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Projeto “Cinema, negritude e infâncias: ver, experimentar, aprender e reconhecer
a cultura africana e afrobrasileira como ensino fundamental”1.
Rosilene da Conceição Cordeiro 2
PPGCLC/UNAMA
Viviane do Socorro da Silva Mota 3
SEMEC-Belém/PA
Resumo
O trabalho apresenta ações desenvolvidas no projeto artístico-pedagógico, de natureza
interdisciplinar, tendo por público-alvo crianças do 3º ano do Ensino Fundamental,
envolvendo diálogos entre Arte (cinema, teatro e artes visuais), Literatura e
Letramento, em andamento na EMEF Maria Madalena Corrêa Raad, no Distrito de
Icoaraci- Belém/Pará, no ano de 2016. Tem por critério primeiro pontuar a diversidade
presente no universo amazônico nortista que nos representa desde a nossa origem,
surgindo no sentido de fortalecer as identidades presentes nas infâncias da nossa região,
infâncias essas frequentadoras de escolas. O enfoque na diversidade sociocultural se dá
em face do desconhecimento dessas matrizes étnico-raciais, por grande parte da
população negra e afrodescendente, aprofundado por práticas de discriminação e
racismo, o que vem criando e acentuando diferenças geradoras de profundas
desigualdades sociais não mais admitidas em contexto sociocultural contemporâneo.
Vinte e seis crianças em contextos de pobreza e outras inúmeras vulnerabilidades
sociais derivadas tem na participação desse projeto a oportunidade de se verem e
reconhecerem como crianças de direitos, sujeitos criativos, solidários e colaborativos
tendo em vista o reconhecimento de suas matrizes étnicas nele contempladas por meio
da arte. E o cinema mediando esse novo olhar sobre si, sobre e com outro.
Palavras-chave: Infância afrobrasileira – educação escolar - cinema
1 “Trabalho apresentado no II Encontro de Antropologia Visual da América Amazônica,
realizado entre os dias 25 e 27 de outubro de 2016, Belém/PA”. 2 Mestranda no Programa de Pós-graduação em Comunicação, Linguagens e Cultura.
Especialista em estudos contemporâneos do corpo (ICA/UFPA). Professora na SEMEC-
Belém/PA. e especialista educacional na SEDUC-PA. Arte educadora e atriz com pesquisa no
âmbito de corpo e performances contemporâneas nas religiões de matriz afroindígena na
Amazônia.
3 Professora regente de Educação Geral na SEMEC–Belém/PA, docente da turma de 3º ANO do
ensino fundamental na qual se desenvolve o projeto no ano de 2016.
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1. Uma educação singular, para Infâncias plurais: algumas palavras a guisa de
uma abertura não explicativa
Assim como precisamos elevar o termo Amazônia ao plural, dado seu diâmetro
territorial, sua polivalência cultural e o alcance de seus inúmeros rincões ainda não
explorados e catalogados entre sujeitos, espaços e relações díspares; do mesmo modo se
torna totalmente incorreto resumir as infâncias desse país-continente, distintas e
múltiplas, distribuídas nesse imenso território sócio-geográfico, cultural e linguístico ao
termo de unidade. Criança brasileira é uma expressão muito grande ao mesmo tempo
que vaga demais não contemplando nossas infâncias em suas particularidades,
carências, desejos e belezuras.
Alunos do 3º Ano do EF da EMEF Madalena Raad em visitação à exposição Nós
de Aruanda – Artistas de Terreiro 2016. (Fotografia: Rosilene Cordeiro)
Então porque aceitar uma escola para todos que não acolhe a esse “todo” em
suas necessidades e particularidades? Como ser criança singular, com crianças plurais
numa escola com um currículo concentrado na unidade, eucêntrico, fabricante de
infâncias baseado em matrizes distorcidas do seu original? A criança negra e
afrodescendente tem lugar garantido nessa escola “para todos”? Que qualidade é essa a
qual nos referimos e em que proporção ela as atinge?
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De acordo com Lima (2006) o sentimento de infância, a ideia que se tem dela, as
representações de infância, todos esses fenômenos psicossociais surgiram na civilização
muito vagarosamente e ligado a diferentes motivos, em diferentes épocas e contextos
históricos definidos. Essa visão sobre a infância, como um período específico pelo qual
todos passam é uma construção definida na atualidade no entanto a questão de que
todos os indivíduos nascem e serão crianças até um determinado período, independente
da condição vivida, é inegável.
Daí a necessidade de compreendermos esse momento primoroso da existência
humana como algo que precisa ser usufruído da melhor maneira e potencializado para
uma aprendizagem significativa voltada para o reconhecimento de si, do outro, da
valorização da vida, dos valores éticos e morais para as relações afetivas na sua forma
mais humana e colaborativa possível.
Mas como as crianças falam de si? Como se veem?Como sentem e falam do
ambiente onde ? E como vivem esses ambientes? Qual a relação que tem e como
entendem essa relação com os adultos com que se relacionam? Como aprendem? Pelo
que tem interesse? Qual sua visão de escola? O que as crianças têm a nos ensinar? Essas
aão algumas das inúmeras questões que apresentam respostas parciais nos diferentes
tempos, espaços e contextos pesquisados, tendo em vista o universo múltiplo e
surpreendentemente ímpar que cada criança traz consigo à escola.
Um olha sobre essas diferenças é imprescindível em se tratando da educação de
crianças, e passar por cima dessa rica diversidade é algo letal, tanto a imagem pessoal
que essa criança desenvolve sobre si ao longo do seu desenvolvimento, como nega a
pluralidade existente, retendo a possibilidade de enxergar o outro como ele realmente é.
