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REABILITAO DA MULHER MASTECTOMIZADA
da informao capacitao
Trabalho de projeto
Marlia Patro Ferreira
Junho de 2017 Escola Superior de Sade
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Marlia Patro Ferreira
REABILITAO DA MULHER MASTECTOMIZADA
da informao capacitao
Trabalho de projeto
Mestrado em Enfermagem de Reabilitao
Trabalho efetuado sob a orientao:
Professora Doutora Maria de La Salete Rodrigues Soares
Junho de 2017
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RESUMO
A mastectomia uma forma de tratamento do cancro da mama que pode causar
impacto fsico e emocional desfavorvel, gerador de grande sofrimento e limitao das
atividades de vida das mulheres a ela submetida, com consequente influncia na
qualidade de vida e independncia. A viso contempornea da reabilitao em
oncologia integra um conjunto de dinmicas teraputicas centrando-se em reabilitar
capacidades e prevenir complicaes atravs de um acompanhamento integral da
pessoa numa abordagem holstica e multidisciplinar. Os enfermeiros de reabilitao,
atravs da sua interveno, tm competncias para desenvolver programas de
reabilitao, que potenciem a capacidade de adaptao, maximizem a funcionalidade
e forneam informao. Desta forma so fundamentais para a aquisio do
conhecimento e para a capacitao para a autonomia, maximizando a gesto do
projeto de sade e de vida das mulheres mastectomizadas.
A metodologia de trabalho de projeto foi escolhida porque estabelece conexes entre
a prtica, a evidncia cientfica e a introduo de boas praticas nos contextos reais.
Para diagnstico foi aplicada a entrevista semiestruturada a seis mulheres
mastectomizadas, como instrumento de recolha de dados. Da anlise das entrevistas
emergiram reas temticas que conjuntamente com a anlise SWOT nos permitiu
efetuar o diagnstico da situao adaptado ao contexto organizacional.
Para a resoluo dos problemas identificados: insuficiente capacitao e insuficiente
reabilitao elaboramos um programa de reabilitao mulher mastectomizada e
propomos a criao de uma consulta de enfermagem de reabilitao de
acompanhamento. Neste sentido, definiram-se objetivos e efetuamos o planeamento
da consulta como forma de materializao da resposta efetiva a esta problemtica
com intervenes educativas, de capacitao e reabilitao funcional. As restantes
etapas preconizadas: execuo e avaliao dos resultados surgiro numa fase
posterior, aquando da implementao do projeto.
Palavras-chave: Metodologia de Projeto, Cuidados de Enfermagem de Reabilitao,
Mulher Mastectomizada
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ABSTRACT
Mastectomy is a form of treatment of breast cancer that can cause unfavorable
physical and emotional impact, generator great suffering and limiting the life activities
of the women submitted to it, with consequent influence on the quality of life and
independence. The contemporary view of oncology rehabilitation integrates a set of
therapeutic dynamics focusing on rehabilitating capabilities and preventing
complications through an integral follow-up of the person in a holistic and
multidisciplinary approach. Rehabilitation nurses, through their intervention, have the
skills to develop rehabilitation programs that enhance adaptability, maximize
functionality, and provide information. In this way they are fundamental for the
acquisition of knowledge and for the empowerment for the autonomy, maximizing the
management of the health and life project of the mastectomized women.
The project work methodology was chosen because it establishes connections
between practice, scientific evidence and the introduction of good practices in real
contexts. A semi structured interview was applied to six mastectomized women, as a
data collection instrument. From the analysis of the interviews emerged thematic areas
that together with the SWOT analysis allowed us to make the diagnosis of the situation
adapted to the organizational context.
In order to solve the problems identified: insufficient training and insufficient
rehabilitation, we developed a rehabilitation program for mastectomized women and
suggested the creation of a follow-up rehabilitation nursing consultation. In this sense,
we defined objectives and we made the planning of the consultation as a form of
materialization of the effective response to this problem with educational interventions,
training and functional rehabilitation. The remaining recommended steps: execution
and evaluation of the results will emerge at a later stage, when the project is
implemented.
Keywords: Project Methodology, Nursing Rehabilitation Care, Mastectomized Woman
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AGRADECIMENTOS
No desenvolvimento deste trabalho tive o privilgio de me relacionar com vrias
pessoas a quem quero agradecer o incentivo e apoio que permitiram a sua
concretizao. Em especial:
Professora Doutora Salete Soares pela partilha de conhecimento e estmulo
intelectual, contribuindo com sugestes e orientaes valiosas ao longo deste
percurso, pelo entusiasmo e palavra amiga nas fases mais complexas.
Ao Sr. Presidente do Conselho de Administrao da Instituio onde decorreu o
trabalho de projeto e estudo de investigao, pela autorizao concedida.
s mulheres mastectomizadas entrevistadas que aceitaram partilhar as suas vivncias
com extrema generosidade permitindo compreender o outro lado e tornando possvel
a realizao da investigao.
