postais de soldados das trincheiras
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No âmbito da disciplina de História e da comemoração do Centenário da Primeira Guerra Mundial, os alunos do 9ºD do Agrupamento de Escolas de Montenegro (2015-2016) imaginaram-se soldados na frente ocidental e escreveram postais ou cartas a familiares ou amigos a contar a sua vida nas trincheiras...TRANSCRIPT
Postais da Primeira Guerra Mundial
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POSTAIS DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
TRABALHOS DE ALUNOS – 9ºD História - 2015-2016
Postais da Primeira Guerra Mundial
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"Em época de paz, os filhos enterram os pais, enquanto em época de
guerra são os pais que enterram os filhos."
Heródoto, 484 a.C.-425 a.C.
No âmbito da evocação do centenário da Grande Guerra, solicitei aos
meus alunos do 9º ano que procedessem a uma pesquisa sobre a vida
dos soldados nas trincheiras, na frente ocidental, e escrevessem um postal ou carta a
um familiar ou amigo.
Para esta geração das mensagens no telemóvel e de missivas curtas nas redes
sociais e correio electrónico, a construção de um texto coerente, ordenado e com um
código preciso (escrever a data, local, saudação, dar informações relevantes,
despedida…) revelou-se complicado pois muitos nunca fizeram esse ato tão banal da
minha geração, que era/é escrever um postal ou uma carta.
Este desafio envolveu ainda o desenvolvimento de aprendizagens associadas a
capacidades/conhecimentos e atitudes/valores:
Seleção de ferramentas e fontes de informação (impressas e digitais) a utilizar.
Referenciação da fonte.
Uso autónomo da biblioteca escolar e de bibliotecas digitais para trabalhar a
informação.
Uso de ambiente digital para partilhar a aprendizagem (plataforma moodle e
livro digital).
Manifestação de espírito de interrogação.
Demonstração de iniciativa e criatividade na resolução de problemas.
Refletir sobre a guerra.
Valorizar os trabalhos escolares.
Este livro digital é o resultado dos trabalhos que me foram entregues,
independentemente do perfil de desempenho de cada aluno. É o resultado da
sensibilidade, determinação e empenho de cada aluno. A ilustrar os textos encontram-
se postais da época e fotografias cuja fonte foi a excelente página no Facebook -
Centenário da Grande Guerra - da Liga dos Combatentes.
Constitui ainda objetivo deste livro digital a divulgação junto dos pais e
encarregados de educação e comunidade cibernauta os trabalhos produzidos pelos
alunos, contribuindo para a valorização do que é feito no espaço escolar.
Cristina Barcoso Lourenço, Montenegro, 14 de dezembro de 2015
Postais da Primeira Guerra Mundial
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Índice
1. De um soldado para a sua mãe, por Andreia Félix .......................................................................... 4
2. O sargento Beátrice escreve a seus pais, por Beatriz Pires ............................................................. 5
3. Um filho escreve à sua mãe, por Beatriz Ventura ........................................................................... 7
4. Postal ao meu amor, Sophia, por Diogo Cavaco ............................................................................. 8
5. De uma enfermeira para os seus pais, por Joana Pinto ................................................................ 10
6. De um soldado para a sua mulher, por Jorge Barreiros ................................................................ 12
7. De um general para a sua mulher, por Mariana Barão ................................................................. 13
8. De um sargento para o seu pai, por Miguel Quintas .................................................................... 15
9. De um soldado para os seus pais, por Patrícia Gaitinha ............................................................... 17
10. De um general da infantaria farense para a sua amada Raquel, por Raquel Canário ................... 19
11. Do soldado Richard para Sophia, sua mãe, por Ricardo Quintas .................................................. 20
12. Do general Joroslaw para o seu amigo, por Rodrigo Silva............................................................. 21
13. Do soldado Vasco Maria para os pais e irmã, por Vasco Farinha ................................................. 22
14. Charles Kléber escreve a sua mãe, por Vera Mateus ................................................................... 24
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://www.prof2000.pt/users/avcultur/Postais3/Militaria/060_Militaria.jpg,
Consultado a 14/12/2015
1. De um soldado para a sua mãe, por Andreia
Félix
17 de setembro de 1915
Mãe, escrevo-te esta carta para te resumir como é a vida aqui
nas trincheiras.