Com base no primeiro caderno de textos, Saberes e fazeres do Programa a Cor
da Cultura4 - Modos de Ver viver , em sociedade implica a necessidade de uma postura
nova em relação às diferenças existentes “Mas e quando as diferenças não são
perceptíveis? [...] o que ocorre quando, em vez de reconhecê-las (e valorizá-las),
4 A Cor da Cultura é um projeto educativo de valorização da cultura afro-brasileira, fruto de uma
parceria entre o Canal Futura, a Petrobras, o Cidan - Centro de Informação e Documentação do Artista
Negro, o MEC, a Fundação Palmares, a TV Globo e a Seppir - Secretaria de políticas de promoção da
igualdade racial. Disponível em www.acordacultura.org.br/
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Contação da história da África contida livro de pano. Galeria Theodoro Braga,
abril 2016. (Fotografia Rosilene cordeiro)
passamos ao largo e assumimos o posicionamento de quem prefere fingir que elas não
existem?”(p.11) e ainda,
Não deixar que as diferenças se revelem é negar uma possibilidade
essencial para a transformação da sociedade, pois a partir dessa
percepção, reformulamos nosso modo de ver as coisas do mundo e,
por consequência, o próprio mundo. (p. 11)
As crianças entendidas por essa diversidade absorvem o mundo, associam
palavras, gestos e comportamentos; ouvem, falam, tocam, interpretam os fatos, as
pessoas e os acontecimentos conforme sua peculiaridade infantil e daí vai aprendendo:
relacionando-se com esses conhecimentos e saberes trocados, apreendidos de tal modo,
assimilados de tal forma por fazerem parte de seu cotidiano imediato, mediado pelas
linguagens e comportamentos dos adultos de sua época. As crianças aprendem pelos
sentidos.
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Ao imaginarmos a criança na Amazônia imediatamente somos levados à
necessidade de entendê-las em relação ao conjunto de fatores que interferem e
interagem em suas aprendizagens ligados ao universo dessas relações que as crianças
mantém entre si, com os adultos que as cercam nesse conglomerado de fenômenos
naturais, emocionais, afetivos, religiosos. Políticos, culturais que ocorrem em suas
práticas sociáveis e educativas, formais e cotidianas.
Nessa visão de uma criança contextualizada, situada numa sociedade, num
espaço e num tempo específico, sem perder de vista a relação com a história geral sobre
o desenvolvimento biocognitivo e sociocultural; dessa infância em relação, em que ela
se situa como sujeito de direitos, temos um universo multifacetado de saberes por
descobrir, de conhecimentos ainda por desvendar, sistematizar teoricamente.
Conceber uma escola de caráter universalista, longe de considerar tais diferenças
socioculturais inviabiliza qualquer projeto voltado à implementação do sentimento de
diversidade que deve animar nossa convivência social. E disto tem se ocupado a
educação brasileira neste último século em que tem procurado conhecer e reconhecer as
faces desses pequenos que formam o corpo discente representante salutar da escola
pública brasileira, sobretudo nessa miscelânea que é a Amazônia. Esse grupo de
crianças da primeira etapa do ensino fundamental brasileiro que precisa ser visto como
realmente se apresentam sem estereótipos degradantes que nada acrescentam aos
princípios de uma educação voltada à cidadania e a inclusão social de todas elas.
Conceitos como beleza, mal, bom, rico, pobre, sujo, bonito, feio são
construídos desde o início do aprendizado escolar, geralmente, de
acordo com os ensinamentos repassados. Nesse aspecto, compete ao
professor compreender o sentido didático da realização de
determinadas atividades educativas envolvendo, em larga escala,
todos os educandos no processo de formação de valores de sua
identidade étnica. (FEITOSA, 2015, p .29)
Qualquer desejo de trabalhar nessa direção precisa contemplar, antes, a
identificação de quem estamos falando e como estamos nos referindo a esses sujeitos
sociais, atores em desenvolvimento
2. Quem são elas, as nossas crianças do 3º Ano da EMEF Madalena Raad,
protagonistas em ação?
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O trabalho aqui exposto privilegiou a socialização das ações deste projeto
artístico-pedagógico, de natureza interdisciplinar, desenvolvido na Escola Municipal de
Ensino Fundamental Maria Madalena Corrêa Raad, tendo por público-alvo crianças do
3º ano do Ensino Fundamental, ao todo 26 crianças, em sua maioria moradoras do
Bairro do Paracuri I e II, uma área periférica do Distrito de Icoaraci, no município de
Belém onde a escola pública municipal está situada há 24 anos.
Envolveu uma metodologia baseada em atividades lúdicas entre projeções de
filmes, rodas de conversa, rodas de leitura, atividades plásticas de desenho, pintura,
recorte, colagem para composição de um portfólio individual por aluno/a ao longo do
projeto. Somamos a essas atividades momentos de sensibilização sonora por meio de
músicas do universo afro e afins, jogos teatrais, exploração do universo sonoro com
objetos cotidianos e instrumentais da cultura africana e afrobrasileira e uma visita
monitorada a uma galeria de arte onde os alunos entraram em contato com as obras de
artistas negros e afrodescendentes, entre eles babalorixás e ialorixás (lideranças
religiosas do Candomblé afetivamente chamados pais e mães, ou zeladores de santo).
Tal circuito artístico foi proporcionado para que as crianças entrassem em
contato com o universo da cultura da África e de suas influências socioculturais na
formação e ainda presentes na tradição da sociedade brasileiras, para então começarem
a construir um olhar sobre tais conteúdos e temas abordados no seu universo particular:
família, escola.
Ao término os alunos serão motivados a escolherem temas trabalhados ao
longo do projeto e, igualmente, partindo de um dos filmes assistidos do acervo
videográfico proposto (também escolhido por eles) produzirmos um reconto de história
que seria organizado na forma de roteiro cinematográfico para ser filmado tendo neles,
as crianças participantes do projeto, o elenco em questão. O filme criado pela turma
depois de filmado deverá ser exibido à comunidade escolar no mês de novembro, por
ocasião da Semana de Consciência Negra (comemoração presente oficialmente no
calendário escolar ). No mesmo momento apresentaremos um varal com fotos e a
exposição dos portfólios individuais para apreciação de todos: comunidade escolar, os
seus familiares e convidados presentes ao evento.