Enfermeira Chefe do meu servio Fernanda Silva pela autonomia concedida neste
projeto, pela partilha de uma filosofia comum de qualidade de cuidados de
enfermagem, pela compreenso e flexibilidade de horrio concedida.
s colegas que integraram o projeto Re(h)abilita: Ftima Sousa, Cludia Costa,
Rosrio Rodrigues e Sandra Miranda, s alunas de Enfermagem da Escola Superior
de Sade do IPVC pela sua colaborao, bem como restantes colegas do servio que
contriburam.
Eugnia, companheira de jornada, pela partilha das conquistas e inquietaes nesta
caminhada acadmica.
Ao Jorge e aos nossos filhos Pedro e Lusa pela compreenso da minha ausncia nos
momentos mais complicados, pelo apoio incondicional e por tudo o que nos une...
restante famlia e amigos pelo suporte afetivo dedicado.
Para todos o meu agradecimento!
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DEDICATRIA
s mulheres mastectomizadas que aceitaram participar
neste estudo e a todas as mulheres com cancro de
mama que todos os dias lutam pela sobrevivncia,
autonomia e qualidade de vida...
para elas este Trabalho de Projeto
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NDICE INTRODUO .......................................................................................................................... 18
CAPTULO I O cancro, uma realidade (in) esperada ...................................................... 22
1. O PERCURSO DA DOENA-CANCRO DA MAMA ................................................... 24
1.1. Realidade Epidemiolgica do cancro da mama .................................................. 26
1.2. Diretrizes europeias na luta contra o cancro de mama ...................................... 26
1.3. Fatores de risco para o cancro da mama ............................................................. 27
1.4. Diagnstico do cancro da mama ............................................................................ 28
1.5. Tratamento do cancro da mama ............................................................................ 29
1.6. Complicaes da mastectomia .............................................................................. 32
1.7. As sobreviventes de cancro de mama .................................................................. 34
2. DA GESTO DO PERCURSO DA DOENA PARA A GESTO DO PERCURSO
DE VIDA ..................................................................................................................................... 35
2.1. Gesto da doena crnica ...................................................................................... 35
2.2. Da informao capacitao na doena crnica ............................................... 38
2.3. O cancro, uma doena crnica .............................................................................. 42
3. REABILITAO DA MULHER MASTECTOMIZADA NUM CONTINUUM DE
CUIDADOS ................................................................................................................................ 43
3.1. A Consulta de Enfermagem de Reabilitao ....................................................... 48
3.2. Reabilitao da Mulher Mastectomizada .............................................................. 50
CAPITULO II Trabalho de projeto ...................................................................................... 60
1. Diagnstico da situao .................................................................................................. 65
1.1. O contexto ................................................................................................................. 65
1.2. A problemtica .......................................................................................................... 67
1.3. Instrumentos de recolha de dados ........................................................................ 68
1.4. Procedimentos de recolha e anlise de dados .................................................... 69
1.5. Apresentao, anlise e discusso de resultados .............................................. 70
1.6. Anlise SWOT para consulta de enfermagem de reabilitao ............................ 99
2. Definio de objetivos .................................................................................................... 100
3. Planeamento ................................................................................................................... 100
3.1. Porteflio coletivo - Porteflio Rosa ......................................................................... 101
3.2. Proposta de Programa de reabilitao .................................................................... 102
3.3. Planeamento da consulta de enfermagem de reabilitao mulher
mastectomizada .................................................................................................................. 109
4. Do planeado ao possvel ............................................................................................... 115
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CONCLUSES ....................................................................................................................... 116
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................... 120
ANEXOS .................................................................................................................................. 130
ANEXO I - Autorizao do estudo ................................................................................... 132
APNDICES ............................................................................................................................ 136
APNDICE I - Guio da Entrevista.................................................................................. 138
APNDICE II - Quadro de Definio de conceitos ....................................................... 142
APNDICE III - Declarao de consentimento informado ........................................... 148
APNDICE IV - Matriz de reduo de dados (das entrevistas) .................................. 152
