muito angustiante. Você como professor tem uma

expectativa. E aquela expectativa não é confirmada.

No intervalo. Até no intervalo a gente discute sobre o aluno.

Nas ATPC, é discutido a todo momento. Uma forma pra

gente conseguir é resgatar nossos alunos para o aprendizado.

É uma das maneiras que a gente viu aqui na escola, até pelas

notas das provas SAEB, SARESP, diagnóstica, em que todos

foram mal em Matemática. Foi muito triste.

Um fala para o outro e ficam indignados em ter que aprovar

esses alunos, porque já ensinamos o básico e os alunos não

conseguem entender. Muitas vezes, a gente não consegue e

O professor sabe que a

reprovação escolar pode

resultar em abandono

escolar e falta de motivação

para o ano seguinte.

Com a progressão

continuada o aluno chega ao

final do ciclo sem

conhecimento básico.

O professor busca a questão

da reprovação escolar

historicamente e apresenta

contradição na interpretação:

“tinha uma taxa de

reprovação muito grande e

não resolvia”, “Mas aprovar

também não dá né!”

O tema “ciclos de

aprendizagemӎ pouco

discutido nas escolas. O

aluno deveria ser reprovado

de dois em dois anos.

O professor sente angústia

porque os alunos não

dominam os conhecimentos

necessários para o ano/série.

Tentativas dos professores

em melhorar a

aprendizagem dos alunos e

as notas nas avaliações

externas.

Professores ficam

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culpa o aluno sobre essas obrigações que eles não cumprem,

como a falta de interesse e de motivação de estudar. A gente

fala um para o outro: como que pode um aluno não entender?

Alguns são a favor da reprovação e que no ano que vem ele

vai sentir o “baque” da reprovação e vai começar a

estudar,empenhar-se mais. Outros acreditam que não. Outros

acreditam que uma porcentagem tem que ser reprovada até

porque isso ajuda a dar um “baque” na turma. São opiniões

diferentes que a gente vê sobre a reprovação. Uns são a favor,

outros não, outros em parte. São opiniões bem diferentes, mas

que vão para o lado da reprovação.

Os alunos são muito inteligentes. Eles sabem, por exemplo,

sobre a reprovação. Os alunos sabem que reprova nas oitavas

séries, que é final de ciclo. O professor deixa bem claro e a

gestão passa para eles que têm que estudar,empenhar-se,

senão vai reprovar. Mas assim eles somente vão ter esse

interesse, esse foco, lá no último bimestre. No final do ano,

eles começam a entregar trabalho, começam a ir atrás de

notas, a buscar alternativas de trabalhos extras para não

perder o ano. Eles têm, sim, essa preocupação de não perder o

ano. Entre eles, a gente percebe que mesmo aqueles que não

fizeram nada durante o ano, não participaram de forma

alguma, no final, têm medo de perder o ano. Não querem

separar-se da turma, o colega ir adiante e ele ficar para trás,

ficar na reprovação.

Não. São indiferentes [os funcionários] sobre esse negócio de

reprovação. Os comentários que conversamos com os

funcionários são outros. Esse é um assunto que não é

mencionado.

Então, é assim: uma boa parte dos pais é a favor da

reprovação, mas eles não têm conhecimento de que é a

progressão continuada que faz isso. A questão da história dos

ciclos, que nós professores não queríamos que aprovasse.

Então, eles enxergam assim: não aprendeu nada e tem notas

vermelhas? Tem que ser reprovado.

Posso voltar alguns anos. Fui professor de recuperação

paralela uns 3 ou 4 anos. A gente percebia uma evasão muito

grande. Era no contraturno e o aluno não vinha, tinha lá 20

alunos por turma. Vinham seis ou sete. Hoje, essa

recuperação de apoio dentro da sala ou fora em outra sala

ambiente, durante o processo, traz mais resultados.

Na Recuperação Paralela, os alunos não vinham no

contraturno. Havia muita ausência. Essa era outra recuperação

indignados em ter que

aprovar os alunos.

Parte dos professores

querem reprovar os alunos

para que eles sintam “o

baque” e estudem mais no

próximo ano.

Os professores têm opiniões

diferentes, mas que “vão

para o lado da reprovação”.

O professor afirma que “Os

alunos são muito

inteligentes”.

A reprovação escolar como

ameaça para que o aluno

estude.

Os alunos não querem ser

reprovados e fazem as

atividades só no final de

ano.

O assunto “reprovação” é

um tema tratado só por

professores e direção.

Parte dos pais é favorável à

reprovação.

É a progressão continuada

que aprova os alunos.

O modelo de atendimento

aos alunos em recuperação

não era eficiente.

O modelo atual de

recuperação, com apoio do

Professor Auxiliar tem mais

resultados.

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paralela, e agora é esse Professor Auxiliar.

Tinha um professor que ficava, também. Parecia com a

recuperação paralela. Mas, na hora do almoço, os alunos

ficavam uma aula a mais e depois iam embora. Lembro sim,

mas também lembro que muitas vezes os alunos acabavam

indo embora com os colegas que não estavam para

recuperação. Eles fugiam da recuperação na hora do almoço

junto com os colegas. Terminava o horário normal, e eles

aproveitavam e se mandavam. Saíam, não ficavam mesmo.

Acho que era muito cansativo ter cinco ou seis aulas e ainda

ficar mais uma aula. É muito chato. Assim, a escola não

oferecia nada de diferente. Foi mais uma tentativa que não

deu em nada, não deu certo.

Eu vejo como tentativas. Acho que foram quatro. Foram

várias tentativas de melhorar nesse sentido de recuperar o

aluno. E os professores, muitas vezes, não têm capacitação e

o material é feito às pressas.

Porque não trouxeram resultados ou foram poucos resultados.

A gente vê que nesses oito ou dez anos, a gente não consegue

resgatar esses alunos. Não conseguimos recuperar esses

alunos.

A gente explica que agora tem professor auxiliar para

trabalhar de maneira diferenciada com ele.

Se a gente for comparar com o reforço paralelo, como era

antes no contraturno, o professor auxiliar é melhor. O aluno

sai da sua aula, vai lá com o professor auxiliar e consegue

algumas mudanças que talvez a gente não consiga na sala

para resgatar alguns conteúdos. Ali, ele fica como se fosse

uma aula particular, com cinco, seis, oito alunos. Então, a

mudança está acontecendo e é significativa.

Então, dois professores na sala gera conflito. Não conflito

entre os dois professores, mas entre os próprios alunos. A

dinâmica da aula acaba não fluindo, porque alguns alunos

atrapalham e os próprios colegas acham melhor eles saírem

para o reforço. Já trabalhei dessa forma também.

Acho que reduzir o número de alunos para 30, 25 é o sonho

de qualquer professor. Seria uma alternativa melhor que ter

professor auxiliar.

Os alunos não compareciam

na recuperação paralela no

contraturno.

A recuperação na pré-aula

ou na pós-aula não

apresentava resultados.

A recuperação no

contraturno, na pré-aula ou

na pós-aula não oferecia

nada de diferente: “Foi mais

uma tentativa que não deu

em nada, não deu certo”.

Foram várias tentativas de

recuperação e os professores

não foram capacitados.

Na última década, a

recuperação oferecida não

conseguiu ajudar os alunos

O Professor Auxiliar

trabalha de maneira

diferenciada.

A recuperação com

professor auxiliar é melhor:

“...está acontecendo e é

significativa.”

Os próprios alunos

atrapalham os colegas em

recuperação.

Reduzir o número de alunos

em sala de aula é a melhor

forma para ajudar os alunos

que têm dificuldades.

Professor Auxiliar é,

geralmente, um professor

iniciante ou professor/aluno.

O professor gosta de ter um

Professor Auxiliar em sala

de aula.

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Geralmente, são professores [professor auxiliar] que estão

começando agora na rede, recém-formados. Geralmente, têm

também aqueles que ainda são professores-alunos, que dizer,

estão estudando ainda. São apresentados pela gestão que diz

que vamos traçar um plano para trabalhar com os alunos.

Gosto. E é o segundo ano que a gente está trabalhando dessa

forma. No ano passado, trabalhei com professor auxiliar na

sala de aula. Acompanhei os prós e contras. Nesse ano, já

decidimos trabalhar dessa forma: eu e o professor auxiliar.

Não.

Esse projeto da recuperação, com ajuda do professor auxiliar,

traz resultados. Sou a favor, embora não conheça muito a

legislação em relação a esses projetos. É um projeto inovador.

Dizem: olha, a partir de hoje, você vai ter um professor

auxiliar para ficar com os alunos que possuem maior

dificuldade e vocês vão fazer esse reforço para melhorar o

rendimento e melhorar o conceito no Saresp.

A gente não ouve muitos comentários dos outros professores.

Eu desconheço as opiniões. Sobre os outros professores,

parece-me que não sabem o que está acontecendo.

É, temos aqui na escola (continua rindo)... Nós temos aqui na

escola uma taxa muito grande de reprovação. Se a gente levar

isso em conta, temos 8 salas de final de ciclo, oitava série. Em

cada sala dessas, nós temos uma média de 7 a 8 alunos que

são reprovados. Se a gente pegar e buscar esses alunos que

foram reprovados, posso falar com convicção de que 80% dos

alunos reprovariam novamente. Talvez não seja feito algo

para que isso mude. Se não vão reprovar um ano, vão fazer

outro ano do mesmo jeito. E, às vezes, até com menor

desempenho. E vão chegar ao final do ano e acabar sendo

reprovados, não aprenderam nada.

Quando a gente não percebe que melhorou, o professor

auxiliar revê as atividades que ele fez, se ele vai permanecer

mais um bimestre, se tem outro aluno que pode se enquadrar

na sala de reforço. Então, há um acompanhamento, às vezes

só bimestral. O pouco tempo que a gente tem em reuniões, a

gente acaba deixando isso de lado. É uma falha do professor

da sala.

O professor não conhece a

legislação que trata do

Professor Auxiliar.

O professor considera como

um projeto inovador ter um

Professor Auxiliar em sala

de aula.

O Professor Auxiliar atende

os alunos com mais

dificuldades para melhorar o

rendimento e a notas da

avaliação externa – Saresp.

Os professores das demais

disciplinas desconhecem a

proposta de Professor

Auxiliar: “ parece-me que

não sabem o que está

acontecendo”.

Os alunos não estão

aprendendo: “não

aprenderam nada.”

A escola e os professores

pouco registram o

acompanhamento da

aprendizagem dos alunos.

Os pais são informados

sobre a aprendizagem dos

alunos através de um

registro técnico: “como está

no reforço, se está

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O que é direcionado para os pais é que nós temos aqui, o

sistema informatizado de registro de notas e frequência. E

existe lá uma avaliação do perfil do aluno que é de “xizinho”

(SIC) de múltipla escolha. Depois, a gente imprime todo

aquele documento e o pai recebe para ver se o filho está no

reforço. Então, o pai, de alguma forma quando ele vem para

a escola, ele participa, ele tem um acompanhamento, ele sabe

que o filho dele está no reforço, como está no reforço, se está

aprendendo, se está buscando aprender, se é esforçado, se tem

empenho, se não é bagunceiro. Então, esse elo existe.

Olha... (silêncio... risos...) a gente vê muito a mídia criticando

a Educação. Mídia assim como internet, TV. Vemos muita

crítica a gestão estadual e municipal. São vários fatores que

levam a educação a estar dessa forma: casos de violência, de

abandono e da falta de estrutura das escolas. São vários

motivos e a gente ouve muito que o Estado abandonou a

escola. O que fazer? Então, a gente vê os políticos e a política

refletirem na educação. Mas o que fazer eu não sei. É muito

difícil.

Tem estrutura agora porque tem todos esses problemas sociais

que levam o aluno a não conseguir aprender. Talvez, seja o

que a gente comentou lá no começo da fala: essa estrutura

familiar, essa violência, esses alunos que não aprendem,

mesmo uma escola estruturada como a nossa é. São vários

profissionais bons, frequentes, a gente não consegue atingir o

objetivo.

Não. As políticas da Secretaria de Educação não estão

garantindo a aprendizagem dos alunos. (silêncio... demonstra

preocupação)

Isso é problema de política educacional. Essa escola tem tudo

de que precisamos, mas nas outras está feio.

A gente ouve falar que falta recurso. Os professores criticam

esse negócio de governo falar e não acontecer nada.

Intensamente, fazem críticas ao governo: que a escola, a

educação foi abandonada, que falta melhorar a questão do

material, das apostilas... Apostilas fora da realidade dos

nossos alunos. Então, essa parte, sim, é muito criticada por

todos.

Pouco, muito pouco. As crianças estão aprendendo pouco.

Alguns professores mudaram a maneira de trabalhar depois

que começaram a fazer o curso “Melhor Gestão Melhor

aprendendo, se está

buscando aprender, se é

esforçado, se tem empenho,

se não é bagunceiro”.

O abandono da escola pelo

Estado: “São vários fatores

que levam a educação a

estar dessa forma: casos de

violência, do abandono, da

falta de estrutura das

escolas. São vários motivos

e a gente ouve muito que o

Estado abandonou a escola”.

Os alunos não aprendem

devido aos problemas

sociais.

O Estado não tem garantido

o direito à aprendizagem

A política educacional não

tem garantido o direito à

educação.

Os professores criticam o

discurso governamental

descolado da realidade, o

abandono das escolas e o

material “fora da realidade

dos alunos”.

“As crianças estão

aprendendo pouco”

Os professores mudam a

maneira de trabalhar quando

fazem cursos.

Tentativas da escola em

melhorar a aprendizagem

dos alunos.

A escola e os professores

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Ensino”. Assim, conduzem as aulas de outro jeito.

(Silêncio... risos... silêncio) A escola tem tentado melhorar.

Estamos buscando alternativas depois desse curso “Melhor

Gestão Melhor Ensino”. Sentamos para conversar e melhorou

um pouco. Fizemos algumas mudanças pra gente mudar essa

quantidade de “insatisfatório” e melhorar o Saresp. Estamos

buscando alternativas.

(Silêncio... professor incomodado com a pergunta) Direito...

(silêncio...demonstra inquietação...) Direito é... a gente já

associa direito a dever, né? O que é dever? E o que é direito?

(silêncio...) Direito é... em se tratando de escola, educação,

todos têm direito. Direito de aprender, de ter uma boa

convivência, de ter uma família estruturada, de ter um bom

professor. Direito acho que é... acredito que está ligado a

obrigação. O aluno tem o direito garantidoquando cumpre a

obrigação.

O nosso aluno, embora isso você não possa apontar como

causa dessa falta de estrutura, essa carência que o aluno tem,

talvez mesmo com todas essas questões de qualidade que as

escolas possuem você não consegue atingir os objetivos de ter

uma aula de qualidade, porque alguns alunos não querem

aprender, não aprendem.

Como é apresentada? É através de números, dados. Quem vai

bem no Saresp, tem melhor qualidade. É através das provas e

dos resultados do Saeb, do Enem. A gente vê lá a

classificação e fala: essa escola é boa e aquela não é. A nossa

está abaixo do básico e é vista como de péssima qualidade.

Então, é avaliado assim, isso é a qualidade.

Os projetos de recuperação deveriam garantir o direito de

aprender, mas nem sempre o aluno consegue aprender. Ele

tem o direito, mas não consegue aprender. Ele permanece

mais um ano fazendo aquela série, com duas aulas de

professor auxiliar, e não apresenta melhoras. Então, ele tem o

direito, mas nem sempre esse direito é alcançado,.Essas

associam a aprendizagem à

melhoria dos índices da

avaliação externa e não à

garantia do direito à

aprendizagem.

O professor associa o direito

à obrigação de cumprir os

deveres.

A escola não tem qualidade

“porque alguns alunos não

querem aprender, não

aprendem”.

As notas baixas ou altas são

indicadores únicos da

qualidade da escola e da

aprendizagem dos alunos.

Os projetos de recuperação

devem garantir o direito de o

aluno aprender, “mas nem

sempre o aluno consegue

aprender. Ele tem o direito,

mas não consegue aprender”

O aluno tem o direito: “mas

nem sempre esse direito é

alcançado”.

O Estado garante o direito

“...mas alguns alunos...você

sabe”

O professor busca melhorar

Page 89: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP de Assis.pdf · 1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: manutenção do poder e negação de direitos 29 1.4

89

políticas públicas até garantem o direito de aprender, mas

alguns alunos... você sabe. Fiz cursos da SEE, aprendi e

aplico em sala de aula. Procuro melhorar a qualidade da aula,

buscando alternativas de aprendizagem para os alunos.

A gente trabalha tanto, um absurdo. Como vai preparar aulas?

Sou a favor de um terço da jornada, ou seja, ter 28 aulas de 50

minutos com alunos e bom salário e não ter que trabalhar

feito um louco e adoecer. Sai de uma escola e vai para outra.

Tudo bem que tem dois meses de férias, mas preferia

trabalhar menos e melhor. Que tempo vai ter para preparar

aulas? Só essas políticas são pouco se não olham para o

professor. Cuidar do professor é tudo. Eu tenho 30 aulas e já

acho muito cansativo, pois tenho pouco tempo para me

preparar. Imagina com 50, 60 aulas? É isso que querem de

qualidade?

sua aula e sua prática

docente.

O desgaste do professor

frente a desvalorização

profissional: “A gente

trabalha tanto” ; “Só essas

políticas é pouco se não

olhar para o professor.

Cuidar do professor é tudo”

Page 90: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP de Assis.pdf · 1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: manutenção do poder e negação de direitos 29 1.4

90

Quadro XI. Pré-Indicadorese Indicadores – Entrevista 2 – Professora Beatriz –

Português

Pré-Indicadores Indicadores

Porque com os ciclos eles acham que, no final do ciclo, ele

não vai ser reprovado, muitas vezes ele aposta nisso e não

estuda. Na 8ª série, eles são muitos infantis, falta muita

maturidade e no primeiro semestre é bem difícil, no segundo

semestre a gente já percebe alguma diferença. Em anos

anteriores ,a gente tem conseguido mostrar algumas coisas

para alguns alunos, outros demoram um pouquinho mais, só

no ensino médio é que vão acordar para essa realidade.

É outra coisa que a gente tem conversado. Muitos hoje ainda

têm a mentalidade de que se ele copiar a lição ele está

participando da aula, não sabe que tem que estar trocando

ideias, buscando o que ele sabe, perguntando, apropriando-se

mesmo do conhecimento e eles não percebem isso, que estão

perdendo.A escola, para muitos, acredito que funciona como

lazer, contam histórias de todos os tipos ai quando você quer

ler um texto, tenta discutir, quando pede atividade é um ou

outro que tem interesse real em participar.

Se estão aprendendo?Alguns sim. É, alguns sim. Estaria

mentindo se falasse que não. Uma boa parte ainda precisa

amadurecer para essa questão, pela minha experiência

percebo que muitos, quando chegam no 1º, 2º anos do ensino

médio, amadurecem bastante.

O que deveriam aprender ainda falta muito, bastante.

Aprenderam mais, acredito que a gente não consegue atingir

todos como deveríamos atingir, chegam com certa defasagem.

Os que aprenderam são aqueles em que acredito que no

decorrer da caminhada vem com uma estrutura maior, com

um acompanhamento maior. A gente percebe que quando o

pai acompanha, eles conseguem acompanhar melhor. Aqueles

alunos que vêm da 4ª, 5ª séries lendo, escrevendo, eles

conseguem assimilar melhor o que a gente tenta passar nas

outras séries e têm muitos alunos que conseguem ler bem,

escrever bem, conseguem ser críticos, posicionar-se.Outros

mais tímidos não conseguem oralmente, mas conseguem

escrever e muitos não conseguem. Realmente não conseguem,

não conseguem copiar, não têm opinião própria, depende

A professora argumenta que

o aluno não estuda porque

sabe que vai ser aprovado no

final do ciclo.

A escola como espaço de

convivência e lazer.

Somente alguns alunos estão

aprendendo.

Os alunos apresentam certas

defasagens dos anos

anteriores e o professor não

consegue ajudar.

Os alunos que aprendem são

os que tiveram melhor

acompanhamento.

Os anos iniciais são

fundamentais na

escolarização dos alunos.

Com a ajuda do Professor

Auxiliar ficou mais fácil

para o professor acompanhar

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muito do outro para fazer o seu trabalho.

Hoje é até mais fácil porque tem aquele “Professor Auxiliar”

que está sempre acompanhando, sempre auxiliando, esse

professor de apoio sempre auxiliando no aprendizado.

Percebemos é que, aqueles que têm vontade, conseguem. Só

que uma grande parte não tem vontade realmente, não quer

fazer mesmo com o professor se dispondo a ajudar ,ele não

tem interesse em fazer, esse é mais difícil.A gente usa formas

diferentes para ver se esse aluno consegue escrever. O

objetivo até a 8ª série é ele escrever, ler e escrever bem, que

ele sabia se posicionar, a gente não se preocupa tanto com o

conteúdo, mas que ele sabia ler e escrever bem e se

posicionar, ter opinião própria.

Quando a gente percebe que ele tem vontade de aprender é

mais fácil. Sabemos que ele vai para série seguinte, vai

amadurecer e melhorar. Agora quando o aluno não tem

vontade é muito difícil, é muito difícil. Têm alguns alunos

que não conseguem, têm uma dificuldade tremenda,

tremenda, mas ele tenta, de alguma forma ele tenta. Esse

aluno, eu acho que ele de alguma forma vai caminhar, mesmo

não aprendendo ele vai caminhar. Agora aquele que não tem

vontade é muito difícil.

Da reprovação... é difícil né...(silêncio...) olha (ri muito...) da

reprovação né... vou falar do passado, só que o passado não

volta mais. Eu penso que antes, quando tínhamos a

reprovação, o aluno se preocupava mais em estudar, em saber,

em ir para série seguinte e a própria família não queria que ele

ficasse estacionado. A família acompanhava mais e hoje não.

Eles acham, que de uma forma ou de outra, só o fato de ele

vir para escola ele já está aprovado. Uma boa parte pensa

dessa forma, só de vir para escola já é aprovado, não faltou,

então é aprovado. Preocupa-me muito a questão do

aprendizado. Eles dizem: professora eu faço tudo! Mas só

copiam, o fato de ele copiar, ele acha que já aprendeu. Isso

não é aprendizado, ele só está copiando. Eu penso que quando

havia reprovação funcionava melhor, eu sei que a reprovação

não é o caminho, mas ainda não encontrei o caminho (ri

muito... gesticula e fica incomodada) não encontrei outro

(continua rindo...) e têm muitos alunos que são aprovados só

por conta de estarem na escola. Muitos alunos escolhem

matéria para estudar, não as que acham mais fácil, mas a de

que gostam, que têm maior afinidade.

a aprendizagem dos alunos.

Mesmo com Professor

Auxiliar tem aluno que não

se interessa.

A aprendizagem depende da

vontade do aluno em

aprender.

O professor afirma que

quando a escola reprovava o

aluno aprendia mais.

Os alunos acham que basta

estar na escola para serem

aprovados.

O professor afirma que

quando a escola reprovava

era melhor.

Os alunos são aprovados só

por estarem na escola.

O professor desconhece a

reestruturação dos ciclos na

rede estadual.

Com os novos ciclos haveria

mais reprovação e “acabaria

esse negócio de passar sem

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Eu acho que... (silêncio) que essa implantação... você fala

desses novos ciclos, né? Que estão sendo montados? Eu acho

que vai diminuir. Acho que os alunos vão ter mais interesse

na escola. Saberão que tem um trabalho diferente, que eles

estão sendo vistos de outra forma, a gente tem conversado

bastante com eles. Acredito que essa mudança de alguma

forma é para melhor. Vai acabar esse negócio de passar sem

saber.

Olha, eu entendo a ideia como muito boa porque o ciclo é....

prevê um monte de movimentos do aluno. Se não aprendeu

naquele momento, ele pode aprender em outro,sinto a ideia

muito boa, só que os alunos não entendem assim esse ciclo,

eles acham que, como eles não têm interesse, muitos não têm

interesse em aprender, apenas em passar de ano, eles não

entendem esse ciclo, não têm essa ideia que o ciclo tem.

Os professores têm discutido os ciclos, talvez não como

devesse, mas é discutido sim, acredito que a todo momento a

gente está refletindo sobre isso.

Os professores que são antigos (ri muito...) sempre estão

falando: Antes não era assim, com a mudança de 1996, se eu

não me engano, e penso que foi em 1996. Até 1996 era uma

coisa, de 1996 para cá ficou diferente.Antes era pior, agora a

gente aceitou bastante a ideia dos ciclos. Mas vemos que em

muitos momentos não funciona, embora no papel seja muito

bom, acho que é maravilhoso, mas no dia a dia a grande

maioria dos professores percebem que não funciona.Hoje

mesmo ouvi uma professora falar: um aluno de 7ª série que

vem para escola sabe que se ele fizer ele vai ser aprovado e se

ele não fizer também vai ser aprovado, ele está ali quietinho,

não está prestando atenção em nada, não está atrapalhando as

aulas, copiou a lição, vem sempre para escola, não tem como

reprovar um aluno desse. Ele não atinge o que queremos, mas

ele de alguma forma faz, mas ele não pensa que tem que

aprender, que tem de dar uma devolutiva do que está

aprendendo.

Dessa maneira, com o professor auxiliar, tem funcionado

melhor, pelo menos com os alunos que estão na sala, estão

com interesse, mesmo dentro do horário o professor está ali

acompanhando, orientando, não tem como eles não virem.

Por enquanto ainda não. Acho que caminha sim para

resultados, não tem como não ter. O professor dentro da sala

saber”.

Os alunos não têm interesse

em aprender e só querem

passar de ano.

As discussões sobre os

ciclos são superficiais.

Aceitação da política de

ciclos sem conhecimento da

proposta.

A ideia dos ciclos é muito

boa no papel, mas “não

funciona”.

O apoio aos alunos com

dificuldades tem funcionado

melhor com a chegada do

Professor Auxiliar para

aqueles “com interesse”.

O professor gosta de contar

com um professor auxiliar.

Menos alunos em sala de

aula melhora a

aprendizagem.

A aprendizagem dos alunos

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93

acompanha os alunos em grupos menores mas com maiores

dificuldades e estou gostando. Pelo menos nesse início tenho

gostado bastante, tem me auxiliado bem.

No ensino fundamental menos alunos em sala de aula

melhorariam, mas, principalmente, eu acho que esse problema

hoje é um problema social. Não é tanto a escola, é a família,

as normas mesmo, eles não têm esses parâmetros pelos quais

as famílias deveriam passar. Só isso já melhoraria bastante.

(silêncio... a professora pensa bastante para responder...) Se

meus alunos têm o direito à aprendizagem garantido?

Acredito que temos feito o possível para que o aluno aprenda

mais. É o que eu falei, passa pelo querer, as oportunidades

têm sido dadas Tudo que precisa fazer se o aluno tem

dificuldade de aprendizagem a gente procura fazer. Acredito

que a escola está fazendo o que é possível fazer mas aí passa

pela questão do querer do aluno e do acompanhamento dos

pais.

O material para o aluno é positivo, mas o aluno ficou muito

viciado nisto, porque ele ganha um no começo do ano aí se

acaba o lápis ele acha que ele não pode comprar nenhum

lápis. A escola, nesse sentido, ficou muito assistencialista.

Considero. Considero sim o projeto de reforço porque antes o

professor era obrigado a dar conta de todas as dificuldades

dos alunos e agora ele conta com estes projetos de

recuperação que são, sem dúvida, um avanço.

(pensa bastante... fica em silêncio) Dos meus trezentos alunos

acho que um terço seria aprovado. É um terço, com domínio

como um problema social.

O professor afirma que a

escola tem feito tudo para

que os alunos aprendam.

A escola tem feito tudo e

quem não aprende é porque

não quer.

A escola é vista pelo

professor como

assistencialista.

Os projetos de reforço e a

figura do Professor Auxiliar

são considerados como um

avanço pelos professores.

O professor aprovaria só um

terço dos seus alunos.

Para o professor sempre

haverá uma parte de alunos

que não aprendem, que

fracassam.

O professor só aprova

“porque eu tenho que

aprovar.”

O professor prefere a escola

seriada.

O professor afirma que os

alunos têm o direito à

educação garantido: “Eles é

que não estão sabendo

aproveitar, eles têm esse

direito! Eles têm garantido

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total um terço, uns 100 alunos.

Eu acho... (demonstra inquietação, fica em silêncio e levanta

os ombros...) Não que eu não aprovaria. Aprovaria, mas com

ressalvas. Com ressalvas, porque boa parte não aprendeu

100% do que foi transmitido. Acho que mesmo antes quando

havia reprovação sempre houve uma parte que não atingia,

menos que hoje, mas sempre houve uma parte que não

atingia. Só que eu acho que com o ciclo isso aumentou,

aumentou o número de alunos que passam ser estar

totalmente aptos a seguirem. Aprovo porque eu tenho que

aprovar.

Eu entendo seriação melhor, eu entendo.

Mas eu não acho que eles estão tendo o direito. Acho que eles

têm o direito à educação! (fala de forma afirmativa e em tom

de voz mais elevado) Eles é que não estão sabendo aproveitar,

eles têm esse direito! Eles têm garantido esse direito! Agora

se ele quer aproveitar isso que é o problema. Ele não tem

consciência de que isso é para o bem dele. Ele não tem essa

consciência, mas como eu falei a gente oferece, a escola

oferece, mas eles não aproveitam. Não vou mentir. É igual

hora que você perguntou sobre aprovar, é um terço só. Todos

têm esse direito porque a gente procura é ensinar para todos,

mas é claro que não vai atingir todos, só que isso passa pelo

querer, pela consciência, pela maturidade, então 100% do que

a gente está passando eu acredito que um terço, outros vão

passar sem saber nada, com ressalvas, não aproveitaram tudo

que tinha que aproveitar. Mesmo esses, que nesse momento

estou dizendo que não aprovaria, ele está tendo esse direito

garantido. Muitas vezes ele não quer essa oportunidade, ele

nem sabe para que precisa dessa oportunidade. Ai é difícil né!

Eu acho que é isso que tentamos é... (muda radicalmente o

tom de voz) Conversamos com eles falamos das necessidades,

do direito, do que é necessário, é... mostrar no dia a dia.

Mostramos casos de pessoas que estudaram e venceram,

outras não estudaram e também venceram, mas tiveram sorte

ou ajuda. Tudo isso é conversado, sobre os espertos que de

alguma forma conseguiram vencer. A oportunidade é para

todos, agora uns aproveitam e alguns não, infelizmente. Isso é

escola.

esse direito! Agora se ele

quer aproveitar isso que é o

problema.”

Os alunos têm o direito de

aprender garantido, mas não

aprendem porque não

querem.

O professor associa o direito

à aprendizagem ao empenho

pessoal e ao vencer na vida.

Alguns alunos aproveitam a

oportunidade, outros não:

“Isso é escola”.

O professor sabe que é

desvalorizado e que isso

prejudica a aprendizagem

dos alunos.

O professor afirma que o

direito à aprendizagem é

garantido, mas os alunos não

cumprem com o dever:

“Quanto ao direito a gente

garante: quero saber é do

dever deles.”

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E eu quero corrigir, quero devolver para o aluno, quero que

ele veja o que ele errou, que discuta comigo o que tem que

melhorar e se você não fizer esse trabalho fora de sala de aula

então é muito pouco, acho que deveríamos ter menos aulas,

mais espaços para corrigir provas, preparar aula, conversar

mais com os professores sobre as turmas e, é claro, que tudo

isso passa pela questão salarial, se você pudesse trabalhar

menos e ganhar mais seria o ideal.

Nosso papel é importante porque somos orientadores,

estudamos junto com os alunos, a gente está sempre

norteando, será que fica melhor desse jeito ou não. Acho que

o nosso papel é orientar, estar sempre orientando, buscando

soluções para os problemas, nosso papel é esse. Quanto ao

direito a gente garante, quero saber é do dever deles.

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Quadro XII. Pré-Indicadorese Indicadores – Entrevista 3 – Professor Carla –

Matemática

Pré-Indicadores Indicadores

Estou resgatando de uma maneira assim muito árdua. Procuro

sempre estar dialogando, falando para eles a importância dos

estudos. A importância dos vestibulares. Os concursos e a

importância em desenvolver os conteúdos propostos.

Converso muito e consegui resgatar alguns. Porém com

alguns ainda não consegui participação na sala de aula.

Então... (silêncio...) É ...( a professora demonstra

nervosismo). Primeiro passo você na sala de aula vai

desenvolver o conteúdo proposto. Sabemos hoje que existem

vários fatores que auxiliam. No mínimo eles estão avançando,

agora aqueles poucos que encontrei continuam no mesmo

patamar do início do ano.

Como seriam os alunos aprovados?(sorri e fica inquieta).

Alunos aprovados. Na verdade não sou eu que vou aprovar o

aluno, ele que aprova ele mesmo! De acordo com a nossa

metodologia com o retorno que ele dá todos os dias. De

acordo com as avaliações, as atividades avaliativas da

escola, eles vão tendo menções, essas menções vão fazer

com que ele se aprove ou não.

Já diagnostiquei uma parcela de alunos com dificuldades no

aprendizado. Por questões sociais, de família, o que eu

posso fazer? Na sala de aula o que eu consegui até o

momento foi chamá-los para uma atividade diferenciada

no qual eu pedi para que eles realizassem de maneira bem

tranquila, de uma forma bem carinhosa, que realmente

demonstrasse ali o que ele sabe. A partir daí dou a

devolutiva para eles.

No momento não. Já falei antes que eu não reprovo. São

eles que se reprovam. São os próprios alunos que se

reprovam. Muitas oportunidades são oferecidas. Procuro

resgatar sempre o máximo, então quer dizer, de acordo

com a progressão continuada tenho que aprovar. Da

forma que venho trabalhando esse aluno para ele ser

reprovado só se realmente for evadido e não fizer as

atividades,se não tiver participação, desempenho.

Essa questão é assim (fala baixo e gesticula muito) Quais são

os alunos que eu aprovaria e não aprovaria? Em primeiro

lugar eu levo muito em conta o desenvolver da unidade

escolar, não só meu método de trabalho. Eu levo em conta o

aluno não só na minha disciplina. Levo em conta as outras

disciplinas também.Se ele ficar comigo em questão de

notas, menção baixa passaria pelo conselho devido que as

O aproveitamento escolar e

o conteúdo proposto servem

para o aluno passar em

vestibulares e concursos.

Alguns alunos continuam no

mesmo patamar do início do

ano.

A responsabilidade pela

aprendizagem é só do aluno:

“...ele que aprova ele

mesmo!”

As notas dos alunos são

definidas por avaliações e

atividades.

As notas atribuídas aos

alunos é que define a

aprovação ou não.

“...essas menções vão fazer

com que ele se aprove ou

não.”

O aluno não aprende por

questões sociais e de família

e a professora alega não

poder fazer nada.

Para o aluno aprender a

professora oferece

atividades diferenciadas

“...de uma forma bem

carinhosa”.

A responsabilidade por não

aprender é só do aluno: “Já

falei antes que eu não

reprovo. São eles que se

reprovam. São os próprios

alunos que se reprovam.”

A professora aprova os

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outras matérias aprovam. Vou fazer o que? Ele está

contemplado? Provavelmente eu não reprovaria nenhum

aluno porque a progressão continuada aprovaria.