Nosso objetivo com tal trajeto é compreender como a criança se vê dentro
desse contexto, tentando identificar sua experiência anterior ao projeto e se essas
identificações sofreram algum tipo de alteração no decorrer dele. Procurando identificar
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como a arte contribuiu para essas alterações. Tal observação se daria, tanto pela
educadora geral que estaria em contato diário com eles observando as possíveis
modificações no vocabulário, os discursos, as práticas de brincadeiras e convivência
diárias entre elas, como pela arte educadora nas diferentes atividades distribuídas nas
etapas formativas pensadas para esse fim.
A relação interdisciplinar envolveu diálogos entre os campos da Arte (cinema,
teatro e artes visuais), Literatura e Letramento, tendo por critério importante estabelecer
aproximações entre esses campos de conhecimento, compreendendo a arte como
altamente interativa e potencialmente mediadora de múltiplas aprendizagens no âmbito
da educação de crianças numa perspectiva para a diversidade.
Identificar a diversidade presente na vida dessas crianças que vivem na
Amazônia, sendo impactadas por este contexto educativo que nos representa desde a
nossa origem, procurando destacá-lo no sentido de fortalecer as identidades presentes
nas infâncias de nossa região. O enfoque na diversidade cultural se deu em face de
desconhecimento dessas matrizes étnico-raciais, por grande parte da população,
aprofundado por práticas de discriminação e racismo o que vem criando e acentuando
diferenças grotescas, geradoras de desigualdades sociais não mais admitidas em
contexto sociocultural contemporâneo.
Vinte e seis crianças em contextos de pobreza e outras inúmeras
vulnerabilidades sociais derivadas tem, por ocasião da participação nesse projeto, a
oportunidade de se reconhecerem como crianças de direitos, bonitas, inteligentes,
sujeitos criativos, solidários e colaborativos tendo em vista o reconhecimento de sua
matrizes étnicas nele contempladas e valorizadas.
Um momento expressivo por oportunizar a legitimação de ações que visem
atender as orientações didático-pedagógicas contidas na LDB Nº 9394/96, que prevê
um currículo que atenda a variedade cultural brasileira o que valida o surgimento e
consolidação dos dispositivos da Lei Nº 10.639/03, alterada pela Lei nº 11.645/2008 a
qual estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e cultura afro-brasileira
e indígena”. Orientações legais que precisam ser implementadas e monitoradas para que
sejam garantidas pelas instituições de ensino, o que implica a necessidade de abordar a
temática em questão no ensino de todas as disciplinas do currículo da educação básica
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brasileira, incluindo o ensino fundamental e médio nas escolas públicas e particulares
em todo o território nacional.
3. Conhecer, para reconhecer e reconhecer-se: a África está no meio de nós
Alunos acompanhando o vídeo “Menina do cabelo crespo”. Galeria
Theodoro Braga. Abril 2016 (Fotografia: Rosilene Cordeiro)
Como educadoras de crianças há duas décadas, sempre foi nosso desejo
trabalhar com o ensino da cultura africana e afrobrasileira na escola. Sonho antigo, do
qual derivam alguns tímidos projetos que visam dar visibilidade à Lei 10.639/03 na
educação escolar das crianças com que atuamos no ensino fundamental menor nos
últimos três anos na Secretaria de Educação do Município de Belém.
Uma vez que a secretaria não dispõe, em seu currículo formal de um programa
direcionado, nem de orientações mais sistematizada que viabilizem, via rede
municipal, a implementação e acompanhamento de tais projetos e, por entendermos que
a semana de consciência negra, amplamente comemorada no mês de novembro nas
escolas em todo território nacional, só tem sentido se for resultante de um grandiosos
empreendimento formativo desenvolvido no decorrer de todo ano letivo; desde o ano de
2014, propusemos à EMEF Maria Madalena Corrêa Raad, situada no bairro da Agulha
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em Icoaraci- Belém/PA, o projeto de intervenção artístico-cultural intitulado, naquele
ano, “Mama África, a nossa mãe!” no qual objetivávamos desenvolver ações
pedagógicas em total interação com as temáticas concernentes a apresentação de
atividades que dessem visibilidade a essas práticas orientadas pelos dispositivos legais
em questão5.
Assim, o presente projeto de intervenção “Cinema e negritude na infância: ver,
sentir, experimentar, aprender e viver cultura africana e afrobrasileira na escola com
crianças do 3º Ano do Ensino Fundamental”, nasce e continuidade a esse desejo, com
vistas a oportunizar a legitimação de ações que atendam as orientações didático-
pedagógicas contidas na LDB Nº 9394/96, propondo um currículo atravessado pela
temática afrobrasileira e africana em sete meses de trabalho efetivo ( o trabalho foi
desenvolvido nos meses de abril a novembro de 2016, exceto no mês de julho, as férias
escolares). As ações implementadas buscaram atender a variedade cultural brasileira o
que valida o surgimento e consolidação dos dispositivos legais os quais determinam a
obrigatoriedade da temática “história e cultura afrobrasileira” no currículo oficial da
rede de ensino fundamental e médio, nas escolas públicas e particulares em todo o
território brasileiro6.
