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Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Programa de Pós-Graduação em Psicologia A CLÍNICA INFANTIL TRANSPESSOAL: UM OLHAR A PARTIR DOS PROFISSIONAIS Ana Flávia França Bezerra Natal 2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

A CLÍNICA INFANTIL TRANSPESSOAL: UM OLHAR A PARTIR DOS

PROFISSIONAIS

Ana Flávia França Bezerra

Natal

2019

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Ana Flávia França Bezerra

A CLÍNICA INFANTIL TRANSPESSOAL: UM OLHAR A PARTIR DOS

PROFISSIONAIS

Dissertação elaborada sob orientação da Profª. Drª. Geórgia

Sibele Nogueira da Silva, coorientada pelo Prof. Dr. Marlos

Alves Bezerra, e apresentada ao Programa de Pós-Graduação

em Psicologia, da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre

em Psicologia.

Natal

2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA

Bezerra, Ana Flávia França.

A clínica infantil transpessoal: um olhar a partir dos

profissionais / Ana Flávia França Bezerra. - 2019. 132f.: il.

Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e

Artes, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2019. Natal, RN, 2019.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Geórgia Sibele Nogueira da Silva. Coorientador: Prof. Dr. Marlos Alves Bezerra.

1. Psicologia Transpessoal - Dissertação. 2. Psicoterapia

Infantil - Dissertação. 3. Psicoterapia - Dissertação. I. Silva,

Geórgia Sibele Nogueira da. II. Bezerra, Marlos Alves. III.

Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 159.9

Elaborado por Ana Luísa Lincka de Sousa - CRB-15/748

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Agradecimentos

A presente dissertação de mestrado não seria a mesma sem o apoio precioso de várias

pessoas que fizeram parte dessa caminhada.

Em primeiro lugar, à minha família, que sempre apoiou minhas escolhas, me dando

suporte e incentivando meus objetivos. Vocês são minha fortaleza.

Ao meu companheiro de todos os dias, Victor, que me deu suporte e alegrias. Obrigada

por dividir comigo todos os momentos.

Aos meus amigos, que entenderam minhas ausências e sempre acreditaram em mim.

Agradeço ao meu orientador, Marlos, por todo o empenho, paciência e a motivação

durante todo o processo da dissertação e que me acompanhou desde antes de ingressar no

mestrado, me motivando com esse projeto.

À professora Sibele, pela confiança no trabalho.

Ao professor Aurino, pelas leituras e sugestões nas qualificações.

À professora Symone, por todo aprendizado sobre ludoterapia durante minha formação.

À todas as psicólogas que disponibilizaram um momento para compartilhar suas

práticas. Sem elas a elaboração desse trabalho não seria possível.

Desejo agradecer a todos os colegas de mestrado, pela caminhada compartilhada.

À todos os funcionários do PPGPSI, pela disponibilidade em colaborar.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, pelo incentivo

financeiro.

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Sumário

Agradecimentos .......................................................................................................................... v

RESUMO .................................................................................. Erro! Indicador não definido.

ABSTRACT .............................................................................. Erro! Indicador não definido.

1. Ciclo 01 – Introdução ao tema de pesquisa ....................................................................... 11

2. Objetivos ........................................................................................................................... 16

2.1 Objetivo geral: ................................................................................................................ 16

2.2 Objetivos específicos: ..................................................................................................... 16

3. Ciclo 02 – Revisão de Literatura ....................................................................................... 17

3.1.A criança em terapia ....................................................................................................... 17

3.2A Psicologia Transpessoal e o olhar para a infância ....................................................... 23

3.2.1.Histórico ....................................................................................................................... 23

3.2.1.1.Histórico no Brasil .................................................................................................... 26

3.2.2.Autores ......................................................................................................................... 29

3.2.2.1.Ken Wilber ................................................................................................................ 30

a)Estados de consciência ...................................................................................................... 32

b)Estágios ou níveis de desenvolvimento ............................................................................. 33

c)Linhas de desenvolvimento ............................................................................................... 39

d)Tipos .................................................................................................................................. 41

e)Quatro Quadrantes ............................................................................................................. 42

3.2.2.1.1. Espiritualidade ...................................................................................................... 44

3.2.2.2.Stanislav Grof ........................................................................................................... 48

3.2.2.2.1. Uma nova compreensão da cartografia e da psique humana ................................ 50

a) Biografia pós-natal e o inconsciente individual ............................................................ 50

b) O nível perinatal ............................................................................................................ 51

c) Nível transpessoal da psique ......................................................................................... 53

3.2.2.2.2 Estratégia de psicoterapia e autodescoberta ........................................................... 54

3.2.2.2.3. O papel da espiritualidade na vida humana .......................................................... 55

3.2.2.2.4. A respiração holotrópica ....................................................................................... 56

3.2.2.2.5. Como essa teoria se organiza na clínica infantil ................................................... 56

3.2.2.3.Vera Saldanha ........................................................................................................... 58

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4. Ciclo 03 – Percurso Metodológico .................................................................................... 69

5. Ciclo 04 – Resultados e Discussão .................................................................................... 79

5.1.O que é a Psicologia Transpessoal .................................................................................. 79

5.2.Teóricos e bibliografia .................................................................................................... 84

5.3.Olhar para a criança em terapia ...................................................................................... 93

5.4.Desenvolvimento infantil ................................................................................................ 97

5.5.Conceitos Aplicados ..................................................................................................... 102

5.6.Recursos utilizados ....................................................................................................... 106

5.7.Diferencial da Psicologia Transpessoal ........................................................................ 113

6. Considerações Finais ....................................................................................................... 117

7. Referências ...................................................................................................................... 122

APÊNDICES .......................................................................................................................... 127

Apêndice A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido............................................. 127

Apêndice B ......................................................................................................................... 131

Apêndice C ......................................................................................................................... 132

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Lista de Quadros

Quadro 1 – Estados nos quatro quadrantes ............................................................................... 33

Quadro 2 - Estrutura básica do desenvolvimento ..................................................................... 36

Quadro 3 - Estágios do Self ...................................................................................................... 38

Quadro 4 - Linhas de desenvolvimento inseridas nos quatro quadrantes................................. 41

Quadro 5 - Tipos nas quatro dimensões ................................................................................... 41

Quadro 6 - Análise temática dos dados .................................................................................... 77

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Resumo

A clínica se constitui como uma tradicional prática na psicologia, em que na atualidade vai se

diversificando, seja na prática privada, operacionalizado nas políticas públicas ou nas

instituições do terceiro setor. A psicoterapia infantil é uma parcela significativa dessa prática,

desafiando os psicólogos a sempre se reinventarem para adentrar o mundo da criança. A

discussão se deu por meio da construção teórica de três autores da Psicologia Transpessoal, dois

no âmbito internacional Ken Wilber e Stanislav Grof; e Vera Saldanha no âmbito nacional,

percebendo como suas teorias contribuem para o atendimento infantil nessa abordagem. Para

conhecer como é realizado o atendimento infantil nessa perspectiva teórica, foram entrevistadas

seis psicólogas que estavam realizando atendimento infantil no momento da pesquisa dentro da

abordagem transpessoal utilizando da entrevista narrativa. O presente estudo se propôs a ser

uma pesquisa de cunho qualitativo, em que utilizei a Investigação Intuitiva, método/abordagem

caracterizado por ser transpessoal. Para compreender o que emergiu nas entrevistas, utilizer a

análise temática dos dados, desenvolvida por Jovchelovitch e Bauer. Emergiram sete categorias

de análise a partir das entrevistas, se relacionando com os objetivos do estudo, sendo elas: 1) O

que é a Psicologia Transpessoal; 2) Teóricos e bibliografia utilizada; 3) Conceitos aplicados; 4)

Recursos utilizados; 5) Olhar para a criança em terapia; 6) Desenvolvimento infantil; 7)

Diferencial da Psicologia Transpessoal. A espiritualidade na Psicologia Transpessoal se

sobressaiu nos resultados, colocando essa abordagem também como um caminho envolvendo

diferentes áreas da vida, resultando em um processo de transformação do terapeuta. A maioria

das obras dos autores citados são mais voltados para a teoria como um todo, abordando os

processos psíquicos, não havendo uma discussão sobre infância na clínica nem ferramentas

criadas especificamente para esse público. Os recursos que as psicólogas utilizam são diversos

envolvendo sempre a ludicidade como mediador do processo e a adaptação de recursos e

técnicas pensadas inicialmente para o público adulto. Perceber como a criança se insere no

espaço psicoterápico e suas demandas são importantes para a terapia. Como diferencial da

Psicologia Transpessoal as psicólogas trouxeram as ferramentas disponíveis no campo da

fantasia, a possibilidade de vivenciar crenças e fantasias e a mudança que a abordagem faz com

o próprio terapeuta. Nesse contexto, os profissionais realizam uma prática clínica com crianças

pautada na psicologia transpessoal, entretanto não de forma sistematizada, por não haver essa

sistematização teórica, sendo uma construção particular de cada profissional, provenientes de

suas bagagens teóricas e do caminho que percorreram na psicologia. Destaca-se que ainda se

espera outros estudos voltados para a prática clínica em torno da criança e avançando em

trabalhos que ajudem a referenciar estudantes e profissionais a esse respeito, ressaltando a

necessidade de mais estudos sobre a criança, a infância e o atendimento infantil na transpessoal.

Palavras-chave: Psicologia Transpessoal; Psicoterapia infantil; Psicoterapia

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Abstract

The clinic is constituted as a traditional practice in psychology, in which, at the present, it is

diversifying such as in private practice, as in operationalized in public policies or institutions

of the third sector. Child psychotherapy is a significant portion of this practice, challenging

psychologists to always reinvent themselves into the child's world. In the present research, the

look at the human being was discussed from three theorists of Transpersonal Psychology, two

at international ambit Ken Wilber and Stanislav Grof; and Vera Saldanha nationwide and how

their theories contribute to child care in this approach. To know how child care is performed in

the transpersonal approach, six psychologists who were performing child care at the time of

research within the transpersonal approach using the narrative interview were interviewed. The

present study was intended to be a qualitative research, in which I used the Intuitive Research,

research method / approach characterized by being a transpersonal research. To understand

what emerged in the interviews, I used the thematic analysis of the data, developed by

Jovchelovitch and Bauer. Seven categories of analysis emerged from the interviews, relating to

the objectives of the study, which are: 1) What is Transpersonal Psychology; 2) Theorists and

bibliography used; 3) Applied concepts; 4) Resources used; 5) Look at the child in therapy; 6)

Child development; 7) Differential of Transpersonal Psychology. With the creation of these

categories, it made it possible to better understand how the field of child psychotherapy in the

transpersonal is organized. Most of the works of the authors cited are more focused on the

theory as a whole, addressing the psychic processes, therefore being no discussion about

childhood in the clinic or tools specifically created to attend this audience. Psychologists use

many and different resources, always involving playfulness as a mediator of the process and

the adaptation of resources and techniques designed for the adult. As a differential of

Transpersonal Psychology, psychologists brought the tools available in the field of fantasy, the

possibility of experiencing beliefs and fantasies and the change that the approach makes with

the therapist himself. In this context, the professionals perform a clinical practice with children

based on transpersonal psychology, however not systematically, because there is no such

theoretical systematization, being a particular construction of each professional. It is expected

to contribute to the field of transpersonal clinic, clarifying the clinical practice around the child

and advancing in studies that help refer students and professionals in this regard, highlighting

the need for further studies on children, childhood and child care in the transpersonal.

Keywords: Transpersonal Psychology; Child psychotherapy; Psychotherapy

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1. Ciclo 01 – Introdução ao tema de pesquisa

“A infância não é um tempo, não é uma idade, uma

coleção de memórias. A infância é quando ainda não

é demasiado tarde. É quando ainda estamos

disponíveis para nos surpreendermos, para nos deixar

encantar.”

(Mia Couto)

Desde que entrei no curso de psicologia, as questões acerca da criança me fascinavam

demasiadamente, fazendo-me pensar nos modos de ter acesso ao mundo infantil. Acredito que

esse interesse já emergia antes mesmo da graduação. Da mesma forma, a clínica sempre se

manifestava como uma prática na qual me identificava, fazendo-me percorrer um caminho

voltado para esses dois temas, deixando desvelar sentido nessa prática de novas descobertas e

encontro com o outro.

De início, podemos dizer que a psicoterapia infantil tem como característica a utilização

de diferentes elementos para a mediação do processo com as crianças. Geralmente são

elementos lúdicos, como brincadeiras, jogos, histórias e desenhos que ajudam na expressão de

conflitos internos. Fui percebendo esses elementos no trabalho com crianças quando comecei a

participar de um projeto de extensão na graduação com crianças e adolescentes, em situação de

acolhimento institucional. A partir de então, fui me inserindo em outros campos de atuação do

psicólogo, como contexto hospitalar e comunitário, adentrando o mundo infantil. Ainda na

graduação tive contato com a Psicologia Transpessoal através de um grupo de estudos que

estava se formando, despertando meu interesse em conhecer mais sobre a abordagem. Foi

quando fiz o curso de formação em psicologia transpessoal. Dentro da abordagem, fui

percebendo que haviam poucos psicólogos que trabalhavam com crianças, surgindo o interesse

em buscar compreender mais sobre esse tema, dando início a essa pesquisa.

A presente pesquisa busca compreender como a psicoterapia infantil é realizada partindo

de um referencial teórico da Psicologia Transpessoal, a partir da compreensão desses

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profissionais sobre clínica infantil na psicologia. Essa temática se torna pertinente de ser

investigada, pois o surgimento da Psicologia Transpessoal é recente, tendo os seus teóricos

abordado o tema da infância, mas não sistematizando ou destacando essa temática. Além disso,

a produção na área da psicoterapia infantil ainda é escassa, caminhando lentamente nas

diferentes perspectivas teóricas (Costa & Dias, 2005; Pajaro, 2015).

Podemos perceber um crescimento nas pesquisas relacionadas à psicologia clínica nos

últimos anos, devido ao aumento da demanda pela comprovação da psicoterapia, como

tratamento efetivo das desordens mentais, levando a um crescimento da produção teórica

mundial nesse âmbito (Campezatto, Nunes & Silva, 2014). Entretanto, as pesquisas em

psicoterapia ainda enfrentam dificuldades devido as diferentes modalidades de estudo nessa

área, que podem envolver a avaliação de resultados ou o processo psicoterapêutico (Brum et

al., 2012; Campezatto et al., 2014; Sousa, 2006). Essas modalidades ainda geram outra questão

relacionada ao conceito de processo psicoterapêutico, no qual ainda varia, de acordo com o

autor, não havendo uma uniformidade nas pesquisas e permanecendo em aberto (Campezatto

et al., 2014; Peuker, Habigzang, Koller & Araújo, 2009). Além das dificuldades das realizações

de pesquisa no âmbito da psicoterapia, Campezatto et al. (2014) destacam que os psicólogos

clínicos não dispõem de horas de trabalho para se dedicarem a pesquisa em psicoterapia.

Apesar desses fatores, a produção e, consequentemente, os estudos nessa área vêm

aumentando, estreitando os laços entre psicoterapia e pesquisa, aumentando a produção

principalmente nos Estados Unidos e Europa (Campezatto, Vieira & Nunes, 2013). A maior

parte dos artigos encontrados pelos autores são relacionados aos resultados gerado pela

psicoterapia, sendo a concentração maior na abordagem da Teoria Cognitiva-Comportamental,

demonstrando necessário os estudos em outras abordagens que não têm a tradição em estudos

empíricos como a Teoria Cognitiva-Comportamental.

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Sobre esse estudo, é importante destacar que se trata de um projeto de pesquisa sobre

psicoterapia e sobre psicoterapia com crianças numa abordagem específica da psicoterapia, que

é a clínica Transpessoal. Torna-se importante destacar ao leitor que o desenvolvimento de

pesquisas em psicoterapia nos últimos anos vem evoluindo, passando por estudos iniciais de

eficácia e efetividade, os quais ainda são presentes e predominantes, até o momento atual de

pesquisa em psicoterapia, que focam mais no processo psicoterápico (Brum et al., 2012).

No que concerne à Psicologia Transpessoal, Ferreira, Silva e Silva, (2015) realizaram

um estudo do Estado da Arte (Romanowski & Ens, 2006) sobre a produção de dissertações e

teses que abordavam o tema da transpessoalidade no campo brasileiro. Os estudos do Estado

da Arte se tornam relevante no meio acadêmico devido ao aumento das produções, sendo esse

um caminho para apontar os aspectos que vêm sendo abordados em um determinado tema, em

detrimento de outros, podendo se tornar uma contribuição importante para a constituição do

campo a ser estudado (Romanowski & Ens, 2006).

A busca realizada por Ferreira, Silva e Silva (2015) foi feita na CAPES (Coordenação

de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), no BDTD (banco nacional de teses e

dissertações brasileiras), no site Google Acadêmico e no site das Universidades federais,

estaduais e particulares de todos os Estados brasileiros que estavam cadastrados no site do MEC

(ministério da Educação e Cultura) e disponibilizavam seu banco de dados próprio no site da

instituição. O estudo buscou dissertações e teses que foram defendidos entre o período de 1986

a 2014, os quais continham a palavra “transpessoal” no título, resumo ou palavra-chave. De

acordo com os autores, foram encontrados 146 trabalhos, sendo 117 dissertações e 29 teses.

No que concerne as dissertações de mestrado, os autores distribuem por campo de

conhecimento e também por tema. Nos campos estas estão distribuídas entre a Enfermagem

(39), Educação (38), Psicologia (20), ciências das Religiões (11), Educação Física (02),

Ciências Sociais (02), Antropologia (01), Ciências da Comunicação (01), Ciências Artísticas

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(02) e Ciências Médicas (01). O grande quantitativo no campo da enfermagem se explica pelo

fato dos trabalhos estarem dentro da categoria do “cuidado transpessoal”, uma teoria

desenvolvida por Jean Watson, entretanto, boa parte do quantitativo se refere ao paradigma

transpessoal, contribuindo nesse aspecto (Ferreira et al., 2015). Quanto as teses, estas estão

distribuídas nos campos da Educação (15), Psicologia (09), Ciências Sociais (01), Enfermagem,

(03) e Economia (01). Na divisão por temas, as dissertações estão divididas entre Cuidado

Transpessoal (31), Enfoque em Autor (13), Educação Integral (18), Contribuições Paradigma

Transpessoal (10), Consciência (09), Espiritualidade (09), Religião (07), Sentido existencial

(04), Transdisciplinaridade (04), Relação Corpo-mente (03), Transcendência (03), Temática

Morte (02), Psicoterapia Transpessoal (02), EAD (01) e Arte (01). No tocante as teses, estas

estão divididas entre Educação Integral (10), Transdisciplinaridade (03), Espiritualidade (03),

Consciência (02), Paradigma Transpessoal (02), Enfoque Autor (02), Análise existencial (02),

Temática Morte (01), Transcendência (01), Psicoterapia Transpessoal (01), Cuidado

Transpessoal (01) e Relações Humanas (01). A partir dessa revisão do Estado da Arte, podemos

perceber a escassez nos estudos quando o tema é Psicoterapia Transpessoal, percebendo uma

necessidade de estudos que envolvam também esse aspecto.

Com o intuito de conhecer mais sobre os recentes temas estudados na Transpessoal,

realizei levantamento dos temas abordados nas dissertações e teses pela Transpessoal, a partir

do ano de 2014. As bases nas quais foram realizadas a busca são: o Google Acadêmico, os

Periódicos CAPES e a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações. As palavras que utilizei para

encontrar foram: Transpessoal, transpessoalidade, espiritualidade, Psicologia Integral,

integralidade, educação integral, Ken Wilber e Grof. No total foram encontradas 15 dissertações

e 12 teses. Os principais campos nas dissertações foram: Educação (9), Enfermagem (5), Gestão

de Negócios (1). Já nas teses, os campos foram: Educação (4), Psicologia (2), Enfermagem (2),

Ciências Médicas (2), Filosofia (1) e Língua Portuguesa (1). Em relação aos temas nas

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dissertações, foram encontrados os seguintes: Educação Integral (6), Espiritualidade (4),

Cuidado Transpessoal (3), Formação (1) e Relações Humanas (1). No que concerne as teses, os

temas foram: Educação Integral (2), Espiritualidade (2), Transdisciplinaridade (1), Cuidado

Transpessoal (2), Arte (1), Enfoque Autor (1), Filologia (1), Psicoterapia Transpessoal (1) e

Ciências Médicas (1).

Em relação aos artigos, foi realizada uma busca utilizando o nome Transpessoal no

título, palavra-chave ou resumo nas bases de dados da Scielo, Periódicos CAPES e Google

Acadêmico. No total, foram achados 71 artigos publicados em revistas nas áreas de:

Enfermagem (41), Psicologia (20), Educação (5), Comunicação (1), Serviço Social (2),

Ciências Médicas (1) e Antropologia (1). Os temas dos artigos estavam relacionados a: Cuidado

Transpessoal (33), Contribuição Paradigma Transpessoal (13), Espiritualidade (7), Psicoterapia

Transpessoal (6), Sentido Existencial (3), Música e terapia (3), Educação Integral (2), História

da Transpessoal (2), Temática Morte (1), Sócio-Cultural (1).

A partir de então, podemos dizer que os estudos com o tema da Psicoterapia

Transpessoal ainda está em crescimento, principalmente no âmbito acadêmico, quando

buscamos por artigos em revistas indexadas. Quando o recorte se torna mais específico, como

relacionado ao tema da Psicoterapia Infantil Transpessoal, a dificuldade em encontrar estudos

se torna ainda maior. Diante disso, a presente pesquisa pretende contribuir com essa área da

Psicologia, problematizando o campo da psicoterapia. Neste sentido investigamos como é

realizado o trabalho dos Psicólogos que trabalham com psicoterapia infantil, na abordagem da

Psicologia Transpessoal.

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2. Objetivos

2.1 Objetivo geral:

Compreender o lugar da clínica infantil na abordagem transpessoal a partir da

perspectiva de profissionais da cidade de Natal-RN.

2.2 Objetivos específicos:

a) Discutir como se organiza o campo do trabalho da clínica infantil na perspectiva

transpessoal;

b) Apreender o modo como os entrevistados formulam conceitos e noções relacionando-

as à prática da clínica transpessoal com crianças;

c) Indicar nas narrativas dos entrevistados a existência ou não de elementos específicos

que caracterizem uma clínica infantil na psicologia transpessoal.

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3. Ciclo 02 – Revisão de Literatura

3.1. A criança em terapia

A clínica se constitui como sendo uma prática realizada por muitos psicólogos, como

também um modelo de atuação ainda mais disseminado, que na atualidade vai se diversificando,

quer na prática privada, seja operacionalizado nas políticas públicas ou brotando nas

instituições do terceiro setor. Em sua origem, a palavra clínica, segundo Barbier (1985) provém

do grego, kliné, significando “procedimento de observação direta e minuciosa” (p. 45). O termo

klin, o qual advém do grego significa “leito”. Partindo assim dá origem do termo, a clínica

significa debruçar sobre o leito, sobre o doente que se encontra lá. Assim, a clínica psicológica

nasce no modelo médico, em que percebe a necessidade de observar para posteriormente

intervir, tratar (Moreira, Romagnoli & Neves, 2007).

Para além dos debates a respeito do fazer clínico e da sua importância no contexto da

infância, é importante ressaltar que aqui trazemos a infância e a criança como um ser, a qual

está em um lugar autêntico de fala e sabedoria (Oliveira, 2017). Oliveira (2017) discute que a

infância nas sociedades ocidentais foi pensada como apenas um fato da vida humana, indicando

o não instituído ou que resiste as determinações culturais, mas que também compreende a

infância como uma “morada, lugar de aprendizado, espanto da linguagem” (Oliveira, 2017, p.

19). Assim, por muito tempo a infância foi tida com essa concepção, entretanto, as filosofias

contemporâneas, principalmente na área da educação, estão buscando ampliar suas concepções

para além de apenas um período cronológico de experiência, uma infância e um infante no qual

está presente em todos, na criança, mas também no adulto, no pai e na mãe que tutela aquela

criança, todos temos um infante constituindo nosso ser (Oliveira, 2017).

O esforço empreendido por estudiosos com Ariès (1981) e mais contemporaneamente

Sarmento (2008) nos ajudam a repensar também a compreensão sobre a infância na psicologia

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de modo geral e na clínica mais particularmente, pois auxilia a refletirmos sobre o lugar da

infância na sociedade e como ela está inserida nos contextos atuais. Até mesmo o modo como

foi construída a noção de infância, subsidiando e dando aportes teóricos para compreender o

olhar sobre as crianças e como isso influencia em outros aspectos internos.

A infância como a percebemos atualmente nem sempre foi tida como infância, pois esta

é uma construção social que foi se desenvolvendo com o decorrer da história. A sociologia da

infância tem como objeto de estudo as crianças como atores sociais e a infância como uma

categoria social do tipo geracional, a qual é socialmente construída (Sarmento, 2008). Nesse

sentido, a criança deve ser estudada como uma categoria geracional de modo a articular os

elementos de homogeneidade, estando ciente das imagens sociais a que a infância está ligada e

a par da geração em que está inserida (Sarmento, 2008).

Desse modo, é importante conhecer que a construção social da infância foi erguida sob

um viés da negatividade, sobressaindo os pontos negativos e o que a criança não tinha

capacidade de realizar (Sarmento, 2008). Fazendo um contraponto com esse olhar, a sociologia

da infância nasce com um alicerce no paradigma da competência infantil (Hutchby & Moran-

Elis, 1998 citado por Sarmento, 2008) a qual considera todas as crianças competentes no que

fazem, sendo consideradas suas experiências e oportunidades de vida, tendo em vista que suas

competências são distintas das aptidões desenvolvidas pelo adulto. Nesse viés, a infância não é

considerada como uma fase de transição e sim como uma condição social com características

próprias e distintas de outras fases etárias, inserido em uma lógica do diferente e não da

grandeza, incompletude, imperfeição.

A clínica vai se constituindo ao longo da história, se referenciando em uma visão do

humano e de mundo particular de cada teoria. Deslocando o olhar para o trabalho com crianças,

as abordagens teóricas e seus precursores realizaram uma sistematização para o atendimento

infantil a partir das visões coerentes com suas abordagens. Por este ângulo, as principais

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correntes foram construindo modelos, instrumentos e técnicas para a realização do atendimento

infantil, que serão mais detalhadas a seguir.

A partir da psicanálise, com Freud, ocorre uma mudança no sentido de que o paciente é

detentor do conhecimento, entretanto, um conhecimento inconsciente. Nesse sentido, o papel

do psicanalista é de ser um facilitador para que esses conteúdos inconscientes emerjam (Moreira

et al., 2007). Assim, a clínica psicológica vai trilhando outro caminho, se diferenciando da

clínica médica, pois esta vai se aperfeiçoando em relação a diagnósticos, enquanto que o

caminho da psicanálise vai sendo traçado a partir do sofrimento, enfatizando-o.

A Psicanálise teve como precursor Sigmund Freud, dividindo a Psique em três

instâncias, que seriam o id, o ego e o superego (Tabuti & Puertas, 2015). Além disso, a partir

da corrente Psicanalítica de Freud surgiram os pós-freudianos, que alguns avançaram em alguns

conceitos e postulados propostos por Freud e os seus dissidentes, que romperam por discordar

de algumas ideias, como a centralidade da libido, na determinação do modo de ser do sujeito,

dando início a novas abordagens dentro da psicologia de acordo com seu modo de ver o ser

humano e o mundo.

O brincar e um olhar para a criança, começou a ser inserido na psicologia, a partir do

caso do “Pequeno Hans” (S. Freud, 1909) – uma análise de fobia em um menino de cinco anos,

em que o brincar do garoto, relatado por seu pai, aparecia como uma resolução de conflitos

intrapsíquicos – ressaltando que esse olhar para a criança é muito mais para a etapa da vida

infantil, uma vez que Freud nunca trabalhou diretamente com crianças. Após Sigmund Freud,

sua filha, Anna Freud (1965) se torna a pioneira na psicanálise infantil, com algumas teorias,

dentre elas, a utilização dos jogos que deveriam ter caráter também educativo, além disso, a

visão da criança era de um ser ainda sem maturidade psíquica. Posteriormente, Melanie Klein

(1953-1955; 1991), sugere a técnica analítica do brincar, em que o brincar é visto como

elemento principal e desprovido de caráter educativo ou moral na brincadeira, utilizando como

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elemento teórico apenas a psicanálise (Gomes & França, 2012). Assim, a brincadeira surge com

o sentido de ser um meio de acesso ao inconsciente, tendo em vista que seria correspondente,

em uma terapia do adulto, a associação livre (Gomes & França, 2012). Além do brincar, outros

métodos lúdicos foram sendo inseridos, como o desenho.

A clínica psicanalítica com adultos se difere da clínica psicanalítica com crianças, por

ocorrer uma mudança de paradigma, saindo de uma clínica baseada no significante e na

linguagem para se voltar para a questão de contenção/continente (Zornig, 2008). Donald Woods

Winnicott, outro autor da psicanálise, traz um olhar diferenciado para o brincar infantil, gerando

modificações significativas no pensamento psicanalítico (Felice, 2003). Nesse sentido, as

interpretações analíticas ficam em segundo plano, sendo o espaço do brincar mais importante

nesse setting (Felice, 2003).

A Psicologia Comportamental é embasada nas teorias comportamentais, as quais se

desenvolveram no século XX, ganhando grande repercussão com a obra de Skinner na década

de 50 (Bahls & Navolar, 2004). Essa corrente se caracteriza como sendo a mais fiel ao modelo

científico vigente na época em que surgiu, pois de acordo com Bahls e Navolar (2004), pode

conhecer as leis do comportamento, tornando-o mais previsível. Já a teoria cognitiva tem como

objeto de estudo o processamento de informações, que seria atribuir significado a algum

acontecimento ou algo (Bahls & Navolar, 2004). Ainda dentro dessa corrente, algumas ondas

de terapia vão surgindo de acordo com o avanço em pesquisas, como a Psicologia

Comportamental Clássica baseada nos experimentos de B. F Skinner, a Terapia Cognitivo-

Comportamental que tem a Psicologia Cognitiva de Aaron Beck e a Acceptanceand

Commitment Therapy (ACT) de Steven Hayes. Essa perspectiva surge com o pressuposto de

que o sofrimento é ocasionado pelo modo como o paciente processa e interpreta as situações,

tendo o objetivo a flexibilização e ressignificação dos modos patológicos de processamento da

informação (Pureza, Ribeiro, Pureza & Lisboa, 2014). Como abordagem teórica voltada para a

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psicoterapia, a TCC foi inicialmente evidenciada com adultos, tendo em vista as técnicas

utilizadas.

