por que o brasil é um país atrasado? · a maioria dos brasileiros acredita viver em uma...
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SUMÁRIO
Capa
Sumário
FolhadeRosto
FolhadeCréditos
Dedicatória
UMAUTORESSENCIALPARAENTENDEROPAÍS
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO1
CAPÍTULO2
CAPÍTULO3
CAPÍTULO4
CAPÍTULO5
CAPÍTULO6
CAPÍTULO7
CAPÍTULO8
CAPÍTULO9
CAPÍTULO10
CAPÍTULO11
CAPÍTULO12
CAPÍTULO13
CONCLUSÃO
AGRADECIMENTOS
BIBLIOGRAFIA
NOTAS
LUIZPHILIPPEDEORLEANSEBRAGANÇA
©2017EditoraNovoConceitoTodososdireitosreservados.
Nenhumapartedestaobrapoderáserreproduzida,copiada,transcritaoumesmotransmitidapormeioseletrônicosougravações,assimcomotraduzida,semapermissão,porescrito,doautor.OsinfratoresserãopunidospelaLeinº9.610/98
Versãodigital—2017
ProduçãoeditorialEquipeNovoConceitoeMaquinariaStudioBragança,LuizPhilippedeOrleanse
PorqueoBrasiléumpaísatrasado?/LuizPhilippedeOrleanseBragança.–RibeirãoPreto,SP:NovoConceitoEditora,2017.
ISBN978-85-8163-867-6
1.Brasil2.Política3.Economia4.HistóriaI.Título.
CDD-306.2
Índicesparacatálogosistemático:1.Sociologiapolítica306.2
RuaDr.HugoFortes,1885ParqueIndustrialLagoinha14095-260–RibeirãoPreto–SPwww.grupoeditorialnovoconceito.com.br
DedicoestaobraaosmeuseternosavósLuizeMariadoCarmodeMoraesBarros,eavidaeosvaloresqueelesmetransmitiram.
UM AUTOR ESSENCIAL PARA ENTENDER OPAÍS
Por que o Brasil não é de primeiro mundo, com todo o potencial que tem? Por que acumulamosproblemas após problemas, sem resolvê-los àmedida que aparecem?Emque ponto da nossa históriaescolhemosatrilhaerrada?Eporqualcaminhoprecisamosretornar?LuizPhillipedeOrleanseBragança,descendentediretodenossosantigosmonarcas, temumavisão
abrangenteeespecial,usandoopassadoeasexperiênciasparalelasparademonstrarcomoeondetemosfalhadonaconstruçãodanossahistóriamaisrecente–eofazcomaagudezadeumcrítico,aenergiadeumacadêmicoeorigordeumcientistapolítico.Aobranasceemumdosmomentosmaisdelicadoseinstáveisdenossatrajetória.DizerqueoBrasilé
umpaísatrasadoélugar-comum.Ehámuitasrespostasprontas,segundooautor.Porestarazão,elesepropõe a oferecer elementos para que o leitor não seja compelido a reproduzir o que é de fácilcompreensão,masquequasesemprenãocorrespondeàrealidade.Elese insurgeaodefender,comcoragem,omelhorcaminhoparatiraroBrasildoatrasoemquese
encontra.Evaialém,denunciandoque todososgovernosbrasileiros,nosúltimoscemanos,se tornamdonosdasleis,centralizarampoder,ereforçaramseusinteressesacimadosinteressesdosbrasileiros.Chegamosaomomentoatualemqueficaóbvioquenossosgovernantesnãonosprotegem.Nemsequer
nosrepresentam;elesnosespoliam.Nãotemosmaisonoblesseoblige,ouseja,aobrigaçãodosnobres.Nossos governantes gastam mais fortunas hoje do que aquelas consumidas pelos castelos reais deoutrora.Preferemarrecadar40%emimpostosdoquedoar2%diretamenteparaentidadesbeneficenteshonestaseeficientes.Vale a pena conhecer toda uma forma de pensar que perdemos ao longo do caminho. E fico feliz
porquemeu amigoLuiz se dispôs a colocar tudonuma forma acessível.A contribuiçãodePor que oBrasiléumpaísatrasado?é,portanto,inestimávelaodebatequesempreevitamos.