E aqui destacamos, que não estamos a falar apenas de obrigatoriedade como um
legado, mas sobretudo da reparação de direitos subtraídos, da dignidade devida às
populações negras e seus descendentes desatendidas em direitos por mais de cinco
séculos. Nos referimos à reparação, compensação esta que deve dar conta que as
crianças tenham acesso, imediato e pleno às histórias dos povos africanos e suas
descendências , total e livre acesso a seus acúmulos culturais. Que tenham a
5 O projeto desenvolvido pela professora Rosilene Cordeiro (regent de uma turma de 5º Ano, no
ano de 2014) foi objeto de estudo de um Trabalho de Conclusão de Curso da Universidade do
Estado do Pará (UEPA) de autoria de Dayse Michelle Feitosa, que se propôs investigar causas
do preconceito racial em relação à cultura afro, existente na sociedade brasileira desde os
primórdios da colonização. Objetivou explicar de que forma o racismo é abordado nas práticas
educativas de uma turma do 5° ano/9 de uma escola pública à luz da Lei n° 10.639, de 9 de
janeiro de 2003, que tornou obrigatória a inclusão da temática história e cultura afro-brasileira
no currículo oficial da rede de ensino.
6Leia-se mais especificamente na Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional, Lei Nº
9394/96, MEC, 1996.
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oportunidade de se enxergarem crianças exatamente como são: negras,
afrodescendentes, afroindígenas, como sujeitos individuais, diferentes uns dos outros,
como crianças de valores, alegres, que vivem a sua vida de forma espontânea e feliz por
serem exatamente como são; e que possuem direitos sociais, garantias legais e devem
ter acessos iguais na forma de viverem, aprenderem, ensinarem, expressarem e
manifestarem a sua infância de acordo com sua cultura, com as expressões e identidades
de sua comunidade, de viverem seus cultos e afetos, de diferentes formas e em
diferentes contextos, sem terem que sofrer por isso; sem que isso represente um
confronto direto com outras formas de vida, sentimentos, pensamentos divergentes ou
práticas destoantes. E que a intolerância nesses casos seja combatida com veemência e
sem tréguas
São bem vindas, nesses casos, todas as condutas e práticas que sinalizem a
existência e a valorização dessa variedade tão benéfica à sociocultural étnica brasileira.
A aceitação e consolidação do diverso, do múltiplo e do plural pelo qual devemos ser
apresentados, identificados e reconhecidos no mundo inteiro, a começar pelas nossas
comunidades imediatas: família, escola, vizinhança...onde quer que estejamos. E sobre
isso a Lei brasileira tratou de demarcar condignamente a escola como agência
fundamental responsável por tal formação de forma sistêmica:
Art. 26-A .Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio,
oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e
Cultura Afro-Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo
incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos
negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da
sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas
social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira
serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial
nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
[...]
Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como
‗Dia Nacional da Consciência Negra‘(BRASIL, 2003, Seção 1, p. 1).
Este foi, portanto, um projeto pensado para que os alunos tivessem acesso a
encontros mediados pela arte fílmica em relação com as demais linguagens previstas no
processo, oportunizando e fortalecendo a visibilidade da identificação e do
reconhecimento das crianças participantes do mesmo de forma a valorizá-las, gerando a
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relação de pertencimento necessária para que a interação sociocultural se efetive na
escola de forma igualitária e para todos, indistintamente.
A ideia de trabalhar com filmes que abordassem questões de organização social,
costumes, gêneros, linguagens, expressões artísticas e religiosas, cultura, trabalho,
produção econômica, entre outras, pensados para o atendimento da faixa etária entre 8 e
9 anos, não foi despretenciosa. Esse grupo de crianças foi escolhido por se
concentrarem num momento formativo bastante expressivo e específico de sua
formação escolar, pois além de se encontram numa turma que está no 3º Ano do EF,
finalizante do período de alfabetização, processo de aquisição da linguagem oral e
escrita escolar, ou seja um processo formal, institucionalizado - o processo de
alfabetização previsto pela atual LDB 9394/96 se dá em três anos e, portanto, fechando
o Ciclo I dos ciclos de aprendizagens escolar , na perspectiva como hoje as turmas são
teoricamente pensadas e organizadas segundo as Diretrizes Curriculares do Ensino
Fundamental na SEMEC Belém-PA.
A SEMEC-Belém dispõe de um documento regido para o atendimento das
necessidades específicas dessa etapa de formação e no qual lemos que “a criança e seu
ambiente (ambos estruturalmente organizados) não são nem estáticos, nem imutáveis,
mas estão em permanente transformação, tanto microgeneticamente, quanto
ontogeneticamente”. (SEMEC. DCE Ciclos I e II, 2012)
Desse modo, o desenvolvimento da criança é definido no contexto de suas
relações com o ambiente cultural e fisicamente estruturado em que suas ações sobre o
ambiente são conduzidas pelo outro”. ( DCE Ciclos I e II, Rede Municipal de
Educação de Belém, 2012); e ainda “[...] esta compreensão do Desenvolvimento
Humano enfatiza que a educação se faz na articulação de uma multiplicidade de
processos formadores dentro e fora da escola, internos e externos ao indivíduo, através
dos quais, nós nos constituímos, socializamos, aprendemos; tornamo-nos sociais,
culturais e humanos.” Um projeto que vem ao encontro de contribuir com a formação
integral em Ciclos de Formação sendo esta a orientação dos dispositivos legais que
traçam e delineiam a formação e aplicação dos currículos da educação básica em todo
território nacional. A formação em Ciclos, assim
são pensados como uma forma de organizar os processos educativos,
considerando as temporalidades do Desenvolvimento Humano com
suas especificidades e exigências. Seu eixo estruturante são as idades
da vida, a formação humana em seus tempos-ciclos da infância, da
adolescência, da juventude e da idade adulta. Os Ciclos de Formação
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não podem, portanto, ser visualizados no intuito de acabar com a
retenção, acelerar o fluxo, ou acabar com a defasagem idade-série em
nome do respeito à diversidade de ritmos de aprendizagem, com
processos mais leves de avaliação contínua, ao longo do ciclo”
(adaptado de ARROYO, 1999, p. 10)
E considerando a importância da mediação docente na aquisição do aluno nesta
fase do desenvolvimento de sua intelectualidade, refletimos com Vygotsky (1987)7,
importante estudioso do desenvolvimento intelectual infantil, o qual discorre sobre
diferentes áreas de um campo (zona) que canalizam o desenvolvimento de um
organismo. Para o estudioso, estabelece-se, assim, três tipos de zonas. A zona de
movimento livre (ZML), a zona das ações promovidas (ZAP) e a zona de
desenvolvimento proximal (ZDP). A zona de ação promovida (ZAP) é caracterizada
pela promoção de aquisições de novas habilidades, ou seja, envolve um conjunto de
atividades, objetos ou áreas do ambiente onde as ações da criança são promovidas, e que
os outros devem se envolver, direcionando a criança para aqueles objetos ou atividades
que consideram fundamentais para o seu desenvolvimento. Ela é, assim, uma zona
inclusiva, marcada pelo esforço dirigido das pessoas em torno da criança para orientar
suas ações numa direção.