Como deves imaginar tem sido uma vida desgastante. Digo-te
que como soldado é bastante difícil conseguir sobreviver a todas estas
coisas. Devo começar por dizer que a falta de higiene é grande e
muitos já faleceram com doenças causadas pela mesma. A nossa
alimentação é horrível, a maior parte é enlatada, a nossa ração diária é
um pedaço de pão, alguns biscoitos, 200g de legumes e 200g de carne.
Muitos dos soldados que aqui estão nesta guerra, por vezes, roubam
comida dos bolsos de outros soldados devido à fome que têm.
As trincheiras são muitas vezes autênticos lodaçais. Aqui
ficamos meses a fio, lutando pela conquista de pequenos territórios.
Tenho visto novas armas que tornam esta guerra ainda mais mortífera,
como as metralhadoras, gases tóxicos, submarinos, lança-chamas.
A vida nesta guerra enlouquece por vezes muitos de nós,
chegando a haver situações em que alguns ferem-se a si próprios para
poderem ser mandados para casa.
Para terminar um abraço do teu filho que te ama muito.
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://www.portugal1914.org/portal/pt/historia/iconografia/item/7641-viva-a-raca-
portuguesa-viva-a-razao-e-a-justica, Consultado a 14/12/2015
2. O sargento Beátrice escreve a seus pais, por
Beatriz Pires
Sargento Beátrice
6ª Batalhão dos fuzileiros Franceses
Região de Verdun, código 85497854 Leroy
Queridos pais
Se estiverem a ler esta carta é porque não sobrevivi a esta
dolorosa e longa batalha. Já lá vão 44 dias e nove horas nestas
malditas trincheiras.
A batalha, perto do rio Somme, não está a correr como
previsto. O meu batalhão (agora sou do 6º batalhão dos fuzileiros
reais) já sofreu demasiadas baixas. Estamos perdidos e cansados. O
objetivo desta batalha era tentar aliviar a pressão dos alemães na
região de Verdun, a cidade que fica perto da nossa antiga casa, para
abrir caminho em território francês. Os alemães pressionam demais e
não deixam contra atacar. O exército britânico já sofreu mais mortes
que o nosso.
Já começo a duvidar das razões que me levaram a participar
nesta guerra. Sei que a repressão alemã ao nosso continente não
poderia continuar, sei que lutamos pelos ideais que os nossos
antepassados defendiam (Liberdade, Fraternidade e Igualdade) mas
também estamos a lutar pela ganância mundial, pela hegemonia
Postais da Primeira Guerra Mundial
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económica. Será que vale a pena perder a vida de tanta gente?
Começo a enfraquecer e deixo de acreditar que realmente vale a pena.
O meu batalhão recebeu hoje uma máquina nova, dizem que é um
carro blindado capaz de aguentar a força de uma divisão de infantaria.
O tanque, pode ser que nos tire desta trincheira, embora não acredite
que o faça. Nada parece conseguir romper a força bélica daqueles
malditos alemães. Organizam-se em dias, parece que as trincheiras
deles são melhores que as nossas.
No último confronto usámos as baionetas, sinto que a morte
me ocupou o coração já não consigo sentir outra coisa senão ódio e
vontade de matar. E fome, muita fome.
Como podemos nós recuperar se não conseguimos sequer
comer. A trincheira é húmida e fria, a comida é escassa, apenas sobra
pão bolorento. Água nem vê-la, apenas quando chove, mas quando
isso acontece a trincheira torna-se um pântano de fome, morte e
miséria. As ratazanas fugiram das nossas trincheiras, eram a nossa
última esperança...carne. Mas que animal ficaria a ver este horror?
Houve uma tentativa frustrada de nos abastecerem de comida,
o avião foi derrubado pelo morteiro minenwefer dos alemães.