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INDICE DE FIGURAS E QUADROS
FIGURAS
Figura 1-Fases de metodologia de projeto...................................................................62
Figura 2-Localizao Geogrfica da rea de influncia do HSMM, EPE, Barcelos....64
Figura 1-Fases de metodologia de projeto...................................................................62
Figura 3-Caracterizao da amostra segundo os tipos de tratamentos
efectuados/a efectuar....................................................................................................70
Figura 4-Reorganizao de estratgias
face ao diagnstico de necessidades da equipa ..........................................................99
Figura 5- Circuito da mulher desde o diagnstico e percurso subsequente...............108
QUADROS
Quadro 1-Identificao das reas temticas................................................................68
Quadro 2-Caracterizao sociodemogrfica da amostra............................................69
Quadro 3-Anlise SWOT para consulta de enfermagem de reabilitao mulher
mastectomizada............................................................................................................97
Quadro 4-Programa de Reabilitao mulher mastectomizada................................100
Quadro 5 -Atividade: Consulta de Enfermagem de reabilitao mulher
mastectomizada..........................................................................................................109
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SIGLAS
ADN - cido desoxirribonucleico
ANA - American Nurses Association
ARN - Association of Rehabilitation Nurses
APER - Associao Portuguesa de Enfermeiros de Reabilitao
CIPE - Classificao Internacional Prtica de Enfermagem
DGS - Direo Geral de Sade
DPOC - Doena Pulmonar Obstrutiva Crnica
EEER - Enfermeiro Especialista de Enfermagem de Reabilitao
EPE - Entidade Pblica Empresarial
EUROPA DONNA -The European Breast Cancer Coalition
ESMO - European Society for Medical Oncology
HSMM - Hospital Santa Maria Maior
IPO - Instituto Portugus de Oncologia
INE - Instituto Nacional de Estatstica
IARC - International Agency for Research on Cancer
GID - Gesto Integrada da Doena
OE - Ordem dos Enfermeiros
OMS - Organizao Mundial de Sade
PQCEER - Padres de Qualidade dos Cuidados Especializados em Enfermagem de
Reabilitao
PNS - Plano Nacional de Sade
NCI - National Cancer Institute
NICE - National Institute for Health and Care Excellence
RRHMFR - Rede de Referenciao Hospitalar de Medicina Fsica e de Reabilitao
SNS - Servio Nacional de Sade
SWOT - Strengths Weaknesses Opportunities Threats
WHO - World Health Organization
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ABREVIATURAS
Art. - Artigo
cm - Centmetro
ed. - Edio
et al - Et alii (e outros)
E - Entrevista
H. Dia - Hospital Dia
p.- Pgina
Km2 - Quilmetros quadrados
MS - Membro superior
N - Nmero
% - Percentagem
Vol. - Volume
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INTRODUO
A sade das pessoas integrando a procura do bem-estar e a qualidade de vida pode
ser melhorada de muitas formas, mas fundamental que as polticas de sade
favorveis e acordos internacionais assumidos permitam melhorar o acesso e a
qualidade dos cuidados de sade, pois desta forma contribuem para que as
intervenes dos profissionais possam ser mais efetivas.
Os enfermeiros tm um papel importante a desempenhar em todos os contextos de
cuidados de sade seja na avaliao das necessidades, na prestao de cuidados, no
planeamento de respostas s necessidades das pessoas ou na avaliao dos
resultados das suas intervenes (OE, 2017) demonstrando a sua imprescindibilidade
e o seu contributo no panorama da sade globalmente.
No atual contexto das polticas de Sade em Portugal as reformas planeadas e em
desenvolvimento pretendem dar uma resposta mais ajustada s crescentes
necessidades que as pessoas enfrentam constituindo desafios que se ligam a novos
paradigmas e exigem reestruturao e reorganizao dos cuidados de sade
(Sakedelallarides et al, 2016; DGS, 2016).
Nesta linha de pensamento emergem modelos de gesto integrada da doena com
foco na pessoa e na sua colaborao na gesto da sua sade/doena que valorizam a
inovao de prticas, onde a informao fornecida pelos profissionais na aquisio do
conhecimento capacita para o autocuidado e para a gesto do projeto de sade,
criando valor para todos desde a pessoa e famlia, aos profissionais e s
organizaes. Estas abordagens integram preveno, diagnstico, tratamento,
reabilitao e acompanhamento (Escoval, 2010; Sakedelallarides et al, 2016; DGS,
2016).
Para as pessoas com doena crnica a informao torna-se um instrumento
significativo para a gesto da doena podendo influenciar a sua qualidade de vida
devendo a pessoa tornar-se conhecedora das consequncias da situao e aplicar os
seus conhecimentos por forma a fazer a gesto da doena a longo prazo. Desta
forma, profissionais que partilham informao com a pessoa atingem melhores
resultados de manuteno de sade (Hoeman, 2011).
Cada vez mais, a doena oncolgica vista como uma condio crnica com
cuidados complexos e uma problemtica que exige processos de qualidade
centralizados na pessoa e na sua trajetria de doena. O acompanhamento destas
situaes constitui um processo importante na passagem da pessoa com cancro para
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a de sobrevivente de cancro. Neste acompanhamento o grande objetivo que se impe
desenvolver dinmicas que promovam o conhecimento e desenvolvam habilidades e
capacidades para a pessoa gerir a doena e os efeitos desfavorveis da mesma.
A viso contempornea da reabilitao em oncologia integra um conjunto de
dinmicas teraputicas direcionadas para a pessoa desenvolver o seu potencial fsico,
psicolgico e social, otimizando a mxima independncia e qualidade de vida no
processo de adaptao sua condio, centrando-se em reabilitar capacidades e
prevenir complicaes ou minorar disfunes decursivas da doena ou tratamentos,
impondo-se um acompanhamento integral da pessoa numa abordagem holstica e
multidisciplinar.