Entretanto, desde o behaviorismo clássico com Watson, já haviam teorias sobre o

modelo de aprendizagem infantil, realizando estudos com crianças. Um clássico experimento

realizado por ele foi com o pequeno Albert, um bebê de 11 meses, que foi submetido a um

condicionamento para ter medo de um rato branco que antes não tinha. Essa resposta se

generalizou, expandindo o condicionamento a outros estímulos similares a ratos brancos. A

partir do trabalho de Watson, teve início a aplicação sistemática de técnicas comportamentais

com a população infantil (Ardila, 2013). Atualmente, os princípios que norteiam o trabalho dos

psicoterapeutas que seguem a TCC com adultos são similares com crianças, sendo realizadas

algumas mudanças em relação as técnicas e a forma como se dá o acesso ao funcionamento

cognitivo da criança, utilizando linguagens não-verbais, por exemplo (Pureza et al., 2014).

Nessa corrente teórica, apesar de não existir um nome específico, como em outras

abordagens, é perceptível os esforços dos autores para pesquisas e estudos nesse contexto. É

notório a sistematização da Terapia Comportamental e também da Cognitiva, como em Moura

e Venturelli (2004), que sistematizam um modo de se proceder no atendimento infantil, com o

intuito de gerar reflexões acerca dessa prática para os profissionais que trabalham com crianças

nessa perspectiva. Por este ângulo, dentro desse modelo teórico, são encontrados muitos estudos

e pesquisas pensando a aplicação da teoria, como também novos modos de se trabalhar a partir

de uma determinada queixa ou problema aparente trazido pelo cliente.

A corrente teórica da Psicologia Humanista-Existencial surge, de início, a partir de um

movimento humanista (Frota, 2012). Ainda de acordo com Frota (2012), o movimento

humanista surgiu em um período de valorização do humano, em que se contrapunha ao

pensamento presente na idade média, no qual o humano era desvalorizado em detrimento de

uma moral, de algo espiritual e de costumes. Assim, podemos dizer que a Psicologia Humanista

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defende uma visão que enfatiza a vivência das emoções, da subjetividade, a intuição e as

potencialidades (Frota, 2012).

Dentre as abordagens que tiveram suas raízes no movimento humanista, a Abordagem

Centrada na Pessoa, desenvolvida por Carl Rogers ganhou destaque. Dentro dessa linha teórica,

podemos destacar Virginia Mae Axiline com seu trabalho sobre ludoterapia, sistematizando

oito princípios para o atendimento infantil a partir de uma psicologia Humanista, em seu livro

“Ludoterapia a Dinâmica Interior da Criança” (1972). Com o movimento humanista, ideias

anteriores surgiram para agregar a psicologia. O movimento fenomenológico, junto com alguns

filósofos existencialistas, fizeram parte desta corrente dando a psicologia suas contribuições.

Apesar de diferenças nas concepções filosóficas, o que une os diversos autores do

existencialismo, segundo Ewald (2008), é o questionamento do modo de ser do humano no

mundo, a relação sujeito-mundo, o ser no mundo questionando o próprio mundo, tendo em vista

que esse ser não é dado nem constituído, relacionando como o mundo é percebido pelo humano

e como se dá as possibilidades dentro desse mundo.

Já a fenomenologia aparece como um método, que ganhou domínio com Husserl em

1910, como um movimento fenomenológico que se contrapunha a ciência positivista da época,

sendo como um método de se chegar ao fenômeno (Nascimento, n.d.). A partir do movimento

existencialista somos convidados a retornar a Merleau-Ponty, que é uma voz dissonante em

relação ao pensamento positivista que vigorava naquela época. Assim, a partir da forma

simbólica que a criança tem como modo de se expressar, como proposta por Merleau-Ponty,

podemos pensar o modo de ser da criança, partindo assim de um olhar fenomenológico-

existencial, mas sendo sempre um olhar perpassado pelo olhar do adulto, o que encerra um

limite (Azevedo, 2008). Além desses autores que trabalham com crianças, outra autora que

ganhou grande destaque nessa linha, foi Violet Oaklander com seu livro “Descobrindo

Crianças” de 1978.

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Certamente, a discussão apresentada neste item poderia incluir outros cenários e atores

das diversas vertentes teóricas que estão presentes na psicologia. Fundamentalmente, nosso

argumento principal é que o desafio de olhar para a criança em terapia nos leva também a

interrogar o estatuto histórico e social da criança em si mesma. Terapeutas das clássicas

abordagens da psicologia clínica tentaram alinhar essa compreensão, com sua prática

profissional e o modo como sua perspectiva lhes subsidiava na psicoterapia com crianças.

3.2. A Psicologia Transpessoal e o olhar para a infância

3.2.1. Histórico

A Psicologia Transpessoal surgiu a partir da Psicologia Humanista com Abraham

Maslow e Anthony Sutich, como sendo uma ampliação dessa corrente, e não uma crítica a ela.

A Psicologia Transpessoal aparece no cenário mundial por volta da década de 1960, mas é

resultado de um movimento que já vinha acontecendo a partir de escritos de alguns autores,

como James, Jung, Assagioli, Moreno e Maslow (Saldanha & Oliveira, 2012). Maslow é tido

como um líder do movimento da Transpessoal. Outro significativo nome na Psicologia

Transpessoal é Stanislav Grof que desenvolvia pesquisas sobre “estados alterados de

consciência”, que outros autores, como Assagioli e Frankl, denominavam como sendo um

estado de inconsciente espiritual (Saldanha & Oliveira, 2012).

Para compreender a história da Psicologia Transpessoal, o significado do nome

transpessoal para a abordagem, utilizarei a compreensão histórica realizada por Ferreira et al.

(2015), a qual realiza essa compilação histórica.

O termo “transpessoal” foi utilizado pela primeira vez por Willian James, no ano de

1905 (Vich, 1988; Taylor, 1996; Friedman e Hartelius, 2013 citados por Ferreira et al., 2015).

A utilização desse termo também pode ser atribuída para Carl Jung, que na tradução de seus

escritos o termo “überpersönlich”, utilizado hoje como inconsciente coletivo, levaram aos

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tradutores ingleses a usarem como sinônimo de “transpessoal” (Ferreira et al., 2015). Ao longo

dessa dissertação, vai ser possível perceber a influência de Carl Jung e sua teoria na Psicologia

Transpessoal, em que podemos dizer que esse autor se destaca sendo um dos precursores da

teoria.

A palavra “trans” está atrelada ao significado de transpessoal e vem situada de

significados de pesquisas, nas quais assinalavam a dimensão da transcendência humana

(Ferreira et al., 2015). No entanto, o termo “trans” ainda carrega grande diversidade de sentidos

e significados, necessitando de uma definição mais específica do que estamos nos referindo ao

termo transpessoal, levando a uma melhor compreensão do que é a Psicologia Transpessoal

(Ferreira et al., 2015). Para esses autores, a utilização do termo transpessoal como algo “além

do humano” não condiz com o que a abordagem significa, levando as pessoas a entenderem que

a transpessoal não se refere a potencialidades pessoais. Sem incluir aspectos imanentes da

vivência, vai ao encontro do que os fundadores dessa perspectiva teórica propuseram, pois para

esses autores, a transcendência é uma potencialidade da natureza humana.

O trans não é uma categoria dada eternamente nem permanentemente, devendo ser

percebido como uma forma de evolução com o tempo, manifestando potenciais políticos

também transformadores, em que precisamos considerar a Psicologia Transpessoal em sua

integralidade, incluindo aspectos subjetivos e objetivos (Ferreira et al., 2015). O conceito de

transcendência transpessoal é atrelado a imanência do ser humano, de forma a realizar uma

compreensão mais integral do ser, aceitando toda a incompletude, abertura e amplitude do Ser

Humano (Wilber, 2001 citado por Ferreira et al, 2015). Esses autores utilizam o termo

transcendente/imanente para expressar a visão de sujeito na Psicologia Transpessoal, que

enxerga um sujeito inseparável do mundo e sendo desenvolvido pelas tradições orientais.

Configura-se também um marco da fenomenologia e da transpessoal a divergência da dualidade

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mente/corpo, postulada na tese cartesiana, fazendo uma busca de retorno ao mundo existencial.

Dessa forma Ferreira et al. (2015, p. 8) afirma que:

A transcendência na perspectiva transpessoal é posta como um convite permanente para

olharmos de maneira interdependente o aqui-e-agora do mundo vivido, desafiando-nos

a perceber este mundo vivido como solo primeiro dos nossos sentidos, incluindo nossa

abertura para o mundo e desafiando a ideia de que a verdade “habita apenas o ‘homem

interior’, ou antes não há homem interior, o homem está no mundo e é no mundo que

ele se conhece”. O trans “mais pessoal” trata a transcendência como a possibilidade de

ser expressa no mundo, mas que conserva sua abertura, sua impossibilidade de fechar-

se, seu “ir além”.

Rompendo com a lógica de pensamento newtoniana-cartesiana, com a visão não-

dualista, surgiram pesquisas no campo da consciência, tendo como principais nomes o de

Stanislav Grof e Ken Wilber, dirigindo as pesquisas, as quais possibilitam uma relação mais

integral com o mundo e consigo mesmo, surgindo assim a Psicologia Transpessoal (Ferreira et

al., 2015). A partir desses estudos e como forma de encontrar respostas para as incongruências

no modelo tradicional que domina o Ocidente, a Psicologia Transpessoal foi tomando forma e,

em 1969 ela é sistematizada com a formação da Associação de Psicologia Transpessoal. No

mesmo ano, também é publicada uma revista de Psicologia Transpessoal, sendo mais um marco

que demarca o surgimento dessa abordagem. Em 1971, Anthony Sutich organiza a Associação

Americana de Psicologia Transpessoal e em 1978, Stanislav Grof funda a Associação

Internacional Transpessoal (Ferreira et al., 2015).

Com a sistematização da teoria, surge uma definição do que seria a Psicologia

Transpessoal, que se caracteriza por ser um desdobramento das correntes teóricas anteriores,

com um interesse nas capacidades potenciais do ser humano, abarcando aspectos mais amplos

da vida do ser humano, sendo um caminho de pesquisa e vivência da espiritualidade e

multidimensionalidade do ser (Sutich, Matos, 1992, Walsh & Vaughn, 1993, citados por

Ferreira et al., 2015).

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Outro ponto que demarca a transição entre a Psicologia Humanista e a Psicologia

Transpessoal é o estudo da espiritualidade, considerada como um elemento da vida cotidiana e

da estrutura da consciência (Ferreira et al., 2015). Se observarmos o histórico da Psicologia

Transpessoal, poderemos perceber que os fundadores dessa abordagem teórica são os mesmos

da Psicologia Humanista, tendo destaque para Abraham Maslow. A inserção da espiritualidade

também rompe com um modo de pensar dicotômico, colocando o campo da espiritualidade e o

científico em polos opostos, como destaca os autores. Foi a partir do reconhecimento da

dimensão espiritual na vida do ser humano que surgiram novos estudos em torno de diferentes

aspectos, até o momento eram negligenciados (Ferreira et al., 2015).

No corpo teórico da Psicologia Transpessoal, existem as cartografias da consciência, as

quais surgem para nortear o processo de compreensão do ser humano. As cartografias da

consciência não tem a pretensão de ser uma verdade absoluta, muito menos dar conta de todo

o fenômeno humano. Portanto:

Numa tentativa de síntese, a Psicologia Transpessoal busca incluir em seu modelo

teórico os conhecimentos das escolas psicológicas anteriores, além de realizar um

intenso diálogo transdisciplinar com outras áreas do conhecimento no intuito de compor

um “paradigma integral”, que apresenta o humano dentro de uma perspectiva

multidimensional e integral, no qual as categorias de corpo, emoção, mente e espírito

nas suas relações com o subjetivo, com o social e com o cultural expandem o campo da

pesquisa psicológica, incluindo áreas da experiência e do comportamento humano

associadas à saúde e ao bem-estar. (Ferreira et al., 2015, p. 11)

Dessa forma, esses autores destacam que a Psicologia Transpessoal se coloca no campo

dos saberes como um paradigma que não se propõe a ser fechado ou uma verdade única, mas

como uma forma de expansão do estudo do humano.

3.2.1.1. Histórico no Brasil

Quando voltamos a atenção para a história da transpessoal no cenário brasileiro, Ferreira

et al. (2015) destaca dois nomes, Pierre Weil e Léo Matos, sendo um grande marco em 1978

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com a realização do IV Congresso Internacional de Psicologia Transpessoal, em Belo

Horizonte. Pierre Weil tem seu destaque no pioneirismo da introdução dessa abordagem no

campo acadêmico, percorreu o Brasil anunciando a Transpessoal, criando centros formadores

e uma universidade em Brasília (Ferreira et al., 2015). Léo Matos influenciou a formação de

psicoterapeutas transpessoais em todo território brasileiro, como também abriu um canal de

comunicação com seu curso na Índia (Ferreira et al., 2015).

Esses dois nomes de psicólogos transpessoais tiveram grande importância no Brasil e

caminharam juntos por muito tempo, entretanto, houve uma cisão na relação deles, acabando

por criar dois movimentos diferentes na transpessoal no Brasil, em que, apesar dos esforços,

ainda não houve uma integração desse saber (Ferreira et al., 2015).

Ao longo desses anos a Psicologia Transpessoal foi se fortalecendo. Alguns marcos se

destacam nessa história, os quais foram destacados na obra de Ferreira et al. (2015) com nomes

da Psicologia Transpessoal no Brasil, incluindo a inserção dentro do campo acadêmico e a

criação de cursos de formações e associações. Os autores, destacam que houveram três vias de

entrada da Psicologia Transpessoal no Brasil encontrada no trabalho de doutorado de Ferreira

(2007), sendo elas: a) Ação individual ou via dos pioneiros, b) Movimento Popular e

comunidades terapêuticas ou via alternativa e c) Oficial ou via acadêmica.

A primeira via foi um movimento não sistematizado e individualizado, em que pioneiros

emergiram na psicologia tradicional e começaram a introduzir os estudos sobre os estados

alterados de consciência e a tentativa de conciliar sua visão de mundo com os modelos da

psicologia já existentes. Esse movimento iniciou a partir da vivência individual dos próprios

psicólogos e a tentativa de inserir isso na psicologia, mas ainda não havia uma necessidade de

que isso fosse compartilhado em grupos.

A segunda via foi influenciada por trabalhos em grupos junto a movimentos populares

e comunidade terapêuticas, aproveitando também o movimento humanista da década de 60.

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Essa inserção era realizada por psicólogos ligados a movimentos populares e o caráter informal

ainda estava bastante presente, não havendo preocupação em haver uma inserção da

transpessoal no campo acadêmico.

A terceira via tem seu marco com a realização da Quarta Conferência Transpessoal

Internacional em Belo Horizonte, organizada por Pierre Weil e Léo Matos em 1978. A inserção

no campo acadêmico acabou se tornando uma necessidade para a legitimação da Psicologia

Transpessoal, pois estaria circulando em um espaço paradigmático. Esse esforço teve início

com Pierre Weil e vem sendo empregados esforços desde então para que haja esse intercâmbio

com a transpessoal, de forma que não fique marginalizada nas abordagens, adquirindo

maturidade enquanto teoria.

Sobre isso, Ferreira et al. (2015) destaca alguns marcos para a Psicologia Transpessoal

no Brasil que são importantes destacar, como a criação da Associação Brasileira de Psicologia

Transpessoal (ABPT) em 1985 por Léo Matos; a primeira defesa de dissertação em 1986, de

Marcia Tabone; a criação da Universidade Holística Internacional de Brasília (UNIPAZ) tendo

Pierre Weil à frente; a criação da Escola Dinâmica Energética do Psiquismo em 1991 por Theda

Basso e Aidda Pustilnik oferecendo cursos de formações; o Grof Transpersonal Training

(GTT), treinamento oferecido desde 1995 no Brasil; a fundação da Associação Luso-Brasileira

de Psicologia Transpessoal (ALUBRAT), em 1995 por Vera Saldanha, Manoel Simões e Pierre

Weil, sendo uma das principais instituições formadoras e divulgadora nos últimos anos da

Psicologia Transpessoal no Brasil; a criação do GRUPO OMEGA na Bahia com os principais

representantes da transpessoal no estado em 1997; o lançamento do curso de especialização em

psicologia e psicoterapia transpessoal em Maceió pelo Dr. Gerardo Campana no ano de 1999;

seguindo o esforço de Weil, Maria de Fátima Abraham Tavares introduz a psicologia

tranpessoal na graduação de psicologia da UFRN em 1989, sendo a segunda no país e a que

sustentou por mais tempo disciplinas e estágios de graduação nessa perspectiva; em 2003 houve

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a criação da Rede Nordestina de Psicologia e Psicoterapia Transpessoal; a criação da turma de

especialização em Psicologia e Psicoterapia Transpessoal na Universidade Federal de Sergipe

pela Drª Norma Alves de Oliveira em 2004; a fundação Associação Norte Riograndense de

Psicologia e Psicoterapia Transpessoal (ANPPT) em 2011; o curso de especialização em

psicologia e psicoterapia transpessoal ministrado por Débora Cristina Diógenes Andrade e

Marlos Alves Bezerra desde 2002; o I Colóquio Brasileiro de Pesquisa em Psicologia

Transpessoal na cidade de Natal/RN proposto pelos professores Aurino Ferreira da UFPE e

Marlos Bezerra da UFRN em 2011; a inserção da Psicologia Transpessoal em uma sociedade

oficial da Psicologia no Brasil em 2011 pelo Comitê de Psicologia Transpessoal no interior da

tradicional Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul.

Contudo, a Psicologia Transpessoal inserida no campo acadêmico é resultado de longos

anos de pesquisa sobre estados ampliados de consciência, resultando em uma maturidade

paradigmática e o esforço de psicólogos para um diálogo não marginalizado, possibilitando a

formação e o conhecimento dessa abordagem (Ferreira et al., 2015).

3.2.2. Autores

Após revisar a história da Psicologia Transpessoal, no âmbito internacional e nacional,

passamos a escolha dos autores que consideramos importante para a discussão na dissertação.

Reconhecemos a existência de diversos autores importantes cuja contribuição chegou ao Brasil

como: Roberto Assagioli e Leo Matos, em no final do século XX, Roger Woolger, Jean-Yves

Leloup, Susan Andrews. Mas optamos pelos dois autores que estavam presentes desde o início

do movimento nos Estados Unidos e cujos modelos trouxeram mais influência a outros autores,

além das inovações por eles introduzidas. Desse modo, optamos por explorar a teoria de Wilber

e Grof devido a inovação em seus modelos teóricos, trazendo outro olhar para a prática

psicológica. Do mesmo modo, reconhecemos a importância de cartografias nacionais

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construídas pelas brasileiras Eliana Bertolucci na PUC-SP no fim dos anos 1980 e fora da

academia de uma síntese original entre os trabalhos de Wilber e as contribuições das escolas

psicocorporais realizadas por Aidda Pustilnik em colaboração com Theda Basso, no eixo

Salvador-São Paulo. Ainda assim, optamos pelo trabalho de Vera Saldanha em função do seu

trabalho formativo de psicoterapeutas em todas as regiões do Brasil desde a fundação da

ALUBRAT.

3.2.2.1. Ken Wilber

Ken Wilber, um importante teórico da Psicologia Transpessoal, tem seu renome como

o criador do Movimento Integral e dos estudos integrais, articulando diversas áreas do

conhecimento, como componentes da integralidade do ser humano, em que baseia sua teoria.

Sua visão teórica dialoga com diferentes áreas, integrando de maneira coerente as verdades

parciais de diversas áreas do conhecimento de maneira que, elas se complementam, levando a

visão integral do humano (Lima, 2014). Ken Wilber propõe uma psicologia integral

considerando e aceitando cada aspecto da consciência humana como sendo legítimo (Wilber,

2009).

A filosofia perene, um alicerce filosófico da psicologia integral, tem como premissa a

concepção de que a realidade é composta de vários níveis do ser e do conhecer (níveis de

existência), onde um nível engloba outro, em uma dimensão maior está contido aspectos de

dimensões menores (Wilber, 2009). Essas dimensões são chamadas por Wilber (2009) de

“Grande Ninho do Ser”, sendo essa cadeia um elemento fundamental na filosofia perene,

portanto, fundamental também para uma psicologia integral.

O Grande Ninho do Ser, baseado na filosofia perene, é fruto dos estudos realizados no

período pré-moderno. Ken Wilber, para criar a psicologia integral realizou estudos englobando

o período pré-moderno, o período moderno e o pós-moderno. O período da modernidade surgiu

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a psicologia científica, entretanto, com o seu desenvolvimento, aspectos diferentes foram sendo

enfatizados. Para a psicologia integral, todos os aspectos que, em algum momento da história

foram enfatizados, são importantes para a constituição da consciência do ser humano, sendo

necessário um amplo olhar para esses aspectos como um todo.

Os níveis presentes no Grande Ninho do Ser são compostos por uma compilação de

estudos realizados e produzidos no oriente e ocidente, de diferentes tradições filosóficas,

religiosas, espirituais e científica (Arantes, 2014). Wilber (2009) caracterizando o Grande

Ninho como sendo uma grande holarquia do ser e do conhecer.

Ken Wilber propõe uma cartografia da consciência (1986, 1999a, 1999b), também

utilizada na Psicologia Transpessoal, que fala dos níveis de desenvolvimento da consciência,

indo desde os níveis mais básicos e primitivos, em que há uma identidade construída em torno

da corporeidade, até níveis mais integradores do corpo e da mente com o mundo ao redor.

Outrossim, Wilber (2009) continuaria avançando em sua cartografia propondo uma

Psicologia Integral abrangendo os “quatro quadrantes do Kosmos”. O Kosmos, para os gregos,

era o universo sensível regido pela ordem que explicaria o funcionamento do universo e da

natureza (Wilber, 2009). Ken Wilber utiliza este termo relacionando a uma visão integral,

integrando diversos aspectos constituintes do ser. Diante disso, podemos dizer que os dois

principais objetos de estudo da teoria transpessoal sejam a consciência e a espiritualidade.

Buscando uma compreensão que pudesse integrar diferentes verdades teóricas, não de

uma maneira eclética, mas percebendo o olhar para diversos aspectos que cada teoria têm sem

buscar uma verdade universal. Percebendo essa realidade, Wilber criou um mapa, que

chamamos de cartografia da consciência, em que houvesse possibilidade, abertura, para que

outros aspectos fossem incluídos. De início, Wilber reuniu diversas teorias de diferentes áreas

do conhecimento, com todas as verdades parciais dessas áreas, olhando de um ponto que

interliga essas verdades, fazendo dialogar de maneira coerente (Lima, 2014). Ele considera que

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a integração dessas verdades proeminentes de distintas áreas do conhecimento é mais valiosa

que a supervalorização de uma determinada área em detrimento de outra, pois traz as conquistas

que os conhecimentos trouxeram para o entendimento da realidade (Lima, 2014). Esse mapa

representa um guia para compreender a consciência do ser humano, realizando uma leitura

abrangente (Silva, 2016).

Com esse intuito de integrar os conhecimentos humanos, foi que se originou o Sistema

Operacional Integral, constituído dos elementos das diversas áreas de conhecimento, sendo

inicialmente aplicadas ao desenvolvimento do ser humano, mas posteriormente se percebeu que

ela pode ser aplicada em diversas áreas de conhecimento, basta ter esse olhar integral.

Para a compreensão desse mapa integral, cinco elementos se tornam necessários

conhecer, sendo eles: estados de consciência, estágios ou níveis de desenvolvimento, linhas de

desenvolvimento, tipos e os quatro quadrantes (Wilber, 2010).

a) Estados de consciência

Os principais e mais conhecidos estados de consciência são o de vigília, de sonho e de

sono profundo, todavia, existem também estados diferentes, como os estados meditativos

(induzidos pela ioga, oração, meditação), estados alterados de consciência (os quais podem ser

induzidos por drogas), e experiências de pico (induzidas por experiências intensas, como ouvir

uma boa música, andar na natureza) (Wilber, 2009, 2010). Esses estados podem não ser

determinantes, mas podem ter grande importância. Por isso, é necessário considerar esse fator

quando se estiver utilizando um modelo de abordagem integral, de acordo com Wilber (2010).

Esses estados estão disponíveis para todos os seres humanos acessarem,

independentemente da idade, ou do estágio de desenvolvimento, pois estar acordado, sonhar e

dormir está acessível a qualquer pessoa (Wilber, 2009). Como exemplo, Wilber destaca que as

experiências de picos (chamadas por Maslow também de experiências platô ou culminantes)

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podem ser vivenciadas por pessoas em quaisquer estágio de desenvolvimento, todavia, a

maneira como isso será interpretado, compreendido e integrado depende de cada sujeito.

Quadro 1 – Estados nos quatro quadrantes

DIMENSÕES ESTADOS

EU Estados emocionais, estados criativos

NÓS Estados interpessoais de relacionamento, estados de emoções

compartilhadas

ISTO Estados cerebrais, estados biológicos

ISTOS Estados econômicos, estados políticos, estados climáticos

Fonte: Lima, 2014 adaptado de Wilber, 2011 com alterações nossas

No quadro acima fica perceptível como os Estados estão presentes nas dimensões do ser

humano. Essas dimensões estão relacionadas ao interior e exterior do individual e do coletivo.

O “eu” e o “nós” são os aspectos subjetivos do ser humano, como funciona internamente o

sujeito e o contexto que está inserido. O “isto” e “istos” se referem ao que é observável na

dimensão individual e coletiva, são os aspectos mais objetivos, que podem ser “mensurados”.

Explicaremos como isso se estrutura melhor no item “e” dessa sessão.

A principal característica desse elemento, para que possamos entender a teoria de Ken

Wilber, é de que os estados são transitórios. Independente do momento ou experiência que

estamos vivendo, ela vai passar e dar lugar a outro estado que iremos vivenciar. Caso aconteça

do estado vir a não ser mais transitório, deixa de ser estado para ser nível ou estágio, que iremos

abordar a seguir.

b) Estágios ou níveis de desenvolvimento

Para Wilber (2010), os estágios se referem as conquistas em termos de crescimento ou

desenvolvimento, se tornando uma aquisição permanente, uma vez que você as tenha

alcançado. No desenvolvimento, quando se alcança certas aquisições, como a linguagem, o

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desenvolvimento psicomotor, dificilmente há um retrocesso, são características que se tornam

permanentes.

No tocante a quantos estágios ou níveis existem, esse é um ponto bastante variável, pois

depende para qual esfera você pode estar direcionando sua atenção. Sua ideia não se refere a

superioridade, mas a complexidade, cada nível se torna mais complexo que o anterior, cada

estágio que compreende a existência do ser humano é fundamental nos níveis subsequentes, um

não invalida o outro, e não está certo ou errado, mas cada um contém sua verdade (Lima, 2014).

Para pensar a infância e como ocorre seu desenvolvimento, destaco aqui uma construção

feita por Wilber para pensar o desenvolvimento a partir de diferentes teóricos. Para a

compreensão desses estágios, acredito ser importante explanar um pouco sobre os níveis pré-

convencional, convencional e pós-convencional (Wilber, 2009, 2010). Esses estágios estão

relacionados ao desenvolvimento moral. Se inicia no egocêntrico, onde o bebê está voltado para

si mesmo, mas à medida que vai conseguindo assimilar regras, entendendo a cultura, se

inserindo nos grupos sociais, o estágio passa para etnocêntrico. Nesse momento a criança está

inserida nesse contexto social e tende a excluir os demais que não estão inseridos, mas quando

passa para o próximo estágio, a identidade passa a se expandir, incluindo e considerando outras

pessoas, independentemente de estarem no mesmo grupo. Esse é o estágio pós-convencional.

Wilber (2009) destaca a importância do desenvolvimento pensado por diversos teóricos

e, como o Eu vai se constituindo, como a consciência vai surgindo, desde o mundo material,

até uma diferenciação do Eu corporal do ambiente material. Dessa forma, a medida que a mente

se desenvolve, o ser se transforma e adquire novas formas de pensar. Assim como o Eu vai se

constituindo, a visão de mundo, perspectivas e moral também se desenvolve. Wilber (2009)

apresenta um olhar sobre o desenvolvimento, entretanto, embora a discussão sobre infância seja

dispersa na obra de Wilber, indiscutivelmente ele aporta uma construção original sobre

desenvolvimento infantil para a psicologia transpessoal, numa tentativa de integração entre a

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visão de desenvolvimento infantil no ocidente e as tradições orientais (Wilber, 1986, 1999a,

1999b, 2009).

Ken Wilber (1986) no livro “Transformações da Consciência” propõe um modelo de

desenvolvimento psicológico em que as estruturas da psique são divididas em dois tipos gerais,

sendo as estruturas básicas e as estruturas de transição, havendo linhas de desenvolvimento em

ambas. As estruturas básicas se definem por permanecerem existindo com o avanço do

desenvolvimento a partir do momento em que emergem, diferente das estruturas de transição,

as quais são estruturas de fase específica e de fase temporária, tendendo a serem substituídas

parcialmente ou por completo mediante as fases seguintes (Wilber, 1986). Essa estruturação

realizada pelo autor não constitui como uma separação rígida, mas ressaltar as importantes

qualidades que emergem nos estágios de desenvolvimento, os aspectos importantes desses

fenômenos (Brasil, 2019). O self, ou sistema do self, estaria mediando os desenvolvimentos

estruturais e é descrito por Wilber (1986) como sendo o ponto em que processa, realiza a

identificação e organização das experiências nos níveis de crescimento e desenvolvimento

estrutural.

