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Revista Contexturas, n° 24, p. 50 - 71, 2015. ISSN: 0104-7485 50 PRECISÃO GRAMATICAL E PROFICIÊNCIA ORAL EM LÍNGUA INGLESA: UM ESTUDO DE CASO Douglas Altamiro CONSOLO 1 Isabella DALLACQUA 2 Aline Mara FERNANDES 3 UNESP, São José do Rio Preto, SP RESUMO Neste trabalho apresentamos resultados de uma investigação que objetiva descrever a precisão gramatical, em língua inglesa, nas falas de alunos-formandos em Letras produzidas em apresentações orais de seminários em sala de aula, com o intuito de categorizar os desvios gramaticais, visando a colaborar para uma descrição da proficiência oral em inglês desses alunos. Palavras-chave: Avaliação; Precisão gramatical; Proficiência oral. ABSTRACT In this paper we present results from an investigation that aimed at describing grammatical accuracy in spoken English, in utterances of students graduating from a Letters course, produced in oral presentations in class, with the goal of categorizing the grammatical deviations, and of helping towards a description of the students’ oral proficiency. Keywords: Assessment; Grammatical accuracy; Oral proficiency. 1 E-mail de contato: [email protected] 2 E-mail de contato: [email protected] 3 E-mail de contato: [email protected]

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Revista Contexturas, n° 24, p. 50 - 71, 2015. ISSN: 0104-7485

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PRECISÃO GRAMATICAL E PROFICIÊNCIA ORAL EM LÍNGUA

INGLESA: UM ESTUDO DE CASO

Douglas Altamiro CONSOLO1

Isabella DALLACQUA2

Aline Mara FERNANDES3

UNESP, São José do Rio Preto, SP

RESUMO

Neste trabalho apresentamos resultados de uma investigação que objetiva descrever a

precisão gramatical, em língua inglesa, nas falas de alunos-formandos em Letras

produzidas em apresentações orais de seminários em sala de aula, com o intuito de

categorizar os desvios gramaticais, visando a colaborar para uma descrição da

proficiência oral em inglês desses alunos.

Palavras-chave: Avaliação; Precisão gramatical; Proficiência oral.

ABSTRACT

In this paper we present results from an investigation that aimed at describing

grammatical accuracy in spoken English, in utterances of students graduating from a

Letters course, produced in oral presentations in class, with the goal of categorizing

the grammatical deviations, and of helping towards a description of the students’ oral

proficiency.

Keywords: Assessment; Grammatical accuracy; Oral proficiency.

1 E-mail de contato: [email protected] 2 E-mail de contato: [email protected] 3 E-mail de contato: [email protected]

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Introdução

Quando pensamos nos fatores que influenciam o ensino de uma língua

estrangeira (LE), um dos aspectos importantes para se considerar consiste no

nível de proficiência na língua-alvo do professor, para o exercício da

docência. E sabemos que a realidade de uma formação acadêmica de

professores de LE, no que se refere a cursos e certificações para o ensino, nem

sempre garante que esses professores recém-formados terão um nível de

proficiência linguística desejado para a profissão (CONSOLO, 2011;

FERNANDES, 2011).

Uma discussão atual e relevante na área de formação de professores

de línguas estrangeiras abrange a questão da proficiência linguística

necessária para que tais professores possam, e se apropriado para os contextos

nos quais lecionam, ministrar suas aulas na língua estrangeira (LE) que

ensinam, em vez de conduzirem suas aulas em língua materna. E, para

constatarmos os níveis de proficiência dos professores, em formação e

formados, contamos com os conhecimentos e procedimentos da área da

avaliação de proficiência em línguas.