As mulheres com cancro da mama vivenciam uma incerteza que provm da prpria
condio de pessoa com cancro e esto sujeitas a tratamentos agressivos, efeitos
colaterais debilitantes e problemas fsicos graves. A mastectomia constitui uma forma
de tratamento do cancro da mama e um processo cirrgico mutilante que pode
acarretar repercusses fsicas e emocionais desfavorveis causadoras de grande
sofrimento e limitao das atividades de vida ao longo do percurso de vida destas
mulheres (Amorim, 2007; Pinto, 2009; Lago et al, 2015; Merncio, 2016). Os
enfermeiros de reabilitao atravs da sua interveno podem desenvolver programas
de reabilitao que potenciem a capacidade de adaptao, maximizem a
funcionalidade e capacitem para manter, recuperar ou promover as capacidades
funcionais e independncia. Nestas intervenes podem orientar e acompanhar o
percurso da mulher mastectomizada, promovendo a capacitao atravs da educao
para sade e desta forma maximizar o seu potencial para gerir eficazmente a sua
doena em qualquer fase do percurso oncolgico.
O desafio atual o de conceber dinmicas que incitem a evoluo de uma situao
onde prevalece a diminuta informao, para processos pr-ativos onde exista
desenvolvimento e partilha contnua de informao e de conhecimento que permitam a
autogesto da doena (PNS 2011-2016), atravs da capacitao da mulher
mastectomizada com ganhos de independncia e qualidade de vida numa verdadeira
continuidade de cuidados.
Consideramos com base na literatura (Costa, 2011; Rodrigues, 2012; Merncio, 2016)
que a reabilitao da mulher mastectomizada ser tanto melhor sucedida quanto mais
informada estiver pelo que estas dinmicas devem alicerar-se em intervenes do
enfermeiro de reabilitao para a capacitao destas mulheres por forma a evitar
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limitaes ou reduzir incapacidades contribuindo, ainda, para este processo de
recuperao os outros profissionais de sade que constituem a equipa multidisciplinar.
A consulta de enfermagem de reabilitao mulher mastectomizada unifica estes
pressupostos e perspetiva uma abordagem holstica evitando abordagens
fragmentadas ou insuficientes no acompanhamento destas mulheres e existem j
alguns exemplos de boas prticas em Portugal desta forma de interveno que
demonstram a importncia desta consulta.
Estamos convictos que a cultura de investigao deve nortear as prticas de cuidados
que por sua vez devem ser sustentadas na evidncia cientfica. A Enfermagem de
Reabilitao deve maximizar-se estabelecendo conexes entre a prtica, a evidncia
cientfica comprovada e a introduo de boas praticas nos contextos reais para
alcanar os melhores padres de qualidade. A metodologia de trabalho de projeto
consubstancia-se nesta trade em articulao.
A problemtica em estudo centrada na Reabilitao da mulher mastectomizada: da
informao capacitao, insere-se na metodologia de trabalho de projeto e
perspetiva criar respostas a problemas identificados, mobilizando recursos e criando
dinmicas interventivas (Nunes et al, 2010). A escolha da rea problemtica decorreu
da observao/reflexo e inquietao do nosso percurso profissional e dos
constrangimentos com os quais nos deparamos no contacto com as mulheres
mastectomizadas. Conscientes da problemtica real e com propsito de intervir
realizamos um diagnstico da situao para identificar os problemas e progredir nas
restantes fases.
Este estudo de investigao foi desenvolvido tendo como ponto de partida as questes
de investigao: Quais as necessidades de informao e capacitao das mulheres
mastectomizadas e quais as estratgias ou recursos utilizados para gerirem os seus
projetos de vida e sade com autonomia?
Para a deteo de necessidades foi aplicada a entrevista semiestruturada a seis
mulheres mastectomizadas, como instrumento de recolha de dados. Da anlise das
entrevistas das mulheres mastectomizadas emergiram reas temticas que
conjuntamente com a anlise SWOT nos permitiu efetuar o diagnstico da situao
adaptado ao contexto organizacional que caraterizamos.
Perspetiva-se neste trabalho de projeto dar resposta a necessidades concretas da
mulher mastectomizada e s novas exigncias em cuidados de sade e atravs desta
abordagem fazer a diferena na reabilitao da mulher mastectomizada impulsionando
a sua capacitao e melhoria da qualidade de vida.
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Para a resoluo dos problemas identificados consideramos que deve ser repensada a
abordagem mulher mastectomizada e sugerimos a criao de uma consulta de
enfermagem de reabilitao como forma de materializao da resposta efetiva a esta
problemtica. Desta forma contempla-se intervenes no pr-operatrio, no ps-
operatrio e ps-alta, com abordagens educativas e de capacitao bem como
programas de reabilitao funcional para a preveno e deteo precoce de
complicaes sempre adaptados individualidade de cada mulher. Consideramos que
a consulta planeada pode tambm constituir-se uma resposta inovadora de oferta de
cuidados de Sade que pode distinguir a instituio pela vantagem competitiva que
cria. Neste seguimento definimos objetivos e efetuamos o planeamento desta
interveno. As restantes etapas preconizadas: execuo e avaliao dos resultados
constaro de uma fase posterior aquando da implementao do projeto (Nunes et al,
2010).