As estruturas básicas do autor foram desenvolvidas a partir de uma análise e comparação

das principais escolas psicológicas e religiosas, construindo um modelo que inclui as tradições

orientais e ocidentais e tentando preencher as diversas lacunas que são deixadas por ambos os

modelos isoladamente (Wilber, 1986). Sobre o desenvolvimento, muitas escolas teóricas

abordam de maneira similar alguns aspectos, principalmente as estruturas de 1 a 6, as quais são

mais facilmente percebidas (Wilber, 2009). As estruturas da consciência se destacam de estados

da consciência por poderem proporcionar maiores informações sobre o indivíduo e como este

se encontra no desenvolvimento (Wilber, 2009). São elencadas dez estruturas básicas do

desenvolvimento da consciência as quais são desenvolvidas nessa respectiva ordem:

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sensorifísico; famtasmagórico-emocional; mente-representativa; mente regra/papel; mente

formal-reflexiva; visão-lógica; psíquico; sutil; causal; último (Wilber, 1986, 2009).

Quadro 2 - Estrutura básica do desenvolvimento

Estrutura Básica Característica

1. Sensorifísico Se refere ao reino da matéria, sensação e percepção. É o primeiro

estágio desenvolvido no início da vida

2. Fantasmagórico-

emocional

Caracterizado como o nível emocional-sexual e fantasmagórico,

referindo a simples visualização de imagens

3. Mente-rep

Significa uma abreviatura para mente representativa. Acontece em

dois estágios, o de símbolos (2-4 anos) e o de conceitos (4-7 anos).

Essa estrutura se diferencia da anterior pelo fato de um símbolo

poder representar a imagem não exatamente como ela é, sendo a

representação simbólica uma operação cognitiva mais sofisticada e

os conceitos são símbolos que representam objetos ou atos.

4. Mente

regra/papel

Relaciona-se ao pensamento operacional concreto de Piaget. Pode

realizar operações de regras e assumir o papel de outras

5. Mente formal-

reflexiva:

É o pensamento operacional formal de Piaget. É uma estrutura na

qual se caracteriza por poder pensar acerca do pensamento, sendo

auto-reflexiva e introspectiva.

6. Visão-lógica

Uma estrutura cognitiva além das estruturas descritas por Piaget.

Essa estrutura estabelece uma rede dos relacionamentos

estabelecidos pela mente formal. Caracterizada como uma estrutura

integrativa, pois pode realizar sintetizações, conexões, coordenar

ideias.

7. Psíquico

Esse nível pode ser percebido como uma culminação do nível

anterior, a visão lógica. Assinala o início do desenvolvimento

transpessoal. O indivíduo inicia um processo de aprendizado sobre

inspecionar as capacidades cognitivas e perceptuais da mente,

começando a transcende-la.

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8. Sutil

O nível sutil é caracterizado como o início de uma introvisão

transcendental, que seria um estado de ver as coisas de outra forma,

dando lugar a arquétipos e com maior abertura para a intuição.

9. Causal Esse é um estado descrito como um self universal e sem forma,

comum a todos os seres.

10. Último Esse estágio não é como os outros, sendo uma condição ou essência

de todos os níveis anteriores.

Fonte: Adaptado de Wilber 1986

Com o intuito de facilitar o entendimento, Wilber dividiu esses estágios em três etapas

do desenvolvimento, sendo a fase pré-pessoal, pessoal e transpessoal. A partir desses estágios,

podemos dizer que nos níveis 1 ao 6 são estágios de desenvolvimento considerados pré-pessoais

e pessoais pelo autor, sendo os níveis 7 a 10 os estágios transpessoais de consciência, sendo

representados como os mais importantes. Os últimos estágios, considerados transpessoais são

experienciados no sujeito como significado, ou como propósito (Brasil, 2019). São

fornecedores de sentido, de uma visão de mundo, de um enraizamento na vida. Wilber (1986)

caracteriza esses dez níveis como funcionalmente dominantes, uma vez que amadurecemos e

aprofundamos os níveis anteriores. Essas estruturas caracterizadas como transpessoais podem

ser conscientemente manifestas nas pessoas ou um potencial dos seres humano, como uma

realidade que ainda não foi efetivada, mas potencialmente presente enquanto uma estrutura

disponível e que pode ser desenvolvida ao longo da vida (Wilber, 2009). Os níveis de 1 a 6

surgiram em uma grande escala, sendo observados e abordados por muitos teóricos da

psicologia e de estudos religiosos, sendo mais facilmente observados (Wilber, 2009).

Os Estágios de Transição, denominados também por Estágios do Self, são estruturas que

não estão incluídas no estágio de desenvolvimento que se segue, tendendo a serem negadas,

dissolvidas ou substituídas no desenvolvimento. Uma metáfora usada por Wilber, para tornar

essa discussão mais clara, é sugerir que os estágios ou estruturas são patamares ou níveis de

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uma montanha. Em cada patamar uma visão nova do mundo ao redor é possível. Os estágios

de transição ou de Self são o Alpinista, ou seja, o senso do eu que se modifica a cada novo

patamar explorado na montanha. Ou seja, quando uma pessoa ascende de um nível para outro

o estágio continua existindo, entretanto, a perspectiva limitada do estágio não, havendo uma

integração das novas maneiras de enxergar do novo estágio.

Dessa maneira, cada estrutura básica do desenvolvimento apoia vários estágios do self,

tais como diferentes necessidades, pesquisadas por Maslow, estudadas por Loevinger e

diferentes conjuntos de respostas morais, as quais foram estudadas por Kohlberg (Wilber,

1986). Abaixo, exponho a relação das estruturas básicas de consciência com os três aspectos

dos Estágios do Self mencionados anteriormente encontrados em Wilber (1986, p. 28).

Quadro 3 - Estágios do Self

Estágios do Self Características

1. Sensorifísica

Sua necessidade é fisiológica, a sensação de identidade é “autista” e

“simbiótico”, e o sentido de moral ainda está em um estágio “pré-

moral”

2. Fantasmagórico-

emocional

Sua necessidade também é fisiológica, a sensação de identidade é

impulsivo inicial e o sentido de moral é denominado “desejo

mágico”

3. Mente-rep

Tem como necessidade a segurança, sua identidade é impulsiva e

auto protetora, e o sentido moral está no nível pré-convencional

contemplando os estágios de “punição/obediência” e “hedonismo

ingênuo” assinalados por Kohlberg.

4. Mente

regra/papel

Tem como necessidade o pertencimento, a identidade é de

conformismo e conformismo consciente, está no estágio

convencional do sentido moral, que contempla a “aprovação dos

outros” e “lei e ordem”.

5. Formal-reflexiva

Sua necessidade é a autoestima, tem como identidade a consciência

e o individualismo, sua moral é pós-convencional, que englobaria os

“direitos individuais” e os princípios de consciência individual.

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6. Visão-lógica

Sua necessidade é a auto realização, sua identidade é autônomo e

integrado, seu sentido de moral continua sendo pós convencional

sem se correlacionar com nenhum estágio especificamente.

7. Psíquica Para esses três estágios, as necessidades são a mesma, de auto

transcendência, a identidade não foi destacada por Loevinger e

como sentido moral, Kohlberg sugeriu um estágio após ter

sistematizado os anteriores que seria “universal-espiritual” e

contemplaria todos os estágios classificados como “transpessoais

8. Sutil

9. Causal

Fonte: Adaptado de Wilber 1986

Dessa maneira, podemos dizer que o Self vai se modificando em conformidade com o

nível de consciência que ele mesmo “habita”. Por essa analogia podemos dizer que, em

diferentes momentos de vida, é possível termos como protagonista um self ou “eu físico”, “eu

emocional” e assim sucessivamente (Wilber, 1986). Após essa identificação com uma

estrutura/nível específica ocorre uma busca por consolidar, integrar e organizar os novos

aprendizados dessa estrutura. Wilber inspira-se em Jean Piaget para dizer que é necessário haver

em cada nível, por parte do Self, uma identificação, uma negação e uma desidentificação para

alcançar um novo patamar de desenvolvimento.

Wilber destaca que existem diferentes tipos de desenvolvimento e, dependendo de qual

esfera do indivíduo esteja em evidência, haverá um olhar para as etapas do desenvolvimento

especificamente, o que faz pensar que não existe uma verdade única. O importante é perceber

que os estágios são marcos permanentes no caminho, independente de qual desenvolvimento

seja ele, podendo ser fases culturais, fases cognitivas, estágios de desenvolvimento moral

(Brasil, 2019).

c) Linhas de desenvolvimento

Um outro elemento importante estudado por Wilber são as linhas de desenvolvimento.

Elas são linhas relativamente independentes uma das outras, ou seja, geralmente elas podem se

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desenvolver sem depender que uma outra se desenvolva, e se referem ao desenvolvimento em

diferentes aspectos da vida, como desenvolvimento moral, afetivo, espiritual, cognitivo,

interpessoal, dentre outras (Wilber, 2009). Por exemplo, área cognitiva é amplamente estudada

pelos psicólogos ocidentais e importante no desenvolvimento do ser humano. Ela se faz

significativa para ter a consciência e poder desenvolver as demais linhas de desenvolvimento,

mas não suficiente, é preciso outras ferramentas para isso (Wilber, 2009). Essas linhas não são

trilhos retos, podem ser como ondas, por isso também são chamadas de correntezas ou correntes

do desenvolvimento (Lima, 2014).

Esse conceito foi bastante difundido por Howard Gardner com as inteligências

múltiplas, pois os seres humanos têm diferentes inteligências, se sobressaindo em uma ou duas

delas, mas não em todas (Wilber, 2010). A possibilidade de sermos excepcionais em todas as

linhas é quase utópico, mas esse não é o objetivo desse elemento, o intuito é percebermos quais

são nossas potencialidades e fraquezas. Essa percepção faz parte do saber integral, pois

podemos compreender o que temos de melhor a oferecer no mundo.

As linhas de desenvolvimento se desenvolvem por meio dos estágios de

desenvolvimento, que foi abordado no tópico anterior, podendo ser os três principais (pré-

convencional, convencional e pós convencional). Quando avança nesse estágio, determinada

característica ou aprendizado foi conquistada permanentemente, caracterizando o estágio, pois

as linhas se desenvolvem de maneira sequencial, incorporando o que está no estágio anterior.

Como modo de representar essas inteligências múltiplas, Wilber criou o psicográfico

integral, ajudando a identificar os maiores potenciais, refinando esse conhecimento. Ainda

auxilia a identificar o modo como todos nós nos desenvolvemos, de maneira desigual,

facilitando na compreensão do outro.

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Quadro 4 - Linhas de desenvolvimento inseridas nos quatro quadrantes

DIMENSÕES LINHAS DE DESENVOLVIMENTO

SUBJETIVA Cognitiva, emocional, moral

OBJETIVA Visões de mundo culturais, relações

CULTURAL Desenvolvimento motor, relações culturais

SOCIAL Desenvolvimento econômico, político, modos de produção

Fonte: retirado de Lima, 2014 adaptado de Wilber, 2011 com adaptações.

Nesse quadro acima, podemos perceber como as linhas de desenvolvimento se

estruturam nas quatro dimensões presentes na vida do ser humano, pois o desenvolvimento está

presente em praticamente tudo que fazemos.

Dessa maneira, se torna possível ter consciência de aspectos da vida do indivíduo e

como é esse aspecto, possibilitando uma autocompreensão e um autoconhecimento maior,

interferindo consequentemente na relação com as outras pessoas.

d) Tipos

O elemento “Tipos” é caracterizado por Wilber (2010) como aspectos que podem estar

presentes em praticamente todos os estágios ou estados, sendo tipologias horizontais, pois não

tem esse componente hierárquico. Os tipos se assemelham com uma maneira de descrever o

lugar do qual se opera, as estruturas nas quais estamos inseridos no mundo, já construído e

conectados com uma estrutura social, histórica, cultural (L. A. C. Silva, 2016).

A partir do quadro abaixo podemos perceber como os tipos se organizam dentro das

quatro dimensões presentes na vida do ser humano.

Quadro 5 - Tipos nas quatro dimensões

DIMENSÕES TIPOS

EU Tipos de personalidade (extrovertido, intuitivo)

NÓS Tipos de relacionamento (amizade, romântico), tipos culturais, tipos de

comunicação (direta, indireta)

ISTO Tipos sanguíneos, tipos corporais

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ISTOS Tipos de democracia (parlamentar, bipartidária), tipos de linguagem

(idiomas) Fonte: retirado de Lima, 2014, adaptado de Wilber, 2011 com adaptações

Se faz importante a compreensão de que esse é um elemento apenas norteador. Nossa

preocupação é que os tipos sinalizem categorias estanques e descontextualizadas de um lado e

rotuladoras de outro. Usar uma tipologia como introversão e extroversão é um exemplo disso.

Algumas crianças podem ser tímidas em determinados contextos, mas bastante extrovertida

com seus pares até ao ponto de ser chamada a atenção no colégio. Portanto, o profissional

precisa ter cautela nesse aspecto quando for trabalhar com essas grandes referências, para que

não se reserve apenas a isso.

e) Quatro Quadrantes

Chegamos aqui ao quinto elemento proposto por Wilber, que traz o diferencial para sua

teoria, pois integra os elementos em um mapa, possibilitando um olhar amplo e que pode ser

aplicado em diversas áreas de conhecimento. A modernidade trouxe para o mundo a divisão

das áreas, consolidando um reducionismo científico (Wilber, 2009). Para organizar esse mapa,

Wilber dividiu em quatro quadrantes, que se referem a quatro dimensões da existência, a

dimensão individual e coletiva em seus âmbitos internos e externos, nomeados de Eu, Nós, Isto

e Istos. Para o autor, a interligação desses quadrantes se mostra de maneira essencial para

compreender o ser humano, que significa compreender não só o humano, mas todo o contexto

que ele está inserido.

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Figura 1 - Quatro Quadrantes

Fonte: adaptado de Wilber, 2010

O quadrante superior esquerdo se refere ao interior do sujeito, onde se encontram os

pensamentos, sentimentos, sensações, o aspecto subjetivo da consciência (Wilber, 2009, 2010).

Os relatos desse quadrante são sempre em primeira pessoa, ou seja, só é possível conhecer o

indivíduo, sua subjetividade, por meio desse quadrante, que se acessa pela linguagem. É essa

uma das principais vias de acesso encontradas na psicoterapia, pois é como o indivíduo pode

expressar sua individualidade, sua subjetividade e convida o terapeuta a conhecer seu interior,

seu Eu.

O quadrante superior direito é o olhar para o ser individual de fora, podemos observar o

comportamento físico, o comportamento material, os sistemas do organismo, DNA, tipos

sanguíneos e muitos outros aspectos (Wilber, 2009, 2010). Esse quadrante é correlato ao

esquerdo, entretanto, nele podemos acessar o que é observável. Enquanto o superior esquerdo

se aproxima do olhar subjetivo, o superior direito é o observável, o objetivo. Ele cobre os

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aspectos exteriores e individuais da consciência humana, campo em que as neurociências e

ciências cognitivas atuam (Brasil, 2019).

A partir do que foi escrito acima, podemos perceber que os quadrantes superiores se

referem ao “Eu”, como ele é visto de dentro e de fora. Todavia, os indivíduos estão imersos em

um contexto maior, todo ser é um ser no mundo, que aqui são representados pelos quadrantes

inferiores. O quadrante inferior esquerdo está relacionado a cultura de um determinado

grupo/meio que o indivíduo está inserido, o interior do coletivo, ou seja, valores, visão de

mundo, ética e aspectos compartilhados pelos grupos (Wilber, 2009). A linguagem desse

quadrante é o nós, pois está se referindo à relação.

O quadrante inferior direito reporta-se ao exterior do coletivo, ao que pode ser observado

de maneira objetiva, pois todos os componentes culturais estão ancorados em formas materiais,

institucionais (Wilber, 2009). O autor destaca alguns exemplos desses sistemas, os quais são

instituições, formação geopolítica, forças de produção. A linguagem desse quadrante é o “isto”.

Essas são maneiras de enxergar a vida do indivíduo e as dimensões nas quais ele está

inserida. Não existe uma mais correta que a outra, apenas olhar para diferentes perspectivas.

Para um sistema integral, todos esses quadrantes precisam ser incluídos quando nos referimos

aos aspectos do ser humano.

3.2.2.1.1. Espiritualidade

Buscando o tema da infância em Ken Wilber, foi encontrado sua perspectiva

desenvolvimentista e a importância que o mesmo atribui aos aspectos biográficos. Wilber

(2009) dedica em seu livro “Psicologia Integral” um capítulo abordando a espiritualidade na

infância, na discussão de sua teoria integral Wilber (2009). Mesmo na psicologia transpessoal

em que a espiritualidade é um conceito e dimensão expoente não há unanimidade em sua

conceituação principalmente quando juntamos ao tema da infância (S. C. R. da Silva, 2015),

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tanto que apenas Ken Wilber (2009) aponta cinco definições diferentes para espiritualidade: (1)

a espiritualidade como correspondente aos níveis mais elevados das linhas de desenvolvimento,

sendo a espiritualidade relacionada a qualquer das correntes de desenvolvimento nos estágios

pós-pós-convencionais; (2) espiritualidade como soma total dos níveis mais elevados das linhas

de desenvolvimento; (3) espiritualidade como uma linha de desenvolvimento separada; (4) a

espiritualidade como uma atitude (como a sinceridade e o amor) que se pode ter em qualquer

estágio; (5) a espiritualidade como experiências de pico, e não estágios – ou seja, como

experiências temporárias, passageiras, transitórias, podendo ocorrer em qualquer estágio do

desenvolvimento (Ferreira, 2012b).

Desse modo, se for considerar apenas as definições 1 e 2 não haveria espiritualidade na

infância, pois a criança se encontra em processo de desenvolvimento, não sendo possível atingir

os estados mais elevados de todas as linhas de desenvolvimento. Assim, partindo de algumas

definições de espiritualidade, como a definição 3, apontando a espiritualidade como uma linha

de desenvolvimento separada, a definição 4, a qual traz as atitudes que definem a espiritualidade

(sinceridade, amor, fluidez, etc), e a definição 5, a qual estabelece como experiências de pico,

trazendo a espiritualidade como sendo um aspecto o qual também faz parte de experiências já

vividas pela criança. Partindo das definições 3, 4 e 5, dessa perspectiva, compreende-se que por

ser uma linha de desenvolvimento separada, elas podem ter uma espiritualidade, mesmo que

rudimentar, pois já podem apresentar características dos primeiros estágios, que posteriormente

se desdobrarão no que o autor chama de capacidades espirituais. É importante destacar que,

independente do estágio ou estrutura de desenvolvimento, qualquer ser humano tem o espectro

geral da consciência a sua disposição, dessa maneira, as experiências de pico podem acontecer

com indivíduos de quase todos os estágios de desenvolvimento, sendo interpretada pelo

indivíduo de acordo com seu estágio de desenvolvimento (Wilber, 2009). Entretanto, o autor

destaca que a maneira como a pessoa vivencia cada estágio depende do estágio de

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desenvolvimento que se encontra. Além disso, as crianças têm uma capacidade maior de se

conectar com algumas atitudes citadas na definição 4, fazendo-as se aproximar de uma

espiritualidade. Na cinco, especificamente, o que ele aponta é que podemos dizer que sim, há

uma espiritualidade infantil, porque ela seria simplesmente qualquer vivência ocorrida na

infância de uma pessoa que possa ser nomeada como tal. E por essa definição na linha ou

estágio. Espiritualidade é apenas um estado transitório e que nem sempre vai ser integrado pela

criança. Seria abordada na terapia infantil como uma experiência “curiosa”, “peculiar”,

“diferente” como outras da vida.

Todavia, para considerar a espiritualidade na criança é importante que tenhamos claro

o que concebemos como espiritualidade, por exemplo, se nos conceitos 3, 4 e 5 de

espiritualidade concebemos a espiritualidade com “se sentir bem” (Wilber, 2009) é possível

pensar em uma espiritualidade infantil.

Na definição 3, em que se considera a espiritualidade uma linha de desenvolvimento

separada, é permitido falarmos de uma possível espiritualidade na infância, todavia, não

devemos a partir disso concluir que as crianças são expressões de santidade e sabedoria, ou que

estão em contato perene com as realidades espirituais autênticas, pois isso corresponderia a uma

visão idealizada da criança e infância. O que podemos afirmar dentro desta definição de

espiritualidade é que pode haver espiritualidade na infância, mas que esta está em um percurso

de desenvolvimento a caminho de uma espiritualidade autêntica, ou seja, mais amadurecida e

contextualizada a partir de um desenvolvimento posterior na vida adulta.

É preciso ainda que nos indaguemos sobre a que espiritualidade nos referimos, qual

ideia temos sobre esta dimensão, se, por exemplo, consideramos espiritualidade como “se sentir

bem” (Wilber, 2009), é mais fácil argumentar a presença da espiritualidade na infância. Embora

possamos dizer que, para parcela significativa das crianças em nosso país, os contextos de vida

estão muito longe de proporcionar vivências de “se sentir bem”. Porém, se a este conceito

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englobamos “também fazer o bem, adotando o papel de outras pessoas, e a projeção da sua

consciência mediante muitas perspectivas e panoramas pluralistas, de modo a incluir a

compaixão, o cuidado e o altruísmo” (Wilber, 2009) já se torna bastante discutível a

espiritualidade nesta etapa do desenvolvimento. Entretanto, partindo da definição de

espiritualidade 1 e 2 trazida no livro de Wilber (2009), não se pode considerar que a criança

possui uma espiritualidade. A definição 1, de acordo com o autor, é conceituado que a

espiritualidade envolve os níveis mais elevados de qualquer uma das linhas de

desenvolvimento, sendo impossível a criança possuir uma espiritualidade considerando essa

perspectiva, tendo em vista que a criança está em situação peculiar de desenvolvimento, não

poderia atingir o nível máximo de desenvolvimento das linhas. Já a definição 2, traz que a

espiritualidade seria a soma total dos níveis mais elevados, sendo um caminho individual de

cada ser, e, assim como na definição 1, exclui a possibilidade da criança ter uma espiritualidade.

Na definição 4, por exemplo, tem se encontrado dificuldade de produzir exemplos

coerentes e válidos, já que em algumas idades a criança não é ainda capaz de adotar o papel do

outro. Então, até que ponto esta sinceridade desenvolvida é genuína e pode ser considerada

espiritual? Devemos considerar, mesmo que espontânea e fluida, a sinceridade egocêntrica

“espiritual”? (Wilber, 2009). Essa é considerada uma visão romântica do olhar sobre as

crianças, indicando que elas têm uma maior capacidade de sinceridade, entretanto, ainda não

conseguem se colocar no lugar do outro, atribuindo o termo espiritual a criança, na qual está

vivendo o egocentrismo seria semelhante a transformar o espiritual em narcisismo (Ferreira,

2012a).

É importante ressaltar que existem algumas ressalvas a mencionar referentes a definição

4 de espiritualidade. O conceito diz que “A espiritualidade é uma atitude (tal como a sinceridade

ou o amor) que você pode ter em qualquer estágio que esteja” (Wilber, 2009, p. 151), entretanto,

vale ressaltar que essa definição tem se mostrado difícil de definir ou de se enunciar de maneira

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coerente (Wilber, 2009). Nesse sentido, o teórico traz o amor e a sinceridade como exemplos

de atitudes que possam ser definidas como espiritualidade. Todavia, é evidenciado que os

sentimentos de afeto, como o amor, progridem de forma egocêntrica inicialmente, para apenas

posteriormente se desenvolver para uma maneira sociocêntrica e só depois mundicêntrica.

Dessa maneira, essa atitude não estaria presente em todos os níveis. Assim como a sinceridade,

essa não pode afirmar ser uma capacidade formada ou que se desenvolve aos poucos.

3.2.2.2. Stanislav Grof

O trabalho de Grof (1987, 2000, 2012) descortinou novos horizontes na psicologia

transpessoal. Suas descobertas foram fruto de mais de 30 anos de pesquisa. No que tange a

infância, Grof nunca escreveu uma obra específica, entretanto, seus principais estudos giram

em torno da psicologia Pré-Natal e Perinatal. Ao cunhar o termo perinatal, Grof sugere que o

psiquismo infantil inicia antes do nascimento físico. O autor defende que o processo gestacional

deixam marcas no psiquismo, girando em torno da vida intrauterina e do processo de

nascimento (Grof, 1987, 2000, 2012). Embora Grof não seja o único, foi um dos primeiros a

chamar atenção para o desenvolvimento psíquico durante a gestação e ampliar a noção do

psicanalista Otto Rank do nascimento enquanto evento traumático.

Desse modo, as pesquisas conduzidas por Stanislav Grof, rompiam com um paradigma

newtoniano-cartesiano vigente, o qual já se percebia que não dava conta das demandas não só

individuais, mas globais que o mundo estava vivendo na época. Assim, estudos sobre a

consciência vão se desenvolvendo, considerando também diversas tradições orientais, as quais

já discutiam sobre o tema da consciência anteriormente (Tavares, Azevedo & Bezerra, 2012).

A discussão é principalmente focada nos estados não ordinários da consciência, os quais

ainda são um desafio no estudo da psiquiatria, chamado de estados holotrópicos pelo autor, que

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significa orientado em direção ao todo, pois no nosso estado de consciência ordinário,

estaríamos nos identificando apenas com uma parte de quem realmente somos (Grof, 2012).

Nos estados holotrópicos ocorre uma transformação da consciência, podendo ser

associada a algumas mudanças sensoriais, emoções e manifestações psicossomáticas intensas e

possíveis alterações profundas nos processos mentais. Essas percepções ocorrem de maneira

qualitativa e profunda, diferente dos estados cotidiano, mas sem perder o contato completo com

a realidade cotidiana. Existem diferentes maneiras de acessar esses estados holotrópicos. De

início, Grof (1987) estudou esses estados de consciência pelo uso de LSD (dietilamida do ácido

lisérgico). A escolha por pesquisa através da substância do LSD foi feita pelo fato de que

pesquisadores que estudam efeitos psicodélicos chegaram à conclusão que essa substância

funciona como ampliadores ou catalisadores do processo mental, ativando matrizes

preexistentes ou potenciais da mente humana (Grof, 1987, 2000, 2012). Posteriormente, foi

desenvolvido por ele e sua esposa um método de respiração holotrópica com foco no corpo, na

respiração e uso da música. Em seus livros, são descritos quatro domínios da psique humana,

com suas experiências correspondentes, sendo eles: 1) a barreira sensorial, 2) o inconsciente

individual, 3) o nível de nascimento e 4) o domínio transpessoal (Grof, 1987, 2000, 2012). A

percepção desses domínios está para além de suas experiências com psicodélicos, pois pode ser

percebido no trabalho psicoterapêutico por ele construído denominado respiração holotrópica

que utiliza a respiração, dança, música e o trabalho corporal (Grof & Grof, 1992).

A barreira sensorial é definida por Grof (1987, 2000) como uma ativação dos órgãos

sensoriais, possibilitando o indivíduo a experimentar experiências sensoriais, geralmente são

abstratas e nem sempre tem algum sentido simbólico pessoal. As áreas sensórias nas quais o

fenômeno pode aparecer são diversas, entretanto, o fenômeno ótico é o mais frequente (Grof,

1987).

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Inovações no trabalho do autor são percebidas por trazer uma compreensão diferente do

ser humano. A partir desses pressupostos vamos discorrer abaixo como se estrutura essa teoria

e os domínios 2, 3 e 4 mencionados anteriormente.

3.2.2.2.1. Uma nova compreensão da cartografia e da psique humana

a) Biografia pós-natal e o inconsciente individual

Iniciamos esse tópico abordando sobre como se organiza a psique humana para o autor,

pois para Grof, não inicia apenas após o nascimento, que seria o aspecto pós-natal, biográfico.

O nível biográfico é amplamente estudado pelas psicoterapias ocidentais, em que o aspecto

verbal é o mais acessado.

O campo seguinte descrito por Grof (1987) foi o domínio do inconsciente individual,

em que experiências estão relacionadas a eventos biográficos do indivíduo, desde o nascimento

ao momento presente, sendo atrelada forte carga emocional a elas. O diferencial dessa

perspectiva teórica está em levar o sujeito ao nível experiencial, em que o fato biográfico, além

de ser lembrado é também revivido, trazendo emoções, sensações físicas e outros dados dos

nossos sentidos (Grof, 1987).

Stanislav Grof (1987, 2000, 2012) inspirado no conceito junguiano de complexos

psicológicos, inova ao discutir que as experiências do ser humano de maneira que se organizam

em um sistema COEX, experiências complexas, em que percebeu em suas pesquisas que

algumas experiências eram multiplamente determinadas, combinando com elementos de

diversas áreas diferentes, relacionada com conteúdo emocional e de diferentes temáticas. O

principal interesse do autor está nas experiências que possuem um potencial curativo, pois estas

representam e tem destaque na formação da psique humana. Essas memórias e elementos

biográficos emergem como constelações dinâmicas nítidas, estando relacionado com elementos

biográficos e seu material, mas também se expandindo para os diferentes níveis da psique,

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sendo representado como um princípio geral. O que unem essas experiências é a mesma

qualidade emocional e a mesma sensação física.

b) O nível perinatal

Outro domínio do inconsciente descrito por Grof (1987, 2000, 2012) é o domínio

perinatal, que significa “em torno do nascimento”. Esse domínio considera que o nascimento

é um trauma vivido pelos sujeitos, em que há uma iminente possibilidade de morte, tendo em

vista que há uma conexão entre o nascimento biológico e as experiências de morrer e estar

nascendo. Essas experiências perinatais não são apenas reviver o nascimento biológico, elas

estão para além disso, pois de acordo com o autor, elas têm distintos aspectos emocionais e

psicodinâmicos, associando esse processo a crises existenciais, questionando tanto o sentido da

vida, como seus valores e estratégias desenvolvidas para seu enfrentamento. Nesse sentido,

Grof (1987, 2000, 2012) denomina as Matrizes Perinatais Básicas (MPB), postulando a

existência de matrizes dinâmicas hipotéticas as quais orientam o processo perinatal e do

inconsciente, sendo divididas em quatro etapas relacionadas ao nascimento, com correlações a

sensações físicas e emocionais. Cada uma dessas matrizes enfeixam dimensões arquetípicas, no

sentido junguiano, que se atualizam em diversos momentos da vida, conectando dimensões

pessoais e coletivas do psiquismo.