(silêncio, fica incomodada com a pergunta - Aprovaria

por conta da progressão continuada ou por que estão

aprendendo? Sorri muito) Que pergunta difícil? (repete a

pergunta várias vezes) Não. Não. Sabe por que demorei na

resposta? Em um primeiro momento eu não pensei nisso.

É muito provocativo pensar nisso, a questão do meu dia a

dia. Não vejo meio de reprovar com a progressão

continuada. Sou uma pessoa muito humana, eu não me

vejo reprovando um aluno. Eu vou reprová-lo porque não

aprendeu minha matéria. Eu nunca fiz isso. Não vou

mudar essa concepção de que ele não aprendeu e ficou

com nota baixa. Os alunos com nota baixa eu deixaria

para o conselho deliberar pelo sim ou não. Se o conselho

reprova, eu também reprovo.

Percebo que são ideias que vieram para somar ao nosso

trabalho para que o aluno avance no aprendizado. Agora o

que percebo é a organização do trabalho, os métodos de cada

um. É necessário criar um contrato didático para esses

negócios de recuperação paralela, projetos, aula de reforço, de

apoio. Precisa de uma organização maior para o exercício

dessas atividades para ter um retorno melhor com meus

alunos. O que eu percebo é que amaioria gostaria de mais

reprovação, que houvesse mais reprovação. O professor

acredita que reprovando o aluno ele vai se dedicar mais às

aulas e vai prestar mais atenção. Estudar mais, respeitar

mais o professor, melhorar seu conhecimento. Os

professores acreditam que reprovando o aluno será

melhor no nosso dia a dia, não vai ter essas preocupações

todas. Desafios de ter que ensinar um aluno a ler e

escrever os símbolos matemáticos. Se houver reprovação

eu vou ter na sala só quem já sabe, assim posso ensinar

mais. Não vamos ter esses casos paralelos que não

aprendem.

Eles perguntam: Não entendi como esse aluno passou? Como

que meu filho passou sem aprender nada? Tinha notas

vermelhas e foi aprovado? O pai não entende a progressão

continuada. Já comentei anteriormente que ele não tem essa

visão que precisava acompanhar o aprendizado do seu filho

na escola.

O professor não conhece [progressão continuada]. Esse

professor precisa ser observado, auxiliado, incentivado. Ai

o trabalho dele vai desencadear de uma forma que

alunos porque de acordo

com a progressão

continuada tem que aprovar.

A professora reprovaria só

na disciplina dela, não o faz

porque o conselho aprova.

A responsabilidade pela

aprovação dos alunos que

não aprenderam é da

progressão continuada.

Se não fosse obrigada pela

progressão continuada, a

professora reprovaria os

alunos.

Quando questionada sobre

aprendizagem e progressão

continuada a professora

considera que é um assunto

difícil.

“Não vejo meio de reprovar

com a progressão

continuada”

Sobre o tema reprovação

contraditoriamente a

professora afirma ser “uma

pessoa muito humana”, mas

“se o conselho reprova, eu

também reprovo”.

A maioria dos professores

gostaria de mais reprovação.

“O professor acredita que

reprovando o aluno ele vai

se dedicar mais às aulas e

vai prestar mais atenção”.

O aluno que é reprovado

dedica-se mais as aulas.

A reprovação faz o aluno

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contemple a progressão continuada. Quando não há isso

cada um trabalha da forma que é possível, do jeito que dá.

Essa organização é feita através do diagnóstico da

dificuldade do aluno. Chega o “Professor Auxiliar” e

passamos para ele as dificuldades dos alunos. O professor

auxiliar vai procurar trabalhar dentro daquelas

dificuldades que o aluno apresentou que o professor da

sala diagnosticou.

No momento temos professor auxiliar de Língua Portuguesa.

De matemática não tem. Mas nunca deixei de fazer

recuperação com meus alunos. Com ele (Professor Auxiliar)

ou sem ele estou sempre fazendo minhas atividades paralelas

que se tornam atividades individuais. Eu mesmo crio as

atividades com meus alunos. Estou sem professor auxiliar,

sem apoio, não tem professor.

Não, anteriormente era fora do horário de aula, um horário a

parte. O aluno era indicado para o reforço e viria antes do seu

período ou depois do horário da aula dele. No contraturno

com o professor do reforço.

Acredito que tem dois ou três anos. A recuperação paralela e

contínua é da competência do professor em sala. Deveria ser.

O reforço era fora do horário como tinha comentado. Como

era feito? O professor da sala realizava o diagnóstico e

apontava os alunos que estavam com dificuldades de

aprendizagem e encaminhava uma listagem, com no máximo

15, 20 alunos para montar uma turma. Colocaria as

dificuldades apresentadas, as habilidades e competências

que cada um teria. Outro professor contratado que ia

lecionar essa aula de reforço. O que às vezes dificultava

era a frequência dos alunos, que já vêm com essa

concepção de que estudar não é legal, não é gostoso, tem

que fazer lição, que aprender não é bom.

Não. Não tenho, mas já tive.

(silêncio, demora para responder) Essa proposta é legal.

Ajudava meu aluno a sanar a dificuldade. Se tem outro

professor auxiliar na sala com o professor titular, temos

mais tempo de dar conta do conteúdo com os outros

alunos. Não tem professor de Matemática para contratar,

é o que dizem.

Todos os professores gostariam de ter um professor de

apoio, não somente de Português e Matemática, que no

caso são disciplinas que necessitam mais de um professor

de apoio. Todas as disciplinas são importantes. Mas

respeitar mais o professor.

O retorno da reprovação

escolar como redentora dos

problemas escolares: “Os

professores acreditam que

reprovando o aluno será

melhor no nosso dia a dia,

não vai ter essas

preocupações todas.”

A reprovação escolar é boa

porque seleciona os alunos.

Com a reprovação escolar:

“Não vamos ter esses casos

paralelos que não

aprendem.”

O professor não conhece a

progressão continuada e

“cada um trabalha da forma

que é possível, do jeito que

dá”.

O professor auxiliar

organiza seu trabalho de

acordo com o diagnóstico da

aprendizagem do aluno.

A professora organiza

atividades de recuperação

para os alunos.

Não tem professor auxiliar

de Matemática.

A proposta de ter um

professor auxiliar é bem

aceita pela professora.

Não tem professor de

Matemática para contratar.

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Português e Matemática, que é a junção de todas elas, que

vão fazer diferença para que o aluno aprenda.

(silêncio, sorri muito) Como uma primeira experiência.

(gesticula muito e fica incomodada) Foi mínima, não houve

um avanço do tipo foi “glorioso”, com 100% de

aprendizado, com todos os alunos na mesma

aprendizagem, no mesmo nível dos demais alunos. Houve

um avanço mínimo.

Eles têm o direito à aprendizagem garantido. (sorri muito

e fica incomodada) Agora se eles visualizam que é de

direito, que é garantido para eles, isso que eu quero saber

deles? Se eles querem esse direito? Essa também é uma

dúvida minha. (silêncio, respira fundo e parece nervosa)

Então, conforme iniciamos a conversa sobre a realidade deles:

que preciso conhecer meus alunos. Se eu for retirar mais

tempo para conhecer meus alunos, para o meu trabalho, eu

não vou fazer mais nada na vida! Não vou viver nada!

Dependo da equipe. São muitos alunos. Se fôssemos uma

equipe ,conheceria melhor meus alunos, assim eu poderia

falar que estão aprendendo 100%.

Os colegas apresentam muita dificuldade de transmitir, de

ensinar, de querer fazer com que o aluno se interesse. O

aluno não vê significado para aprender. Não vê o

conhecimento. Ele quer de forma diferenciada, mais

alegre e com menos cobrança. Ele não quer ter problemas,

não quer desafios que chamem à atenção. Não quer,

muitas vezes, nada.

Garantimos sim [o direito à aprendizagem] de uma

maneira mais formal. Tenho certeza de que grande parte

deles vem para escola e os professores procuram ensinar,

deixar o aluno preparado para o ENEM, para um

concurso. É voltado para o teórico, mas não posso

garantir que isso garante. Fazemos nossa parte, nossa

prática. Agora se alguns alunos não fazem a parte

deles...Olha o professor tem feito o máximo para garantir

esse direito do aluno, o que precisamos é de trocas, de

reuniões. O professor precisa ampliar seus conhecimentos.

A gente depende de tudo isso, de uma estrutura que possa

disponibilizar para o professor e precisamos estudar. A

estrutura física da escola, de um modo geral,

equipamentos, internet. Precisamos de um professor que

tenha conhecimento das tecnologias e onde precisa de um

curso de informática. Sinto falta da troca de experiência

com meus pares.

Todos os professores

gostariam de ter um

professor auxiliar.

A melhoria da aprendizagem

dos alunos foi pequena

mesmo com o apoio do

professor auxiliar.

Os alunos deveriam ficar no

mesmo nível de

aprendizagem.

O aluno tem o direito à

educação garantido, mas não

aproveitam.

Quando o assunto é direito à

educação a professora

dissimula e procura mudar

de assunto.

O aluno quer uma escola

diferente só que “O aluno

não vê significado para

aprender. Não vê o

conhecimento....não quer ter

problemas, não quer

desafios que chamem

atenção. Não quer, muitas

vezes, nada.”

Os professores fazem a parte

deles para garantir o direito

à educação: “Agora se

alguns alunos não fazem a

parte deles...”

A professora reconhece que

precisa dominar outros

conhecimentos e dialogar

com os demais professores.

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100

Quadro XIII. Pré-Indicadores e Indicadores– Entrevista 4 – Professora Diana –

Português

Pré-Indicadores Indicadores

Eu os vejo como muito carentes, não só de aprendizagem,

mas de conteúdos. A gente se envolve com esses alunos que

são carentes. Carentes de carinho mesmo, amor de pai e mãe.

Eles falam da vida deles. Eu também converso, falo algumas

coisas minhas e eles falam que agora, na época deles, é

diferente e assim vai. Eles são espertos e conversam bem.

Falam que vem aqui só para estudar, mas a gente sabe que

não é só isso. Eles vêm para encontrar os amigos, para

namorar, para jogar futebol, brincar, jogar cards se a gente

deixar. Fazem tudo menos parar para estudar, fazer o que

precisam fazer. Mas eles também vêm para aprender, eles

querem aprender. Na fala deles eles querem só brincar, mas

também querem estudar, saber, aprender.Penso que falam isso

porque os pais falam que precisa ir para escola, repetem a fala

dos pais.

Minhas salas estão cheias, uns 35, 40. Como alguns

transferem devo ter 33, 37 por sala. Em média tenho, deixa

fazer a conta, quatro manhã, quatro tarde, uma noite: tenho

uns 350 alunos (sorri muito e demonstra preocupação). E

tenho que dar conta de todos eles!

Tem turma que vai bem, aproveita bem, mas tem turma que

tem muita dificuldade. Tenho alunos que não sabem ler ou

escrever e às vezes eles copiam, mas não lê, a letra é linda,

mas ele não lê sozinho. Não consegue produzir nada a não ser

copiando, mas não é a turma inteira. Então por conta dessas

dificuldades não dou conta de trabalhar com todos. Faço as

atividades diferenciadas com esses alunos que contam com o

“Professor Auxiliar”, que ajuda na sala de aula. Em casos

muito específicos preciso ver o que vou fazer com ajuda desse

professor auxiliar. No aproveitamento, no geral, eles vão bem,

tem uma turma da manhã que tem mais dificuldades. Tenho

duas turmas, uma vai melhor e a outra não, é um pouco mais

abaixo.

(sorri muito... gesticula... demora bastante para responder)

Estão aprendendo? Acredito que estão aprendendo. Eles

participam, eles falam que aprendem, alguns aprendem.

Alunos não dominam os

conteúdos.

Os alunos são “espertos e

conversam bem”.

A escola é um espaço de

convivência para os alunos.

Os alunos querem aprender.

O professor tem que dar

conta de todos os alunos.

Os alunos apresentam

muitas dificuldades.

Alguns alunos não sabem ler

e escrever.

O professor auxiliar ajuda na

sala em atividades

diferenciadas.

O professor tem turma que

aprendeu mais e outras não.

O professor não tem

convicção em responder se

os alunos estão aprendendo.

O professor afirma que os

alunos participam.

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101

Aprovados? Deixa-me pensar? (demora a responder...) Ora!

Eles são aprovados, tem que ser todos aprovados!

Não é que eles seriam não aprovados. Existem alunos que têm

muitas dificuldades, então a gente faz atividades diferentes

com eles. Como agora temos o professor auxiliar a gente

senta e vê quais são realmente as dificuldades dos alunos, dos

problemas deles, das atividades diagnósticas. Fazemos de

tudo para que ele não fique para trás, que acompanhe o grupo.

Não deixo o aluno trabalhar sozinho, sempre tem um que sabe

melhor os conteúdos, o que está sendo trabalhado no

momento, nos trabalhos. Enfim, nunca trabalham sozinhos,

sempre estão em pares, em trios, em quartetos, até um pouco

mais, mas eles sempre trabalham. Um ajuda o outro, não sou

só eu. Eles não são não aprovados, no fim sempre sabem,

sempre tem alguma coisa. Não ficam para trás, quem fica para

trás é aquele que não frequenta a aula.

(silêncio e demonstra inquietação com o tema reprovação)

Não. Eu até reprovaria alguns um tempinho, mas não entendo

que é o caminho. Deixá-lo na mesma série para ele aprender,

eu não sei.

Eu não concordo muito que o aluno seja reprovado porque, às

vezes, o conteúdo que eu estou dando lá não é aquilo que vai

definir o que ele vai ser amanhã. Não é esse conteúdo que vai

definir se ele vai prosseguir. Acho que sempre ele sabe uma

coisa a mais. O que fica para trás mesmo, que não vai passar é

o que falta demais. Respondi? É isso?

Da reprovação? A gente sempre ouve: Não podemos

reprovar! Faz-se de tudo para aprovar o aluno. Quanto menos

reprovação melhor. É o que a gente escuta, não só eu, mas os

outros professores também. Então a gente faz tudo para

recuperar o aluno. O que ele sabe realmente de um conteúdo

naquele momento não vai fazer com que ele mais tarde seja

caso para retenção. Então a reprovação a gente não vê com

bons olhos, a gente tem que fazer o máximo para recuperar o

aluno e que ele consiga caminhar com a turma.

Os alunos são aprovados

porque “têm que ser todos

aprovados”.

Os alunos que apresentam

mais dificuldades fazem

atividades diferenciadas.

O professor titular e o

professor auxiliar

preocupam-se com a

aprendizagem do aluno para

que ele “não fique para

trás”.

O professor reprovaria seus

alunos por “um tempinho”.

O professor reprovaria seus

alunos, mas sabe que não é o

caminho.

O professor não concorda

muito com a reprovação,

mas reprova.

O aluno que não aprendeu o

conteúdo sempre “sabe uma

coisa a mais”.

O professor não reprova os

alunos porque “sempre

ouve: não podemos

reprovar”.

O professor não vê a

reprovação com “bons

olhos”.

O professor faz o máximo

para o aluno caminhar com a

turma.

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102

Não são os professores. Porque pelos professores, mesmo se a

gente fosse realmente fazer, como a gente talvez pudesse

fazer, mas não pode, talvez tivesse ai uns 10 de alguma sala.

A gente sabe que não pode reprovar. A gente sabe que isso já

vem de cima, quando a gente vai para uma sala de conselho,

passa uma nota e, às vezes, a gente tem lá uma nota vermelha,

a gente sempre tem que pensar no melhor, a gente não deixa

o aluno. Como é difícil falar essas coisas (a professora ficou

muito incomodada e silenciou.)

Talvez seja melhor para escola, para Secretaria da Educação,

é assim que eu penso. Mas para o aluno eu não sei, às vezes

seria até bom ele ficar mais um tempo para ele, sei lá,

caminhar melhor com a turma. Eu tenho aluno com laudo. Ele

não consegue acompanhar a turma e nada que você faça.

Escrever e ler não sabe de jeito nenhum, ele não consegue,

tem alguma deficiência intelectual. Ele não consegue. Esse

não vai. Sobre esse aluno a gente recebe aquelas conversas de

que você tem que aprovar porque ele tem um problema. Esse

aluno vai para frente, só que esse aluno precisaria talvez de

um acompanhamento psicológico, quem sabe? E a gente

como professora não está preparada para lidar com esse tipo

de situação, esse tipo de aluno. Daí tem que aprovar? Eu não

sei como a gente faz? E ai a gente, como eu falei, eles falam

para gente aprovar, mas o melhor é não aprovar, às vezes é

até melhor para o aluno.

(pensa muito, fica incomodada, diz em voz baixa: “Ai meu

Deus do Céu!”...) A gente não pode mudar esse assunto de

reprovação (sorri bastante e demonstra nervosismo). Se fosse

mesmo fazer de acordo com que o aluno precisa nos testes

que a gente faz talvez ficassem alguns para trás, mas assim,

uns cinco de cada turma talvez.

Seriam as avaliações a que os alunos são submetidos. Não é

teste, falei errado a palavra teste. São as avaliações que a

gente propõe aos alunos. Em uma avaliação escrita o aluno

vai mal, mas tem as avaliações que também fazemos no

processo. Às vezes no processo, ele não consegue ir para

frente, não consegue evoluir, não consegue evoluir, nem sei

se posso falar aprender, mas ele não consegue, às vezes, fazer

aquilo que estamos oferecendo também, não ajuda também,

fica patinando.

Da reprovação? Das avaliações? Olha, pela maioria dos

professores, a gente sempre tenta recuperar o aluno, sempre

tentando ajudar, sempre tentando fazer alguma coisa, mas

também tem muita conversa: “Podia ficar. Não sabe tem que

O professor quer reprovar,

mas não pode.

O professor aprova os

alunos porque é pressionado

pela direção da escola.

Reprovar os alunos não é

bom para a Secretaria da

Educação.

O professor entende que a

reprovação ajuda o aluno a

caminhar melhor com a

turma no próximo ano.

O professor não sabe como

ajudar o aluno para que ele

não reprove.

O professor afirma que

reprovar às vezes é melhor

para o aluno.

O assunto reprovação

escolar incomoda o

professor.

Os testes mostram que parte

dos alunos deviam ser

reprovados.

O aluno não consegue

aprender e “fica patinando”.

Os professores tentam

recuperar os alunos e

acreditam que a reprovação

é uma forma de ajuda.

A escola obriga os

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103

reprovar”. Mas assim, com relação à escola reprovar, a escola

lá sempre coloca que não podemos reprovar o aluno porque

ele é submetido a uma avaliação escrita e ele não conseguiu e

nós não podemos reprovar. Então como a gente pode ajudar?

É acho que é isso? Será que eu respondi?

Os ciclos agora aumentaram, é isso né? Conversamos sobre

isso, mas não conversamos muito. É que o aluno poderia até

ficar reprovado. Poderíamos avaliar os alunos em três fases e

ele poderia ficar retido por três séries, 5º ano. Não, 3º ano, 6ª

ano e 9º ano, que são as séries em que eu dou aula. Então

assim, essa questão dos ciclos, não vejo como algo ruim, no

caso, no tocante a trabalhar com eles, não vejo como algo

ruim é, na verdade eu... (fica em silêncio...)

Tem colegas que falam que têm que ficar para trás, quem sabe

mais um ano para ele aprender mais um pouco. Se tenho esse

aluno com problema intelectual, porque vou deixar para trás,

mas se ele também acompanha. Mas os colegas dizem que

não gostam dessa questão dos ciclos. Por eles preferiam até

que andássemos para trás, que realmente tivesse reprovação, a

seriação e não os ciclos. É essa conversa que a gente escuta

pelo que falam. E que têm outros, alguns, que são a favor dos

ciclos.

A prova, a avaliação escrita como um jeito de reter o aluno,

ainda tem essa, infelizmente, ideia de reprovar o aluno. Ter

aumentado um ciclo para reprovar, não sei o que penso.

Estou ficando nervosa (sorri bastante e parece querer falar

mais e não consegue.)

Tem a ideia desse professor auxiliar que vem agora na sala de

aula. Não assimilei direito porque estava acostumada com

aquele professor do reforço, ainda não estou acostumada com

isso, com essas novas denominações, então tenho um

professor que vem, acredito que é o Professor Auxiliar. É

estou achando bom, está ajudando bastante.

Esse projeto do Professor Auxiliar é recente. Teve uma época

que não tinha esse professor auxiliar, que ora fala apoio, ora

fala reforço. Tem coisa de dois anos isso. O professor antes

era um professor que vinha e tirava os alunos da sala e nós

fazíamos, no caso eu titular da sala, fazia o levantamento,

uma avaliação diagnóstica e verificávamos os alunos que

professores a aprovarem os

alunos.

O tema ciclos de

aprendizagem é pouco

trabalhado na escola.

O professor não entende a

mudança atual dos ciclos,

mas vê como uma

possibilidade de reprovar

mais alunos.

O professor afirma que

outros professores defendem

a reprovação para: “quem

sabe mais um ano para ele

aprender mais um pouco”.

O professor afirma que os

colegas não gostam dos

ciclos: “que realmente

tivesse reprovação, a

seriação e não os ciclos”.

Alguns professores são a

favor dos ciclos.

O professor demonstra

ansiedade quando o tema é

ciclo e reprovação escolar.

O professor não conhece a

proposta de ter um professor

auxiliar.

Mesmo sem conhecer a

proposta o professor acha

bom ter um professor

auxiliar.

O professor titular e o

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104

tinham maiores dificuldades para acompanhar a turma e os

encaminhava para o reforço com outro professor em horário

diferente da aula. Vinham antes para a aula, entravam uma

hora antes e tinham as aulas de reforço com esse professor,

mas ele já tinha em mãos a avaliação diagnóstica e ia

trabalhar com o aluno. Depois o aluno vinha para sala

continuar.

Hoje é diferente. Pelo que vejo falamos desse professor

auxiliar que está chegando. Ele vem, fica na sala de aula e me

ajuda com aqueles que na hora estão com dificuldades.

Vamos de carteira em carteira apoiando, trocando ideias com

os alunos, fazendo atividades. Conversamos, enquanto eles

fazem as atividades e vamos avaliando o processo. Se eles

estão conseguindo, ou se não estão conseguindo aprender não

sei. Acho que esse professor veio em uma hora boa. Foi bem

melhor que a outra situação que nós tínhamos de tirar os

alunos da sala de aula. Para o professor, às vezes, até seria

bom. Você tem lá uma sala indisciplinada e você precisa dar a

sua aula e, as vezes, você precisa tirar esses daqui porque dão

muito trabalho. Já ouvi muito professor falar assim, que era

melhor o outro projeto para tirar os indisciplinados da sala:

então tira porque é melhor!. Acho que não pode ser como

punição senão você, sabe, eu me preocupo muito com os

alunos.

No ano passado eu tive uma professora que ficou com os

alunos, eu não sei se era professor auxiliar ou se era do

reforço. Eu não imaginei que os alunos aprenderam. Só sei

que ela ajudou os alunos pouco. Era um professor da

disciplina específica e os alunos precisavam de alfabetização.

O professor não sabia alfabetizar, não ajudou os alunos. Eles

continuaram com as mesmas deficiências que apresentavam

para desenvolver certas atividades. São os mesmos alunos que

tenho hoje e eu não vi melhora, não vi ajuda. Então vieram

outras professoras, só que não deram essas aulas, só faltavam,

não sei o que aconteceu.

Essas que chegaram agora trabalham mais, inclusive falei que

tem hora que vai ficar com a gente e tem hora que vai tirar o

aluno da sala, isso é um ou dois, no caso da alfabetização. É

um ou dois quando a gente trabalha essa apostila que é do

Estado, então eles também precisam participar das demais

aulas. Então essa professora ajuda mais esse aluno que tem

dificuldade, esses alunos que também têm que participar.

Eu penso que sim, penso que eles têm o direito à

aprendizagem garantido. É uma tentativa, eu penso. (Fica em

silêncio e incomodada com a questão.)

professor auxiliar ajudam o

aluno, mas não sabem dizer

se ele está aprendendo.

A atual proposta de oferecer

recuperação para os alunos

com ajuda do professor

auxiliar é melhor do que a

recuperação que se fazia

antes retirando os alunos da

sala de aula.

Anteriormente o

atendimento aos alunos para

recuperação tinha falhas e

não atendia às expectativas

do professor.

O professor auxiliar tem que

ser alfabetizador.

O professor auxiliar ajuda os

alunos que têm dificuldades.

Mesmo com a ajuda do

professor auxiliar tem aluno

que não participa.

O professor considera que os

alunos têm o direito à

aprendizagem garantido.

A questão do direito à

educação incomoda o

professor.

Para o professor o direito à

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105

Que todo aluno frequente à escola. Todos têm que vir para

aula, já diz, garante a LDB. Eles vêm, eles têm direito de

aprender e o governo tem mais é que garantir (risos...

demonstra intranquilidade com o tema).

Bom... tem aquela conversa que todos precisam ser aprovados

( ri muito e gesticula.). Eles têm o direito mesmo assim,

quando a gente chega a reprovar realmente os alunos ... a

gente sempre procura um meio de aprovar ... e .... perdi o que

ia falar.

É mesmo... todos são aprovados, quem fica para trás mesmo é

quem não frequenta a escola. Mas mesmo esses a gente

controla a frequência para garantir o direito de aprender.

Passamos para o coordenador entrar em contato com a mãe

para ter o acesso garantido.

Hããã... ai você me pegou (dá gargalhadas, se movimenta

muito na cadeira, levanta um pouco e senta novamente). Ser

aprovado não significa que... não que ele... como vou dizer...

fiquei em uma encrenca danada (silêncio...). Ele usa o direito

dele, ele está lá para aprender. Se ele vai aprender vai

depender um pouquinho dele, todos estão aqui pensando no

bem comum (muda o tom de voz) “tentando ajudar, promover

aprendizagens significativas”, “fazendo aulas diferenciadas”.

Procuramos ajudar agora se ele vai aprender, sabe, sei lá.

O restante é a família, uma família inteira. Se ele fosse bem,

tivesse uma família completa, quem sabe ele aprenderia

melhor. Não posso condená-lo se ele não aprendeu e deixá-lo

reprovado porque tem um pai e uma mãe que são separados.

Agora com relação a ele aprender ou não eu não sei explicar.

Ele deve ter vontade, mas envolve todo mundo, a família, a

escola, o professor, o direito a ter materiais, recursos que, às

vezes, a escola não tem. A nossa escola está tentando ter e

melhorar as aulas, que sejam interessantes para eles. Se não

for interessante,ele talvez não aprenda. Precisamos de mais

recursos para as aulas serem mais interessantes, ajudar o

aluno, sei lá.

Nossa dessas políticas públicas! Parece que os professores

não estão muito preocupados com os alunos. E os alunos têm

tudo a favor deles. Têm muitas coisas que são feitas pensando

no aluno, (muda o tom de voz) “ele tem a família assim,

precisa de um atendimento psicológico.” O professor não tem

nada disso, bom ou não tem que ir para sala de aula, dar aula

dinâmica, é isso que a gente ouve. A gente não tem esse

apoio. Pensa-se só no aluno: e o professor? Promove-se tudo

para o aluno, tudo vem para ele. E nós? A gente quase não

tem nada, a fala que a gente recebe é assim: nós não temos

educação se resume em o

governo oferecer vagas na

escola.

O professor limita o direito à

educação à aprovação

escolar.

O direito à educação se

resume ao controle da

frequência escolar, ao acesso

à escola.

O professor não consegue

associar o direito à educação

como direito subjetivo.

O professor afirma fazer de

tudo para garantir o direito à

educação, mas

responsabiliza só o aluno

pela aprendizagem.

O professor reproduz a fala

oficial e recortes da

literatura pedagógica para

justificar sua defesa:

“...todos estão aqui

pensando no bem comum”.

O professor entende que o

tema direito à educação é

complexo.

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106

um ensino de qualidade e só o professor é o culpado porque o

ensino não tem qualidade. Eu falo assim porque a gente vê na

mídia, parece que somos o problema.A Secretaria da

Educação até lança os programas que investem no professor,

não posso também tirar esse mérito. Só que também barra o

professor que tem dois cargos e não pode receber a bolsa para

fazer mestrado/doutorado, não tem direito. Tenho que dar

muitas aulas, ter dois cargos, se eu quiser também ter uma

vida melhor, mais confortável lá fora e aí não posso fazer

mestrado/doutorado. Assim é nosso trabalho, por exemplo:

tenho dois cargos e não tenho direito a ticket refeição, não

pelo ticket, mas é um direito, a gente não tem muita coisa,

mas é cobrado de tudo.

Direito à aprendizagem é tudo isso ai. Acho que sim. Um

professor qualificado. Para isso a Secretaria tem que dar

apoio, embora até ofereçam os programas, mas nem sempre o

professor pode.

Se ele está tentando e quer qualificar o professor, como eu

coloco, parece que tudo envolve o professor, parece que ele é

o problema. O professor é o problema. Então o governo está

tentando, mandando cursos fechadinhos, tentando mudar a

sala de aula com mais um professor. Acho que está tentando

também e a gente faz o possível também para atender a essa

questão da aprendizagem. É isso, só falta o aluno... (risos...

descontração)

Neste momento desligo o gravador e a professora diz: queria

falar tanta coisa! (Sorri muito e fica impaciente).

Então, essa questão da reprovação: Nós vamos para sala,

quando estamos lá fazendo nosso conselho de classe/série de

bimestre ou final e ouvimos, já ouvi várias vezes: mas

professora! nota vermelha! E, às vezes, o vermelho lá é uma

nota três, quatro, do aluno que não conseguiu acompanhar

tudo. Não conseguiram aprender e demonstrar isso durante as

aulas. Falam novamente: mas professora nota vermelha! A

senhora deu três e o outro dois! Então subo minha nota para

quatro. Só que continua: mas professora não dá para dar um

cinco? Então ponho cinco e acabo com o assunto. É isso.

Às vezes você precisa reprovar. Se a gente pudesse reprovar

mesmo a gente reprovaria mais da metade da sala (risos...

gargalhadas) mais da metade da sala.

A gente, professores. Não podemos porque somos barrados

porque vem a ordem de cima. Através do coordenador, do

diretor, do governo. O diretor não quer que a escola tenha

muita reprovação e é isso que a gente escuta. Então porque

O professor afirma que: “ os

alunos têm tudo a favor

deles” e o professor: “não

tem nada disso”.

O professor demonstra

indignação com sua situação

profissional e social: “parece

que somos o problema”; “a

gente não tem muita coisa,

mas é cobrado de tudo.”

Para o professor direito à

educação é ter um professor

qualificado e para isso a

Secretaria tem que dar

apoio.

O professor como o

principal problema da

educação.

O governo e o professor

fazem de tudo para garantir

o direito à educação, mas o

aluno não.

O professor quer ser ouvido,

mas teme as consequências.

A professora sente-se

pressionada a atribuir notas

para os alunos.

A professora atribui nota

para o aluno para não ter

problema com a direção.

O professor afirma que, se

pudesse reprovar,

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107

você vai reprovar? Mesmo assim quando a gente mantém

uma reprovação e o professor bate o pé dizendo: eu tenho

todas as atividades desse aluno e ele não vai! E mesmo assim

a coordenação quer que eu aprove? Nós não aprovamos!

Às vezes tem conceitos lá mostrando que o aluno ficou para

trás. Tivemos alunos da oitava que foram embora. Tadinhos,

era a limitação deles, eles vão para onde? Só até ali, não vão

para frente, pelo menos naquilo que a gente diz de “escola,

papel”. Não eles são só aquilo ali, tudo que ele conseguiu é

ali. Não vai para frente. Reprovamos alunos de algumas

turmas, foram poucos. Mas ficaram! Não foi por indisciplina,

pelo menos isso a gente não faz, reter por indisciplina. Antes

fosse bagunceiro, mas aprendesse. E chega a direção, a

coordenação pedagógica e diz: mas ,professora, esse não fez

nada, tem certeza? É isso direito à aprendizagem?

É uma contradição. Não tem essa prova diagnóstica que vem

da Secretaria. Não é o SARESP. É a “prova diagnóstica”* dos

6º anos , 7ª anos. Não tem como você fingir uma realidade,

não tem como forjar nada ali.Fazemos justamente porque

precisamos avaliar o aluno, para prepararmos nosso

planejamento, para tentar trabalhar mesmo, ajudar. É o que

podemos fazer para ele aprender, uma forma de fazer valer

esse direito que ele tem de aprender é reprovar.

Tem essas provas ai que não camuflam. O problema é essas

políticas públicas que o governo manda. Dizem que você tem

que fazer assim e você acaba indo conforme vai. Quem perde

com isso? O aluno. (demonstra preocupação e angústia).

reprovaria: “mais da metade

da sala”.

O professor relata o embate

com a coordenação e direção

quando o assunto é

reprovação escolar.

Mesmo com todas as

atividades o “aluno não

vai!”.

Os alunos são vistos como

coitados quando “não vão

para frente”.

O professor entende que

para garantir o direito à

educação é preciso reprovar

alunos.

A professora justifica a

reprovação escolar através

dos resultados obtidos nas

avaliações externas.

As avaliações externas não

camuflam o fato de os

alunos não estarem

aprendendo.

O professor entende

políticas públicas como

ordem de alguém e que ele

não participa.

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4.3 Núcleo de Significação 1- A escola não cumpre seu principal objetivo que é a

aprendizagem dos alunos e os professores reafirmam a concepção de escola seletiva

Quadro XIV. Núcleo de Significação - A escola não cumpre seu principal objetivo que é

a aprendizagem dos alunos e os professores reafirmam a concepção de escola seletiva

Indicadores

O rendimento escolar dos alunos é muito baixo.

Em Matemática a maioria dos alunos tem notas vermelhas.

O conteúdo do ano/série não foi ensinado.

Os alunos aprovados estão muito abaixo do nível para o ano/série.

Alunos com mais dificuldades de aprendizagem “são mais difíceis”.

O professor sente angústia porque os alunos não dominam os conhecimentos necessários

para o ano/série.

Tentativas dos professores em melhorar a aprendizagem dos alunos e as notas nas avaliações

externas.

O Professor Auxiliar atende os alunos com mais dificuldades para melhorar o rendimento e a

notas da avaliação externa – Saresp.

Com a progressão continuada o aluno chega ao final do ciclo sem conhecimento básico.

A escola não tem qualidade “porque alguns alunos não querem aprender, não aprendem”.

Os alunos não estão aprendendo: “não aprenderam nada.”

Os alunos não aprendem devido aos problemas sociais.

“As crianças estão aprendendo pouco”

Os alunos mais interessados são aprovados e estão abaixo do básico.

O Professor trabalha o “mínimo” com os alunos que têm mais dificuldades.

A dificuldade dos alunos atendidos pelo professor auxiliar é “extrema”.

A escola e os professores pouco registram o acompanhamento da aprendizagem dos alunos.

Os pais são informados sobre a aprendizagem dos alunos através de um registro técnico:

“como está no reforço, se está aprendendo, se está buscando aprender, se é esforçado, se tem

empenho, se não é bagunceiro”.

Os alunos mais interessados são aprovados.

O Professor trabalha o “mínimo” com os alunos que têm mais dificuldades.

A dificuldade dos alunos atendidos pelo professor auxiliar é “extrema”.

O professor titular e o professor auxiliar separam os alunos em níveis de aprendizagem.