O relatrio que elaboramos pretende explanar o percurso desenvolvido e encontra-se
dividido em dois captulos em que o primeiro aps esta introduo apresenta a
problemtica e o enquadramento terico que a norteou e o segundo captulo refere-se
metodologia do projeto por esta ser a opo metodolgica selecionada. Neste
damos enfase ao diagnstico de situao identificando os problemas que emergiram
das entrevistas, apresentamos um programa de reabilitao mulher mastectomizada
que elaboramos, definimos os objetivos e indicamos o planeamento da interveno:
Implementao da consulta de enfermagem de reabilitao mulher mastectomizada
explicando previamente a sua viabilidade com a aplicao da anlise SWOT. Por fim
efetuamos a concluso, onde salientamos a perspetiva de continuidade do projeto.
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CAPTULO I
O cancro
Uma realidade (in) esperada
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1. O PERCURSO DA DOENA-CANCRO DA MAMA
O cancro da mama um dos problemas com mais gravidade na sade em todo o
mundo, correspondendo segunda causa de morte por cancro, na mulher, no mundo
ocidental. Constitui-se como uma das maiores preocupaes atuais em termos de
sade j que traz consigo grandes impactos na qualidade de vida da mulher, desde o
momento do diagnstico da doena (Eberhardt, 2014).
Seguidamente iremos fazer uma delimitao do problema nas suas vrias dimenses
e abordagens, iniciando por algumas consideraes de carter mais geral.
O cancro integra aspetos multidimensionais pelo que constitui uma preocupao em
sade pblica a nvel nacional e internacional. O cancro transformou-se numa doena
que exige vigilncia e tratamentos prolongados e no se pressupe retrocesso nos
atuais dados estatsticos (DGS, 2016). O cancro obriga a uma perspetiva
multidisciplinar com uma abordagem articulada com os vrios intervenientes para alm
das estruturas de sade na medida em que uma das doenas do futuro (e do
presente) (DGS, 2014).
De acordo com a OMS (2013) espera-se que o nmero de novos casos aumente cerca
de 70% nas prximas duas dcadas. O cancro a segunda principal causa de morte
em todo o mundo e foi responsvel por 8,8 milhes de mortes em 2015. Globalmente,
quase 1 em cada 6 mortes causada por cancro (WHO, 2015). Na anlise
retrospetiva dos tumores malignos de 2009-2010 a DGS (2016) refere que a incidncia
destes em Portugal aumentou em 4%. Segundo o Instituto Nacional de Estatstica os
tumores malignos foram a segunda causa de morte em 2013, com registo de 25 920
bitos, o que correspondeu a 24,3% da mortalidade, no pas.
A OMS (2013) fornece vrias indicaes sobre o cancro em geral referenciando a
American Cancer Society que destacamos:
O cancro surge da transformao de clulas normais em clulas tumorais num
processo de vrios estadios que geralmente progride de uma leso pr-cancerosa
para um tumor maligno. Essas mudanas so o resultado da interao entre os fatores
genticos de uma pessoa e as categorias de agentes externos, incluindo:
carcinogneos fsicos, carcinogneos qumicos, e carcinogneos biolgicos. O
envelhecimento outro fator fundamental para o desenvolvimento do cancro. A
incidncia aumenta exponencialmente com a idade pela acumulao de riscos para
cancros especficos combinada com a baixa capacidade de reparao celular
caracterstica do envelhecimento. O cancro um termo genrico para um grande
grupo de doenas que se caraterizam pelo crescimento de clulas anormais alm dos
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seus limites habituais que podem invadir partes adjacentes do corpo e/ou disseminar
para outros rgos. Outros termos utilizados para a sua designao so tumores e
neoplasias malignas. O cancro pode afetar qualquer parte do corpo e tem muitos
subtipos anatmicos e moleculares. Cerca de 30-50% dos cancros podem ser
prevenidos atualmente, evitando fatores de risco e implementando estratgias de
preveno baseadas em evidncias existentes. A carga de cancro tambm pode ser
reduzida atravs da deteo precoce e orientao das pessoas que desenvolvem
cancro, atravs de diagnsticos precoces e tratamentos adequados. A mortalidade
pode ser reduzida se os casos forem detetados e tratados precocemente. Quando
detetado precocemente, o cancro mais propenso a responder ao tratamento efetivo
e pode resultar numa maior probabilidade de sobrevivncia, menor morbidade e
tratamento menos dispendioso. Melhorias significativas podem ser feitas na vida de
pessoas com cancro se identificado atempadamente e sem atrasos nos cuidados de
sade. O diagnstico precoce relevante em todas as configuraes e na maioria dos
cancros.