StephenKanitz
INTRODUÇÃO
A partir de 2013, oBrasil viu despertar uma força política adormecida hámuito tempo: a força dasociedadebrasileira.Nomomentoqueestaobraéescrita,opaísviveumperíododealtainstabilidadepolíticacomescândalosdecorrupçãoqueabalamospoderespúblicos,promovemtrocasdepresidentese gerammobilizações sociais de todanatureza.Meupropósito é apresentar subsídios para discussõespropositivas e sugerir uma linha esquematizada de raciocínio. Esses instrumentos poderão ser úteis atodos os brasileiros que, desde o começo das manifestações anticorrupção espalhadas pelas grandescidades brasileiras em junho de 2013, vêm se perguntando como direcionar o anseio popular pormudançaspereneseorenovadointeressedopovonapolíticaemganhossubstanciais.ComoativistapolíticoemembrodaliderançadoMovimentoLiberalAcordaBrasil,tenhoencontros
regulares com osmais variados grupos: estudantes, artistas, músicos, juristas, empresários,militares,religiosose,evidentemente,políticosdosmaisdiversospartidos.Estelivrotambéméumatentativadeconsolidar essas discussões e estimular outros brasileiros a criar seus próprios grupos de debate.AcreditoqueoBrasilpoderáusaraenergiapor renovaçãoparade fato superar limitaçõeseentraveshistóricosaodesenvolvimento.O primeiro passo nesse sentido é preencher uma lacuna de conhecimentos básicos a respeito de
conceitos da ciência política e revisar o significado de termos e chavões que vêm sendo usadosacriticamente, apenas porque sempre o foram. E aqui, certamente, os críticos dematizes variados seencarregarão de sentenciar que é demasiadamente pretensioso querer transmitir conceitos de ciênciapolíticaaopúbliconumaobradeleiturarápida.Porém,minhacrençaédeque,sim,épossível.Maisqueisso–énecessário.Estelivroédestinadoatodososbrasileirosquesequestionamporque,aessaaltura,nossopaísainda
éatrasado.Essapergunta,emboramuitopertinente,nãotemumaúnicaresposta.Oatrasoquenosdeixatão indignados émotivado por um conjunto de decisõesmíopes – e, portanto, equivocadas – da elitepolítica.A cada capítulo, busco apresentar uma resposta à pergunta-título. Cada tentativa de respostasuscitaránovosquestionamentosporpartedoleitor;ealgunsdessesquestionamentosdesafiarãoosensocomum.Hámuitasrespostasprontas,porcerto;easpessoastendemaaceitarereproduziraquiloqueémais
fácil de compreender – o que é próximo, tangível e compartilhado por outros ao redor. É umcomportamentoperceptível.Todosnós resgatamosumasériedemitos,ditospopulares, jargões, frasesfeitas e preconceitos para construir nossas crenças. Aos poucos, tais preconceitos se cristalizam emverdades comungadas por todos e nos levam a responder questões complexas com frases simples erecheadasdeclichês.Amaioria dos brasileiros compartilha ditados populares para explicar por que nos desenvolvemos
aquémdenossascapacidades.Acultura,aética,oidioma,ojeitinho,ahistóriacolonial,ageografia,areligião e o coronelismo, entre outros fatores, seriam responsáveis pela nossa condição de país empermanenteestadomedíocrededesenvolvimento.Afirmarqueacausadas limitaçõesnacionaiséesseconjuntodefatores“culturais”é,nomínimo,reducionista.Na ciência política, esses ditados populares raramente são utilizados para analisar causa e
