princípios do coletivo ativismo abc

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Princípios coletivo Ativismo ABC

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Na prática a teoria é anarquista.

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  • Princpioscoletivo

    AtivismoABC

  • princpios do coletivo ativismo abcNeste momento lanamos os Princpios do Coletivo Anarquista Ativismo

    ABC, publicao que fruto de debates internos que tivemos ao longo dequase 3 anos.

    A ideia de escrever os princpios do coletivo surgiu porque no havia umacomunho do que entendamos sobre os princpios do anarquismo que jseguamos e porque alguns dos nossos princpios no vinham diretamente doanarquismo clssico, mas de um modo de vida no-capitalista confluente como anarquismo, como a agroecologia.

    Foi um processo demorado porque em cada Teorismo (como chamamosestes debates internos) discutamos cada ponto, lamos em conjunto,reescrevamos, num processo quase sem fim.

    Ter a formulao dos princpios era necessrio para sermos entendidastanto externamente (frente a outros grupos e organizaes) quantointernamente (novas membros e frequentadoras da Casa da Lagartixa Preta).

    Desta maneira, disponibilizamos os princpios do Coletivo Ativismo ABC eestamos dispostas a debater e conversar sobre eles caso necessrio.

    Boa Leitura!

    Contatos: [email protected] www.ativismoabc.org

    Nota sobre ferramentas livres usadas para edio deste fanzine: rede social WE, pad, libreoffice,linux, etc. Compartilhamos da proposta de organizao e autonomia que os grupos quedesenvolvem essas ferramentas tm. Incentivamos os grupos polticos a usarem essas ferramentase colaborarem nesse trabalho que to importante para ns. Muitas das nossas conquistas quanto aorganizao de eventos coletivos, edio de textos, difuso e debates de ideias, devemos a essesgrupos. Valeu demais!

    Nota sobre a linguagem de gnero utilizada neste texto: este texto est redigido de forma neutrasem o uso de X, @ ou *, buscando superar o machismo existente na lngua portuguesa e ao mesmotempo facilitar a leitura. Trataremos o sujeito sempre como pessoa. Portanto, sempre que fizermosreferncia a pessoa ou pessoas, usaremos o feminino, pois a palavra pessoa feminina emportugus.

  • Horizontalidade

    A horizontalidade pode ser definida como a ausncia de hierarquiadentro de uma relao, ou seja, uma maneira de se relacionar em que umelemento no possui mais poder que o outro. Em busca da horizontalidade,chegamos a concluso de que nosso coletivo est hoje numa diagonal comtendncia horizontal. Explicaremos aqui o porque disso.

    Um dos elementos chave da autogesto a participao poltica dosmembros e sua capacidade de influir na construo coletiva. Nesse sentido,temos como princpio a horizontalidade em termos de graduao igualitriapara a participao irrestrita de todos os membros do coletivo em seusprocessos. Todos os membros do coletivo tem o mesmo potencial (em termosde potencial e abertura do coletivo) para propor, fazer, questionar, sugerir,transformar, participar, se expressar.

    Mas h um princpio que no pode ser ignorado por conta da ideia deigualdade, que o da diferena; embora todas tenham igual liberdade paraserem, estarem, tornarem-se, agirem e influenciarem o coletivo, cada uma ofaz a partir de suas prprias demandas, desejos, capacidades, gostos, talentose experincias diversas que tiveram em suas vidas. Nesse sentido a experinciado Ativismo ABC indica que diferentes pessoas tero diferentesconhecimentos, prticas, opinies e capacidades a respeito de diferentesassuntos e que aquelas que melhor se expressarem em cada rea tendem aapresentar um saber e um poder maior sobre essa determinada rea ouassunto. isso que resulta no que chamamos de efeito diagonal de nossasrelaes.

    Exemplos disso podem ser encontrados na prpria diviso de comits esubgrupos na organizao coletiva: o comit que cuida de certo assunto termais voz sobre ele que os demais no porque os demais no podemparticipar das decises, mas porque as palavras dos membros do comit teromais legitimidade e poder de convencimento com base em sua experincia.Isso tambm vale para a relao entre pessoas mais velhas, mais antigas nocoletivo ou mais experientes em algum assunto em relao s novatas.

    Como reestabelecer o princpio da horizontalidade perante essa situaoquase vertical das relaes de saber e poder em dado campo de ao? Oprimeiro ponto a ser destacado a importncia do respeito a quem tem maisexperincia como forma de evitar tiranias. Porque o princpio da igualdadepode ser aplicado de maneira tirana no sentido de deslegitimar a experinciado outro, reclamando supostos direitos iguais queles que tem uma relaomais intensa ou antiga com o lugar ou a atividade em questo. Essa tirania daqual falamos muitas vezes acontece em organizaes autonomistas cuja