Na ausncia de diagnstico precoce, as pessoas so diagnosticadas em estdios
tardios e o tratamento curativo deixa de ser possvel. Os planos de sade devem ser
projetados para reduzir os atrasos e as barreiras aos cuidados, permitindo que as
pessoas tenham acesso ao tratamento em tempo til. Um diagnstico escrupuloso de
cancro fundamental para um tratamento apropriado e eficaz, uma vez que cada tipo
de cancro requer um tratamento especfico que compreenda uma ou mais
modalidades, como cirurgia, radioterapia e quimioterapia.
Determinar os objetivos de tratamento e cuidados paliativos um passo importante, e
os servios de sade devem ser integrados e centrados nas pessoas. O principal
objetivo deve ser curar o cancro, mas tambm melhorar a qualidade de vida da
pessoa. Isto pode ser conseguido com cuidados de apoio ou paliativos e apoio
psicossocial. Os cuidados paliativos podem ajudar as pessoas a viver de forma mais
confortvel e constituem uma necessidade humanitria urgente para pessoas em todo
o mundo com cancro. Alvio de problemas fsicos, psicossociais e espirituais podem
ser alcanados em mais de 90% dos doentes com cancro avanado atravs de
cuidados paliativos.
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1.1. Realidade Epidemiolgica do cancro da mama
Segundo a International Agency for Research on Cancer (IARC) (2016) em 2012 a
incidncia de cancro da mama em todo o mundo foi de 1,38 milhes e mais de 60%
sero sobreviventes de longo prazo depois de terminarem o tratamento definido.
O cancro da mama afeta mais mulheres do que qualquer outra doena oncolgica.
Uma em cada oito mulheres europeias vir a desenvolver cancro da mama at ao final
da vida. A associao Europa Donna acrescenta que medida que a populao
envelhece, cada vez mais mulheres sero afetadas por esta patologia, responsvel
por mais de 26% das doenas oncolgicas e mais de 17% das mortes por cancro nas
mulheres (EUROPA DONNA, 2013).
Em Portugal, anualmente so divulgados cerca de 4500 novos casos de cancro da
mama, e 1500 mulheres morrem com esta doena. Nos ltimos anos a mortalidade
por cancro da mama tem estabilizado e no pas a regio norte consta no registo
oncolgico nacional como a que tem a taxa mais baixa de mortalidade (DGS, 2014). A
DGS (2015) acrescenta que esta reduo da taxa de mortalidade deriva de duas
circunstncias: otimizao do diagnstico precoce atravs dos rastreios e melhoria das
prticas de tratamento.
1.2. Diretrizes europeias na luta contra o cancro de mama
Existem vrias recomendaes europeias sobre a luta contra o cancro da mama na
Unio Europeia. O Parlamento Europeu (2016) refere que para reduzir a taxa de
mortalidade por cancro da mama, importante implementar programas nacionais de
mamografia e fornecer tratamento para a doena. A Comisso Europeia publicou
normas de orientao para implementar centros de rastreio, diagnstico de qualidade
e unidades de mama, assentes nas melhores prticas clnicas e assistncia mdica,
com o objetivo de garantir a qualidade multidisciplinar na abordagem ao cancro da
mama e melhorar programas de assistncia que vo desde o rastreio, aos
procedimentos diagnsticos, ao tratamento e acompanhamento no cancro da mama.
O rastreio mamogrfico possibilita a deteo precoce do cancro. Esta tcnica permite
detetar neoplasias trs a quatro anos antes do aparecimento de sintomas e aumenta a
hiptese de efetuar um tratamento precoce e menos invasivo.
A qualidade da assistncia prestada atualmente s mulheres europeias com cancro da
mama varia consoante o pas e a regio e o parlamento europeu recomenda que as
mulheres europeias tenham acesso aos mesmos cuidados de qualidade no cancro da
mama preconizados, independentemente do pas ou regio onde se encontrem. O
diagnstico da doena da mama deve envolver uma equipa multidisciplinar de
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profissionais experientes e com formao e devem ser prestadas s mulheres
recomendaes prticas, de apoio e aconselhamento por enfermeiros especializados.
As mulheres devem ter acesso a cuidados de qualidade em todas as fases da doena
da mama, desde os estadios iniciais at aos mais avanados, no mbito de cuidados e
acompanhamento da mxima qualidade pela mesma equipa multidisciplinar com
implementao das melhores prticas sobretudo de comunicao, protocolos,
auditoria e gesto de padres de qualidade. As variveis psicossociais desempenham
um papel importante no tratamento do cancro, que podem facilitar ou interferir com os
resultados clnicos desejveis. Por este motivo para se otimizar os resultados dos
tratamentos oncolgicos importante integrar as necessidades psicossociais das
pessoas, e inclu-las no plano de tratamento.