consequência. Eles não sobrevivem à observação científica. São, simplesmente, excluídos da análise,poispoucosdelessãoreplicáveisemumoutrocontextoedemaneiraclaraedistinta.Invariavelmente,essascrençaspopularestêmexceçõesquefacilmentedestroemsuaspremissas.Hápoucasvariáveisque,umavez testadas repetidamente, tornam-se leis científicas aplicáveis emqualquer situação, gerando omesmoresultadoacadaiteração.Infelizmente, há cientistas políticos, historiadores, filósofos e sociólogos que não trabalham dessa
maneira.Sãoosquedescartamaobservação,arepetiçãoeacomprovaçãocientífica.Elesdesvinculamaciênciadapolíticaeterminamporfazersomentepolítica.Essesestudiosostrabalhamcomoimagináriodas pessoas, na intuição sensorial e estética. Políticos com disfarce de cientistas, eles poluem econtaminam milhões de mentes com falsas verdades, estatísticas maquiadas, temas não observáveis,deturpaçõesde fatoshistóricos,destruiçãodeevidências e tentativasde criaçãodemitos enarrativasnovas para se validarem como representantes “do povo.” Eles almejam a construção de uma visãoconfortável, de fácil digestãopelasmassas, equeremconquistar controle epoder.Sãoagentesque seutilizam de linguagem camaleônica para obter uma perfeita aceitação nos segmentos que desejamconvencer e controlar. Esses são os políticos dentre os cientistas. Atualmente, eles são amaioria noBrasil.Nesta obra curta, didática e comesperança de ser objetiva, proponhoumcaminhodeliberadamente
oposto ao que vem sendo seguido pela maioria dos cientistas políticos que enxergam a realidadebrasileiraatravésdeumalentedesfocadapelaideologia.Naanálisequesegue,oleitorprecisaestarpreparadoparasedesvinculardapoluiçãosensorialcriada
por esses políticos do imaginário. Você terá que se imbuir de seu espírito científico e aceitar acausalidade como regra, o que frequentemente implica em negar convenções e, mesmo, emoções. Apergunta“oquecausaoquê?”deveestarsemprepresenteparavalidarqualquernovofatoouargumentoquepretendaserverdadeiro.Nossa jornada para entender por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido inicia-se com a
constatação de que nossas escolhas históricas de sistema de governo e de sistemas econômicos noscolocaramnaclassificaçãoatualdepaísemperpétuoevacilantedesenvolvimento.Essarespostaémaissimpleseóbviadoquesepoderiaesperar,masrequerumamentelivre,capazde
compreenderedeaceitarascausaseconsequênciascomclarezacientífica.Essesfatores,maisdoquequalquermitopopularouargumentoculturalousociológico,sãoosquecausamoresultadoobservadoeé a partir de sua alteração que podemos resolver a questão inicial.No entanto, para que você possaaceitarecompreenderasimplicidadedessaresposta,énecessárionavegarpelalógicaepelaanálisedoquenoslevaatalconclusão.Veremosqueanossainquietudeadvémdefalsaspremissas.Amaioriadosbrasileirosacreditaviver
emumademocracia.UmgrupomenordecidadãosacreditaqueoBrasilsejaumarepública.Muitosdenós acreditamos ainda que a nação brasileira tenha uma organização política de estados federativosautônomos e que nosso sistema econômico seja capitalista, ou uma variante do capitalismo. Desseconjunto de premissas nasce a percepção de que temos um modelo institucional aparentementecomparávelàquelesdepaísesdesenvolvidos;etalpercepçãofalsaéoquealimentaaeternadúvidadoporquêaindanãoconquistamosaprosperidade.Sociólogos,antropólogos,historiadores,professores,cientistaspolíticos, jornalistase,sobretudo,os
