prova i - economia política
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Universidade Federal da BahiaFaculdade de Economia
Curso de Mestrado em Economia
Avaliação
1ª avaliação da disciplina Economia Política, ministrada pelo professor Paulo Balanco.
Aluno: Felipe Andrade Souza Campos
SalvadorJun. 2012
1. Tendo em vista as bases ontológicas do materialismo histórico, podemos afirmar que, para Marx, a elaboração da teoria econômica requer um procedimento inverso do método “atomístico” adotado pela corrente dominante da economia contemporânea. Explique.
A metodologia utilizada pelo pensamento mainstream da economia atual, concebe o
indivíduo como ponto central dos movimentos econômicos. Esse indivíduo é construído através da
imposição de alguns pressupostos que facilitariam a análise de suas ações. A partir desses
pressupostos sobre os indivíduos (agentes) foi possível o desenrolar das teorias neo-clássicas e
novo-clássicas, que hoje “dominam” a ciência econômica. Esses pressupostos formam o que é
conhecido como individualismo metodológico, base do pensamento burguês.
Prado (1993) elenca os pressupostos que formam a base do pensamento neoclássico que
tratam do indivíduo, ao mesmo tempo em que demonstra suas diferenças com o pensamento
marxista-historicista-materialista. O autor declara que esse método advém do pensamento iluminista
onde “o indivíduo é encarado como proprietário de sua pessoa e dono de suas próprias capacidades,
nada devendo à sociedade por tê-las adquirido” (PRADO, 1993, p. 112). Desse ponto, podemos
extrair as demais características da metodologia individualista preponderante.
Como o objetivo desse texto é demonstrar as diferenças entre o método marxista e o método
neoclássico a partir do ponto de vista das bases filosóficas do primeiro, tentaremos fazer uma
abordagem assim como Marx fez com o pensamento clássico: “reconhecer seu vínculo necessário e
proceder a uma reconstituição dos elos conceituais de sua articulação, relacionando-os a cada
momento ao sentido global da crítica” (GRESPAN, 2000, p. 77).
Guiando-me por Prado1 (1993) apresento o primeiro pressuposto neoclássico, que, de fato é
quase um sinônimo de individualismo metodológico: a racionalidade neoclássica ou o princípio da
escolha racional. Segundo esse princípio, o ponto que move a ciência econômica é o
comportamento do agente (indivíduo) e a sua capacidade e liberdade escolha. Todavia, tanto a
capacidade quanto a liberdade são postas em dúvida se analisarmos bem o que significam dentro do
pensamento neoclássico. Para fazer essa análise devemos levantar um segundo suposto: os
indivíduos têm informação adquirida sobre o comportamento dos outros agentes e do mercado
como um todo: isso quer dizer que os agentes seguem modelos específicos baseados em
probabilidades.
Logo, podemos observar que, se há modelos pré-determinados de comportamento dos
agentes e do mercado, não há que se falar de liberdade nem de capacidade, muito menos de escolha.
“A atribuição de papéis, ou de modelos comportamentais pré-definidos, colide com primado da 1 Prado (1993) leva em consideração os pontos na teoria de Walras, principal nome da fundação do pensamento neoclássico.
escolha, que pressupõe a indeterminação” (COUTINHO, 2000, p. 115). Ainda, “em lugar de, como
partes autônomas, produzirem a totalidade, os indivíduos estaria irremediavelmente, subsumidos à
totalidade” (DUAYER, 1995,193). Podemos falar então em determinismo, outro ponto central no
pensamento neoclássico. Os agentes agem de forma compatível com as preferências individuais dos
outros indivíduos, convergindo para um estado de equilíbrio onde as escolhas individuais por si só,
estabilizem toda a economia. Tal pressuposto, do equilíbrio a partir da convergência natural das
escolhas individuais, justifica a necessidade de liberdade dos agentes econômicos, ou seja, do livre-
mercado. Portanto, a atuação de agentes externos ao mercado (em outras palavras, o Estado) iria
desequilibrar todo o sistema.
A hipótese de determinação natural do homem advém do pensamento positivista fundado
também a partir do iluminismo francês. Segundo tal corrente, “a sociedade é regida por leis
naturais, isto é, leis invariáveis, independentes da vontade e da ação humanas” (LOWY, 2000, p.
17). Essas leis naturais levam à harmonia da sociedade ou equilíbrio natural. O naturalismo e
determinismo positivistas claramente influenciaram o método da ciência neoclássica, o
individualismo metodológico. Esse método, ainda segundo o positivismo, deve empregar os
mesmos processos utilizados pela física, química, matemática e biologia, ou seja, as ciências da
natureza.