A Primeira Matriz Perinatal (MPB I) tem como base biológica a experiência de vida

intrauterina antes do início do parto, existindo fatores físicos, químicos, biológicos, emocionais

e psicológicos que podem interferir (Grof, 1987, 2000, 2012). A Segunda Matriz Perinatal

(MPB II) se relaciona biologicamente aos primeiros momentos do parto em que começas as

contrações musculares e a saída ainda não é possível, tendo em vista que o colo uterino ainda

se encontra fechado. Nas contrações ocorre a compressão das artérias uterinas, causando o

bloqueio momentâneo de oxigênio para o feto (Grof, 1987, 2000, 2012). A Terceira Matriz

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Perinatal (MPB III) diz respeito ao segundo estágio clínico do parto biológico, em que as

contrações continuam, mas o colo uterino está dilatado, proporcionando uma gradual saída

através do canal de nascimento (Grof, 1987, 2000, 2012). A Quarta Matriz Perinatal (MPB IV)

relaciona-se com o terceiro estágio clínico do parto, que é o real nascimento do bebê e o corte

do cordão umbilical (Grof, 1987, 2000, 2012). Com o processo de nascimento já finalizado, o

processo de morte-renascimento descrito por Grof (1987, 2000, 2012) é concluído.

Esse processo se mostra importante para o autor, pois reflete a maneira como lidamos

com o mundo, experimentando a vulnerabilidade e o sentimento de impotência gerado nesse

momento do nascimento, pois não lidamos emocionalmente com esse fato. Na medida em que

esse processo é revivido ou simbolizado (posto que Grof admite que não há como afirmar que

se trata de um reviver objetivo do próprio parto), tomamos consciência dele e expressamos,

podemos lidar de outra maneira com o processo traumático do nascimento, a primeira

experiência de trauma, fazendo esse processo ser curador e transformativo nas experiências

posteriores da vida em que nos sentimos “sem saída”, em uma luta de morte-renascimento

(Grof, 2012).

O trabalho de McCarty (2013) traz novos horizontes para pensar a Psicologia Pré-Natal,

Perinatal e os primeiros anos de vida utilizando a abordagem integral de Ken Wilber, os estudos

do psiquiatra Graham Farrant, um dos pioneiros da Psicologia Pré-Natal, a teoria do

desenvolvimento humano relacionado com etapas do desenvolvimento da consciência de Jenny

Wade e o paradigma holográfico baseado em autores como Michael Talbot, Gary Schwartz,

Edgar Mitchell. Em seus estudos são abordado sobre nossa natureza senciente, na qual afirma

que as memórias das experiências pré-natais e perinatais das pessoas, independentemente da

idade estão imbuídos de uma noção de eu, como também o desejo de ser reconhecido como um

ser consciente e senciente pelas pessoas que estão ao seu redor. Em seu livro “O Extraordinário

Mundo Interior dos Bebês: Do Útero ao Berço”, McCarty desenvolve todo um arcabouço

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teórico de fontes utilizadas por elas que embasam sua perspectiva de um modelo integrado com

a psicologia oriental. Partindo de seus estudos com a Psicologia Pré-Natal e Perinatal, podemos

pensar em aspectos que se expandam para uma psicologia da infância nessa perspectiva.

O Eu integrado bastante mencionado no livro apoia uma totalidade do ser durante a

vida pré-natal, o nascimento e o período da formação de vínculos, dando um outro olhar para

perceber os bebês e as crianças. Em seu livro, os seres que estão em desenvolvimento pré-natal,

perinatal e quando nascem precisam ser considerados como eu senciente, considerados como

seres humanos, pois já existem estudos que dão indícios que existe essa percepção humana das

sensações e sentimentos (McCarty, 2013). Além disso, a autora traz aspectos para podermos

pensar em uma infância a partir de um eu integrado, transformando a visão das necessidades de

desenvolvimento, as quais foram sendo desenvolvidas baseadas em teorias que percebiam o ser

humano como estritamente biológicos, para pensar uma teoria das necessidades que satisfaça

as necessidades do Eu integrado desde o início da vida perinatal.

c) Nível transpessoal da psique

O nível transpessoal tem como significado “além do pessoal” ou “transcendendo o

pessoal” como apontado por Grof. Elas usualmente ocorrem em processos de autoexploração

individual profunda, mas ultrapassam fenômenos simplesmente intrapsíquicos por parecer que

contém informações que estão além do alcance convencional do sujeito (Grof, 2012). Esse nível

está relacionado ao inconsciente coletivo, conceito criado por Carl Jung, o qual fala que existe

um inconsciente além do individual, em que podemos ter acesso a toda herança cultural da

humanidade. O nível transpessoal não é facilmente acessado de maneira espontânea, conforme

ilustra o próprio Grof é necessário a estimulação com música, movimento e respiração para

vivenciá-los em estados holotrópicos no setting clínico. Importante ressaltar que esse estado

produz um notável processo de cura do ser humano (Grof, 2012).

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3.2.2.2.2 Estratégia de psicoterapia e autodescoberta

Existem diferentes visões do ser humano e a psicologia moderna se diverge em diversos

pontos, tanto relacionados aos pressupostos filosóficos, como dentro dessas escolas existem

divergências de pensamentos (Grof, 2012). Cada uma dessas escolas utiliza uma interpretação

e uma forma de abordar o problema de maneira diferente e a escolha do terapeuta para a

abordagem tem muito mais a ver com a subjetividade do próprio terapeuta (Grof, 2012). O

trabalho holotrópico se mostra de uma maneira não diretiva, em que o próprio sujeito tem seu

curador interno e é ele quem vai guiar o processo de cura, confiando na própria inteligência

curativa.

Esse processo foi inspirado em C. G. Jung, no que ele chama de processo de

individuação, em que a cura é guiada por uma inteligência interna que vai além da sabedoria e

conhecimento do terapeuta (Grof, 2012). No trabalho holotrópico desenvolvido por Grof, a

tarefa do terapeuta é oferecer um método que possa favorecer a emergência de um estado de

consciência holotrópico, criar um ambiente que seja seguro e acolhedor e apoiar o processo que

se desenrolará. Dessa maneira, o terapeuta, munido de uma atitude não-diretiva e não-

interpretativa, se torna um acompanhante ou assistente do processo de cura, em consonância

com o significado da palavra “terapeuta” (Grof, 2012).

Segundo Armstrong (1984), a maioria dos teóricos de orientação da Psicologia

transpessoal no ocidente, que desenvolveram modelos de desenvolvimento, compartilham a

mesma visão de que a infância representa um momento de emergir, de um momento que o

sujeito não é consciente, caminhando para o desenvolvimento de um ego que pode enfrentar as

demandas das realidades sociais, em que as demandas transversais só se tornam relevantes

quando o ego já está desenvolvido. Em seu artigo, Armstrong (1984) defende a existência de

experiências transpessoais tanto em crianças quanto em adultos, que elas podem coexistir com

o nível de desenvolvimento pré-pessoal e pessoal. Dessa maneira, esses estudos citados

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abordando a infância na perspectiva da Psicologia Transpessoal, possibilitam pensar uma

clínica infantil na perspectiva Transpessoal. Entretanto, esses estudos ainda não são tão

abundantes na área, existindo a necessidade de mais pesquisas nesse contexto auxiliando os

profissionais que estão atuando nessa perspectiva.

3.2.2.2.3. O papel da espiritualidade na vida humana

A ciência, como veio se construindo, não percebe a religião e a espiritualidade e suas

dimensões como presentes na vida do ser humano por ser pautada em uma filosofia materialista,

ou seja, o mundo material representa a única realidade (Grof, 2012). Entretanto, existem

algumas experiências provenientes de estados alterados da consciência, como o perinatal e o

transpessoal que podem fazer emergir essa dimensão do sagrado para o indivíduo, de acordo

com o autor. Jung foi o primeiro a perceber essas constatações, dando o nome de numinosidade.

Grof (2012) destaca a importância de diferenciar o que seria a religião e a

espiritualidade. A espiritualidade se caracteriza por ser uma experiência de outras realidades,

sendo uma experiência pessoal, não precisando da mediação de uma pessoa para mediar o

contato com o divino. Já a religião se constitui como uma instituição, tendo como base a

organização de um grupo em torno dessa instituição, envolvendo um local e pessoas com

funções nomeadas, havendo também uma hierarquia.

Dessa maneira, corroborando com os pressupostos da psicologia transpessoal, em que

tem a espiritualidade e o sagrado como um importante aspecto do ser humano, sendo esse

biopsicossocioespiritual, Grof destaca esse aspecto relevante e oriundo da consciência

holotrópica.

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3.2.2.2.4. A respiração holotrópica

O método utilizado por Grof foi o da respiração holotrópica, desenvolvido por ele e sua

esposa, Christina, como um processo terapêutico. Esse processo se dá em grupo e induz estados

alterados de consciência por meio da respiração acelerada, música evocativa e trabalhos

corporais, sempre em duplas, revezando e supervisionado por facilitadores que ajudam os

participantes e fazem alguma intervenção especial, caso necessite (Grof, 2012)

Após a respiração, os participantes expressam suas vivências pintando as mandalas e

compartilhando o relato com o grupo (Grof, 2012). Retomando o que foi apresentado

anteriormente, essa abordagem acredita no potencial do curador interno, portanto, não há

interpretações do que está sendo trazido pelos participantes nem das produções das mandalas,

tendo como característica diferenciada a utilização do potencial terapêutico dos estados

holotrópicos de consciência (Grof, 2012).

3.2.2.2.5. Como essa teoria se organiza na clínica infantil

O trabalho desenvolvido por Stanislav Grof se voltava para atendimentos em grupo e

com adultos, nunca tendo desenvolvido um trabalho voltado para crianças. Entretanto, podemos

pensar e destacar algumas considerações acerca de suas pesquisas que pudessem auxiliar no

desenvolvimento de uma clínica infantil por esse olhar, sendo um grande desafio pelo fato do

próprio autor não ter desenvolvido essa dimensão na sua teoria.

A partir disso, podemos convidar o leitor a pensar alguns aspectos e premissas para

pensar a partir do trabalho de Grof uma clínica infantil. Inicialmente, é importante destacar a

não-diretividade nessa perspectiva e a relevância do setting terapêutico, no sentido de

proporcionar um espaço de cuidado, abertura e acolhimento incondicional.

Explorando o conceito de COEX, as emoções e sentimentos podem ser expressadas no

espaço terapêutico, emergindo emoções mais profundas e ressignificando essas experiências.

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Os aspectos das matrizes perinatais desenvolvidos pelo autor, podem ser vistos como modos de

enfrentamento das situações presenciadas na vida. A matriz perinatal I pode estar relacionada a

sentimentos de bem-estar com a vida, como também com sentimentos de apatia em relação ao

mundo, já a matriz perinatal II se relaciona a sentimentos de medo, fobias e uma característica

de fechamento em si mesmo, a matriz perinatal III pode ser expressa por meio da agonia,

ansiedade, agressividade, envolvendo situações de stress, conflito, confrontação, como uma

separação conjugal, a mudança para uma cidade e escola em que não se conhece ninguém; por

fim, a matriz perinatal IV pode se manifestar pela perseverança, coragem. Essas características

seriam percebidas e possibilitariam o terapeuta entender o que está acontecendo no momento.

Existe a possibilidade de trabalhar a partir do que essas pesquisas vieram trazendo em

relação ao conhecimento da psique humana e dos estados de consciência, considerando que os

estados holotrópicos da consciência disponibilizaram em sua singularidade.

O trabalho do psicólogo em atendimento infantil baseado nessa abordagem tem como

escopo maior, conduzir a criança por meio dessas vivências arquetípicas do processo de

nascimento e de outras simbolizações, no sentido de conduzir a criança por meio dessas

vivências arquetípicas identificadas no brincar. Por meio do universo simbólico trazido pela

criança, é possível trabalhar por meio de elementos que façam parte do universo infantil daquela

criança especificamente. A estratégia de terapia infantil nessa perspectiva não se resume apenas

ao reviver físico do parto, mas a todo o contexto do brincar e dos recursos lúdicos, escolhido

pela criança em terapia, compreendendo os sentidos que forem sendo construídos.

A partir desses estilos de enfrentamento, pode-se pensar estratégias para se trabalhar

com a criança, uma maneira de reviver o trauma do nascimento representativamente sem

precisar da dramatização, da dimensão física para que isso possa ser ressignificado, tendo em

vista que o processo psicoterápico com crianças é baseado na brincadeira, criatividade e relação

entre a criança e o psicoterapeuta. Esse processo de cura se dá pelo simbolismo na brincadeira.

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Considerando que a psique se organiza através das experiências condensadas, brincar e

experienciar, esses processos acarretam em perceber essa consciência e esses níveis da

consciência, gerando a reelaboração das experiências traumáticas. Importante ressaltar que do

mesmo modo que o processo terapêutico a partir de Grof não é de forma diretiva, o processo

com crianças também não deverá ser, se revelando pelo que a criança expressa. Assim, o

desvelamento da experiência da criança em terapia pode ocorrer considerando o que está mais

emergente no momento.

3.2.2.3. Vera Saldanha

Essa autora tem sua importância na psicologia transpessoal principalmente no cenário

luso-brasileiro, pois conseguiu sistematizar a teoria a partir de três grandes autores, que foram

base para a transpessoal: Abraham Maslow, Carl Jung e Jacob Moreno. Considerando que a

teoria da Transpessoal emerge a partir da Psicologia Humanista, a Abordagem Integrativa

Transpessoal de Vera Saldanha, tem como pressupostos teóricos os autores advindos dessa

teoria e contribuições sobre a psicologia Junguiana. Seu livro, “Psicologia Transpessoal:

Abordagem Integrativa: Um Conhecimento Emergente em Psicologia da Consciência” (2008)

traz uma aplicação da teoria transpessoal na educação, mas também pode nos ajudar a entender

como são as bases teóricas da abordagem e um pouco da sua história.

De Jung e Moreno Saldanha elenca elementos distintos. Em Jung encontramos

principalmente a discussão de funções psicológicas a partir da qual ela organiza seu eixo

psicodinâmico. São as funções da sua bússola psíquica: razão, emoção, intuição e sensação, daí

usando o anagrama REIS. Além disso, o trabalho com elementos simbólicos, como as

expressões arquetípicas que apareceriam no inconsciente coletivo também é usado nos

procedimentos de atendimento, no que a autora chama de recursos adjuntos.

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Quanto a Moreno, Saldanha inspira-se no trabalho do psicodrama para realizar uma

dinâmica mais interativa entre cliente e terapeuta, através de exercícios e atividades que são

encenadas no espaço terapêutico. Moreno é um teórico que entra no campo de discussão de

Saldanha através da influência de um dos pioneiros transpessoal no Brasil: Pierre Weil. Em

suas contribuições, Pierre Weil destaca a dimensão do tempo “aqui e agora” integrando

passado, presente e futuro advinda de Jacob Moreno (Saldanha, 2008). Inspirado no psicodrama

de Moreno, Pierre Weil desenvolve o psicodrama de orientação transpessoal, que ele

denominou de cosmodrama. A plena consciência ou consciência cósmica foi o tema mais

pesquisado por Pierre Weil,(Saldanha, 2008). De modo operacional podemos dizer que o que

Weil denomina como consciência cósmica equivale à experiência culminante de Maslow. De

acordo com Saldanha (2008), estado de consciência se destaca na compreensão do ser humano,

pois de acordo com o nível de percepção de cada indivíduo, se constitui também sua percepção

da realidade, gerando suas crenças, valores e atitude em relação a si e ao mundo.

As contribuições de Maslow aportam na teoria de Saldanha por meio das necessidades

básicas, motivações, metanecessidades, metamotivações, metacognição e aspectos de auto-

realização, mas para além disso, houveram as observações acerca das experiências culminantes.

Embora seja muito conhecido dos profissionais de psicologia como criador da pirâmide das

necessidades humanas, Maslow avança no final da vida para uma discussão sobre o que ele

compreendia como um nível superior de motivações/necessidades. As metamotivações seriam

na perspectiva de Maslow uma espécie de conjunto de motivações de crescimento, enquanto as

motivações já descritas anteriormente estavam orientadas para falta. Estudiosos desses escritos

do fim da vida de Maslow como Barrett (2009) estão convencidos de que se tratam de um tipo

mais altruísta e solidário de necessidades que incluem a alteridade e bem comum. Como

exemplo, Barrett (2009) reagrupa estas metanecessidades em três grandes categorias: coesão

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interna (propósito), fazer a diferença (deixar sua marca no mundo) e serviço (colaborar em prol

da coletividade).

Essas experiências denominadas por Maslow como sendo culminantes, são momentos

em que uma pessoa atravessa experiências de êxtase, deslumbramento, de extrema felicidade.

Trata-se de uma generalização dos melhores momentos do ser humano, que quando estamos

vivenciando, nos sentimos mais integrados, conscientes, mais capazes de usar nossa energia de

modo construtivo (Saldanha, 2008). São nesses momentos que o indivíduo está de maneira mais

saudável, sendo as pessoas que tem mais experiências culminantes consideradas mais

metamotivados.

Para Maslow, haviam dois conjuntos de forças que poderiam impulsionar o indivíduo,

uma regressiva, constituída por medo, ansiedade, levando para a doença, e o outro de forças

saudáveis, importantes para manter a saúde mental (Saldanha, 2008). Foi significativo nos

estudos de Maslow as investigações acerca dos aspectos positivos do ser humano, sendo esse

aspecto notável na Psicologia Transpessoal. A auto-atualização ou individuação apresenta o ser

humano como estando no auge do seu desenvolvimento, em que esse processo ocorre por meio

do crescimento (Saldanha, 2008). A transcendência é um conceito bastante explorado por

Maslow, estando como base na Psicologia Transpessoal e se referindo a níveis inclusivos da

consciência, sendo uma integração do ser humano com o todo que o cerca (Saldanha, 2008).

De modo curioso, embora seguinte a perspectiva de Maslow como eixo de suas

formulações, é possível identificar na elaboração da teoria de Saldanha, influências que são

bastante divergentes desse autor, tendo em vista que a autora se baseia de fontes psicanalíticas.

Por exemplo: Os recursos utilizados na Abordagem Integrativa Transpessoal (AIT) advém da

construção Freudiana sobre pensamento do processo primário, que seria o inconsciente,

representado por alusão, analogias, podendo ser expresso por meio da arte, de representações

não-verbais, contos, fábulas, poesias, representações (Saldanha, 2008). O pensamento de

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processo primário se utiliza de representações simbólicas para se expressar. Essa linguagem

utilizada pela AIT é de grande relevância no trabalho infantil, tendo em vista que é a principal

maneira como as crianças se expressam, de forma vivencial. De acordo com Saldanha (2008),

a transcendência também pode ser acessada por meio desses elementos, do pensamento do

processo primário. Utilizando a linguagem do processo de pensamento primário, Saldanha

(2008) dá destaque para trabalhos por meio da fantasia, como fábulas, poesias, grafismos,

facilitando o processo criativo (Saldanha, 2008). Desse modo, é importante a fusão entre esses

modos de ser e de pensamento, para que a criatividade esteja ao alcance do sujeito quando

necessário, rompendo com o processo de dualidade e trazendo a integralidade para o ser

humano. Essa integralidade tem como propósito devolver ao ser humano a consciência de si

mesmo, dos aspectos positivos e negativos que permeiam a existência.

Outro ponto da teoria de Maslow é o desenvolvimento das nossas potencialidades e o

reconhecimento delas, reconhecendo a nós mesmo, os aspectos positivos e os negativos e

aceitando esses valores no outro levaria a amar e aceitar essas qualidades em nós mesmos

(Saldanha, 2008). Esse aspecto leva a pensar sobre o autoconhecimento, sendo necessário o

sujeito conhecer seu próprio eu, ouvir sua própria voz interior, ser ele mesmo e ouvir seu próprio

self em diferentes momentos da vida (Saldanha, 2008). Além desse enfoque da Psicologia

Transpessoal, destacam-se os aspectos saudáveis do ser humano, como a psicologia positiva e

as experiências culminantes (Saldanha, 2008).

A partir da construção desses teóricos, Vera Saldanha construiu uma sistematização da

Psicologia Transpessoal, denominando Abordagem Integrativa Transpessoal, que apresenta os

principais conceitos com o intuito de poder aplicá-lo as diferentes áreas, como identificar o

percurso dessa prática e o melhor momento de utilizar as técnicas, contextualizando no setting

terapêutico. Vera Saldanha realiza também a ampliação de um conceito da psicanálise,

incluindo o princípio da transcendência, que “indica um impulso em direção do despertar

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espiritual por meio da própria humanidade do ser” (Saldanha, 2008, p. 145). Segundo a autora,

esse princípio gera relações mais cooperativas, harmoniosas, favorece valores de crescimento

e processos criativos e também é responsável pela manifestação de experiências culminantes,

realizando novas formas de apreensão da realidade interna e externa.

A espiritualidade se constitui como um importante aspecto da Psicologia Transpessoal,

sendo importante para o desenvolvimento do seu humano. Essa espiritualidade é abordada por

Vera Saldanha, que a diferencia da religião, pois a espiritualidade envolve a necessidade de

transcendência.

De acordo com Vera Saldanha, o Corpo Teórico da Psicologia Transpessoal é formado

por cinco elementos, sendo eles: conceito de unidade, conceito de vida, conceito de ego, estados

de consciência e cartografia da consciência, existindo também os eixos dinâmicos, constituídos

pelo eixo experiencial e eixo evolutivo.

O conceito de unidade se refere a não fragmentação do ser, sendo um pressuposto básico

da Psicologia Transpessoal, em que partem ou convergem os recursos da abordagem (Saldanha,

2008). O conceito de unidade se refere a harmonia consigo e com o outro, a sensação de

presença no momento aqui e agora e por inteiro, de acordo com Saldanha (2008). O conceito

de vida tem como característica básica a dimensão atemporal e, em relação ao aspecto

psicológico, a vida em seu processo evolutivo tem duas etapas básicas, a de morte e

renascimento. A existência do ser humano é repleta de processos de morte e renascimento,

sendo a morte uma transição sob o enfoque da Transpessoal.

Conceito de ego na Psicologia Transpessoal indica uma construção mental, que vai na

direção de consolidar a energia mental em uma barreira separando o espaço entre o eu e o outro

(Saldanha, 2008). A teoria da Psicologia Transpessoal, tem como proposta o renascimento do

ser humano a partir do sofrimento que este vivenciava, permitindo redimensionar o conceito de

ego, explica Saldanha (2008).

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Estados ou níveis de consciência indica uma caminhada pelas diferentes dimensões da

consciência, norteando o processo e ampliando a percepção da realidade. De acordo com Weil

(1989) citado por Saldanha (2008), existem seis estados de consciências demarcatórios, sendo

eles a consciência de vigília, de sonho, de sono profundo, de devaneio, despertar e a plena

consciência. Para melhor compreender os estados de consciência, alguns autores criaram um

mapa da consciência, que são as cartografias da consciência, explicando de que modo esses

estados se expressam na psique humana (Saldanha, 2008).

Na teoria de Vera Saldanha, o aspecto dinâmico, composto pelo eixo evolutivo e

experiencial, é a forma como esses elementos do corpo teórico se expressam de maneira

dinâmica. No eixo experiencial retrata uma integração da Razão, Emoção, Intuição e Sensação.

Como forma de compreensão, se refere ao modelo de Jung sobre tipo psicológico relacionado

as funções de pensamento, sentimento, sensação e intuição. O pensamento possibilita perceber

“o que é”, o sentimento “o seu valor”, a sensação aponta “o que está presente” com toda

experiência sensorial presente e a intuição “aponta possibilidades” (Saldanha, 2008). Para Jung,

o desenvolvimento de forma saudável proporciona o equilíbrio dessas funções, esse processo

foi chamado por ele de individuação. A promoção da congruência entre a razão, emoção,

intuição e sensação ocorre no eixo experiencial, podendo levar a ampliar a percepção de

realidade e, consequentemente a manifestação do eixo evolutivo (Saldanha, 2008). Na criança,

esse processo ajuda a nomear sentimentos, elaborar o que acontece na vida ao redor e

compreender as sensações físicas. O eixo evolutivo é composto pelos estados de consciência já

mencionados anteriormente e pela dinâmica interativa que explicaremos mais adiante. Com o

trabalho no eixo evolutivo, é possível emergir estados de consciência mais profundos, como

também permitir uma expressão mais saudável da psique. No eixo evolutivo possibilita a

criança a realizar aprendizados significativos sobre si mesma, ampliando o contexto sobre o

qual percebe a si e aos outros.

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Na Psicologia Transpessoal existem alguns recursos que podem ser utilizados no

trabalho, seja ele na clínica, educação, instituição, os quais foram sistematizados por Vera

Saldanha. Para essa dissertação, utilizarei o enfoque na clínica, pois é o tema central do

trabalho. Os recursos são: intervenção verbal, imaginação ativa, reorganização simbólica,

dinâmica interativa e recursos auxiliares ou adjuntos. Iremos discorrer um pouco de cada um

desses recursos e como podem ser utilizados na clínica infantil.

O primeiro recurso é a intervenção verbal, representado pelo conjunto de verbalizações

que ocorrem no processo, desde o primeiro contato, estabelecimento de vínculo, facilitando o

processo de empatia, além da formulação do contrato e combinados (Saldanha, 2008).

Importante acentuar a necessidade do trabalho do próprio terapeuta a fim de acrescentar

qualidade no processo, auxiliando o cliente a também seguir por esse caminho, além de

sustentar a atenção, um ponto relevante no processo (Saldanha, 2008). A autora ressalta a forma

como o processo é realizado, considerando a postura do terapeuta, permite a presença do eixo

experiencial (REIS), facilitando a manifestação do eixo evolutivo, tendo como consequência a

manifestação do núcleo saudável e de equilíbrio do indivíduo, clareando e aprofundando o

conteúdo que está emergindo. A confiança no sujeito que está em processo e na sua capacidade

possibilita que emerja a espontaneidade criativa, dando oportunidade para que ele evolua no

seu tempo (Saldanha, 2008). A intervenção verbal no processo terapêutico acontece desde o

início, principalmente para o estabelecimento de vínculo, tanto com quem leva a criança como

com a própria criança, principalmente no lugar de terapeuta, é necessário ter empatia com o

sofrimento do outro para que haja uma relação e a evolução do eixo experiencial e,

consequentemente, o eixo evolutivo.

A imaginação ativa, outro recurso da abordagem transpessoal sistematizada por

Saldanha (2008), se relaciona ao desenvolvimento de imagens mentais geradas pelo próprio

inconsciente do indivíduo, relacionada a suas demandas interiores. Nesse trabalho promove a

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potencialização de aspectos da consciência de vigília, possibilitando uma apreensão mais

abrangente da realidade, além de possibilitar um nível de consciência não habitual, expandido,

estimulando também aspectos saudáveis do indivíduo. Assim como outros conceitos, esse

recurso se originou na teoria junguiana. A imaginação ativa é realizada por meio de exercícios

permitindo a vivência de experiências com o envolvimento do inconsciente e, assim, a

possibilidade de ressignificar tais elementos da consciência. Os exercícios de imaginação ativa

promovem a criatividade e a intuição, viabilizando sua expressão no cotidiano do indivíduo.

Tais exercícios podem ocorrer de diferentes maneiras, dependendo de como o terapeuta

perceber a abertura para tal e ir de encontro com a proposta do que precisa ser trabalhado. A

imaginação da criança se apresenta de diferentes maneiras, auxiliando na elaboração e

ressignificação de conflitos internos. Desse modo, é possível a realização de exercícios na

prática clínica, utilizando esse recurso da imaginação ativa de maneira adaptada para o universo

infantil.

A reorganização simbólica se caracteriza também como um recurso da abordagem

Transpessoal caracterizado por técnicas, com o objetivo de facilitar a organização de

determinados conteúdos psíquicos, direcionando aspectos psíquicos por meio dos estados

ampliados de consciência, a partir dos conteúdos mobilizados (Saldanha, 2008). Esse recurso

da psicologia Transpessoal vai além da utilização apenas da imaginação, incluindo também a

clarificação e organização de metas, de aspectos do psiquismo, acionando a intuição e os

processos inconscientes, transformando os desejos em atitudes do cotidiano (Saldanha, 2008).

Nos exercícios que buscam a reorganização simbólica, auxilia o indivíduo a desenvolver

perspectivas positivas sobre o futuro, perceber núcleos de apego, despertar para o significado

da vida, ampliando a percepção do todo.

Um outro recurso descrito pela autora é a Dinâmica Interativa, sete etapas específicas

sensibilizadas por meio de um profundo trabalho com os conteúdos psíquicos por meio de

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algumas práticas mencionadas anteriormente, assim como alguns exercícios, sendo essa a

grande contribuição no trabalho de Vera Saldanha. Essas sete etapas são denominadas de:

reconhecimento, identificação, desidentificação, transmutação, transformação, elaboração e

integração. Essas sete etapas são integrativas de um processo de desenvolvimento pessoal,

necessitando um preparo do profissional que for trabalhar com elas, favorecendo também

experiências intensas no processo terapêutico. Essas etapas são integrativas, tendo em vista que

são cíclicas, se repetindo sempre que uma nova aprendizagem está em curso (Saldanha, 2008).

A primeira etapa é o reconhecimento, que consiste em um olhar ao redor, um

questionamento, uma mobilização, podendo ser por motivações intrínsecas ou extrínsecas. Na

identificação, a segunda etapa, são vivenciadas sensações físicas, sentimentos, pensamentos,

ocorrendo a partir da motivação, que o indivíduo se encontra com a necessidade percebida. A

terceira etapa, denominada desidentificação, ocorre o discernimento crítico, análise e reflexão,

necessitando haver um cuidado para não se cristalizar no aspecto racional, tendo a necessidade

de se conectar também com sua experiência interna. Para que essa etapa ocorra é necessário

que haja a identificação de alguma demanda na sua vivência interna, pois não existe a

possibilidade de se desidentificar com aquilo que não nos identificamos. A vivência dessa etapa

é favorável para aprofundar outros elementos, como a sensação e intuição, preparando para a

etapa seguinte, a transmutação. Na transmutação existe a possibilidade de perceber aspectos

funcionais e disfuncionais de uma mesma realidade, realizando uma contemplação do conflito

e da solução, sendo uma fase em que a razão, o julgamento do certo, errado, bem ou mal são

insuficientes. Passando para a etapa seguinte ocorre a transformação, onde as vivências das

etapas anteriores se transformam em um novo conhecimento, trazendo um novo referencial

interno e externo para o indivíduo. A elaboração, a sexta etapa, permite uma nova apreensão do

contexto, tendo em vista que o estado mental é outro, promovendo um novo significado para o

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indivíduo. Por fim, ocorre a integração, a sétima etapa, do conhecimento, possibilitando um

novo olhar, um novo fazer, um novo sentido.