Tento sempre tomar banho, para me sentir mais humano, a
última réstia de humanidade parece estar num bocado de sabão. Que
estupidez!
Fiz este desenho ontem com o carvão que encontrei na minha ala.
Esta é a imagem que vejo sempre que fecho os olhos. E eu queria ser
artista, pai. Lembras-te como me disseste que artistas eram os
famintos que nada tinham para comer. Tens razão, sou um faminto
que nada tem que comer e que se agarra a um Deus inexistente. Não
há ateus aqui, não há ateus nesta trincheira.
Estamos no dia 12 de Setembro de 1916 aqui está frio.
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://www.portugal1914.org/portal/pt/historia/iconografia/item/3941-porta-bandeira-do-
corpo-expedicionario-portugues, Consultado a 14/12/2015
3. Um filho escreve à sua mãe, por Beatriz Ventura
13 de julho 1915
Mãe, estou a escrever-te para te relatar como é a vida na guerra.
Começo por te dizer como são os nossos hábitos de alimentação.
Por dia temos direito a pão, legumes e carne, normalmente a comida é
enlatada.
Todos nós, soldados, vivemos durante meses dentro das
trincheiras, ou seja em valas abertas feitas por nós, que têm como
principal objetivo o ataque e a proteção dos exércitos em dois blocos.
A vida aqui não é nada fácil, muitos soldados, com o desespero,
ferem-se a si próprios para serem mandados para casa.
Durante a tarde temos alguns períodos de descanso e
aproveitamo-los para ler ou jogar às cartas.
Não fiques preocupada.
Um beijo do teu filho.
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://casacomum.org/cc/visualizador?pasta=09022.002.092, Consultado a 14/12/2015
4. Postal ao meu amor, Sophia, por Diogo Cavaco
Minha querida Sophia Bond
Querida mulher,
Venho por este meio dizer-te que ainda estou vivo e cheio de
saudades tuas e da nossa família. Conto os dias para estar ao pé de ti
mas a guerra está a ser muito dura, muitos dos meus colegas foram
mortos por bombas, gás ou armas, outros morreram com doenças
como infeções, pé das trincheiras, etc. Os nossos aliados como já
deves ter conhecimento são os Franceses, Ingleses, Russos, e juntos
lutamos contra o inimigo, contra os alemães que são os mais duros de
todos!
As trincheiras são feitas aos ziguezagues e têm geralmente três
frentes, eu estou na primeira frente.
Não queria dizer isto, mas o teu irmão foi morto, porque
deixou-se dormir no seu turno, quando uma pessoa deixa-se dormir no
seu turno pode ser morto por uma arma de fogo.
Eu não tinha noção que os animais nos poderiam ajudar na
guerra, nas cargas, a transportar informações, na defesa a ataques de
gás. Os ratos têm um nariz muito sensível que pode detetar o gás mais
rapidamente que um ser humano, os cavalos ajudam na carga de
armamento, os pombos-correio a transmitir informações.
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Esta guerra tem coisas que eu nunca tinha visto, como os
tanques e submarinos
Na aldeia de onde viemos não havia nada disto! Quando todos
os homens da aldeia foram chamados para a guerra pensámos que iria
durar pouco tempo. Já se passaram 2 anos, isto é um martírio, estou
desejoso de chegar a casa e abraçar-te como se não houvesse amanhã.
A guerra começou em 1914, mas acho que vai durar mais tempo do
que pensávamos.
Nas trincheiras temos que fazer turnos enquanto uns dormem
outros estão de vigia, entre nós e os inimigos há um local cujo seu
nome é Terra de Ninguém de 30 a 200 mt, esse lugar era muito
perigoso porque estava cheio de minas e arame farpado.
Agora tenho de te deixar para ir tomar conta do meu posto, até
breve meu amor.
Beijos e abraços para todos e em especial para ti.
https://www.facebook.com/centenariogg.oficial/info/?tab=overview,
Consultado a 14/12/2015
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http://www.portugal1914.org/portal/pt/historia/iconografia/item/7663-gloria-aos-aliados-
viva-portugal-paz-salve-a-cruz-vermelha-viva-a-paz, Consultado a 14/12/2015
5. De uma enfermeira para os seus pais, por Joana
Pinto
14 de Novembro de 1915
Minha querida família,
Estou a escrever-vos porque há muito tempo que não recebia
correspondência vossa.