Outros pontos do pensamento neoclássico também foram trazidos dos métodos das ciências
naturais: a decomposição do objeto como um todo em partes, e analisando essas partes chegar, por
indução, ao todo através da investigação “que deveria descobrir as propriedades relevantes
intrínsecas desses elementos” (PRADO, 2008, 3).
O método utilizado pela corrente dominante da ciência econômica contemporânea tem na
formalização e na utilização de técnicas científicas uma outra característica marcante. Esse
predicado advém claramente da utilização dos processos científicos das ciências naturais nas
ciências sociais tal qual a economia. A formalidade dos “modelos econômicos” é uma questão de
obrigatoriedade para o reconhecimento do trabalho como verdadeira ciência. Só através de modelos
bem elaborados (elaboração através de utilização de técnicas estatísticas e matemáticas) é que se
consegue provar algo de forma científica. De fato, os neoclássicos chegam a lamentar o atraso das
ciências sociais em relação a esse ponto, principalmente acerca do trato da matemática e da
estatística como ferramentas eficientes de pesquisa e análise.
Variados são os pontos que distinguem a ciência neoclássica (e também outras correntes
dominantes da economia contemporânea, como os novo-clássicos e novo-keynesianos) do
pensamento marxista. Marx claramente ia de encontro com o processo científico clássico e
neoclássico, “seu ponto de partida metodológico é a recusa do positivismo e seu objetivo é produzir
o entendimento e a dinâmica da lógica do capital” (TEIXEIRA, 2000, p. 99). Marx encontra na
teoria clássica e na nascente teoria neoclássica problemas que não podem ser superados seguindo o
ponto de vista do próprio método neoclássico, por isso a necessidade de ir além dessa visão, para
que fosse possível encontrar tais soluções.
O personagem principal da teoria marxista, o indivíduo, possui características distintas
daquelas utilizadas pelo mainstream. Ele está localizado em certo período histórico, de acordo com
a análise que está sendo feita. Essa ruptura é base de todas as outras diferenças entre as duas
correntes, principalmente devido ao modo como Marx trata a percepção histórica.
A historicidade da teoria marxista vai além do simples desenrolar dos fatos e da assimilação
destes pelos indivíduos e instituições. Ela diz respeito ao modo como esses agentes se relacionam
entre si e como se relacionam com o ambiente, o mercado, enfim, toda a sociedade. Por sua vez,
essas relações são vistas por Marx de maneira distinta daquela dos economistas “vulgares”.
Diferentemente do agente neoclássico, o indivíduo marxista não age sozinho, não é imune às
alterações que ocorrem no ambiente e na sociedade (mais à frente tratarei sobre essas alterações),
não possui informação perfeita sobre o mercado nem sobre as ações dos outros agentes, nem calcula
seus atos baseado em modelos probabilísticos.
O indivíduo marxista é social, ele se comporta conforme se localiza dentro da sociedade:
especificamente, o indivíduo pertence a classes sociais. E como tal, seus comportamentos não são
livres: estão submetidos a uma lógica de organização social construída justamente através da
relação entre essas classes. A conclusão a qual chega Marx nesse ponto, é que, essa divisão social
não é natural, como pregavam pensadores positivistas2. Ela é desenvolvida segundo o desenrolar
dos processos sociais históricos, das relações de poder entre essas classes. Vale destacar que, na
teoria marxista, as classes sociais não são agentes de decisão econômica.
Essa distinção advém da forma como Marx acredita que o indivíduo “enxerga” o mundo ao
seu redor. Para os cientistas burgueses o conhecimento humano é formado a partir do que é
percebido na realidade aparente3. E é a partir dessa percepção que o indivíduo age. Dessa forma,
podemos falar sobre determinação natural se o que vemos, aparentemente, na realidade segue uma
certa lógica dedutiva. Também podemos tirar desse conhecimento a partir da aparência, o fenômeno
do fetichismo da mercadoria, assim batizado por Marx. Ou seja, a relação entre os homens passa a
2 Durkheim chega a desenvolver a teoria organicista, onde defende que todos os indivíduos tem papéis definidos de forma natural, e que tais papéis tem diferentes graus de importância dentro da sociedade. Portanto as diferenças sociais seriam facilmente explicadas a partir do ponto de vista da posição funcional da atividade do indivíduo: os trabalhadores teriam que entender sua posição social inferior e sem privilégios pelo bem da ordem social (LOWY, 2000).3 Esse ponto foi um dos principais desacordos entre Marx e os pensadores clássicos da economia (A. Smith, D. Ricardo e J. S. Mill), especialmente na forma como são tratados três elementos básicos nessas teorias: valor, dinheiro e trabalho.
ser a relação entre coisas (bens, mercadorias) e o valor dessas coisas provém delas como coisas e
não do fato de elas serem produtos do trabalho humano numa sociedade organizada naturalmente ao
redor da troca. Assim, podemos dizer que no sistema capitalista fundado nos princípios da ciência
econômica burguesa, a mercadoria é aparente, mas não é essencialmente.