O Professor Auxiliar trabalha com grupos menores e atinge os objetivos.

“Provas diagnósticas” para selecionar os alunos com mais dificuldades

O professor afirma que “Os alunos são muito inteligentes”.

A escola e os professores associam a aprendizagem à melhoria dos índices da avaliação

externa e não à garantia do direito à aprendizagem.

Os alunos apresentam certas defasagens dos anos anteriores e o professor não consegue

ajudar.

Somente alguns alunos estão aprendendo.

Os alunos que aprendem são os que tiveram melhor acompanhamento.

A aprendizagem depende da vontade do aluno em aprender.

Os alunos não têm interesse em aprender e só querem passar de ano.

A aprendizagem dos alunos como um problema social.

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109

O professor afirma que a escola tem feito tudo para que os alunos aprendam.

A escola tem feito tudo e quem não aprende é porque não quer.

A escola é vista pelo professor como assistencialista.

Para o professor sempre haverá uma parte de alunos que não aprendem e que fracassam.

O professor prefere a escola seriada.

Os alunos têm o direito de aprender garantido, mas não aprendem porque não querem.

O professor associa o direito à aprendizagem ao empenho pessoal e ao vencer na vida.

Alguns alunos aproveitam a oportunidade, outros não: “Isso é escola”.

O aproveitamento escolar e o conteúdo proposto servem para o aluno passar em vestibulares

e concursos.

Alguns alunos continuam no mesmo patamar do início do ano.

As notas dos alunos são definidas por avaliações e atividades.

As notas atribuídas aos alunos é que define a aprovação ou não.

“...essas menções vão fazer com que ele se aprove ou não.”

O aluno não aprende por questões sociais e de família e a professora alega não poder fazer

nada.

Para o aluno aprender a professora oferece atividades diferenciadas “...de uma forma bem

carinhosa”.

O aluno que é reprovado dedica-se mais as aulas.

A reprovação faz o aluno respeitar mais o professor.

Os alunos deveriam ficar no mesmo nível de aprendizagem.

O retorno da reprovação escolar como redentora dos problemas escolares: “Os professores

acreditam que reprovando o aluno será melhor no nosso dia a dia, não vai ter essas

preocupações todas.”

A reprovação escolar é boa porque seleciona os alunos.

Com a reprovação escolar: “Não vamos ter esses casos paralelos que não aprendem.”

A melhoria da aprendizagem dos alunos foi pequena mesmo com o apoio do professor

auxiliar.

Os professores fazem a parte deles para garantir o direito à educação: “Agora se alguns

alunos não fazem a parte deles...”

Alunos não dominam os conteúdos.

Os alunos apresentam muitas dificuldades.

Alguns alunos não sabem ler e escrever.

O professor tem turma que aprendeu mais e outras não.

O professor não tem convicção em responder se os alunos estão aprendendo.

O professor afirma que os alunos participam.

Os alunos que apresentam mais dificuldades fazem atividades diferenciadas.

O professor titular e o professor auxiliar preocupam-se com a aprendizagem do aluno para

que ele “não fique para trás”.

O aluno que não aprendeu o conteúdo sempre “sabe uma coisa a mais”.

Os testes mostram que parte dos alunos deviam ser reprovados.

O aluno não consegue aprender e “fica patinando”.

Mesmo com a ajuda do professor auxiliar tem aluno que não participa.

Mesmo com todas as atividades o “aluno não vai!”.

Os alunos são vistos como coitados quando “não vão para frente”.

As avaliações externas não camuflam o fato de os alunos não estarem aprendendo.

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110

4.3.1 Análise do Núcleo de Significação 1 - A escola não cumpre seu principal objetivo que é

a aprendizagem dos alunos e os professores reafirmam a concepção de escola seletiva

Um dos temas mais debatidos em educação nos últimos anos é a questão da Qualidade

do ensino oferecido às crianças e adolescentes. Dados internacionais como os divulgados pelo

Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) e os nacionais como o Exame

Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

(IDEB) e, o específico do Estado de São Paulo, Índice de Desenvolvimento da Educação

Básica de São Paulo (IDESP) apontam, com todos os seus limites e possibilidades (RONCA,

2013) que a escola não tem cumprido seu papel: a aprendizagem dos alunos. Os meios de

comunicação divulgam os dados com frequência.As escolhas das “melhores” e “piores”

escolas são divulgadas e os mais diversos setores da sociedade opinam, criticam ou

sobrevalorizam os dados apresentados. Comumente economistas, políticos, jornalistas,

psicólogos, advogados comentam e analisam os dados apresentados, traçam panoramas da

educação nacional. Raramente educadores são convidados para tal fim. Relega-se à escola e

educadores apenas o papel passivo de ouvintes e tarefeiros. A análise mais comum entre elas

é que sem educação de qualidade “não teremos crescimento econômico” e “perderemos o

futuro”, que “em 2030 alcançaremos o índice e teremos uma das melhores escolas do

mundo”. Afinal, do que falamos? De qualidade ou de direito? De qual mundo e para quem?

Nos limites a que esse trabalho se propõe, pretendemos apreender as significações que

professores dos anos finais do ensino fundamental atribuem aos projetos de recuperação e às

questões relativas ao direito à aprendizagem, a construção do Núcleo de Significação “A

escola não cumpre seu principal objetivo que é a aprendizagem dos alunos e os professores

reafirmam a concepção de escola seletiva” foi marcante. Entre as falas dos professores

observamos que a discussão é mais ampla: o ideal da escola seletiva ainda é presente e a

escola não cumpre seu papel de ensinar. Expressões como “as crianças estão aprendendo

pouco”, “o aluno não vai” e “Isso é escola” associam-se ao ideário historicamente construído

no discurso dos professores que parcela dos alunos “não querem aprender” e “são mais

difíceis”. Continuamos “ensinando” para “melhorar o rendimento e a nota da avaliação

externa – Saresp” e “passar no vestibular”. E o fato é que pouco se avançou no Estado de São

Paulo conforme os próprios índices divulgados e alarmados como “Metas de Longo Prazo –

2030”que projetam para 2030: 5º ano do ensino fundamental – 7,0; 9º ano do ensino

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111

fundamental – 6,0; 3º ano do ensino médio 5,0. (Programa de Qualidade da Escola. Nota

Técnica,2014)

Uma Nação e um Estado não podem permitir que várias gerações de cidadãos

aguardem a propalada qualidade da escola por mais de quinze anos, mais precisamente até

2030! Fato é que este “Programa de Qualidade da Escola” perdura, com outras

nomenclaturas, desde 1998 e pouco, ou quase nada, se avançou.

Enquanto isso, na escola, afirmamos a seletividade escolar: que alguns são mais capazes que os

outros, um dos alicerces do ideário da Produção dofracasso escolar (PATTO, 2002). Algumas escolas e seus

alunos serão capazes de alcançar bons índices, outras não, e esse movimento é naturalizado e aceito como

verdade única.

O modelo de organização escolar vigente, nestes projetos sustentados unicamente na avaliação

externa, não atende à complexa trama que é a educação, a aprendizagem, o conhecimento. A qualidade da

educação é associada aos índices alcançados pela escola e pelos alunos nas avaliações externas. O que

apresenta limitações como bem apontou Ronca (2013) no caso do IDEB:

As avaliações externas, baseadas nos testes de larga escala, não são suficientes para

compreender a amplitude e a complexidade da realidade da escola, ainda mais

quando somente dois fatores avaliativos de qualidade (fluxo e desempenho) são

utilizados e são contempladas apenas as dimensões de leitura e matemática.

São muitos os fatores que interferem na vida da escola e não podemos cultivar a

ilusão de um indicador único de qualidade. A escola é uma instituição complexa

que exige muitos olhares. (RONCA,2013,p.79)

Alves (2014) em artigo que trata da Implicação dos resultados dos sistemas de avaliação nos

processos de formação no interior da escola informa que, no caso do IDESP, “a análise dos resultados da

escola na avaliação externa está se constituindo numa razoável possibilidade de formação

permanente”(p.139), porém, alerta sobre riscos a se considerar, entre eles, “a possibilidade da avaliação

externa se constituir em finalidade do trabalho pedagógico da escola” (p.140).

Observamos na construção deste Núcleo de Significação - A escola não cumpre seu principal

objetivo que é a aprendizagem dos alunos e os professores reafirmam a concepção de escola

seletiva - que os professores entrevistados sofrem afirmando serem “angustiantes” os baixos

resultados dos alunos nas avaliações externas e no trabalho diário da escola. Tentam trabalhar

coletivamente e transformar a realidade “conversamos com a coordenação para a gente reagir,

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112

mudar” e que “os alunos querem aprender”, porém, a forma como a escola tem se organizado

já projeta contradições , “porque alguns alunos não querem aprender, não aprendem”, “...essas

menções vão fazer com que ele se aprove ou não”, “Não vamos ter esses casos paralelos que

não aprendem”, constituem este fenômeno social, do fracasso escolar, produzido

dialeticamente, no interior da escola pelos professores em sua atividade, e no mundo pelos

membros desta sociedade que se comunicam, interagem e socializam suas experiências. É

esse movimento de contradição na fala do professor, nos sentidos e significados que atribui a

sua atividade docente, que é possível desconstruir conceitos e práticas excludentes

evidenciados quando estudamos a história da educação e as concepções teóricas oferecidas

pela psicologia sócio-histórica.

O tema fracasso escolar, tratado em uma perspectiva histórica (PATTO,1999;

GUALTIERI; LUGLI, 2012), tem denunciado a inadequação da forma que a escola tem-se

organizado e atendido seus alunos. As significações que professores atribuem à escola

corroboram com o ideal da escola seletiva e excludente, em que os índices de avaliações

externas reforçam que a reprovação escolar poderá representar a pretensa melhoria da

qualidade de ensino.

A escola seriada e seletiva é uma marca incólume da educação brasileira e junto a ela

o ideário da reprovação escolar dos “casos paralelos que não aprendem”.

O que se temapresentado nas políticas públicas para o ensino fundamental na rede

estadual de São Paulo é a justificativa da reprovação escolar para suposta melhoria da

qualidade de ensino. Estes caminhos reforçam a apreensão de significações por professores

sobre a concepção de escola seletiva que, para ser boa, para alcançar a qualidade desejada, é

preciso separar através do recurso da reprovação ou, concomitantemente, dos espaços para

turmas de recuperação ou reforço para os que “não aprendem” dos que “aprendem”,

construindo assim sentidos e significados sobre aprendizagem e melhoria da qualidade que

representam o modelo, já condenado, das turmas homogêneas e do esforço pessoal.

Em um modelo de escola liberal e seletiva, como a nossa, o alicerce da concepção de

homem e sociedade é o individualismo. A escola promove o discurso da ascensão social e a

consequente responsabilização do indivíduo pelo fracasso escolar: “ele que aprova ele

mesmo”. A ideologia liberal dominante tem na escola seletiva seus mecanismos de persuasão

e hegemonia (Gramsci, 1978). No caso pesquisado,as resoluções SE e os pretensos projetos

de recuperação de aprendizagem, têm exercido tal função.

Page 113: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP de Assis.pdf · 1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: manutenção do poder e negação de direitos 29 1.4

113

4.4 Núcleo de Signifcação 2 - O alicerce da exclusão e das desigualdades no interior da

escola: A reprovação escolar para “esses que não tem jeito”

Quadro XV. Núcleo de Significação – O alicerce da exclusão e das desigualdades no

interior da escola: A reprovação escolar para “esses que não tem jeito”

Indicadores

O professor reprovaria seus alunos: “Sim, reprovaria”

A reprovação escolar não ajuda, mas “a gente acaba reprovando esses alunos que não têm o

que fazer, que não têm jeito”.

O professor tem dificuldade em entender o que significa a reprovação escolar e acaba

reprovando “os alunos que não têm jeito”.

Os professores atribuem à progressão continuada o fato de o aluno que “não consegue

compreender, entender e mesmo assim ele é aprovado”.

O professor sabe que a reprovação escolar pode resultar em abandono escolar e falta de

motivação para o ano seguinte.

O professor busca a questão da reprovação escolar historicamente e apresenta contradição na

interpretação: “tinha uma taxa de reprovação muito grande e não resolvia”, “Mas aprovar

também não dá né!”

O tema “ciclos de aprendizagem”é pouco discutido nas escolas. O aluno deveria ser reprovado

de dois em dois anos. Professores ficam indignados em ter que aprovar os alunos.

Parte dos professores querem reprovar os alunos para que eles sintam “o baque” e estudem

mais no próximo ano.

Os professores têm opiniões diferentes, mas que “vão para o lado da reprovação”.

A reprovação escolar como ameaça para que o aluno estude.

Os alunos não querem ser reprovados e fazem as atividades só no final de ano.

O assunto “reprovação” é um tema tratado só por professores e direção.

Parte dos pais é favorável à reprovação. É a progressão continuada que aprova os alunos.

A professora argumenta que o aluno não estuda porque sabe que vai ser aprovado no final do

ciclo.

O professor afirma que quando a escola reprovava o aluno aprendia mais.

Os alunos acham que basta estar na escola para serem aprovados.

O professor afirma que quando a escola reprovava era melhor.

Os alunos são aprovados só por estarem na escola.

O professor desconhece a reestruturação dos ciclos na rede estadual.

Com os novos ciclos haveria mais reprovação e “acabaria esse negócio de passar sem saber”.

As discussões sobre os ciclos são superficiais.

Aceitação da política de ciclos sem conhecimento da proposta.

A ideia dos ciclos é muito boa no papel, mas “não funciona”.

O professor aprovaria só um terço dos seus alunos.

Page 114: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP de Assis.pdf · 1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: manutenção do poder e negação de direitos 29 1.4

114

O professor só aprova “porque eu tenho que aprovar.”

A responsabilidade pela aprendizagem é só do aluno: “...ele que aprova ele mesmo!”

As notas dos alunos são definidas por avaliações e atividades.

As notas atribuídas aos alunos é que define a aprovação ou não.

“...essas menções vão fazer com que ele se aprove ou não.”

O aluno não aprende por questões sociais e de família e a professora alega não poder fazer

nada.

Para o aluno aprender a professora oferece atividades diferenciadas “...de uma forma bem

carinhosa”.

A responsabilidade por não aprender é só do aluno: “Já falei antes que eu não reprovo. São

eles que se reprovam. São os próprios alunos que se reprovam.”

A professora aprova os alunos porque “...de acordo com a progressão continuada tenho que

aprovar”.

A professora reprovaria só na disciplina dela, não o faz porque o conselho aprova.

A responsabilidade pela aprovação dos alunos que não aprenderam é da progressão

continuada.

Se não fosse obrigada pela progressão continuada, a professora reprovaria os alunos.

Quando questionada sobre aprendizagem e progressão continuada a professora considera que

é um assunto difícil.

“Não vejo meio de reprovar com a progressão continuada”

Sobre o tema reprovação contraditoriamente a professora afirma ser “uma pessoa muito

humana”, mas “se o conselho reprova, eu também reprovo”.

A maioria dos professores gostaria de mais reprovação.

“O professor acredita que reprovando o aluno ele vai se dedicar mais às aulas e vai prestar

mais atenção”.

O aluno que é reprovado dedica-se mais as aulas. A reprovação faz o aluno respeitar mais o

professor.

O retorno da reprovação escolar como redentora dos problemas escolares: “Os professores

acreditam que reprovando o aluno será melhor no nosso dia a dia, não vai ter essas

preocupações todas.”

A reprovação escolar é boa porque seleciona os alunos.

Com a reprovação escolar: “Não vamos ter esses casos paralelos que não aprendem.”

O professor não conhece a progressão continuada e “cada um trabalha da forma que é

possível, do jeito que dá”.

Os alunos são aprovados porque “têm que ser todos aprovados”.

O professor reprovaria seus alunos por “um tempinho”.

O professor reprovaria seus alunos, mas sabe que não é o caminho.

O professor não concorda muito com a reprovação, mas reprova.

O professor não reprova os alunos porque “sempre ouve: não podemos reprovar”.

O professor não vê a reprovação com “bons olhos”.

O professor faz o máximo para o aluno caminhar com a turma.

O professor quer reprovar, mas não pode.

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115

O professor aprova os alunos porque é pressionado pela direção da escola.

Reprovar os alunos não é bom para a Secretaria da Educação.

O professor entende que a reprovação ajuda o aluno a caminhar melhor com a turma no

próximo ano. O aluno não consegue aprender e “fica patinando”.

O professor não sabe como ajudar o aluno para que ele não reprove.

O professor afirma que reprovar às vezes é melhor para o aluno.

O assunto reprovação escolar incomoda o professor.

Os testes mostram que parte dos alunos deviam ser reprovados.

Os professores tentam recuperar os alunos e acreditam que a reprovação é uma forma de

ajuda.

A escola obriga os professores a aprovarem os alunos.

O professor demonstra ansiedade quando o tema é ciclo e reprovação escolar.

A professora sente-se pressionada a atribuir notas para os alunos.

A professora atribui nota para o aluno para não ter problema com a direção.

O professor afirma que, se pudesse reprovar, reprovaria: “mais da metade da sala”.

O professor relata o embate com a coordenação e direção quando o assunto é reprovação

escolar.

O professor entende que para garantir o direito à educação é preciso reprovar alunos.

A professora justifica a reprovação escolar através dos resultados obtidos nas avaliações

externas.

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4.4.1 Análise do Núcleo de Significação 2 - O alicerce da exclusão e das desigualdades no

interior da escola: A reprovação escolar para “esses que não têm jeito”

No primeiro capítulo deste trabalho tratamos do direito à aprendizagem e

universalização do ensino com objetivo de entender historicamente como essa conquista

democrática tem-se efetivado no Brasil, no plano legal e pela luta da população. O marco

legal é a Constituição Federal de 1988 que garante os direitos sociais, sendo o direito à

educação o alicerce desta conquista

No segundo capítulo tratamos do processo ensino aprendizagem na perspectiva da

garantia do direito à aprendizagem e como as políticas públicas em educação, na rede estadual

de São Paulo, tem-se organizado através dos chamados mecanismos de apoio escolar, que são

os projetos de recuperação contínua, paralela, intensiva e de ciclo.

Observamos ainda a persistência da reprovação escolar quando nos deparamos com a

porcentagem de alunos reprovados no ano final do ensino fundamental: 3,4% em 1996 e

11,3% em 2012. Afirmamos que as variações apontadas correspondem às distorções e

alterações das políticas públicas em educação em São Paulo. Apontamos a progressão

continuada (SÃO PAULO,1998) em estudos realizados(BERTAGNA,2003; FREITAS,2003 e

2007;VIÉGAS,2007; ELLIOTT,2009) como um dos alicerces de tais distorções. Deixa-se de

reprovar anualmente. Reprova-se na 4ª série (ano final do ciclo I) e na 8ª série (ano final do

ciclo II) e, a partir de 2014 (Resolução SE nº 53/14), a lei permite reprovar no 3º ano (ciclo de

alfabetização), no 6º ano (ciclo de intermediário) e no 9º ano (ciclo final).

Na fala dos professores entrevistados a progressão continuada os obriga a aprovar os

alunos “porque eu tenho que aprovar”, “de acordo com a progressão continuada tenho que

aprovar”. Mas, com a possibilidade legal proporcionada pela Resolução SE nº 53/14, com os

novos ciclos, “acabaria esse negócio de passar sem saber”. O que seria bom, segundo o

professor entrevistado, para que os alunos sintam o “baque” e “que reprovando o aluno ele vai

se dedicar mais às aulas e vai prestar mais atenção” e estudar mais no próximo ano. Tese que

não se sustenta, pois os números apontam 4% de evasão dos alunos que cursam a 8ª série no

estado de São Paulo em 2012, 2,1% na 5ª e 6ª série e 2,5 na 7ª série (SEESP/CIMA, 2012),

sendo que um dos indicativos é a distorção idade/série que tem, entre as variáveis mais

concretas, a reprovação e o abandono escolar e a exploração do trabalho infantil.

Gualtieri e Lugli (2012) alertam que:

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117

Uma política mal concebida e implantada produz uma cortina de fumaça que

impede um adequado enfrentamento do problema do fracasso, ainda que, no

caso dos ciclos e da progressão continuada, possa ter (e tem tido) um efeito

importante que é o de possibilitar à criança permanecer na escola por mais

tempo e, dessa forma, postergar sua eliminação dos bancos escolares pelas

sucessivas repetências. Isto é um avanço no sentido de garantir a essas

crianças a ampliação do processo de socialização que a escola promove,

razão suficiente para que não se retroceda nessa política, ainda que possamos

reconhecer que, dá forma como está, não assegura a aprendizagem. Portanto,

é preciso repensá-la. (GUALTIERI; LUGLI, 2012, p.51)

A exclusão e as desigualdades no interior da escola são reforçadas na fala do professor

como se, naturalmente, “reprovando o aluno será melhor no nosso dia a dia, não vai ter essa

preocupação toda” e, “não vamos ter esses casos paralelos que não aprendem.”

O professor entender a reprovação escolar como necessária e ter o aval da legislação,

do poder público, para reprovar mais alunos é um retrocesso para o projeto educacional do

país. É um misto de política mal concebida e implantada quando trata da formação e

aprendizagem dos professores e dos alunos. Aprofunda as desigualdades e a exclusão

presentes na sociedade e relega ao espaço escolar apenas o papel de reproduzir o ideário do

sucesso individual e do mérito pessoal para alguns e, para os “casos paralelos que não

aprendem”, a reprovação escolar basta.

Assim, a manifestação de uma concepção de educação cujas práticas de

reprovação são entendidas como necessárias é condizente com uma realidade

social que prioriza a ação e a competência individuais em detrimento do

direito social da igualdade de oportunidades, que exige uma educação

escolar universal que promova o desenvolvimento de todos (JACOMINI,

2010. p.213)

A ideia do empenho e da capacidade individual apresentada pelo liberalismo,

e atualmente reforçada pelo neoliberalismo, contribui para a manutenção das

opiniões que responsabilizam alunos e familiares pelo baixo desempenho e a

consequente reprovação. Assim, ao continuar selecionando os que melhor

respondem às suas exigências, seja pela reprovação ou por não garantir os

meios para todos aprenderem, a escola legitima a exclusão escolar e social

por meio do chamado “mérito”. (JACOMINI, 2010, p. 215)

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118

4.5 Núcleo de Signifcação 3 - As formas de recuperação da aprendizagem oferecidas aos

alunos na última década não apresentaram resultados. A recuperação contínua com apoio do

professor auxiliar como esforço da escola e dos professores para garantir à aprendizagem dos

professores para garantir à aprendizagem dos alunos

Quadro XVI. Núcleo de Significação. As formas de recuperação da aprendizagem

oferecidas aos alunos na última década não apresentaram resultados. A recuperação

contínua com apoio do professor auxiliar como esforço da escola e dos professores para

garantir à aprendizagem dos alunos

Indicadores

O modelo de atendimento aos alunos em recuperação não era eficiente.

O modelo atual de recuperação, com apoio do Professor Auxiliar tem mais resultados.

Os alunos não compareciam na recuperação paralela no contraturno.

A recuperação na pré-aula ou na pós-aula não apresentava resultados.

A recuperação no contraturno, na pré-aula ou na pós-aula não oferecia nada de diferente:

“Foi mais uma tentativa que não deu em nada, não deu certo”.

Foram várias tentativas de recuperação e os professores não foram capacitados.

Na última década, a recuperação oferecida não conseguiu ajudar os alunos

O Professor Auxiliar trabalha de maneira diferenciada.

A recuperação com professor auxiliar é melhor: “...está acontecendo e é significativa.”

Os próprios alunos atrapalham os colegas em recuperação.

Reduzir o número de alunos em sala de aula é a melhor forma para ajudar os alunos que têm

dificuldades.

Professor Auxiliar é, geralmente, um professor iniciante ou professor/aluno.

O professor gosta de ter um Professor Auxiliar em sala de aula.

O professor não conhece a legislação que trata do Professor Auxiliar.

O professor considera como um projeto inovador ter um Professor Auxiliar em sala de aula.

Os professores das demais disciplinas desconhecem a proposta de Professor Auxiliar:

“parece-me que não sabem o que está acontecendo”.

Com a ajuda do Professor Auxiliar ficou mais fácil para o professor acompanhar a

aprendizagem dos alunos.

Mesmo com Professor Auxiliar tem aluno que não se interessa.

O apoio aos alunos com dificuldades tem funcionado melhor com a chegada do Professor

Auxiliar para aqueles “com interesse”.

O professor gosta de contar com um professor auxiliar.

Menos alunos em sala de aula melhora a aprendizagem.

Os projetos de reforço e a figura do Professor Auxiliar são considerados como um avanço

pelos professores.

O professor auxiliar organiza seu trabalho de acordo com o diagnóstico da aprendizagem do

aluno.

A professora organiza atividades de recuperação para os alunos.

Não tem professor auxiliar de Matemática.

A proposta de ter um professor auxiliar é bem aceita pela professora

Não tem professor de Matemática para contratar.

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119

Todos os professores gostariam de ter um professor auxiliar.

O professor tem que dar conta de todos os alunos.

O professor auxiliar ajuda na sala em atividades diferenciadas.

Os alunos que apresentam mais dificuldades fazem atividades diferenciadas.

O professor titular e o professor auxiliar preocupam-se com a aprendizagem do aluno para

que ele “não fique para trás”.

O professor não conhece a proposta de ter um professor auxiliar.

Mesmo sem conhecer a proposta o professor acha bom ter um professor auxiliar.

O professor titular e o professor auxiliar ajudam o aluno, mas não sabem dizer se ele está

aprendendo.

A atual proposta de oferecer recuperação para os alunos com ajuda do professor auxiliar é

melhor do que a recuperação que se fazia antes retirando os alunos da sala de aula.

Anteriormente o atendimento aos alunos para recuperação tinha falhas e não atendia às

expectativas do professor.

O professor auxiliar tem que ser alfabetizador.

O professor auxiliar ajuda os alunos que têm dificuldades.

Mesmo com a ajuda do professor auxiliar tem aluno que não participa.

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120

4.5.1 Análise do Núcleo de Significação 3 - As formas de recuperação da aprendizagem

oferecidas aos alunos na última década não apresentaram resultados. A recuperação contínua

com apoio do professor auxiliar como esforço da escola e dos professores para garantir à

aprendizagem dos alunos

No capítulo 2 deste trabalho observamos que em uma década foram publicadas nove

resoluções pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo que tratam do tema

Recuperação e os diversos projetos de reforço/recuperação foram implantados ou

implementados a partir destas resoluções.

Estes projetos de reforço/recuperação, como estratégia pedagógica da escola, pouco

alteraram a dinâmica escolar e a aprendizagem dos alunos. Constituíram apenas um

movimento justificador da não aprendizagem dos alunos. Na fala dos entrevistados e, pela

prática deste pesquisador, constata-se que o professor não participou minimamente da

elaboração destes projetos, coube a eles somente a execução. Não receberam formação

suficiente e os projetos foram “mais uma tentativa que não deu em nada, não deu certo”.

Confirma-se assim o que Caldas (2010) concluiu em sua tese: o distanciamento entre

as propostas oficiais e sua concretização na escola, e que a recuperação configura-se mais

como espaço de “impossibilidades” do que de “potencialidades”.

Os projetos de recuperação atendiam mais a necessidade dos governos em prestar

contas a população e justificarem a mal sucedida política pública do que de fato um garantir a

aprendizagem dos alunos através de um projeto educacional gestado no interior da escola por

professores, alunos e pais. Na fala doprofessor Antonio, de matemática: “muitas vezes os

alunos acabavam indo embora com os colegas que não estavam de recuperação. Eles fugiam

da recuperação na hora do almoço junto com os colegas. Terminava o horário normal, e eles

se mandavam. Saiam, não ficavam mesmo. Acho que era muito cansativo ter cinco ou seis

aulas e ainda ficar mais uma aula. É muito chato. Assim, a escola não oferecia nada de

diferente. Foi mais uma tentativa que não deu em nada, não deu certo.”

Este período histórico a que o professor se refere é a partir de 2005. Com a publicação

da Resolução SE nº 15/05 as escolas poderiam organizar projetos de recuperação no período

pós-aula, sendo três aulas para os alunos do chamado ciclo I (1ª a 4ª série) e duas aulas para

os alunos do ciclo II (5ª a 8ª série). Depois de elaborados os projetos deveriam ser

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homologados pelo Conselho de Classe/Série, Supervisão de Ensino e Dirigente Regional de

Ensino.

Nesta época este pesquisador atuava como Diretor de Escola e vivenciou este drama: o

esforço da escola em tentar manter os projetos de recuperação; a dedicação dos professores

em agrupar alunos e informar os responsáveis; as tentativas de articular os professores da

recuperação com os professores titulares e, enfim, cumprir o que determinava a Resolução.

Porém, mesmo com todo o esforço da escola os alunos não permaneciam na recuperação

“fugiam ... se mandavam”. Não tínhamos clareza dos projetos, não éramos informados e

preparados para tal ação, os projetos não possuíam qualquer vínculo com os alunos e com os

professores, se quer tínhamos a dimensão do trabalho pedagógico e da proposta pedagógica

da escola. Mais cumpríamos as tarefas determinadas pela Secretaria de Estado da Educação,

através de suas resoluções e portarias, do que pensávamos sobre nosso trabalho na escola.

A atual proposta de ter um professor auxiliar na sala de aula suscita novos

questionamentos: se de um lado os entrevistados afirmam que “...está acontecendo e é

significativa”, de outro lado, afirmam que os demais professores das outras disciplinas “não

sabem o que está acontecendo”, o que caracteriza novamente o descompasso entre as

propostas oficiais e sua concretização na escola.

As mediadas burocráticas, resoluções e decretos, pouco alteram o eixo norteador da

escola (JACOMINI, 2010, p.251). Os entrevistados afirmam que o professor auxiliar ajuda os

alunos que tem “interesse” e que mesmo assim “grande parte não tem vontade realmente, não

quer fazer mesmo com o professor se dispondo a ajudar, ele não tem interesse em fazer” e que

os próprios colegas de sala de aula atrapalham os que estão em recuperação. O que demonstra

aspectos ideológicos do apego à reprovação (JACOMINI, 2010,p.234), de concepção de

mundo, de sociedade e de escola (GRAMSCI, 1978). Eis o cerne da questão: a reprovação

escolar é praticamente uma metodologia de trabalho do professor e da escola. É um aspecto já

predeterminado, naturalizado como prática.

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4.6 Núcleo de Significação 4 – Do discurso pelo direito à educação ao abandono da escola: O

professor indignado “parece que somos o problema” e os alunos “que não estão sabendo

aproveitar”. O professor não se reconhece e não reconhece o aluno como cidadão de direitos

Quadro XVII. Núcleo de Significação. Do discurso pelo direito à educação ao abandono

da escola: O professor indignado “parece que somos o problema” e os alunos “que não

estão sabendo aproveitar”. O professor não se reconhece e não reconhece o aluno como

cidadão de direitos

Indicadores

O abandono da escola pelo Estado: “São vários fatores que levam a educação a estar

dessa forma: casos de violência, do abandono, da falta de estrutura das escolas. São vários

motivos e a gente ouve muito que o Estado abandonou a escola”.

O Estado não tem garantido o direito à aprendizagem

A política educacional não tem garantido o direito à educação.

Os professores criticam o discurso governamental descolado da realidade, o abandono das

escolas e o material “fora da realidade dos alunos”.

Os professores mudam a maneira de trabalhar quando fazem cursos.

Tentativas da escola em melhorar a aprendizagem dos alunos.

O professor associa o direito à obrigação de cumprir os deveres.

As notas baixas ou altas são indicadores únicos da qualidade da escola e da aprendizagem

dos alunos.

Os projetos de recuperação devem garantir o direito de o aluno aprender, “mas nem

sempre o aluno consegue aprender. Ele tem o direito, mas não consegue aprender”

O aluno tem o direito: “mas nem sempre esse direito é alcançado”.

O Estado garante o direito “...mas alguns alunos...você sabe”

O professor busca melhorar sua aula e sua prática docente.

O desgaste do professor frente a desvalorização profissional: “A gente trabalha tanto” ;

“Só essas políticas é pouco se não olhar para o professor. Cuidar do professor é tudo”

Tentativas da escola e do professor em garantir a aprendizagem dos alunos.

“Conversamos com a coordenação para a gente reagir, mudar”

Reuniões entre professores para definir qual aluno deve fazer reforço.

As questões sociais afetam a aprendizagem dos alunos.

A escola como espaço de convivência e lazer.

Os anos iniciais são fundamentais na escolarização dos alunos.

O professor afirma que os alunos têm o direito à educação garantido: “Eles é que não

estão sabendo aproveitar, eles têm esse direito! Eles têm garantido esse direito! Agora se

ele quer aproveitar isso que é o problema.”

O professor sabe que é desvalorizado e que isso prejudica a aprendizagem dos alunos.

O professor afirma que o direito à aprendizagem é garantido, mas os alunos não cumprem

com o dever: “Quanto ao direito a gente garante: quero saber é do dever deles.”

O aluno tem o direito à educação garantido, mas não aproveitam.

Quando o assunto é direito à educação a professora dissimula e procura mudar de assunto.

O aluno quer uma escola diferente só que “O aluno não vê significado para aprender. Não

vê o conhecimento....não quer ter problemas, não quer desafios que chamem atenção. Não

quer, muitas vezes, nada.”

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Os professores fazem a parte deles para garantir o direito à educação: “Agora se alguns

alunos não fazem a parte deles...”

A professora reconhece que precisa dominar outros conhecimentos e dialogar com os

demais professores.

Os alunos são “espertos e conversam bem”.

A escola é um espaço de convivência para os alunos.

Os alunos querem aprender.

O tema ciclos de aprendizagem é pouco trabalhado na escola.

O professor não entende a mudança atual dos ciclos, mas vê como uma possibilidade de

reprovar mais alunos.

O professor afirma que outros professores defendem a reprovação para: “quem sabe mais

um ano para ele aprender mais um pouco”.

O professor afirma que os colegas não gostam dos ciclos: “que realmente tivesse

reprovação, a seriação e não os ciclos”.

Alguns professores são a favor dos ciclos.

O professor demonstra ansiedade quando o tema é ciclo e reprovação escolar.

O professor considera que os alunos têm o direito à aprendizagem garantido.

A questão do direito à educação incomoda o professor.

Para o professor o direito à educação se resume em o governo oferecer vagas na escola.

O professor limita o direito à educação à aprovação escolar.

O direito à educação se resume ao controle da frequência escolar, ao acesso à escola.

O professor não consegue associar o direito à educação como direito subjetivo.

O professor afirma fazer de tudo para garantir o direito à educação, mas responsabiliza só

o aluno pela aprendizagem.

O professor reproduz a fala oficial e recortes da literatura pedagógica para justificar sua

defesa: “...todos estão aqui pensando no bem comum”.

O professor entende que o tema direito à educação é complexo.

O professor afirma que: “ os alunos têm tudo a favor deles” e o professor: “não tem nada

disso”.

O professor demonstra indignação com sua situação profissional e social: “parece que

somos o problema”; “a gente não tem muita coisa, mas é cobrado de tudo.”

Para o professor direito à educação é ter um professor qualificado e para isso a Secretaria

tem que dar apoio.

O professor como o principal problema da educação.