O rastreio do cancro da mama constitui um programa prioritrio em termos da
Comunidade Europeia, e constitui um dos principais mecanismos de preveno do
cancro da mama e de reduo da taxa de mortalidade. Os pases da comunidade
europeia so aconselhados a elaborar diretrizes nacionais que respondam a estas
recomendaes. A DGS (2009) estabelece prioridades na abordagem doena e faz
recomendaes relativamente organizao dos servios hospitalares e orientao
mdica incluindo o tratamento.
A Norma de Orientao Clinica da Direo Geral de Sade (DGS-051/2011) refere-se
s recomendaes de diagnstico e aconselha a realizao de mamografias regulares
(2-2 anos) em mulheres assintomticas a partir dos 50 anos. Baseia-se no conceito
que a deteo de um cancro em fases precoces melhora o prognstico. Segundo a
evidncia cientfica mais atual o rastreio do cancro da mama atravs da mamografia
aconselhado pela DGS como uma medida preventiva eficaz na diminuio da
mortalidade de mulheres assintomticas e nos resultados evidentes dos padres de
morbilidade justificando assim todo o investimento.
1.3. Fatores de risco para o cancro da mama
Segundo a National Breast Cancer (2017) ningum sabe com exatido as causas do
cancro de mama. O que se sabe que o cancro de mama sempre causado por
danos do ADN de uma clula, desencadeando-se um crescimento celular
descontrolado. Esta proliferao de clulas pode ser local, com capacidade de invadir
os tecidos contguos ou metasttica constituindo leses secundarias em rgos
distantes.
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28
A mesma organizao salienta que ser mulher e ter idade avanada, o fator de risco
mais comum, no entanto existe outros fatores de risco como: Familiar com cancro da
mama, especialmente em idade jovem; Menarca precoce; Menopausa tardia;
Teraputica hormonal de substituio durante longo tempo; Ter tido o primeiro filho em
idade avanada. Constituindo-se, ainda, como risco acrescido: cancro da mama
anterior, radiao na zona do trax e carga familiar de cancro da mama muito pesada.
As mulheres com risco acrescido devem ser rastreadas com maior frequncia. A
cirurgia de reduo de risco (com mastectomia profiltica e reconstruo) pode ser
oferecida a mulheres com risco muito alto, como aquelas que tiveram radiao
torcica prvia ou so portadoras de mutao de gene (BRCA1 ou BRCA2) o que
implica um estudo gentico prvio, conforme opinio da European Society for Medical
Oncology (ESMO, 2015).
A OMS (2017) refere como fatores de risco a acrescentar aos mencionados, tambm,
a obesidade aps a menopausa e a dieta em particular quando h um consumo muito
elevado de gorduras animais, bem como, consumo de lcool e de tabaco.
1.4. Diagnstico do cancro da mama
O diagnstico do cancro de mama baseado no exame clnico em combinao com
achados imagiolgicos e confirmado por avaliao anatomopatolgica (ESMO,
2015).
Segundo Ftima Cardoso (2015) o cancro da mama uma neoplasia epitelial maligna
com capacidade de disseminao (metastizao) e a sua incidncia aumenta com a
idade. O prognstico melhor se detetado em estadios iniciais e est ligado
heterogeneidade clnica e morfolgica do tipo de tumor. A mesma autora considera,
ainda, que o conhecimento das especificidades moleculares da neoplasia constitui-se
fundamental para a deciso teraputica e consequente aumento da sobrevivncia.
De acordo coma American Cancer Society (2017) os aspetos essenciais para a
caraterizao do cancro da mama a definio do estadio da doena (estadiamento)
e compreende:
Estadio 0-Tumor in situ
Estadio I-Tumores com menos de 2 cm, sem envolvimento de gnglios
Estadio II-Tumores com menos de 5 cm com envolvimento de gnglios axilares
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Estadio III-Tumores com tamanho superior a 5 cm com invaso da pele ou da
parede torcica, comprometendo gnglios fixos na rea clavicular, no entanto
ainda sem evidncias de metstases
Estadio IV-Tumores com tamanho considervel com presena de gnglios
anormais e metstases diferentes
Alguns dos estadios tm sub-etapas que so designadas com as letras A, B e C.
O cancro de mama uma doena heterognea, e inclui vrios tipos histolgicos. Alm
das diferenas nas suas aparncias histopatolgicas, que conduzem a diferentes tipos
histolgicos de cancro de mama, tambm, estes diferem substancialmente nas suas
caractersticas clnicas e tumorais. Enquanto os carcinomas inflamatrios se traduzem
habitualmente em taxas de sobrevivncia mais baixas, os carcinomas lobular e ductal /
lobular, so caracterizados por uma mistura de caractersticas tumorais associadas
com prognsticos melhores (Silva & Oliveira, 2010).
Segundo a American Cancer Society (2017) o cancro de mama pode comear em
diferentes reas da mama: os dutos, os lbulos ou, em alguns casos, o tecido
intermdio. Existem vrios tipos desde o cancro de mama no invasivo, invasivo,
recorrente e metasttico, bem como os subtipos intrnsecos ou moleculares.