No âmbito da Linguística Aplicada, vários estudos, hoje, se

preocupam com a questão da avaliação. O projeto “Avaliação da proficiência

linguístico-comunicativa-pedagógica do professor de línguas:

operacionalização de construto no Exame de Proficiência para Professores de

Língua Estrangeira”, por exemplo (CONSOLO, 2011), constitui uma proposta

com intuito de definir critérios mais específicos para a avaliação da

proficiência dos profissionais recém-formados em cursos de Licenciatura em

Letras. O referido projeto almeja, principalmente, a implementação do EPPLE

(Exame de Proficiência para Professores de Línguas Estrangeiras) no Brasil,

um exame que considera não somente a competência linguística do professor

em termos de sua proficiência para usos diversos e gerais da LE, mas também

sua habilidade para lidar com a metalinguagem em sala de aula.4

A pesquisa relatada neste artigo, conduzida em caráter de iniciação

científica (IC), objetivou colaborar com o projeto maior de elaboração do

EPPLE, considerando a teoria em avaliação e uma coleta de dados de natureza

oral e, por meio da discussão envolvendo esses aspectos, chegar a resultados

que poderão ser usados para uma posterior comparação com resultados de

4 Sobre a proposta do EPPLE, vide Consolo e Teixeira da Silva, 2014, e Consolo et

alii, 2009.

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futuras versões e aplicações do EPPLE, já que todos os alunos em questão

neste estudo são possíveis candidatos ao referido exame. Os dados foram

coletados em uma universidade pública, no interior do estado de São Paulo,

com alunos-formandos (cursando o último ano) de um curso de Licenciatura

em Letras Inglês-Português.

Almejamos, com o relato de pesquisa e a discussão apresentados neste

artigo, contribuir também para a divulgação, a professores de língua inglesa e

outros profissionais, de algumas bases teóricas sobre precisão gramatical na

oralidade e dos resultados de nosso estudo, motivando outros estudos

semelhantes que possam ampliar nossos conhecimentos sobre avaliação de

proficiência em línguas estrangeiras.

Objetivos da investigação

Objetivos Gerais

O objetivo do trabalho de IC aqui apresentado foi realizar uma análise

de dados sobre a proficiência oral de futuros professores de inglês como

língua estrangeira, por meio (a) da transcrição de apresentações orais, em

inglês, feitas por alunos do último ano do curso de Licenciatura em Letras,

que constituem dados do projeto “Avaliação da proficiência linguístico-

comunicativa-pedagógica do professor de línguas: operacionalização de

construto no Exame de Proficiência para Professores de Língua Estrangeira

(EPPLE)”,5 iniciado em 2011 (CONSOLO, 2011), para dar continuidade às

metas propostas para elaboração e implementação do exame, e para o

estabelecimento de sua validade; e (b) da investigação de características

linguísticas presentes nas transcrições das falas dos alunos.

Buscou-se, à luz dos subsídios teóricos que embasam a investigação

das características e da qualidade da fala, em inglês, de alunos-professores em

formação, analisarem-se aspectos linguísticos dessas falas e, especificamente

neste projeto, a qualidade da precisão gramatical na produção oral, em língua

inglesa, dos licenciandos. Foi feita uma análise dos tipos de desvios

gramaticais nas falas dos alunos e da frequência da ocorrência desses desvios,

tendo como referência uma unidade de análise denominada AS-unit (Unidade

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de Análise de Fala), critério este sugerido por Foster et al. (2000) e utilizado

anteriormente por Busnardi (2012). Salienta-se que, no caso deste projeto, não

são tratados propriamente os dados do EPPLE, e sim dados de produção oral

de alunos candidatos ao EPPLE, em uma situação autêntica e real de uso da

língua inglesa, a saber, as apresentações de seminários temáticos em sala de

aula.

As atividades desenvolvidas nesta investigação, além de contribuir

para a elaboração e implementação do referido exame de proficiência

proposto para (futuros) professores de línguas estrangeiras no contexto

brasileiro, salientando possíveis características gramaticais do desempenho

linguístico desses (futuros) professores em contexto de ensino/aprendizagem

da língua estrangeira, fornecem subsídios para futuros trabalhos de pesquisa

na área de ensino/aprendizagem de línguas, especialmente nos estudos sobre

avaliação.

Objetivos Específicos

1) Transcrever 13 (treze) gravações de apresentações orais de

seminários, realizadas por alunos do último ano do curso de

Licenciatura em Letras com habilitação em inglês e português, de

uma universidade pública do estado de São Paulo. As apresentações

orais, em inglês, foram gravadas em áudio e em vídeo.