  • participao de novos membros aberta, onde algumas pessoas menosresponsveis pela organizao em questo interferem em momentos chavesobre a deciso coletiva sem, no entanto, estarem dispostas a arcar com aresponsabilidade da mesma deciso, seja por incapacidade, seja porirresponsabilidade. Ou seja, sugerem uma coisa, sem realmente entenderem asconsequncias dela, sem saber se j foi tentada antes, ou mesmo sem a realinteno de ajudar a realiz-la. Para evitar isso, consideramos que uma pessoaque participa pouco, se dedica pouco, precisa respeitar e atentar opiniodaquelas que participam mais e se dedicam mais o que no quer dizer queno possam ser questionadas, mas sim que no se deve ignorar queprovavelmente esto mais por dentro do contexto do coletivo. Por outro lado,o princpio do respeito aos mais experientes pode prejudicar a distribuiohorizontal das diferenas e levar, tambm, a tirania. Porque pessoas podem terexperincias diferentes sobre os mesmos assuntos e essas experincias podem,algumas vezes, se chocar ou serem fundadas em processos e perspectivasdiferentes sobre a mesma questo. Ou seja, muitas vezes pessoas diferentesaprenderam maneiras diferentes de fazer alguma coisa, ou tem pontos de vistadiferente sobre determinado assunto, porque aquilo que viveram (ou mesmo oque concluram do que viveram) diferente. H ainda a possibilidade de umaideia nova de uma pessoa com menos experincia ser bastante rica para somara um modo j aceito de fazer determinada coisa, ou seu questionamento serimportante para se rever determinada ideia. Sendo assim, consideramos que asdiversas sabedorias sobre um mesmo assunto no so, a princpio, maiores oumelhores em comparaouns aos outros, mas simapenas diferentes.

    Qual deve ser amedida, ento? Ora, osmais experientes emtermos de participao emdado tempo e lugarprecisam ser receptivos,saber equilibrar comomalabaristas oconhecimento que j temcom o conhecimento que aoutra lhe oferece quandovem participar. precisoestar aberta para aprendercom a outra e no julgar

  • que o conhecimento dela seja pior que o de uma ativista mais experientenaquele assunto. Para que uma perspectiva sobre determinado assunto no setorne a nica perspectiva correta, preciso equilibrar a balana diagonal eadmitir que ela no esttica.

    O processo pode se dar atravs de diversas estratgias. Uma delas :1) congregar decises a partir de uma assembleia (o que ns fazemos em

    nossa reunio quinzenal) 2) concentrar as decises mais detalhadas no comit especfico (ns por

    exemplo temos Comits para Horta, Comunicao, Biblioteca, etc). So doismomentos diferentes, que no podem entravar ou ignorar um ao outro. Cadacaso deve ser pesado num fluxo que oscile entre essas duas instncias. Assimconseguimos resolver alguns de nossos problemas. Explicando um poucomelhor: tomamos decises gerais que consideramos importantes que sejamaprovadas/conhecidas por todas do coletivo nas reunies onde todas estopresentes. J as decises e atividades mais relacionadas a determinado comite cuja realizao no precise ser levada para a reunio geral(o que tornariaessa reunio super extensa e cheia de pautas que poderiam ser resolvidas pormenos pessoas) so tomadas pelas pessoas dos respectivos comits, queeventualmente levam as questes do comit especfico para a reunio geral,quando acharem necessrio.

    fundamental que os comits ou outros grupos de pessoas dentro docoletivo no escondam informaes dos demais membros. Caso contrrio, atendncia verticalizao aumenta, devido ao acesso privilegiado que issogera para certas informaes.

    Outra estratgia que precisa de grande ateno a transmisso deconhecimentos e sua relao com a tomada de decises. Para que todasparticipem horizontalmente da tomada de decises preciso que aquelas queestiverem numa posio diagonal superior saibam transmitir seus saberespara as demais de modo a se equivalerem ou ao menos reduzir as assimetrias(ou seja, que aquela pessoa que domina mais sobre um determinado assuntotransmita o que sabe aquelas que o desejarem, para que elas tambm passema dominar esse assunto).

    Uma estratgia complementar valorizar os saberes e fontes de saberesdiversos e variados sobre um mesmo tema. preciso saber expressarconhecimentos sem prejulgar a outra (porque o conhecimento do outro podeser estranho ao nosso, mas no necessariamente falso) e valorizar o aspectoexperimental , dando espao para que a outra mostre sua viso divergente apartir da experimentao, do teste, da tentativa e erro.

    Caso os recursos (tempo, espao, material, pessoas) forem escassos, aopo da tentativa e erro precisa ser repensada coletivamente. Isso depende

  • do risco que o coletivo est disposto a correr enquanto experimenta,debatendo o assunto e imaginando suas consequncias. Em caso dediscordncia, interessante e pedaggico quando possvel tentar as diferentesalternativas para ver qual, afinal , convm mais ao coletivo.

    O processo criativo e de planejamento fundamental para a construoda experincia e se fortalece quando feito coletivamente. uma forma desairmos da clausura de nossos pensamentos antes de tomar decises. Assim asdecises se aproximam mais de contemplar a todas, ou seja, de atingir ahorizontalidade.

    Por isso outro fundamento importante na busca da horizontalidade odilogo. Conversar sempre, falar e escutar sem irritao, com pacincia, comsilncio mental e transformar suas palavras com base nas palavras do outroPorm, o dilogo no deve ser confundido com concordncia cega, tampoucocom um monlogo mascarado pela retrica. Entendemos o dilogo como algoque ultrapassa o sentido da fala, algo corporal-emocional que surge ao fazer econstruir coisas em conjunto. Para que o saber e o poder sejam melhordistribudos, interessante que no processo coletivo as pessoas que pouco seexpressam e tomam iniciativas explorem mais sua capacidade de argumentar,falem mais, coloquem suas ideias e as coloquem em prtica, e aquelas queapresentam tendncia de falar e fazer mais que as outras prestem ateno aisso, cedam espaos, deixem de falar quando se sentirem contempladas pelafala de outra pessoa (s vezes repetimos algo que j foi dito com nossaspalavras, sem necessidade).

    Em suma, ns no vemos as relaes de poder como algo esttico nemdualista (vertical ou horizontal), mas como uma estrutura complexa emconstante transformao que pode apresentar tendncias horizontalidade e verticalidade. Acreditamos que quanto maior a capacidade de dilogo e detroca de saberes dentro de um coletivo, maior ser sua tendncia horizontalidade.