Já para Marx, o conhecimento humano, formulado a partir de um processo dialético, permite
troca de informações sensoriais e mentais entre os indivíduos e o ambiente no qual estão inseridos,
sendo o comportamento desses indivíduos resultado direto da sua relação com a sociedade e
portanto, não passível de homogeneização e determinação.
Esse processo de construção do indivíduo se dá através da atividade humana (prática), ou
seja, dos modos de produção e daí surge a consciência. Essa consciência que cria as regras (corpo
jurídico) que ordenam a vida social. Logo, podemos ver claramente que, segundo Marx, o sistema
econômico vigente e suas instituições decorrentes são frutos, primeiramente, do modo de produção
utilizado em dado tempo. E a crítica aos neoclássicos se encontra justamente em eles não
considerarem o sistema capitalista como uma forma de organização historicamente condicionada e
destinada a ser superada.
Um último ponto a ser considerado é o fato de que, em Marx, a sociedade, determinadora do
comportamento dos indivíduos, não é apenas um conjunto desses indivíduos. A sociedade “não é
um conjunto de indivíduos – que constitui apenas uma população –, mas uma rede de relações
sociais” (GERMER, 2000, p.13). Ainda segundo Germer,
Deste modo o indivíduo, concebido isoladamente, e até mesmo cada geração, defrontam-se com condições objetivas que não escolheram e dentro de cujo contexto devem viver e desenvolver a sua ação, que é a origem da mudança a partir da base que encontram quando nascem. Portanto, o processo através do qual o ser humano, como ser social, produz a sua história, é por sua vez condicionado e limitado historicamente. (GERMER, 2000, p. 13).
Podemos perceber que as principais contradições entre o indivíduo considerado na teoria
neoclássica e o indivíduo do pensamento marxista são: i) homogeneidade dos indivíduos e de suas
ações versus distinção social dos indivíduos em classes sociais; ii) determinação das ações humanas
através de leis naturais versus condicionalidade histórica do indivíduo; e iii) subjetividade do
indivíduo (escolhas) versus comportamento de classe (que não é agente).
2. Considere, em primeiro lugar, a inflexão conservadora da economia política relativamente à tradição progressista do pensamento burguês, a qual aparece na base da construção teórica do neoclassicismo (mainstream). Considere, em segundo lugar, os pressupostos formulados por Bueno para a elaboração do conceito de economia política.
Nesse sentido, destaque os elementos que poderiam ser considerados com o propósito de caracterização da escola neoclássica como uma postura fortemente impregnada de ideologia e idealismo.
A ciência social moderna (não só a ciência econômica, mas tratando também de outras
áreas) sofreram grande influência do movimento iluminista revolucionário no século XVIII a fim de
estabelecer novos paradigmas que fossem mais plausíveis com a nova ordem econômica e social
que então passava a preponderar: o capitalismo. O antigo sistema, o mercantilismo, era
demasiadamente focado na ação do Estado, deixando pouco espaço para a livre ação do indivíduo
(que além dessa restrição, também era limitado por dogmas religiosos).
Desse processo histórico de revolução do pensamento humano surgiram diversas correntes
filosóficas novas e portanto, novos métodos científicos. A maioria dessas correntes filosóficas agora
centrava seus esforços na análise da nova realidade social, e no papel do indivíduo dentro de um
sistema onde ele próprio tomava as rédeas do ambiente que o circundava, através de tecnologias
avançadas.
Uma crítica ao sistema feudal absolutista e sua falta de ciência vem diretamente da nova
classe que acabara de conseguir grande espaço de decisão na sociedade. Desde esse início podemos
perceber que o movimento de reforma do sistema social feudal para o sistema capitalista – e
também a forma de produzir conhecimento – foram resultado da prevalência de novos valores e
princípios de uma nova classe, sedenta por poder. Cabe analisar como essa mudança ocorreu na
ciência econômica e seu desenrolar histórico até os tempos atuais.