O governo e o professor fazem de tudo para garantir o direito à educação, mas o aluno

não.

O professor quer ser ouvido, mas teme as consequências.

O professor entende que para garantir o direito à educação é preciso reprovar alunos.

O professor entende políticas públicas como ordem de alguém e que ele não participa.

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4.6.1 Análise do Núcleo de Significação 4 - Do discurso pelo direito à educação ao abandono

da escola: O professor indignado “parece que somos o problema” e os alunos “que não estão

sabendo aproveitar”. O professor não se reconhece e não reconhece o aluno como cidadão de

direitos

O direito à educação é uma conquista do povo brasileiro por direitos sociais e por

democracia. A Constituição de 1988 é marcada por avanços neste tema e a educação é tratada

como direito social, conforme artigo 6º: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho,

o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência

aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988).

O Artigo 206 afirma que “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” e o Artigo 208 completa

que é dever do Estado a garantia de “ I- Educação Básica obrigatória e gratuita dos 4(quatro)

aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos a que a

ela não tiveram acessoà idade própria” (EMENDA CONSTITUCIONAL nº59/09).

No campo legal podemos afirmar que a escola pública como direitose consolidou nas

últimas décadas. A escola é o lócuse é nela que se efetiva tal conquista. Mas esse direito tem

sido negado quando as crianças e adolescentes pouco ou quase nada aprendem na escola.

Oliveira (2007a) comentando o Artigo 206 da Constituição Federal afirma:

Este dispositivo, se transformado em realidade, avança em termos da

efetivação da igualdade de todos perante a lei, pois um dos mecanismos mais

conhecidos de exclusão já não se produz no caminho até a escola (falta de

vagas, por exemplo), mas na própria ação da escola, que reproduz e

estigmatiza parcelas da população, levando-as ao abandono precoce da

escola, por meio de múltiplas reprovações e, mais recentemente, colocando-

as na inusitada situação de aceitar sua permanência e progresso no sistema

de ensino, sem que isso signifique o aprendizado correspondente.

(OLIVEIRA,2007a, p.23)

Em uma das falas dos professores entrevistados observamos como“é na própria ação

da escola” que a efetivação deste direito constitucional não se concretiza, pois, “nem sempre o

aluno consegue aprender. Ele tem o direito, mas não consegue aprender”e que o aluno tem o

direito, “mas nem sempre esse direito é alcançado”. E que o Estado garante o direito “mas

alguns alunos...você sabe”.

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Segundo Oliveira“a exclusão social e, particularmente, aeducacional, requerem

remédios mais amplos e articulados, pois em diversas esferas o Estado mostrou-se refratário à

efetivação de tais direitos” (OLIVEIRA,2007, p. 41). O “remédio mais amplo e

articulado”sugerido por Oliveira reside na forma como concebemos a aprendizagem e o

direito à educação. Não nos reconhecemos como cidadãos de direitos e o direito à

aprendizagem é resumido em responsabilizar o aluno, que, em tese, é o beneficiário deste

direito: “Quanto ao direito a gente garante: quero saber é do dever deles”. O direito à

educação resume-se a ter escola. A aprendizagem, o conhecimento,resume-se ao esforço

pessoal: “Eles é que não estão sabendo aproveitar, eles têm esse direito! Eles têm garantido

esse direito! Agora se ele quer aproveitar isso que é o problema.”

Anísio Teixeira, em 1957, no livro Educação não é privilégiosustentava a

universalização da escola pública e discutia a necessidade da organização da escola e a

formação integral dos alunos, defendia outra concepção de educação que superasse a seleção

ou especialização, compreendia que a educação erapara todos e seria constituidora na nossa

identidade nacional. Ainda travamos esse desafio. Avançamos na universalização do ensino,

porém, sua organização, ainda tradicional, está assentada em um currículo sistematizado pela

civilização letrada, em uma avaliação baseada em números e estatísticas, no desprezo das

necessidades psicossociais dos alunos e das suas famílias e as condições sócio-culturais que

se encontram.

O professorque, na maioria dos casos, também passou por essa escola básica como

aluno, sente-se abandonado pelas políticas públicas: “Só essas políticas é pouco se não olhar

para o professor. Cuidar do professor é tudo” e ainda afirma “parece que somos o problema, a

gente não tem muita coisa, mas é cobrado de tudo”.

O caráter reprodutivo da educação, das teorias não-críticas em educação (Saviani,

1983), ainda permanecem como base da organização do currículo, da avaliação, do ensino

aprendizagem e do papel do professor.

O fato de o professor não se reconhecer e não reconhecer o aluno como cidadão de

direitos vincula-se diretamente à forma como se organiza a sociedade e a escola. Ao longo da

história da educação verificamos como é distante o que a escola preconiza e o que realiza.

Severino escreveu:

Os responsáveis pelas políticas dos sistemas de educação se equivocam ao

pretender que ela só cuide da habilitação técnica dos educandos ao afirmar

que não lhe cabe a formação política, de cunho crítico. Essa tem sido uma

estratégia ideológica para evitar a democratização das relações sociais, o que

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ameaçaria a hegemonia de segmentos dominantes. Na educação brasileira

ainda prevalece o caráter reprodutivista. (SEVERINO, 2012, p.90)

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa proposta nesta pesquisa foi estudar como os projetos de recuperação de

aprendizagem e as questões relativas ao direito à aprendizagem têm sido apreendidos pelos

professores dos anos finais do ensino fundamental.

Para concretização deste fim priorizamos inicialmente os estudos teóricos e marcos

legais que consolidam o direito à educação e à universalização do ensino no Brasil. Na

história do Brasil e na história da educação, podemos constatar que este direito foi uma

conquista do povo brasileiro. Não foi resultado de altruísmo, caridade ou humanitarismo dos

governos constituídos ou das classes dominantes, que comumente se articulam política e

ideologicamente.

Raras exceções na história do país, em determinados momentos históricos,

vislumbraram mudanças significativas como nas discussões e embates da Constituição

Federal de 1934, onde, pela primeira vez, é mencionado o direito à instrução pública,

independentemente da situação socioeconômica da pessoa, e na Constituição Federal de 1946,

que assegurava direitos e garantias individuais, afastando-se da ideologia liberal-aristocrática,

tão bem representada pelas elites remanescentes do período colonial/imperial escravocrata.

(ROMANELLI, 1978)

Nos anos de 1980, período de redemocratização do país, as discussões e debates foram

intensos entre os defensores da educação pública e gratuita, que preservavam os princípios

discutidos democraticamente na Conferência Brasileira de Educação, realizada em 1986 e

representados na Carta de Goiânia (CBE, 1986), e os grupos ligados aos setores

conservadores, que defendiam políticas econômicas centradas na privatização dos serviços

públicos, na flexibilização do trabalho e na desregulamentação do setor financeiro, temas

caros nos dias atuais aos movimentos sociais, pois são sistematicamente retomados por

grupos conservadores representantes das classes dominantes.

Mesmo nesse tom de debates ideológicos intensos a Constituição Federal de 1988 foi

promulgada e, no seu novo ordenamento jurídico, estabeleceu a educação como direito de

todos e dever do Estado e da família. Os direitos sociais e o direito à educação, estabelecidos

legalmente, consolidam o ideal da escola pública como direito.

Nos últimos anos o direito à educação foi ampliado a partir da Emenda Constitucional

nº 59/09, que instaura o ensino obrigatório para toda população dos 4 aos 17 anos e amplia

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programas suplementares para a Educação Básica, e a Lei nº 12.796/13, que enceta ser dever

dos pais efetuar a matrícula das crianças a partir dos 4 anos de idade.

Neste breve histórico retratamos os avanços pelo direito à educação pública e gratuita

como conquista do povo brasileiro, mas não podemos negar os momentos históricos de

retrocessos liderados pelas elites, como os períodos de 1937-1945 e 1964-1982, que foram

marcados por regimes de exceção, de ditadura civil/militar e apoiados por organismos

internacionais representantes das potências capitalistas.

E, neste momento histórico que concluímos esta pesquisa, os direitos sociais

conquistados pelo povo brasileiro sofrem ataques dos grupos econômicos (telecomunicações;

sistema bancário; agronegócio e setor industrial) que defendem políticas econômicas com

menor intervenção do Estado na economia. Entenda-se menos Estado na economia quando se

trata de programas sociais e não em grandes financiamentos de infraestrutura que favorecem o

capital.

Fato marcante nos últimos anos foi a aprovação dos 10% do Produto Interno Bruto

para aplicação em educação. Todo esse debate foi sustentado pelos movimentos sociais e

entidades ligadas aos trabalhadores da educação e representou avanço, porém, o Plano

Nacional de Educação aprovado não atendeu plenamente às expectativas delineadas na

CONAE/2010 e estabeleceu a utilização de recursos públicos para as parcerias público-

privadas, contabilizando como investimento em educação pública os gastos com repasses as

instituições privadas.

Nossa pesquisa iniciou por esse caminho de historicizar o direito à educação como

conquista, porque, fundamentada na perspectiva sócio-histórica, compreendemos que esse

movimento de contradições na sociedade, na escola, na sala de aula e na prática e fazeres do

professor, possibilita a compreensão da constituição deste sujeito singular e cultural, social e

histórico. E esse fenômeno complexo e contraditório implica em compreender o homem a

partir da e na realidade concreta (ANDERY; SÉRIO, 2007).

Isso posto, resgatar historicamente as conquistas sociais, em torno do direito à

educação, foi imprescindível para compreender as significações que professores atribuem as

leis, projetos, programas, prática individual e coletiva e, enfim, as ações humanas, na

sociedade e na escola, orbitadas pela contradição, pela mediação e historicidade.

A cultura é elemento essencial neste processo de constituição do sujeito. Caracterizar

o fenômeno produzido a partir de sua materialidade e da historicidade é medular para

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entendermos a apreensão das significações que professores atribuem aos projetos de

recuperação de aprendizagem e as questões relativas ao direito à aprendizagem. A categoria

significações foi primordial por permitir recriar significados sociais e sentidos subjetivos das

relações historicamente construídas por estes sujeitos na sociedade e na escola.

Os achados deste estudo permitem afirmar que professores ainda vêem na reprovação

escolar um caminho, um método de condução da sua prática pedagógica, da organização da

escola e da “medição” dos “resultados” da aprendizagem. Os projetos de recuperação de

aprendizagem e as avaliações externas, da maneira como são conduzidos pela política

educacional na rede estadual de São Paulo, fortalecem o ideário da reprovação escolar junto a

professores e comunidade escolar. Consideramos retrocesso uma Resolução que permitirá que

no percurso de nove anos do ensino fundamental os alunos possam ser reprovados no 3º, 6º e

9º anos. Mais pernicioso ainda é a possibilidade de que esses alunos “repetentes” formem uma

turma exclusiva de Recuperação Intensiva (§ 1º, Artigo 5º, Resolução SE nº 73/14). Em

estudo que realizamos em 2007 (ASSIS, 2007), já denunciávamos as fragilidades deste

modelo.

Assim, outro ponto fundamental foi investigar alguns dos trabalhos científicos mais

recentes que tratam do tema Recuperação de Aprendizagem. Os estudos recentes (PARO,

2001; ELLIOT, 2009; CALDAS, 2010; JACOMINI, 2010; JEFFREY, 2011; GUALTIERI;

LUGLI, 2012) apontam para o ideário da reprovação escolar presente no discurso de

diretores, professores, pais e alunos como sendo solução para os problemas da escola. A ideia

da reprovação escolar povoa o imaginário escolar como medida de austeridade, de controle e

disciplina, enfim, como solução para melhoria da qualidade da educação. Os projetos de

recuperação e reforço escolar se constituem mais como um suporte ao modelo excludente que

precisa justificar porque alguns não aprendem. O professor Antonio afirma: “Porque [os

projetos de recuperação] não trouxeram resultados. A gente vê que, nesses oito ou dez anos, a

gente não consegue resgatar esses alunos. Não conseguimos recuperar esses alunos”

Foi marcante na fala do professor Antonio a afirmação: “Mas aprovar também não dá,

né?”. Mas, contraditoriamente, diz: “Os alunos são muito inteligentes”, e: “Isso é problema de

política educacional”.

A frágil compreensão sobre o processo de aprendizagem e desenvolvimento dos

alunos, associado ao desconhecimento das políticas públicas em educação, aprofundam as

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contradições apresentadas por professores e as significações que atribuem aos projetos de

recuperação de aprendizagem.

Afirma, ainda, o professor Antonio: “Os projetos de recuperação deveriam garantir o

direito de aprender, mas nem sempre o aluno consegue aprender. Ele tem o direito, mas não

consegue aprender”. Novamente no complexo fenômeno educativo, o aluno, que é cidadão de

direitos, é visto como único responsável pelo seu fracasso e será responsabilizado

porque“alguns alunos...você sabe”. E solidifica-se essa concepção quando a professora Carla

sintetiza a questão: “São os próprios alunos que se reprovam”.

As significações que professores atribuem aos projetos de recuperação estão

intimamente atreladas ao ideário do fracasso e reprovação escolar dos alunos. Serão

encaminhados à recuperação os candidatos a exclusão no interior da escola, os que “não tem

jeito”. São os fracassados e possíveis repetentes que permaneceram em tais projetos de

recuperação contínua ou paralela. Apesar de o discurso apontar para recuperação como um

momento de ajuda para os alunos, constituem-se, de fato, como segregação dos que não

aprendem dentro da própria escola.

Este projeto educacional, encaminhado no estado de São Paulo nas últimas décadas,

reforça, drasticamente, estas significações, que professores atribuem aos projetos de

recuperação de aprendizagem. Reforçam a seletividade escolar e as desigualdades no interior

da escola. O fracasso na escola, geralmente, não foi compreendido também como fracasso da

escola (GUALTIERI ; LUGLI, 2012). O fracasso na escola é o fracasso de políticas públicas

implantadas e implementadas por governos que desconsideram os atores escolares no

processo de formulação destas políticas. Este é um dos pontos fundamentais do debate que

este estudo desvela e pretende colaborar para sua superação.

O discurso presente da não-reprovação que se solidificou legalmente a partir de 1998

com a instituição da progressão continuada, não se sustenta mais. Por isso, as propostas de

mudança com a alteração de dois para três ciclos, com possibilidade de reprovação no 3º, 6º e

9º anos, conforme a Resolução SE nº 73/14, tem sido a proposta salvacionista para este

projeto que, de origem, não se sustenta. Logo, precisa criar factoides para se justificar frente

à opinião pública e promover ações falaciosas em tempos eleitorais.

A análise empreendida, por meio desta pesquisa e pela prática deste pesquisador na

sua atuação profissional como Supervisor de Ensino, afirma que as constantes alterações

promovidas pela Secretaria de Estado da Educação dilaceram o trabalho pedagógico da escola

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e a formação continuada, oferecida aos professores, não tem contribuído para o entendimento

dessas propostas e para a práxis docente.

Fato é que a Resolução que discute o tema Reorganização do Ensino Fundamental em

Regime de Progressão Continuada e Mecanismos de Apoio à Aprendizagem foi alterada três

vezes em um período de pouco mais de um ano (Resolução SE nº 74/13; Resolução SE nº

53/14; Resolução SE nº 73/14). Todas as alterações, pedagógicas e administrativas, se

iniciaram a partir de frágeis encontros encaminhados e direcionados pela Secretaria da

Educação e Diretorias de Ensino em 2011 sem participação ativa e autônoma de professores e

comunidade escolar. Aqueles que são os principais atores políticos do projeto educacional -

professores e comunidade - foram subjugados pelo discurso dominante. Este expediente, de

simular a participação é assim entendido: “Quanto mais a sociedade e o regime político são

fechados, antidemocráticos, mais a política (o governo, o poder, a gestão) tende a se deixar

conduzir pela lógica da simulação e da dissimulação” (NOGUEIRA, 2004, p. 27).

Este fato não é exclusivo desta administração. Adrião já denunciava esse modelo em

governos anteriores:

O fato de defender a centralização das decisões a respeito dos aspectos

pedagógicos põe a nu a limitada concepção da SEE a respeito da autonomia

reservada às escolas e explicita a desconfiança depositada por essa secretaria

tanto nos educadores que atuam na unidades escolares quanto nos seus

usuários, como agentes ativos e prioritários na definição dos projetos

pedagógicos. Atribui, pois, o baixo desempenho da rede à inexistência de

formas mais „eficientes‟ de controle, por parte dos órgãos hierarquicamente

superiores, sobre o produto da escola. (ADRIÃO, 2006, p. 122)

E acrescenta:

Tanto o programa de Covas quanto as diretrizes educacionais, a reservarem a

esse governo a função de liderança exclusiva na „revolução educacional‟ a

ser realizada no Estado de São Paulo, além de restringirem a autonomia dos

municípios e das escolas na definição de projetos educativos condizentes

com suas necessidades, excluem os cidadãos e usuários dos serviços

educacionais da possibilidade de participar da definição dos objetivos da

educação por eles financiada. A estes reserva-se apenas o direito de

consultar os resultados obtidos pelas escolas. Assim, a participação da

comunidade nos assuntos pedagógicos da escola não extrapola o acesso à

informação a respeito do que foi centralizadamente decidido. Por outro lado,

esse mesmo governo apela para que essa comunidade, por meio de trabalho

voluntário, contribua - novamente - para a manutenção e o funcionamento

das atividades escolares: mais uma „parceria‟ se estabelece. (ADRIÃO,

2006, p. 123)

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As políticas públicas em educação deveriam garantir o direito constitucional à

educação e se apresentar como possibilidade de enfrentamento das desigualdades econômicas,

sociais e de escolarização, mas, no caso estudado, apresenta equívocos em suas formulações:

na concepção teórica do ato de aprender e ensinar e na formulação das políticas públicas que

não promovem a participação e envolvimento da comunidade escolar e dos professores.

Gualtieri e Lugli explicam a inconsistência na concepção teórica e práticas da escola:

As tradições escolares organizam os conhecimentos a serem aprendidos em

níveis de dificuldade, correspondentes às séries de ensino (mesmo nas

escolas organizadas em ciclos); no entanto, sabe-se hoje que as pessoas não

aprendem desse modo. Há uma inconsistência entre a organização escolar e

a natureza da aprendizagem das crianças e, embora os professores tenham

contato com as teorias de Jean Piaget (1896-1980), Lev Vigostski (1896-

1934) e Henri Wallon (1879-1962) durante sua formação, dificilmente

conseguem visualizar o que poderiam fazer de diferente nos seus modos de

ensinar, porque as suas representações sobre a aprendizagem estão

fortemente moldadas pelo modelo escolar. (GUALTIERI; LUGLI, 2012, p.

70)

Os projetos de recuperação camuflam o direito à aprendizagem. Em uma década a

Secretaria de Estado da Educação alterou nove vezes a forma de organizar estes projetos. No

nosso entendimento não se justificam inúmeras alterações legais, através de resoluções, em

curto período de tempo. O argumento utilizado, para tais alterações nas resoluções, é

comumente apresentado como inovação, melhoria e até revolução, mas professores o

apresentam como tentativas frustradas de melhorar a aprendizagem dos alunos. Essa angústia

e frustraçãodo professor pela não aprendizagem dos alunos e pelo fracasso dos projetos de

recuperação são reforçadas e mantidas pela concepção de escola seletiva, onde somente

alguns terão sucesso na vida, na escola e na sociedade. Marca indelével do sistema capitalista

e da escola tecnicista e seus mecanismos atualizados.

Mas, neste movimento de contradição, professores também afirmam que: “As políticas

da Secretaria da Educação não estão garantindo a aprendizagem dos alunos” e; “Os

professores criticam esse negócio de o governo falar e não acontecer nada”; “São vários

motivos e o que a gente ouve é que o governo abandonou as escolas”. E também assumem

suas responsabilidades profissionais: “Conversamos com a coordenação para a gente reagir,

mudar” e; “A escola tem tentado melhorar. Estamos buscando alternativas”; “Acredito que

temos feito o possível para que o aluno aprenda”.

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Nesta pesquisa a construção do Núcleo de Significação: Do discurso pelo direito à

educação ao abandono da escola: O professor indignado “parece que somos o problema” e os

alunos “que não estão sabendo aproveitar”. O professor não se reconhece e não reconhece o

aluno como cidadão de direitos, foi o que mais apontou as contradições na fala dos

professores participantes da pesquisa.

A análise efetuada a partir deste núcleo validou nossa percepção da prática diária

como integrante do magistério paulista: a escola é o lócus da conquista pelo direito à

educação, porém, é justamente nela que apontamos os que “não sabem aproveitar” e não

conseguimos que as classes populares se apropriem do saber historicamente construído e

desenvolvam criticidade frente aos desafios que se apresentam. Praticamos o ato de submissão

dos nossos alunos ao nosso poder de professor sem conseguir entender as contradições

históricas apresentadas, onde reproduzimos de certa forma o modelo estabelecido da ideologia

dominante. Não nos reconhecemos e não reconhecemos o aluno como cidadão de direitos. A

cidadania concedida é uma dura herança herdada dos mecanismos de clientelismo e

coronelismo que se fazem presentes na nossa sociedade, tão representada nos últimos tempos

em postagens em redes sociais e em parte dos meios de comunicação.

Os direitos elementares para o exercício pleno da cidadania ainda são negados. Os

avanços na legislação em educação são significativos e tem papel decisivo na luta política,

mas pouco avançamos em direção as raízes das desigualdades no Brasil e na superação da

nossa consciência conservadora: o fato é que a escolarização, que é o direito à educação –

acesso, permanência e, principalmente, uma boa escola - não é permitida para a maior parte

da população, entenda-se trabalhadores braçais do campo e da cidade – negros, indígenas –

mulheres, jovens e crianças.

Carvalho escreveu:

A cultura do consumo dificulta o desatamento do nó que torna tão lenta a

marcha da cidadania entre nós, qual seja, a incapacidade do sistema

representativo de produzir resultados que impliquem a redução da

desigualdade e o fim da divisão dos brasileiros em castas separadas pela

educação, pela renda, pela cor. José Bonifácio afirmou, em representação

enviada à Assembleia Constituinte de 1823, que a escravidão era um câncer

que corroia nossa vida cívica e impedia a construção da nação. A

desigualdade é a escravidão de hoje, o novo câncer que impede a

constituição de uma sociedade democrática. A escravidão foi abolida 65

anos após a advertência de José Bonifácio. A precária democracia de hoje

não sobreviveria a espera tão longa para extirpar o câncer da desigualdade.

(CARVALHO, 2013, p. 229)

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134

Como já escrito, os avanços na legislação educacional podem contribuir decisivamente

para superarmos as desigualdades sociais e de escolarização no Brasil e o Parecer CNE/CP nº

8/12 e a Resolução CNE/CP nº 1/12, que tratam das Diretrizes Nacionais de Educação em

Direitos Humanos, podem, efetivamente, se apropriadas na perspectiva a que se propõe,

mudar a maneira como a escola se organiza pedagogicamente e se relaciona com a

aprendizagem de todos.

Candau afirma que os Direitos Humanos estão no foco dos problemas apresentados

pelas sociedades contemporâneas ocidentais e, neste momento histórico, privilegia a

afirmação da igualdade e da diversidade. Acrescenta a necessidade da construção de uma

cultura em direitos humanos como eixo principal para garantia do direito à educação e a

necessidade de superar a fragilidade da formação de professores e práticas pedagógicas.

No que diz respeito à interrelação entre direito à educação e educação em

direitos humanos, num primeiro momento, as reflexões sobre estes campos

se deram de modo independente. No entanto, foram se aproximando

progressivamente e foi sendo assumida a perspectiva que considera a

educação em direitos humanos como um componente do direito à educação e

elemento fundamental da qualidade da educação que desejamos promover.

Sendo assim, estas duas preocupações se entrelaçam na busca da construção

de uma educação comprometida com a formação de sujeitos de direito e a

afirmação da democracia, da justiça e do reconhecimento da diversidade na

sociedade brasileira. A construção de uma cultura dos direitos humanos em

diferentes âmbitos da sociedade constitui seu eixo principal. No entanto, se

no plano teórico esta articulação foi sendo conquistada, ainda é muito frágil

no âmbito das políticas públicas, da formação de educadores e das práticas

pedagógicas. (CANDAU, 2012, p. 724)

A interrelação entre direito à educação e educação em direitos humanos na perspectiva

da igualdade e da diferença é assumida, claramente, no Parecer CNE/CP nº 8/12, quando

estabelece os princípios da educação em direitos humanos: Dignidade humana; Igualdade de

direitos; Reconhecimento e valorização das diferenças e das diversidades; Laicidade do

Estado; Democracia na educação; Transversalidade, vivência e globalidade; Sustentabilidade

socioambiental.

A educação em direitos humanos tem a “finalidade de promover a educação para a

mudança e a transformação social” e como advertia Severino “as armas que dispõem os

educadores são prioritariamente as fornecidas pelo conhecimento. Através de um

conhecimento produzido de maneira crítica, competente e criativa, os educadores atuarão

como técnicos e políticos – enquanto intelectuais” (SEVERINO, 2012, p. 155).

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Nidelcoff alerta para a formação do “professor povo”, que “deve ajudar as crianças a

descobrirem que estão criando cultura, na medida em que VÊEM a realidade e a expressam e

se expressam a si mesmos” (NIDELCOFF, 1994, p. 76). Quando concluímos que o professor

não se reconhece e não reconhece o aluno como cidadão de direitos, vemos o quanto nosso

trabalho será obstinado e longo em direção a formação do “professor povo” e a “mexer na

ossatura da escola” (ARROYO, 2013, p. 33).

Nossa ideia inicial em construir essa pesquisa sobre as significações que professores

atribuem aos projetos de recuperação e as questões relativas ao direito à aprendizagem

suscitaram problemas mais amplos que necessitam de novas pesquisas: porque professores

atribuem à parcela dos alunos a responsabilidade pelo fracasso escolar, mas reconhecem que

a escola não vai bem? Por que falamos e ouvimos sobre políticas públicas de Estado e, de

fato, vivemos e aceitamos pretensas políticas públicas partidárias e/ou de promoção pessoal?

Essas questões demandam mais estudos e pesquisas. Limitamo-nos ao que se

apresentou nas entrevistas com professores e, centrados, focados na nossa questão principal,

contribuímos para novas reflexões sobre o porquê dos projetos de recuperação de

aprendizagem apresentarem resultados pífios e pouco ou quase nada alteram a garantia do

direito à aprendizagem dos alunos.

Constatou-se, por meio das significações, que professores atribuem aos projetos de

recuperação de aprendizagem e o direito à educação, que os caminhos da proposta

educacional da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo apresentam fragilidades. Os

alicerces do discurso pela melhoria da qualidade de ensino são débeis, restritos. Baseiam-se

na precarização do trabalho docente, na terceirização dos serviços, no modelo gerencialista de

administração, na bonificação por resultados e meritocracia, na perniciosa ideia de que só a

melhoria de resultados das avaliações externas representa a garantia do direito à

aprendizagem e, a limitação do potencial cultural das escolas através da imposição de projetos

e programas.

As políticas públicas em educação têm como objetivo garantir o direito constitucional

à educação. Apresentam-se como possibilidade de enfrentamento das desigualdades

econômicas, sociais e de escolarização, porém, no caso estudado, não cumprem essa função e,

ao contrário, os projetos e as resoluções reforçam o ideário da reprovação escolar, da

seletividade e da exclusão no interior da escola.

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136

Outro achado importante desta pesquisa mostra a contradição no discurso de

professores quando consideram que as questões sociais implicam sobre a garantia do direito à

aprendizagem, porém pouco se importam com tais questões quando aplicam [ou desejam]

reprovar os alunos. “É um bairro bem carente, tem todos esses problemas sociais que levam o

aluno a não aprender”; “Cuidar do professor é tudo”; “eu acho que esse problema hoje

[aprendizagem] é um problema social” ; “Carentes de carinho mesmo, de amor de pai e mãe”;

“A gente não tem muita coisa, mas é cobrado de tudo”.

As significações que professores atribuem ao direito à educação apresentam

contradições que estão aparentes na sua prática diária na escola. Tem clareza da negação do

seu direito e do direito do aluno a cidadania, mas não consegue se reconhecer e reconhecer o

outro como cidadão de direitos. Este movimento contraditório é aparente, porque o professor

demonstra certa sensibilidade social com essas questões, porém, não consegue se desprender

ideologicamente. Superar as debilidades na formação política do professor, que são reforçadas

pelo discurso predominante das elites conservadoras que defendem, entre outros temas, a

diminuição da maioridade penal, a criminalização de movimentos sociais e a negação dos

direitos humanos é um dos desafios que esta pesquisa apresentou.

Este modelo imposto, desde a concepção teórica do ato de aprender e ensinar, das

formulações e reformulações de projetos e programas e a articulação política para prestação

de contas junto à sociedade, por meio de índices de avaliação externa, não servem as classes

populares. Aprofundam desigualdades e não promovem a cidadania.

Estudos e pesquisas em outras redes de ensino, estaduais e municipais, serão

necessários para desvelar ainda mais estas preocupações.

Por considerarmos ricos os dados produzidos nesta pesquisa, por meio da entrevista

semiestruturada, acrescentamos que outros estudos poderão ser ampliados por esse

pesquisador.

Estudos e pesquisas em outras redes de ensino, estaduais e municipais, serão

necessários para desvelar ainda mais estas preocupações. Esperamos que este trabalho gere

inquietações e crises em todos que o leiam. Porque a crise “dilacera fachadas e oblitera

preconceitos” (ARENDT, 2013, p. 223)

Outros caminhos devemos e podemos construir coletivamente com as escolas e seus

atores.

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exercício de 2009, o percentual da Desvinculação das Receitas da União incidente sobre os

recursos destinados à manutenção e desenvolvimento de ensino de que trata o art. 212 da

Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I e VII do art. 208, de forma a prever a

obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar a abrangência dos programas

suplementares para todas as etapas da educação básica, e dá nova redação ao §4º do art. 211 e

ao caput do art. 214, com a inserção neste dispositivo de inciso VI. Diário Oficial da União,

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2013.

______. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação educacional.

Desempenho escolar rede estadual estado de São Paulo. 1986-2013. Tabelas e gráficos.

2014.

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Ensino Fundamental em Regime de Progressão Continuada e sobre os Mecanismos de Apoio

Escolar aos alunos dos Ensinos Fundamental e Médio das escolas estaduais. Disponível em:

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______.Resolução SE nº 73 de 30 de janeiro de 2014Dispõe sobre a reorganização do

Ensino Fundamental em Regime de Progressão Continuada e sobre os Mecanismos de

Apoio Escolar aos alunos dos Ensinos Fundamental e Médio das escolas estaduais.

Disponível em: <http://www.educacao.sp.gov.br/lise/index.asp >. Acesso em: 3 jan. 2015.

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150

APÊNDICE 1

Roteiro inicial de entrevista, 11/10/2013.

1- A prática do professor e seus alunos.

1.1 Sobre sua formação;

1.2 Sobre você professor(a);

1.3 Sobre sua prática docente;

1.4 Sobre seus alunos – Como são seus alunos? De onde vêm? Como são as famílias? O

bairro? O que eles fazem fora da escola? De que gostam? O que não gostam? O que dizem

sobre escola, futuro, sociedade...

1.5 Sobre a escola – Como é a escola em que você trabalha? Condições estruturais,

condições internas e externas à escola?

1.6 Quantas aulas você ministra semanalmente? Quantos alunos você tem?

1.7 Como é o aproveitamento dos seus alunos?

1.8 Estão aprendendo?

1.9 Fale sobre os alunos aprovados. Como eles são?

1.10 O que você faz com os alunos que têm dificuldades?

1.11 E as questões sociais? Como aparecem no seu dia a dia? A pobreza, a delinquência, o

abandono, a drogadição, a família...

1.12 O que a disciplina/indisciplina dos alunos tem a ver com isso?

1.13 Tem alguns que você reprovaria?

1.14 Como você pensa a questão da reprovação?

1.15 É a melhor solução reprovar esses alunos?

2- História da Educação.

2.1 Pretendo que você fale um pouco sobre reprovação escolar na história da educação.

2.2 O que você conhece sobre seriação e seletividade escolar?

2.3 O que você entende por ciclos de aprendizagem?

2.4 E progressão continuada?

2.5 Sobre como esses temas aparecem no seu dia a dia.

2.6 Sobre como esses temas aparecem nas reuniões/encontros dos professores. (ATPC;

Reunião Pedagógica; Encontros de Formação Continuada).

2.7 E nas conversas informais do dia a dia com os colegas professores, como isso é discutido?

(no intervalo, no café, na sala dos professores, no pátio)

2.8 E entre os alunos?

2.9 E entre os funcionários da escola?

2.10 E entre os pais e comunidade?

3- Recuperação/Reforço.

3.1 Sobre os projetos de Recuperação/Reforço que ocorrem na escola.

3.2 Comente sobre esses projetos na última década.

3.3 Como a Secretaria de Estado da Educação apresenta o projeto de recuperação para os

professores?

3.4 Como a Diretoria de Ensino apresenta o projeto para os professores?

3.5 Como a equipe pedagógica da escola apresenta o projeto para os professores?

3.6 Como esses projetos são apresentados aos alunos?

3.7 Como esses projetos são apresentados aos pais?

3.8 Como os professores se apropriam desses projetos?

3.9 Quais as vantagens desse modelo de projeto de recuperação?

3.10 Quais as desvantagens desse modelo de projeto de recuperação?

3.11 Comente sobre o Professor Auxiliar (PA).

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151

3.12 Você gosta da ideia de ter um professor para auxiliar os alunos na sua aula?

3.13 Como você entende a proposta do Professor Auxiliar?

3.14 Você gosta desse projeto?

3.15 Como esse professor foi apresentado para você e para seus alunos?

3.16 O que os professores de outras disciplinas pensam sobre os Projetos de Recuperação e o

auxílio do professor auxiliar?

3.17 Como você avalia estes projetos na escola?

3.18 Este projeto apresenta resultados?

3.19 Como e quem faz o acompanhamento desses projetos? (Recuperação/PA)

3.20 Como são registrados e socializados com os demais professores?

3.21 Como são divulgados/socializados com os alunos?

3.22 Como são divulgados/socializados com os demais funcionários?

3.23 Como são divulgados/ socializados com os pais?

3.24 Quais as perspectivas desse projeto?

4- Direito à aprendizagem.

4.1 O que você entende por políticas públicas para educação?

4.2 Sobre as políticas públicas da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo.

4.3 Como essas políticas públicas chegam até a escola, até os professores?

4.4 Quais delas você tem percepção direta no seu dia a dia como professor?

4.5 Como elas aparecem no dia a dia da escola?

4.6 Como elas se configuram no discurso dos professores e da equipe de gestão?

4.7 Os funcionários, alunos e pais conhecem esses políticas públicas?

4.8 Essas políticas públicas tem alcançado seus objetivos?

4.9 As crianças e adolescentes estão aprendendo mais com a implantação/implementação

dessas políticas públicas?

4.10 A escola melhorou com essas políticas públicas?

4.11 A saída que a SEE tem apresentado são os projetos de recuperação e de professor

auxiliar para melhorar a aprendizagem dos alunos? Como você entende esse saída proposta

pela SEE?