E como nossa atuação se dá no campo específico dessa zona em que ocorrem os
estímulos à aprendizagens que os alunos vão assimilando no decorrer de seu processo
formativo escolar é que entendemos o papel da arte como fundamental e intransferível,
daí o fato da ludicidade permear todas as ações pretendidas. Portanto
[...] é na escola, mas não só nela, que “se pode ajudar a desconstruir
mentalidades, posturas e comportamentos que atingem a alteridade
com preconceito e discriminação”. Pode-se acrescentar que é na
escola, mas não só nela, que se pode ajudar a formar crianças e jovens
cuja autoestima lhes propicie o respeito por si próprios e pelos outros
com os quais se relacionam, condição necessária para o cumprimento
de seus deveres e para a luta por seus direitos como cidadãos de nosso
país e do mundo contemporâneo. (CURY, 2005, p. 30)
4. Sobre o Cinema e a Educação: crianças, encontros e encantos possíveis e
desejáveis
7 VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
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Quando os irmãos Lumière, inventores do cinematógrafo, projetaram “L’Arrivée
d’un Train à La Ciotat” para uma plateia de trinta e três pessoas pasmas, no “Grand
Café”, em Paris (segundo sites de pesquisa, a primeira exibição pública de cinema que
ocorreu em 28 de dezembro de 1895), nem se imaginava que o cinema pudesse, em
pleno século XXI, ter encontrado um tempo promissor de avanço tecnológico e profusa
adesão popular. Provavelmente não tivessem consciência, ainda, de que estavam
criando um meio de expressão tão importante e posteriormente tão bem aceito nas
sociedades contemporâneas. Chegaram a dizer que sua invenção não tinha o menor
futuro como espetáculo, porém, ainda no fim do século XIX, Georges Méliès, um
ilusionista francês, percebeu que ele poderia ser um veículo capaz de tornar real a
imaginação8.
Criar o cinema permitiu vê-lo atravessar diversas transformações técnicas,
estéticas, ideológicas, formais, estilísticas, relacionais e de conteúdo, para citar apenas
algumas das inúmeras mudanças sofridas. A cada uma destas mutações correspondeu
não apenas uma forma de se fazer, como também diferentes formas de se pensar o
cinema, de localizá-lo nos tempos, espaços e diferentes contextos socioculturais no qual
ele se apresenta. Contribuiu, sobretudo, na relação de usos que podemos fazer dele, das
experimentações e apropriações de tal recurso como metodologia didática à disposição
do ensino e a serviço das aprendizagens desejadas nos muitos temas que o circundam.
Mas, por certo, o que é importante refletir aqui é o fato de que ao falarmos a
palavra cinema, podemos estar nos referindo tanto ao filme propriamente dito, quanto a
uma indústria, ou mesmo a um lugar de encontro físico e social. E que ao falarmos de
cinema voltado as infâncias, mais surpresos ficaremos, se considerarmos que nessa fase
de desenvolvimento este opera bastante favorável quanto a interação que promove,
reduzindo barreiras, como valiosa linguagem artística que é e pode vir a ser.
Infelizmente as práticas pedagógicas escolares ainda não identificaram a
potência dessa mídia, no entanto alguns programas e projetos específicos nas áreas de
conhecimento tem lançado mão da extraordinária capacidade do cinema envolver
8 Disponível em http://lounge.obviousmag.org/bibliotela/2014/03/ha-119-anos-os-irmaos-lumiere-
exibiram-o-primeiro-filme-ao-grande-publico-dando-inicio-a-magia-do-ci.html, acessado em 10/10/16
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crianças, adolescentes, jovens e adultos com tanta força ao ponto de gerar uma
interação que pode (e deve) ser revertida em aprendizagens de vida e para a melhoria de
vida de tais populações..
No projeto em questão o cinema aqui é proposto como mediação pedagógica.
Entre ver, comentar, reescrever uma história que se viu ou ouviu em cinema, para a
criança tem um valor indescritível. Posto que este se encontra no campo da visualidade,
das imagens em movimento, a celebração da alegria, do reconhecimento de si nos
personagens e enredos; musicas são incorporadas ao acervo sonoro das crianças, outras
imagens e ramificações surgem dando lugar a uma criatividade pulsante que não ‘pára
quieta’.
5. Ver, ouvir, tocar, sentir e fazer: os caminhos metodológicos do projeto
Todo objetivo pretendido precisa ser comungado com um “jeito de fazer”, a
forma que irá propiciar todo sentido em se tratando do encaminhamento das ações
previstas. Deste modo, procuramos desenvolver atividades simples, curtas, prazerosas e
com alto teor de interatividade possível a fim de envolver os alunos de forma efetiva no
mesmo gerando apropriação e autonomia dos mesmos sem quaisquer constrangimento
( aquele sentimento do “ nosso projeto” , pensado e operado por nós coletivamente).
Sempre depois de uma sessão de filme mensal, seguia-se duas atividades no mesmo dia
e as outras eram distribuídas nas aulas com a professora de educação geral, seguindo o
rol de atividades propostas no projeto.