  • AutogestoA autogesto um modelo de gesto onde todos possuem igual

    capacidade de participao sem a existncia de cargos hierrquicos. Todavia, aausncia de uma hierarquia decisria no implica a ausncia de distribuio deresponsabilidades e tarefas, nem o comprometimento das pessoas do coletivo.A ao coletiva passa a ser responsabilidade de todos e a autodisciplina passaa ser primordial, j que a falta de compromisso de uma pessoa afetar todo ocoletivo. Portanto a participao poltica direta traz consigo a necessidade dededicao e ateno ao ambiente em que estamos inseridas.

    Muitos acontecimentos que no encontramos nos livros de histria so aprova viva das possibilidades que temos. O possvel e o atingvel no esto nombito de em quem podemos votar, quem pode nos representar, o que nosdizem que possvel , mas sim no de tomar a vida pessoal e social por prpriasmos para transform-la. O que precisamos hoje deixar de ter medo dasoutras, deixar de ter medo de tomarmos nossas vidas por ns mesmas. Issoimplica arriscar e assumir responsabilidades (pois :liberdade eresponsabilidade caminham juntas), e tambm encontrar com as outraspessoas formas de construir uma vida melhor.

    O Ativismo ABC toma decises coletivas e gere a Casa da Lagartixa Pretapor meio da horizontalidade, colocando sempre em balano as diferenasdiagonais de participao e conhecimento. Buscamos o consenso sem ignoraro dissenso, atravs de assembleias,da distribuio de tarefas e diviso decomits, do apoio mtuo entre osmembros e os comits, do faamos-ns-mesmas e das buscas por incluira diversidade de experincias e porcriar relaes amistosas. Nossaprtica mostra que o fundamento daautogesto uma busca contnua porromper com as formas dominantes deorganizao (que envolvem, tambm,as esferas do agir e do falar), pois noqueremos mandar ou ser mandados.Queremos construir uma nova gestoem todos os mbitos de nossas vidas,realizada em conjunto, autnoma ecom o poder distribudo entre todas.

  • Anticapitalismo

    O capitalismo um sistema hegemnico com base na propriedade quevisa a produo, manuteno, proteo e acmulo de capital atravs damanipulao e explorao de outros seres e recursos. No capitalismo, relaesdiversas de intercmbio e ddiva so substitudas/dominadas por um grandecircuito mediado pelo equivalente geral (dinheiro), que se consegue a partir daexplorao e venda da fora de trabalho. Tal equivalncia fundada numaideologia do valor-trabalho e da condenao do cio, sendo o lazer relegadoaos momentos de consumo. As diferenas que aparecem como alternativas aocapitalismo so transformadas em produtos a serem consumidos, o que leva aspessoas a acreditarem que no existe outras alternativas.

    A moeda, contudo, no mero produto de relaes econmicas, mas umencontro entre estas relaes e as relaes de poder. a constituio do poderna forma do Estado soberano, que garante atravs do monoplio da violnciae coero, tambm o monoplio da produo da moeda. Unifica, atravs dela,as diferentes esferas de circulao numa s rede de transmisso de mando eobedincia, tornando-nos ao mesmo tempo servos e carrascos. No existeneutralidade no fluxo monetrio, pois o mesmo s faz sentido a partir daseparao e quantificao de diversos aspectos de nossas vidas. A acumulaos possvel graas avareza, negao da gratuidade e recusa a distribuir.Contra ela, a valorizao da generosidade e das formas de circulao gratuitaso alternativas.

    O Ativismo ABC tem como base, portanto, uma crtica prtica aocapitalismo que envolve a experimentao e constituio de formas deproduo e circulao no-mercantis. O anticapitalismo ao qual nos referimosse concretiza na proposta de uma economia baseada na ddiva e nareciprocidade. Alm de sermos contrrios explorao das pessoas e suaalienao, buscamos e incentivamos outras formas de convivncia sem ointermdio do equivalente geral monetrio, procurando intercmbios maisprximos, diretos e pessoais. Isso passa, tambm, por transformaes narelao entre consumo e produo atravs de outros circuitos relacionais.

    Em nossa horta comunitria experimentamos, a partir da agroecologia,uma relao diferente entre ns, as plantas e os outros seres. Alm debuscarmos nos tornar ao mesmo tempo produtores e consumidores (aoparticipar do comit da horta), distribumos nossos frutos, verduras, folhas,razes e ervas medicinais para aquelas que so vizinhas, parentes, amigas,frequentadoras ou participantes da Casa da Lagartixa Preta, com base naddiva.

    A constituio desses circuitos no-mercantis o processo contnuo de

  • potencializao da autonomia perante o capital e o Estado e em relao cadeia monetria, de modo a constituir relaes no fundadas no mando e naobedincia. Fazemos da nossa presena no capitalismo um esforo de(re)transformar a mercadoria em ddiva. A constituio desses circuitos fundamental para que qualquer relao com o capitalismo possa se tornaranticapitalista.

    Quanto mais estreitarmos a relao de produo e consumo dentro deuma esfera total de ddivas, mais estaremos numa construo de umaalternativa ao mercado e ao Estado. Existem prticas que consideramos maisprximas de estratgias de sobrevivncia dentro do capitalismo, queobjetivam uma vida com menor dependncia do trabalho assalariado,provendo ociosidade para dedicao prticas polticas mais autnomas.Redes gratuitas de trocas e reaproveitamento de alimentos que sodescartados entram neste campo estratgico, que por fim podem ajudar muitona obteno de tempo para projetos mais radicais e audaciosos.