4.12 Existem outras formas de melhorar a aprendizagem dos alunos?

4.13 O que você entende por Direito?

4.14 Comente sobre qualidade da educação.

4.15 Como são apresentados os dados sobre qualidade da educação?

4.16 Comente sobre qualidade da educação e avaliação da educação.

4.17 Comente sobre direito à aprendizagem.

4.18 Os projetos de recuperação tem garantido o direito à aprendizagem, a qualidade da

educação?

4.19 Como você percebe o direito à aprendizagem no dia a dia?

4.20 Os projetos da SEE tem garantido o direito à aprendizagem?

4.21 Qual o papel do professor para garantir o direito à aprendizagem?

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152

APÊNDICE2

Transcrição da entrevista realizada em 05 de março de 2014 com duração de 01 hora e 02

minutos.

Professor Antonio - Matemática

Tempo aproximado de transcrição: 7 horas.

PESQUISADOR. Sou Doutorando no Programa de Educação: Psicologia da Educação, da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Agradeço ao professor por conceder esta

entrevista. Informo que nossa conversa deve ter duração média de 50 minutos e será realizada

a partir de um roteiro prévio que desenvolvemos anteriormente em reuniões de orientações

gerais para este trabalho. Lembro ao professor que não utilizaremos ou divulgaremos o nome

do entrevistado ou de qualquer outra pessoa ou local.

PESQUISADOR. Você trabalha aqui há quanto tempo?

PROFESSOR: Há quatro anos.

PESQUISADOR. Quantas aulas você ministra, semanalmente? Quantos alunos você tem?

PROFESSOR: 30 aulas. 220 alunos.

PESQUISADOR. Como é o aproveitamento deles? Estão aprendendo?

PROFESSOR: É então... (pensa bastante, sorri...)Vimos que no primeiro semestre, nos

dois bimestres trabalhando a proposta, nos conteúdos da série, o rendimento é muito

baixo. Tivemos, em Matemática, de 70% a 80% de notas vermelhas, insatisfatórias.

Conversamos com a coordenação para a gente reagir, mudar. Foi proposto, com a

gestão, rever os conceitos anteriores lá nas quintas e sextas séries para não chegar a esse

abismo que tem na oitava série. No terceiro bimestre, já conseguimos um

aproveitamento de 50% nos 80% que estavam com nota insatisfatória. Para mim e para

os outros professores, a matéria se tornou mais fácil, mais prazerosa. Eles estavam

conseguindo aprender. Esse resgate que fizemos dos anos anteriores foi importante. Só

que, em contrapartida, paramos o conteúdo da série um pouquinho e estamos tentando

chegar aos poucos.

PESQUISADOR. Sobre os alunos.

PROFESSOR: Os que aprovam? São os que estudam! Mesmo esses alunos que são

aprovados ainda estão muito abaixo do nível que esperamos. Dissemos assim: é aluno

nota 5, nota 6, porque a gente tenta avaliar de diversas formas.

PESQUISADOR. Então eles são aprovados, mas, no entendimento de vocês, são aprovados

no básico, no nível básico, do básico para o adequado.

PROFESSOR: Esses alunos que são aprovados demonstram mais interesse, participam

mais, mesmo assim são do nível básico para o adequado. (Os níveis de proficiência são:

abaixo do básico, básico, adequado e avançado. São classificados a partir da pontuação dos

alunos nas provas do SARESP – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de

São Paulo. A SEESP considera que o ideal é que os estudantes fiquem entre o nível básico e o

avançado. Fonte: www.educacao.sp.gov.br. Nota do pesquisador.

PESQUISADOR. E o que o professor faz com os que têm dificuldades, esses que estão abaixo

do básico?

PROFESSOR: Nós temos nesse ano o “professor auxiliar”. Esses alunos que têm mais

dificuldades, abaixo do básico, ficam duas aulas por semana com esse professor. A gente

dá o mínimo mesmo.(“professor auxiliar” é o que atua, em até três aulas semanais, junto

com o Professor da classe. Fonte: Resolução SE nº 02/2012) Nota do pesquisador.

PESQUISADOR. Eles não ficam com o professor? Saem da sua aula e vão para outro espaço?

PROFESSOR: Outro espaço, com outro professor, outro ambiente para trabalhar com

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153

essa dificuldade mesmo que é extrema. Mas tem professor que trabalha assim. Têm

outros que trabalham de outra forma, trabalham dois professores na sala, dividem os

alunos em níveis.

PESQUISADOR. E há outros professores que preferem que os alunos com dificuldades saiam

para ser atendidos em outros espaços?

PROFESSOR: É. Tudo depende das turmas. Nas minhas turmas, eu vejo a necessidade

desse professor trabalhar com o grupo menor. Nem sempre é menor. A gente viu que

está atingindo os objetivos.

PESQUISADOR. E como que vocês fizeram para chegar aí? Como que vocês decidiram isso?

PROFESSOR: No início do ano, fizemos “provas diagnósticas” para ver o perfil do aluno

e as dificuldades. Através desses resultados, a gente seleciona os alunos que têm mais

dificuldades, que são mais difíceis. Isso foi feito do primeiro para o segundo bimestre.

(“Avaliação de Aprendizagem em Processo” - O exame é utilizado pelos educadores para

analisar o nível de aprendizado dos estudantes e, com isso, traçar estratégias e metas para

garantir o desenvolvimento dos alunos. Fonte: www.educacao.sp.gov.br)

PESQUISADOR. E a decisão de separá-los e tirá-los da sala, para ficar com o professor

auxiliar ou mantê-los na sala com dois professores, quem tomou essa decisão?

PROFESSOR: O professor auxiliar, o professor titular da sala, a coordenação e o grupo

gestão.

PESQUISADOR. Como foi? Fizeram como?

PROFESSOR: Uma reunião traçando o perfil da sala e dos alunos para ver se era a

melhor maneira de conduzir os alunos para o reforço.

PESQUISADOR. Falamos dos alunos que apresentam dificuldades e o professor comentou.

Mas como que aparecem, no meio de tudo isso, as questões sociais? Como aparece no seu dia

a dia?

PROFESSOR: Isso repercute muito. Têm alunos usuários de drogas. Alguns casos são

visíveis. O aluno vem pra escola, pra não perder a vaga e não ser encaminhado para o

Conselho Tutelar. Esse bairro, onde a gente trabalha, tem bastante. A questão da

pobreza também. É um bairro bem carente, que afeta muito a estrutura familiar.

Crianças que não têm pais são separadas, e isso afeta muito. O aluno acaba não

conseguindo ter o rendimento esperado por esses fatos.

PESQUISADOR. E como você vê seu papel e o da escola nessas situações? Primeiro falamos

dos alunos que consideramos aprovados, que estão no básico, depois dos alunos que têm

dificuldades, que estão abaixo do básico e o que fazemos. Mas como vocês professores

trabalham com essas questões sociais?

PROFESSOR: Muitas vezes são essas questões sociais que levam a atos de indisciplina, a não

acompanhar as atividades e a, simplesmente, não abrir um caderno, porque ele tem outros

problemas e aquilo para ele não é importante. Ele vem para escola, gosta de estar com os

colegas, mas aquela importância dos estudos ele não coloca como prioridade. Talvez, a falta

de estrutura familiar repercute na questão maior da vida deles.

PESQUISADOR. Você considera importante a escola discutir essas questões?

PROFESSOR: Considero. Acho que os projetos sociais aproximam mais o professor e o

aluno. Temos dois professores que têm maior facilidade de ter esse elo com o aluno, de

conversar, de tentar entender o aluno. Outros já não têm esse elo. Talvez, isso ajude o aluno a

ter mais confiança nesse profissional.

PESQUISADOR. Tem alunos que você reprovaria?

PROFESSOR: Reprovaria por rendimento?

PESQUISADOR. Que você reprovaria?

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154

PROFESSOR: Sim. Sim. Reprovaria.

PESQUISADOR. E como você pensa essa questão da reprovação escolar?

PROFESSOR: É uma questão bem ampla, bem complexa. Esse ano para mim foi de

renovação. Ao voltar o conteúdo, a gente vê que os alunos têm dificuldades extremas.

Então, reprovar um aluno eu entendo que não ajuda. Quando o aluno reprova a 8ª série,

há dez anos que trabalho com 8ª série, que é final de ciclo, no ano seguinte, fazendo a 8ª

serie novamente, muitas vezes ele não vai melhorar. A tendência é piorar por causa da

falta de motivação e de empenho. Mas existem alguns casos de alunos que não abrem o

caderno, não fazem as atividades, que não buscam o conhecimento e acabam reprovando

por desempenho. Então, a gente acaba reprovando esses alunos que não têm o que fazer,

que não têm jeito. Mesmo assim, na minha visão, no ano seguinte, esse aluno não vai

melhorar. Vai continuar do mesmo jeito.

PESQUISADOR. É a melhor solução para esses alunos?

PROFESSOR: Talvez, não seja a melhor solução, mas fica difícil encontrar um caminho

para que esses alunos não cheguem à reprovação. Entender porque esse aluno é assim,

que não consegue entender, porque ele não quer, seria esse meio termo porque não

reprovar os alunos que não têm jeito.

PESQUISADOR. E a progressão continuada?

PROFESSOR: É, a gente fala muito sobre a progressão continuada. Existem muitas

críticas sobre a progressão continuada de 1998. Hoje, o aluno só é reprovado no final do

ciclo, no fundamental I e no fundamental II. Lembro quando eu era aluno. O aluno era

reprovado por rendimento. Hoje, a gente escuta que o aluno foi reprovado por faltas. Só

será por nota e rendimento no final de ciclo. O que eu conheço um pouquinho da

progressão continuada está relacionado a essas críticas que nós, professores, eu me

incluo nessa, fazemos: que hoje o aluno não consegue compreender, entender e mesmo

assim ele é aprovado.

PESQUISADOR. Sobre seriação e seletividade escolar.

PROFESSOR: A gente faz muitas comparações: que naquele tempo os alunos conseguiam

aprender e muitos que eram reprovados evadiam-se. Eu me lembro de que muitos

abandonavam a escola para trabalhar e hoje os alunos de alguma forma, quando são

reprovados, abandonam. Não só o abandono de não vir para escola, mas o abandono

intelectual. Ao reprovar um aluno, eu acho que, nos anos seguintes, você perde esse

aluno. Talvez não por abandono, mas por falta de motivação que no ano seguinte é muito

grande. A questão da seriação, não sei explicar bem o que seria.

PESQUISADOR. E como essas questões, progressão continuada, seriação e seletividade são

vistas pelos demais professores?

PROFESSOR: A gente percebe que o aluno chega ao final de ciclo, na progressão

continuada, sem o conhecimento básico. Agora, eu não sei se essa questão de você

reprovar o aluno interfere no final do ciclo. Mas nós vimos que o aluno chega hoje ao

final do ciclo da 8ª série sem conhecimentos prévios básicos.

PESQUISADOR. Então, deveria ter mais reprovações?

PROFESSOR: Aí tem uma contradição. Será que reprovar os alunos seria melhor?

Porque, se a gente voltar para alguns anos atrás, a gente reprovava o aluno. Havia uma

taxa de reprovação muito grande e isso não resolvia o caso dos alunos reprovados. Mas

aprovar também não dá, né?

PESQUISADOR. E os ciclos de aprendizagem?

PROFESSOR: Isso é pouco discutido na escola. A gente já comentou de ciclo de dois anos.

É, talvez fosse a solução. Em vez de você deixar do sexto até o nono ano para recuperar o

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aluno, por que não de dois em 2 anos? Com esse ciclo menor, você conseguiria recuperar o

aluno. Não que você ia reprovar o aluno, mas uma recuperação mais intensiva a cada dois

anos. Talvez aquela recuperação que existia antes.

PESQUISADOR. E como isso aparece no dia a dia da escola?

PROFESSOR: Muitas vezes é angustiante. Muitas vezes, a gente prepara uma aula que

você acredita que vá durar aqueles cinquenta minutos, ou cem minutos, duas aulas, e

acaba se estendendo por uma semana inteira. Às vezes, eu preparo uma atividade

considerada básica e duas aulas acabam se tornando seis, porque os alunos têm essa

dificuldade, esse nível de conhecimento muito básico. Uma grande defasagem que é

mesmo muito angustiante. Você como professor tem uma expectativa. E aquela

expectativa não é confirmada.

PESQUISADOR. E como essas questões aparecem em reuniões, encontros entre professores,

nos horários coletivos e em formação continuada?

PROFESSOR: No intervalo. Até no intervalo a gente discute sobre o aluno. Nas ATPC, é

discutido a todo momento.Uma forma pra gente conseguir é resgatar nossos alunos para

o aprendizado. É uma das maneiras que a gente viu aqui na escola, até pelas notas das

provas SAEB, SARESP, diagnóstica, em que todos foram mal em Matemática. Foi muito

triste.

PESQUISADOR. Professor, isso é o que a gente ouve e fala nos encontros e reuniões. Mas e

nas conversas informais, quando você está lá no café com os demais professores, o que o

professor ouve sobre esses assuntos?

PROFESSOR: Um fala para o outro e ficam indignados em ter que aprovar esses alunos,

porque já ensinamos o básico e os alunos não conseguem entender. Muitas vezes, a gente

não consegue e culpa o aluno sobre essas obrigações que eles não cumprem, como a falta

de interesse e de motivação de estudar. A gente fala um para o outro: como que pode um

aluno não entender?Alguns são a favor da reprovação e que no ano que vem ele vai

sentir o “baque” da reprovação e vai começar a estudar,empenhar-se mais. Outros

acreditam que não. Outros acreditam que uma porcentagem tem que ser reprovada até

porque isso ajuda a dar um “baque” na turma.São opiniões diferentes que a gente vê

sobre a reprovação. Uns são a favor, outros não, outros em parte. São opiniões bem

diferentes, mas que vão para o lado da reprovação.

PESQUISADOR. E os alunos, nas conversas informais, o que falam sobre isso? Sobre essa

forma de a escola se organizar?

PROFESSOR: Os alunos são muito inteligentes. Eles sabem, por exemplo, sobre a

reprovação. Os alunos sabem que reprova nas oitavas séries, que é final de ciclo. O

professor deixa bem claro e a gestão passa para eles que têm que estudar,empenhar-se,

senão vai reprovar. Mas assim eles somente vão ter esse interesse, esse foco, lá no último

bimestre. No final do ano, eles começam a entregar trabalho, começam a ir atrás de

notas, a buscar alternativas de trabalhos extras para não perder o ano. Eles têm, sim,

essa preocupação de não perder o ano. Entre eles, a gente percebe que mesmo aqueles

que não fizeram nada durante o ano, não participaram de forma alguma, no final, têm

medo de perder o ano. Não querem separar-se da turma, o colega ir adiante e ele ficar

para trás, ficar na reprovação.

PESQUISADOR. E os funcionários da escola, você ouvem comentários sobre isso?

PROFESSOR: Não. São indiferentes [os funcionários] sobre esse negócio de reprovação.

Os comentários que conversamos com os funcionários são outros. Esse é um assunto que

não é mencionado.

PESQUISADOR. E os pais e a comunidade?

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PROFESSOR: Os pais da oitava série são a favor da reprovação. Quando a gente discute em

sala de aula, eles falam: meu filho não sabe e não é justo que ele seja aprovado. Ele não sabe

nada e todo ano é aprovado. Acaba passando para frente sem saber de nada. Essa é a fala dos

pais. Então, é assim: uma boa parte dos pais é a favor da reprovação, mas eles não têm

conhecimento de que é a progressão continuada que faz isso. A questão da história dos

ciclos, que nós professores não queríamos que aprovasse. Então, eles enxergam assim:

não aprendeu nada e tem notas vermelhas? Tem que ser reprovado. Mas assim, em

partes, aqui na nossa escola, a presença dos pais é baixa, insatisfatória. Cerca de 30% ou 40%

dos pais é que dão as caras. E geralmente são os pais dos alunos que têm notas satisfatórias,

que são bons. Aqueles que os alunos estão em condições ruins não aparecem, não participam

nem de reuniões, nem quando são acionados, muitas vezes, para discutir a parte pedagógica,

porque o filho está mal na escola. Mas quando eles participam da última reunião do ano, da 8ª

série, e o filho é reprovado, eles ficam indignados! Mas em nenhum momento eles vieram. Em

nenhuma reunião, eles compareceram antes de chegar ao extremo. É outra parte angustiante.

PESQUISADOR. Vocês discutem essa não participação dos pais? O que vocês ouvem deles?

PROFESSOR: A gente ouve que é por causa do trabalho. Só que a gente procura marcar

reunião o dia todo, então o período da manhã fica aberto a reunião das oito até o meio dia. Ele

também pode comparecer à tarde, à noite. É só querer vir, mas muitas vezes não comparece.

PESQUISADOR. E sobre recuperação?

PROFESSOR: Posso voltar alguns anos. Fui professor de recuperação paralela uns 3 ou 4

anos. A gente percebia uma evasão muito grande. Era no contraturno e o aluno não

vinha, tinha lá 20 alunos por turma. Vinham seis ou sete. Hoje, essa recuperação de

apoio dentro da sala ou fora em outra sala ambiente, durante o processo, traz mais

resultados. Escutei de alunos meus: professor, consegui aprender as quatro operações com a

professora auxiliar. Comigo não aprendeu no contexto geral, mas com a professora focando

naquele tópico, naquele assunto, ele consegue compreender.

PESQUISADOR. Quantos alunos você tem em sala de aula?

PROFESSOR: 40

PESQUISADOR. E quantos precisam da recuperação?

PROFESSOR: Uns 25%. Uns 10 alunos por sala que estão abaixo do básico.

PESQUISADOR. Comente mais sobre esses projetos de recuperação nesta última década.

PROFESSOR: Lembro-me do Projeto Números em Ação que era para alunos que tinham

dificuldades em Matemática. O Projeto Trilhas e Letras que era para Língua Portuguesa. Eles

trabalhavam com a tecnologia e era muito diferente. Tinha o computador, softwares e jogos

em que eles aprendiam a resolver situações problemas, português, ditado, redação. Tudo

interativo. E lembro que o aluno aprendia bastante, interagia mais. Na Recuperação Paralela,

os alunos não vinham no contraturno. Havia muita ausência. Essa era outra recuperação

paralela, e agora é esse Professor Auxiliar.

PESQUISADOR. Lembra-se de mais alguma?

PROFESSOR: Não, não me recordo de mais nenhuma.

PESQUISADOR. Lembra-se daquele que era na pré ou pós-aula?

PROFESSOR: Ah, lembro! Só lembro que acabava o horário da manhã e, antes de começar o

horário da tarde, havia alunos que: ou ficavam do período da manhã ou chegavam mais cedo

do período da tarde para ficar na recuperação, na hora do almoço. Tinha um professor que

ficava, também. Parecia com a recuperação paralela. Mas, na hora do almoço, os alunos

ficavam uma aula a mais e depois iam embora. Lembro sim, mas também lembro que

muitas vezes os alunos acabavam indo embora com os colegas que não estavam para

recuperação. Eles fugiam da recuperação na hora do almoço junto com os colegas.

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Terminava o horário normal, e eles aproveitavam e se mandavam. Saíam, não ficavam

mesmo. Acho que era muito cansativo ter cinco ou seis aulas e ainda ficar mais uma

aula. É muito chato. Assim, a escola não oferecia nada de diferente. Foi mais uma

tentativa que não deu em nada, não deu certo.

PESQUISADOR. Como a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, nestes tempos que

comentamos, tem apresentado esses projetos para os professores?

PROFESSOR: Eu vejo como tentativas. Acho que foram quatro. Foram várias tentativas

de melhorar nesse sentido de recuperar o aluno. E os professores, muitas vezes, não têm

capacitação e o material é feito às pressas.

PESQUISADOR. E por que, então, essas tentativas, essas tantas mudanças em pouco tempo?

PROFESSOR: Porque não trouxeram resultados ou foram poucos resultados. A gente vê

que nesses oito ou dez anos, a gente não consegue resgatar esses alunos. Não conseguimos

recuperar esses alunos.

PESQUISADOR. E como a Diretoria de Ensino apresenta isso para os professores?

PROFESSOR: Olha, eu só vi assim: pelo site da Educação (www.educacao.sp.gov.br).

Através do site, a gente fica sabendo. E em conversas entre os professores, também.

PESQUISADOR. E a equipe pedagógica da Diretoria de Ensino, como apresenta isso aos

professores?

PROFESSOR: Eu vejo o elo da Diretoria com a coordenação e a coordenação com os

professores na escola. Não tem professor/diretoria. Tem professor, coordenação pedagógica e

equipe gestão da escola.

PESQUISADOR. E como esses projetos são apresentados aos alunos e aos pais?

PROFESSOR: Nas reuniões bimestrais, o pai assina um termo em que o filho apresenta as

dificuldades básicas da disciplina. Esse aluno começa a participar das aulas de reforço.

PESQUISADOR. E como vocês falam isso para os pais na reunião?

PROFESSOR: Falamos dessa forma: seu filho apresenta essas dificuldades. Foram feitas

algumas provas diagnósticas e ele apresentou dificuldades na Língua Portuguesa e na

Matemática. Assim, ele necessita fazer um reforço. A gente explica que agora tem professor

auxiliar para trabalhar de maneira diferenciada com ele. PESQUISADOR. Os professores estão se apropriando dessas ideias? Como que eles recebem

isso?

PROFESSOR: Existe a conversa só entre os professores de Português e Matemática. Os outros

não se interessam muito, porque não é ligado à sua disciplina. Então, isso fica mais

internamente em Português e Matemática.

PESQUISADOR. Você vê vantagens nesse modelo?

PROFESSOR: Se a gente for comparar com o reforço paralelo, como era antes no

contraturno, o professor auxiliar é melhor. O aluno sai da sua aula, vai lá com o

professor auxiliar e consegue algumas mudanças que talvez a gente não consiga na sala

para resgatar alguns conteúdos. Ali, ele fica como se fosse uma aula particular, com

cinco, seis, oito alunos. Então, a mudança está acontecendo e é significativa.

PESQUISADOR. E quais as desvantagens desse jeito de ajudar o aluno nesse modelo?

PROFESSOR: O que a gente percebe deles é que, quando o aluno sai da sala, a preocupação

dele é perder sua aula. No meu caso ele fala: professor, vou lá ao reforço e o senhor não vai

dar matéria, explicar. Eu respondo que vou, ele diz: depois vou pegar o caderno. E quando

acontece na sala de aula com os dois professores acaba tumultuando entre eles. Então, dois

professores na sala gera conflito. Não conflito entre os dois professores, mas entre os

próprios alunos. A dinâmica da aula acaba não fluindo, porque alguns alunos

atrapalham e os próprios colegas acham melhor eles saírem para o reforço. Já trabalhei

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dessa forma também.

PESQUISADOR. Salas de aula com mais de 35 alunos, com dois professores, ou menos

alunos e um só professor?

PROFESSOR: Acho que reduzir o número de alunos para 30, 25 é o sonho de qualquer

professor. Seria uma alternativa melhor que ter professor auxiliar.

PESQUISADOR. Comenta um pouco mais sobre esse professor auxiliar.

PROFESSOR: Geralmente, são professores [professor auxiliar] que estão começando

agora na rede, recém-formados. Geralmente, têm também aqueles que ainda são

professores-alunos, que dizer, estão estudando ainda. São apresentados pela gestão que

diz que vamos traçar um plano para trabalhar com os alunos.

PESQUISADOR. E você gosta dessa ideia do professor auxiliar?

PROFESSOR: Gosto. E é o segundo ano que a gente está trabalhando dessa forma. No

ano passado, trabalhei com professor auxiliar na sala de aula. Acompanhei os prós e

contras. Nesse ano, já decidimos trabalhar dessa forma: eu e o professor auxiliar.

PESQUISADOR. Você conhece a proposta e a legislação sobre o professor auxiliar?

PROFESSOR: Não.

PESQUISADOR. Você gosta desse projeto?

Esse projeto da recuperação, com ajuda do professor auxiliar, traz resultados. Sou a

favor, embora não conheça muito a legislação em relação a esses projetos. É um projeto

inovador.

PESQUISADOR. Como esse professor auxiliar é apresentado para você e para os alunos? Fale

sobre a chegada dele na escola.

PROFESSOR: Chegando à escola, é a coordenação pedagógica e a gestão que apresenta o

professor para você e para os alunos. Dizem: olha, a partir de hoje, você vai ter um

professor auxiliar para ficar com os alunos que possuem maior dificuldade e vocês vão

fazer esse reforço para melhorar o rendimento e melhorar o conceito no Saresp. O

professor também se apresenta para a turma.

PESQUISADOR. Os outros professores, como eles recebem este projeto de Professor

Auxiliar?

A gente não ouve muitos comentários dos outros professores. Eu desconheço as

opiniões.Sobre os outros professores, parece-me que não sabem o que está acontecendo.

PESQUISADOR. E como você avalia esses projetos na escola, o do Professor Auxiliar e o de

final de ciclo que ficam um ano a mais?

PROFESSOR: Um ano a mais?

PESQUISADOR. Sim, os da oitava série, do final de ciclo?

PROFESSOR: Não.

PESQUISADOR. Os que são reprovados?

PROFESSOR: Sim. Sim. Os que reprovam a oitava série e ficam em uma turma só no outro

ano.

PESQUISADOR. Como você avalia esses projetos?

PROFESSOR: É, olha....

PESQUISADOR. Eles apresentam resultados?

PROFESSOR: É, deixa eu ver....

PESQUISADOR. A pergunta é: os alunos estão aprendendo?

PROFESSOR: (Risos do professor, gesticula bastante e continua rindo) É, temos aqui na

escola (continua rindo)... Nós temos aqui na escola uma taxa muito grande de

reprovação. Se a gente levar isso em conta, temos 8 salas de final de ciclo, oitava série.

Em cada sala dessas, nós temos uma média de 7 a 8 alunos que são reprovados. Se a

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gente pegar e buscar esses alunos que foram reprovados, posso falar com convicção de

que 80% dos alunos reprovariam novamente. Talvez não seja feito algo para que isso

mude. Se não vão reprovar um ano, vão fazer outro ano do mesmo jeito. E, às vezes, até

com menor desempenho. E vão chegar ao final do ano e acabar sendo reprovados, não

aprenderam nada.

PESQUISADOR. E como é o acompanhamento desses projetos?

PROFESSOR: O trabalho do professor auxiliar com o professor da sala acontece todo

bimestre. Ao final do bimestre, a gente senta para conversar se houve uma melhora

significativa desse aluno. Quando a gente não percebe que melhorou, o professor auxiliar

revê as atividades que ele fez, se ele vai permanecer mais um bimestre, se tem outro

aluno que pode se enquadrar na sala de reforço. Então, há um acompanhamento, às

vezes só bimestral. O pouco tempo que a gente tem em reuniões, a gente acaba deixando

isso de lado. É uma falha do professor da sala.

PESQUISADOR. Como tudo isso é registrado e socializado na escola?

PROFESSOR: O que é direcionado para os pais é que nós temos aqui o sistema Babica

(sistema informatizado de registro de notas e frequência). E existe lá uma avaliação do

perfil do aluno que é de “xizinho” (SIC) de múltipla escolha. Depois, a gente imprime

todo aquele documento e o pai recebe para ver se o filho está no reforço. Então, o pai, de

alguma forma quando ele vem para a escola, ele participa, ele tem um

acompanhamento, ele sabe que o filho dele está no reforço, como está no reforço, se está

aprendendo, se está buscando aprender, se é esforçado, se tem empenho, se não é

bagunceiro. Então, esse elo existe.

PESQUISADOR. Fale um pouco sobre Políticas Públicas em Educação.

PROFESSOR: Olha... (silêncio... risos...) a gente vê muito a mídia criticando a Educação.

Mídia assim como internet, TV. Vemos muita crítica a gestão estadual e municipal. São

vários fatores que levam a educação a estar dessa forma: casos de violência, de abandono

e da falta de estrutura das escolas. São vários motivos e a gente ouve muito que o Estado

abandonou a escola. O que fazer? Então, a gente vê os políticos e a política refletirem na

educação. Mas o que fazer eu não sei. É muito difícil.

PESQUISADOR. Mais especificamente no Estado de São Paulo, como você acompanha essas

políticas públicas para educação?

PROFESSOR: Olha, eu vejo assim: se a gente avaliar algumas escolas públicas de São Paulo,

a minha escola tem estrutura. Tudo que uma escola particular tem e pode oferecer para o

aluno, a nossa pode oferecer também. Tem estrutura agora porque tem todos esses

problemas sociais que levam o aluno a não conseguir aprender. Talvez, seja o que a

gente comentou lá no começo da fala: essa estrutura familiar, essa violência,esses alunos

que não aprendem, mesmo uma escola estruturada como a nossa é. São vários

profissionais bons, frequentes, a gente não consegue atingir o objetivo.

PESQUISADOR. Então, essas políticas públicas deveriam dar conta de outros fatores

externos à escola e não só o que é de responsabilidade da escola?

PROFESSOR: Olha, temos aqui o “Professor Mediador” que é para tratar dos conflitos e

resolver as questões em partes, mas não é o principal. (“Professor Mediador Escolar e

Comunitário - PMEC - do Sistema de Proteção Escolar”. Entre os objetivos da função deste

professor designado PMEC destaca-se a prática de mediação de conflitos no ambiente

escolar e orientação aos alunos, pais e professores. Fonte: www.educacao.sp.gov.br)

PESQUISADOR. Essas políticas públicas em educação da SEESP estão dando conta de

garantir o direito de aprender?

Não. As políticas da Secretaria de Educação não estão garantindo a aprendizagem dos

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alunos. (silêncio... demonstra preocupação)

PESQUISADOR. Quais outros projetos que você conhece aqui na escola?

PROFESSOR: A do professor mediador, mas a gente não sabe, não foi explicado para nós, por

exemplo, o motivo a fundo, a função de como chegou o professor mediador. A gente sabe que

precisa mediar e dar com esses conflitos, só isso. Mas isso eu conheço. A gente tem esses

contatos diariamente com o professor mediador por causa da indisciplina. A gente acaba indo

até a sala da professora mediadora para tentar lidar com esses conflitos e passa o caso para a

direção. O aluno sente essa confiança com a professora mediadora. Levar para a direção, todo

mundo já sabe: vou levar suspensão, vou ser advertido, vai chamar minha atenção. Por outro

lado, a mediadora já tem outra forma de conduzir.

Eu não sinto essa necessidade assim como professor de outros projetos, outras políticas

públicas de estrutura. Tem escola em que já trabalhei que não tinha uma quadra para trabalhar,

não tinha sequer sala de aula, era tudo adaptado, não tinha um computador. Existem muitas

escolas aqui na cidade em que falta muito recurso.Isso é problema de política educacional.

Essa escola tem tudo de que precisamos, mas nas outras está feio.

PESQUISADOR. E no dia a dia dos professores, nas conversas informais, como isso aparece?

PROFESSOR: A gente ouve falar que falta recurso. Os professores criticam esse negócio

de governo falar e não acontecer nada. Intensamente, fazem críticas ao governo: que a

escola, a educação foi abandonada, que falta melhorar a questão do material, das

apostilas... Apostilas fora da realidade dos nossos alunos. Então, essa parte, sim, é muito

criticada por todos.

PESQUISADOR. Essas políticas têm alcançado o objetivo de os alunos aprenderem mais, ter

esse direito garantido?

Não. Não. Fiz o Curso “Melhor Gestão Melhor Ensino” e finalizei. Muitos não conseguiram

finalizar. (“Melhor Gestão, Melhor Ensino” - Curso semipresencial, com duração de 60 horas,

oferecido a Diretores de Escola, Professores Coordenadores Pedagógicos e Professores de

Português e Matemática. Tem foco na gestão escolar e no processo de ensino e de

aprendizagem de língua portuguesa e de matemática.) Fonte: www.educacao.sp.gov.br

PESQUISADOR. As crianças e adolescentes estão aprendendo?

Pouco, muito pouco. As crianças estão aprendendo pouco. Alguns professores mudaram

a maneira de trabalhar depois que começaram a fazer o curso “Melhor Gestão Melhor

Ensino”. Assim, conduzem as aulas de outro jeito.

PESQUISADOR. E a escola tem melhorado para garantir o direito de aprender dos alunos?

PROFESSOR: (Silêncio... risos... silêncio) A escola tem tentado melhorar. Estamos

buscando alternativas depois desse curso “Melhor Gestão Melhor Ensino”. Sentamos

para conversar e melhorou um pouco. Fizemos algumas mudanças pra gente mudar essa

quantidade de “insatisfatório” e melhorar o Saresp. Estamos buscando alternativas.

PESQUISADOR. Professor, o que é Direito?

PROFESSOR: (Silêncio... professor incomodado com a pergunta) Direito...

(silêncio...demonstra inquietação...) Direito é... a gente já associa direito a dever, né? O

que é dever? E o que é direito? (silêncio...) Direito é... em se tratando de escola,

educação, todos têm direito. Direito de aprender, de ter uma boa convivência, de ter uma

família estruturada, de ter um bom professor. Direito acho que é... acredito que está

ligado a obrigação. O aluno tem o direito garantidoquando cumpre a obrigação.

PESQUISADOR. E sobre qualidade da educação. Como você acompanha essas conversas

com os demais professores?

PROFESSOR: A qualidade da educação, se eu me referir aos professores, há professores

altamente qualificados que trabalham no Estado, no Município, na rede particular, em

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Universidades. Temos professores altamente qualificados, mas nem sempre a gente consegue

ter uma educação de qualidade, talvez por tudo isso que a gente falou aqui hoje. O nosso

aluno, embora isso você não possa apontar como causa dessa falta de estrutura, essa

carência que o aluno tem, talvez mesmo com todas essas questões de qualidade que as

escolas possuem você não consegue atingir os objetivos de ter uma aula de qualidade,

porque alguns alunos não querem aprender, não aprendem.

PESQUISADOR. Como é apresentado para vocês professores essa ideia de escola de

qualidade?

PROFESSOR: Como é apresentada? É através de números, dados. Quem vai bem no

Saresp, tem melhor qualidade. É através das provas e dos resultados do Saeb, do Enem.

A gente vê lá a classificação e fala: essa escola é boa e aquela não é. A nossa está abaixo

do básico e é vista como de péssima qualidade. Então, é avaliado assim, isso é a

qualidade.

PESQUISADOR. Isso garante o direito do aluno aprender?

PROFESSOR: (Silêncio... risos... longo silêncio) Se isso garante a aprendizagem pelo fato

das notas, de estar abaixo ou no alto. (gesticula e ri muito...) Não, não garante. Às vezes,

eu como profissional poderia falar também nas minhas aulas de Matemática de outros

assuntos, outras coisas do cotidiano do aluno, mas tem que ser só matemática.

PESQUISADOR. Esses projetos de que tanto falamos garantem o direito de o aluno aprender?

PROFESSOR: Os projetos de recuperação deveriam garantir o direito de aprender, mas

nem sempre o aluno consegue aprender. Ele tem o direito, mas não consegue aprender.