Segundo a autora, essas etapas estão descritas de maneiras bem definidas, entretanto,

elas podem ocorrer de forma concomitante. Elas são capazes de emergir de formas distintas,

sendo por conteúdo ou por alguns exercícios, como de grafismos. Os exercícios de grafismos

possibilita uma integração maior dos aspectos do eixo experiencial (Saldanha, 2008). Durante

o processo terapêutico, conseguimos perceber dentro da dinâmica interativa como o processo

está sendo desenvolvido e assimilado, tanto pela criança em terapia como para a família,

considerando que também é preciso caminhar junto com a criança para o desenvolvimento.

Esse recurso auxilia o terapeuta a perceber como o processo terapêutico está ocorrendo e como

se dá de forma experiencial, possibilitando um olhar para o todo e assessorando em quais

poderiam ser os próximos objetivos dentro da terapia.

Os recursos auxiliares ou adjuntos são amplamente utilizados na prática clínica,

englobando recursos antigos já existentes, como a meditação, concentração, contemplação e o

relaxamento, sendo denominados recursos auxiliares por não serem exclusivos da psicologia.

Esses recursos auxiliam na expansão da consciência, rebaixam o nível de tensão e ansiedade,

propiciam uma clareza mental e maior receptividade ao novo. Esses recursos também

contribuem na interação corpo e mente, integrando várias áreas do conhecimento e diferentes

níveis de percepção da realidade (Saldanha, 2008). Esses recursos são bastante úteis dentro do

processo, podendo ser acrescentado também os recursos lúdicos, tendo em vista que a

linguagem da criança é lúdica, esses recursos podem ser mediadores do processo terapêutico,

inclusive nos métodos descritos anteriormente.

Com a conclusão deste ciclo podemos destacar que a história da psicologia transpessoal

é bastante recente, tendo como foco a clínica voltada para adultos desde seu surgimento.

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Entretanto, a partir dos teóricos apresentados acima, é possível dizer que existem elementos

para poder construir uma clínica infantil, mas ainda carecem de uma sistematização.

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4. Ciclo 03 – Percurso Metodológico

“Aonde fica a saída? Perguntou Alice ao gato que ria. Depende, respondeu o gato. De

que? Replicou Alice; Depende para onde você quer ir...”

(Alice no País das Maravilhas)

O presente estudo é uma pesquisa de cunho qualitativo. Nesse sentido, um método de

pesquisa significa a escolha sistemática para explicar o fenômeno, sendo essa escolha a partir

da natureza do problema (Holanda, 2012). Assim, a pesquisa qualitativa descreve o problema

em sua complexidade. O método qualitativo é amplamente utilizado para auxiliar no surgimento

de novos conteúdos, por ser um método que vai a fundo nos significados da perspectiva do

sujeito, descobrindo novos nexos e significados (Aires, 2011).

De acordo com Minayo (2010, 2011), o método de pesquisa qualitativa é aplicada ao

estudo das relações, das histórias, das representações, das opiniões e produto de interpretações

que os seres humanos realizam e constroem seus artefatos, a si mesmos, como sentem e como

pensam. Assim, essa dissertação de mestrado se apresenta como um estudo qualitativo.

Dentre o que Anderson e Braud (2011) convencionaram chamar de métodos de pesquisa

transpessoal, utilizei a Investigação Intuitiva – método/abordagem de pesquisa desenvolvido

por Anderson (2006; 2011). Como inspiração para o desenvolvimento desse método, a autora

utilizou uma matriz hermenêutica apoiando-se em Hans-Georg Gadamer e Friedrich

Shleiermacher, assim como autores da Fenomenologia, Maurice Merleau-Ponty e Eugene

Gendlin’s, além de outros teóricos que tinham uma perspectiva etnográfica (Anderson & Braud,

2011, Chapter 1). Como apontado por Anderson (2006), hoje a Investigação Intuitiva já é tida

como uma abordagem hermenêutica em pesquisa.

A Investigação Intuitiva é baseada na compreensão hermenêutica, entendendo que a

interpretação é pessoal e cíclica ao invés de linear e processual (Anderson & Braud, 2011). De

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maneira prática, a abordagem fornece uma série de ciclos, para que o processo de pesquisa seja

realizado.

Anderson (2006) detalha que a abordagem intuitiva em pesquisa se une ao rigor

intelectual da interpretação hermenêutica, voltando seu cerne para o estudo da sutileza das

experiências humanas. Os assuntos explorados pelos pesquisadores intuitivos são aqueles que

realmente importam aos pesquisadores em que buscam honrar, retornar, dar sentido a

experiências de vida pessoais, sendo esta a principal fonte de inspiração e insights,

transformando não só o entendimento do pesquisador ou da ciência acerca do tópico estudado,

mas também a compreensão sobre suas vidas pessoais (Anderson, 2006).

Assim, os pesquisadores intuitivos devem se fazer a seguinte pergunta: o que eu mais

quero saber? Dessa forma, eles entram em contato com assuntos que os motivam a pesquisar

(Anderson, 2006). Em relação ao presente estudo, posso dizer que a questão da infância sempre

foi algo que me motivou a conhecer mais, unindo esse tema ao atendimento na perspectiva da

Psicologia Transpessoal, minha motivação nasce no “entre” dessas duas linhas, em um processo

que busca entender como é o atendimento infantil a partir do olhar da Psicologia Transpessoal.

A relação de desvelamento entre o universal e o particular, já explorada por outros

hermeneutas, também é tida aqui na perspectiva Intuitiva de pesquisa transpessoal. A autora se

refere a Ken Wilber (2000, citado por Anderson, 2006) para falar do espaço intersubjetivo, no

qual se dá a compreensão, abordado por ele no chamado modelo de quatro quadrantes: segundo

ambos os autores, vários olhares (interno, externo, individual coletivo) se fazem necessárias

para uma compreensão integral das questões humanas. Na pesquisa intuitiva, a compreensão se

dá no “entre”. Em outras palavras, a compreensão é revelada entre o que o pesquisador traz

para os dados e os dados que remetem aos participantes da pesquisa e a cultura (Anderson,

2006). Logo, o intérprete deve permitir a ação do texto sobre ele, deve consentir que o texto

coloque suas próprias reivindicações e que indague seus próprios preconceitos, de modo que o

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movimento hermenêutico enquanto tentativa de compreensão figura também como potencial

agente de mudança do sujeito que busca compreender (Anderson, 2006).

Apesar de alguns aspectos da pesquisa intuitiva poderem ser usados em qualquer tipo

de pesquisa, seja quantitativa ou qualitativa, a abordagem propriamente intuitiva, da maneira

como descrita por Anderson (2006), não pode e nem pretende ser universalizada para qualquer

tópico ou tipo de investigação. A autora destaca que esse método providencia maneiras para a

coleta, análise e interpretação dos dados da pesquisa (Anderson, 2011).

Isto posto, Anderson (2011) aponta uma sequência de ciclos de interpretação que

compõe abordagem intuitiva em pesquisa. Como é convencional nas hermenêuticas, o círculo

de interpretação na Investigação Intuitiva envolve os movimentos cíclicos de “avanço e

retorno”. Os dois primeiros ciclos representam a ida, com o processo de identificação e

clarificação dos preconceitos. Já os ciclos 3 a 5 representam a volta, num processo de

transformação dos preconceitos a partir da compreensão dos outros (Anderson, 2006).

Iniciando o processo da pesquisa intuitiva temos, no ciclo 1, o esclarecimento do tópico

de pesquisa através de um processo criativo. Recomenda-se selecionar um elemento que atrai

a atenção do pesquisador intuitivo e se relaciona com sua área de interesse, mesmo que essa

relação não seja óbvia, se voltando diariamente para essa inspiração. Com esse exercício,

facilita-se o surgimento de pensamentos, ideias, devaneios, conversas, impressões, visões e

intuições. O pesquisador deve estar voltado ao texto ou a imagem até a tensão criativa entre os

dois tiver atingido um nível de resolução ou completude (Anderson, 2006). As questões

relacionadas a infância e a Psicologia Transpessoal me inspiram muito, como destaquei

anteriormente.

Ainda no ciclo 1, deve-se verificar se a questão de pesquisa: inspira/motiva o

pesquisador, se é exequível, passível de ser pesquisada, promissora. Também é importante que

no primeiro ciclo o pesquisador tenha uma direção sobre quem são seus pares, audiência, e

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beneficiários das suas possíveis futuras descobertas (Anderson, 2006). Dessa maneira, o

presente estudo se torna relevante pelo fato de ter buscado compreender a partir de quais

princípios e pressupostos os terapeutas infantis da Psicologia Transpessoal utilizam no seu

trabalho, tendo em vista que a abordagem utiliza de um olhar e um referencial de homem e

mundo, a presente dissertação buscou investigar como isso se organiza na prática da clínica

infantil em Natal-RN. Outrossim, esse estudo se propôs realizar uma aproximação dos

terapeutas e investigadores, para que possa se tornar conhecido os métodos de trabalho e

estratégias utilizadas por psicoterapeutas com o intuito de estreitar o campo teórico com a

prática, tendo em vista a necessidade de um maior diálogo entre essas duas áreas de

conhecimento.

No Ciclo 2, o pesquisador intuitivo reflete sobre sua própria compreensão do tópico de

pesquisa. Ele faz isso a luz da literatura existente sobre o tema, de forma a preparar uma lista

de lentes interpretativas prévias. Este ciclo requer também que o pesquisador revele seus

preconceitos, o que está com ele a priori. Assim, é possível perceber a transformação da

compreensão no seguimento da pesquisa (Anderson, 2006). Nesse ciclo temos as lentes

identificadas, para possibilitar que sejam refinadas no curso do estudo. O exercício proposto é

estar consciente das lentes preliminares e convidá-las a transformação no curso da pesquisa

(Anderson, 2006). Este exercício proposto no ciclo 2 foi sendo realizado continuamente no

processo de pesquisa, buscando referências e a contextualização que possa dar sentido ao tema

proposto.

No Ciclo 3, busca-se identificar qual a melhor fonte de dados para a pesquisa e em

seguida desenvolver os critérios que guiarão a seleção dessa fonte dos dados, seja ela registros

históricos, empíricos ou literários, ou ainda participantes. O termo utilizado foi fonte de dados

por não se referir especificamente a uma pesquisa qualitativa, podendo ter diversas fontes. Para

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esse estudo, especificamente, me refiro às narrativas dos sujeitos. Acontecem também nesse

ciclo a coleta dos dados originais, o registro e a organização desses dados.

Para a execução deste ciclo, foi realizada a entrevista narrativa com a colaboração de 6

participantes para a pesquisa. Como critério de inclusão na pesquisa, estiveram incluídos

profissionais psicólogos que consideraram realizar seus atendimentos clínicos de psicoterapia

infantil na perspectiva da Psicologia Transpessoal e que estivesse realizando atendimento

clínico infantil. Foram excluídos da pesquisa os profissionais que não se consideravam

trabalhando na perspectiva da Psicologia Transpessoal com atendimento infantil, mas que

estivessem realizando a psicoterapia infantil, como também profissionais que já realizaram

atendimento infantil nessa perspectiva em algum momento da trajetória profissional, mas não

estavam realizando no momento da pesquisa.

A pesquisa foi submetida ao conselho de ética do Conselho Nacional de Saúde, nos

comprometendo em seguir as diretrizes e normas regulamentadoras da pesquisa. Durante a

realização da entrevista a previsão de riscos é mínima, pode acontecer um desconforto durante

a entrevista que será minimizado com auxílio psicológico caso mencionado pelo entrevistado.

Além disso, é sempre importante destacar o cuidado com os profissionais que estarão

participando da pesquisa, tendo em vista que estaremos discutindo sobre sua prática

profissional. Como benefício, esse pode ser um espaço para que os profissionais psicólogos

pensem um pouco sobre sua atuação, além desse estudo propor realizar uma aproximação dos

terapeutas e investigadores, para que possa se tornar conhecido os métodos de trabalho e

estratégias utilizadas por psicoterapeutas com o intuito de estreitar o campo teórico com a

prática, tendo em vista a necessidade de um maior diálogo entre essas duas áreas de

conhecimento. Acredita-se que esse estudo pôde contribuir para uma discussão sobre infância

na clínica transpessoal, ampliando o diálogo com os profissionais atuando nesse campo

específico. A presente pesquisa foi aprovada com parecer de número 2.942.109.

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As entrevistas foram gravadas a partir da autorização dos entrevistados com a assinatura

de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e um Termo de Autorização para

Gravação de Voz, sendo posteriormente transcritas para realizar uma melhor análise dos dados.

Após a transcrição das entrevistas foi enviado para as participantes, caso elas desejassem

realizar alguma alteração. O método escolhido para acessar as participantes foi o bola de neve.

O primeiro contato com as pessoas indicadas foi com uma pergunta se o profissional

atendia crianças utilizando a abordagem transpessoal. Quando a resposta era positiva, o

profissional era convidado a participar da pesquisa. Da amostra, todos os profissionais que

aceitaram colaborar com a pesquisa eram psicólogas mulheres, no qual as seis psicólogas já

haviam realizado ou estavam realizando alguma formação em Psicologia Transpessoal. Além

disso, todas as entrevistadas realizaram a mesma formação em Psicologia Transpessoal, não

sendo esse um critério de inclusão, mas diante da dificuldade em acessar psicólogos dessa

abordagem que estivessem atendendo criança, acabou sendo um ponto em comum. Com

exceção de uma psicóloga, todas haviam terminado a especialização há menos de 03 anos ou

estava em andamento, além disso, tinham menos de cinco anos de atuação na clínica com

crianças. Os psicólogos e psicólogas que atuavam há mais tempo e utilizavam essa abordagem,

que a pesquisadora entrou em contato, não estavam mais atendendo crianças. Estes, atenderam

criança no início da carreira profissional, mas por questões desconhecidas nessa pesquisa,

passaram a não atender mais esse público.

A primeira entrevistada (E1) tinha 30 anos de formação, atuando na clínica desde o

início de sua carreira como psicóloga. Passou por outras abordagens antes de conhecer a

Transpessoal (Psicodrama, Humanista e Biossíntese), sendo a formação realizada com uma

especialização. A segunda psicóloga a ser entrevistada (E2), se formou há vinte anos, atuando

na área organizacional inicialmente e passando a atender na clínica por oito anos, utilizando a

fenomenologia. Ficou afastada do atendimento clínico, retornando há cerca de um ano, quando

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iniciou a formação em Psicologia Transpessoal. A terceira entrevistada (E3) estava com cerca

de dois anos de formada na graduação de psicologia, realizando atendimento infantil desde o

início. Finalizou a formação em Psicologia Transpessoal e antes disso fez outras formações em

Psicanálise e Biossíntese. A quarta psicóloga (E4) que colaborou com a pesquisa finalizou a

graduação havia quatro anos, estava cursando a formação em Psicologia Transpessoal e antes

utilizava a abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental. Nossa quinta psicóloga

colaboradora (E5) entrevistada estava com pouco mais de um ano de formada, havia realizado

a formação em Psicologia Transpessoal e também o estágio na mesma abordagem, não atuando

com outra abordagem antes dessa. A sexta psicóloga (E6) estava com cerca de seis anos de

graduada, realizando a formação durante a graduação e já trabalhando também com corporal,

além disso, realizou uma formação também em arteterapia. Estava atuando na clínica com

crianças há cerca de três anos, além disso já havia concluído a formação em Psicologia

Transpessoal.

Durante o trabalho de campo foi utilizada a entrevista narrativa (Bauer, 2002) que se

caracteriza por ser procedimento não estruturado, abrindo maior espaço para opiniões do

entrevistado (Jovchelovitch & Bauer, 2002). Uma importante característica da entrevista

narrativa é seu aspecto colaborativo, pois a história emerge da interação entre entrevistador e

participantes (Muylaert, Sarubbi Jr, Gallo, Neto & Reis, 2014). As narrativas podem ser vistas

como representações ou interpretações do mundo, não estando abertas a comprovação e

julgamento de verdadeira ou falsa, tendo em vista que expressam a verdade de um determinado

ponto de vista, em um específico tempo, espaço e contexto sócio histórico, pois não temos

acesso direto a experiência do outro, lidamos com as representações das experiências ao

interpretá-las na interação que se estabelece (Muylaert et al., 2014), sendo parte do meu trabalho

estar atenta ao surgimento das representações dessas experiências.

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O pesquisador, chegando no ciclo 4, interpreta os dados a partir das lentes hermenêuticas

despertas no ciclo 2, a fim de refinar, modificar, refutar, remover, reorganizar e expandir a

compreensão do tópico da pesquisa. Fazendo o exercício de incorporar as experiências dos

outros e apresentando o resumo dos resultados com base na interpretação do que foi percebido

no ciclo 3, o pesquisador amplia e aperfeiçoa seus preconceitos. Nessa etapa, ficam já mais

nítidos os refinamentos na compreensão da questão do estudo, em comparação ao Ciclo 2

(Anderson, 2006).

Geralmente, o pesquisador organiza e resume os dados no estilo da análise de conteúdo

clássica, em sumários descritivos, em retratos de participantes da pesquisa (Anderson, 2006).

Para esse momento da pesquisa, utilizei a análise proposta pelos autores Jovchelovitch e Bauer

(2002), a análise temática dos dados. Esse modo de análise foi inspirado em Bardin (1977), que

deu início as análises temáticas. A análise de conteúdo pode ser compreendida como um

conjunto de técnicas de pesquisa cujo objetivo é a busca do sentido ou dos sentidos de um

documento. Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo pode ser pensada em três etapas,

sendo elas a pré-análise, a exploração do material e a interpretação.

Esse modo de análise propõe três etapas, sendo elas a transcrição, a redução em

sentenças e as palavras-chaves. Os autores recomendam um processo gradual de redução do

texto de forma qualitativa. Nessa etapa da pesquisa foi realizada a transcrição de todas as

entrevistas e enviada para os entrevistados de modo que eles pudessem realizar alguma

alteração se sentissem necessidade. O processo de transcrição se destaca pela sua importância

para ter uma boa apresentação do material, apesar de ser um processo monótono, auxilia no

fluxo de ideias para interpretação do texto, além de relembrar o momento da entrevista

(Jovchelovitch & Bauer, 2002).

Com as entrevistas transcritas, foi sendo realizada a leitura exaustivamente e, a cada

nova leitura as sentenças eram reduzidas. Com a redução das sentenças em sentenças sintéticas,

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foram sendo percebidas semelhanças entre a fala das entrevistadas, tornando possível a

realização de agrupamento das falas das entrevistadas que giravam em torno de um mesmo

tema, como podemos perceber no quadro abaixo:

Quadro 6 - Análise temática dos dados

Texto

Transcrição Integral

1ª redução

Sentenças Sintéticas

2ª redução

Palavras-chave

Imaginava uma abordagem que pudesse unir a

psicologia, científica, das técnicas da abordagem

humanista essa coisa do amor incondicional da

aceitação da autenticidade com algo do sagrado,

com algo do espiritual

Então é uma abordagem que eu acho que trabalha

muito o crescimento, que tem a ver com minha

prática pessoal de espiritualidade, né, da minha

religião

Psicologia Transpessoal é um encontro com sua

transcendência, é um encontro com algo que vai

além da sua consciência ordinária, da sua

consciência mais superior, né. Eu posso te dizer

isso, da consciência mais imanente

E eu acho que a Transpessoal é isso, é quando você

vai além do seu egocentrismo, em busca do seu eu

superior, dessa conexão com essa, esse eu sagrado,

esse eu cósmico. E a transpessoal para mim é isso,

esse caminho de luz, de autoiluminação.

União da psicologia humanista

e seus preceitos com o sagrado

e o espiritual. Trabalha o

crescimento, caminho de luz.

Encontro com a

transcendência, expandindo a

consciência.

O que é a Psicologia

Transpessoal

A transpessoal para mim é um caminho de vida.

A Transpessoal olha para o outro com mais

amenidade, com mais carinho, com mais atenção, a

transpessoal para mim é isso, é olhar para o outro

com mais empatia e respeitar o processo do outro,

independente de que processo seja, e você vai

ajuda-lo se ele permitir.

Ser transpessoal é estar presente. É você estar

presente naquele momento, nesse momento que eu

estou com você eu estou presente. E para estar

presente você precisa se conhecer muito. É uma

viagem interior, é uma viagem de você saber que

você sozinha não se basta, que você precisa da

ajuda do outro.

Transpessoal como um

caminho de vida, olhar com

empatia e respeito. Estar

presente, trabalhando suas

questões e respeitando o outro.

Fonte: a autora

Essa etapa descrita acima foi essencial, pois realizando a redução foi possível chegar até

as palavras-chaves, dando origem as categorias de análise, as quais irei discutir na sessão

seguinte. As categorias foram emergindo das entrevistas percebendo os temas que se repetiam

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e os objetivos da dissertação, não foram colocadas a priori. Essas categorias foram: 1) O que é

a Psicologia Transpessoal; 2) Teóricos e bibliografia utilizada; 3) Conceitos aplicados; 4)

Recursos utilizados; 5) Olhar para a criança em terapia; 6) Desenvolvimento infantil; 7)

Diferencial da Psicologia Transpessoal.

Assim, essas três etapas não necessariamente ocorrem de maneira cronológica e

sucessiva, tendo em vista que, mesmo o material estando organizado, é necessário o estudo

detalhado de seu conteúdo, das palavras e frases que o compõem. Com a conclusão desse ciclo,

se torna possível compreender como os psicólogos da perspectiva transpessoal estão

trabalhando no contexto da psicoterapia infantil, quais aportes teóricos eles utilizam para ajudar

a pensar como se estrutura esse atendimento. Nesse aspecto, acredito que é importante estreitar

esse relacionamento entre teoria e prática, para tornar público a realização de atividades que

são do espaço clínico.

Por fim, no Ciclo 5, o pesquisador integra as lentes percebidas no Ciclo 4 com literatura

empírica e teórica revisada no início do estudo, acrescentando agora nova literatura, dentro das

necessidades do estudo, como é costume nas pesquisas em geral (Anderson, 2006; 2011). No

processo de investigação intuitiva, no entanto, o pesquisador deve também avaliar a eficácia do

processo interpretativo dos cinco ciclos e apontar o que agora pode ser dito sobre o tema da

pesquisa, incluindo ainda o que ele percebe que ainda não foi revelado sobre o assunto

(Anderson, 2006). Essa será a finalização da pesquisa e o momento de realizar a discussão que

o tema gerou. É importante também destacar nesse ciclo o que não pôde ser respondido na

pesquisa sobre o tema desenvolvido, alguns questionamentos.

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5. Ciclo 04 – Resultados e Discussão

Após realizar os passos descritos anteriormente para análise das narrativas, chegamos a

alguns resultados possíveis de acordo com a lente teórica escolhida. As categorias de análise

emergiram a partir do que foi sendo descrito pelas entrevistadas, como sua relação com os

nossos objetivos iniciais, os quais pretendemos responder a partir dessa pesquisa, partindo de

um olhar das entrevistadas. Algumas questões foram trazidas pelas psicólogas e outras a partir

das questões elaboradas anteriormente a entrevista narrativa, com o objetivo de abarcar as

questões acerca da pesquisa. Desse modo, foi possível compreender o processo psicoterápico

com crianças a partir da abordagem transpessoal.

5.1. O que é a Psicologia Transpessoal

Um dos pontos em comum que podemos perceber sobre o que é a transpessoal para as

psicólogas colaboradoras da pesquisa é a relevância da espiritualidade dentro da abordagem,

sendo comentado por quatro, das seis psicólogas entrevistadas. Esse aspecto se mostrou em

destaque quando o assunto era o olhar para o ser humano, compreendendo que as psicólogas

percebem a espiritualidade como constituinte do ser humano. Dessa maneira, podemos perceber

que a espiritualidade e infância se relacionam na medida em que a segunda é parte do processo

de desenvolvimento humano e a primeira atravessa os diferentes ciclos desse desenvolvimento.

[...] tratar desse acolhimento em várias áreas e a espiritualidade para mim, como a

transpessoal compreende, é muito importante nesse processo de autonomia mesmo do

sujeito, de autoconhecimento também [...] (E5)

A maneira como a sociedade se relaciona com essas crenças espirituais, as vezes pode

se caracterizar como reducionista, colocando-as como superstição, crenças primitivas,

dogmáticas ou religiosas não valoriza a importância dessa esfera para o ser humano e seu lugar

no mundo, reduzindo o ser humano e a vida em relações materialistas e racionalistas (Ferreira

et al., 2015). É notório a quantidade de interpretações relacionadas a espiritualidade,

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transferindo para essa palavra diferentes conotações, portanto Ferreira, Silva e Silva (2015)

elencaram quatro acontecimentos referentes a espiritualidade e é a partir deles que iremos

abordar esse contexto nessa sessão. Esses quatro acontecimentos são:

(1) a espiritualidade como um acontecimento não religioso;

(2) a espiritualidade como acontecimento de mudança e transformação (do

numinoso de Grof às experiências fundamentais de Tart);

(3) o espiritual acontecendo como valores supremos e altruístas;

(4) a espiritualidade como acontecimento integral. (Ferreira et al., 2015, p. 61)

A espiritualidade não se caracteriza por essas interpretações mencionadas acima, mas

se revela importante para o ser humano, sendo um elemento que pode gerar grande

transformação nos indivíduos, provendo a verdadeira autenticidade. Os autores destacam que

apesar da diversidade sobre o termo “espiritualidade”, uma equivalência se destaca na mudança

de relação com o mundo e as coisas de maneira que não se consegue mais se relacionar da

maneira como se relacionava antes. A dimensão espiritual é considerada uma esfera importante

e essencial na vida do ser humano e na sua qualidade de vida. Consequentemente, existe um

grande aumento de pesquisas relacionadas a espiritualidade e seu impacto na qualidade de vida

do ser humano (Melo, Sampaio, Souza & Pinto, 2015).

O conceito da espiritualidade para a Psicologia Transpessoal se caracteriza como central

na teoria. Podemos efetuar essa afirmação, porque nos três teóricos escolhidos para compor a

dissertação a espiritualidade esteve em uma posição de destaque. Tanto para Ken Wilber,

Stanislav Grof e Vera Saldanha, a espiritualidade não está ligada a uma religião

especificamente. Para Grof, a espiritualidade é uma experiência pessoal, existe a dimensão do

sagrado, sem a necessidade de uma mediação, além disso, é derivado de um nível de consciência

holotrópico. Em relação a teoria de Vera Saldanha, a espiritualidade está relacionada ao

princípio da transcendência e que na Psicologia Transpessoal se estudam os fenômenos que

fazem parte da vida humana, incluindo os religiosos, entretanto o foco não é na religião, mas

na espiritualidade e em como esses fenômenos espirituais influenciam nos valores humanos.

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Ken Wilber traz diferentes visões da espiritualidade, sendo presente na vida do ser humano por

diversas formas, pois a espiritualidade pode estar presente sem a religiosidade.

De acordo com Ferreira, Silva e Silva (2015), a perspectiva transpessoal tem como

especificidade a visão espiritual da subjetividade, diferenciando essa abordagem de outras

maneiras de conhecimento, logo, quando as entrevistadas destacam esse fator, estão colocando

em evidência esse olhar dentro do processo psicoterápico que realizam. A partir desse processo

de enxergar a espiritualidade como integrada ao ser humano, o olhar do psicoterapeuta se volta

para ele também, como é possível perceber na fala das entrevistadas 02 e 06, abordando uma

sensação de estar mais presente no momento do atendimento, uma postura de maior atenção no

espaço terapêutico, ou seja, com uma atenção plena e dotado das possibilidades que estão

presentes na lógica identitária do sujeito, terapeuta, considerando sua própria subjetividade

naquele espaço de atendimento psicológico, seja ele adulto, adolescente ou criança.

Esse olhar para si também é percebido no trabalho de Vera Saldanha, pois ela coloca

como um importante pilar quando se pretende ser terapeuta, considerando sua própria

subjetividade para poder olhar para o outro. A experiência da subjetividade está relacionada a

sermos quem realmente somos naquele espaço, ter a liberdade de fazer a presença como

presente (Ferreira et al., 2015). Isto posto, a transpessoal aparece como um caminho de vida,

promovendo a transformação e cuidado do terapeuta, destacado nas entrevistas por 4

psicólogas, a entrevistada 01, 02, 05 e 06.

E eu acho que a transpessoal, a psicologia transpessoal para mim é um caminho de cura,

um caminho de cura antes de tudo e de auto cura minha também, sabe? E começou dessa

forma e eu acho que no meu trabalho eu sigo muito esse norte também. (E5)

Vera Saldanha ressalta esse aspecto em seu livro. O trabalho do terapeuta se torna

inevitável, para acrescentar qualidade em sua vida, auxiliando o outro a fazer o mesmo

(Saldanha, 2008). Demonstra a necessidade de cultivar a arte da transcendência, pois esta

colabora na relação, sendo importante também o constante esforço para estar nesse processo

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(Saldanha, 2008). Nesse sentido, a Psicologia Transpessoal se mostra como um caminho, assim

como as entrevistadas apontaram, tendo em vista essa necessidade de olhar para dentro de si,

cultivando a transcendência e se percebendo também nesse processo.

A dimensão integrativa foi um aspecto bastante citado pelos psicólogos como uma

característica da psicologia transpessoal para eles, sendo percebido em cinco das seis

entrevistas. Importante destacar que a integralidade também se relaciona com a dimensão da

espiritualidade de acordo com o quarto acontecimento, em que a espiritualidade se destaca

como um acontecimento integral. Podemos perceber nas falas retiradas das entrevistas: “Depois

daí, ela [transpessoal] só veio a integrar, complementar” (E1), “E ao mesmo tempo ela

[transpessoal] é muito integradora também” (E4), “Porque eu percebi que realmente é a que ver

o homem de uma maneira mais integral” (E5).