Aqui na enfermagem da linha de apoio da guerra, tem havido
imenso trabalho devido aos soldados feridos russos, nossos aliados.
Relembro-vos que fui para a guerra porque achei que é bom
podermos ajudar o nosso país.
Aqui na guerra temos visto de tudo, se vocês imaginassem o
tipo de armamento que aqui usam ficariam loucos: baionetas, lança-
chamas, morteiros, granadas, pistolas, revólveres, rifles,
metralhadoras, tanques, armas químicas, gases venenosos, aviões de
guerra, artilharia e navios e submarinos.
Hoje o dia foi muito difícil pois muitos feridos vieram hoje das
trincheiras e muitos com a doença “hespanhola “, que é mesmo muito
difícil de tratar. Nós tentamos de tudo mas parece não ter resultado, já
não sabemos o que fazer.
Hoje um soldado da linha de defesa veio cá ver um amigo e
contou-me muito acerca das trincheiras, o quão são horríveis, alguns
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desses detalhes explicam muitas das doenças aqui presentes na
enfermaria, sendo a falta de higiene o maior problema. A maior parte
da comida é enlatada , a porção diária do nosso exército só dá direito a
um pedaço de pão, alguns biscoitos, 200 g de legumes e 200 g de
carne. Para reabastecer o cantil com água, muitos soldados recorrem a
poças deixadas pela chuva.
Os corpos em decomposição, enterrados em covas rasas perto
das trincheiras, atraem ratos, que invadem as trincheiras sem controlo.
Além de transmitirem doenças, eles chegam a roubar comida dos
bolsos dos soldados e a roer os corpos dos feridos! Com esta falta de
higiene, os piolhos contagiavam a febre das trincheiras, doença
contraída por mais de 10% dos soldados.
Concluindo, as trincheiras são um verdadeiro inferno, tenho
pena daqueles que lá estão e espero que esta guerra acabe de uma
vez.
Espero que esteja tudo bem por aí,
Muitos beijos e abraços,
Sónia Petrova
Uma fotografia minha para se lembrar de mim.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Alexandra_Feodorovna#/media/File:Alix_h%C3%A1bor%C3%BA.
jpg, Consultado a 14/12/2015
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http://casacomum.org/cc/visualizador?pasta=09022.002.091, Consultado a 14/12/2015
6. De um soldado para a sua mulher, por Jorge
Barreiros
França, 20 de Dezembro de 1916
Querida mulher.
Espero que esteja tudo bem contigo e com os nossos filhos.
Comigo está tudo bem.
Isto aqui tem estado mau, vários colegas meus têm pé de
trincheira. Temos passado fome e dormimos pouco.
Milhares de soldados têm morrido ao avançar pela terra de
ninguém, por gases tóxicos e explosões vindas de lançamento de
granadas e de tanques, mas também pela falta de higiene.
Ontem tentámos avançar pela terra de ninguém mas começou
a ser muito arriscado pois havia pelo chão muitas minas e o arame
farpado não nos deixava passar. Muitos morreram mas eu e mais
alguns conseguimos escapar.
No tempo em que não estamos a fazer nada jogamos às cartas
ou aproveitamos para descansar, mas esse tempo não dá para nada
porque nos nunca sabemos quando é que o inimigo ataca. O que me
deixa mais triste no meio disto tudo é estar a chegar o Natal e eu não
poder passá-lo convosco
Beijos para ti e para os nossos filhos, feliz Natal.
Jorge
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://heritage.warwickshire.gov.uk/files/2013/12/8-CR4265_1-front.jpg,
Consultado a 14/12/2015
7. De um general para a sua mulher, por Mariana
Barão
St. Quentin, 16 de Maio de 1917
Querida Michelle
Minha amada esposa, envio-vos esta carta para que notícias
minhas tenhais. Como deveis saber, a guerra não está fácil. Os alemães
não se rendem de maneira alguma e os nossos soldados começam a
ficar desesperados, pois as condições não são as melhores.