2) Uma vez produzidas as transcrições, objetivou-se categorizá-las com

base no conceito de AS-unit (Unidade de Análise de Fala), e elencar

uma tipologia de desvios gramaticais presentes nos dados, utilizando-

se também procedimentos de quantificação (frequência de desvios),

para avaliação da precisão gramatical na produção oral dos

participantes do projeto.

Conceitos Teóricos

Proficiência Oral

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A caracterização da proficiência oral (PO) do professor de inglês

como língua estrangeira faz-se necessária devido a um nível mínimo exigido

para que o formando em um curso de Licenciatura em Letras com habilitação

em língua inglesa possa atuar como profissional nessa área, utilizando a

linguagem oral especificamente para esse fim.

Neste trabalho, focou-se na competência e na proficiência dos alunos-

formandos em Letras, observando as manifestações linguístico-comunicativas

da língua. De acordo com Llurda (2000), a habilidade de comunicação pela

linguagem (communicative language ability), divide-se em proficiência

linguística e proficiência comunicativa. Nesse caso, o profissional tem que se

preocupar tanto com aspectos do código linguístico, como a gramática, e com

a habilidade de se comunicar efetivamente na língua, ou seja, “passar a

mensagem”. Para Edmonson (1981, apud LLURDA, 2000: 88) competência

linguística significa codificação, decodificação e sequenciamento de atos

comunicativos, o que também inclui o conhecimento dos códigos linguísticos

da língua.

Como já mencionado, um aspecto importante a ser levado em

consideração na avaliação da proficiência linguística é a gramática, uma vez

que ela é um dos fatores essenciais na produção e estruturação da fala. No

entanto, ao observamos a precisão gramatical do aluno, faz-se necessário levar

em consideração o fato de que a fala é marcada pela imprevisibilidade, sendo,

neste e em outros aspectos, diferente da escrita. No presente trabalho, em que

são avaliados seminários em contextos reais da fala em sala de aula, os

aspectos característicos da fala devem ser levados em conta, e, por isso,

situações com autocorreções instantâneas feitas pelo próprio falante, por

exemplo, foram desconsideradas, analisando-se somente os desvios

gramaticais que não foram corrigidos ou modificados.

Unidade de Análise: a AS-unit

Para a segmentação e análise da linguagem oral, Foster et al. (2000)

sugerem uma unidade de análise sintática denominada AS-unit (Unidade de

Análise da Fala), definida como: “o enunciado de um único falante que

consiste em uma oração independente, ou numa unidade não oracional, junto

com qualquer oração(ões) subordinada(s) associada(s) a elas. (…)” (FOSTER

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et al., 2000, p. 365).6 Ao sugerirem o modo de se fazer a segmentação dos

dados, Foster et al. (2000) conseguem abarcar as peculiaridades da língua

falada relevantes para a análise de dados orais. Nesta pesquisa, a AS-unit foi

adotada, portanto, como a unidade de análise dos dados.7.

A título de ilustração, vejamos as considerações de Borges-Almeida

(2009, p. 82) sobre essa unidade de análise, com base nos exemplos de Foster

et al (2000, p. 369, 364).

(a) A: | oh that’s a big problem

B: oh no!

A: :: because my shop’s policy is only :: to give the credits for the

return goods |

(b) A: I think um (3.0) yeah it’s hard maybe he like her but no like

a girlfriend, just a

B: just like a sister

A: yeah

Em (a), A continua falando apesar da interrupção de B, portanto

temos a continuação da mesma AS-unit. Em (b), temos um fenômeno de

andaime. B completa o turno de A e, por isso, recebe uma AS-unit. Se A

tivesse repetido “just like a sister” e continuado, teríamos uma mesma AS-

unit, a partir da última fala sua. Como ele apenas diz “yeah”, temos de

desconsiderar “just a”, colocando como um falso início e considerar “yeah”

como uma unidade completa.