Tão logo, distribuímos o trabalho que constou, previamente, de seleção dos
livros paradidáticos junto a biblioteca da escola9, uma biblioteca ampliada para outros
tipos de leitura...a leitura de mundo pelo mundo de recursos metodológicos
apresentados procedemos a multiutilização do espaço. Era muito importante ver aquele
espaço de biblioteca virando sala de leitura, roda de música, sala de corpo; um espaço
em movimento comungado. E daí os relatos que seguem vindos pela voz da professora
Viviane Mota, regente da turma, não poderiam ser outros.
9 A presença do espaço biblioteca foi fundamental para o desenvolvimento das sessões fílmicas já que a
escola não dispõe de um espaço mais apropriado. Incluímos as atividades do projeto à programação anual
da biblioteca da escola junto ao SISMUB, tendo na professora responsável pelo turno da manhã, Priscila
de Oliveira Ramos uma parceria especial cuidando para que juntos tivéssemos o êxito desejado.
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E vem do filósofo Rubem Alves, por meio da educadora, o pensamento que
nos ajuda a cavalgar algumas reflexões, todas elas salutares porque nos ajudam a
redefinir ações, rever condutas e buscar com mais clareza a voz de nossos pequenos-
grandes protagonistas:
Se fosse ensinar a uma criança a beleza da música não começaria com
partituras, notas e pautas. Ouviríamos juntos as melodias mais
gostosas e lhe contaria sobre os instrumentos que fazem a música. Aí,
encantada com a beleza da música, ela mesma me pediria que lhe
ensinasse o mistério daquelas bolinhas pretas escritas sobre cinco
linhas. Porque as bolinhas pretas e as cinco linhas são apenas
ferramentas para a produção da beleza musical. A experiência da
beleza tem de vir antes. (Rubem Alves.
http://cantandoarte.blogspot.com )
Segundo Feitosa (2015) é interessante destacar a preocupação de haver um dia
especial dedicado à discussão da consciência negra como forma de chamar a atenção à
história e cultura negra, relegadas e discriminadas, muitas e sucessivas vezes, pela própria
escola. No entanto, segundo a autora, deve ser ressaltado como fato lamentável quando um
professor não trabalha a temática, ou, apenas a trabalha por obrigação para preencher o
diário e o tempo, pois, infelizmente, ainda é muito comum atitudes pedagógicas que
abordem as questões raciais apenas nos dias comemorativos, ou quando em sala de aula, há
muitos casos de preconceito de cor entre alunos ( p. 27). Daí a necessidade de apresentar ás
nossas crianças a importância de suas presenças nessa diversidade hoje compreendida como
fundamental ao entendimento do Brasil como um país carregado de belezas étnico-raciais
que precisar ser conhecidas e admiradas sem ressalva, todos os dias, em todos os
territórios..
É exatamente dessa forma que o Projeto Cinema, negritude e infâncias: ver,
experimentar, aprender e reconhecer a cultura africana e afrobrasileira como ensino
fundamental entrou na rotina de minha sala de aula, pois a cada sessão de vídeo, a cada
instrumento ou objeto introduzido nas vivências, via as crianças e a mim mesma
mudando o modo de nos perceber e perceber os outros. Fato esse exemplificado na fala
da aluna Bianca Dalva:
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“Professora, antes eu não gostava do meu cabelo, era feio! Agora eu
sei que é bonito!”
Assim, fica claro que o projeto contribuiu muito com meu trabalho cotidiano de
professora regente na turma de 3º Ano, neste ano de 2016, pois a aceitação dos alunos
de si e dos outros deu um “UP” na sua autoestima, o que consequentemente levou os
alunos a sentirem-se mais confiantes e capazes de aprender. Respeitando as diferenças
dos outros e de si, percebendo a beleza como característica mais profunda e não só algo
superficial. Isso ficou claro na fala da aluna Giselly Leão, ao se expressar com muita
segurança:
“bonito é ser educado, respeitar as pessoas e ter caráter.”
A conclusão a que chego, é que o trabalho pautado no planejamento diário,
aliado ao projeto interdisciplinar tem criado uma atmosfera de grande aprendizado em
via de mão dupla, ou seja, tanto ensino como tenho aprendido muito.
Outro ponto muito significativo e positivo foi a utilização de ambiente
extraclasse, possibilitando ao aluno uma vivência única, em espaços com grande
potencial de aprendizado, onde os alunos puderam ver e sentir nossas manifestações
culturais de uma forma pouco exploradas na escola.
O projeto valoriza de forma simples e bonita nossa cultura afro-brasileira,
oferecendo base ao meu trabalho no trato dos temas relacionados a cultura afro, visto
que a escola, em sua essência, mostra-se recheada de pré-conceitos e pré-modelos
difíceis de ser eliminados, mesmo quando se trata de professores. O trabalho ajudou-me
a conhecer melhor o assunto e sabê-lo tratar de forma mais simplificada e livre das
amarras do preconceito, que infelizmente quer queiramos ou não, acabamos
protagonizando de forma consciente ou não, seja pelo medo ou receio de tratar o
assunto, seja pela falta de conhecimento do mesmo.