políticos brasileiros tendem a reforçar a ideia de que há limitações culturais e sociológicas querespondemoqueháde erradonanossapolítica ena economia.Segundoeles, a eterna conclusão é anecessidadede“alteraracultura”emelhoraramatéria-primahumanadanaçãoparaconsertaroerrono
nossomodelopolítico-econômico.Depois de décadas ouvindo essemantra, a insegurança de ser brasileiro se tornou onipresente e a
baixa autoestimacoletiva fincou raiz.Amensagemdeque “tudoé culpada cultura eda sociedade” éreplicadapelamídia,pelaclassepolítica,pelasigrejas,escolas,universidades–enoslevaacreremumconjuntodevaloresquedeterminamumavisãopobreevulneráveldenósmesmos.Passamosaacreditarquesomosumpovoqueprecisaserguiado,liderado,mandado–equedevemosalterarnossanatureza,demaneiraanostornarmaisadequadosaofuturoquequeremos.Setaldiagnósticodobrasileirofosseumfatoverificável,talvezesse“argumentocultural”pudesseser
validado. Contudo, algo não se encaixa. Intuitivamente, o brasileiro sabe que não é inferior que osdemais povos que compõem nossa humanidade. Também percebe que povos que estão em situaçãosocioeconômicadelicadanãosão“piores”doqueaquelesquevivememcondiçõesmaisfavoráveis.Porisso,quandonoscomparamosaoutrospaíses,sentimosumacertainquietude.Aopercebermosque
outros povos e nações que se organizam de maneira semelhante à nossa obtêm resultados melhores,ficamos desconcertados.Quando nos deparamos com países politicamente estáveis e economicamenteprósperos, que lideram inovações, têm uma classe média consumidora pujante e contribuem para ahumanidadedemaneiradesproporcionalànossa,nosperguntamos:“Porqueelesenãonós?”.Nestelivro,proponhorespostasdefinitivasparaaperguntaprimordialqueafligeatantasgeraçõesde
brasileiros.Alinhamestradestaobraestácontidanaseguintemáxima:“Quemnãosabeoqueé,nãosabeo que quer.E, quemnão sabe o que quer, não chega a lugar algum”.Assim, permita-me o leitor umaobviedade: temosquecomeçardo início.Precisamosanalisar adefiniçãoqueescolhemoscomopovoorganizadoevalidarsedefatosomosdojeitoquenosdefinimos.Para melhor compreensão do que somos, verificaremos as formas de organizações políticas e
econômicas. Nas diferenças que encontramos entre os conjuntos de sistemasmora a compreensão domodelo brasileiro. Para podermos avançar como sociedade, como pátria e nação organizada, énecessário primeiro nos definirmos.Ou,melhor, nos redefinirmos. Só assim saberemos que caminhosprecisamospercorrerparaextrairomelhordenósmesmosedenossoricopaís.Ao redefinir quem somos, construiremos a ideia deBrasil que queremos. Isso ajudará a solucionar
váriasdenossasafliçõespresentesedesafiosfuturos.Vamoscomeçaragoraajornadapararesponderàpergunta-títulodestelivro:PorqueoBrasiléumPaísAtrasado?.Umarespostaporvez.
CAPÍTULO1
ESTADOOUGOVERNO?Porquemisturamosconceitostãodiferentes–eoprejuízoqueissonosacarreta