O reflexo econômico que surge dessa revolução iluminista é o liberalismo. Essa nova
filosofia considerava a nova instituição, o mercado, nas suas formulações. Ingleses como Adam
Smith e David Ricardo foram os principais pensadores nesse início do liberalismo, onde a ciência
econômica foi batizada como economia política. Foi através desses filósofos (até então poucos eram
economistas essencialmente) que analises sobre as relações comerciais entre indivíduos e também
entre nações começaram a ser feitas; também foi a partir deles que trabalhos sobre dinheiro, valor e
trabalho também começaram a ganhar significado.
Mesmo que ainda nesse momento não se discuta a metodologia da ciência econômica,
podemos perceber a ideologia através dos pontos de vista das novas pesquisas. Tanto Ricardo
quanto Smith defendiam a liberdade dos empresários para produzir, defendiam a redução da atuação
estatal nos destinos econômicos e observavam a necessidade de especialização da mão-de-obra.
Nesse tempo apareceu a figura de Condorcet, um dos fundadores do pensamento positivista.
Assim como a maior parte dos pensadores XVIII, Condercet estava encantado com os avanços
técnicos e científicos das ciências naturais, proporcionados por novos métodos de pesquisa. Assim,
argumentava que as ciências sociais, incluindo a economia política, deveriam absorver muitas
dessas técnicas para que avançassem: “(...) o conjunto de dos fenômenos sociais está submetido ‘às
leis gerais... necessárias e constantes’ parecidas com as que regem as operações da natureza”
(LOWY, 2000, p.19).
Tanto Condorcet quanto seu sucessor, S. Simon, defendiam um cientificismo positivista,
onde a verdadeira ciência era aquela que utilizava técnicas que protegessem o objeto pesquisado das
“paixões” do cientista. Ou seja, deveria existir uma ciência do homem, constituída pelos fatos
materiais que derivam da observação direta (sem julgamento de valores). Esses dois pensadores
lutaram contra os preconceitos científicos, uma posição crítica e contestadora que se incluía na luta
dos produtores capitalistas contra os resquícios feudais.
Foram levantadas por esses dois pensadores a base do método científico da economia
política, que mais tarde seria aperfeiçoado e distorcido. A verdadeira ciência social deveria se
basear nas Leis Naturais (tais como o determinismo darwnista), o método de pesquisa e análise
deveria ser aquele mesmo utilizado nas ciências naturais (métodos objetivos e matemáticos) e toda
ciência deveria ser feita livre de julgamento de valor, para que não houvesse influência de
preconceito. O positivismo de Condorcet e S. Simon definia então os pontos necessários para
afastar o atraso feudal dos avanços tecnológicos do sistema capitalista burguês.
Posteriormente, positivistas como Comte (reconhecido como o verdadeiro pai do
positivismo) e Durkheim alteram uma das grandes características do positivismo de Condorcet e S.
Simon: a capacidade crítica dessa corrente filosófica. Dentro de uma nova ordem social, nesse
momento já perfeitamente estabelecida, Durkheim defendia que o sistema econômico industrial era
fruto da ordem natural do desenvolvimento humano e que a ciência deveria servir a esse sistema,
deveria promover sua estabilidade4.
O naturalismo positivista entendia como perfeitamente normal fenômenos como acumulação
de capital e desigual distribuição da riqueza. Esse último ponto era, inclusive, explicado pela teoria
organicista de Durkheim, onde cada indivíduo tem uma função na manutenção da ordem social e
essas funções são recompensadas de acordo com sua importância: os empresários correm grande
risco ao investir capital nas fábricas e na contratação de mão-de-obra, logo, devem ser melhor
recompensados, enquanto que os trabalhadores estão “livres” desse risco e, por isso, devem
obedecer à ordem e ao empresário.
Foi desse corpo filosófico que emergiram os dois supostos que norteiam todo o pensamento
neoclássico:
4 Durkheim criticou Condorcet por deixar-se levar pelas paixões ideológicas na formulação da filosofia positivista.
Segundo SAMUELSON (1983: 220) são apenas duas as premissas fundamentais para a derivação de teoremas frutíferos em economia (economics é claro): 1) a hipótese de comportamento maximizante da firma e do consumidor e 2) a hipótese de estabilidade do equilíbrio, ou seja, a de que os mercados se auto-equilibram (BUENO, 1997).
A hipótese de comportamento maximizante liga-se ao conceito de racionalidade do
indivíduo, que por sua vez deriva-se do pressuposto da aplicação de leis e métodos naturais
universalmente aceitas também nas ciências sociais, tal qual a homogeneização do comportamento
humano, assim como é feito nas ciências naturais. De fato, esse pressuposto se faz necessário para
um dos principais objetivos da ciência econômica mainstream: a possibilidade de prever as ações
dos indivíduos e, por conseguinte, do estado.