Metodologia da Investigação

A primeira etapa do trabalho consistiu na elaboração de transcrições

de seminários apresentados por dezenove alunos-formandos do curso de

Licenciatura em Letras, no ano de 2012, em uma universidade do interior de

São Paulo. Dentre treze seminários, sete deles foram apresentados

individualmente e os seis restantes em duplas. Todos os seminários foram

6 No original: a single speaker’s utterance consisting of an independent clause or sub-clausal

unit, together with any subordinate clause(s) associated with either. 7 A AS-unit é explorada mais detalhadamente na seção seguinte (seção 4) deste artigo.

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gravados em formato de áudio e de vídeo. É importante ressaltar que nem

todo o material pode ser aproveitado por problemas em relação à qualidade do

áudio. Devido a fatores externos, como barulhos e conversas fora da sala de

aula, ou alunos que falaram muito baixo durante o seminário, tornou-se difícil

o entendimento claro de todas as suas falas. Cinco transcrições tiveram que

ser descartadas, pois não havia material suficiente para a análise da

proficiência oral dos alunos em questão. Em um específico seminário, as

alunas apenas leram toda a apresentação dos slides, o que não demonstra uma

situação de uso real da língua em termos de manifestações de proficiência em

produção oral e, por isso, também foi descartado.

As transcrições dos seminários foram feitas de acordo com um

sistema de códigos para que se pudesse identificar características da fala dos

interlocutores, tais como:

A = fala do aluno/examinado P = fala da professora-participante

(school) = o que provavelmente foi dito (INCOMP) = fala incompreensível

+ = pausa breve (menos de 1 segundo) [2] = duração de pausa em segundos

{ASC} = entonação ascendente {DESC} = entonação descendente ? = entonação típica de pergunta

((risada)) = ocorrências paralinguísticas [ ] = falas simultâneas = = turno interrompido : = alongamento de som

/.../ = quebra de turno para fins de categorização ENglish = sílaba enfatizada

- - = trechos desconsiderados para análise

Os onze alunos que participaram deste estudo foram identificados por

letras, de A a K.

Assim que as transcrições eram finalizadas, eram revisadas pelo

professor-orientador do estágio de IC e também por outra pesquisadora

participante do projeto do EPPLE.

A próxima etapa do trabalho consistiu na segmentação dos dados das

transcrições em AS-units, como já mencionado anteriormente, unidade de

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análise escolhida para este trabalho, a qual é uma unidade de base sintática,

que considera características relevantes da produção oral, tais como

marcadores conversacionais, pausas, autocorreções e falsos inícios.

Primeiramente, colocamos entre chaves {...} os trechos disfluentes,

que podem ser pausas preenchidas, marcadores conversacionais, falsos

inícios, palavras não lexicalizadas, reestruturação, ou trechos produzidos em

português, dentre outros. Após a demarcação desses trechos disfluentes, as

AS-units são demarcadas por barras verticais |...|, nas quais orações

coordenadas entre si são delimitadas separadamente e orações principais e

suas subordinadas são delimitadas juntas. É importante ressaltar que

autocorreções foram desconsideradas neste trabalho, assim como os trechos

disfluentes, e os trechos demarcados por hifens - -, pois não continham

material suficiente para análise.

Depois de termos as transcrições segmentadas em AS-units, foi

realizada manualmente a contagem de unidades produzidas por cada aluno e o

levantamento de desvios, para, posteriormente, calcular o índice de desvios

cometidos pelos alunos em cada unidade.

Segue a fórmula para calcularmos o índice de desvio por unidade:

Índice desvio-unidade = frequência de desvios ÷ frequência de AS-units

Portanto, para a apresentação dos resultados obtidos na análise, cada

aluno terá sua apresentação brevemente comentada individualmente e

exemplificada com um dos desvios encontrados, seguido de um gráfico com

seus desvios divididos em categorias, e o resultado de seu índice de desvio por

unidade.

É importante ressaltar que várias dificuldades em relação às

transcrições foram encontradas. Problemas com áudio ou até mesmo com o

sotaque do aluno, fazia com que a aluna-estagiária tivesse que ouvir muitas

vezes cada seminário, e em alguns casos, isso não era suficiente. No entanto,

o trabalho realizado muito contribuiu para a formação da aluna-estagiária,

pois exigiu um bom entendimento oral da língua inglesa para a realização das

transcrições, um conhecimento sintático para a divisão das AS-units e um

conhecimento linguístico da língua-alvo para o levantamento de dados.