Reavivar a linguagem e a História, contra o esquecimento e o
obscurecimento de segmentos sociais desfavorecidos ou minoritários
(como as crianças, por exemplo) implica em que o passado e o
presente sejam considerados numa perspectiva crítica, tendo em vista
reconstruir o futuro. Esta perspectiva se concretiza em práticas que se
comprometem com a transmissão e produção do conhecimento e da
cultura e com a cidadania. (Subsídios para Diretrizes Curriculares Nacionais Específicas da Educação Básica. MEC. 2009, p. 35)
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Sabemos dos desafios que nos cercam, sobretudo por conta dessa sensação de que
ainda estamos no começo de tudo, por conta das resistências pessoais de grupos sociais
discriminatórios, políticas publicas de educação que não foram estabelecidas, nem leis que tem
seu cumprimento efetivado. Mas diante nós compreendemos a oportunidade de desenvolver
esse outro olhar, novas reflexões e posturas ante esse cenário excludente no qual a maioria de
nossas crianças estão submersas, tendo em vista que para usufruirmos de um novo contexto
social mais inclusivo para nossos alunos precisamos, antes, compreender que
Em primeiro lugar, é fundamental formar-se, atualizar-se nos temas e
não partir do pouco que se sabe para ocupar um lugar que nunca
esteve ocupado. Temos a responsabilidade de tratar com muito
profissionalismo esses conteúdos. Devemos estudar, procurar leituras
específicas e, sempre que possível, capacitar-nos em cursos e em
discussões acadêmicas. Nossas precárias condições de trabalho e de
vida não podem justificar uma ausência de esforço nesse sentido-
estamos falando da reescrita de uma história que nos foi negada,
estamos lidando com a base de uma identidade que está para ser
reconstruída. O que está em jogo é mais do que a nossa competência –
é o nosso compromisso. (Projeto a Cor da Cultura. Modos de Ver. v 1.
2006. p. 46-47)
6. O olhar docente sobre a mediação pedagógica: implicações e reflexões
A diferença nos marca desde nossa origem como populações brasileiras: povos
nativos que habitavam o Brasil há milhares de anos foram surpreendidos pela chagada
de brancos europeus que trouxeram na “bagagem” povos negros escravizados, trazidos
com eles como mercadoria barata e meramente produtiva e, tão logo sugada e usurpada,
descartável. Uma diferença étnica expressiva e latente que teria tudo para ser rica e
salutar, não fosse a forma como se deu esse contato triste e vergonhoso que marca
negativamente a nossa cultura ancestre. O fato é que essa história produziu um fosso de
miséria e exclusão em 516 anos de proliferação do ocultamento das reias condições em
que esses entes passados foram massacrados e os danos sociais profundos e irreversíveis
que as populações negras e afrodescendentes herdaram de tal chacina ética, moral e
memória das inúmeras culturas atingidas.
O fato é que, com o passar dos tempos, essa diversidade continua se
apresentando e acentuando muitas vezes de forma desigual, pois ainda há uma
prevalência cultural de predomínio branco que invalida ou inferioriza as demais
manifestações e expressões que não a referendem. E nesse interin as inúmeras
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populações entre indígenas e negras, bem como todos aqueles que deles descendem
galgam um ‘posto’ de segundo plano, postura na maioria das vezes reforçada por uma
literatura que ainda privilegia alguns tipos de saberes e conhecimentos em detrimento de
outros.
Muito ainda há que ser feito na sociedade, e a escola tem um papel marcante
nessa tarefa posto que
A escola precisa se organizar para demonstrar a todos a importância
da pluralidade racial na sociedade. Os educadores devem contemplar a
discussão da diversidade racial da sociedade; discutir os problemas
sociais e as diferentes proporções em que atigem os grupos raciais.
(Elliane Cavalleiro – Projeto A cor da Cultura – Caderno 1)
O trabalho com as crianças nos encoraja a continuar buscando alternativas.
Acompanhá-las na curiosidade, no desejo de conhecer os temas estudados, ao
arregalarem os olhos ao ver uma imagem, ao perceberem um som, ao experimentarem
pela primeira vez um espaço de galeria são indicativos de que estamos ainda
começando. Sabemos que não á uma fórmula, nem uma única forma de atingir essa
desigualdade, mas o conhecimento continua sendo a arma mais poderosa que temos e
com ela devemos nos munir contra as batalhas diárias da ignorância social, da
intolerância, da discriminação, do racismo, das correntes que nos impedem de avançar
como povos livres, criados para a liberdade e para a convivência fraterna, solidária, com
as diferenças.
Um passo decisivo nessa direção foi este trabalho que nos ajuda a identificar os
fatores, criar condições conjuntas de fortalecer a comunidade escolar a se posicionar
diante do quadro de invisibilidade das culturas afrobrasileira e africana na escola,
assumindo o seu compromisso de uma educação pública, ampla, laica, promotora da
dignidade humana e da valorização das populações a margem do currículo escolar.
Porque racismo, discriminação e intolerância étnico-racial tem personagens, endereços,
estão localizadas e nãopodem ter livre acesso ao espaço escolar por ser matéria do dia,
pauta permanente, agenda obrigatória, combatida nos lares, nas igrejas, templos e
terreiros. E não pode ser admitida nem como brincadeira, nem com a invisibilidade com
quem vem sendo tratada por séculos. E para isso a arte está no mundo: para nos ajudar a
rever nossas origens, valorizando-as e aproximando-os uns dos outros com o melhor
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que cada um tem e pode agregar nessa imensa colcha de retalhos que é a sociedade
caminhante.
Livros literários utilizados nas rodas de leitura do projeto
ABOUET, Marguerite. Aya de Yopougon. 2012
BADOE, Adwoa. Histórias de Ananse. Ilustrações Baba Wagué Diakité. - Tradução de
Marcelo Pen. São Paulo: Edições SM, 2006. – (Cantos do mundo)
CUNHA, Carolina. Mestre gato e comadre onça. Uma história de capoeira. Reconto e
ilustração Carolina Cunha. – São Paulo: Edições SM, 2011
ROSA, Sonia. Capoeira. Ilustração Rosinha Campos – 2ª Ed. –Rio de Janeiro: Platas, 2009
__________. Jongo. Ilustração Rosinha Campos – 2ª Ed. –Rio de Janeiro: Platas, 2009
__________. O tabuleiro da baiana. Ilustração Rosinha Campos – 2ª Ed. –Rio de Janeiro:
Platas, 2009
PHILIP, Neil. Volta ao mundo em 52 histórias. Ilustrações: Nilesh Mistry; Trad. Hildegard
Feist. 1998.