UmasociedadenãoconsegueingressarcomfundamentossólidosnarotadodesenvolvimentocasonãoentendaadistinçãoentregovernoeEstado.Habitualmente,obrasileiromédioconfundeascoisas.“Estoufeliz porquemeu filho foi aprovado no vestibular de uma faculdade do governo”; “o governo temumMinistérioPúblicomuitoeficiente”;ou“aaposentadoriadogovernoéumamiséria”sãocomentáriosqueilustramessaconfusão.Ora, as universidades públicas são instituições de Estado, bem como o Ministério Público e a
PrevidênciaSocial.Claro,háumagestãodosorganismosdeEstadoexercidapelogovernoque,porumperíodo determinado, ocupa essa gestão. Mas, enquanto o governo gerencia a coisa pública e étemporário,oEstadoestáacimadele–eépermanente.EntregovernoeEstadoháaindaoutrocomponentedamáquinapública,aburocracia.Forma-seentão
umaespéciedetrindade,aqualfazumpaísavançaroupermanecernoatraso.Convémdistinguiroqueécadacomponenteeseupapelnessatrindade.Antes,porém,dediscorrersobreaaçãodecadaumadessasforças,permita-meoleitorcomeçardefinindocadaconceito.Otermo“Estado”datadoséculoXIIIedesignaoconjuntodeinstituiçõesquecontrolameadministram
umanação.HámuitasteoriassobreaformaçãodoEstado,assimcomoháváriosmodelosdistintosdessainstituição.Todavia,oEstadocomooconhecemos,modernoeocidental,começaaganharformanofimda Idade Média. Na época, o poder, anteriormente fragmentado entre diversos nobres, duques ousenhoresgovernadoresdeterras,voltouaseconcentrarnasmãosdosreis.Antesdessareconcentração,aEuropanãotinhaEstadosounações.Osduquesnãotinhamtantopoder
delegislar,umavezquealegislaturadaIgreja,centralizadaemRoma,detinhamaisconhecimentoeumaburocraciaprópriaebemdistribuídaemváriosducados.IssopermitiaqueaIgrejaexercessemuitomaiscontrolelegislativodoqueessesgovernadoreslocais.Tantoocleroquantoaaristocracialocaldetinhamocontroledosmeiosderepressão,compartilhadoscomosduques.NoconceitoquesetornouclássiconoOcidente,desenvolvidopelojuristaeeconomistaalemãoMax
Weber (* 1864 – † 1920), umdos criadores da Sociologia, Estado é a instituição que concentra umasociedade,dentrodeumterritórioespecífico(pátria),edetémospoderesdelegislarereprimir.OmodelodeEstadocomooconhecemosnecessitaaindaquehajaumsistemaunificadodecoletade
impostoseumconjuntodecrençasentreoscidadãos–comoadequealgunsvalores fundamentaisosunem,bemcomoanoçãodequeexisteumahistóriaoucaracterísticascomunsqueosassemelhaaseusconcidadãos e os separa dos demais. Estado, no caso, se refere a todos os agentes políticos, àsinstituiçõespúblicas,aosseusprincípioseleisderegimentosintetizados,namaioriadoscasos,emumaConstituição;eleincluiogovernoeaburocraciaqueregemumpovonumdeterminadoterritório.Tudo isso começou a se estabelecer na Europa com a dinastia dos Tudors, na Inglaterra; com os
Habsburgos,naEspanha;ecomosBourbons,naFrança.Esses foramosgovernantesqueconseguiramestabelecerumcontrolepolítico,econômicoejudicialcentralizadoacimadopoderdosváriosduques,alémdedefiniremfronteirasdelimitadas.Elesconseguiram,ainda,reduziropoderdeoutrasinstituições,comoaIgreja,edegruposcomoanobreza.Posteriormente,comoenfraquecimentodoabsolutismo–a
noção de que o poder do rei seria absoluto, de que ele próprio seria o Estado –, surgiu outro braçofundamentaldoEstadomoderno:aburocracia.O que é burocracia? O termo remete àquelas chateações sem fim a que somos submetidos em