Ele permanece mais um ano fazendo aquela série, com duas aulas de professor auxiliar,

e não apresenta melhoras. Então, ele tem o direito, mas nem sempre esse direito é

alcançado. Essas políticas públicas até garantem o direito de aprender, mas alguns

alunos... você sabe. Fiz cursos da SEE, aprendi e aplico em sala de aula. Procuro

melhorar a qualidade da aula, buscando alternativas de aprendizagem para os alunos. Mas não é uma contradição ter os indicadores externos apontando que os alunos aprenderam

pouco e a gente fazendo tanto na escola? A gente não consegue atingir o mínimo para o aluno

aprender? A gente trabalha tanto, um absurdo. Como vai preparar aulas? Sou a favor de

um terço da jornada, ou seja, ter 28 aulas de 50 minutos com alunos e bom salário e não

ter que trabalhar feito um louco e adoecer. Sai de uma escola e vai para outra. Tudo bem

que tem dois meses de férias, mas preferia trabalhar menos e melhor. Que tempo vai ter

para preparar aulas? Só essas políticas são pouco se não olham para o professor. Cuidar

do professor é tudo. Eu tenho 30 aulas e já acho muito cansativo, pois tenho pouco tempo

para me preparar. Imagina com 50, 60 aulas? É isso que querem de qualidade? PESQUISADOR. Agradeço o professor por esse momento de conversa.

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APÊNDICE3

Transcrição da entrevista realizada em 12/03/2014 com duração de 52 minutos e 44 segundos.

Professora Beatriz – Língua Portuguesa

Tempo aproximado de transcrição: 6 horas

PESQUISADOR. Sou Doutorando no Programa de Educação: Psicologia da Educação, da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Agradeço ao professor por conceder esta

entrevista. Informo que nossa conversa deve ter duração média de 50 minutos e será

realizada a partir de um roteiro prévio que desenvolvemos anteriormente em reuniões de

orientações gerais para este trabalho. Lembro ao professor que não utilizaremos ou

divulgaremos o nome do entrevistado ou de qualquer outra pessoa ou local.

PESQUISADOR. E em relação à escola, aos alunos, à aprendizagem.

Olha no ensino fundamental eles não têm muita noção disso, são poucos que pensam que

vão para o ensino médio, depois faculdade, que vão ter uma bagagem boa, que já têm visão

do ENEM. Hoje o ENEM é uma das principais portas de entrada para faculdade e poucos

têm essa visão. Na 8ª série tem aluno que se comporta como se estivesse nas séries

anteriores. Porque com os ciclos eles acham que, no final do ciclo, ele não vai ser

reprovado, muitas vezes ele aposta nisso e não estuda. Na 8ª série, eles são muitos

infantis, falta muita maturidade e no primeiro semestre é bem difícil, no segundo semestre

a gente já percebe alguma diferença. Em anos anteriores ,a gente tem conseguido mostrar

algumas coisas para alguns alunos, outros demoram um pouquinho mais, só no ensino

médio é que vão acordar para essa realidade.

PESQUISADOR. Fala um pouco mais dos alunos do 9º ano, 8ª série. Como é o

aproveitamento escolar desses alunos?

É outra coisa que a gente tem conversado. Muitos hoje ainda têm a mentalidade de que se

ele copiar a lição ele está participando da aula, não sabe que tem que estar trocando ideias,

buscando o que ele sabe, perguntando, apropriando-se mesmo do conhecimento e eles não

percebem isso, que estão perdendo.A escola, para muitos, acredito que funciona como

lazer, contam histórias de todos os tipos ai quando você quer ler um texto, tenta

discutir, quando pede atividade é um ou outro que tem interesse real em participar.

PESQUISADOR. Eles estão aprendendo?

Se estão aprendendo? Alguns sim. É, alguns sim. Estaria mentindo se falasse que não.

Uma boa parte ainda precisa amadurecer para essa questão, pela minha experiência

percebo que muitos, quando chegam no 1º, 2º anos do ensino médio, amadurecem

bastante. Acho que essa conversa faz parte do processo, eu trabalho também no ensino

médio e quando eles estão no 2º, 3º anos eles comentam, muitos comentam, sobre o

comportamento que tinham anteriormente. Acho isso bastante interessante, acho que essa

passagem 7ª, 8ª para o ensino médio é muito importante para o amadurecimento do aluno.

PESQUISADOR. Os alunos dos anos finais do fundamental estão aprendendo.

O que deveriam aprender ainda falta muito, bastante. Aprenderam mais, acredito

que a gente não consegue atingir todos como deveríamos atingir, chegam com certa

defasagem.

PESQUISADOR. E os que aprenderam.

Os que aprenderam são aqueles em que acredito que no decorrer da caminhada vem

com uma estrutura maior, com um acompanhamento maior. A gente percebe que

quando o pai acompanha, eles conseguem acompanhar melhor.Aqueles alunos que vêm

da 4ª, 5ª séries lendo, escrevendo, eles conseguem assimilar melhor o que a gente tenta

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passar nas outras séries e têm muitos alunos que conseguem ler bem, escrever bem,

conseguem ser críticos, posicionar-se.Outros mais tímidos não conseguem oralmente,

mas conseguem escrever e muitos não conseguem. Realmente não conseguem, não

conseguem copiar, não têm opinião própria, depende muito do outro para fazer o seu

trabalho.

PESQUISADOR. Como você trabalha com esses que não conseguem?

Eu faço vários trabalhos diferenciados: peço para que sentem em dupla, porque as salas são

cheias, então algumas vezes, como não consigo atingir a fala do próprio colega muitas

vezes dá resultado, mas a gente faz um trabalho, por exemplo, ele produz um texto e o

texto não ficou bom, ele vai reescrever aquele texto. Hoje é até mais fácil porque tem

aquele “Professor Auxiliar” que está sempre acompanhando, sempre auxiliando, esse

professor de apoio sempre auxiliando no aprendizado. Percebemos é que, aqueles que

têm vontade, conseguem. Só que uma grande parte não tem vontade realmente, não

quer fazer mesmo com o professor se dispondo a ajudar ,ele não tem interesse em

fazer, esse é mais difícil. Com uma boa parte a gente consegue atingir com esse trabalho

de texto, muitos alunos falam: não tenho ideia professora, então eu falo: vamos ver um

filme quem sabe você consegue fazer a partir do filme, muitas vezes ele consegue, é uma

forma. A gente usa formas diferentes para ver se esse aluno consegue escrever. O

objetivo até a 8ª série é ele escrever, ler e escrever bem, que ele sabia se posicionar, a

gente não se preocupa tanto com o conteúdo, mas que ele sabia ler e escrever bem e se

posicionar, ter opinião própria. (“Professor Auxiliar”– Professor que atua, até três aulas

semanais, junto com o Professor da classe. Fonte: Resolução SE nº 02/2012)

PESQUISADOR. Ainda sobre essa questão do aproveitamento dos alunos. Como fica a

aprovação/reprovação. Você tem alunos que reprovariam.

Quando a gente percebe que ele tem vontade de aprender é mais fácil. Sabemos que

ele vai para série seguinte, vai amadurecer e melhorar. Agora quando o aluno não

tem vontade é muito difícil, é muito difícil. Têm alguns alunos que não conseguem,

têm uma dificuldade tremenda, tremenda, mas ele tenta, de alguma forma ele tenta.

Esse aluno, eu acho que ele de alguma forma vai caminhar, mesmo não aprendendo

ele vai caminhar. Agora aquele que não tem vontade é muito difícil.

PESQUISADOR. Como você entende essa questão da reprovação escolar.

Da reprovação... é difícil né...(silêncio...) olha (ri muito...) da reprovação né... vou falar

do passado, só que o passado não volta mais. Eu penso que antes, quando tínhamos a

reprovação, o aluno se preocupava mais em estudar, em saber, em ir para série

seguinte e a própria família não queria que ele ficasse estacionado. A família

acompanhava mais e hoje não. Eles acham, que de uma forma ou de outra, só o fato de

ele vir para escola ele já está aprovado.Uma boa parte pensa dessa forma, só de vir

para escola já é aprovado, não faltou, então é aprovado. Preocupa-me muito a questão

do aprendizado. Eles dizem: professora eu faço tudo! Mas só copiam, o fato de ele copiar,

ele acha que já aprendeu. Isso não é aprendizado, ele só está copiando. Eu penso que

quando havia reprovação funcionava melhor, eu sei que a reprovação não é o

caminho, mas ainda não encontrei o caminho (ri muito... gesticula e fica incomodada)

não encontrei outro (continua rindo...) e têm muitos alunos que são aprovados só por

conta de estarem na escola. Muitos alunos escolhem matéria para estudar, não as que

acham mais fácil, mas a de que gostam, que têm maior afinidade.

PESQUISADOR. E essas questões como aparecem no seu dia a dia na escola com essa

mudança nos ciclos.

Eu acho que... (silêncio) que essa implantação... você fala desses novos ciclos, né? Que

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estão sendo montados? Eu acho que vai diminuir. Acho que os alunos vão ter mais

interesse na escola. Saberão que tem um trabalho diferente, que eles estão sendo vistos

de outra forma, a gente tem conversado bastante com eles. Acredito que essa

mudança de alguma forma é para melhor. Vai acabar esse negócio de passar sem

saber.

PESQUISADOR: E como é essa ideia de ciclo de aprendizagem?

Olha, eu entendo a ideia como muito boa porque o ciclo é.... prevê um monte de

movimentos do aluno. Se não aprendeu naquele momento, ele pode aprender em

outro,sinto a ideia muito boa, só que os alunos não entendem assim esse ciclo, eles

acham que, como eles não têm interesse, muitos não têm interesse em aprender,

apenas em passar de ano, eles não entendem esse ciclo, não têm essa ideia que o ciclo

tem.

PESQUISADOR. E os professores entendem? É discutido no dia a dia de vocês?

Os professores têm discutido os ciclos, talvez não como devesse, mas é discutido sim,

acredito que a todo momento a gente está refletindo sobre isso.

PESQUISADOR. Em quais momentos?

O senhor é professor e sabe como é na sala dos professores, comenta-se de tudo. Em ATPC

a gente discute e com a própria direção em alguns momentos.

PESQUISADOR. Como esse tema aparece nas reuniões, nos encontros com professores,

entre alunos, pais, funcionários. O que você ouve.

Os professores que são antigos como eu (ri muito...) sempre estão falando: Antes não era

assim, com a mudança de 1996, se eu não me engano, e penso que foi em 1996. Até 1996

era uma coisa, de 1996 para cá ficou diferente.Antes era pior, agora a gente aceitou

bastante a ideia dos ciclos. Mas vemos que em muitos momentos não funciona,

embora no papel seja muito bom, acho que é maravilhoso, mas no dia a dia a grande

maioria dos professores percebem que não funciona.Hoje mesmo ouvi uma professora

falar: um aluno de 7ª série que vem para escola sabe que se ele fizer ele vai ser aprovado e

se ele não fizer também vai ser aprovado, ele está ali quietinho, não está prestando atenção

em nada, não está atrapalhando as aulas, copiou a lição, vem sempre para escola, não tem

como reprovar um aluno desse. Ele não atinge o que queremos, mas ele de alguma forma

faz, mas ele não pensa que tem que aprender, que tem de dar uma devolutiva do que está

aprendendo.Acha de que qualquer forma vai, então é muito falho porque as famílias não

pensam no aprendizado real do aluno e assim ele vai para série seguinte.

PESQUISADOR. Sobre esses alunos com dificuldades como vocês se organizam, o que é

feito?

Na escola a gente tem projeto de leitura, tudo passa pela leitura, temos vários projetos de

leitura. A “Sala de Leitura” que funciona. Temos nossos projetos individuais, momentos

em que temos nossos projetos em conjunto. Esses projetos são expostos para os alunos e

para comunidade. Os projetos acontecem e são mostrados e a comunidade fica satisfeita,

mas ao mesmo tempo é um trabalho grande por parte dos professores, a família não

participa muito, mesmo a gente estando não tem participação da família. (“Programa Sala

de Leitura” – Escolas que contam com espaço físico adequado podem designar até dois

professores para atuarem na sala de leitura. Entre seus objetivos destaca-se o acesso dos

alunos aos espaços da sala de leitura e o apoio direto aos professores e alunos em

atividades de pesquisa e estudo. Resolução SE nº63/2013)

PESQUISADOR. Esses projetos de recuperação sempre foram organizados assim?

As coordenadoras sempre participam de reuniões e sempre trazem ideias. A gente sempre

pensa em implantar essas ideias. Por exemplo: no ano passado tínhamos o Professor

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Auxiliar (PA) e tínhamos salas vagas e o PA pegava o aluno da sala e levava para outro

local, outro ambiente, para trabalhar com reforço e percebemos que isso não deu certo e foi

conversado isso na Diretoria de Ensino e elas (coordenadoras) vieram orientando para que

os professores de apoio ficassem na sala e trabalhassem junto com o professor o mesmo

contexto porque no ano passado não deu certo essa medida com os alunos, não funcionou

muito. Acredito que o coordenador é a ponte entre os professores e a diretoria. O que

acontece aqui é levado para a Diretoria e às vezes os dados destas provas SARESP, Prova

Brasil, tudo passa pela Diretoria e vêm alguns projetos com base nesses dados. Atualmente

funciona dentro da sala de aula com o professor auxiliar. Ele trabalha juntamente com o

professor. Já houve turma só de recuperação. Em anos anteriores houve projetos de

recuperação, mas muitos alunos, a grande maioria, não vinha fora do horário, eles

faltavam. Dessa maneira, com o professor auxiliar, tem funcionado melhor, pelo

menos com os alunos que estão na sala, estão com interesse, mesmo dentro do horário

o professor está aliacompanhando, orientando, não tem como eles não virem.

PESQUISADOR. Como que os outros professores entendem esse projeto do professor

auxiliar?

Para os alunos e para nós foi perguntado se gostaríamos de trabalhar com o professor

auxiliar. Não era obrigatório, mas eu acredito que se há essa possibilidade todos os

professores aceitaram porque todas as salas têm alunos com defasagem, então houve

atribuição dessas aulas. A coordenação fez essa apresentação, houve uma conversa na

própria escola, no planejamento e passamos as diretrizes do que seria feito em sala de

aula.

PESQUISADOR. Como você avalia esse projeto? Tem apresentado resultado?

Por enquanto ainda não. Acho que caminha sim para resultados, não tem como não ter.

O professor dentro da sala acompanha os alunos em grupos menores mas com

maiores dificuldades e estou gostando. Pelo menos nesse início tenho gostado bastante,

tem me auxiliado bem. Lembrei-me agora de outros projetos de reforço que eram feitos

fora do horário de aula. Pediam autorização dos pais. Alguns pais pediam que o aluno não

fizesse reforço por conta do horário, do tempo, mesmo a gente explicando que era

importante, mesmo assim tinha aluno que não vinha, o pai até assinava,mas ele não vinha,

não comparecia, a maioria não comparecia. Os que vinham até conseguiam, o problema é

que muitos não vinham. Houve outros momentos em que o reforço era em horário de aulas.

Esse problema do reforço em sala de aula não deu muito certo porque o aluno saía da sala

de aula e como são poucas aulas de reforço ele ficava sem a aula, sem reforço. Este aluno

que saía da sala de aula depois não tinha interesse pela aula normal e não conseguíamos

fazer fora da sala de aula.

PESQUISADOR. E a aprendizagem.

Eu entendo que as alternativas são utópicas. No ensino fundamental menos alunos em

sala de aula melhorariam, mas, principalmente, eu acho que esse problema hoje é um

problema social.Não é tanto a escola, é a família, as normas mesmo, eles não têm esses

parâmetros pelos quais as famílias deveriam passar. Só isso já melhoraria bastante.

PESQUISADOR. Fala um pouco sobre essas questões sociais.

Como já falei no início da conversa esse acompanhamento da vida escolar, o pai não se

preocupa com a vida escolar do filho. Que o filho tenha horários para internet, para falar

com os filhos, para estudar, estudar mesmo. Tem que organizar o material porque hoje no

Estado eles recebem tudo e uma grande maioria não traz material para escola. Você vê hoje

mesmo na 8ª série eu disse: tal dia vocês vão precisar da apostila e o livro porque um

trabalho vai complementar o outro. Eles respondem: professora mas vai ter que trazer três

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livros. Daí eles não trazem, boa parte não traz. E essa questão de estar acompanhando o que

o filho está fazendo é essencial. Eles não percebem, até sabem de que precisam fazer, tudo

que precisa, mas não fazem. Sabem que o filho não pode trazer nada inadequado para

escola, sabem que o pai não vai olhar a bolsa deles, sabem que tem que vir para escola com

uma roupa inadequada, mas não vem. Então eu acho que esse problema é um problema

social, muitas vezes você chama um pai para falar do filho e o pai vem pior do que o filho.

Hoje é um problema social, essa questão do limite, do... (silêncio...) como eu diria...

(silêncio...) de estar dentro das normas mesmo, eles não têm esse parâmetro, é difícil

trabalhar.

PESQUISADOR. Quais outros problemas sociais.

Na sala a gente percebe muito a discriminação mesmo entre eles, uns vêm com uma roupa

melhor e outro vem diferente, então a gente está sempre dando atenção para isso, um mora

em um local em que as ruas são de barro e outro no asfalto e falam: Professora ele não

mora aqui, mora lá naquele lugar de “pé de barro”. Então essas diferenças têm que estar

tentando minimizar, superar esse bairrismo, um mora aqui outro ali, mas é um do lado do

outro, você tem que estar sempre conversando sobre essas diferenças.

PESQUISADOR. Por esse caminho da nossa conversa, fale um pouco sobre direito à

aprendizagem. Seus alunos têm o direito à aprendizagem garantido?

(silêncio... a professora pensa bastante para responder...) Se meus alunos têm o direito

à aprendizagem garantido? Acredito que temos feito o possível para que o aluno

aprenda mais. É o que eu falei, passa pelo querer, as oportunidades têm sido dadas

Tudo que precisa fazer se o aluno tem dificuldade de aprendizagem a gente procura

fazer. Acredito que a escola está fazendo o que é possível fazer mas aí passa pela

questão do querer do aluno e do acompanhamento dos pais.

PESQUISADOR. E as políticas públicas têm dado conta da garantia do direito à

aprendizagem?

Acredito que não totalmente. Quando a gente fala de escola próxima, de horário adequado.

No meu bairro mesmo não tem muita vaga no noturno, principalmente porque têm poucas

salas no noturno nas escolas. Acho que em alguns pontos tem falhas, tem muita coisa

positiva também.

PESQUISADOR. Quais falhas e o que tem de positivo?

Na questão de material. Há uma gama grande de material tanto de papelaria, televisores,

vídeos. Tem bastante material nas escolas, coisas que a gente pode usar. Tem sala de

leitura. Referente ao material a gente tem recebido bastante coisa, acho que melhorou

bastante nos últimos anos. O material para o aluno é positivo, mas o aluno ficou muito

viciado nisto, porque ele ganha um no começo do ano aí se acaba o lápis ele acha que

ele não pode comprar nenhum lápis. A escola, nesse sentido, ficou muito

assistencialista. Sobre o caderno têm muitos alunos que enquanto não chega o caderno do

kit ele usa folhas, escreve em qualquer lugar porque a mãe não vai comprar caderno se vai

ganhar o kit, depois que acaba também. É o tempo todo: Professora acabou não sei o quê! É

nesse sentido que a escola dá material, mas a família por outro lado deixou de fazer a parte

dela, nesse sentido de estar acompanhando o material, a mochila, porque eles perdem

mesmo material, caneta. Mesmo perdendo eles pensam que a escola é obrigada a dar tudo

para ele.

PESQUISADOR. E os projetos de recuperação, você considera um avanço?

Considero. Considero sim o projeto de reforço porque antes o professor era obrigado

a dar conta de todas as dificuldades dos alunos e agora ele conta com estes projetos de

recuperação que são, sem dúvida, um avanço. O próprio ATPC que é um horário de

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discussão dos professores sobre recuperação é um avanço para escola.

PESQUISADOR. Quantos alunos você tem?

Acho que uns trezentos alunos.

PESQUISADOR. Entre esses seus quase trezentos quais seriam aprovados?

(pensa bastante... fica em silêncio) Dos meus trezentos alunos acho que um terço seria

aprovado. É um terço, com domínio total um terço, uns 100 alunos.

PESQUISADOR. E como fica a garantia do direito à aprendizagem, à educação, destes

outros 200 alunos?

Eu acho... (demonstra inquietação, fica em silêncio e levanta os ombros...) Não que eu

não aprovaria. Aprovaria, mas com ressalvas. Com ressalvas, porque boa parte não

aprendeu 100% do que foi transmitido. Acho que mesmo antes quando havia

reprovação sempre houve uma parte que não atingia, menos que hoje, mas sempre

houve uma parte que não atingia. Só que eu acho que com o ciclo isso aumentou,

aumentou o número de alunos que passam ser estar totalmente aptos a seguirem.

Aprovo porque eu tenho que aprovar.

PESQUISADOR. Entre a seriação e os ciclos.

Eu entendo seriação melhor, eu entendo.

PESQUISADOR. Estamos em um impasse. Como vamos resolver a seguinte questão:

Educação é um direito, aprendizagem é um direito, só que mais da metade dos alunos não

aprenderam. Como você pensa esse impasse?

Mas eu não acho que eles estão tendo o direito. Acho que eles têm o direito à

educação! (fala de forma afirmativa e em tom de voz mais elevado) Eles é que não

estão sabendo aproveitar, eles têm esse direito! Eles têm garantido esse direito! Agora

se ele quer aproveitar isso que é o problema. Ele não tem consciência de que isso é

para o bem dele. Ele não tem essa consciência, mas como eu falei a gente oferece, a

escola oferece, mas eles não aproveitam. Não vou mentir. É igual hora que você

perguntou sobre aprovar, é um terço só. Todos têm esse direito porque a gente

procura é ensinar para todos, mas é claro que não vai atingir todos, só que isso passa

pelo querer, pela consciência, pela maturidade, então 100% do que a gente está

passando eu acredito que um terço, outros vão passar sem saber nada, com ressalvas,

não aproveitaram tudo que tinha que aproveitar. Mesmo esses, que nesse momento

estou dizendo que não aprovaria, ele está tendo esse direito garantido. Muitas vezes

ele não quer essa oportunidade, ele nem sabe para que precisa dessa oportunidade. Ai

é difícil né!

Eu acho que é isso que tentamos é... (muda radicalmente o tom de voz) Conversamos

com eles falamos das necessidades, do direito, do que é necessário, é... mostrar no dia

a dia. Mostramos casos de pessoas que estudaram e venceram, outras não estudaram

e também venceram, mas tiveram sorte ou ajuda. Tudo isso é conversado, sobre os

espertos que de alguma forma conseguiram vencer. A oportunidade é para todos,

agora uns aproveitam e alguns não, infelizmente. Isso é escola.

PESQUISADOR. Fale um pouco mais sobre escola.

A gente conversa bastante sobre escola, sala ambiente e em algumas coisas eu via, outras

não. Eu acho que o ideal seria uma sala para cada professor, o professor teria o seu material

na própria sala, as salas equipadas com TV, vídeo, acho que essa estrutura ajudaria

bastante. Os livros dos alunos nas salas de aula para não ter esse problema do aluno não

querer trazer seu material, livro, apostila, ou esquecer –se de trazer. Penso que se houvesse

uma sala para cada professor, cada área, para inglês, matemática e outras, eu entendo que

facilitaria bastante. Essa é a situação do professor.

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PESQUISADOR. E sobre os professores.

(silêncio... fica incomodada) penso que tudo isso, a questão salarial não tem como não

falar, o professor não é valorizado no Brasil. A questão salarial é primordial, não para que a

gente tenha vontade de ensinar, isso acho que já é nato nosso, mas para que a gente tenha

condição de trabalhar menos, de preparar melhor sua aula. Hoje mesmo estava falando para

um colega: veja só 25 anos de trabalho e quando dá meio dia tenho vontade de sair

correndo, não quero ficar mais um minuto. A gente trabalha muito, as crianças hoje são

muito agitadas, muito espertas, e quando chega a sexta aula... nossa... a gente está muito

cansada. Então penso que a gente trabalha demais e ganhamos pouco, trabalhamos fora do

horário, a gente tem algumas aulas livres para correção fora do horário, mas é pouco, tem

muita coisa para corrigir, principalmente de português, tem final de semana que eu trabalho

duas, três horas no sábado, no domingo. Acho que não é possível e tem professor que diz:

eu não consigo fazer na escola, então o problema não é só meu. E eu quero corrigir,

quero devolver para o aluno, quero que ele veja o que ele errou, que discuta comigo o

que tem que melhorar e se você não fizer esse trabalho fora de sala de aula então é

muito pouco, acho que deveríamos ter menos aulas, mais espaços para corrigir

provas, preparar aula, conversar mais com os professores sobre as turmas e, é claro,

que tudo isso passa pela questão salarial, se você pudesse trabalhar menos e ganhar

mais seria o ideal.

PESQUISADOR. Direito à aprendizagem então.

Nosso papel é importante porque somos orientadores, estudamos junto com os alunos, a

gente está sempre norteando, será que fica melhor desse jeito ou não. Acho que o nosso

papel é orientar, estar sempre orientando, buscando soluções para os problemas, nosso

papel é esse. Quanto ao direito a gente garante, quero saber é do dever deles.

PESQUISADOR. Estamos encerrando e gostaria de saber se a professora quer falar sobre

algo que não comentei.

Sim, sim. Algo que não comentamos foi sobre aula de computação, em nenhum momento

falamos sobre isso. Acho que muitas vezes não trabalhamos porque não é possível. Na sala

de computação são poucos computadores e muitas vezes estão quebrados, o sistema é

muito lento. A maioria dos professores acaba não trabalhando na sala de computadores e é

uma ferramenta assim muito importante de que dispomos, mas não dá maneira que

deveríamos. Quero deixar isso registrado é muito importante, muitas vezes quando marca a

sala de informática falam que não dá, tem problemas, está fechado. Penso que a gente tem

muitos problemas com relação à sala de informática e é uma ferramenta muito importante e

esses problemas precisam ser sanados. É complicado e tem uma cobrança muito grande.

Todos os questionários que vêm para os alunos perguntam se o professor leva na sala de

informática. A resposta dos alunos é: Não. Não perguntam por que a gente não leva. Esses

questionários do SARESP, por exemplo, têm perguntas voltadas para isso, para a sala de

informática. Ficamos preocupados quando falam que não trabalhamos. Só que não

trabalhamos porque muitas vezes não é possível, tem problemas mil.

PESQUISADOR. Agradeço a professora por esse momento de conversa.

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APÊNDICE4

Transcrição da entrevista realizada em 01/04/2014 com duração de 41 minutos e 17 segundos.

Professora Carla - Matemática

Tempo aproximado de transcrição: 04 horas.

PESQUISADOR. Sou Doutorando no Programa de Educação: Psicologia da Educação, da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Agradeço o professor por conceder esta

entrevista. Informo que nossa conversa deve ter duração média de 50 minutos e será

realizada a partir de um roteiro prévio que desenvolvemos anteriormente em reuniões de

orientações gerais para este trabalho. Lembro o professor que não utilizaremos ou

divulgaremos o nome do entrevistado ou de qualquer outra pessoa ou local.

PESQUISADOR. Como é o aproveitamento escolar dos alunos do 9º ano, 8ª série?

Estou resgatando de uma maneira assim muito árdua. Procuro sempre estar

dialogando, falando para eles a importância dos estudos. A importância dos

vestibulares. Os concursos e a importância em desenvolver os conteúdos propostos.

Converso muito e consegui resgatar alguns. Porém com alguns ainda não consegui

participação na sala de aula.

PESQUISADOR. Eles estão aprendendo?

Então... (silêncio...) É ...( a professora demonstra nervosismo). Primeiro passo você na

sala de aula vai desenvolver o conteúdo proposto. Sabemos hoje que existem vários

fatores que auxiliam. No mínimo eles estão avançando, agora aqueles poucos que

encontrei continuam no mesmo patamar do início do ano.

PESQUISADOR. Como são seus alunos que você considera aprovados?

Como seriam os alunos aprovados?(sorri e fica inquieta). Alunos aprovados. Na

verdade não sou eu que vou aprovar o aluno, ele que aprova ele mesmo! De acordo com

a nossa metodologia com o retorno que ele dá todos os dias. De acordo com as

avaliações, as atividades avaliativas da escola, eles vão tendo menções, essas menções

vão fazer com que ele se aprove ou não.

PESQUISADOR. E os alunos dos anos finais que têm dificuldades.

Já diagnostiquei uma parcela de alunos com dificuldades no aprendizado. Por questões

sociais, de família, o que eu posso fazer? Na sala de aula o que eu consegui até o

momento foi chamá-los para uma atividade diferenciada no qual eu pedi para que eles

realizassem de maneira bem tranquila, de uma forma bem carinhosa, que realmente

demonstrasse ali o que ele sabe. A partir daí dou a devolutiva para eles.

Vamos supor: em um conteúdo que é necessário usar técnicas, regras. Eu descrevo aquela

regra, vou imprimir e passar para esse meu aluno e vou falar: Olha, você está com

dificuldade nisso porque demonstrou isso. Na verdade, eu quero que você leia minhas

explicações que estão aqui manuscritas. Ai eu faço uma xérox e distribuo para esse aluno e

mando-o com essa atividade novamente para casa. Ele vai retornar na próxima aula com

aquilo resolvido. Mas sempre eu peço sinceridade, você mesmo é quem faz, não peça para

ninguém fazer por você, você que tem que aprender. Faço isso paralelamente às aulas e

extraclasse.

PESQUISADOR. Você falou em questões sociais.

É uma grande preocupação que eu tenho, porém não consigo fazer muita coisa sozinha.

Conversamos coletivamente em sala de aula. Orientamos a respeito da baixa autoestima, da

questão da violência, da droga, um pouco superficial, não muito aprofundado porque não é

da minha área, eu sou da área de exatas, de Matemática, procuro sempre estar orientando

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eles.

PESQUISADOR. Isso afeta na aprendizagem.

Contribui um pouco. Não é totalmente responsável mas no conjunto de fatores até que faz

com que alunos venham a pensar nas dificuldades durante o período de aulas.

PESQUISADOR. Tem aluno que você reprovaria?

No momento não. Já falei antes que eu não reprovo. São eles que se reprovam. São os

próprios alunos que se reprovam. Muitas oportunidades são oferecidas. Procuro

resgatar sempre o máximo, então quer dizer, de acordo com a progressão continuada

tenho que aprovar. Da forma que venho trabalhando esse aluno para ele ser reprovado

só se realmente for evadido e não fizer as atividades,se não tiver participação,

desempenho.

PESQUISADOR. E a mudança nos ciclos?

Essa questão é assim (fala baixo e gesticula muito) Quais são os alunos que eu aprovaria e

não aprovaria? Em primeiro lugar eu levo muito em conta o desenvolver da unidade escolar,

não só meu método de trabalho. Eu levo em conta o aluno não só na minha disciplina. Levo

em conta as outras disciplinas também.Se ele ficar comigo em questão de notas, menção

baixa passaria pelo conselho devido que as outras matérias aprovam. Vou fazer o que?

Ele está contemplado? Provavelmente eu não reprovaria nenhum aluno porque a

progressão continuada aprovaria.

PESQUISADOR. Aprovaria por conta da progressão continuada ou por que estão

aprendendo.

(silêncio, fica incomodada com a pergunta - Aprovaria por conta da progressão

continuada ou por que estão aprendendo? Sorri muito) Que pergunta difícil? (repete a

pergunta várias vezes) Não. Não. Sabe por que demorei na resposta? Em um primeiro

momento eu não pensei nisso. É muito provocativo pensar nisso, a questão do meu dia a

dia. Não vejo meio de reprovar com a progressão continuada. Sou uma pessoa muito

humana, eu não me vejo reprovando um aluno. Eu vou reprová-lo porque não

aprendeu minha matéria. Eu nunca fiz isso. Não vou mudar essa concepção de que ele

não aprendeu e ficou com nota baixa. Os alunos com nota baixa eu deixaria para o

conselho deliberar pelo sim ou não. Se o conselho reprova, eu também reprovo.

PESQUISADOR. Como essas questões aparecem no dia a dia da escola.

Percebo que são ideias que vieram para somar ao nosso trabalho para que o aluno avance no

aprendizado. Agora o que percebo é a organização do trabalho, os métodos de cada um. É

necessário criar um contrato didático para esses negócios de recuperação paralela, projetos,

aula de reforço, de apoio. Precisa de uma organização maior para o exercício dessas

atividades para ter um retorno melhor com meus alunos. O que eu percebo é que a maioria

gostaria de mais reprovação, que houvesse mais reprovação. O professor acredita que

reprovando o aluno ele vai se dedicar mais às aulas e vai prestar mais atenção. Estudar

mais, respeitar mais o professor, melhorar seu conhecimento. Os professores acreditam

que reprovando o aluno será melhor no nosso dia a dia, não vai ter essas preocupações

todas. Desafios de ter que ensinar um aluno a ler e escrever os símbolos matemáticos.

Se houver reprovação eu vou ter na sala só quem já sabe, assim posso ensinar mais.

Não vamos ter esses casos paralelos que não aprendem.

PESQUISADOR. E entre alunos, pais, funcionários, o que você ouve.

Eles perguntam: Não entendi como esse aluno passou? Como que meu filho passou sem

aprender nada? Tinha notas vermelhas e foi aprovado? O pai não entende a progressão

continuada. Já comentei anteriormente que ele não tem essa visão que precisava acompanhar

o aprendizado do seu filho na escola.

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PESQUISADOR. E os professores conhecem a progressão continuada?

O professor não conhece [da progressão continuada]. Esse professor precisa ser

observado, auxiliado, incentivado. Ai o trabalho dele vai desencadear de uma forma

que contemple a progressão continuada. Quando não há isso cada um trabalha da

forma que é possível, do jeito que dá.

PESQUISADOR. Como vocês organizam o processo de recuperação da aprendizagem?

Essa organização é feita através do diagnóstico da dificuldade do aluno. Chega o

“Professor Auxiliar” e passamos para ele as dificuldades dos alunos. O professor

auxiliar vai procurar trabalhar dentro daquelas dificuldades que o aluno apresentou

que o professor da sala diagnosticou.(“Professor Auxiliar” – Professor que atua em até três

aulas semanais junto com o Professor da classe. Fonte: Resolução SE nº 02/2012)

PESQUISADOR. Você tem mais de 200 alunos ,como isso se organiza?

O que precisamos é um tempo disponível para diálogo entre professores e alunos, gestão,

funcionários, pais, para disponibilizar atividades, troca de experiências, observar avanços,

dificuldades. O que não temos. Temos o que o planejamento de início de ano e meio de ano.

Agora eu pergunto: fazer dois planejamentos no início e meio de ano é suficiente para que eu

possa eliminar, conhecer, trocar ideias com meus pares? De um modo geral nunca coincidem

os horários, nem todos estão no mesmo dia. Então esse distanciamento entre os professores

dificulta muito. O que vejo: reuniões pedagógicas periodicamente, não toda semana, pelo

menos uma vez por mês, uma reunião coletiva.

PESQUISADOR. E a ATPC (aula de trabalho pedagógico coletivo)?

São quebradas. Não tenho contato com os pares da minha área.

PESQUISADOR. Retomando essa questão, como que você organiza a recuperação dos seus

alunos?

No momento temos professor auxiliar de Língua Portuguesa. De matemática não

tem.Mas nunca deixei de fazer recuperação com meus alunos. Com ele (Professor

Auxiliar) ou sem ele estou sempre fazendo minhas atividades paralelas que se tornam

atividades individuais. Eu mesmo crio as atividades com meus alunos. Estou sem

professor auxiliar, sem apoio, não tem professor.