Análise dos Dados

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Conforme mencionado anteriormente, os dados desta pesquisa foram

obtidos a partir das transcrições de treze seminários apresentados no ano de

2012 por alunos-formandos de um Curso de Licenciatura em Letras de uma

universidade do estado de São Paulo. Como cinco desses seminários foram

descartados, serão apresentados os resultados da análise de apenas oito

seminários, com o total de onze alunos-participantes.

Para cada aluno, foi feita uma análise qualitativa e uma quantitativa

de sua apresentação. Para a análise qualitativa, levantamos os desvios e os

dividimos em categorias. Todos os desvios foram levantados tomando-se

como base a língua inglesa padrão, desconsiderando os casos em que os

alunos se corrigiam imediatamente. Para a análise quantitativa, contamos o

número de desvios cometidos por cada aluno e o dividimos pelo número de

AS-units, contado manualmente pela estagiária. Assim, foi possível encontrar

o índice de desvios por unidade de cada aluno.

Como não foram encontrados apenas desvios gramaticais, utilizou-se

o mesmo sistema de categorização utilizado por Busnardi (2012), no qual se

incluiu a categoria de léxico (lex), uma vez que o uso indevido de uma palavra

pode provocar desvios sintáticos, levando a um possível desvio gramatical.

Também incluímos a categoria sintaxe (sin), na qual se enquadraram os

desvios difíceis de serem classificados em apenas uma categoria, pois

envolviam mais de um constituinte no enunciado.

Precisão gramatical nos seminários

Na Tabela 1, abaixo, segue o número de AS-units, o número de

desvios e o índice de desvios-unidade cometidos por cada aluno nos

seminários apresentados. É importante ressaltar que, quanto menor o índice

desvio-unidade do aluno, maior a sua proficiência oral.

Aluno Número de AS-units

Frequência absoluta de desvios

Índice de desvios

A 45 6 13%

B 36 7 16%

C 32 3 9%

D 27 9 33%

E 69 16 23%

F 44 2 4%

G 20 3 15%

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H 32 9 28%

I 36 9 25%

J 97 12 12% K 65 7 10%

Tabela 1: Índices quantitativos da precisão gramatical dos alunos nos seminários

A partir dos resultados, pode-se notar que a maioria dos alunos

apresentou um número alto no índice de desvio-unidade. No entanto, é

importante levar em consideração que alguns seminários foram apresentados

individualmente e, outros, em duplas. Por isso a grande diferença de

quantidade de AS-units produzidas por cada aluno. No caso da aluna J, que

produziu noventa e sete AS-units, maior número produzido na turma, seu

índice de desvios não foi tão alto em relação aos demais (12%). Já no caso da

aluna D, que produziu apenas vinte e sete AS-units, segundo menor número da

turma, seu índice foi o maior em relação aos demais (33%).

É relevante também salientar que todos os alunos em questão são

possíveis candidatos ao EPPLE. Se testados, a partir dos resultados

quantitativos nesta investigação, será possível verificar a relação dos índices

quantitativos com suas faixas classificatórias no exame, em estudos futuros.

Apresentamos, a seguir, um quadro das categorias dos desvios

gramaticais encontrados nos seminários e as siglas utilizadas, na análise dos

desvios, para cada categoria.

Quadro1: Categorias dos desvios gramaticais nos seminários

Trataremos, na sequência deste artigo, da apresentação dos desvios

cometidos por cada aluno.

Sigla Significado

Adv Advérbio

Art artigo ou determinante

Lex léxico (escolha lexical inadequada)

Flex flexão de nome

Prep Preposição

Pron Pronome

Sint sintaxe (estruturação sintática inadequada)

Verb verbo (tempo e/ou aspecto inadequado(s))

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A aluna A produziu 45 AS-units e cometeu seis desvios, resultando

em um índice de 13%. Como mostra o gráfico, seus desvios se dividiram em

três categorias, entre elas verb (três desvios), sint (2) e prep (1).