Para o Aurélio, integração é um substantivo feminino com origem do latim integrare,

que significa o ato ou efeito de integrar ou tornar inteiro, senso sinônimo de assimilação e

reunião. Na entrevista, a transpessoal foi percebida como uma abordagem que estava integrando

todos os saberes já conhecidos, outras práticas, como uma possibilidade de “acolher tudo que

vem do cliente” (E3), como uma maneira de ver o ser humano de modo integral também,

destacando o aspecto integrativo dessa abordagem. Wilber (2009) aborda a integralidade

consciência em sua cartografia da consciência, constatando a influência desse autor e essa visão

entre os psicólogos da abordagem. O modelo dos quatro quadrantes de Ken Wilber pretende

ser um modelo integrador dos acontecimentos na vida do ser humano, podendo explicar essa

visão de acolher as demandas e o que está vindo do cliente. O principal quadrante para uma

abordagem integral é do “Eu”, subjetivo, entretanto, é necessário contextualizar esse quadrante

em meio a todos os outros para atingir um amplo entendimento do primeiro quadrante

mencionado. É esse primeiro quadrante que também se torna central na psicoterapia, pois, só

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podemos acessar o outro, sua subjetividade, caso haja permissão, permita esse conhecimento.

Assim, tecendo a história e os significados para o indivíduo, é possível conhecer sua

subjetividade, aspecto central em psicoterapia. No trabalho com crianças, esse quadrante

também se mostra importante para conhecer a história da criança, suas relações e como ela vai

significando e assimilando as situações que acontecem.

O conceito de unidade foi apontado por Vera Saldanha (2008) como um elemento

central na sistematização da teoria, se caracterizando como um pressuposto básico da Psicologia

Transpessoal. Esse conceito de unidade se refere a não-fragmentação do Ser e a vivência desse

sentimento de unidade leva para o sujeito sentimentos de confiança, paz, harmonia (Saldanha,

2008). Desse modo, a unidade está ligada a integralidade do ser, mencionado pelas entrevistadas

e presente também no corpo teórico da transpessoal.

Essa integralidade também se apresenta na fala da entrevistada 06, quando cita a

transcendência como um aspecto relevante da psicologia transpessoal. A transcendência

mencionada pelas psicólogas se apresenta como uma maneira de compreender o outro em

diferentes contextos e em sua totalidade, como uma interpretação do fenômeno que emerge na

prática clínica, trabalhando além das técnicas apreendidas, transcendendo, ou seja,

ultrapassando a maneira como a psicologia e a prática clínica foi apreendida por ela,

possibilitando um modo de atendimento. A entrevistada 01 também aborda o tema da

transcendência, mas voltada para o aspecto da consciência, sendo a transcendência um encontro

consigo mesmo e uma maneira de acessar outros níveis de consciência, como podemos

perceber:

Psicologia Transpessoal é um encontro com sua transcendência (E1)

Por isso que eu falo muito, até a palavra, o nome transpessoal para mim é muito isso, é

algo que para mim, que transcende, que me faz entender que tem algo na pessoa que

chega pra mim, tanto em atendimento clínico, como em grupo, como na saúde pública,

que eu também trabalho. (E6)

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O termo “transcendência” é bastante utilizado no corpo teórico da Abordagem

Integrativa Transpessoal, desenvolvido por Vera Saldanha. A integralidade, presente no

conceito de unidade se mostra como um aspecto positivo e relevante para que o ser humano

venha a cultivar a transcendência. O princípio da transcendência se caracteriza por ser um

referencial significativo do desenvolvimento humano, o qual favorece o despertar da dimensão

espiritual, de valores positivos e saudáveis tanto ao nível individual como coletivo (Saldanha,

2008). A autora complementa ainda que a transcendência é inerente ao ser humano, pois o

indivíduo nasce com a possibilidade da transcendência em seu pleno desenvolvimento, ou seja,

ela faz parte da unidade psíquica desde o início. O princípio da transcendência é responsável

pela manifestação das experiências culminantes e como essas experiências se tornam possíveis

de emergirem, envolvendo diversos fatores (Saldanha, 2008).

Pulsão de transcendência também está relacionada aos aspectos saudáveis do ser

humano, ou seja, quando essa pulsão não está bloqueada, a razão, emoção, intuição e sensação

(REIS), os valores do Ser são estimulados (Saldanha, 2008). A pulsão da transcendência se

mostrou bastante relevante para as participantes da pesquisa, ressaltando esse aspecto que

transcende e integra os conhecimentos adquiridos por elas. Importante ressaltar que a Psicologia

Transpessoal trabalha para potencializar os aspectos saudáveis do indivíduo, sendo congruente

com esse conceito.

5.2. Teóricos e bibliografia

Nas entrevistas também foi investigado qual a bibliografia utilizada pelos psicólogos na

prática, tanto que auxiliam teoricamente seu trabalho, quando os que são de relevância para

entender e realizar a prática clínica.

Retomando o que foi dito na seção metodológica, fizemos algumas perguntas no

decorrer das entrevistas para aprofundar a narrativa das participantes sobre o seu fazer clínico.

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Esses questionamentos parecem indicar que em um primeiro momento as entrevistadas

respondem de modo mais ou menos automático sobre sua identidade teórica. No caso, como

estão no campo da transpessoal, explicam que usam teóricos da transpessoal, como podemos

perceber no quadro sobre teóricos. No decorrer da entrevista ao serem questionadas sobre o que

consideram que é essencial para a sua prática, se referem a literatura e autores que estão mais

presentes no seu dia-a-dia, se referindo a obras de autores que não necessariamente estejam no

corpo teórico da Psicologia Transpessoal.

Nossa hipótese para essa aparente contradição é que a resposta ao nosso primeiro

questionamento circunscreve as entrevistadas ao campo transpessoal. Assim elas se

reconhecem fazendo parte dessa abordagem. Por outro lado, a sequência das perguntas

convidam-nas a uma reflexão mais detida sobre a prática clínica cotidiana. Assim, elas evocam

livros e autores que estão mais presentes na lida com as crianças e que podem ou não ser

alinhados ao campo transpessoal.

A partir do que foi apontado como as principais referências e os principais autores,

organizei em uma tabela. Para a construção da tabela tomei como referência uma outra

organizada por Ferreira, Silva e Silva (2015) que fizeram um levantamento dos principais

autores e obras internacionais com maior relevância no âmbito nacional, que utilizei abaixo,

como forma de relacionar com os autores e a bibliografia utilizada pelos entrevistados. Em

outra tabela também retirada do livro “Psicologia Transpessoal: história, conquistas e desafios”

(2015), estão as obras nacionais publicadas sobre Psicologia Transpessoal, a qual também fiz

referência para equiparar com o que é conhecido pelos psicólogos que estão na prática clínica.

Tabela 01 – Autores e obras nacionais

AUTOR (A) OBRA

Pierre Weil

A Consciência Cósmica, Introdução à Psicologia Transpessoal - ED. VOZES,

Petrópolis. 1972. 2ª Edição

As Fronteiras da Regressão - ED. VOZES, Petrópolis. 1976.

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As Fronteiras da Evolução e da Morte - ED. VOZES, Petrópolis. 1979

Pequeno Tratado de Psicologia Transpessoal em Colaboração com outros autores -

ED. VOZES, 1979. 5 volumes.

Volume I - Cartografia da consciência humana

Volume II - A mística e a ciência

Volume III - Psicofisiologia da consciência cósmica

Volume IV - Experiência cósmica e psicose

Volume V - Medida da consciência cósmica

A Revolução Silenciosa, Autobiografia Pessoal e Transpessoal - EDITORA

PENSAMENTO, São Paulo. 1983

A Neurose do Paraíso Perdido - ED. ESPAÇO TEMPO. DISTRIBUIDORA

VOZES. Rio, 1987

Ondas à Procura do Mar - ED. AGIR, Rio, 1987.

A Palha e a Trava - ED. VOZES. Rio, 1988.

Meu Deus Quem é Você - ED. VOZES (1989), Petrópolis. 1991

A Nova Ética - Ed. Rosa dos Tempos, Rio. 1993

A Arte de Viver em Paz - ED. GENTE, São Paulo. 1993, Apoio UNESCO

A Morte da Morte - ED. GENTE, São Paulo, 1995.

Antologia do Êxtase - ED. PALAS ATHENAS. São Paulo.1992. - VERSÃO

COMPLETA DISPONÍVEL

Holística: Uma Nova Visão e Abordagem do Real - ED. PALAS ATHENAS, São

Paulo, 1990. - VERSÃO

COMPLETA DISPONÍVEL

Sistemas Abertos: A Nova Transdisciplinaridade. Em colaboração com Ubiratan

D’Ambrósio e Roberto

Crema - SUMMUS EDITORA. São Paulo, 1993.

Lágrimas de Compaixão: E a Revolução Silenciosa Continua! - EDITORA

PENSAMENTO. São Paulo, 1999.

Os Mutantes, Uma nova humanidade para um novo espírito - Ed. VERUS,

Campinas, SP. 2003.

NORMOSE. Pierre Weil, Jean-yves Leloup, Roberto Crema. Campinas:VERUS.

2003.

TRANSCOMUNICAÇÃO. O Fenômeno Magenta - Observações e interpretações

de fenômenos paranormais ocorridos na presença do sensitivo Amyr Amiden.

EDITORA PENSAMENTO. São Paulo. 2002.

Léo Matos

Drogas ou Meditação - Meditação como Alternativa para o Uso de Drogas. VOZES.

1989.

Mente e corpo. VOZES. 1994

Carlos Fregtman Música Transpessoal. CULTRIX. 1984.

Holomúsica – Um caminho de evolução Transpessoal. CULTRIX. 1995

Eliana Bertolucci Psicologia do Sagrado: Psicoterapia Transpessoal. AGORA EDITORA. 1991.

Elias Boainaim Jr. Tornar-se transpessoal: transcendência e espiritualidade na obra de Carl Rogers.

SUMMUS EDITOR. 1996

Maria Cristina

Monteiro de

Barros (org.)

A consciência em expansão: os caminhos da abordagem transpessoal na educação,

na clínica e nas organizações. EDIPUCRS. 1998

Márcia Tabone Psicologia Transpessoal: introdução à nova visão da Consciência em psicologia e

Educação. CULTRIX. 1999 (1987).

Vera Saldanha A Psicoterapia Transpessoal. ROSA DOS TEMPOS. 1999

Raissa Cavalcanti O retorno do sagrado. CULTRIX. 2000.

Ana Maria Maeda Como transformar seu corpo em um templo sagrado: feng shui interno, uma visão

transpessoal. MADRAS. 2000.

Rita de Cassia

Macieira

O sentido da vida na experiência de morte. Uma visão transpessoal em psico-

oncologia. CASA DO PSICÓLOGO. 2001.

Lilian Costa Pinto Iluminação espiritual: a emergência do sagrado na tradição iogue e na Psicologia

Transpessoal. VOZES. 2001.

Anabela Sabino Vivências – abordagem transpessoal em Psicoterapia. EDICEL. 2004

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87

Norma Alves de

Oliveira Psicanálise transpessoal e terapia de vivências passadas. PRINT. 2004.

Aurino Lima Ferreira

(org.)

Psicoterapia e Psicologia Transpessoal: ampliando as fronteiras da consciência.

LIVRO RÁPIDO. 2004.

Francisco Di Biase;

Mário Sérgio da Rocha

Ciência, Espiritualidade e Cura: Psicologia Transpessoal e ciências holísticas.

QUALITYMARK. 2005.

Caminhos do sucesso: A conspiração holística e transpessoal do terceiro milênio.

QUALITYMARK. 2009.

Aurino Lima Ferreira;

Eliége Brandão; Salete

Menezes

Psicologia e Psicoterapia Transpessoal: caminhos de transformação.

COMUNIGRAF. 2005

Crsitina França Psicologia Transpessoal e uma sociedade secreta. GRÁFICA E EDITORA

VITÓRIA. 2005

Isabel Campos

Aprendizagem em treinamento corporativo: inovação, método e resultados sob uma

abordagem

transpessoal. ALTANA. 2006

Odete Maria de

Oliveira Conceito de Homem: mais humanista, mais transpessoal. UNIJUI. 2006.

Claudio Roberto Freire

de

Azevedo;

Delzilene Macêdo

Costa

(Organizadores)

Ciência e espiritualidade: psique e transpessoalidade. ÓRION EDIÇÕES. 2006

Elydio dos Santos

Neto

Por uma educação transpessoal: a ação pedagógica e o pensamento de Stanislaw

Grof. LUCERNA. 2006

Mani Alvarez Psicologia Transpessoal: a aliança entre espiritualidade e ciência. ALL PRINT.

2006.

Julio Francisco Dantas

de

Rezende

Matrix e a Administração Transpessoal. E-PAPERS. 2007.

Aurino Lima Ferreira Psicologia e psicoterapia transpessoal: desafios e conquistas na contemporaneidade.

COMUNIGRAF. 2007

Jorge Trevisol Educação Transpessoal: um jeito de educar a partir da interioridade. PAULINAS.

2008

Vera Saldanha Psicologia Transpessoal: abordagem integrativa. UNIJUI. 2008.

Maria Cristina

Monteiro de

Barros (org.)

A consciência em expansão: os caminhos da abordagem Transpessoal na educação,

na clínica e nas organizações. EDIPUCRS. 2008.

Francisco Di Biasi;

Mario Sergio Rocha

Caminhos do Sucesso: A Conspiração Holística e Transpessoal do Terceiro

Milênio. Qualitymark. 2009.

Ana Montanari; Carlos

França; Vera

Saldanha; Viviane

Dias

Didática Transpessoal: facilitando o ato de ensinar e de aprender. MERCADO DAS

LETRAS. 2010

Anna Mathilde

Pacgeco;

Chaves Nagelshmidt

Argonautas dos espaços interiores: uma introdução à Psicologia Transpessoal.

VETOR. 1996.

Rosalia Monteiro A significação do amor: o maior aprendizado da consciência. EPICON. 1997

Márcia Melo de

Araujo;

Reica Barros dos

Santos

Arteterapia Transpessoal. MARCIA MELO. 2010.

Rita de Cássia

Macieira (og)

Despertando a cura: do brincar ao sonhar – aspectos psíquicos e espirituais da cura

existência. LIVRO PLENO. 2011.

Aurino Lima Ferreira;

Nadja Acioly-Régnier;

Psicologia Transpessoal: reflexões e pesquisas no campo acadêmico brasileiro. TOP

PRODUÇÕES. 2012.

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Maria de Fatima

Abrahão

Tavares; Marlos Alves

Bezerra

(Organizadores)

Maria de Fatima

Abrahão

Tavares;

Claudio Roberto Freire

de

Azevedo;

Marlos Alves Bezerra

(Organizadores)

Tratado da Psicologia Transpessoal: antigos ou novos saberes em psicologia?

(Vol1). EDUFRN. 2012.

João Batista de Castro O que é a mente? 100 casos clínicos de hipnose transpessoal. AMERICA. 2013..

Emílio Figueira Psicologia Transpessoal: Sua história, seus teóricos, suas possibilidades. EBOOK.

2014

João Carvalho Neto

Psicanálise da alma. SAQUAREMA. 2005.

Casos de um divã transpessoal: psicanálise e tvp reunidas em uma proposta

terapêutica. PORTAL LITERÁRIO.

Maria Carvalho O que é o transpessoal?. TEMÁTICA.

Elaine Marini Síndrome do pânico: o tratamento na visão da psicologia transpessoal. VETOR.

2008.

Jeronimo Moreira de

Oliveira

O que vejo no espelho: uma visão pragmática da psicologia transpessoal.

LEOPOLDIANUM. ABRUC EDITORAS ASSOCIADAS / UC. 2004

Sergio Holtz Filho Pedagogia transpessal aplicada na empresa: um novo paradigma na comunicação

social. BOOKESS. 2014.

Fonte: retirado de Ferreira et. al, 2015

Como já mencionado, essa tabela nos ajudou na construção da tabela abaixo. Na

primeira coluna colocamos os autores citados pelas entrevistadas e na segunda os autores que

estavam apoiando o seu fazer clínico. As duas últimas colunas se referem ao trabalho realizado

por Ferreira.

Tabela 02 – Autores e obras citadas

Entrevistadas Teóricos Citados Bibliografia que apoia a prática

E1

Victor Frankl

Vera Saldanha

Stanislav Grof

“Descobrindo Crianças” (Violet Oaklander)

“Tornar-se presente” (John Stevens)

“Psicologia e Psicoterapia Transpessoal”

(Ferreira, Brandão & Menezes (2005)

“Descobrindo sua Força Espiritual” (James

Van Praagh)

“O Lado Sombrio dos Buscadores de Luz”

(Debbie Ford)

“Prática de Vida Integral” (Ken Wilber)

E2 Teóricos da fenomenologia

Virginia Mae Axline

“Dibs: Em busca de si mesmo” (Virginia M.

Axline)

“Ludoterapia” (Virginia M. Axline)

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E3 Stephen Gilligan

Bert Hellinger

“A coragem de amar” (Stephen Gilligan)

“Psicanálise nos contos de fadas” (Bruno

Bettelheim)

E4

Aaron Beck

“Autores da Gestalt”

Victor Frankl

Leo Matos

Ken Wilber

Não cita livro especificamente

E5 Stanislav Grof

Estudos sobre o feminino

Artigos relacionados aos casos

“Descobrindo Crianças” (Violet Oaklander)

E6 Carl Jung “A coragem de amar” (Stephen Gilligan)

“Descobrindo Crianças” (Violet Oaklander)

Tabela 03 – Autores e obras internacionais com relevância nacional

Autores internacionais com

relevância nacional (Ferreira et

al., 2015)

Autores e obras internacionais com maior relevância no

âmbito nacional (Ferreira et al., 2015)

Roger Walsh, e Frances Vaughan

Ken Wilber

Stanislav Grof e Christina Grof

Charles Tart

Rob Preece

Ram Dass

Jack Kornifield

Mark Epstein

Clovis Correa

Mariana Caplan

John Welwood

John Engler

Roger Walsh, e Frances Vaughan

o “Além do ego: dimensões transpessoais em psicologia” (1995)

o “Caminhos além do ego: uma visão transpessoal” (1997)

Ken Wilber

o “O espectro da consciência” (1996)

o “A consciência sem fronteiras: pontos de vista do Oriente e do

Ocidente sobre o crescimento pessoal” (1991)

o “Espiritualidade Integral: uma nova função para a religião neste

início de milênio” (2006).

Stanislav Grof e Christina Grof

o “Além do Cérebro: nascimento, morte e transcendência em

psicoterapia” (Grof, 1987)

o “Emergência Espiritual: crise e transformação espiritual”

(Grof;Grof, 1992)

o “A Psicologia do Futuro: lições da investigação moderna sobre

a consciência” (Grof, 2007)

o “Respiração Holotrópica: uma nova abordagem de

autoexploração e terapia” (Grof; Grof, 2010)

o “A aventura da autodescoberta” (Grof, 1997)

o “A tempestuosa busca do ser: um guia para o crescimento

pessoal através da crise de transformação” (Grof; Grof, 1994).

Charles Tart

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90

o “O fim do materialismo: como evidências científicas dos

fenômenos paranormais estão unindo ciência e espiritualidade” (2012)

o “Psicologias transpersonales”.

Rob Preece

o “The Wisdom of imperfection”

A partir das tabelas acima, podemos perceber que, das obras citadas pelas psicólogas

entrevistadas, não havia nenhuma da lista dos livros e autores com maior relevância no âmbito

nacional, varredura realizada por Ferreira, Silva e Silva (2015) na obra “Psicologia

Transpessoal no Brasil: História, Conquistas e Desafios”. O livro “A Coragem de Amar” (2001)

de autoria por Stephen Gilligan, foi citado por duas entrevistadas, a entrevistada 03 e a

entrevistada 06 como um dos livros mais utilizados para apoiar a prática clínica. Além do livro

citato, a entrevistada 01 elencou os livros “Psicologia e Psicoterapia Transpessoal: caminhos

de transformação.” de Aurino Lima Ferreira; Eliége Brandão; Salete Menezes (2005) e “Prática

de Vida Integral” de Ken Wilber; Terry Patten; Adan Leonard (2011) como dois dos livros

utilizados na prática clínica com crianças. É importante destacar que nenhum dos livros citados

acima são considerados livros de autores da Psicologia Transpessoal, abordam o tema da

infância. Entretanto, esses livros falam sobre a teoria da transpessoal, sendo importantes para o

olhar sobre o ser humano e o fenômeno que emerge no contexto de trabalho.

O livro “Descobrindo Crianças” de Violet Oaklander (1978) foi o mais citado, sendo

mencionado por três das seis psicólogas entrevistadas (01, 05 e 06). Esse livro utilizado pelas

entrevistadas é considerado um clássico da abordagem gestáltica com crianças, se mostrando

um modelo e um guia de atendimento infantil na abordagem Gestalt (Pajaro, 2015). Outro livro

considerado da abordagem Gestalt também citado foi “Tornar-se presente” de John Stevens

(1971), mencionado pela entrevistada 01.

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Uma autora também citada que emerge nesse campo como uma referência no modo de

se trabalhar com psicoterapia infantil é Virginia M. Axline, autora da perspectiva Humanista,

que estabeleceu princípios sobre ludoterapia. Nessa abordagem e autora de um caso

representativo, Dibs, dando origem ao livro “Dibs – em busca de si mesmo” (1964), citado pela

entrevistada 04, assim como o livro que estabelece os princípios da ludoterapia, denominado

“Ludoterapia – A dinâmica interior da criança” (1974).

Outro livro citado, por uma única entrevistada, foi “Psicanálise nos contos de fadas” do

autor Bruno Bettelheimm. Trata-se também de uma obra situada em outra abordagem teórica

clássica: a psicanálise.

Dois livros que se mostraram como livros importantes para a prática dos psicólogos

entrevistados foram: “Descobrindo sua Força Espiritual” de James Van Praagh e “O Lado

Sombrio dos Buscadores de Luz” de Debbie Ford, ambos citados pela entrevistada 01.

Importante destacar que os dois autores não são considerados teóricos de alguma abordagem

específica, se caracterizando como autores que auxiliam no auto desenvolvimento, utilizando

conceitos também utilizados pela Psicologia Transpessoal, como o conceito de espiritualidade

(no livro de James Van Praagh) e como o conceito de sombra (utilizado por Debbie Ford em

seu livro). A busca por essas leituras se tornam acessíveis e, por vezes, trazem diversas técnicas

e maneiras de trabalhar com a demanda que surge na clínica, sendo uma alternativa prática aos

clássicos teóricos da abordagem.

No que concerne aos teóricos que auxiliam na construção teórica da prática clínica,

foram citados conforme a segunda coluna da tabela. Dos teóricos citados, podemos destacar

Victor Frankl, Stephen Gilligan, Stanislav Grof e Ken Wilber, como sendo autores

internacionais relevantes no âmbito nacional, se destacando pela influência tanto no campo da

pesquisa, como no campo da prática clínica em geral. Sobre os autores nacionais, Vera Saldanha

e Léo Matos se destacam na fala dos entrevistados como influências no campo da transpessoal

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de âmbito nacional. Além dos autores supracitados, outros teóricos e fontes de estudo se

destacaram na fala das entrevistadas, como teóricos da fenomenologia, Virginia Mae Axline,

Bert Hellinger, Aaron Beck, Carl Jung e de modo mais vago, “estudos sobre o feminino”.

Diante dessas falas, podemos perceber que o profissional que atende crianças pela

abordagem transpessoal, se mostra em uma constante busca de teorias que auxiliem a

operacionalizar essa prática ligada ao universo infantil ou que auxiliem na compreensão desse

universo, lançando mão de diferentes leituras e autores de outras abordagens psicológicas.

Revendo a história da Psicologia Transpessoal, Ferreira, Silva e Silva (2015) percebem a

dimensão transpessoal como foco da atenção nas principais correntes teóricas ao longo da

história, podendo ser essa uma explicação para a variedade de autores não considerados

transpessoais e destacados nas entrevistas. Em seu corpo teórico, podemos perceber aspectos

da Psicologia Humanista, como Maslow e também da junguiana, trabalhando aspectos do ser

humano. Essa constituição da Psicologia Transpessoal em dialogar com diferentes abordagens

pode ter relação com o fato das profissionais buscarem também em outras fontes. Uma outra

dimensão notória foi o fato de cinco, das seis entrevistadas, já terem trabalhado com outras

abordagens para guiar sua visão de homem, de mundo e consequentemente seus atendimentos,

seja na graduação ou em outras formações enquanto profissional, fazendo recorrer ao que é

conhecido dentro do campo de atuação. Aliado a isso, a transpessoal não objetiva negar o que

já foi elaborado pelas outras abordagens psicológicas, o intuito é um olhar para dimensões da

vida humana que não foram abordadas anteriormente (Ferreira et al., 2015).

Outro apontamento importante se apresenta nas inúmeras publicações de autores

nacionais que não são expressivas na fala dos profissionais entrevistados, entretanto, os

profissionais acabam por recorrer a leituras em outras abordagem, muitas vezes por

desconhecer a produção na própria corrente teórica. Além disso, alguns livros já não são mais

encontrados de maneira fácil, pois as editoras não os publicam mais, sendo esse um fator que

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dificulta o acesso as leituras e aos livros da própria abordagem. Essa busca em outras teorias

demonstra também uma abertura dos profissionais em buscar dialogar com diferentes saberes,

como também a necessidade de aprender a filtrar, refletir e digerir aquilo que pode ser

proveitoso dentro da abordagem como um limite teórico-epistemológico (Pajaro, 2015).

A escassez de estudos sobre o tema da infância na abordagem foi outro ponto destacado

durante as entrevistas como empecilho para trabalhar nessa abordagem com crianças na clínica.

Apesar da mencionada escassez, nada foi comentado sobre a possibilidade de publicações na

área.

5.3. Olhar para a criança em terapia

Podemos perceber também um olhar sobre a criança durante o processo de psicoterapia,

que é parte da construção das psicólogas que estão nesse espaço de elaboração e criação

presentes na atuação, demonstrando e demarcando esse espaço criativo do ser. É perceptível a

vontade e o deleite dos profissionais no atendimento infantil e também os desafios que essa

prática impõe.

A necessidade de um cuidado nesse fazer é ressaltado por uma entrevistada, tendo em

vista a importância do processo de desenvolvimento da infância, já estando em uma situação

peculiar de pessoa em desenvolvimento, de acordo com o artigo 6° do ECA. Essa necessidade

de um cuidado nos faz pensar na criança em terapia considerando que, quando a criança se

encontra em processo de psicoterapia pode haver uma situação de vulnerabilidade, é preciso

que o profissional fique atendo a essas demandas.

[...] a criança por si própria transmite essa leveza, ela transmite essa receptividade [...]

As crianças, que eu digo que tem um nível de abertura muito maior do que o adulto, que

não tem resistência, a não ser em algumas situações, como situações de abuso ou

situações mais de violência, mas tirando isso, as crianças são muito leves, é muito fácil

você transitar com as crianças. (E1)

A criança ela já está com o campo próprio para isso, muita emoção ali e através do

lúdico a gente consegue acessar. [...] com a criança eu percebo que realmente acaba

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fluindo mais facilmente por ela já está nesse nível [da fantasia], então tem sido muito

interessante [...] (E4)

Para algumas psicólogas, trabalhar com crianças se configura como sinônimo de leveza,

abertura, receptividade. Essas características descritas são consideradas positivas,

demonstrando que existe um olhar positivo para essa fase do desenvolvimento. Na quarta

definição de Ken Wilber, sobre espiritualidade, existe uma relação entre espiritualidade e

atitudes positivas, destacando que as crianças têm uma facilidade maior em se conectar com

essas atitudes. Entretanto, é importante destacar que essa é uma visão romantizada da infância,

como mencionado anteriormente. Esse contexto se dá em meio as brincadeiras, fantasia e

ludicidade presentes no universo infantil, sendo a criatividade essencial para essas práticas. A

dimensão da criatividade pode ser percebida no trabalho realizado por Vera Saldanha, pois em

seu livro “Psicologia Transpessoal: Abordagem Integrativa – Um Conhecimento Emergente em

Psicologia da Consciência” (2008), podemos perceber a utilização de técnicas que aplicam

diferentes recursos, estimulando a criatividade e o potencial do curador interno, ou seja, a

criatividade na resolução do problema pode ser encontrada em si mesmo.

A fantasia no processo psicoterápico infantil se constitui como um recurso que favorece

na identificação de sentimento pelo conteúdo trazido (Nalin, 1993). O trabalho com a fantasia

auxilia na comunicação entre o psicoterapeuta e a criança, fazendo esse adentrar no universo

infantil e estimular a formação do vínculo na terapia. Essa capacidade de se conectar com a

criança é bem peculiar do trabalho do terapeuta infantil, favorecendo a evolução da criança no

processo psicoterápico (Costa & Dias, 2005). Os recursos lúdicos auxiliam na psicoterapia

infantil, sendo destaque pelas crianças e se caracterizando como um meio para se trabalhar os

conflitos, emoções e angústias trazidas por elas, identificando-as e possibilitando a orientação

dos familiares e facilitação do processo para todos (Polli & Arpini, 2013; Trapiá, Tagliapietra,

Usui, Hammoud, & Coelho, 2012). O aspecto da fantasia associado a brincadeira é uma

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atividade presente na infância auxiliando o desenvolvimento, tanto social, como cognitivo,

psicomotor e afetivo das crianças, sendo o brincar uma prática cultural em que auxilia a

compreensão da infância e dos processos vividos nessa etapa da vida (Brandão, Bichara &

Barreto, 2016). O lúdico mencionado pelas profissionais entrevistadas segue esse caminho da

brincadeira, considerando o brincar como um recurso já presente na criança e auxiliando esse

contato com o universo infantil e acessando as experiências que determinada criança teve.