PESQUISADOR. Esses projetos de recuperação sempre foram organizados assim?

Não, anteriormente era fora do horário de aula, um horário a parte. O aluno era indicado para

o reforço e viria antes do seu período ou depois do horário da aula dele. No contraturno com

o professor do reforço.

PESQUISADOR. E quando isso mudou?

Acredito que tem dois ou três anos. A recuperação paralela e contínua é da competência do

professor em sala. Deveria ser. O reforço era fora do horário como tinha comentado. Como

era feito? O professor da sala realizava o diagnóstico e apontava os alunos que estavam com

dificuldades de aprendizagem e encaminhava uma listagem, com no máximo 15, 20 alunos

para montar uma turma. Colocaria as dificuldades apresentadas, as habilidades e

competências que cada um teria. Outro professor contratado que ia lecionar essa aula de

reforço. O que às vezes dificultava era a frequência dos alunos, que já vêm com essa

concepção de que estudar não é legal, não é gostoso, tem que fazer lição, que aprender não é

bom.

PESQUISADOR. Neste momento você não tem o professor auxiliar?

Não. Não tenho, mas já tive.

PESQUISADOR. Por que não tem? Como era?

(silêncio, demora para responder) Essa proposta é legal. Ajudava meu aluno a sanar a

dificuldade. Se tem outro professor auxiliar na sala com o professor titular, temos mais

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tempo de dar conta do conteúdo com os outros alunos. Não tem professor de

Matemática para contratar, é o que dizem.

PESQUISADOR. Como os outros professores, de outras disciplinas, entendem esse projeto

do professor auxiliar?

Todos os professores gostariam de ter um professor de apoio, não somente de

Português e Matemática, que no caso são disciplinas que necessitam mais de um

professor de apoio. Todas as disciplinas são importantes. Mas Português e Matemática,

que é a junção de todas elas, que vão fazer diferença para que o aluno aprenda.

PESQUISADOR. E esse projeto do professor auxiliar tem apresentado resultados? Os alunos

estão aprendendo?

(silêncio, sorri muito) Como uma primeira experiência. (gesticula muito e fica

incomodada) Foi mínima, não houve um avanço do tipo foi “glorioso”, com 100% de

aprendizado, com todos os alunos na mesma aprendizagem, no mesmo nível dos demais

alunos. Houve um avanço mínimo.

PESQUISADOR. Por esse caminho da nossa conversa fale um pouco sobre direito à

aprendizagem. Seus alunos têm o direito à aprendizagem garantido?

Eles têm o direito à aprendizagem garantido. (sorri muito e fica incomodada) Agora se

eles visualizam que é de direito, que é garantido para eles, isso que eu quero saber

deles? Se eles querem esse direito? Essa também é uma dúvida minha. (silêncio, respira

fundo e parece nervosa) Então, conforme iniciamos a conversa sobre a realidade deles:

que preciso conhecer meus alunos. Se eu for retirar mais tempo para conhecer meus

alunos, para o meu trabalho, eu não vou fazer mais nada na vida! Não vou viver nada!

Dependo da equipe. São muitos alunos. Se fôssemos uma equipe ,conheceria melhor

meus alunos, assim eu poderia falar que estão aprendendo 100%.

PESQUISADOR. O que você ouve na escola sobre direito à aprendizagem.

Os colegas apresentam muita dificuldade de transmitir, de ensinar, de querer fazer

com que o aluno se interesse. O aluno não vê significado para aprender. Não vê o

conhecimento. Ele quer de forma diferenciada, mais alegre e com menos cobrança. Ele

não quer ter problemas, não quer desafios que chamem à atenção. Não quer, muitas

vezes, nada.

PESQUISADOR. O direito à aprendizagem tem sido garantido?

Garantimos sim [o direito à aprendizagem] de uma maneira mais formal. Tenho

certeza de que grande parte deles vem para escola e os professores procuram ensinar,

deixar o aluno preparado para o ENEM, para um concurso. É voltado para o teórico,

mas não posso garantir que isso garante. Fazemos nossa parte, nossa prática. Agora se

alguns alunos não fazem a parte deles...Olha o professor tem feito o máximo para

garantir esse direito do aluno, o que precisamos é de trocas, de reuniões. O professor

precisa ampliar seus conhecimentos. A gente depende de tudo isso, de uma estrutura

que possa disponibilizar para o professor e precisamos estudar. A estrutura física da

escola, de um modo geral, equipamentos, internet. Precisamos de um professor que

tenha conhecimento das tecnologias e onde precisa de um curso de informática. Sinto

falta da troca de experiência com meus pares.

PESQUISADOR. Agradeço a professora por esse momento de conversa.

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APÊNDICE 5

Transcrição da entrevista realizada em 01/04/2014 com duração de 49 minutos e 17 segundos.

Professora Diana - Português

Tempo aproximado de transcrição: 05h30 min.

PESQUISADOR. Sou Doutorando no Programa de Educação: Psicologia da Educação, da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Agradeço o professor por conceder esta

entrevista. Informo que nossa conversa deve ter duração média de 50 minutos e será

realizada a partir de um roteiro prévio que desenvolvemos anteriormente em reuniões de

orientações gerais para este trabalho. Lembro o professor que não utilizaremos ou

divulgaremos o nome do entrevistado ou de qualquer outra pessoa ou local.

PESQUISADOR. Fale um pouco sobre seus alunos.

Eu os vejo como muito carentes, não só de aprendizagem, mas de conteúdos. A gente se

envolve com esses alunos que são carentes. Carentes de carinho mesmo, amor de pai e

mãe. Aquele cuidado de pai e mãe. Percebo isso quando a gente conversa nas minhas aulas.

Sempre no começo converso muito sobre o que eles fizeram no dia anterior, como que foi,

como são os pais. A gente sempre conversa sobre o que aconteceu de interessante ou se não

aconteceu nada. Temos sempre uns minutos de conversa. Eles falam sobre o que vivem lá

fora: professora eu estava vindo para escola ai desceu uma menina do carro, saiu com o

cabelo todo bagunçado e solto e um homem gritando com ela. Falam muito da internet, um

dia tinha uma questão do livro que tinham que responder, um respondeu e colocou na

internet para os outros. Esse cuidado com as redes sociais, eles acessam as redes sociais,

moram todos aqui perto, um bairro próximo só que com fama de muito perigoso. Os alunos

que vêm de lá a gente já tem a cultura de receber assim meio restrito, só que na sala de aula

são todos iguais, não tem nada de separação.Alguns às vezes falam: ele mora lá no bairro

perigoso, mas aqui são todos iguais. Eles falam da vida deles. Eu também converso, falo

algumas coisas minhas e eles falam que agora, na época deles, é diferente e assim vai.

Eles são espertos e conversam bem.

PESQUISADOR. E seus alunos, fora da aula normal e nos intervalos, você conversa com

eles sobre outros assuntos.

Falam que vem aqui só para estudar, mas a gente sabe que não é só isso. Eles vêm para

encontrar os amigos, para namorar, para jogar futebol, brincar, jogar cards se a gente

deixar. Fazem tudo menos parar para estudar, fazer o que precisam fazer. Mas eles

também vêm para aprender, eles querem aprender. Na fala deles eles querem só

brincar, mas também querem estudar, saber, aprender.Penso que falam isso porque os

pais falam que precisa ir para escola, repetem a fala dos pais.

PESQUISADOR. E a escola.

Tempos atrás a gente não tinha nada aqui, ia mais do professor buscar material, não tinha

recursos, o máximo que tinha era TV na sala de aula só que era com grade, não era moderno,

era muito alto e não dava para ver nada. Eram salas abafadas, sem ventilação, esse era nosso

recurso. Desde o ano passado a nova diretora andou mudando umas coisas, reformando bem

o prédio. Agora temos sala de vídeo onde podemos levar os alunos, a sala de leitura que era

pequena. Não dava nem para sentar, agora é boa, bem melhor, está sendo arrumada. Vai ter a

sala de informática.

PESQUISADOR. Quantas aulas você ministra por semana?

34 aulas.

PESQUISADOR. Quantos alunos você tem?

Minhas salas estão cheias, uns 35, 40. Como alguns transferem devo ter 33, 37 por sala.

Em média tenho, deixa fazer a conta, quatro manhã, quatro tarde, uma noite: tenho

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uns 350 alunos (sorri muito e demonstra preocupação). E tenho que dar conta de todos

eles!

PESQUISADOR. Dos alunos do 9º ano, 8ª série, como é o aproveitamento escolar deles.

Tem turma que vai bem, aproveita bem, mas tem turma que tem muita dificuldade.

Tenho alunos que não sabem ler ou escrever e às vezes eles copiam, mas não lê, a letra é

linda, mas ele não lê sozinho. Não consegue produzir nada a não ser copiando, mas não

é a turma inteira. Então por conta dessas dificuldades não dou conta de trabalhar com

todos. Faço as atividades diferenciadas com esses alunos que contam com o “Professor

Auxiliar”, que ajuda na sala de aula. Em casos muito específicos preciso ver o que vou

fazer com ajuda desse professor auxiliar. No aproveitamento, no geral, eles vão bem,

tem uma turma da manhã que tem mais dificuldades. Tenho duas turmas, uma vai

melhor e a outra não, é um pouco mais abaixo.(“Professor Auxiliar”– Professor que atua,

em até três aulas semanais, junto com o Professor da classe. Fonte: Resolução SE nº

02/2012)

PESQUISADOR. Eles estão aprendendo?

(sorri muito... gesticula... demora bastante para responder) Estão aprendendo?

Acredito que estão aprendendo. Eles participam, eles falam que aprendem, alguns

aprendem. Ainda ontem eu estava dando aula de Inglês. E no que eu estava ensinando

inglês levantou um aluno e disse: nossa, professora, estou aprendendo muito mais que em

Português. Só que eu não sou a professora de Português dele e fiquei meio sem jeito. O que

eu estava ensinando era um verbete de dicionário da aula do sétimo ano mesmo. Faz parte da

apostila que a gente usa e a aluna falou que não sabia nada daquilo, que eu expliquei tudo, e

ela disse: como aprendi! Como exemplo até cito essa turma.

PESQUISADOR. Como são seus alunos que você considera aprovados?

Aprovados? Deixa-me pensar? (demora a responder...) Ora! Eles são aprovados, tem

que ser todos aprovados!

PESQUISADOR. E os alunos dos anos finais que têm dificuldades.

Não é que eles seriam não aprovados. Existem alunos que têm muitas dificuldades,

então a gente faz atividades diferentes com eles.Como agora temos o professor auxiliar

a gente senta e vê quais são realmente as dificuldades dos alunos, dos problemas deles,

das atividades diagnósticas. Fazemos de tudo para que ele não fique para trás, que

acompanhe o grupo. Não deixo o aluno trabalhar sozinho, sempre tem um que sabe melhor

os conteúdos, o que está sendo trabalhado no momento, nos trabalhos. Enfim, nunca

trabalham sozinhos, sempre estão em pares, em trios, em quartetos, até um pouco mais, mas

eles sempre trabalham.Um ajuda o outro, não sou só eu. Eles não são não aprovados, no

fim sempre sabem, sempre tem alguma coisa. Não ficam para trás, quem fica para trás

é aquele que não frequenta a aula.

PESQUISADOR. Tem aluno que você reprovaria?

(silêncio e demonstra inquietação com o tema reprovação) Não. Eu até reprovaria

alguns um tempinho, mas não entendo que é o caminho. Deixá-lo na mesma série para

ele aprender, eu não sei.

PESQUISADOR. Como você pensa essa questão da reprovação.

Eu não concordo muito que o aluno seja reprovado porque, às vezes, o conteúdo que eu

estou dando lá não é aquilo que vai definir o que ele vai ser amanhã. Não é esse

conteúdo que vai definir se ele vai prosseguir. Acho que sempre ele sabe uma coisa a

mais. O que fica para trás mesmo, que não vai passar é o que falta demais. Respondi? É

isso?

PESQUISADOR. E essas questões como aparecem no seu dia a dia na escola.

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Da reprovação?A gente sempre ouve: Não podemos reprovar! Faz-se de tudo para

aprovar o aluno. Quanto menos reprovação melhor. É o que a gente escuta, não só eu,

mas os outros professores também. Então a gente faz tudo para recuperar o aluno. O

que ele sabe realmente de um conteúdo naquele momento não vai fazer com que ele

mais tarde seja caso para retenção. Então a reprovação a gente não vê com bons olhos,

a gente tem que fazer o máximo para recuperar o aluno e que ele consiga caminhar

com a turma.

PESQUISADOR. Quando os professores falam: menos reprovação é melhor. Como é isso?

Não são os professores.Porque pelos professores, mesmo se a gente fosse realmente

fazer, como a gente talvez pudesse fazer, mas não pode, talvez tivesse ai uns 10 de

alguma sala. A gente sabe que não pode reprovar. A gente sabe que isso já vem de

cima, quando a gente vai para uma sala de conselho, passa uma nota e, às vezes, a gente

tem lá uma nota vermelha, a gente sempre tem que pensar no melhor, a gente não

deixa o aluno. Como é difícil falar essas coisas (a professora ficou muito incomodada e

silenciou.) PESQUISADOR. Ainda nesta questão da reprovação.

Talvez seja melhor para escola, para Secretaria da Educação, é assim que eu penso.

Mas para o aluno eu não sei, às vezes seria até bom ele ficar mais um tempo para ele,

sei lá, caminhar melhor com a turma. Eu tenho aluno com laudo. Ele não consegue

acompanhar a turma e nada que você faça. Escrever e ler não sabe de jeito nenhum, ele não

consegue, tem alguma deficiência intelectual. Ele não consegue. Esse não vai. Sobre esse

aluno a gente recebe aquelas conversas de que você tem que aprovar porque ele tem um

problema. Esse aluno vai para frente, só que esse aluno precisaria talvez de um

acompanhamento psicológico, quem sabe? E a gente como professora não está preparada

para lidar com esse tipo de situação, esse tipo de aluno. Daí tem que aprovar? Eu não

sei como a gente faz?E ai a gente, como eu falei, eles falam para gente aprovar, mas o

melhor é não aprovar, às vezes é até melhor para o aluno.

PESQUISADOR. Entre esses seus quase trezentos alunos haveria alguma reprovação?

(pensa muito, fica incomodada, diz em voz baixa: “Ai meu Deus do Céu!”...) A gente

não pode mudar esse assunto de reprovação (sorri bastante e demonstra nervosismo).

Se fosse mesmo fazer de acordo com que o aluno precisa nos testes que a gente faz

talvez ficassem alguns para trás, mas assim, uns cinco de cada turma talvez.

PESQUISADOR. Do total de trezentos?

Não! Cinco por turma. Daria uma turma de 40 alunos. Eu falo assim enquanto uma

disciplina só, de Língua Portuguesa. De Língua Inglesa não, seria uns 20, 25.

PESQUISADOR. Você falou de acordo com os testes? Quais?

Seriam as avaliações a que os alunos são submetidos. Não é teste, falei errado a palavra teste.

São as avaliações que a gente propõe aos alunos. Em uma avaliação escrita o aluno vai

mal, mas tem as avaliações que também fazemos no processo. Às vezes no processo, ele

não consegue ir para frente, não consegue evoluir, não consegue evoluir, nem sei se

posso falar aprender, mas ele não consegue, às vezes, fazer aquilo que estamos

oferecendo também, não ajuda também, fica patinando.

PESQUISADOR. Como esse tema surge nas reuniões, nos encontros com professores, entre

alunos, pais, funcionários. O que você ouve.

Da reprovação? Das avaliações? Olha, pela maioria dos professores, a gente sempre

tenta recuperar o aluno, sempre tentando ajudar, sempre tentando fazer alguma coisa,

mas também tem muita conversa: “Podia ficar. Não sabe tem que reprovar”. Mas

assim, com relação à escola reprovar, a escola lá sempre coloca que não podemos

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reprovar o aluno porque ele é submetido a uma avaliação escrita e ele não conseguiu e

nós não podemos reprovar. Então como a gente pode ajudar? É acho que é isso? Será

que eu respondi?

PESQUISADOR. E com essa mudança atual nos ciclos.

Os ciclos agora aumentaram, é isso né? Conversamos sobre isso, mas não conversamos

muito.É que o aluno poderia até ficar reprovado. Poderíamos avaliar os alunos em três

fases e ele poderia ficar retido por três séries, 5º ano. Não, 3º ano, 6ª ano e 9º ano, que

são as séries em que eu dou aula. Então assim, essa questão dos ciclos, não vejo como

algo ruim, no caso, no tocante a trabalhar com eles, não vejo como algo ruim é, na

verdade eu... (fica em silêncio...)

PESQUISADOR. Como era antes? Quando tinha reprovação?

Reprovava lá no 9º ano, mas se ele já chegou até lá, vai deixá-lo para trás por quê? Eu não

sei se seria interessante.

PESQUISADOR. E entre seus colegas professores.

Tem colegas que falam que têm que ficar para trás, quem sabe mais um ano para ele

aprender mais um pouco. Se tenho esse aluno com problema intelectual, porque vou

deixar para trás, mas se ele também acompanha. Mas os colegas dizem que não gostam

dessa questão dos ciclos. Por eles preferiam até que andássemos para trás, que

realmente tivesse reprovação, a seriação e não os ciclos. É essa conversa que a gente

escuta pelo que falam. E que têm outros, alguns, que são a favor dos ciclos.

PESQUISADOR. Ainda é presente essa ideia da seriação.

A prova, a avaliação escrita como um jeito de reter o aluno, ainda tem essa,

infelizmente, ideia de reprovar o aluno. Ter aumentado um ciclo para reprovar, não

sei o que penso. Estou ficando nervosa (sorri bastante e parece querer falar mais e não

consegue.)

PESQUISADOR. Como vocês organizam o processo de recuperação da aprendizagem?

Tem a ideia desse professor auxiliar que vem agora na sala de aula. Não assimilei

direito porque estava acostumada com aquele professor do reforço, ainda não estou

acostumada com isso, com essas novas denominações, então tenho um professor que

vem, acredito que é o Professor Auxiliar. É estou achando bom, está ajudando

bastante.

PESQUISADOR. Esses projetos de recuperação sempre foram organizados assim?

Esse projeto do Professor Auxiliar é recente. Teve uma época que não tinha esse professor

auxiliar, que ora fala apoio, ora fala reforço. Tem coisa de dois anos isso. O professor antes

era um professor que vinha e tirava os alunos da sala e nós fazíamos, no caso eu titular da

sala, fazia o levantamento, uma avaliação diagnóstica e verificávamos os alunos que tinham

maiores dificuldades para acompanhar a turma e os encaminhava para o reforço com outro

professor em horário diferente da aula. Vinham antes para a aula, entravam uma hora antes e

tinham as aulas de reforço com esse professor, mas ele já tinha em mãos a avaliação

diagnóstica e ia trabalhar com o aluno. Depois o aluno vinha para sala continuar.

Hoje é diferente. Pelo que vejo falamos desse professor auxiliar que está chegando.Ele vem,

fica na sala de aula e me ajuda com aqueles que na hora estão com dificuldades.Vamos

de carteira em carteira apoiando, trocando ideias com os alunos, fazendo atividades.

Conversamos, enquanto eles fazem as atividades e vamos avaliando o processo.Se eles

estão conseguindo, ou se não estão conseguindo aprender não sei. Acho que esse

professor veio em uma hora boa. Foi bem melhor que a outra situação que nós

tínhamos de tirar os alunos da sala de aula. Para o professor, às vezes, até seria bom.

Você tem lá uma sala indisciplinada e você precisa dar a sua aula e, as vezes, você precisa

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tirar esses daqui porque dão muito trabalho. Já ouvi muito professor falar assim, que era

melhor o outro projeto para tirar os indisciplinados da sala: então tira porque é melhor!.

Acho que não pode ser como punição senão você, sabe, eu me preocupo muito com os

alunos.

No ano passado eu tive uma professora que ficou com os alunos, eu não sei se era

professor auxiliar ou se era do reforço. Eu não imaginei que os alunos aprenderam. Só

sei que ela ajudou os alunos pouco. Era um professor da disciplina específica e os

alunos precisavam de alfabetização. O professor não sabia alfabetizar, não ajudou os

alunos. Eles continuaram com as mesmas deficiências que apresentavam para

desenvolver certas atividades. São os mesmos alunos que tenho hoje e eu não vi

melhora, não vi ajuda. Então vieram outras professoras, só que não deram essas aulas,

só faltavam, não sei o que aconteceu.

Essas que chegaram agora trabalham mais, inclusive falei que tem hora que vai ficar

com a gente e tem hora que vai tirar o aluno da sala, isso é um ou dois, no caso da

alfabetização. É um ou dois quando a gente trabalha essa apostila que é do Estado,

então eles também precisam participar das demais aulas. Então essa professora ajuda

mais esse aluno que tem dificuldade, esses alunos que também têm que participar.

PESQUISADOR. Por esse caminho da nossa conversa fale um pouco sobre direito à

aprendizagem. Seus alunos têm o direito à aprendizagem garantido?

Eu penso que sim, penso que eles têm o direito à aprendizagem garantido. É uma

tentativa, eu penso. (Fica em silêncio e incomodada com a questão.) PESQUISADOR. O que você ouve na escola sobre direito à aprendizagem.

Que todo aluno frequente à escola. Todos têm que vir para aula, já diz, garante a LDB.

Eles vêm, eles têm direito de aprender e o governo tem mais é que garantir (risos...

demonstra intranquilidade com o tema).

PESQUISADOR. E sobre esses alunos que você falou que reprovaria, não estamos

garantindo o direito deles?

Bom... tem aquela conversa que todos precisam ser aprovados ( ri muito e gesticula.).

Eles têm o direito mesmo assim, quando a gente chega a reprovar realmente os alunos

... a gente sempre procura um meio de aprovar ... e .... perdi o que ia falar.

PESQUISADOR. Sobre o direito de aprender.

É mesmo... todos são aprovados, quem fica para trás mesmo é quem não frequenta a

escola. Mas mesmo esses a gente controla a frequência para garantir o direito de

aprender. Passamos para o coordenador entrar em contato com a mãe para ter o

acesso garantido.

PESQUISADOR. A questão então é: ser aprovado é ter garantido o direito à aprendizagem?

Hããã... ai você me pegou (dá gargalhadas, se movimenta muito na cadeira, levanta um

pouco e senta novamente). Ser aprovado não significa que... não que ele... como vou

dizer... fiquei em uma encrenca danada (silêncio...). Ele usa o direito dele, ele está lá

para aprender. Se ele vai aprender vai depender um pouquinho dele, todos estão aqui

pensando no bem comum (muda o tom de voz) “tentando ajudar, promover

aprendizagens significativas”, “fazendo aulas diferenciadas”. Procuramos ajudar agora

se ele vai aprender, sabe, sei lá.

PESQUISADOR. Se aprender depende um pouquinho dele, de quem depende o restante?

O restante é a família, uma família inteira. Se ele fosse bem, tivesse uma família completa,

quem sabe ele aprenderia melhor. Não posso condená-lo se ele não aprendeu e deixá-lo

reprovado porque tem um pai e uma mãe que são separados. Agora com relação a ele

aprender ou não eu não sei explicar. Ele deve ter vontade, mas envolve todo mundo, a

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família, a escola, o professor, o direito a ter materiais, recursos que, às vezes, a escola

não tem. A nossa escola está tentando ter e melhorar as aulas, que sejam interessantes para

eles. Se não for interessante,ele talvez não aprenda. Precisamos de mais recursos para as

aulas serem mais interessantes, ajudar o aluno, sei lá.

PESQUISADOR. E sobre as políticas públicas de formação continuada de professores.

Nossa dessas políticas públicas! Parece que os professores não estão muito preocupados

com os alunos. E os alunos têm tudo a favor deles. Têm muitas coisas que são feitas

pensando no aluno, (muda o tom de voz) “ele tem a família assim, precisa de um

atendimento psicológico.” O professor não tem nada disso, bom ou não tem que ir para

sala de aula, dar aula dinâmica, é isso que a gente ouve. A gente não tem esse apoio.

Pensa-se só no aluno: e o professor? Promove-se tudo para o aluno, tudo vem para ele.

E nós? A gente quase não tem nada, a fala que a gente recebe é assim: nós não temos

um ensino de qualidade e só o professor é o culpado porque o ensino não tem

qualidade. Eu falo assim porque a gente vê na mídia, parece que somos o problema.A

Secretaria da Educação até lança os programas que investem no professor, não posso

também tirar esse mérito. Só que também barra o professor que tem dois cargos e não

pode receber a bolsa para fazer mestrado/doutorado, não tem direito. Tenho que dar

muitas aulas, ter dois cargos, se eu quiser também ter uma vida melhor, mais

confortável lá fora e aí não posso fazer mestrado/doutorado. Assim é nosso trabalho,

por exemplo: tenho dois cargos e não tenho direito a ticket refeição, não pelo ticket,

mas é um direito, a gente não tem muita coisa, mas é cobrado de tudo.

PESQUISADOR. Direito à aprendizagem então...

Direito à aprendizagem é tudo isso ai. Acho que sim. Um professor qualificado. Para

isso a Secretaria tem que dar apoio, embora até ofereçam os programas, mas nem

sempre o professor pode.

PESQUISADOR. Esses programas oferecidos, como chegam até vocês?

Olha, tem programa assim, como eu falei: tenho dois cargos e tenho que me desdobrar para

achar um momento em que eu possa fazer o curso. Por exemplo: tem curso online e, como

esse curso da EFAP (Escola de Formação e Aperfeiçoamento), participei de um curso desse.

No começo a gente recebe informação. Desdobrei-me, tinha problemas familiares, mas me

desdobrei, fiz de tudo para poder fazer, completar o curso, em um dado momento do curso

deveria ter mais um encontro, não recebi essa informação por parte da escola. Não porque

não me empenhei. Perguntei mas fiquei sem saber do encontro presencial do MGME –

“Melhor Gestão, Melhor Ensino”.

Quando percebi estava com uma bela falta publicada em Diário Oficial e nem sei no que deu.

Esses cursos já chegam prontos. Nem um questionário chega à escola perguntando se a gente

gostaria de determinado curso. Já chega pronto, geralmente o coordenador traz para a gente

um aviso, uma circular e diz: olha tem um curso que a Secretaria está oferecendo. Às vezes

vem como obrigação, como convocação que a gente não pode recusar. O professor de

Língua Portuguesa precisava fazer! Chegam prontos e não somos consultados sobre o

assunto. O tema já vem pronto, fechado. (“Melhor Gestão, Melhor Ensino” - Curso

semipresencial, com duração de 60 horas, oferecido a Diretores de Escola, Professores

Coordenadores Pedagógicos e Professores de Português e Matemática. Tem foco na gestão

escolar e no processo de ensino e aprendizagem de língua portuguesa e matemática. Fonte:

www.educacao.sp.gov.br)

PESQUISADOR. Implica o direito à aprendizagem.

Sim, sim. O governo até tenta [garantir o direito à aprendizagem]. Oferece e a gente faz na

medida do possível. Não é do jeito que a gente gostaria, mas ele também faz a parte dele e

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isso é uma forma de garantir o direito à aprendizagem.Se ele está tentando e quer

qualificar o professor, como eu coloco, parece que tudo envolve o professor, parece que

ele é o problema. O professor é o problema. Então o governo está tentando, mandando

cursos fechadinhos, tentando mudar a sala de aula com mais um professor. Acho que

está tentando também e a gente faz o possível também para atender a essa questão da

aprendizagem. É isso, só falta o aluno... (risos... descontração)

PESQUISADOR. Agradeço a professora por esse momento de conversa.

Neste momento desligo o gravador e a professora diz: queria falar tanta coisa! (Sorri

muito e fica impaciente).

PESQUISADOR. Podemos retomar a gravação?

Pode sim, vou falar mais. Desde que não prejudique ninguém.

Então, essa questão da reprovação: Nós vamos para sala, quando estamos lá fazendo

nosso conselho de classe/série de bimestre ou final e ouvimos, já ouvi várias vezes: mas

professora! nota vermelha! E, às vezes, o vermelho lá é uma nota três, quatro, do aluno

que não conseguiu acompanhar tudo. Não conseguiram aprender e demonstrar isso

durante as aulas. Falam novamente: mas professora nota vermelha! A senhora deu três

e o outro dois! Então subo minha nota para quatro. Só que continua: mas professora

não dá para dar um cinco? Então ponho cinco e acabo com o assunto. É isso.

Às vezes você precisa reprovar. Se a gente pudesse reprovar mesmo a gente reprovaria

mais da metade da sala (risos... gargalhadas) mais da metade da sala.

PESQUISADOR. A gente quem?

A gente, professores. Não podemos porque somos barrados porque vem a ordem de

cima. Através do coordenador, do diretor, do governo. O diretor não quer que a escola

tenha muita reprovação e é isso que a gente escuta. Então porque você vai reprovar?

Mesmo assim quando a gente mantém uma reprovação e o professor bate o pé dizendo:

eu tenho todas as atividades desse aluno e ele não vai! E mesmo assim a coordenação

quer que eu aprove? Nós não aprovamos!

Às vezes tem conceitos lá mostrando que o aluno ficou para trás. Tivemos alunos da

oitava que foram embora. Tadinhos, era a limitação deles, eles vão para onde? Só até

ali, não vão para frente, pelo menos naquilo que a gente diz de “escola, papel”. Não eles

são só aquilo ali, tudo que ele conseguiu é ali. Não vai para frente. Reprovamos alunos

de algumas turmas, foram poucos. Mas ficaram! Não foi por indisciplina, pelo menos

isso a gente não faz, reter por indisciplina. Antes fosse bagunceiro, mas aprendesse. E

chega a direção, a coordenação pedagógica e diz: mas ,professora, esse não fez nada,

tem certeza? É isso direito à aprendizagem? PESQUISADOR. Não é uma contradição?

É uma contradição. Não tem essa prova diagnóstica que vem da Secretaria. Não é o SARESP. É

a “prova diagnóstica”* dos 6º anos , 7ª anos. Não tem como você fingir uma realidade, não tem

como forjar nada ali.Fazemos justamente porque precisamos avaliar o aluno, para

prepararmos nosso planejamento, para tentar trabalhar mesmo, ajudar. É o que podemos

fazer para ele aprender, uma forma de fazer valer esse direito que ele tem de aprender é

reprovar.(*“Avaliação de Aprendizagem em Processo” - O exame é utilizado pelos educadores para

analisar o nível de aprendizado dos estudantes e, com isso, traçar estratégias e metas para garantir o

desenvolvimento dos alunos. Fonte: www.educacao.sp.gov.br)

Tem essas provas ai que não camuflam. O problema é essas políticas públicas que o governo

manda. Dizem que você tem que fazer assim e você acaba indo conforme vai. Quem perde com

isso? O aluno. (demonstra preocupação e angústia).

PESQUISADOR. Agradeço novamente a professora por esse momento de conversa.

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180

ANEXO 1

Resolução SE 53, de 2-10-2014

Dispõe sobre a reorganização do Ensino Fundamental em Regime de Progressão

Continuada e sobre os Mecanismos de Apoio Escolar aos alunos dos Ensinos Fundamental e

Médio das escolas estaduais.

O Secretário da Educação, à vista do que lhe representou a Coordenadoria de Gestão

da Educação Básica e considerando que:

- a melhoria da qualidade da educação básica somente se consolida mediante o

desenvolvimento de um ensino que assegure efetiva aprendizagem ao aluno;

- o atual contexto e os resultados das avaliações externas, alcançados pelas escolas da

rede pública estadual, indicam a necessidade de se dar continuidade ao redimensionamento

dos ciclos do Ensino Fundamental, com flexibilização dos tempos de aprendizagem e

diversificação dos mecanismos de apoio;

- é de pleno direito do aluno a apropriação do currículo escolar, de forma contínua e

exitosa, subsidiada por tempos de aprendizagem e mecanismos de apoio adequados,

Resolve:

Artigo 1º - O Ensino Fundamental, em Regime de Progressão Continuada,

reorganizado em 3 (três) Ciclos de Aprendizagem, com duração de 3 (três) anos cada,

oferecido nas escolas estaduais, terá seu funcionamento regido pelo que dispõe a presente

resolução.

Parágrafo único – A reorganização do ensino em três Ciclos de Aprendizagem, a que

se refere o caput deste artigo, visa a propiciar condições pedagógicas para que crianças e

adolescentes obtenham mais oportunidades de ser eficazmente atendidos em suas

necessidades, viabilizando-lhes tempos de aprendizagem adaptados a suas características

individuais.

Artigo 2º – Na reorganização do ensino, de que trata esta resolução, as equipes

escolares deverão proceder ao acompanhamento e avaliação contínuos do desempenho do

aluno, com intervenção pedagógica imediata, sempre que necessário, e, quando for o caso,

com encaminhamento do educando para estudos de reforço, recuperação e aprofundamento

curricular, dentro e/ou fora do seu horário regular de aulas.

Artigo 3º - A reorganização do ensino por Ciclos de Aprendizagem se propõe a:

I - assegurar condições de aprendizagem, segundo o critério de flexibilização do

tempo necessário ao aprendizado, no desenvolvimento gradativo e articulado dos diferentes

conteúdos que compõem o currículo do Ensino Fundamental;

II - evidenciar a importância que a flexibilização do tempo representa para a

organização do ensino e para a efetivação de aprendizagens contínuas e progressivas de todos

os alunos, de forma geral, e de cada um, em particular;

III - garantir ao aluno um ensino que, a partir de seus conhecimentos

prévios, implemente novos conteúdos curriculares, visando às aprendizagens previstas para

cada ano de cada Ciclo do Ensino Fundamental;

IV - subsidiar gestores e professores no agrupamento de alunos, na constituição de

classes e na organização dos processos de ensino, acompanhamento e avaliação contínua da

aprendizagem;

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V - ressaltar a importância de intervenções pedagógicas, com ações de reforço,

recuperação e aprofundamento curricular, como mecanismos indispensáveis à obtenção de

bons resultados de aprendizagem;

VI - fornecer a pais e/ou responsáveis parâmetros e orientações que viabilizem e

estimulem o monitoramento do processo de aprendizagem do aluno.

Artigo 4º - Os Ciclos de Aprendizagem, compreendidos como espaços temporais

interdependentes e articulados entre si, definem-se ao longo dos nove anos do Ensino

Fundamental, na seguinte conformidade:

I - Ciclo de Alfabetização, do 1º ao 3º ano;

II - Ciclo Intermediário, do 4º ao 6º ano;

III - Ciclo Final, do 7º ao 9º ano.

5º - O Ciclo de Alfabetização (1º ao 3º ano) tem como finalidade propiciar aos alunos

a alfabetização, o letramento as diversas formas de expressão e de iniciação ao aprendizado de

Matemática, Ciências, História e Geografia, de modo a capacitá-los, até o final deste Ciclo, a

fazer uso da leitura, da linguagem escrita e das diversas linguagens utilizadas nas diferentes

situações de vida, dentro e fora do ambiente escolar.

§ 1º – Ao final do 3º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o Ciclo de Alfabetização, de que trata o caput deste artigo, deverá permanecer

por mais um ano neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 2º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de

estudos no Ciclo de Alfabetização, deverá continuar sua aprendizagem no Ciclo

Intermediário.