Excerto 1

001 A |community college + {ahm} + can be considered a: preparation before

to go to the college or university|

Como vemos no excerto 1, a aluna apresenta um desvio na forma

verbal ao usar a partícula to em to go, ao invés de usar a forma com –ing

(going) requerida pela preposição before, que a antecede.

A aluna B produziu 36 AS-units, cometeu sete desvios e ficou com

um índice de 19%. Como mostra o gráfico a seguir, os sete desvios deste

aluno se estenderam por cinco categorias, são elas: verb (2), sint (1), prep (1),

flex (2) e lex (1).

Excerto 2

005 B |the class time is generally is from eight to three p.m. |

Como vemos no excerto 2, a aluna B utilizou o verbo is novamente

em sua sentença, apresentando um erro sintático. Consideramos esse caso

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como erro devido ao fato de não haver pausas significativas entre a forma

verbal is e o advérbio generally, nem entre o advérbio e a segunda ocorrência

de is. Se houvessem pausas localizadas entre essas palavras, poderiam indicar

que a aluna, na verdade, refez o enunciado enquanto o produzia, ou seja,

alterou o que iria dizer, de “the class time is from eight to three p.m.” para

“the class time generally is from eight to three p.m.” e neste caso, a repetição

da forma is não seria um desvio gramatical, mas um aspecto presente na

gramática da modalidade oral.

No contexto de sua ocorrência, esse desvio também não prejudicou o

entendimento dos demais interlocutores, mas, em algum outro contexto, isso

poderia ter interferido na comunicação. Levando em consideração seu índice

de 16%, um pouco acima da média da turma, podemos dizer que a aluna

comete erros básicos referentes à gramática da língua inglesa, porém, a

compreensão da sua fala pelos interlocutores não é tão prejudicada.

O aluno C produziu 32 AS-units e cometeu apenas 3 desvios,

resultando em um índice de desvios de 9%. Como podemos observar no

gráfico abaixo, os desvios desse aluno se dividiram entre três categorias,

tendo cada uma um desvio, sendo elas prep, lex e art.

Excerto 3

|today we can climb the + three hundred + fifty four steps + to look + through +

{ahm} + crowd + and watch the back of + new york + and new jersey|

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Como se pode observar no excerto 3, o aluno C não utilizou o artigo

the em through the crowd, e, na segunda parte, usou o verbo watch ao invés

de see, por exemplo. Nos dois casos os desvios podem causar confusão no

entendimento da sua fala.

O aluno D produziu 27 AS-units e cometeu 9 desvios, resultando em

um índice de 33%. Como podemos observar em seu gráfico, seus desvios se

dividiram entre cinco categorias, sendo elas verb (2), sint (1), prep (4), lex (1)

e art (1).

No excerto 4, observamos que o aluno não utiliza o pronome it, e

como envolve vários termos na oração, podendo comprometê-la, esse desvio

foi classificado como de sintaxe. No outro desvio, o aluno utiliza a proposição

on em vez da preposição in. Levando-se em consideração seu alto índice de

desvios, o mais alto da sala, conclui-se que esse aluno comete um grande

número de desvios, que podem ou não prejudicar a comunicação.

Excerto 4 |and since then + has been essential to economy + on orlando + and all unites states|

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O aluno E produziu 69 AS-units e cometeu 16 desvios, resultando em

um índice de 23%. Como podemos observar em seu gráfico, seus desvios se

dividiram entre cinco categorias, sendo elas verb (12), sint (1), lex (1), prep

(1) e art (1).

Excerto 5

|and + one day + they have a idea|

No excerto 5, vemos que o aluno cometeu dois desvios. Um em

relação ao verbo, que deveria estar no passado na forma had, e um em relação

ao artigo, que deveria ser an ao invés de a. Nesse contexto, nenhum dos

desvios prejudicou a comunicação, no entanto, o uso incorreto das formas

verbais poderia atrapalhara compreensão da fala em outros contextos.

Levando-se em conta seu índice de 23%, que é maior que o da média da

classe, conclui-se que o aluno cometeu vários desvios, mas isso também pode

estar ligado ao fato que ele também produziu bem mais unidades do que a

média da produção da classe.