A necessidade de prever o comportamento humano é, claramente, requisição da classe
dominante que vê como imprescindível para a manutenção da ordem, resultados científicos que
justifiquem seus meios de atuação, como o argumento de não intervenção do Estado e incentivos à
livre iniciativa.
Além do pressuposto do comportamento maximizante, os argumentos neoclássicos também
são baseados no pressuposto da estabilidade estrutural. Para fins metodológicos, esse pressuposto
permite analisar de forma linear ou numa dinâmica estável o comportamento de variáveis em
modelos específicos. Dessa maneira pode-se analisar a economia através de variações nas posições
de equilíbrio, nunca permitindo que tais modelos se tornem estruturalmente instáveis. Para uma
ciência econômica feita com a intenção de prever os eventos futuros, faz-se necessário esse máximo
controle possível das variáveis envolvidas.
Segundo Bueno (1997) e Prado (2010) a economia política não permite tal tipo de
reducionismo metodológico, uma vez que é impossível estabelecer com precisão todas as variáveis
que influenciam os sistemas analisados: a própria idéia de analisar sistemas separados do resto dos
fenômenos econômicos é também criticada por esses dois autores, que argumentam que
alternativamente a Teoria da Complexidade5 seria mais capaz de absorver todas as vicissitudes do
sistema econômico real.
Tal reducionismo também tem a intenção de tornar as ciências sociais completamente
técnicas a fim de não permitirem a intervenção da ideologia nos processos científicos. Mais uma
vez o interesse aqui, no livre julgamento de valor, é da classe burguesa que não deseja que seus
5 A complexidade “vem a ser característica inerente à realidade tal como ela se apresenta à nossa atividade prática, e, portanto, em nossa representação e apreensão da realidade material, social e histórica. Refere-se, pois, ao mundo enquanto este se apresenta também como problema de conhecimento (...) e o conhecimento não é simples aproximação à ‘verdade’ ou à ‘realidade’; é interação entre o sujeito do conhecimento e a natureza conhecível que depende de fatores biológicos, psicológicos, culturais, lingüísticos, etc” (PRADO, 2011, p. 2).
argumentos sejam postos em dúvida pela sociedade e, portanto, precisam que a ciência seja feita
apenas por cientistas que apóiem seus ideais.
Lowy (2000) discute se os métodos utilizados para fazer ciência são passíveis da liberdade
de julgamento proposta por positivistas como Comte, Durkheim, Condorcet e Popper. A conclusão
óbvia é que, por serem, os agentes, sujeitos formados historicamente, são portadores de ideologias
decorrentes da sua formação social: da classe social à qual pertencem, da sua formação intelectual,
e dos interesses do capital sobre esses indivíduos.
Assim, desde a justificativa da filosofia que influencia o pensamento neoclássico (o
positivismo), até o método utilizado pela economics (comportamento maximizante e estabilidade
estrutural), existe por trás fortes traços ideológicos ligados à classe burguesa dominante desde o
século XVIII que surgiu a partir do iluminismo e de sua crítica ao sistema feudal absolutista até
então preponderante.
De fato, principalmente o termo estabilidade estrutural, esses conceitos estão carregados de
ideologia da classe social dominante que emergiu após a revolução industrial no século XVIII e são
fortemente influenciados pela filosofia positivista e sua defesa à ordem capitalista tecnicista.
Referências:
BUENO, Newton Paulo. Um critério de demarcação para a abordagem de Economia
Política.
COUTINHO, Maurício. A crítica da economia política: teoria e atualidade. In: Crítica
Marxista, nº 10, 2000).
DUAYER, Mario. A ontologia social organicista pós-keynesiana: ruptura com o
neoclassicismo? In: Ensasios FEE, Porto Alegre, (16) 1, PP. 190-217, 1995.
GERMER, Claus M. Contribuição ao entendimento do método da economia política
segundo Marx. Curitiba, UFPR, 2000. Mimeo.
GRESPAN, Jorge. A crise na crítica à economia política. In: Crítica Marxista, nº 10, 2000.
LOWY, Michel. As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Munchhausen. São Paulo:
Busca Vida, 1987.
PRADO, Eleutério. A constelação pós-walrasiana. São Paulo, Revista de Economia Política,
vol. 14, nº 4 (56), outubro-dezembro, 1994.
PRADO, Eleutério. A dialética de Marx e o evolucionismo de Hayek. Revista de Sociedade
Brasileira de Economia Política, nº 23, dezembro de 2008.
TEIXEIRA, Aloísio, Marx e a economia política: a crítica como conceito. In: Econômica,
vol. II, nº 4, PP. 85-109, dezembro, 2000.