    Mas no podemos confundir essas estratgias de sobrevivncia com asestratgias de construo de autonomia poltica, social e ambiental. Aestratgia de sobrevivncia possibilita a construo da autonomia, masmantm a dependncia da produo capitalista. O capitalismo um sistemapoderoso que nos cerca nas mais diversas esferas da vida, enquanto for quaseimpossvel livrar-se dele e durante o processo de constituio dos circuitosopostos a ele faz-se necessrio transformar o que ele nos toma em algo queretorne a ns. Para trazer do capitalismo aquilo que ele tomou alimentosque desperdia, produtos do trabalho que viram lixo, o trabalho alienado doprazer, terra para plantar e, principalmente as pessoas que ele concentra nascidades preciso compreender nossa relao com ele. Compreender seupoder, todavia, no torna as relaes que temos com ele exclusivas podemos e desejamos outras relaes e o processo de sua constituio oprincpio bsico da luta contra o inimigo comum.

    Esta imagen esta inspirada en todas la luchas de resistencia y de construccin que surgen como una gran ola en una alternativa que lleve al capitalismo a su naufragio.

    Lesly Geovanni Mendoza

  • Educao Libertria

    A educao libertria a produo, transmisso e recebimento deconhecimentos de forma autnoma, autogerida, horizontal, consensual e livre.Desse modo, a prtica libertria questiona a institucionalizao do saberatravs da escola. Isso porque ela faz as pessoas agirem conforme padreshierrquicos, com fins de dominao que vo para alm dos meios dedistribuio de conhecimento. As escolas mantm e sustentam um modo devida do qual desejamos nos libertar. Quando se parte de uma perspectivalibertria, qualquer relao com a escola deve ter esta percepo subjacente.Assim, preciso criar urgentemente estratgias para lidar com a escola, j quea vida da grande maioria das pessoas passa por ela.

    Ainda que algumas de ns atuem dentro destas instituies enquantoestratgia poltica e tambm financeira, as prticas alternativas de educaoso mantidas e difundidas pelo Ativismo ABC. Utilizamos tanto de saberespopulares quanto acadmicos, rompendo suas fronteiras. A ocupao deespaos institucionalizados deve buscar neles brechas para uma distribuiomais solidria e libertria do conhecimento.

    A educao libertria um modo paralelo de ensinar, aprender, conhecere viver para alm das estruturas formais e burocrticas. Ela propem o apoiomtuo, a solidariedade entre as pessoas considerando suas diferentescapacidades e necessidades, a fim de tornar possvel um outro modo deorganizao e um outro modo de vida.

    Buscamos relaes de poder e de saber que sejam contra a dominao, eportanto os saberes, para ns, no so colocados a servio da explorao econtrole de uma pessoa sobre a outra. Ao contrrio, so compartilhados evivenciados, para construir relaes mais solidrias e livres.

    A educao libertria no separa trabalho e investigao, jogo ereflexo, teoria e prtica, atividade manual e intelectual, paixo eresponsabilidade. O compartilhamento desse conhecimento acontece, nocotidiano, nos grupo de estudos e cursos livres oferecidos na Casa da LagartixaPreta assim como nas relaes que mantemos com outras pessoas, coletivos eespaos.

    Alguns dos princpios da educao libertria que valorizamos so:

    Autonomia do saber: A imaginao, criatividade, curiosidade e raciocnioso caractersticas inerentes ao ser humano, que observa, reflete e tiraconcluses sobre si mesmo e tudo ao seu redor, de acordo com necessidades

  • pessoais e/ou coletivas. Cada um de seus aprendizados envolve processoscomplexos de observar, sentir, refletir, teorizar e colocar as teorias em prtica.Essa autonomia de aprendizagem ou autodidatismo pode envolver todas aspessoas, independente de idade, gnero, ou qualquer outras caractersticas.

    Autogesto do saber: Cada pessoa ou grupo de pessoas tem seus prpriosinteresses e necessidades sobre determinados assuntos. Elas tambm podemter suas prprias formas de absorver conhecimento e criar teorias, ou podemoptar por estudar teorias j existentes. Quem escolhe o que estudar (idiomas,corpo, animais, plantas, msica, etc) e como estudar (individualmente ou emgrupo, em silncio ou com sons, parado ou se movimentando, lendo livros ouconversando com pessoas, etc) a prpria pessoa ou o grupo de pessoas(como um grupo de estudos, por exemplo) envolvidas no processo deaprendizagem. Na Casa da Lagartixa Preta, existem e j existiram grupos deestudos de diferentes temas: idiomas, comunicao no-violenta, cultivo deplantas, manuteno de bicicletas, polticas amerndias, comunidadesautnomas etc. Em cada um desses grupos, o estudo planejado e executadocoletivamente, de acordo com as demandas coletivas e atravs dos mtodospropostos e escolhidos pelas pessoas participantes.

    Horizontalidade e consenso do saber: No acreditamos que existamconcluses nicas e absolutas, mas concluses criadas ou tomadas a partir deespecficas necessidades, perspectivas, metodologias e contextos. Dessamaneira, podem haver muitas e diferentes concluses sobre uma mesmaquesto estudada. Por isso, quando o Ativismo ABC faz algo coletivamente ouem parceria com outras pessoas e coletivos, buscamos ouvir as experincias econhecimentos umas das outras. Os menosexperientes devem estar abertos aosconhecimentos dos mais experientes, e vice-versa. Desse encontro de diferentesconhecimentos, argumentamos e discutimosat que cheguemos a um consenso, que podeocorrer quando uns aderem a proposta dosoutros, ou quando uma novasoluo/concluso elaboradacoletivamente. A importncia dahorizontalidade na pedagogia se d pelo fatode que aquele que tem mais conhecimentotende a ter maior poder em algumassituaes. Por isso, buscamos sempre

  • distribuir nossos conhecimentos a todas as pessoas, o que descentraliza opoder.