repartições públicas, cartórios e escritórios de despachantes. Porém, burocracia é algo que vaimuitoalém das formalidades com papéis, assinaturas e carimbos. Popularmente, quando falamos emburocracia, hoje em dia, é sempre como sinônimo de coisas que não funcionam ou, quando muito,funcionammal.OtermoéusadoparasinalizarqueoEstadoouogovernoestáatrapalhandoavidadocidadão.EmSociologia,noentanto,acriaçãodaburocraciaéumacontecimentoimportantíssimo.Elaéaestrutura organizativa caracterizada por regras e procedimentos explícitos e regularizados, por umadivisãoderesponsabilidadeseespecializaçãodotrabalho,hierarquiaerelaçõesimpessoais.Emsuma,éainstânciaqueaplicaasregrasestabelecidaspeloEstadodeacordocomsuaConstituição.AburocraciaéconstituídadetécnicosqueadministramasdiversasáreasdoEstado.Essestécnicos,na
maioriadoscasos,nãosãoeleitos–e,algunscargos,sãonomeadospelogovernoparadirigiralgumasáreas-chavepara implementaçãodeprojetosdogoverno.Os técnicosdecarreiraprofissionalnão têmmandatoepodemperdurarporváriosgovernos.Noentanto,comoveremosmaisadiante,aburocraciapodeexercerumpoder igualoumaiorqueodogoverno.Por issoquediversospaísesoptamporumaconstituiçãoquedápoderesaogovernode limitaropoderdaburocracia, evice-versa.Éum jogodeforçasessencialaoequilíbriodeforçaspúblicasqueagemdentrodoEstado.Tudors, Habsburgos e Bourbons ajudaram a estabelecer os Estados europeus como os conhecemos
hoje,masvocêpodetercertezadeque,naeradoabsolutismo,eleseramavessosàideiadetergovernosdepessoasdesassociadasdasfamíliasfundadoras.Hojeemdia,otermo“governo”serefereaoagentepolíticoeleitoparaadministrarasinstituiçõesdo
Estado durante determinado período. Observe que governo é transitório, ao passo que Estado éatemporal.GovernospodemafetaramaneiracomooEstadoseorganiza.Elespodem,atémesmo,mudarcompletamenteavisãoecertasregrasfundamentaisdoEstado.Este,porsuaparte,limitaospoderesdosgovernosassimcomodeterminaquetiposdegovernospodemsurgirparasuaregência.EnquantoEstadoéumaestruturamaisoumenospermanente–evalelembrarqueo“maisoumenos”é
porquenadanahistóriaéimutável–,definidapeloconjuntodeinstituiçõespúblicasquerepresentameorganizam a população que habita o seu território, governo é uma composição transitória que oadministra. Escolas, hospitais, prisões, Exército e polícia, por exemplo, são instituições de Estadogerenciadospelogovernoemexercícionaqueleperíodo.Governos são impermanentes, e num país com sistemas democráticos de eleições frequentes, são
especialmentetransitórios.NoBrasil,podemdurarapenasquatroanos–àsvezes,atémenos,adependerdo comportamento dos políticos e do anseio popular. Durante a sua vida, você poderá testemunhargovernos com propostas completamente diferentes, mas, a priori, o Estado não deveria sofrermuitasalterações.Parasimplificar,governoéaquiloqueelegemosacadaquatroanos,queàsvezesmudadesloganede
lado. Já Estado é o aparato permanente que esses governos administram. É importante distinguir issoporquehápaísescomestruturasdeEstadoqueseparamnitidamenteoqueéEstadoeoqueégoverno,queopovosabedistinguir–ecobrardeacordo.Noentanto,empaísespresidencialistascomooBrasil,adistinçãoentreEstadoegovernonãoéclara.