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O aluno F produziu 44 AS-units e cometeu apenas 2 desvios,

resultando em um índice de 4%, o menor da classe. Como podemos observar

no gráfico abaixo, seus desvios foram apenas relacionados à categoria dos

verbos.

Excerto 6

| [2] the popularity + of the holiday + has become proFItable for comercials|

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No excerto 6 vemos que o aluno F não utilizou corretamente a forma

no passado do verbo become, que deveria ser became, no passado simples,

devido ao contexto do enunciado, em vez de o presente perfeito. Esse tipo de

desvio pode prejudicar a compreensão da fala em certos contextos como já

dito anteriormente, mas esse aluno apenas cometeu dois desvios, o que nos diz

que sua precisão gramatical é bem alta em relação aos demais alunos.

O aluno G produziu apenas 20 AS-units e cometeu 3 desvios,

resultando em um índice de 15%. Em seu gráfico observamos que este aluno

teve seus desvios distribuídos em apenas duas categorias, sendo elas verb (2)

e prep (1).

Excerto 7

|+ would you to read please?|

No excerto 7 vemos que o aluno fez o uso incorreto da preposição to,

que não era necessária nessa sentença. Pelo índice deste aluno, diríamos que

sua precisão é boa em relação aos demais alunos por estar abaixo da média da

turma, porém, esse baixo índice pode se dar pelo fato da pequena produção de

AS-units (20), sendo a menor produção entre os alunos investigados.

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O aluno H produziu 32 AS-units e cometeu 9 desvios, resultando um

índice de 28%. Pelo seu gráfico, vemos que os desvios deste aluno foram

divididos em quatro categorias, sendo elas verb (3), sint (2), lex (1) e art (3).

Excerto 8

|is very important + this movie + because + {é} + talk about a his + a history of +

american civil war + in eighteen five two|

No excerto 8, no primeiro desvio, vemos que o aluno utilizou, em vez

de o artigo the, o artigo a, e no segundo desvio, verificamos que o aluno diz

eighteen five two ao invés de eighteen fifty-two, o que foi considerado como

erro de uso do léxico. Os desvios relacionados ao léxico podem causar

problemas na compreensão da fala desse aluno. De acordo com seu índice,

que está acima da média, esse aluno cometeu bastante desvios e sua precisão

gramatical não é tão alta em relação aos demais alunos.

O aluno I produziu 36 AS-units e cometeu 9 desvios, resultando em

um índice de 25%. Em seu gráfico vemos que seus desvios foram distribuídos

em quatro categorias, sendo elas verb (4), sint (1), lex (1) e art (3).

Excerto 9

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|{ahn} steve vai is a complete music|

No excerto 9, verifica-se mais um caso de uso incorreto do léxico. O

aluno usa music ao invés de musician. Esse aluno apresenta desvios muito

básicos em relação à língua-inglesa padrão, apesar de seu índice de desvios

não ser o mais baixo.

O aluno J produziu 97 AS-units (maior número da sala) e cometeu 12

desvios, resultando em um índice de 12%. Em seu gráfico observamos que

seus desvios se dividiram em cinco categorias, sendo elas verb (5), pron (1),

prep (1), lex (1), art (4).

Excerto 10

| + frank mardi gras + it came + to america + in sixteen + ninety nine + with a

french + exploration|

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No excerto 10 vemos que a aluna utilizou inseriu o pronome it no

enunciado de forma incorreta, pois a forma pronominal correta seria he. Pelo

seus índices de produção oral e de desvios, pode-se concluir que a fala dessa

aluna tem uma boa precisão gramatical, pois produziu 97 AS-units, um

número bem elevado se comparado aos demais alunos, e cometeu 12 desvios.

O aluno K produziu 65 AS-units e cometeu 7 desvios, resultando em

um índice de 10%. Em seu gráfico observamos que seus desvios foram

distribuídos em quatro categorias, sendo elas verb (1), sint (1), prep (1) e art

(4).