A dimensão do lúdico, da fantasia, da criatividade não é abordada diretamente por algum

autor citado anteriormente. Entretanto, podemos dizer que essa dimensão está relacionada a

dimensão interna e interior na teoria de Ken Wilber, sendo o Eu. Nessa dimensão estão os

aspectos interiores do indivíduo, que podemos acessar apenas por meio do próprio sujeito, caso

haja permissão. É por meio do brincar e da ludicidade que podemos acessar a criança e nos

permitir conhece-la, reconhecendo sua subjetividade. Através da brincadeira a criança mostra

como ela percebe o mundo ao seu redor, como isso é significado para ela. Também é nesse

quadrante que são percebidas outras questões levantadas pelas profissionais, como as sensações

e as emoções. Outro ponto ressaltado foi a formação da identidade, destacando que é na infância

que ocorre a formação de identidade para Wilber e também precisa ser considerado a

autoestima. A expressão da criança também foi apontado por uma entrevistada, podendo ser

percebido no quadrante superior direito, pois o quadrante superior esquerdo é a expressão do

direito, como a subjetividade se dar no mundo, é como podemos observar, o que é externado,

como o comportamento. Geralmente é o comportamento da criança que a faz chegar a

psicoterapia, sendo importante considerar. No quadrante superior esquerdo também podemos

perceber aspectos fisiológicos da criança, importantes de perceber no atendimento infantil.

No tocante a família, esse também foi um ponto destacado pelas psicólogas, podendo

perceber na fala a seguir: “[...] porque você também vai trabalhar com os pais, então você tem

condições de também trabalhar o adulto e o lúdico com a criança [...]” (E3). A família surge

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como um aspecto essencial no trabalho com crianças, sendo trazido pelos profissionais como

um tema central, tanto como um tema trazido por elas, como um tema importante para o

psicólogo trabalhar, pois esse meio influencia tanto a educação, quanto a formação psicológica

tendo em vista que esse é o núcleo inicial de socialização da criança e do ser humano, tendo a

formação inicial de vínculos. Nesse aspecto, é importante destacar o que estamos chamando de

família. A família passou por diversas mudanças desde a sua instituição, desde o sentimento de

linhagem de um mesmo ancestral na idade média, até as novas configurações de família que

existem atualmente, não seguindo uma lógica linear, se formos contar sua história, devido aos

inúmeros registros familiares (Lino, 2009). A família se configura não apenas como uma

instituição de origem biológica, mas sua relevância está no fato de ser construção social e um

espaço substancial para a manutenção da sobrevivência, de desenvolvimento e de proteção

integral de seus filhos e componentes, que independe da maneira como se configuram ou de

seu arranjo (Lino, 2009). A definição de família e família saudável não diz respeito ao conceito

de família nuclear (pai, mãe, filho), tendo em vista os rearranjos familiares e as diferentes

possibilidades de constituição de uma família, mas sim como os elementos se configuram e

quais os papéis exercidos dentro daquela esfera familiar (Silva & Gontijo, 2016).

A criança tem uma dependência e uma relação fundamental dos pais e/ou a sua rede

social em que esse contexto pode facilitar ou dificultar, sendo um dos maiores obstáculos

quando essa rede não se mostra apoiadora do processo (Costa & Dias, 2005). Além disso, a

família com disfunções pode ocasionar perturbações em um de seus membros, por vezes,

levando-os a busca pela psicoterapia, como destaca Sei, Souza e Arruda (2008), se fazendo

necessária a intervenção junto a essa rede que levou a criança ao processo. Portanto, o processo

de atendimento dos pais e inclusão dessa família no processo psicoterápico se revela como uma

maneira de atendimento paralelo ao atendimento da criança, tendo em vista a dependência dessa

criança, tanto emocionalmente, quanto concretamente, possibilitando um espaço para

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diferenciar as questões individuais de cada um e como isso se desenrola no ambiente familiar

(Otero, 1993; Sei et al., 2008). Essa importância da família também se destaca em uma outra

entrevista, ressaltando a importância da família como meio de expressão da criança. A

importância da família se destaca no terceiro quadrante, o esquerdo inferior, onde se encontram

as relações, visões de mundo e a comunicação. Esse é o quadrante onde o Eu está imerso, sendo

a vivência com o mundo, a percepção, os valores, ou seja, interfere na visão de homem e de

mundo do indivíduo.

A família, como primeira forma de socialização é onde tem início a incorporação de

regras, práticas culturais, podendo haver relações com o desenvolvimento de habilidades sociais

(Petruccci, Borsa & Koller, 2016). Portanto, a dimensão familiar também está presente no

atendimento infantil, pois os aspectos subjetivos destacados no quadrante superior esquerdo,

fazem sentido dentro de um aporte cultural, com uma bagagem sendo compreendida através do

que é vivenciado, existindo uma conexão entre esses quadrantes. A visão de criança para uma

entrevistada perpassa os aspectos do limite biológico imposto pelo desenvolvimento infantil.

Essa é uma característica importante a se levar em consideração, pois cada criança tem seus

aspectos do desenvolvimento e os limites de cada etapa. Portanto, podemos relacionar com a

próxima categoria de análise sobre desenvolvimento infantil, a categoria 04, em que irei abordar

sobre os aspectos importantes do desenvolvimento na clínica infantil.

5.4. Desenvolvimento infantil

Sobre o desenvolvimento infantil, sua importância foi mencionada por algumas

profissionais. A importância de conhecer os aspectos biológicos do desenvolvimento da

criança, como também os aspectos cognitivos, lógico-racionais, foi citado na entrevista. A

necessidade de entender como funciona o desenvolvimento da criança para poder encontrar

maneiras de intervir dentro da psicoterapia demostra de importante relevância.

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Como aspectos importantes para se observar no desenvolvimento infantil as psicólogas

trouxeram a formação da identidade e autoestima da criança, que percebemos também na

categoria anterior, como constituintes do processo de atendimento infantil. Sobre o

desenvolvimento infantil, temos o objetivo de perceber a relevância desse aspecto no trabalho

do terapeuta e como o desenvolvimento é percebido nos diversos âmbitos dentro do contexto

da psicoterapia.

A psicanálise tem seu olhar e todo um arcabouço teórico construído e voltado para o

desenvolvimento infantil. Esse embasamento psicanalítico permeando a concepção sobre a

infância foi percebido em duas falas, trazendo essa percepção da psicanálise como norteadora

do desenvolvimento, como podemos perceber

A cronologicidade, acho que a idade cronológica é importantíssimo. Acho que a criança

até 7 anos ainda está nesse processo do édipo [...] (E2)

[...] eu gostava, lia muito a Melanie Klein, era sempre de psicanálise que me embasava

mais e depois quando chegou a trans, eu tentei fazer a ponte, mas meu olhar é muito

psicanalítico ainda. E daí como eu fui agregando as outras, eu acho ele ficou muito

múltiplo assim. Eu tenho muito o olhar da sistêmica e uso muito com crianças. (E3)

Outra colaboradora da pesquisa apontou não sentir necessidade de buscar fontes

bibliográficas sobre o desenvolvimento infantil por perceber que cada criança tem sua

individualidade, como destacado na fala

[...] mas não é uma coisa que eu sinta necessidade de estar buscando não, porque eu vou

muito, até porque a coisa da idade não é muito... às vezes a criança está dentro daquela

idade, daquela fase do desenvolvimento, mas ela não conseguiu ainda desenvolver

algumas coisas [...] (E6)

Sobre isso, podemos ter duas interpretações. A primeira é que é possível trabalhar com

crianças na clínica sem a preocupação com questões de desenvolvimento, baseado na crença de

que cada sujeito é único. Uma outra interpretação é tomando o modelo de Wilber podemos

perceber as linhas de desenvolvimento, destacando a individualidade de cada sujeito, mas

dentro de contextos de desenvolvimentos possíveis.

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Nas linhas de desenvolvimento, podemos perceber uma certa independência uma das

outras, cada linha se refere a uma determinada característica, como o desenvolvimento

cognitivo, moral, emocional. A linha de desenvolvimento cognitivo se torna um pré-requisito

para o desenvolvimento de outras linhas, entretanto, não é essencial, destacando assim que a

criança pode ter um desenvolvimento moral independente do seu desenvolvimento cognitivo.

Desse modo, diferentes aspectos da vida da criança são considerados quando falamos sobre o

desenvolvimento, não apenas o cognitivo, como estudado amplamente na cultura ocidental.

Ainda dentro do arcabouço teórico desenvolvido por Wilber estão os estágios ou níveis

de desenvolvimento, em que são aquisições adquiridas no decorrer do processo de

desenvolvimento, avançando no grau de complexidade. Para realizar esse estudo acerca do

desenvolvimento, Wilber pesquisa diversos teóricos que teorizam sobre esse tema e vai em

busca de organizar um estudo do desenvolvimento que abarcasse outras esferas para além da

dimensão cognitiva, tentando preencher as lacunas existentes. A grande contribuição de Wilber

(1986) para o desenvolvimento foi a percepção de onde se encontram as lacunas dentro dos

estudos e enxergar essas lacunas em outros estudos de forma que elas não se contrapõe, mas

podem ser complementares. Desse modo, os conceitos desenvolvidos ao longo de anos sobre

os aspectos psicodinâmicos podem se complementar com as abordagens transpessoais,

contribuindo de modo geral para a teoria do desenvolvimento, auxiliando em uma compreensão

mais integral das capacidades do ser humano (Wilber, 1986).

Em um atendimento na abordagem transpessoal, conhecer a teoria do desenvolvimento

proposta por Ken Wilber pode ajudar a compreender a criança como um todo. Essa

compreensão deve considerar todos os aspectos do desenvolvimento, sem desconsiderar o

contexto em que a criança está inserida, ampliando o olhar para além do espaço clínico.

Para Wilber (1986), o processo de desenvolvimento é de extrema importância para a

saúde mental do ser humano, pois, para passar para o estágio seguinte, o anterior precisa estar

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internalizado pelo indivíduo, caso contrário, existe a possibilidade de gerar prejuízos na saúde

mental. É importante ressaltar que esse estudo demanda um grande investimento de tempo no

qual é preciso reconhecer no psicólogo infantil disponibilidade para fazê-lo.

Na Abordagem Integrativa Transpessoal, podemos perceber o desenvolvimento como

um processo, ocorrendo o processo primário, em que é regido pelo prazer, onde aparece a pulsão

de vida e de morte, o processo secundário, o qual é regido pelo princípio da realidade é onde

ocorre a estruturação do ego, já o processo terciário é regido pelo princípio da transcendência,

em que a pulsão da transcendência emerge (Saldanha, 2008). De acordo com a autora, a pulsão

de transcendência se relaciona com o princípio da transcendência.

O princípio da transcendência é a ampliação dos conceitos de “aspectos instintóides” de

Abraham Harold Maslow e da “procura de unidade” estabelecido por Pierre Weil. Esses

referenciais constituem o processo terciário mencionado anteriormente, sendo esse conjunto de

referenciais inerentes ao ser humano, favorecendo o despertar da dimensão espiritual,

favorecendo a manifestação de valores positivos e saudáveis ao ser humano (Saldanha, 2008).

Nessa visão de indivíduo, o humano nasce com todas as possibilidades para seu

desenvolvimento pleno. Podemos perceber que a AIT percebe o ser humano com inúmeras

potencialidades para o desenvolvimento, com um olhar saudável e positivo do indivíduo em

que a natureza transpessoal esteja presente na constituição do ser humano, tendo potencialidade

para emergir. Desse modo, podemos perceber esses aspectos como um processo do

desenvolvimento do ser humano, tendo essas características norteadoras, possibilitando e

permitindo o surgimento da pulsão de transcendência, inerente ao ser humano. Além disso, o

desenvolvimento na AIT considera aspectos não só da personalidade, mas engloba a

individualidade do sujeito, abrangendo também para a espiritualidade (Saldanha, 2008).

Stanislav Grof traz a importância do desenvolvimento perinatal para o ser humano como

um todo, trazendo discussões acerca da consciência nesse período. Dessa forma, para Grof, o

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desenvolvimento se inicia no período perinatal. O domínio biográfico é conhecido pela vida

pós-natal, sendo amplamente estudado na psicologia ocidental, inclusive pelos estudos acerca

do desenvolvimento (Grof, 2012). Por este motivo, os estudos de Stanislav Grof não se voltam

para esse aspecto do desenvolvimento. Entretanto, é importante destacar a relevância que o

autor dá a história como fazendo parte da constituição do ser humano, pois as experiências

vividas no desenvolvimento são significativas, sendo armazenadas como COEX e podendo

emergir, de acordo com as experiências futuras do indivíduo.

Apesar da teoria transpessoal trazer um olhar para o desenvolvimento infantil que pode

embasar uma prática clínica psicológica, apenas uma psicóloga citou autores dessa abordagem,

apresentando Ken Wilber e Stanislav Grof como autores que a embasam sobre

desenvolvimento. Desse modo, é apresentado dentro da própria abordagem um modelo de

desenvolvimento e um olhar para a infância como uma fase da vida, trazendo a importância

desse momento na constituição do ser humano.

[...] acerca do desenvolvimento eu fico ali oscilando, entre Grof com as matrizes

perinatais, até porque na anamnese também vai nessa linha, de entender. [...] Quando eu

quero entender essa criança, de modo geral, pensa eu vou para Piaget ou, relacionando

também com o Ken Wilber, mas assim, sempre volto para Piaget [...] (E5)

Conhecer acerca do desenvolvimento infantil se mostra como importante para a

psicoterapia com crianças, como uma forma de compreender a criança, sabendo que existem

peculiaridades, partindo de cada individualidade. Mas, é importante não utilizar o

desenvolvimento infantil como um a priori, pois cada criança tem sua peculiaridade.

Do conjunto das entrevistas fica em aberto o quanto a dimensão do desenvolvimento

infantil é relevante. Embora mencionado nas entrevistas, seja ressaltando a dimensão cognitiva

ou afetiva, ou o contexto social de desenvolvimento por parte de algumas entrevistas, não

podemos afirmar o quanto tais questões são relevantes para o cotidiano de seu trabalho.

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O que pode ser dito é que no campo da transpessoal, como em outros campos da

psicologia, essa dimensão do desenvolvimento infantil além de importante, também necessita

de uma dedicação aos autores e teorias. Essa disposição parece estar mais presente nos

psicólogos que tem foco voltado para essa clientela. Como esclarecido na seção metodológica,

nossa amostra incluiu as psicólogas que declararam atendiam criança. Posteriormente, nas

entrevistas em profundidade pudemos perceber que nem sempre isso se traduziu como ter o

foco da atuação profissional voltada para o público infantil, como visto na fala de uma

entrevistada também: “[...] até porque como eu não atendo muita criança, eu atendo

pouquíssimas crianças, então não é uma coisa, desenvolvimento infantil, uma coisa que eu vá

fazer uma leitura constante, a não ser quando surge alguma necessidade mais específica [...]”

(E6). Desse modo, o fato de atender criança não necessariamente se configura como um estudo

voltado para esse universo, tendo foco também outras demandas que emergem no âmbito

profissional.

5.5. Conceitos Aplicados

A partir das entrevistas realizadas, podemos delinear os conceitos mais utilizados na

prática clínica pelos profissionais. Sobressaiu o conceito das matrizes perinatais elaborado por

Grof (1987), sendo esse é um modelo de cartografia da consciência bastante utilizado pelas

entrevistadas. O domínio perinatal gira em torno do nascimento e da vida intrauterina,

ressaltando a importância desse período na constituição do ser humano e das experiências

durante a vida. As matrizes perinatais podem ser utilizadas na prática clínica como um mapa da

consciência e de enfrentamento das situações adversas, como também uma forma de

interpretação do brincar das crianças, utilizando a fantasia para reviver esses arquétipos. As

matrizes perinatais também podem ser utilizadas como formas de intervenções, pois, apesar da

psicoterapia baseada em Grof ser não-diretiva, outros autores utilizaram esses conceitos e

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criaram novas formas de intervenções, sendo mais diretiva, como Léo Matos, psicólogo que

formou diversos profissionais no Brasil. Seu nome foi citado como um autor que contribui e

influencia a prática clínica por alguns psicólogos, como apontado na categoria passada.

Portanto, podemos inferir que existem diferentes modos de se trabalhar a partir das matrizes

perinatais e da teoria de Stanislav Grof.

O segundo conceito mais utilizado foi o de arquétipos. Esse conceito originalmente foi

adotado por Jung em 1927, para designar temas psíquicos que pudessem ser exprimidos por

meio de imagens, sendo posteriormente estendido a todas as manifestações psíquicas que

estivessem incluídas no plano da natureza humana e típica, tanto no âmbito do biológico,

psicobiológico ou ideacional (Jacobi, 2016). Os estudos de Jung se destacam na esfera da

psicologia transpessoal, contribuindo em torno de uma psicologia do sagrado o colocando como

um importante autor dessa abordagem (Ferreira, Silva, & Silva, 2015). Ainda corroborando

com esses autores, “arquétipos e mitos, inconsciente coletivo, sonhos, tipos psicológicos,

abordagem simbólica, sincronicidade e dimensões espirituais da psique serviram de base para

a fundamentação da psicologia transpessoal no Ocidente” (Ferreira et al., 2015, p. 33). Dessa

maneira, o conceito de sonhos citado pela entrevistada 03 também faz parte de um corpo teórico

herdado da psicologia Jungiana.

A Psicologia Junguiana esteve bastante presente nos três teóricos que foram trazidos no

início. Relacionando com a categoria de análise 02, Carl Jung também apareceu como um autor

que auxilia a prática das profissionais no atendimento infantil, apesar de não aparecer uma obra

sua, suas construções teóricas vieram a somar com a prática nessa perspectiva. Na teoria de

Vera Saldanha, a razão, emoção, intuição e sensação (REIS) se mostra bastante presente, sendo

uma estruturação proposta por Jung. O REIS auxilia na percepção da realidade quando há o seu

desenvolvimento de forma saudável e congruente, tendo o contato com a elaboração desses

elementos desde o início do desenvolvimento, auxiliando um crescimento saudável

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emocionalmente. Estar em contato com o REIS permite que o indivíduo tome consciência dos

processos que estão acontecendo em sua vida, tornando-se mais consciente de si e do outro.

O conceito de sombra citado pela entrevistada 03 é utilizado por Ken Wilber para montar

sua cartografia se referindo à estrutura da psique apresentada por Jung, sendo um conjunto de

atributos do self em que o sujeito perdeu o contato (Tabone, 2003). De acordo com a autora,

Wilber acredita que quando esses elementos são negados pelo indivíduo, tendo como

consequência o afastamento de si mesmo, criando uma “persona” e percebendo características

da sombra como ameaçadoras do mundo externo. Esse conceito é amplamente trabalhado no

livro “O lado sombrio dos buscadores da luz” de Debbie Ford citado na categoria anterior como

um dos livros que auxiliam a prática dos profissionais que estão atuando.

Sobre os níveis de consciência, esse conceito se caracteriza como um objeto de estudo

importante para a transpessoal, principalmente se considerarmos a sua história, pois foi em

torno dos diferentes níveis de consciência resultantes de outros modos de ver o mundo que

surgiram pesquisas protagonizadas por Ken Wilber e Stanislav Grof e consequentemente a

Psicologia Transpessoal (Ferreira et al., 2015). Dessa maneira, esse conceito utilizado pelos

profissionais se configura de maneira importante para a prática clínica, estreitando teoria e

prática. A teoria de Stanislav Grof inicia com as pesquisas realizadas acerca da consciência e

dos estados não ordinários que a consciência pode atingir. Esses estados foram chamados pelo

autor de estados holotrópicos, onde ocorrem uma transformação da consciência, alterando a

forma como percebemos os sentidos do corpo. Os estados holotrópicos da consciência

permitem acessar de maneira profunda questões da psique humana, pois a consciência é alterada

de forma qualitativa, não a prejudicando, como em delírios (Grof, 2012). O conceito de estados

de consciência, principalmente os estados holotrópicos está relacionado ao conceito de matrizes

perinatais, também trazido pelas profissionais.

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Também para Ken Wilber como Vera Saldanha, os estados de consciência são

importantes na constituição da psique e precisam ser estudados. Esses estados de consciência

são transitórios, mas fazem parte da consciência humana e podem trazer diferentes

compreensões. As experiências de pico fazem parte dos estados de consciência, sendo um

estado de consciência também. Essas experiências são necessárias para cultivar a dimensão

espiritual do ser humano e também para o sentido de motivação quando não estiver vivendo

essas experiências.

Como hipótese, podemos dizer que Stanislav Grof parece ser um autor mais acessível

para as entrevistadas por ter construído sua teoria a partir de um modelo de trabalho, sendo

percebidas essas experiências e conceitos a partir da sua vivência. Acrescenta a esse fator a

construção de um modelo clínico pautado em sua teoria. Com Ken Wilber, podemos perceber

uma aplicação em diferentes áreas, não só na clínica psicológica, havendo diferentes trabalhos

com seu modelo teórico, não havendo um foco na prática clínica. Vera Saldanha estaria mais

próxima de uma “autora da prática” como Grof. Por outro lado, por se tratar de uma autora

brasileira viva e acessível (professora de cursos de especialização como o das entrevistadas), as

entrevistadas estariam mais habituadas com suas palestras do que com seus escritos.

Outros conceitos citados percebidos nos atendimentos foram de identificação, apego,

transformação, transmutação, respiração, sendo todos conceitos que formam o corpo teórico da

psicologia transpessoal em sua história e estão inseridos no modelo explicativo criado para

compreender os fenômenos psicológicos do ser humano. Conforme essa análise, é possível

apontar que os conceitos citados pelas entrevistadas estão presentes na Psicologia Transpessoal

e apesar das psicólogas também realizarem leituras e virem de outras formações teóricas, é

perceptível como a transpessoal e seus conceitos estão em seus modos de trabalhar.

Alguns conceitos que aparecem, como grounding e ancestralidade são importados de

outras abordagens, como a análise bioenergética e na Constelação Familiar de Bert Hellinger.

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A citação desses conceitos pelos entrevistados evidencia o trânsito de autores e noções entre o

fazer dos entrevistados e o contato com a diversidade de perspectivas e abordagens disponíveis

atualmente. Como mencionado anteriormente, o contato de entrevistados com outras

abordagens cria um amalgama de conceitos e noções que fica difícil de separar o que é

específico da transpessoal com outras abordagens. Como mencionado na categoria de análise

anterior, podemos perceber a influência bibliográfica e teórica de outros autores, agregando a

prática desses profissionais. A seguir, falaremos de alguns recursos utilizados pelas psicólogas,

podendo auxiliar na compreensão de como esses conceitos são estruturados na clínica infantil

a partir da prática delas.

5.6. Recursos utilizados

Os recursos utilizados pelas psicólogas emergiu no decorrer da entrevista, pois, quando

falam sobre sua prática, também falam de como é esse fazer. Essa categoria faz percebermos o

mais próximo de como é realizada a prática clínica com crianças na abordagem transpessoal,

pois são as estratégias utilizadas por elas no processo terapêutico. Desse modo, identificamos

que existem os recursos que estão no corpo teórico dos autores citados acima (Ken Wilber,

Stanislav Grof e Vera Saldanha) e os recursos que vieram de outras abordagens ou outros

autores; ou são de uso comum quando se atendem crianças, como os recursos lúdicos.

Dentro dos autores explorados nessa dissertação, iniciaremos com Ken Wilber. Como já

foi anteriormente, no capítulo referente à teoria desse autor, Wilber construiu um arcabouço

teórico reunindo teorias e elaborando uma teoria de forma que esses conceitos se

complementavam, estruturando uma visão do ser humano integral. Embora tenha um corpo

teórico complexo, envolvendo a teoria do desenvolvimento humano, incluindo a infância, há

um debate sobre sua teoria integral. Embora apoiado em teorias do funcionamento psíquico,

como a psicanálise das relações objetais e a Teoria Cognitivo Comportamental, só bem

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recentemente, vem sendo publicadas obras voltadas para a prática da psicoterapia em si mesma.

Podemos citar Mark Forman e seu livro “A Guide to Integral Psychotherapy: Complexity,

Integration, and Spirituality in Practice” publicado em 2010 e o livro de R. Elliot Ingersol e

David M. Zeitler “Integral Psychoterapy. Inside in, Outside out” (2010) como livros que

surgiram no âmbito da Psicologia Transpessoal e utilizam a teoria desenvolvida por Ken Wilber

como norteadora. No que se refere à clínica infantil propriamente dita, não foram lançadas obras

específicas sobre o tema. Em nenhum dos livros citados, há menção ao trabalho clínico com

crianças na perspectiva de Ken Wilber. As psicólogas podem ter criado técnicas com base

também nessa teoria, entretanto, precisaríamos conhecer profundamente sobre o

desenvolvimento desses recursos para embasarmos, o que não seria o objetivo dessa

dissertação.

Stanislav Grof desenvolveu sua teoria pautada em observações realizadas utilizando a

técnica desenvolvida por ele e sua esposa, Christina Grof, de respiração holotrópica. Seu

método de trabalho foi elaborado com grupos de adultos e adolescentes, utilizando música

evocativa, foco na respiração e o trabalho corporal (Grof, 2012). Até o presente momento, não

existe trabalho realizado por Stanislav Grof que remeta a uma psicoterapia infantil. No entanto,

autores que são importantes para a transpessoal no Brasil, como Léo Matos, já citado

anteriormente, desenvolveram adaptações do trabalho realizado por Grof, se voltando para

atendimento psicológico individual com técnicas chamadas de “morte e renascimento do ego”

e a “técnica do sonho catártico diurno”. Esses trabalhos tinham como objetivo utilizar a teoria

da dinâmica das matrizes perinatais no contexto da clínica psicológica.

Por essa razão, foram citados recursos utilizados na psicoterapia infantil baseados no

trabalho de Léo Matos com as matrizes perinatais. A utilização de túnel para a criança passar

simulando o parto e uma boneca grávida para trabalhar os conteúdos perinatais foram citados

como recursos dentro desse campo de atuação e podemos enxergar como uma adaptação das

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técnicas tomando como base essa teoria e o trabalho desenvolvido por Léo Matos. Outro recurso

citado por uma psicóloga foi a utilização de técnicas corporais, podendo ser percebido esse

recurso dentro desse escopo teórico, tendo em vista que além do manejo clínico desenvolvido

por Léo Matos, dentro da respiração holotrópica de Grof trabalhos corporais também são

utilizados quando necessário. Muitas das técnicas corporais vêm de outras abordagens, antes

mesmo da estruturação da Psicologia Transpessoal enquanto abordagem, entretanto, algumas

delas foram sendo utilizadas e incorporadas pela transpessoal.

O trabalho com mandalas também é utilizado na respiração holotrópica, como uma forma

de integração dos conteúdos vivenciados na sessão, sem interpretação do que o indivíduo

produziu. Léo Matos também adaptou a técnica da mandala como um recurso terapêutico e a

existência de padrões na elaboração do desenho, as quais indicariam padrões de questões a

serem trabalhadas, com técnicas para experienciar essa vivência. A mandala é uma técnica

projetiva, a qual seria uma expressão dos conteúdos presentes na consciência no momento do

desenho dela. Isso significa que uma mandala desenhada minutos depois pode ser

completamente diferente da anterior. Esse recurso também foi citado por algumas psicólogas

que poderiam ser utilizado no trabalho com crianças, utilizando a interpretação e o desenho

como um elemento no processo psicoterápico.

Vera Saldanha teve grande reconhecimento em seu trabalho por realizar uma

sistematização dos principais conceitos e recursos utilizados em um processo terapêutico,

podendo ser aplicados em diferentes contextos. A intervenção verbal é o primeiro recurso

apontado pela autora e se caracteriza por ser o principal para estabelecimento de vínculo, sendo

percebido dentro dos recursos a partir das técnicas que vão sendo utilizadas. A imaginação

ativa, foi o segundo recurso apresentado por Saldanha (2008), sendo utilizado por algumas

entrevistadas por meio de técnicas de imaginação e o psicodrama. O terceiro recurso foi a

reorganização simbólica, o qual utiliza a imaginação ativa, mas vai além, organizando

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determinados conteúdos de acordo com o objetivo da dinâmica. Outro recurso foi a dinâmica

interativa, dividida em sete passos para compreender melhor e se mostram integrativas no

processo. Por fim, existem os recursos auxiliares ou adjuntos, os quais não são exclusivos da

psicologia, mas contribuem para o processo psicoterápico, sendo eles a meditação,

concentração, contemplação e relaxamento.

A adaptação das técnicas apreendidas pelos profissionais para utilizar com adultos foi o

principal ponto mencionado. Essa adaptação é realizada com a inserção de recursos lúdicos

visando facilitar o engajamento da criança. As técnicas citadas pelas entrevistadas foram

técnicas do psicodrama, as quais podem ser inseridas na imaginação ativa, pois trabalham na

dimensão do “como se”, estimulando a imaginação como recurso no processo, como na fala de

uma psicóloga: “Então, o psicodrama trabalha muito isso [a fantasia]. Mas, o psicodrama

trabalha com hotsit, questão de encenação o tempo todo. E com a criança a gente trabalha muito

com isso, né, porque é o mundo da fantasia dela.” (E1). Outro recurso citado que pode se inserir

dentro da imaginação ativa são as jornadas de fantasia ou técnicas de visualização terapêutica

de forma adaptada para o mundo infantil, expresso nas falas de algumas psicólogas “[...] essa

questão da jornada de fantasia, eu faço muito, mas depende muito da criança [...]” (E2), “Ah,

outra coisa que eu uso muito é a visualização terapêutica com as crianças” (E3).

A reorganização simbólica também utiliza da imaginação ativa, existindo recursos

citados pelas entrevistadas que estão contemplados por essas duas categorias. Como dito

anteriormente, quando as profissionais falam em técnicas, são as conhecidas e criadas para

adultos, mas foram reinventadas de forma diferente para as crianças, sendo elas: hotsit; templo

sagrado; encontro com o mestre; a loja de trocar objeto; cabana, tronco e montanha; animal de

poder; jornada do guerreiro; arquétipos da luz, guerreiro e do sábio. O outro recurso organizado

pela autora foi a dinâmica interativa, que são sete etapas nas quais ajudam a perceber em qual

momento a terapia se encontra, auxiliando na tomada de decisões e em perceber como o

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processo está caminhando, entretanto, esse recurso não foi citado por nenhuma das

entrevistadas.