Acrescenteaissoofatodequeamaioriadospresidentesdepaísespresidencialistastemtodoointeressedeseperpetuaremnopoderoudeperpetuaremsuaspolíticasdegovernoalémdeseusmandatos.Paratalobjetivo trabalham para tornar uma política temporária de governo em uma política permanente de
Estado.A estrutura de Estado e os poderes que aufere aos governos e à burocracia são a chave para a
estabilidade e o sucesso político de uma nação. Muito poder aos governos e à burocracia torna asociedade sujeita a ser escravadoEstado eminguarnamediocridade.Poucopoderparaogoverno epara a burocracia, por sua vez, restringe de ações que possam proteger a sociedade em questões desoberania,porexemplo.Como,emgeral,todogovernoquermaispoderecontroledacoisapública,elenãogostadelimitações
impostasporoutrasinstituiçõesconstituídascomoindependentesnaestruturadoEstado.Poucossãoosmomentos na história do Ocidente em que governos se demoveram de poder ou reforçaram aindependênciadeoutrasinstituiçõesdeEstadoqueogovernonãocontrolava.Invariavelmente,issoocorreusomenteemcasosdeformaçãodeumanovanaçãoaoselibertardeum
governotirânico,ouemcasosdeindependênciadedomínioexterno–oudeambos.Raramenteocorreudeumgovernoreduzirseuprópriopodervoluntariamenteelimitarseucampodeatuaçãoembenefíciodas demais instituições permanentes do Estado ou da democracia sem que houvesse intensa pressãopolíticapopularoumesmoumarevolução.Tanto a burocracia como o governo sofrem influências da sociedade organizada. Em um Estado
moderno,oscanaisdeinfluênciaecomunicaçãocomopovosãodiretoseabundantes.JáemumEstadototalitário, esses canais não existem ou foram extintos. Considerando essa dinâmica simples, vamoscomeçaraentenderasforçasquedefinemosgovernoseseusefeitosnosestadossoboqualoperam.Umavezdefinidasessasforças,podemosanalisarcomprecisãoonossopaíshojeeasuahistória.Algunsgrandespensadores,comoMaxWebereoeconomistaaustríacoLudwigvonMises(*1881–†
1973),enxergamnaburocraciaumaforçaefetivanocomandodanaçãoquepodeinfluenciarogovernoeatémesmoasociedade.Àsvezes,aburocraciapodetornar-seumaforçasemlimites.Um dos problemas fundamentais relacionados à relevância que a burocracia assumiu nos Estados
contemporâneoséque,emmuitoscasos,elaimpõenormaseregulamentossemavaldapopulação,oquedeveria ser feito via representantes eleitos. Ou seja: cria regras e altera processos à margem dosinstrumentosdemocráticos.Épossívelqueconsigamelhoraraprodutividadecomamudançacorriqueiraderegrasenormas;porém,muitospreceitostécnicosnãosãolegitimadospelasociedade.Porconseguinte,casonãosejamestabelecidoslimitesparasuaatuação,aburocraciapodetornar-se
totalitária,mitigandoqualquerinfluênciadopovoemnomedaeficiênciaedocontrole.Poroutrolado,torná-la sujeitaà supervisãode representanteseleitos tambéméumproblemagrave.Umgovernocomplanos totalitaristaspodeseaproveitardesseviésnaturaldaburocraciaeaparelhá-laparaempurrarasuaagendadepodersempassarporvalidaçõesqueoutroralimitariamaambos,tantoogovernocomooaparelhoburocráticodegestãodasinstituiçõesdeEstado.Aencrencaestáestabelecida.EssedilemafoioqueafligiuWebereMises.Partindodesuasanáliseseconclusões,vemosqueuma
burocracia sópode ser limitadade fato se todosospoderesdentrodoEstado limitamunsaosoutros.QuantomaisfragmentadoopoderdasinstituiçõesdeEstado,menororiscodesecriarumpodersemprecrescenteetirânico.Os poderes têm de operar demaneira independente entre si; um não pode ter o condão de nomear
dirigentes do outro, por exemplo. Antes, os dirigentes de cada poder devem ser eleitos pelos seuspróprios quadros, segundo regras claras de qualificação, diretamente pelo povo ou de acordo comvariáveisdessescritérios.Portanto,háumapropensãonaturaldetodogovernodeconcentraredeseperpetuarnopoder.Também
háumatendênciadetodaburocraciaaseexpandir.AindependênciadepoderesdentrodaestruturadeEstadoécapazdecriarlimitesdessasforças,queagindosemcontrole,setornammaléficas.NoBrasildosúltimoscemanos,esseslimitesnãotêmfuncionadotãobemquantoplanejadoemsuasconstituições.Issoocorreporqueapenasorganizarospoderesadequadamentenãobasta.Alémdaindependênciadepoderes,existeacobrança.Acobrançaqueumpoderfazaooutrogeraum
sistema mais transparente e participativo. Essa cobrança tem de ocorrer dentro dos sistemasinstitucionais e, também, na sociedade, o que nos leva à próxima reflexão: o papel da sociedadeorganizadanojogodeforçasentreEstado,governoeburocracia.