    Apoio Mtuo

    A vida dos grupos de pessoas e de outros seres nesse mundo se djustamente porque em diversos momentos os membros desses grupos tiveramde se apoiar , ou seja, a vida no se d apenas por uma disputa mortal dasespcies, mas tambm pelas relaes de apoio. Nossa sociedade, no entanto,vem sendo estruturada com base na competio, nas relaes de poderexercidas de cima para baixo(governantes, reis e rainhas, professores, polcia),no isolamento de cada uma e de todas.

    A partir dessas bases sociais, em geral pensamos que impossvel aexistncia de outras possibilidades, e esquecemos que em muitas situaescotidianas precisamos do apoio das outras pessoas. Alguns exemplos desituaes cotidianas de apoio so: o mutiro, que uma prtica de trabalhocoletivo em benefcio de uma pessoa ou de um grupo(como a famosa reuniode vizinhos para encher a laje de uma casa); pedir um punhado de acar ouleo na vizinha; fazer uma vaquinha pra aquela pessoa ou grupo que precisa;aes conjuntas de moradores para realizar melhorias no bairro, etc. Somuitos os exemplos que poderamos citar e que esto caindo no esquecimentoou sendo desvalorizados.

    O apoio mtuo a possibilidade de criar uma rede de relaes decooperao e no de imposio. So associaes feitas livremente, pelaidentificao de uma pessoacom os problemas da outra eque, portanto, so relaesque tem uma potencialidadeautnoma. Ele est maisrelacionado solidariedadee, portanto, no pode serconfundido com caridade. Aocontrrio da caridade, que exercida de cima para baixo,sem potencializartransformaes sociais, oapoio mtuo no implica emsuperioridade, mas sim emsolidariedade e compromissoentre as pessoas envolvidas.

  • Diversidade

    Trabalhar, incentivar e lidar com a diversidade so processosimportantes, j que cada pessoa possui caractersticas (gostos, gestos,escolhas, opinies, etc) que s podem se expressar com liberdade se foremcoletivamente respeitadas. As percepes e experincias que cada pessoa ougrupo possuem no so inferiores ou superiores. Elas so simplesmentediferentes e, muitas vezes se completam, possibilitando um rico e criativoambiente de aprendizado.

    Conviver com a pluralidade nos permite compreender melhor o contextode cada pessoa e comunidade, suas motivaes e as opresses as quais estexposta devido s suas escolhas. Isso se aplica sexualidade, ao gnero, cor, origem, e tantas outras caractersticas e opes variadas que, sejam muito oupouco diferentes das nossas, tambm podem ser valorizadas.

    O sistema capitalista se volta para a homogeneizao, ou seja, para aimposio da padronizao entre diferentes culturas, onde os saberes e tudoaquilo que tido como menos eficiente, atrasado ou inferior tende adesaparecer enquanto que o classificado como avanado ou modernotende a permanecer e se espalhar por todas as partes do globo.

    atravs desta lgica que o sistema capitalista vai penetrando etornando pessoas e povos em meros consumidores dependentes. A produode determinado produto em grande escala s possvel com uma grandedemanda, e esta grande demanda s se torna possvel atravs de um amploprocesso de padronizao de preferncias e do comportamento. por estemotivo que so criados padres de beleza, sexualidade, alimentao erelaes, que em geral excluem todos aqueles que no possurem o padro devida propagandeado nos comerciais. Alm disso, para que essa sociedadecontinue se reproduzindo e se espalhando, preciso que os saberes ancestraise todos os modos de vida diferentes deste que imposto, sejammarginalizados e aniquilados, em nome do progresso e do desenvolvimentoeconmico e social.

    A diversidade, seja dentro de um grupo pequeno (micro) ou umasociedade (macro), necessria para combater a uniformizao. assim que seampliam os questionamentos e a luta. Imaginem um grupo somente dehomens brancos ou um grupo s de mulheres de determinada idade, porexemplo. Suas reivindicaes e discusses acabam se limitando a uma esferaespecfica, que nem sempre dialoga com o todo, ao contrrio de ter um grupoem que a diversidade e as diferenas convivam no mesmo espao. Assim,acreditamos que a diversidade cultural funciona como a biodiversidade,ampliando as possibilidades dentro de redes de relaes. Os diferentes

  • organismos existentes, por possurem diferentes estratgias e diferentesnecessidades, podem assim lidar cada qual a sua maneira com as mudanas edesafios que surgem no ambiente. Associam-se, direta ou indiretamente, demodo que coexistem em interdependncia. Utilizam os recursos de maneiraplural, o que viabiliza a coexistncia de muitos tamanhos, hbitos, cores e sonsexibidos por cada forma de vida.

    A diversidade, portanto, um fator essencial para o desenrolar da vidano planeta. No h na natureza padres totalitrios, superiores, definitivos, emuito menos homogneos, uma vez que os organismos esto sempre emconstante renovao e adaptao, e que nada pode permanecer esttico pormuito tempo.

  • Consenso

    Nossas decises sempre foram pautadas pelo princpio da busca peloconsenso, pois para ns, o consenso no a imposio do pensamento nicoou uma forma de eliminar o dissenso. Temos entendido o consenso comoforma de pensar e agir coletivamente, a partir de diferentes propostas,argumentaes, discusso e discordncias, tentando compreender asdiferentes para assim chegar uma deciso de ao que contemple uma oumais propostas ou que mescle as diferentes propostas. Desta forma, oconsenso no uma nica posio e opinio, a possibilidade de combinardiferenas.