Por fim, estão os recursos auxiliares ou adjuntos também utilizados na psicologia,

entretanto, não são exclusivos da psicologia transpessoal, nem da psicologia em si. Esses

exercícios auxiliam no rebaixamento de tensão e ansiedade, como auxiliam também a perceber

o que está acontecendo. Os recursos adjuntos citados e que são utilizados com as crianças pelas

psicólogas, como o mindfulness e a respiração. O mindfulness é uma técnica de meditação que

tem como objetivo a atenção no momento presente, trazendo inúmeros benefícios. A respiração

também foi mencionada como um exercício fazendo parte da atuação das profissionais,

percebendo na fala de algumas psicólogas “Respiração, né? Que a gente usa muito do Grof,

trago muito a respiração para a criança, para trabalhar a ansiedade” (E1) e em outra entrevista

“a gente inventa umas brincadeiras ‘faz de conta que você está enchendo um balão’ ou bota um

balão mesmo, você tá trabalhando a respiração dessa forma.” (E3). Surgiu também o contato

com elementos da natureza ao ar livre, citado por uma psicóloga: “E às vezes até, que antes eu

atendia em uma sala lá embaixo, então é até mais fácil às vezes de sair, ir lá pra fora, pro jardim,

essa coisa do contato com os elementos” (E6)

Um outro ponto que emergiu dentro dos recursos foi o trabalho a partir da constelação

familiar com a criança, realizando de forma adaptada para que organize simbolicamente a

família dentro da vivência infantil. Desse modo, a família sendo uma demanda a ser trabalhada,

esse foi um recurso encontrado por algumas psicólogas.

Alguns recursos utilizados pelas psicólogas da transpessoal são recursos aprendidos em

outras abordagens. Como percebido nas entrevistas, existe uma constante busca por recursos

que auxiliem a prática do psicoterapeuta infantil na transpessoal, resultando em uma aplicação

de recursos práticos voltado para crianças que foram originalmente construídos a partir de

outras perspectivas e abordagens psicológicas. Foram citados durante a entrevista recursos

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aprendidos na abordagem humanista, um olhar fenomenológico, técnicas da Gestalt e da

abordagem corporal.

Na verdade eu uso assim, muita coisa que eu uso para adulto eu uso para criança, mas

adaptado, hotsit, esses psicodramas, o templo sagrado, encontro com o mestre. Uso

muito o desenho, acho que é uma das ferramentas que eu uso mais para a criança, massa

de modelar, massinha, argila, recortes de revista. [..] Tem super-heróis, bonecos de

pano, então eu peço para ele pegar como está se sentindo hoje, eu trabalho muito nesse

sentido assim, de criação. E os recursos que eu tenho são recursos que eu aprendi na

abordagem humanista, né. (E1)

Então, na medida do possível o que eu trabalho com a transpessoal é essa questão do

hotsit e da jornada de fantasia quando dar, mas nem sempre dar. E quando não dar eu

utilizo a ludoterapia mesmo, eu utilizo muito a linha de Axiline. (E2)

Então, eu me oriento mais com isso [livro “A Coragem de Amar”] e com as coisas que

eu considero assim, da corporal que acaba a transpessoal abarcando e da própria

psicanálise. (E3)

Porque na verdade eu acho que a transpessoal não tem técnica da clínica infantil, eu

acho que não tem. Então, eu uso algumas coisas da Gestalt, do, enfim, da compreensão

da fenomenologia aqui atrás, de lidar com o que está surgindo ali naquele momento, né.

(E5)

Isso se explica na categoria 2, quando muitos autores e obras citadas que auxiliam na

prática vieram de outras abordagens. Isso demonstra uma carência de recursos próprio da

transpessoal ou de uma sistematização desses recursos congruentes com a visão de homem

presente na abordagem, embasando esse fazer. Essa foi uma questão levantada por 5 das 6

entrevistadas, a falta de uma sistematização da teoria que pudesse facilitar a prática, fazendo-

as buscar recursos em outras escolas ou fazê-las ter que criar ou adaptar recursos a partir do que

foi aprendido na teoria.

Importante ressaltar que os recursos lúdicos foram citados por todas as entrevistadas,

tendo diferentes maneiras de apresentar e interagir com esses recursos, como desenho, argila,

massa de modelar, recortes de revista, livros, poemas infantis, bonecos e a construção de

histórias com as crianças. Os recursos lúdicos se mostram importantes por fazer parte do mundo

infantil, possibilitando uma conexão maior com as crianças. Costa e Dias (2005) ressaltam a

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importância de se conectar com o mundo da criança e todo o seu simbolismo, levanto em

consideração também a capacidade cognitiva em seu momento do processo evolutivo,

facilitando a relação entre eles.

Portanto, resumindo esta categoria. Fica claro que os profissionais se relacionam com

os recursos de uma das seguintes formas. A primeira seria adaptando recursos existentes (no

caso de Grof, o trabalho com minhocão, ou túnel com cadeiras e colchões) e agregando a

recursos que adquiriram em formações anteriores (trabalho com corpo, trabalho com contação

de histórias, etc.). A segunda seria incorporando outros campos que ainda não estão

reconhecidos (como Constelações Familiares) e criando um modo particular de atuação. A esse

respeito é importante considerar o modo como os clínicos se apercebem dos recursos, seja como

um meio ou um fim em si mesmo.

Se utilizar de uma abordagem não significa necessariamente abandonar as outras, pode

ser utilizado técnica e recursos apreendido em outras teorias, tendo em vista que não existe

apenas uma maneira de intervir, se reduzir a essa forma seria uma forma do cliente se adaptar

aos limites da teoria, sendo a técnica um meio para a comunicação e não o fim (Molina-Loza,

C.A., 2002 citado por Costa & Dias, 2005)

Assim, parece que a prática se trata de um trabalho de síntese pessoal ao longo dos anos,

de um construir um modo coerente de trabalho na clínica, fruto da reflexão, dos fracassos e dos

acertos na experiência profissional. No quadro desse trabalho o que podemos dizer é que nossa

amostra de entrevistados é reduzida e tem a maioria dos entrevistados em torno de 04 anos de

atuação clínica, não havendo possibilidade de estudar diferenças e semelhanças. Desse modo,

esse estudo tem como objetivo também de compartilhar essas formas de atuação e a síntese

realizada pelas psicólogas a partir de suas experiências de atuação prática.

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5.7. Diferencial da Psicologia Transpessoal

Outra questão levantada durante as entrevistas foram a diferença ou o diferencial da

Psicologia Transpessoal com crianças das demais abordagens, se existe algo percebido pelas

profissionais que seja particular dessa perspectiva teórica. A possibilidade de haver essa

diferença da abordagem não foi percebida por duas profissionais entrevistadas, ressaltando que

não existe uma estruturação da prática com crianças na abordagem transpessoal e percebendo

o “olhar transpessoal” independente do recurso que está sendo utilizado no momento, pois a

transpessoal está na interpretação da situação que está emergindo a partir da visão de homem e

de mundo que a abordagem traz.

Essa categoria de análise não responderá todas as questões acerca da transpessoal, mas

retomaremos os teóricos já abordados da teoria, juntamente com a fala das psicólogas que estão

na prática, pois são elas que estão trabalhando com a teoria desenvolvida. Desse modo,

buscamos compreender o que existe de diferente proveniente da Psicologia Transpessoal.

Importante ressaltar, como já mencionado anteriormente, que a maior parte das

profissionais que participaram também percorreram um caminho em outras perspectivas

teóricas. Outro fator considerado importante é o fato de que alguma delas não conheciam de

perto outras abordagens, dificultando opinar a partir de um referencial que não se é conhecido.

Diante disso, sobre o diferencial da abordagem, as entrevistadas ressaltaram algumas

características percebidas apenas na psicologia transpessoal, sendo: 1) as ferramentas para se

trabalhar com a criança dentro da fantasia; 2) Vivenciar crenças e fantasias criadas, imaginadas

que ainda não existiram na realidade; 3) A mudança que a transpessoal traz pra si mesmo

permite levar mudanças para a maneira de vivenciar o setting terapêutico, permitindo a

liberdade e a criatividade em meio às brincadeiras. Essas foram características apontadas pelos

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entrevistados que percebiam dentro da psicologia transpessoal, considerando as abordagens que

já eram conhecidas por eles.

A psicoterapia na atualidade é composta por diferentes números de escolas psicológicas

que se diferenciam em questões fundamentais sobre o conhecimento do ser humano, utilizando

uma explicação diferente para as mesmas desordens emocionais e psicossomáticas, se

orientando e utilizando um caminho terapêutico diferente (Grof, 2012). Grof expõe que as

diferenças aparentam se concentrar no interior das escolas, sendo menor entre elas. Dessa

forma, não há evidências suficientes baseadas em estudos estatísticos que demonstrem a

superioridade de uma forma de psicoterapia, havendo diferentes fatores que são destacados no

processo (Grof, 2012). Dessa forma, a escolha por uma abordagem tem mais relação com a

subjetividade do terapeuta em ter se sentido afetado pela teoria, que com a “eficácia” da própria

teoria (Grof, 2012).

Entretanto, o trabalho terapêutico com estados holotrópicos é uma particularidade da

perspectiva transpessoal, apontado por Grof (2012), como um diferencial da psicologia

transpessoal. Esse processo se diferencia pela forma como os conteúdos com grande carga

emocional emergem, ficando disponível para que possa ser trabalhado. A função do terapeuta

seria de propiciar um método que induzisse o estado holotrópico, além de criar um ambiente

seguro, apoiando todo o processo e o conteúdo que emergisse (Grof, 2012).

Retomando a AIT, na dimensão transpessoal a pulsão de transcendência se desenvolve

e encontra espaço na dimensão da psique, propiciando espaço para a criatividade e a

espontaneidade. No campo do simbólico, em um processo de desenvolvimento da dimensão

terciária, onde se encontrara a pulsão de transcendência, há uma criança interna com

características de espontaneidade, criatividade, sendo desperta para a transcendência (Saldanha,

2008). Essa dimensão da criança se refere à criança interior, ao resgate desses aspectos positivos

da infância para poder estar presente no atendimento infantil. Essa permissividade consigo

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mesmo, permite que a espontaneidade e criatividade, já emergida, surjam no atendimento,

possibilitando uma relação com a criança por meio dessa ludicidade presente no terapeuta. Pelo

meio de comunicação ser o lúdico, se torna necessário que o terapeuta permita que emerjam

essas características positivas. O contrário disso, quando a dimensão transpessoal é reprimida

e não entramos no processo terciário, manifestam características da criança ferida, podendo ser

a agressividade e impulsividade (Saldanha, 2008). Isso não significa que para atender criança

tem que ter tido uma infância sem problemas ou dificuldades, mas que, com o trabalho pessoal

esses momentos vão sendo ressignificados, permitindo a conexão com essas dores com uma

nova forma de olhar.

Ainda em sua obra, Saldanha (2008) apresenta como diferencial da AIT a manifestação

do processo terciário, se evidenciando como integrador quando comparado aos processos

anteriores. A partir dessa integração, diferentes possiblidades podem ser apresentadas se

baseando nessa integração, podendo aplicar em diferentes contextos para além da psicologia

clínica.

Como um diferencial percebido na teoria de Ken Wilber, podemos destacar a sua visão

integral presente nos quatro quadrantes, onde se torna possível incluir todos os aspectos do ser

humano, um mapa onde isso se mostra possível e como potencial. Esse mapa integral tem o

olhar para diferentes verdades teóricas, percebendo os aspectos presentes nas teorias

psicológicas. Além disso, sua teoria engloba aspectos tanto da cultura ocidental como oriental,

como mencionado anteriormente. Podemos perceber isso em sua teoria de desenvolvimento, a

qual abrange diferentes níveis do espectro da consciência e como o sujeito vai desenvolvendo,

tanto cognitivamente como moralmente e espiritualmente. A cartografia da consciência

proposta por Wilber propõe níveis mais integradores do corpo, da mente e do mundo ao redor,

envolvendo todos esses aspectos (Wilber, 2009).

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A partir da amostra de participantes e da categorização realizada durante a discussão

dos resultados, não emerge expressivamente um diferencial da psicologia transpessoal a partir

da prática clínica. Como falado anteriormente, existem alguns diferenciais percebidos no corpo

teórico dos autores escolhidos.

Dessa forma, existe um distanciamento entre o campo acadêmico, de pesquisa e a prática

clínica. Não podemos falar em um distanciamento entre teoria e prática porque os teóricos da

transpessoal não falam sobre criança e o atendimento infantil, sendo uma construção particular

de cada psicóloga esse fazer clínico, tendo em vista que dentro do corpo teórico transpessoal

não se discute sobre atendimento infantil. Outra hipótese é que pelo fato dos profissionais virem

de outras abordagens, em sua maioria, e as demandas de sofrimento na contemporaneidade

permanecerem, pode não ser percebida essa diferença no manejo clínico, apenas no campo

teórico. Sendo assim, fica difícil para quem está na prática ter um momento de reflexão sobre

seu fazer e construir a existência ou não de um diferencial da abordagem, sendo o momento da

entrevista um momento também de reflexão que as psicólogas puderam pensar sobre seu fazer.

Além disso, a maioria das obras dos autores citados são mais voltados para a teoria como

um todo, abordando os processos psíquicos, não havendo uma discussão sobre infância na

clínica e o contexto que ela está inserida. Nesse contexto, os profissionais realizam uma prática

clínica com crianças pautada na psicologia transpessoal, entretanto, não de forma sistematizada,

por não haver essa sistematização teórica.

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6. Considerações Finais

Ao final dessa pesquisa de mestrado, podemos perceber como foi a caminhada de todo

esse percurso. A pesquisa nasce com uma metodologia que propõe a transformação tanto do

pesquisador quando dos participantes. A partir dessa transformação, voltamos a como surgiu o

interesse nesse tema, a inquietação relacionada à prática clínica, aliada à inserção nesse campo

de atuação. Para além disso, ressaltamos a importância da infância como um momento que

precisa de um espaço de cuidado e de vias que possam expressar sentimentos e emoções,

acolhendo o que possa vir. Esse cuidado pode e deve estar presentes nos espaços que essas

crianças habitam tanto de modo metafórico quanto concreto, principalmente quando em todas

as camadas, mas sobretudo junto aos extratos mais pobres do Brasil, ainda há muito a se fazer

para vivermos uma sociedade que zela pelos direitos e necessidades das crianças.

Para conhecer melhor como foi surgindo a psicoterapia infantil, fizemos um percurso

de como foi sendo construído o olhar e o trabalho com as crianças nas abordagens da psicologia.

O sofrimento infantil vai sendo colocado em evidência e surgindo diferentes maneiras de

manejar e ressignificar esse processo. Não só o sofrimento infantil vai tomando um lugar, mas

a infância como um todo, pois o cuidado com esse momento da vida tem sido tema principal

em diversos âmbitos, principalmente relacionado a saúde, ampliando os espaços em que se

torna possível o cuidado.

O presente estudo teve como objetivo compreender como os psicólogos inseridos na

abordagem da Psicologia Transpessoal atuam no contexto da psicoterapia infantil, a partir do

olhar dessas profissionais que estão atuando no campo. Para atingir esse objetivo, buscamos

entender como é organizado essa prática, buscando entender como são formulados conceitos e

noções, relacionando-as ao atendimento infantil, assim como buscamos identificar a existência

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de elementos que caracterizem e diferenciem a psicoterapia infantil baseada na Psicologia

Transpessoal.

Introduzimos essa dissertação voltados para a psicoterapia infantil e como foi surgindo

nas abordagens. Nos voltando para o objetivo da pesquisa, fomos percorrendo a história da

Psicologia Transpessoal em âmbito internacional e nacional, esclarecendo a escolha por utilizar,

dentro dessa escola teórica. Conhecendo o surgimento dessa perspectiva, podemos

compreender seu constructo teórico e sua visão de ser humano, influenciando na forma como

esse olhar vai sendo direcionado para o cuidado durante a infância dentro de um processo

psicoterápico.

A partir de então, nos detivemos nas construções teóricas de três autores da Psicologia

Transpessoal, Ken Wilber, Stanislav Grof e Vera Saldanha, sendo os dois primeiros no cenário

internacional e a última no cenário brasileiro. Compreendendo a teoria desses autores, nos

voltamos para o olhar da infância na psicoterapia e como essas construções teóricas podem ser

apreendidas no contexto do atendimento infantil. Pois a partir da visão construída de ser

humano, que permeia todo um contexto em que esse se encontra, podemos compreender o olhar

para a infância e como essa prática clínica pode ser realizada dentro do contexto infantil. É

importante destacar que não existe um conceito de infância sistematizado pela teoria e que os

autores não pensaram a aplicação de suas teorias em uma clínica infantil. Além disso, as

questões transpessoais se caracterizam por ser também imanentes, não apenas abordando

questões caracterizadas por um “além de”.

Para realizar essa investigação, 6 psicólogas concordaram em colaborar com a pesquisa,

que foi realizada por meio de uma entrevista, compreendendo como é realizada a prática delas.

A maioria das psicólogas que aceitaram participar da pesquisa já haviam percorrido outras

abordagens antes de chegar na Psicologia Transpessoal. Além disso, um ponto em comum entre

elas foi a realização da formação em Psicologia Transpessoal, a mesma formação realizada na

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cidade de Natal-RN. Com a possibilidade de compreender a realização dos atendimentos

infantis realizados por elas, foi propiciado um espaço em que se pudesse pensar a atuação

clínica, considerando a escassez de outros momentos como esse em meio as atribulações

diárias. Importante ressaltar o contexto em que estamos inseridos contemporaneamente, um

contexto de produtividade, do fazer, da prática, tirando esse tempo da reflexão.

Acessando as narrativas da psicólogas, foi possível compreender os aportes teóricos que

subsidiam a prática. Partindo desse acesso, foram sendo construídas as categorias de análise,

que apoiaram a discussão, aprofundando e sistematizando essa análise em categorias que

emergiram durante esse processo.

A prática clínica infantil realizada pelas psicólogas é composta por uma grande

diversidade, desde os recursos utilizados, até a forma como a Psicologia Transpessoal é

compreendida, influenciando nos conceitos aplicados. Podemos perceber que existe uma

prática embasada teoricamente, mas esse momento de reflexão sobre a atuação não é realizado,

tendo em vista que essa é uma discussão que ocorre mais no campo acadêmico.

A Psicologia Transpessoal é percebida por diferentes olhares, mas existem elementos

centrais nessa discussão, como a espiritualidade e os estados de consciência, que foram comuns

nos resultados. Foram destacados autores que fazem parte do corpo teórico da abordagem, como

autores e bibliografias que são de outras perspectivas teóricas como forma de compreender mais

sobre o universo do atendimento infantil, tendo em vista que não existe uma sistematização da

teoria, tendo como consequência a utilização de conceitos teóricos que são da transpessoal e

também que não são. Quando mencionado sobre as obras, foram citadas muitas que não são do

corpo teórico da Psicologia Transpessoal, uma alusão seja a falta de obras não traduzidas ou

mesmo ao processo de sistematizar aquelas disponíveis e que são referências da abordagem no

âmbito nacional e internacional. Importante notar que a maioria das psicólogas já utilizaram

outra perspectiva para orientar o atendimento na sua atividade clínica. Talvez essa seja uma

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razão para que exista uma busca por obras que sejam referência sobre infância de modo mais

geral, sem maiores preocupações em buscar também aporte teórico dentro da transpessoal.

Além disso, muitos recursos citados pelas profissionais podem ser encontrados dentro

do corpo teórico da abordagem, como adaptações dos recursos que são utilizados na clínica

com adultos. Ficou evidente também que muitos recursos são fruto de uma síntese realizada a

partir dos anos de prática dos próprios profissionais, assim como da criatividade utilizada no

atendimento, criando um modo particular de atuação. Esses recursos são perpassados pelo modo

como a criança e seu contexto é percebido dentro da clínica psicológica, desde o

desenvolvimento infantil e sua importância para o atendimento, como o ser criança, a

brincadeira e o lugar do lúdico no processo psicoterápico.

Desse modo, a partir das entrevistas pudemos compreender o trabalho das psicólogas,

assim como perceber que existe uma prática clínica baseada nessa abordagem. Além disso,

refletimos sobre a necessidade de uma sistematização do que já existe na atividade profissional

das psicoterapeutas. O que se torna possível escutando as pessoas que estão realizando essa

prática, pois são elas que estão utilizando, reinventando e atualizando a teoria com seus modos

de fazer. Para tanto, importa fortalecer encontros de profissionais, através de jornadas,

seminários e assemelhados; além da publicação de relatos de experiência profissionais. Assim,

se torna possível a disseminação e o compartilhamento de estratégias, recursos e práticas que

auxiliem no cuidado com o outro, já que esse é um objetivo da psicologia clínica, trazendo esse

conhecimento e essa discussão para mais profissionais que estão atuando ou têm interesse em

atuar com esse público. Essa foi uma das principais mudanças no percurso dessa dissertação, a

de perceber o protagonismo das psicólogas que estão atuando e que elas também percebam sua

importância na construção do conhecimento.

Como todo estudo, existiram algumas limitações nesse trabalho. Primeiramente, foi

definido que a pesquisa seria com psicólogos da cidade de Natal-RN, reduzindo

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121

significativamente a amostra. Além disso, foi difícil encontrar colaboradores que estivessem

atendendo crianças nessa perspectiva, talvez pela falta de sistematização teórica da clínica

infantil transpessoal ou pelo número de profissionais que atendem crianças já serem reduzidos

dentro da própria psicologia por inúmeras questões.

Desse modo, podemos pensar como possível outros estudos que amplie esse

conhecimento sobre a prática dos profissionais, para perceber de forma mais precisa, como é

realizada a prática da psicologia transpessoal no contexto da clínica infantil. Importante

ressaltar que existem elementos, a partir dos autores citados e de outros que compõem a teoria,

para pensar e sistematizar a clínica infantil da transpessoal. Contudo, é fato que pensar sobre a

prática realizada, assim como sistematizar esse fazer, é um trabalho que necessita de tempo e

dedicação, que na sociedade atual é um artefato raro de se ter. Outro ponto a ser considerado é

a necessidade de tornar pública a prática desses profissionais, compartilhando com seus pares

os saberes construídos ao longo de suas formações enquanto terapeutas. Além disso, ainda

compreendemos como necessária uma melhor sistematização da visão da infância nessa

abordagem, algo que compreendemos se mostra substancial na construção desse fazer,

deixando o profissional mais seguro em meio às demandas que surgem no contexto da clínica

infantil.

Page 122: Programa de Pós-Graduação em Psicologia...Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Programa de Pós-Graduação em Psicologia A CLÍNICA

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Page 127: Programa de Pós-Graduação em Psicologia...Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Programa de Pós-Graduação em Psicologia A CLÍNICA

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APÊNDICES

Apêndice A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Esclarecimentos

Este é um convite para você participar da pesquisa: “A CLÍNICA INFANTIL

TRANSPESSOAL: UM OLHAR A PARTIR DOS PROFISSIONAIS”, que tem como

pesquisador responsável Ana Flávia França Bezerra, aluno(a) de mestrado da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte.

Esta pesquisa pretende compreender o lugar da clínica infantil na perspectiva

transpessoal, a partir da perspectiva dos profissionais da cidade de Natal-RN.

O motivo que nos leva a fazer este estudo é realizar uma aproximação dos terapeutas e

investigadores, para que possa se tornar conhecido os métodos de trabalho e estratégias

utilizadas por psicoterapeutas com o intuito de estreitar o campo teórico com a prática, tendo

em vista a necessidade de um maior diálogo entre essas duas áreas de conhecimento.

Caso você decida participar, você será submetido(a) aos seguintes procedimentos: um

encontros individual com a pesquisadora, que conversará sobre a Psicologia Transpessoal e a

psicoterapia nessa perspectiva. Caso concorde, as conversas serão gravadas com o auxílio de

um gravador de voz para facilitar a transcrição das falas e serão utilizadas somente para os

fins dessa pesquisa. Para tanto, você precisará assinar uma autorização específica.

Durante a realização da entrevista a previsão de riscos é mínima, pode acontecer um

desconforto durante a entrevista que será minimizado com auxilio psicológico caso

mencionado pelo entrevistado. Além disso, é sempre importante destacar o cuidado com os

profissionais que estarão participando da pesquisa, tendo em vista que estaremos discutindo

sobre sua prática profissional. Como benefício, esse será um espaço para que os profissionais

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psicólogos pensem um pouco sobre sua atuação, além desse estudo propor realizar uma

aproximação dos terapeutas e investigadores, para que possa se tornar conhecido os métodos

de trabalho e estratégias utilizadas por psicoterapeutas com o intuito de estreitar o campo

teórico com a prática, tendo em vista a necessidade de um maior diálogo entre essas duas

áreas de conhecimento. Acredita-se que esse estudo poderá contribuir para uma discussão

sobre infância na clínica transpessoal, ampliando o diálogo com os profissionais atuando

nesse campo específico, e você poderá contribuir para o desenvolvimento da Psicologia

Transpessoal e a disseminação o conhecimento de práticas realizada na clínica para

psicólogos e estudantes de psicologia.

Em caso de algum problema que você possa ter relacionado com a pesquisa, você terá

direito à assistência gratuita que será prestada pela própria pesquisadora.

Durante todo o período da pesquisa você poderá tirar suas dúvidas ligando para Ana

Flávia França Bezerra, no telefone: (84) 988188364 e e-mail: [email protected], ou

para o orientador da pesquisa Geórgia Sibele Nogueira da Silva: (84) 99417-0024 e e-mail:

[email protected].

Você tem o direito de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer

fase da pesquisa, sem nenhum prejuízo para você.

Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados apenas em

congressos ou publicações científicas, sempre de forma anônima, não havendo divulgação de

nenhum dado que possa lhe identificar.

Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa pesquisa em local

seguro e por um período de 5 anos.

Se você ou o seu acompanhante tiverem alguns gastos pela sua participação nessa

pesquisa, eles serão assumidos pelo pesquisador e reembolsado para vocês.

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129

Se você sofrer qualquer dano decorrente desta pesquisa, sendo ele imediato ou tardio,

previsto ou não, você será indenizado.

Qualquer dúvida sobre a ética dessa pesquisa você deverá ligar para o Comitê de Ética

em Pesquisa – instituição que avalia a ética das pesquisas antes que elas comecem e fornece

proteção aos participantes das mesmas – da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,

nos telefones (84) 3215-3135 / (84) 9.9193.6266, através do e-mail [email protected]

ou pelo formulário de contato do site <www.cep.propesq.ufrn.br> . Você ainda pode ir

pessoalmente à sede do CEP, de segunda a sexta, das 08:00h às 12:00h e das 14:00h às

18:00h, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Campus Central. Lagoa Nova.

Natal/RN. CEP 59078-970

Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com o

pesquisador responsável Ana Flávia França Bezerra.

Consentimento Livre e Esclarecido

Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os

dados serão coletados nessa pesquisa, além de conhecer os riscos, desconfortos e benefícios

que ela trará para mim e ter ficado ciente de todos os meus direitos, concordo em participar da

pesquisa “A prática da psicoterapia infantil na psicologia transpessoal”, e autorizo a

divulgação das informações por mim fornecidas em congressos e/ou publicações científicas

desde que nenhum dado possa me identificar.

Natal,

Assinatura do participante da pesquisa Impressão

datiloscópica do participante

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Declaração do pesquisador responsável

Como pesquisador responsável pelo estudo “A prática da psicoterapia infantil na

psicologia transpessoal”, declaro que assumo a inteira responsabilidade de cumprir fielmente

os procedimentos metodologicamente e direitos que foram esclarecidos e assegurados ao

participante desse estudo, assim como manter sigilo e confidencialidade sobre a identidade do

mesmo.

Declaro ainda estar ciente que na inobservância do compromisso ora assumido estarei

infringindo as normas e diretrizes propostas pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de

Saúde – CNS, que regulamenta as pesquisas envolvendo o ser humano.

Natal,

Assinatura do pesquisador responsável

Assinatura da pesquisadora responsável: ________________________________

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131

Apêndice B

TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE VOZ

Eu,

_______________________________________________________________________,

depois de entender os riscos e benefícios que a pesquisa intitulada “A prática da psicoterapia

infantil na psicologia transpessoal” poderá trazer e, entender especialmente os métodos que

serão usados para a coleta de dados, assim como, estar ciente da necessidade da gravação de

minha entrevista, AUTORIZO, por meio deste termo, os pesquisadores Ana Flávia França

Bezerra, Geórgia Sibele Nogueira da Silva e Marlos Alves Bezerra a realizar a gravação de

minha entrevista sem custos financeiros a nenhuma parte.

Esta AUTORIZAÇÃO foi concedida mediante o compromisso dos pesquisadores

acima citados em garantir-me os seguintes direitos:

1. poderei ler a transcrição de minha gravação;

2. os dados coletados serão usados exclusivamente para gerar informações para a

pesquisa aqui relatada e outras publicações dela decorrentes, quais sejam: revistas científicas,

congressos e jornais;

3. minha identificação não será revelada em nenhuma das vias de publicação das

informações geradas;

4. qualquer outra forma de utilização dessas informações somente poderá ser feita

mediante minha autorização;

5. os dados coletados serão guardados por 5 anos, sob a responsabilidade do(a)

pesquisador(a) coordenador(a) da pesquisa Ana Flávia França Bezerra, e após esse período,

serão destruídos e,

6. serei livre para interromper minha participação na pesquisa a qualquer momento e/ou

solicitar a posse da gravação e transcrição de minha entrevista.

Natal,

Assinatura do participante da pesquisa

Assinatura e carimbo do pesquisador responsável

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Apêndice C

1. Ficha de Identificação do(a) colaborador(a)

Dados Pessoais

Nome:

Sexo:

Idade:

Tempo de atuação na clínica psicológica:

Tempo de atuação no atendimento infantil:

Início da entrevista narrativa

A pergunta norteadora da entrevista:

“Me fale um pouco de como foi seu percurso até chegar à Psicologia Transpessoal”

Perguntas norteadoras para a realização da entrevista:

1. Como você chegou a Psicologia Transpessoal?

2. O que você entende por Psicologia Transpessoal?

3. Qual seu percurso de formação?

4. Quais considerações acerca do desenvolvimento você acredita ser importante para o

atendimento infantil?

5. Qual bibliografia você utiliza como aporte teórico da clínica infantil transpessoal?

Existe alguma que você considera essencial para essa prática? Quais conceitos? Como

você utiliza isso na clínica infantil?

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6. Quais conceitos da psicologia transpessoal você mais percebe durante sua prática na

clínica infantil?

7. Você considera que existe alguma diferença entra a clínica infantil na perspectiva

transpessoal e a clínica infantil em outras abordagens da psicologia?

8. Dentro da transpessoal existe algo específico da teoria para criança?