Sei que muitos deles não queriam estar aqui, tal como eu, mas
temos de afastar esta negatividade e enfrentar os campos de batalha
com orgulho e esperança da pátria, porque estamos aqui por
obrigação e amor à pátria francesa.
Como sabeis, sou General e estou ligado à artilharia e não é tão
simples como parece, ver os nossos soldados cansados e esfomeados
enquanto confirmam o número de munições que se vai tornando
escasso depois de cada ataque. É triste!
Muitas das vezes, sem conseguir evitar, crio relações mais
próximas do que devia. Sendo General tenho que assumir uma postura
mais rígida para com os soldados e não ouvi-los lamentar. Mas por
dentro de mim, como já me conheceis, tenho deles pena por saber que
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não deverão durar muito nas trincheiras ou quando vão combater até
à terra de ninguém.
Ficámos todos mais animados quando soubemos que dia 6 de
Abril os Estados Unidos tinham declarado guerra à Alemanha.
Estávamos iludidos com a ideia de que, com essa declaração, os
alemães se iriam render pouco tempo depois. Mas enganámo-nos.
Ainda com esperança nos nossos corações, dia 16 de Abril decidimos
atacar a frente alemã. Todavia, esta não cedeu e por isso perdemos
muitos soldados. Mais dos que poderíamos. Muitos dos nossos
homens tentavam esconder a sua tristeza perante a perda de
camaradas, mas era impossível.
Como podeis imaginar tivemos de enterrar os corpos de
maneira rápida e eficiente, mas a única coisa que conseguimos foi
enterrar os corpos em meros buracos mal tapados. A nossa pior acção!
Porque estes buracos mal tapados trouxeram-nos tantos problemas e
prejudicaram-nos muito, pois o mau cheiro atraiu ratazanas e pragas,
infetando os nossos soldados e tornando a nossa estadia impossível.
Todos se queixam dos piolhos e dos ratos que lhes roubam a pouca
refeição diária que se resume a: um bocado de pão, alguma carne e
alguns legumes. Pior mesmo é ver soldados a beber água de poças
sujas do chão que a chuva intensa nos traz. Estas nossas refeições não
chegam para o nosso corpo cansado. Para o mínimo a que se deveria
ter direito. E os mantimentos que chegam levam uma eternidade a
alcançar o destino.
A ausência de higiene traz-nos bastantes doenças, entre elas a
“febre das trincheiras”, que se está a espalhar entre nós. As
enfermeiras das linhas da retaguarda queixam-se de haver pouca
gente e poucos recursos para tantos doentes, por isso mandámos
muitos dos feridos e doentes de volta para a casa. Eles aqui já nada
podem fazer e nunca irão recuperar inteiramente.
Muito lamento não ter boas notícias para lhe enviar. Guardo o
seu perfume na minha lembrança e vou dando notícias para que
saibais que estou vivo.
Pergunto-me como se encontram os nossos filhos e como tem
sido difícil educá-los sem a presença de um pai. Mas a guerra há-de
acabar e mantenho a esperança de em breve regressar a casa.
Com amor,
Jean Pierre Beaumont,
General
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http://www.prof2000.pt/users/avcultur/Postais3/Militaria/059_Militaria.jpg,
Consultado a 14/12/2015
8. De um sargento para o seu pai, por Miguel
Quintas
William Smith
9314 Main Street East Lesting
Olá Pai
Desde que saí da América como voluntário para combater na
guerra, tenho sentido muito a tua falta tua. Aqui todos pensávamos
que a guerra iria acabar cedo e, como sabes, foi por esse mesmo
motivo que decidi vir.
Aqui na frente ocidental fui inserido na artilharia, como eu sou
sargento não tenho tanto trabalho quanto as patentes mais baixas,
mas é muito complicado organizar o meu pelotão!
Aqui nas trincheiras, a nossa arma mais mortífera é o morteiro.