    A disputa no tem como fim a eliminao da diferena, mas diversasmaneiras de aceitao ou alterao do que se defende, sem no entanto deixarde tomar as decises necessrias, respeitando o tempo suficiente para que issoseja alcanado.

    No consenso, discordar de uma proposta no a mesma coisa que opor-se a ela. Uma proposta pode no ser a preferida de todos, mas pode ser levadaa cabo coletivamente caso ningum se oponha a ela. A discordncia podetambm dar a possibilidade de que uma proposta seja posta em prtica demodo experimental por quem a defende, e depois ser avaliada coletivamente.Neste caso o coletivo inteiro no precisa se responsabilizar pelaimplementao da ao, mas deve sempre arcar com as consequncias.Todavia, quando existe oposio a uma proposta e as pessoas so contraimplement-la, necessrio generosidade do proponente para retir-la ouesperar uma nova oportunidade.

    Enfim, as propostas podem se mesclar umas as outras ou surgirematravs do debate. preciso tratar as ideias no como prontas na cabea decada um, mas como fruto da conversa e envolvimento entre as pessoas. Dessaforma o consenso no algo imediato, mas requer um processo temporallento, um alongamento dos debates e at mesmo o adiamento de decises.

    Tendo como objetivo a construo de uma sociedade igualitria ondetodas tenham a possibilidade de se expressar e opinar nas decises que dizemrespeito a sua vida, nos parece necessrio construir esse tipo de processodecisrio desde agora, como base para nossas experincias presentes efuturas.

  • Ao Direta

    A ao direta o princpio onde uma ou mais pessoas decidem e atuamdiretamente em tudo o que lhe diz respeito, no delegando a soluo deproblemas a terceiros. Sendo assim, rejeitamos meios indiretos de resoluode questes sociais, ambientais e de outras esferas (como a mediao porpolticos, partidos, Estado e mercado) em favor de meios mais diretos (como omutiro, a assembleia, o faa voc mesma, e outra prticas que visamconstruir uma forma de vida mais libertria).

    A ao direta tambm associada a greves, boicotes, desobedincia civil,intervenes e protestos. Ao optarmos por aes mais afirmativas econstrutivas no negamos a importncia do conflito e da oposio em relaoao sistema dominante, mas acreditamos que sem a construo de algodiferente uma mudana significativa fica muito distante de ser concretizada.

    Nesse sentido, nossa ao direta volta-se hoje, principalmente para acolaborao construtiva de um modo de vida libertrio no presente. A opopela ao direta implica em no esperar que o poder constitudo faa algumacoisa, mas fazer-ns-mesmas, coletivamente e em parceria com outrosgrupos.

    Perante a hegemonia do Capital e do Estado, buscamos manter com elesrelaes mnimas. Ou seja, optamos por no fundar nosso coletivo numarelao de dependncia direta e burocratizao, como por exemplo de serviojunto a projetos governamentais ou editais de acesso a verbas e apoio estatal,que aparecem para ns como ferramentas de controle sobre as aes

    populares. Tais ferramentas incluem diretamente aao coletiva na rede de mando e obedincia,fazendo com que a esfera autogestionada no seconstitua como comunidade parte, atravs daqual formas de circulao no mediadas pelamoeda (ddiva, gratuidade, reciprocidade e apoiomtuo sem base financeira, etc) possam sedesenvolver.

    Nossa prtica cooperativista, assim como tantasformas de cooperao popular (como os trabalhosvoluntrios e coletivos em festas, o mutiro, aproduo caseira), mesmo quando atrelada arelaes mercantis, foge da burocratizaohierrquica que caracteriza o cooperativismoformal.

  • Apartidarismo com tendncias Antipartidrias

    Ns no nos apoiamos nem nos submetemos a nenhum partido, noconcordamos com a forma de organizao com que estes se colocam, nemcompartilhamos de seus interesses (democracia representativa, disputaseleitoreiras, enfim, a tomada e monoplio do poder). No acreditamos nopoder exercido de cima para baixo, e sim em sua diversificao e distribuio.

    Quando trabalhamos junto de outros grupos e movimentos, muitasvezes compartilhamos os mesmos espaos que partidos polticos, ou gruposligados eles. Porm, nossa atuao ou apoio junto a um coletivo, movimentosocial, ou grupo, se d tambm a partir dos nossos princpios.

    Geralmente, as lutas em que nos posicionamos como apartidrios solutas pontuais e estratgicas, como em frentes de luta ou manifestaes, ondetemos algo em comum. Entretanto, quando os princpios da lgica partidriacomeam a predominar nesses ambientes, ns nos opomos ou nos afastamos.

  • Ecologia

    O antropocentrismo baseia-se numa ideia deseparao entre o ser humano e os seres no-humanos, constituindo uma esfera oposta humanaque passa a ser chamada de natureza. Nessa lgicaantropocntrica, o ser humano caracterizado comohierarquicamente superior e dominante. Isso justificaque os no humanos sejam usados como merosrecursos para os seres humanos, manipulados deacordo com nossos interesses e necessidades. Este um dos fundamentos do sistema capitalista e da cultura de mercado. A gua apenas recurso, os minrios so matrias-primas, os vegetais so produtos eos animais so mercadoria e fora de trabalho. A relao utilitria entre anossa espcie e a natureza forjada cotidianamente na cultura da sociedadeindustrial deixa-nos livres para sugar o que for necessrio em prol de umanica espcie e em detrimento do todo. Tal fundamento isenta o ser humanoda responsabilidade com a degradao, a poluio, a destruio de fontesesgotveis de vida e da extino de outras espcies.