L’ HOMME. Erik. Contos de um reino perdido. Ilustrações François Plase. Trad. Maria Luiza
X. de A. Borges. – São Paulo: Edições SM, 2008. – (Cantos do mundo)
MARTINS, Maria Luisa Soriano. Contos árabes para jovens de todos os lugares. Ilustrações
de Marcelo Bicalho. Belo Horizonte, MG: Alis editora/ Algazarra editoprial, 2002.
CONY, Carlos Heitor. As melhores histórias das mil e uma noites. (Textos em português de
Carlos Heitor Cony) – 2. Ed. – Rio de janeiro: Edigraf Ltda. 2012.
NAVARRO, Adriana de Almeida. Valores para crianças através da literatura infantil. Vol 1
e 3.
NIVOLA, Claire A. Plantando as árvores do Quênia: a história de Wangari Maathai. Trad. Isa
Mesquita. – São Paulo: Comboio de Corda, 2010
ZIRALDO. O menino marron. 25ª Ed. – São Paulo: Melhoramentos, 1986
FERREIRA, Felipe. A escola do cachorro sambista. Texto Felipe ferreira; Ilustrações mariana
Massarani. – 1. Ed. – São Paulo: Ática, 2012.
MASSARANI, Mariana. ABC Curumim já sabe ler. (Org.) Bia Hetzel e Silvia Negreiros.2008
__________________. Salão Jaqueline. Textos e ilustrações Mariana Massarani. – Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2009
HETZEL. Beatriz Bozano. Berimbau mandou te chamar. Ilustrações Mariana Massarani. –
Rio de Janeiro: Manati, 2008
HETZEL, Bia. Bagunça no mar. Ilustrações Mariana Massarani. – Rio de janeiro: Manati,
2012
OLE Cuti. A pelada peluda no largo da bola. Ano
20
SELLIER, de Marie. A África meu pequeno Chaka. Companhia das Letrinhas, 2006
MARTÉ. Krokô e Galinhola, um conto africano. Maté textos e ilustrações. – São Paulo:
BRINQUE-BOOK, 2008.
DIELTIENS, Kristien. Meu nome é Pomme. Ilustrações Stefanie de Graef. Trad. Cristiano
Zwisele do Amaral. – São Paulo: Edições SM, 2010.
PETTY, Kate. Brincadeiras. Tradução Rodrigo Villela. – São Paulo: Comboio de Corda, 2008
LÓPEZ, Merce. O menino que comia lagartos. Ilustrações da autora; tradução Pádua
Fernandes. – São Paulo: Edições SM, 2011
COELHO, Cristina. Joãozinho e Maria. Adaptação Ronaldo Simões coelho e Cristina
Agostinho; Ilustrações Walter Lara.- Belo Horizonte: Mazza Edições, 2013
OLIVEIRA, Kissam de. Omo-oba: histórias de princesas. Ilustrado por Josias marinho. –
Belo Horizonte: Mazza edições, 2009
DALY, Niki. O que tem na panela, Jamela?. Ilustrações do autor; tradução Luciano machado.
– São Paulo: Edições SM, 2006
LIMA, Heloísa Pires. Lendas da África Moderna. Ilustrações Denise nascimento. – 1ª Ed –
São Paulo: Elementar, 2010
BARBOSA, Rogério Andrade. Pigmeus, os defensores da floresta. Ilustrações Maurício
negro. – São Paulo. – Farol Literário, 2011
ROBATTO, Sonia. A menina sem jeito. 2011
CUTÍ. A pelada peluda no largo da bola. Ilustrações de Edu Andrade. – São Paulo: Editora
do Brasil, 1988.
Referências fílmicas utilizadas nas sessões de filme no projeto
(Fundação Cultural Palmares. Projeto A Cor da Cultura. Coleção Livros Animados DVDs 1,
2, 3. )
1. Os Ibejis e o Carnaval
2. Adamastor, o pangaré.
3. Obax/ Menino de Argila.
4. Koumba e o tambor diambê
5. Amenina e o tambor
6. A lenda do Saci-pererê em cordel/ Cadarços desamarrados
7. Pode me chamar Nadí.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Sites consultados
http://fundamentoseducacaoinfantil.blogspot.com.br/p/conceito-de-infancia.html
https://cinemahistoriaeducacao.wordpress.com/cinema-e-educacao/sobre-cinema-e-
educacao/linguagem-cinematografica/
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf
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http://www.primeirofilme.com.br/site/o-livro/para-que-serve-a-linguagemdo-cinema/
Livros
ARROYO, Miguel G. Ciclos de desenvolvimento humano e formação de educadores.
In: Educação & Sociedade, Campinas, SP, v. 20, n. 68, p. 143-162, dez. 1999.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo>. Acesso em 04/11/2009
BELÉM.Pressupostos dos ciclos de formação. In: Diretrizes curriculares do ensino
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BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Subsídios para
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CAVALLEIRO. Eliane. Valores civilizatórios: dimensões históricas para uma educação
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Brasília: Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade, 2006
CURY, Carlos Roberto J. Políticas inclusivas e compensatórias na Educação Básica.
São Paulo: Cadernos de Pesquisa v. 35, n. 124, p. 11-32, 2005
FEITOSA, Dayse Michelle Pereira. A Lei nº 10.639/2003: o caso de uma turma de
Ensino Fundamental em Belém (PA). Dayse Michelle Pereira Feitosa; orientadora, Ana
D‘Arc Martins de Azevedo. — 2015. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) -
Universidade do Estado do Pará, Centro de Ciências Sociais e Educação, Departamento
de Filosofia e Ciências Sociais, Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia, Belém,
2015.
Saberes e fazeres, v. 1: Modos de Ver / Coordenação do projeto Ana Paula Brandão. –
Rio de Janeiro: Fundação Roberto marinho, 2006.
_______________, v 3: Modos de Interagir. Coordenação do projeto Ana Paula
Brandão. – Rio de Janeiro: Fundação Roberto marinho, 2006.