Artigo 6º - O Ciclo Intermediário (4º ao 6º ano) tem como finalidade assegurar aos

alunos a continuidade e o aprofundamento das competências leitora e escritora, com ênfase na

organização e produção escrita, em consonância com a norma padrão, nas diferentes áreas de

conhecimento.

§ 1º – No 4º e no 5º anos do Ciclo Intermediário, o ensino será desenvolvido,

predominantemente, por professor regente de classe e, a partir do 6º ano, por professores

especialistas nas diferentes disciplinas do currículo.

§ 2º – Caberá à equipe gestora e aos professores que atuam no Ciclo Intermediário

promover condições pedagógicas que assegurem aprendizagens necessárias à transição do

ensino desenvolvido por professor regente de classe e do desenvolvido por docentes

especialistas.

§ 3º – Ao final do 6º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o Ciclo Intermediário, de que trata o caput deste artigo, deverá permanecer por

mais um ano neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 4º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de

estudos no Ciclo Intermediário, deverá continuar sua aprendizagem no Ciclo Final.

Artigo 7º - O Ciclo Final (do 7º ao 9º ano) tem como finalidade assegurar a

consolidação das aprendizagens previstas para este Ciclo, contemplando todo o currículo

escolar estabelecido para o Ensino Fundamental.

§ 1º - Os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, promovidos em regime de

progressão parcial, com pendência em até 3 (três) disciplinas, poderão iniciar a 1ª série do

Ensino Médio, desde que tenham condições de se apropriar, concomitantemente, dos

conteúdos das disciplinas pendentes do Ensino Fundamental e das disciplinas da 1ª série do

Ensino Médio.

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§ 2º - Ao final do 9º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o Ciclo Final, na forma a que se refere o caput deste artigo, deverá permanecer

por mais um ano neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 3º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de

estudos no Ciclo Final, deverá concluir o Ensino Fundamental.

Artigo 8º - O processo de consolidação de aprendizagens no Ensino Fundamental, em

Regime de Progressão Continuada, a que se refere o caput do artigo 7º desta resolução, deverá

assegurar o acompanhamento e avaliação contínuos e sistemáticos do ensino e do

desempenho do aluno, a fim de apontar a necessidade, ou não, de intervenções pedagógicas,

na forma de estudos de reforço e/ou recuperação, dentro ou fora do horário regular de aulas do

aluno.

Parágrafo único - O acompanhamento e a avaliação das aprendizagens de cada aluno

devem ser concomitantes ao processo de ensino e aprendizagem, e sistematizados

periodicamente por professores e gestores que integram os Conselhos de Classe/Ano/Série e

Ciclo, realizados, respectivamente, ao final do bimestre, do ano/série e do ciclo.

Artigo 9º - Caberá à equipe escolar identificar os alunos do Ensino Fundamental e do

Ensino Médio que necessitem de mecanismos de apoio no processo de ensino e

aprendizagem, para concluir seus estudos dentro do tempo regular previsto na legislação

pertinente.

Parágrafo único - Os mecanismos de apoio utilizados no processo de ensino e

aprendizagem, a que se refere o caput deste artigo, distinguem-se pelos momentos em que são

oferecidos e pelas metodologias utilizadas em seu desenvolvimento, caracterizando-se

basicamente como estudos de Recuperação Contínua e de Recuperação Intensiva, assim

definidas:

1 - Recuperação Contínua: ação de intervenção imediata, a ocorrer durante as aulas

regulares, nas classes de Ensino Fundamental ou Médio, e que é voltada para as dificuldades

específicas do aluno, abrangendo não só os conceitos, mas também as habilidades,

procedimentos e atitudes, sendo desenvolvida pelo próprio professor da classe ou da

disciplina, com apoio do Professor Auxiliar, quando necessário;

2 – Recuperação Intensiva: a oportunidade de estudos que possibilita ao aluno compor

classe cujo professor desenvolverá atividades de ensino específicas e diferenciadas, que lhe

permitirão trabalhar os conceitos básicos necessários a seu prosseguimento de estudos.

Artigo 10 - O Professor Auxiliar, a que se refere o item 1 do parágrafo único do artigo

9º desta resolução, terá como função precípua apoiar o professor da classe ou da disciplina no

desenvolvimento de atividades de ensino e de aprendizagem, em especial, as de recuperação

contínua, oferecidas a alunos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, visando à superação

de dificuldades e necessidades identificadas em seu percurso escolar.

§ 1º - A atuação do Professor Auxiliar ocorrerá, ouvido o professor da classe ou da

disciplina, simultaneamente às atividades desenvolvidas no horário regular de aulas, mediante

atendimento individualizado ou em grupo de alunos, podendo, em casos excepcionais e de

comprovada necessidade, vir a ocorrer em período diverso ao das aulas regulares.

§ 2º - O Professor Auxiliar poderá atuar somente em classes que totalizem, no mínimo,

25 (vinte e cinco) alunos, nos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental, e 30 (trinta)

alunos, no Ensino Médio.

§3º - Excepcionalmente, o Professor Auxiliar poderá atuar em uma das classes

regulares de, no mínimo, 20 (vinte) alunos, desde que dela conste matrícula do público-alvo

da Educação Especial, cuja necessidade tenha sido avaliada pela Equipe de Educação Especial

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da Diretoria de Ensino, excetuando-se dessa possibilidade as Salas de Recursos e as Classes

Regidas por Professor Especializado.

§ 4º - O Professor Auxiliar poderá atuar, em classe do 1º ao 5º ano, com até 10 (dez)

aulas semanais e pelo tempo que se faça necessário à superação das dificuldades dos alunos.

Artigo 11 - Cada classe do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e das 3 (três) séries do

Ensino Médio poderá contar com até 3 (três) Professores Auxiliares, respeitada a

compatibilidade e pertinência entre a natureza da disciplina e a área de formação acadêmica

desses professores, que atuarão, no decorrer do ano letivo, em apoio pedagógico aos alunos,

bem como ao docente da disciplina, na organização, desenvolvimento e avaliação das

atividades de ensino e de aprendizagem, em especial as de recuperação contínua.

§ 1º - As atividades de apoio fornecidas por Professor Auxiliar, para alunos do 6º ao 9º

ano do Ensino Fundamental e das séries do Ensino Médio que apresentem resultados

insatisfatórios de aprendizagem, poderão ser desenvolvidas em até 3 (três) aulas semanais por

classe e no horário regular de aulas, de acordo com o diagnóstico das necessidades,

expectativas e prioridades identificadas pelos professores das diferentes disciplinas da classe e

pela equipe gestora da unidade escolar.

§ 2º - As 3 (três) aulas semanais por classe poderão ser distribuídas entre até 3 (três)

disciplinas, com possibilidade de alternância periódica das demais disciplinas do currículo,

atendendo ao que indicar o diagnóstico de que trata o parágrafo anterior.

Artigo 12 - As aulas relativas às atividades de apoio escolar, fornecido pelo Professor

Auxiliar, serão atribuídas a docentes devidamente habilitados/qualificados e inscritos no

processo anual de atribuição de classes e aulas, observados os respectivos campos de atuação

e na seguinte ordem de prioridade das situações funcionais:

I - docente titular de cargo, que se encontre na situação de adido, sem descaracterizar

essa condição, ou a título de carga suplementar de trabalho;

II - docente ocupante de função-atividade, na composição ou complementação de sua

carga horária de trabalho;

III - candidatos à contratação temporária.

§ 1º - Para os docentes, a que se referem os incisos II e III deste artigo, somente

poderá haver atribuição, como Professor Auxiliar, na comprovada inexistência de classe ou de

aulas que lhes possam ser atribuídas, no processo regular de atribuição, em nível de unidade

escolar e também de Diretoria de Ensino.

§ 2º - O Professor Auxiliar, em qualquer dos níveis de ensino, exercerá suas

atribuições em até, no máximo, 30 (trinta) aulas semanais, fazendo jus, de acordo com a

legislação pertinente, à quantidade de horas de trabalho pedagógico correspondente à carga

horária atribuída.

Artigo 13 - A Recuperação Intensiva, caracterizada como mecanismo de recuperação

pedagógica centrada na promoção da aprendizagem do aluno, mediante atividades de ensino

diferenciadas e superação das defasagens de aprendizagem diagnosticadas, a que se refere o

item 2 do parágrafo único do artigo 9º desta resolução, será estruturada em dois tipos de

classes, cuja instalação deverá observar, obrigatoriamente, a seguinte ordem de prioridade:

I - classe de Recuperação Intensiva de Ciclo - RC, organizada com o limite mínimo de

10 (dez) e máximo de 20 (vinte) alunos, destinada exclusivamente a alunos egressos dos anos

finais de cada ciclo, cujo desempenho escolar lhes tenha determinado a permanência, por mais

um ano letivo, no 3º, 6º e 9º anos do Ensino Fundamental;

II - classe de Recuperação Contínua e Intensiva - RCI, constituída, em média, com 20

(vinte) alunos e destinada a alunos egressos dos anos finais de cada ciclo, cujo desempenho

escolar lhes tenha determinado a permanência, por mais um ano letivo, no 3º, 6º e 9º anos do

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Ensino Fundamental, sendo que, nessa classe, a média de 20 (vinte) alunos poderá ser

completada com alunos egressos do 2º, 5º e 8º anos do Ensino Fundamental que, mesmo

cursando ano subsequente, ainda necessitem de atendimentos de reforço e estudos de

recuperação.

§ 1º - As classes de Recuperação Contínua e Intensiva - RCI, de que trata o inciso II

deste artigo, somente poderão ser instaladas após total atendimento ao limite máximo da

organização de classes de Recuperação Intensiva de Ciclo – RC.

§ 2º - A organização das classes de recuperação intensiva, RC e RCI, de que tratam os

incisos deste artigo, deverá resultar de indicação feita pelos professores, no último Conselho

de Classe/Ano, realizado ao final do ano letivo anterior, ocasião em que também poderão ser

indicados os docentes da escola com possibilidade de assumir as referidas classes no ano

letivo subsequente.

Artigo 14 - A equipe gestora, em reunião do Conselho de Classe/Ano, ouvidos os

professores da classe ou das disciplinas, ao deliberar sobre a aplicação dos mecanismos de

apoio escolar, deverá, na formação de classes de recuperação intensiva, de que trata o disposto

no artigo 13 desta resolução, identificar, preliminarmente, diante do total de classes

regularmente constituídas, o número de salas ociosas existentes, por turno/período, na unidade

escolar, que poderão vir a atender a necessidade de formação e a ordem de prioridade

estabelecida no referido artigo.

§ 1º – A formação de classes de recuperação intensiva, observada a identificação

preliminar a que se refere o caput deste artigo, deverá ser submetida à autorização do

Dirigente Regional de Ensino, mediante parecer do Supervisor de Ensino da unidade escolar.

§ 2º - Excepcionalmente, classes de recuperação intensiva, com número de alunos

inferior ao previsto nos incisos I e II do artigo 13 desta resolução, poderão ter sua constituição

autorizada pelo Dirigente Regional de Ensino, mediante solicitação devidamente justificada

do Diretor de Escola, acompanhada de parecer conclusivo do Supervisor de Ensino da

unidade escolar.

Artigo 15 - A atribuição de classes e de aulas de recuperação intensiva observará as

normas e critérios relativos ao processo anual de atribuição de classes e aulas.

Parágrafo único - As classes e as aulas de recuperação intensiva poderão constituir e

ampliar a jornada de trabalho do docente titular de cargo, e também, se for o caso, compor sua

carga suplementar.

Artigo 16 – Caberá às Coordenadorias de Gestão da Educação Básica e de Gestão de

Recursos Humanos, na conformidade das respectivas áreas de competência, baixar instruções

que se façam necessárias ao cumprimento do que dispõe a presente resolução.

Artigo 17 - Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando

revogadas as disposições em contrário, em especial as Resoluções SE nº 2, de 12.1.2012, nº

44, de 12.4.2012, nº 43, de 18.6.2013, nº 61, de 30.8.2013, e nº 74, de 8.11.2013.

Notas:

Revoga Res. SE nº 2/12;

Revoga Res. SE nº 44/12;

Revoga Res. SE nº 43/13;

Revoga Res. SE, nº 61/13;

Revoga Res. SE nº 74/13.

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ANEXO 2

Resolução SE Nº 73, de 30-12-2014

Dispõe sobre a reorganização do Ensino Fundamental em Regime de

Progressão Continuada e sobre os Mecanismos de Apoio Escolar aos alunos dos Ensinos

Fundamental e Médio das escolas estaduais

O Secretário da Educação, à vista do que lhe representaram as Coordenadorias de Gestão da

Educação Básica - CGEB e de Gestão de Recursos Humanos - CGRH e considerando que:

- a melhoria da qualidade da educação básica somente se consolida com o desenvolvimento

de um ensino que assegure efetiva aprendizagem ao aluno;

- os resultados das avaliações externas, alcançados pelas escolas da rede pública estadual,

confirmam as possibilidades de aumento da eficácia e eficiência do redimensionamento

dos ciclos do Ensino Fundamental, com flexibilização dos tempos de aprendizagem e

diversificação dos mecanismos de apoio;

- ao aluno devam ser garantidos meios e oportunidades diversas de se apropriar do currículo

escolar, de forma contínua e exitosa, subsidiada por tempos de aprendizagem e

mecanismos de apoio adequados,

Resolve:

Artigo 1º - O Ensino Fundamental, em Regime de Progressão Continuada, reorganizado em 3

(três) Ciclos de Aprendizagem, com duração de 3 (três) anos cada, oferecido nas escolas

estaduais, tem seu funcionamento regido nos termos da presente resolução.

Parágrafo único – A reorganização do ensino em três Ciclos de Aprendizagem, a que se refere

o caput deste artigo, assegura condições pedagógicas que disponibilizam, a crianças e

adolescentes, mais oportunidades e meios para serem eficazmente atendidos em suas

necessidades, viabilizando-lhes tempos de aprendizagem adaptados a suas características

individuais.

Artigo 2º – Na reorganização do ensino, de que trata esta resolução, as equipes escolares

procederão ao acompanhamento e avaliação contínuos do desempenho do aluno, com

intervenção pedagógica imediata, sempre que necessário, e, quando for o caso, com

encaminhamento do educando para estudos de reforço, recuperação e aprofundamento

curricular, dentro e/ou fora do seu horário regular de aulas.

Artigo 3º - A reorganização do ensino por Ciclos de Aprendizagem oferece à escola efetivas

possibilidades de:

I - assegurar condições de aprendizagem, segundo o critério de flexibilização do tempo

necessário ao aprendizado, no desenvolvimento gradativo e articulado dos diferentes

conteúdos que compõem o currículo do Ensino Fundamental;

II - evidenciar a importância que a flexibilização do tempo representa para a organização do

ensino e para a efetivação de aprendizagens contínuas e progressivas de todos os alunos, de

forma geral, e de cada um, em particular;

III - garantir ao aluno um ensino que, a partir de seus conhecimentos prévios, implemente

novos conteúdos curriculares, visando às aprendizagens previstas para cada ano de cada Ciclo

do Ensino Fundamental;

IV - subsidiar gestores e professores no agrupamento de alunos, na constituição de classes e

na organização dos processos de ensino, acompanhamento e avaliação contínua da

aprendizagem;

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V - ressaltar a importância de intervenções pedagógicas, com ações de reforço, recuperação e

aprofundamento curricular, como mecanismos indispensáveis à obtenção de bons resultados

de aprendizagem;

VI - fornecer a pais e/ou responsáveis parâmetros e orientações que viabilizem e estimulem o

monitoramento do processo de aprendizagem do aluno.

Artigo 4º - Os Ciclos de Aprendizagem, compreendidos como espaços temporais

interdependentes e articulados entre si, definem-se ao longo dos nove anos do Ensino

Fundamental, na seguinte conformidade:

I - Ciclo de Alfabetização, do 1º ao 3º ano;

II - Ciclo Intermediário, do 4º ao 6º ano;

III - Ciclo Final, do 7º ao 9º ano.

Artigo 5º - O Ciclo de Alfabetização (1º ao 3º ano) tem como finalidade propiciar aos alunos a

alfabetização, o letramento das diversas formas de expressão e de iniciação ao aprendizado de

Matemática, Ciências, História e Geografia, de modo a capacitá-los até o final deste Ciclo, a

fazer uso da leitura, da linguagem escrita e das diversas linguagens utilizadas nas diferentes

situações de vida, dentro e fora do ambiente escolar.

§ 1º – Ao final do 3º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o Ciclo de Alfabetização, de que trata o caput deste artigo, deverá permanecer

por mais um ano neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 2º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de estudos no

Ciclo de Alfabetização, deverá continuar sua aprendizagem no Ciclo Intermediário.

Artigo 6º - O Ciclo Intermediário (4º ao 6º ano) tem como finalidade assegurar aos alunos a

continuidade e o aprofundamento das competências leitora e escritora, com ênfase na

organização e produção escrita, em consonância com a norma padrão, nas diferentes áreas de

conhecimento.

§ 1º – No 4º e no 5º anos do Ciclo Intermediário, o ensino será desenvolvido,

predominantemente, por professor regente de classe e, a partir do 6º ano, por professores

especialistas nas diferentes disciplinas do currículo.

§ 2º – Caberá à equipe gestora e aos professores que atuam no Ciclo Intermediário promover

condições pedagógicas que assegurem aprendizagens necessárias à transição do ensino

desenvolvido por professor regente de classe e do desenvolvido por docentes especialistas em

disciplinas do currículo.

§ 3º – Ao final do 6º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o Ciclo Intermediário, de que trata o caput deste artigo, deverá permanecer por

mais um ano neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 4º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de estudos no

Ciclo Intermediário, deverá continuar sua aprendizagem no Ciclo Final.

Artigo 7º - O Ciclo Final (do 7º ao 9º ano) tem como finalidade assegurar a consolidação das

aprendizagens previstas para este Ciclo, contemplando todo o currículo escolar estabelecido

para o Ensino Fundamental.

§ 1º - Os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, promovidos em regime de progressão

parcial, com pendência em até 3 (três) disciplinas, poderão iniciar a 1ª série do Ensino Médio,

desde que tenham condições de se apropriar, concomitantemente, dos conteúdos das

disciplinas pendentes do Ensino Fundamental e das disciplinas da 1ª série do Ensino Médio,

observadas as condições de viabilidade das alternativas existentes na unidade escolar.

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§ 2º - Ao final do 9º ano, o aluno que não se apropriar das competências e habilidades

previstas para o Ciclo Final, na forma a que se refere o caput deste artigo, deverá permanecer

por mais um ano neste Ciclo, em uma classe de recuperação intensiva.

§ 3º - O aluno a que se refere o parágrafo anterior, ao término de quatro anos de estudos no

Ciclo Final, deverá concluir o Ensino Fundamental.

Artigo 8º - O processo de consolidação de aprendizagens no Ensino Fundamental, em Regime

de Progressão Continuada, a que se refere o caput do artigo 7º desta resolução, deverá

assegurar o acompanhamento e avaliação contínuos e sistemáticos do ensino e do

desempenho do aluno, a fim de apontar a necessidade, ou não, de intervenções pedagógicas,

na forma de estudos de reforço e/ou recuperação, dentro ou fora do horário regular de aulas do

aluno.

Parágrafo único - O acompanhamento e a avaliação das aprendizagens de cada aluno devem

ser concomitantes ao processo de ensino e aprendizagem, e sistematizados periodicamente por

professores e gestores que integram os Conselhos de Classe/Ano/Série e Ciclo, realizados,

respectivamente, ao final do bimestre, do ano/série e do ciclo.

Artigo 9º - Cabe à equipe escolar identificar os alunos do Ensino Fundamental e do Ensino

Médio que necessitem de mecanismos de apoio no processo de ensino e aprendizagem, para

concluir seus estudos dentro do tempo regular legalmente previsto.

Parágrafo único - Os mecanismos de apoio utilizados no processo de ensino e aprendizagem,

a que se refere o caput deste artigo, distinguem-se pelos momentos em que são oferecidos e

pelas metodologias utilizadas em seu desenvolvimento, caracterizando-se basicamente como

estudos de Recuperação Contínua e de Recuperação Intensiva, assim definidos:

1 - Recuperação Contínua: ação de intervenção imediata, a ocorrer durante as aulas regulares

do Ensino Fundamental e Médio, voltada para as dificuldades específicas do aluno,

abrangendo não só os conceitos, mas também as habilidades, procedimentos e atitudes, sendo

desenvolvida pelo próprio professor da classe ou da disciplina, conforme o caso, com apoio

complementar, quando necessário, na seguinte conformidade:

a) nas classes de 1º e 2º anos do Ensino Fundamental, com apoio e assistência direta dos

alunos pesquisadores do Programa Bolsa Alfabetização;

b) nas classes de 3º, 4º, 5º e 6º anos do Ensino Fundamental, com apoio complementar do

Professor Auxiliar - PA; e

c) nas classes de 7º, 8º e 9º anos do Ensino Fundamental e de séries do Ensino Médio com

apoio complementar dos docentes do Projeto Apoio à Aprendizagem - PAA, conforme

dispuser a legislação pertinente;

2 – Recuperação Intensiva: a oportunidade de estudos que possibilita ao aluno integrar classe

cujo professor desenvolverá atividades de ensino específicas e diferenciadas, que permitirão

ao aluno trabalhar os conceitos básicos necessários a seu prosseguimento nos estudos.

Artigo 10 - O Professor Auxiliar, a que se refere o item 1 do parágrafo único do artigo 9º

desta resolução, tem como função precípua apoiar o professor da classe no desenvolvimento

de atividades de ensino e de aprendizagem, em especial, as de recuperação contínua,

oferecidas a alunos do 3º, 4º, 5º e 6º ano do Ensino Fundamental, visando à superação de

dificuldades e necessidades identificadas em seu percurso escolar, nas disciplinas de Língua

Portuguesa e Matemática.

§ 1º - A atuação do docente como Professor Auxiliar darse-á, ouvido o professor da classe

e/ou da disciplina de Língua Portuguesa ou de Matemática, simultaneamente às atividades

desenvolvidas no horário regular das aulas correspondentes, mediante atendimento por grupo

de, no mínimo, 5 (cinco) alunos.

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§ 2º - O Professor Auxiliar poderá atuar somente em classes que totalizem, no mínimo, 25

(vinte e cinco) alunos.

§ 3º - Excepcionalmente, o Professor Auxiliar poderá atuar em classe regular de, no mínimo,

20 (vinte) alunos, desde que nela se inclua matrícula de aluno do público-alvo da Educação

Especial, cuja necessidade tenha sido avaliada pela Equipe de Educação Especial da Diretoria

de Ensino, excetuando-se dessa possibilidade as Classes Regidas por Professor Especializado

e as Salas de Recursos.

Artigo 11 – Cada classe de 3º, 4º, 5º ou 6º ano do Ensino Fundamental, contará com o

Professor Auxiliar em 3 (três) aulas semanais para cada uma das disciplinas (Língua

Portuguesa e Matemática), podendo, conforme a necessidade, totalizar 6 (seis) aulas semanais

(três e três), atendendo ao que indicar o diagnóstico efetuado pelo docente da classe ou da

disciplina.

Artigo 12 - As aulas relativas às atividades do Professor Auxiliar serão atribuídas a docentes

devidamente habilitados/qualificados em Língua Portuguesa ou em Matemática e inscritos no

processo anual de atribuição de classes e aulas, observado o campo de atuação e na seguinte

ordem de prioridade das situações funcionais:

I - docente titular de cargo, que se encontre na situação de adido, sem descaracterizar essa

condição, ou a título de carga suplementar de trabalho;

II - docente ocupante de função-atividade, na composição ou complementação de sua carga

horária de trabalho.

§ 1º - Para os docentes, a que se referem os incisos deste artigo, somente poderá haver

atribuição, como Professor Auxiliar, na comprovada inexistência de aulas que lhes possam ser

atribuídas, no processo regular de atribuição, em nível de unidade escolar e também de

Diretoria de Ensino.

§ 2º - O docente exercerá as atribuições de Professor Auxiliar em classes do 3º, 4º, 5º ou 6º

ano do Ensino Fundamental, observado o limite máximo de 12 (doze) aulas semanais, pelo

tempo que se fizer necessário à superação das dificuldades dos alunos, fazendo jus, de acordo

com a legislação pertinente, à quantidade de horas de trabalho pedagógico correspondente à

carga horária atribuída.

§ 3° - O Professor Auxiliar não poderá ser substituído e perderá a carga horária atribuída,

quando iniciar qualquer tipo de licença ou afastamento.

§ 4° - Excepcionalmente, nos casos de licença-saúde, licença-acidente de trabalho, licença à

gestante e licença-adoção, o/a docente permanecerá com a carga horária relativa ao Professor

Auxiliar, apenas para fins de pagamento e enquanto perdurar a licença, sendo as aulas

correspondentes liberadas, de imediato, para atribuição a outro docente, que venha

efetivamente a ministrá-las.

Artigo 13 - A Recuperação Intensiva, caracterizada como mecanismo de recuperação

pedagógica centrada na promoção da aprendizagem do aluno, mediante atividades de ensino

diferenciadas e superação das defasagens de aprendizagem diagnosticadas, a que se refere o

item 2 do parágrafo único do artigo 9º desta resolução, será estruturada em dois tipos de

classes, cuja instalação deverá observar, obrigatoriamente, a seguinte ordem de prioridade:

I - classe de Recuperação Intensiva de Ciclo - RC, organizada com o limite mínimo de 10

(dez) e máximo de 20 (vinte) alunos, destinada exclusivamente a alunos egressos dos anos

finais de cada ciclo, cujo desempenho escolar lhes tenha determinado a permanência, por mais

um ano letivo, no 3º, 6º ou 9º anos do Ensino Fundamental;

II - classe de Recuperação Contínua e Intensiva - RCI, constituída, em média, com 20 (vinte)

alunos e destinada a alunos egressos dos anos finais de cada ciclo, cujo desempenho escolar

lhes tenha determinado a permanência, por mais um ano letivo, no 3º, 6º ou 9º anos do Ensino

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189

Fundamental, sendo que, nessa classe, a média de 20 (vinte) alunos poderá ser completada

com alunos egressos do 2º, 5º e 8º anos do Ensino Fundamental que, mesmo cursando ano

subsequente, ainda necessitem de atendimentos de reforço e estudos de recuperação.

§ 1º - As classes de Recuperação Contínua e Intensiva - RCI, de que trata o inciso II deste

artigo, somente poderão ser instaladas, nas seguintes situações:

1 - após total atendimento ao limite máximo da organização de classes de Recuperação

Intensiva de Ciclo – RC;

2 – de comprovada inexistência de, no mínimo, de 10(dez) alunos para instalação de uma

classe de Recuperação Intensiva de Ciclo- RC.

§ 2º - Quando o total de concluintes do ciclo, que deverá permanecer por mais um ano letivo,

for igual ou inferior a 3(três) alunos, ou no caso de a unidade escolar não mais dispor de salas

ociosas para instalação de classe de recuperação intensiva, os alunos deverão ser

encaminhados à composição de classes regulares correspondentes ao ano final dos respectivos

ciclos.

§ 3º - A organização das classes de recuperação intensiva, RC e RCI, de que tratam os incisos

deste artigo, deverá resultar de indicação feita pelos professores, no último Conselho de

Classe/Ano, realizado ao final do ano letivo anterior, ocasião em que também poderão ser

indicados os docentes da escola com possibilidade de assumir as referidas classes no ano

letivo subsequente.

Artigo 14 - A equipe gestora, em reunião do Conselho de Classe/Ano, ouvidos os professores

da classe ou das disciplinas, ao deliberar sobre a recuperação intensiva, deverá, na formação

das classes, de que trata o disposto no artigo 13 desta resolução, identificar, preliminarmente,

diante do total de classes regularmente constituídas, o número de salas ociosas existentes, por

turno/período, na unidade escolar, que poderão vir a atender a necessidade de formação e a

ordem de prioridade estabelecida no referido artigo.

§ 1º – A formação de classes de recuperação intensiva, observada a identificação preliminar a

que se refere o caput deste artigo, deverá ser submetida à autorização do Dirigente Regional

de Ensino, mediante parecer do Supervisor de Ensino da unidade escolar.

§ 2º - Excepcionalmente, classes de recuperação intensiva, com número de alunos inferior ao

previsto nos incisos do artigo 13 desta resolução, poderão ter sua constituição autorizada pelo

Dirigente Regional de Ensino, mediante solicitação devidamente justificada do Diretor de

Escola, acompanhada de parecer conclusivo do Supervisor de Ensino da unidade escolar.

Artigo 15 - A atribuição de classes e de aulas de recuperação intensiva observará as normas e

critérios relativos ao processo anual de atribuição de classes e aulas.

Parágrafo único - As classes e as aulas de recuperação intensiva poderão constituir e ampliar a

jornada de trabalho do docente titular de cargo, e também, se for o caso, compor sua carga

suplementar.

Artigo 16 – Caberá às Coordenadorias de Gestão da Educação Básica e de Gestão de

Recursos Humanos, na conformidade das respectivas áreas de competência, baixar instruções

que se façam necessárias ao cumprimento do que dispõe a presente resolução.

Artigo 17 - Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as

disposições em contrário, em especial a Resolução SE Nº 53/2014.

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Tabela I – Analfabetismo na faixa de 15 anos ou mais (Brasil, 1900/2000)

Ano

População de 15 anos ou mais

Total

(em milhares)

Analfabeta

(em milhares)

Taxa de

analfabetismo

1900 9.728 6.348 65,3

1920 17.564 11.409 65,0

1940 23.648 13.269 56,1

1950 30.188 15.272 50,6

1960 40.233 15.964 39,7

1970 53.633 18.100 33,7

1980 74.600 19.356 25,9

1991 94.891 18.682 19,7

2000 119.533 16.295 13,6 Fonte: IBGE. Mapa do Analfabetismo no Brasil, 2010, p.6.

Tabela II – Taxas de rendimento no ensino fundamental (Brasil, 2011)

Brasil Tota

l

Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º

1996

Aprovaçã

o

71,8 72,2 71,4 - 63,

1

72,

2

77,

2

81,

1

63,

6

71,

2

75,

7

81,

2

2011

Aprovaçã

o

87,6 91,2 83,3 96,

5

91,

9

87,

1

90,

9

90,

5

80,

1

83,

4

85,

2

85,

4

1996

Reprovaçã

o

13,9 14,6 12,7 - 18,

5

16,

2

12,

2

9,0 16,

7

13,

5

10,

2

7,1

2011

Reprovaçã

o

9,6 7,3 12,4 2,1 6,7 11,

4

7,5 7,8 15,

3

12,

7

10,

7

10,

3

1996

abandono

14,3 13,2 15,9 - 18,

4

11,

6

10,

6

9,9 19,

7

15,

3

14,

1

11,

7

2011

Abandono

2,8 1,5 4,3 1,4 1,4 1,5 1,6 1,7 4,6 3,9 4,1 4,3

Fonte: IBGE/Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 2011. Adaptado pelo autor.

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Tabela III – Taxas de rendimento no ensino fundamental (São Paulo, 2012)

São Paulo Tota

l

Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º

1996

Aprovação 83,8 86,8 80,5 95,

0

75,

7

88,

6

92,

3

75,

0

79,

2

83,

2

87,

8

2012

Aprovação 93,0 97,3 91,4 - - - 95,

2

94,

4

93,

9

92,

5

84,

7

1996

Reprovação 8,6 8,9 8,3 - 19,

7

7,7 3,9 12,

3

9,1 6,2 3,4

2012

Reprovação 4,9 1,8 6,0 - - - 3,9 3,4 4,1 5,0 11,

3

1996

abandono 7,6 4,3 11,2 5,0 4,6 3,7 3,8 12,

7

11,

7

10,

6

8,8

2012

Abandono 2,1 0,9 2,6 - - - 1,0 2,1 2,1 2,5 4,0

Fonte: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação

educacional, 2012. Adaptado pelo autor.

Tabela IV- Aprovação/Abandono no ano final do ensino fundamental (Brasil,

1996/2011)

Aprovação - ano final do Ensino Fundamental 1996 - 71,4% 2011 – 83,3%

Abandono - ano final do Ensino Fundamental 1996 – 15,9% 2011 – 4,3%

Fonte: IBGE/Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 2011. Adaptado pelo autor.

Tabela V - Reprovação – Anos iniciais e anos finais do ensino fundamental (Brasil, 1996-

2011)

Brasil Tota

l

Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º

1996

Reprovaçã

o

13,9 14,6 12,7 - 18,

5

16,

2

12,

2

9,0 16,

7

13,

5

10,

2

7,1

2011

Reprovaçã

o

9,6 7,3 12,4 2,1 6,7 11,

4

7,5 7,8 15,

3

12,

7

10,

7

10,

3

Fonte: IBGE/Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 2011. Adaptado pelo autor.

Page 192: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP de Assis.pdf · 1.3 A crise do Populismo e o Golpe de Estado de 1964: manutenção do poder e negação de direitos 29 1.4

Tabela VI - Reprovação – Anos iniciais e anos finais do ensino fundamental(São Paulo,

1996/2012)

São Paulo Tota

l

Anos

iniciais

Anos

finais

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º

1996

Reprovação 8,6 8,9 8,3 - 19,

7

7,7 3,9 12,

3

9,1 6,2 3,4

2012

Reprovação 4,9 1,8 6,0 - - - 3,9 3,4 4,1 5,0 11,

3

Fonte: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação

educacional, 2012. Adaptado pelo autor.

Tabela VII- Ensino fundamental de8 Anos – Rede Estadual de São Paulo - Taxas de

Reprovação por Série (São Paulo, 1996/2012)

Série

1ª Série 2ª Série 3ª Série 4ª Série 5ª Série 6ª Série 7ª Série 8ª Série Ano

1996 - 19,7 7,7 3,9 12,3 9,1 6,2 3,4

1997 - 9,0 2,7 1,2 5,1 4,2 3,4 2,5

1998 0,8 1,5 0,8 1,5 2,9 2,7 2,4 2,1

1999 0,9 1,1 1,2 4,8 4,0 4,0 3,9 3,8

2000 1,1 1,1 1,1 6,5 5,1 5,2 5,3 5,9

2001 1,1 1,1 1,0 10,0 5,3 5,0 5,3 8,6

2002 1,4 1,3 1,3 6,2 5,3 6,2 6,1 8,6

2003 1,5 1,3 1,3 7,9 4,9 5,3 6,4 11,1

2004 2,0 1,6 1,4 8,4 5,3 6,1 6,8 13,9

2005 2,0 1,5 1,4 7,8 5,6 6,1 7,3 14,5

2006 2,4 1,7 1,7 8,7 6,3 6,9 7,9 16,4

2007 2,3 1,8 1,6 8,6 6,0 6,5 7,7 17,0

2008 1,7 1,2 1,1 7,0 5,2 5,9 7,1 15,4

2009 1,6 1,0 1,0 5,8 4,5 4,8 6,3 14,5

2010 - 1,1 1,0 5,3 3,4 4,2 5,3 12,3

2011 - - 1,3 5,3 3,8 4,4 6,1 13,7

2012 - - - 3,9 3,4 4,1 5,0 11,3 Fonte: SÃO PAULO. Secretaria da Educação. CIMA. Coordenadoria de Informação, monitoramento e avaliação

educacional, 2013. Adaptado pelo autor.