    Buscamos construir e fortalecer uma outra relao com o meio nohumano, sem destru-lo ou lev-lo ao esgotamento, mas criar, recuperar,construir e praticar relaes mutualistas. O meio ambiente essencial para areproduo da vida e para a construo de uma outra sociedade.

    Dentro desta relao, a biodiversidade tem um papel fundamental naconstruo da base de nossas prticas, da nossa sabedoria e do nossoentendimento do todo. Onde cada ser tem sua importncia, onde no hhomogeneidade, onde as possibilidades so infinitas. Com a certeza de que ouniverso est em constante transformao.

    Queremos ressaltar, porm, que a construo de uma outra sociedade,de um outro modo de vida, s possvel desconstruindo a base do modo devida capitalista e estatista.

    Pela experincia e o entendimento do contexto em que vivemos,percebemos que as iniciativas e construes precisam entender, questionar etrabalhar as relaes profundas para construir algo novo e fortalecer umaestrutura paralela. A lgica capitalista se apropria facilmente das iniciativasonde as relaes mais profundas e enraizadas no foram constitudas,transformando-as em nichos de mercado atravs do contraditriodesenvolvimento sustentvel. O desenvolvimento que pressupe amanuteno da lgica de explorao, produo, consumo e relaes mediadaspelo dinheiro , por si s, insustentvel.

  • Igualdade

    A busca pela igualdade social no est limitada a questo econmica,apesar de abrang-la. O patriarcado, a escravido, a servido, o domnio deum povo sobre os outros ocorrem desde antes do capitalismo se estabelecer.O capitalismo aprofundou, expandiu e fortaleceu a desigualdade,fragmentando e hierarquizando ainda mais pessoas, comunidades, lugares,conhecimentos e vivncias. Esta a sociedade que acumula e centraliza capitale poder, que hierarquiza as pessoas pela sua cultura, cor, sexo e bens.

    Ao defendermos a igualdade no estamos pressupondo que todas aspessoas tenham que ter as mesmas coisas ou serem idnticas. Ela pressupediversidade e diferena estabelecidas dentro de valores anticapitalistas, deliberdade, de apoio mtuo e solidariedade. De cada um segundo suaspossibilidades e a cada um segundo suas necessidades. Desta forma aigualdade deve estar no acesso a participao politica, aos meios de produode vida, no acesso terra e a moradia, nas relaes de gnero e nas relaesentre culturas distintas.

    Impedimos a expanso da pirmide do poder (poltico, social,econmico, cultural), da autoridade e da submisso buscando e conquistandomaior igualdade, contribuindo para a construo de outra sociedade em que asdiferenas no sejam passveis de serem hierarquizadas e dominadas,impossibilitando a vida baseada na explorao de um pelo outro.

    Dentro da lgica do capital uma das tticas mais usadas a de dividirpara conquistar. Essa diviso ocorre de diversas maneiras, pode ser por gnero,sexualidade, classe, cor, times de futebol etc. Tal ttica tem o objetivo de

    fragmentar as partes envolvidas, criandoum cenrio de competio pelo monopliodo poder. Ao contrrio disso, internamenteo coletivo busca um nvel de igualdadebaseado no princpio da ddiva e nadistribuio de saber e poder, dividindotarefas e rotacionando responsabilidades.Tudo est disponvel a todos e as escolhasso tomadas de maneira consensual comigual participao dos membros que seinteressem pelo assunto em questo, sendoasseguradas durante este processo o seudireito de opinio e poder decisrio,independente de credo, cor, gnero,sexualidade.

  • Autonomia

    Autonomia algo diretamente ligado liberdade e ao poder.Para ns a autonomia no algo individual, sendo possvel somente

    como ao coletiva de recusa cadeia de mando e obedincia. Ou seja, noocorre de maneira isolada, sendo possvel apenas atravs da ao conjunta emredes de ddiva e apoio mtuo.

    Autonomia manter relaes prticas com toda a esfera deconhecimentos e necessidades das quais dependem a nossa vida cotidiana eque a constituem. Sade, alimentao, abrigo, mobilidade, relaes com as/osoutras/os e com o meio so elementos constitutivos da autonomia poltica.Quando no operamos em todas as esferas fundamentais para a vida, ficamos merc do Estado e do Capital. Se dependemos de hospitais e indstriafarmacutica (contra doenas simples ou graves ou pelo controle dacontracepo e do parto) ficamos impotentes, entregues s decisesdominantes, lgica de sistema de sade pautada nos interesses do Capital eao controle de nossos corpos pelo Estado. Se no conhecemos a terra, ocultivo e o processo dos alimentos que comemos diariamente, ficamos mercdo cultivo com agrotxicos, transgnicos, uso de antibiticos e hormnios emanimais, inflao e impostos. Quando mantemos nosso corpo dcil e inaptopara o uso da fora combativa, ficamos a merc da violncia privada e estatal.Por motivos como estes, pensamos que a conquista da autonomia passa pelabusca do conhecimento do processo vital como um todo, construindo circuitosgratuitos e de apoio mtuo paralelos ao modo de vida dominante.

    Por toda essa complexidade de relaes, a autonomia depende daconstruo coletiva e comunitria e atravs do apoio mtuo entre diferentespessoas e coletivos na gesto dos recursos e saberes. Com relaes emcomunidade, mais pessoais (e portanto menos institucionais) a construoalternativa ganha bases mais poderosas, que possibilitam uma expansomxima dessas relaes, prticas e conhecimentos. Apenas atravs daexpanso das relaes, redes e federaes de pessoas, coletivos e territriosde libertao autogestionria poderemos corroer as relaes estatais ecapitalistas at o seu declnio, pois essas relaes criam uma alternativa slgicas do mando e da obedincia.