As batalhas que travamos são horríveis, um cenário que ninguém devia
ver, são tão sangrentas…! Após o barulho todo, gritos, tiros, explosões,
há sempre um período de silêncio, a mim, não perguntei a opinião de
outros soldados, deixa-me mais que nervoso.
Nestas trincheiras não há lugar para medricas. As trincheiras são
um lugar mesmo mau, não há higiene, e quando digo que não há, não
há mesmo! Faz muito frio, há imensos ratos, pulgas, e a lama é o
menos dificulta tudo!
Postais da Primeira Guerra Mundial
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Outro problema grave é a imensa lentidão nos abastecimentos,
deve ser difícil abastecer as trincheiras, mas sem os mínimos recursos,
os soldados ficam bastante nervosos. Aqui vai uma foto minha, em
grupo, com os soldados com que me dou melhor, quando voltar conto-
te mais detalhadamente!
Espero ver-te em breve.
Grande Abraço!
http://www.pomegranate.com/aa862.html, consultado a 14/12/2015
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://www.prof2000.pt/users/avcultur/Postais3/Militaria/054_Militaria.jpg
Consultado a 14/12/2015
9. De um soldado para os seus pais, por Patrícia
Gaitinha
Queridos pais:
A guerra é horrível, as trincheiras estão lamacentas e cheias de
ratos. A comida é rara e a que há é muito desidratada e mal chega para
todos.
Têm morrido muitos camaradas de armas, aqui na Frente
Ocidental. Usamos como armas as minas, as metralhadoras e os
alemães mandam-nos gás tóxico.
A vida tem sido muito difícil, pois as doenças como o pé de
trincheira ou a febre das trincheiras vão aparecendo constantemente,
os piolhos e as pulgas são insuportáveis quando nós queremos
combater o inimigo e não podemos, pois a maldição dos piolhos e das
pulgas não nos deixam fazer nada com a comichão. Os gases tóxicos
vão-nos matando constantemente. Gases que corroem os órgãos
vitais.
Isto aqui é muito diferente do nosso mundo, da nossa cidade, da
nossa aldeia. Isto aqui parece um matadouro e a terra de ninguém fica
muitas vezes coberta de cadáveres de soldados mortos, pois não os
conseguimos enterrar com os ataques constantes do inimigo.
Postais da Primeira Guerra Mundial
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Nós viemos para aqui servir o nosso país mas fomos enganados,
pois pensámos que a guerra só iria durar alguns meses. É muito duro
sobreviver nesta agonia pois não sabemos se isto algum dia vai ter fim.
É tempo de Natal, é tempo de paz, mas nós aqui nem
conseguimos dormir quando eventualmente temos tempo para
descansar.
Meus queridos pais, já tenho saudades vossas e dos vossos
carinhos e até das comidas da mãe. Esperem com paciência a minha
chegada, pois eu vou fazer o mesmo.
José do Mota
https://www.facebook.com/centenariogg.oficial/info/?tab=overview,
Consultado a 14/12/2015
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://casacomum.org/cc/visualizador?pasta=09022.002.093,
Consultado a 14/12/2015
10. De um general da infantaria farense para a sua
amada Raquel, por Raquel Canário
Faro, Portugal Rua Manuel Bivar, lote 5
Raquel Rodrigues 17 de julho, 1917
Minha querida amada Raquel,
Venho por esta carta, contar-te como têm sido as minhas últimas
semanas, enquanto como general da infantaria, aqui nas trincheiras da
fronteira entre França e o sul da Bélgica.
Como sabes, eu quero muito defender o que é nosso, o nosso
património português, e é por isso que estou aqui, nestas condições
miseráveis e a assistir a tantas batalhas frias e sangrentas, vendo
morrer diariamente tanta gente inocente.
O uso da arma Hotchkiss M1909 Benet-Mercie, tem posto muito
dos nossos adversários em grande risco de vida, o que nos facilita o
trabalho, mas a mim pessoalmente custa- me muito.
Viver, morar e dormir aqui nas trincheiras, cheias de ratos, lama
e condições muito lamentáveis e miseráveis é terrível.