Excerto 11

|this is characteristics + for this movement|

No excerto 11 podemos observar três desvios. Ao voltarmos ao áudio,

percebemos que o aluno estava mostrando algo no slide, por isso, deveria ter

dito these are the characteristics. Portanto, temos dois desvios relacionados a

artigos e um a verbo. Pela sua alta produção de AS-units (65) e seu baixo

índice de desvios, podemos concluir que, mesmo com alguns desvios básicos,

sua precisão gramatical é alta.

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Na totalidade da contagem absoluta das ocorrências dos desvios

gramaticais, a maioria ocorreu na categoria “verbos”, contabilizando 35

desvios, seguida das contagens de 11 desvios tanto para “itens lexicais” como

para “preposições”. Verifica-se ainda que, para o aluno E, para quem

contabilizou-se a maior produção de AS-units (69 AS-units), o número maior

de desvios cometidos por esse aluno foi justamente na categoria “verbos”, um

desvio na categoria “itens lexicais” e um desvio na categoria “preposições”,

equiparando-se, nesses dois últimos itens, à maioria dos demais alunos

investigados. Tais dados nos levam a depreender desses resultados que (a) o

uso de formas e de tempos verbais representa um desafio maior para

aprendizes de inglês como língua estrangeira e (b) parece ser necessário

trabalhar-se mais, praticar mais a LE de modo a permitir que os aprendizes

consolidem melhor o uso dos verbos na linguagem oral, o mesmo valendo

para itens lexicais e uso de preposições. E ainda que (c) essas três categorias

possam ter saliência nos critérios de avaliação de proficiência oral, no que

tange a questão da precisão gramatical em língua inglesa.

Passamos, agora, às considerações finais sobre nossa investigação.

Considerações Finais

Este trabalho teve o intuito de contribuir com o projeto maior em

vigência do exame EPPLE, o qual visa avaliar a proficiência oral e

comunicativa dos alunos-formandos em Letras, de recém-formados

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professores de língua estrangeira, bem como de professores no exercício da

profissão, através de dados qualitativos e quantitativos da proficiência oral.

A primeira parte do nosso trabalho consistiu na transcrição de treze

seminários em contexto real de sala de aula, apresentados por dezenove

alunos-formandos no curso de Letras, em uma universidade do interior de São

Paulo. O material analisado neste trabalho totalizou oito apresentações de

seminários e onze alunos avaliados individualmente.

A segunda parte do trabalho consistiu na divisão das AS-units,

unidade de análise sintática sugerida por Foster (2000). Em seguida, o

levantamento dos desvios de cada aluno foi feito e categorizado em oito

diferentes categorias (verbo, sintático, léxico, preposição, flexão de nome,

artigo, advérbio e pronome). Depois de termos o número de AS-units, contado

manualmente, mais o número de desvios, pudemos calcular o índice de

desvios por unidade de cada aluno.

Com os resultados obtidos, observou-se que a maioria dos alunos

ficou com o um índice muito alto em relação à média da própria turma. É

importante levar em consideração que alguns alunos produziram um número

muito maior de AS-units do que outros, e que esses alunos que produziram

mais, apresentavam maior proficiência oral (observável) na língua-alvo,

mesmo que alguns não tenham obtido um índice tão bom. Considerando que

produziram mais unidades, estavam mais suscetíveis a cometer desvios.

É importante ressaltar que, apesar de os dados não serem do exame

EPPLE, eles podem servir de comparação em um momento futuro quando

esses mesmos alunos prestarem o exame, já que todos eles são possíveis

candidatos. Será possível comparar o desempenho no EPPLE com os índices

obtidos e observar a evolução desses alunos, na proficiência em língua

inglesa, após o tempo decorrido entre as apresentações orais e sua produção

no teste oral do EPPLE.

O trabalho de pesquisa em questão contribui para melhor

entendermos possíveis correlações entre precisão gramatical e proficiência

oral e, acima de tudo, para o projeto maior EPPLE, que visa a qualidade na

formação dos professores de línguas estrangeiras.

Recebido em: 23/03/15

Aceito em: 27/04/15

Referências

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Proficiência Oral em Inglês do Formando em Letras: implicações para a

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