    A presena da autonomia na esfera organizacional se d quando umcoletivo, organizao ou federao libertrios se organizam de formahorizontal, autogerida e buscando autonomia de decises e aes, gerandovnculos pessoais entre os participantes. Sem estas prticas e vnculos, a aopoltica se torna fugaz.

    Porm queremos reafirmar que a autonomia poltica no se d apenas na

  • esfera decisria e organizativa do prprio coletivo. Ela se d tambm na esferasocial, ecolgica, econmica e de potncia corporal, enfim, uma busca e umaconstruo que envolve todas as esferas da vida. A autonomia s seconsolidar quando expandida para as relaes cotidianas e vitais, para almde sua prpria organizao. Quando se concentra apenas na esferaorganizacional (comits, assembleias, reunies, atas e cartas de princpios,diviso de tarefas, etc), sem levar em conta os demaisaspectos da vida, no constri a independncia da cadeia de mando eobedincia. A organizao fica sem base vital, merc do modo de vidadominante. o que acontece, por exemplo, quando organizaes culturaiscom tendncia libertria e seus membros passam a depender definanciamentos estatais e da vontade dos governantes.

    A autonomia em sentido amplo, organizacional, social, ambiental,econmica, corporal etc., fortalece tanto a organizao interna do coletivoquanto suas relaes externas, federativas e populares.

    Justamente porque se fundamenta em relaes com todos os mbitos davida, bem como em relaes de apoio mtuo e reciprocidade que atravessamvrios coletivos, constituindo uma territorialidade estendida e mltipla. Essasrelaes tornam o coletivo, seus membros e aqueles com quem agem emconjunto menos dependentes dos recursos controlados pelo Estado e oCapital. S assim construiremos uma participao coletiva plena em um outromodo de vida possvel.

  • ANEXO

    Micro e Macro

    Pensamos que uma estratgia poltica deve sempre considerar duasesferas interdependentes que classificamos como Micro e Macro.Consideramos as relaes da nossa vida cotidiana (com quem vivemos, comovivemos, o que comemos, como lidamos com conflitos interpessoais, comogerimos espaos coletivos, como produzimos alimentos localmente, como nosorganizamos em cooperativas) como pertencentes micro esfera, e as relaesque temos com estruturas e instituies (Mercado, Estado, sistema de sade,sistema educacional) como pertencentes macro esfera.

    Talvez fique mais fcil explanar tudo isso atravs de um exemplo prtico.Estamos na gesto da Casa da Lagartixa Preta desde 2004, e dentro desteperodo conseguimos constatar diversas mudanas dentro do coletivo e dentroda sociedade em que estamos inseridos. Podemos dizer que avanamos emmuitos aspectos. O coletivo que inicialmente era feito de pessoas comconhecimentos parciais e pouco potencial de construo de uma autonomiasocial, hoje constitudo de pessoas com saberes tradicionais diversos e comimenso potencial de solidificar uma autonomia social. Alguns vizinhos que nosviam como intrusos, hoje so conhecidos que nos respeitam ou amigosfrequentadores do espao. Expandimos e amadurecemos nossas experinciascomunais, os desentendimentos so comuns mas no saem fora do controle aoponto de se gerar intrigas ou rachas dentro do coletivo. Somos capazes deconstruir qualquer coisa coletivamente sem a necessidade de especialistas,sabemos descentralizar conhecimentos e dialogar com pessoas diversas.

    Poderamos dizer que na esfera micro aprendemos bastante econsolidamos muitas relaes indispensveis para uma mudana poltica esocial, porm na esfera macro a situao um tanto diferente. A especulaoimobiliria avanou estrondosamente na cidade, muitos prdios foramerguidos no bairro e com isso a cultura de vizinhana vai desaparecendo,informaes e conhecimentos ainda esto centralizados em instituiesmantidas pelo Estado e pelo mercado. O capitalismo segue firme e forte.

    Nossas prticas e construes na esfera micro s tero maior impacto naesfera macro se forem expandidas. Nesse sentido, importante a constituiodo macro atravs dos enredamentos das microesferas pelas alianas,associaes entre coletivos, formao de confederaes, intercmbios entrediversas localidades ou relao de ajuda mtua entre grupos. Ao mesmotempo, no adianta trabalhar apenas na esfera macro, se as relaes da esferamicro esto em desacordo e em constante conflito com o que se tenta

  • construir no macro. Do que adianta lutar contra as grandes instituies para aconstruo de um poder descentralizado se a maioria dos projetos de pequenaescala fracassam? Do que adianta sonhar com uma sociedade baseada naautogesto se os prprios grupos libertrios so marcados por brigas, intrigase rachas? Como as duas esferas que tratamos so interdependentes, aexistncia de coletivos especializados em qualquer uma das duas esferas pouco frutfera e as possibilidades de dilogo entre diferentes grupos setornam muito difcil. Micro e macro, para ns, nunca aparecem em termoshierrquicos.

    No possvel viver o macro sem o micro, e o micro sem o macro. Essarelao entre micro e macro se assemelha muito a um holograma ou umfractal, onde a parte mnima e a parte mxima se tornam difceis de seremdiferenciadas.

    Christopher Cardinale - Abril 2010 - ABC No Rio, New York, NY

  • princpios do coletivo ativismo abc

    copyleft distribuio livre recomenda-se citar a fonte