Não consigo descansar nem uma hora seguida com medo que
me aconteça alguma coisa ou aos meus companheiros.
Cada dia que passa sinto mais a saudade do teu carinho, dos teus
abraços e do teu amor.
Voltarei em breve, Do teu amado Henrique
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://www.worldwar1postcards.com/patriotism.php,
Consultado a 14/12/2015
11. Do soldado Richard para Sophia, sua mãe, por
Ricardo Quintas
3 de dezembro de 1916
Frente Ocidental
Fui chamado para a guerra como já esperávamos mãe e acabei
por ficar na artilharia.
As batalhas são horríveis… sabendo que podes morrer de um
momento para o outro, vives sempre com medo. Só quero que acabe
para poder ir ter contigo.
As únicas armas que uso são uma espingarda com uma baioneta
e algumas granadas.
As trincheiras são um tormento, pois apanhamos muito frio e é
uma barbaridade viver aqui, sem condições de higiene, sem me
barbear ou mudar de roupa. Temos ratazanas e ratos por todo o lado.
A comida é pouca e até nos virem abastecer passamos imensa
fome, descansamos muito pouco, tendo em conta que acordamos de
madrugada.
Sinto-me como se fosse um prisioneiro de um sítio terrível, onde
nos obrigam a fazer coisas de que nos arrependemos.
Tenho bons companheiros, se isso te fizer sentir melhor. Espero
que nos voltemos a ver,
Do teu querido, Richard.
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://www.ufunk.net/en/insolite/une-collection-de-vieilles-cartes-postales-de-la-premiere-
guerre-mondiale/ Consultado a 14/12/2015
12. Do general Joroslaw para o seu amigo, por
Rodrigo Silva
Frente ocidental, 15 novembro de 1916
Olá caro amigo
Espero que esteja tudo bem contigo e com a tua família.
Estou a combater na frente ocidental pois apesar de ter nascido
na Rússia os meus pais são franceses e apresentei-me como voluntário
para ajudar a varrer os alemães da França.
Apesar de ser general, a vida nas trincheiras também são muito
complicadas para mim, pois passo frio e fome e, como deves imaginar,
as condições de higiene são deploráveis e os animais, tais como ratos e
pulgas são cada vez mais.
Na semana passada sofreremos um ataque inimigo muito forte.
Fiquei gravemente ferido, mas graças à enfermeira Nicole consegui
sobreviver.
Um abraço
Postais da Primeira Guerra Mundial
22
http://oldworldwar.com/2015/03/30/the-poilu-in-postcards/
Consultado a 14/12/2015
13. Do soldado Vasco Maria para os pais e irmã, por
Vasco Farinha
Queridos pais e irmã
Espero que quando lerem esta carta esteja tudo bem de saúde.
Neste momento estou colocado na Frente Ocidental como soldado de
artilharia e quando vim tinha como intenção o meu dever patriótico,
para que todos pudéssemos ter um futuro melhor. Mas agora
apercebi-me que isto é totalmente diferente do que eu pensava!
Tivemos que escavar as trincheiras que têm dois metros de
profundidade e vários quilómetros de extensão. O grande problema
das trincheiras têm é que quando chove fica tudo inundado, criando-se
um “mar” de lama.
Nós temos que combater, comer e dormir todos encharcados e
isso impede-nos de aquecer. O cheiro a morte já é constante, como
temos cadáveres em decomposição aqui por perto aparecem muitos
ratos em busca de alimento.
Também há falta de higiene e descanso. Não temos assim tantas
horas de descanso por causa das constantes batalhas e por passarmos
o tempo a escavar as trincheiras!
Higiene não há porque sujamo-nos todos com a terra quando
estamos a combater e depois temos a lentidão dos abastecimentos
Postais da Primeira Guerra Mundial
23
como: a comida enlatada mal chega para todos, a falta de tropas para
nos substituir, pois a fadiga e a desmotivação de combater já é muita.
A vida tem sido difícil aqui, nós queremos combater contra os
Alemães mas os piolhos e as pulgas não deixam devido à comichão.
Finalmente tivemos ordem para sermos substituídos mas fomos
violentamente atacados pelo exército alemão que tem um armamento
mais sofisticado e táticas de guerra mais avançadas. Felizmente
consegui sobreviver a este ataque que matou vários camaradas meus.
Houve alguns que ficaram prisioneiros, outros desertaram e alguns até
se suicidaram. É o inferno na Terra para o Corpo Expedicionário
Português. O sítio onde travámos esta batalha chama-se Vale de Lys.
Espero ansiosamente rever-vos neste Natal.
Um abraço e um beijinho para todos do vosso filho e irmão
adorado.
Vasco Maria
Uma fotografia com os meus camaradas de armas. Conseguem
descobrir-me?
https://www.facebook.com/centenariogg.oficial/info/?tab=overview,
Consultado a 14/12/2015
Postais da Primeira Guerra Mundial
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http://warwitness.e2bn.org/resource_37.html Consultado a 14/12/2015
14. Charles Kléber escreve a sua mãe, por Vera
Mateus
10 de janeiro de 1915 Para Norma Kléber
Rua: Lüderßstraße Nº11, Berlim
Minha amada Mãe:
Escrevo esta carta, tal como a anterior, para a senhora saber que
continuo vivo, e também porque é algo que me ajuda a passar o
tempo quando nada se passa. Espero que esteja tudo bem por aí, pois
não há melhor do que saber que embora aqui tudo esteja errado, a
mãe aí está bem. Aqui tudo é difícil…Não durmo há dois dias pois os
ataques começam, na sua maioria, de madrugada. No entanto, neste
momento de calmaria, também não tenho vontade de fechar os olhos
devido ao medo de ter de acordar para ver que mais uma dúzia de
companheiros morreram ou ficaram feridos.
Vim para aqui a pensar que voltaria rápido mas estou a ver que
poderemos nunca mais nos ver… Sei que o Pai não ficaria orgulhoso de
mim, pois decidiu que a guerra era algo a que ninguém se deveria
submeter. Mas foi por ele que me alistei, e agora, como soldado faço
parte da artilharia, de onde ele fez parte um dia. Aqui na frente
ocidental todos os dias matamos quase cem soldados do exército
inimigo que são mandados à terra de ninguém apenas com uma
espingarda, enquanto aqui utilizamos uma metralhadora… é uma
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carnificina. Eu, por acaso, não estou encarregue de ir à terra de
ninguém fazer a reparação de arames ou mesmo sair das trincheiras
para atacar o inimigo, o que é uma sorte pois da mesma maneira que
nós os matamos a eles, eles matam-nos a nós. Mas não é apenas
devido às armas, bombas e gás que vários soldados aqui morrem,
Mãe…
Todos os dias temos de lidar com piolhos, ratos, pulgas, arame
farpado, cadáveres, para os quais temos de construir covas
subterrâneas, soldados feridos e doenças. Neste momento maior parte
dos nossos soldados tem doenças, como infeções ou febres, e a
lentidão dos reabastecimentos faz com que maior parte deles não
sobreviva. Já não temos roupa que nos proteja do frio pois a que
tínhamos neste momento está coberta de lama que não a deixa secar.
Ainda me lembro dos nossos jantares em família… tenho tantas
saudades de ter uma refeição decente para comer. Aqui comemos
muito pouco e tudo feito em cozinhas improvisadas onde temos a
companhia de ratos à procura de comida como nós. Mesmo esta
pouca comida também não me dá vontade de comer devido ao cheiro
vindo dos amontoados de corpos dos meus companheiros mortos.
Como pode ver, Mãe, é a isto que se resume a guerra e espero
sinceramente que isto acabe e que consiga sobreviver para nos
voltarmos a ver. Vou continuar a mandar cartas sempre que tiver
oportunidade mas compreenda que até esta poderá ser a última.
Com muito amor, Charles Kléber
http://webodysseum.com/history/studio-portraits-of-german-soldiers-wwi/, consultado a
14/12/2015
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http://littlecrow.deviantart.com/art/WWI-75088398, consultado a 14/12/2015