No Consenso Internacional de St. Gallen em 2015 foi considerado para orientao
teraputica, a classificao em subgrupos de cancro da mama devido
heterogeneidade clnica e morfolgica do cancro da mama, atendendo a que o
conhecimento das caractersticas moleculares implicadas na iniciao e na progresso
desta neoplasia atualmente uma ferramenta indispensvel para os avanos na
teraputica e consequente aumento da sobrevivncia. Assim, a nova classificao de
subtipos de cancro da mama baseada em caractersticas moleculares (Cardoso et
al, 2015).
1.5. Tratamento do cancro da mama
O tratamento depende do estadio em que feito o diagnstico, caractersticas
biolgicas do cancro da mama e individualidades da mulher, tais como a idade e as co
morbilidades. As modalidades de tratamento vo desde a cirurgia isolada
combinao com radioterapia, quimioterapia, terapia hormonal, e/ ou teraputicas alvo
(Cardoso et al, 2015). Em muitos casos o tratamento pode ser combinado e cada
mulher pode receber dois, trs ou mais tipos de tratamento (Costa, 2013).
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Na maioria das mulheres com cancro da mama a cirurgia ser o tratamento indicado
associada normalmente s outras formas de tratamento A cirurgia uma parte
essencial de todos os tratamentos atuais para curar o cancro de mama. Mais de 90%
das mulheres diagnosticadas so submetidas a tratamento cirrgico (Bahgat, 2016). A
deciso do tipo de tratamento cirrgico depende de fatores clnicos, tais como as
caractersticas do tumor, o tamanho, a localizao e o envolvimento ou no dos
gnglios linfticos (Scarth et al, 2002).
O gnglio sentinela o primeiro gnglio axilar que recebe a drenagem linftica do
tumor. Presentemente, realiza-se a biopsia do gnglio sentinela com o objetivo de
esclarecer o estadio e reduzir o ndice de execuo de linfadenectomia axilar. A
biopsia efetuada atravs de uma tcnica cirrgica, a linfocintilografia, com o objetivo
de traar uma imagem para apontar a localizao da drenagem linftica do tumor. O
gnglio retirado e examinado e, se positivo, realizado o esvaziamento ganglionar
axilar (DGS, 2009).
A eficcia e segurana oncolgica da cirurgia conservadora da mama com radioterapia
adjuvante o tratamento que a evidncia cientfica aconselha na sequncia da
orientao para um melhor controlo local e mnimo de morbilidade. A cirurgia
conservadora recomendada sempre que a mulher apresente condies para a
realizao de radioterapia adjuvante e quando a relao entre o volume de
tumor/volume da mama permite a tumorectomia (a exrese do tumor com uma
margem de tecido saudvel), com margens livres e um resultado esttico razovel
(Cardoso et al, 2015). Quando se prev conservao de mama antecipadamente,
necessrio marcar o stio primrio do tumor (usando um grampo de marcador
habitualmente designado por arpo sob orientao de imagem) para facilitar uma
cirurgia precisa (ESMO, 2015).
A mastectomia deve ser executada quando existe obstculo realizao de
radioterapia adjuvante, por resoluo da prpria doente (aps esclarecimento
informado) nos carcinomas multicntricos (situados em localizaes afastadas e que
no permitem a retirada em bloco de todas as leses), nos carcinomas inflamatrios,
em microcalcificaes malignas diagnosticadas por bipsia com organizao extensa
na mama e na existncia constante de margens com tumor aps vrias experincias,
em cirurgias sucessivas de preservao da mama (DGS, 2009).
De acordo com a American Cancer Society (2016) a mastectomia pode ser simples,
radical modificada ou radical. Na simples remove-se a totalidade da mama sem
remoo dos gnglios linfticos axilares ou tecido muscular encontrado sob o peito. A
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mastectomia radical modificada associa uma mastectomia simples com disseco de
gnglios linfticos axilares. Na mastectomia radical remove-se toda a mama, gnglios
linfticos axilares e msculos peitorais da parede torcica. Esta cirurgia frequente no
passado est em franco desuso, porque uma cirurgia menos extensa,
(nomeadamente, uma mastectomia radical modificada) proporciona os mesmos
resultados com menos efeitos colaterais.
A reconstruo precoce da mama ps-mastectomia por neoplasia de mama tem sido
muito usada, particularmente com a progresso dos tratamentos cirrgicos do cancro
de mama, mas as mulheres mastectomizadas podem ser submetidas reconstruo
tardia no se observando diferenas na qualidade de vida, de acordo com o tempo de
reconstruo (Seidel, 2017). A reconstruo precoce no adequada para todas as
mulheres, nomeadamente, por razes oncolgicas e particularmente no caso de
cancro inflamatrio de mama (ESMO, 2015).
De acordo com a ESMO os diversos tratamentos do cancro da mama para alm da
cirurgia constam de radioterapia, quimioterapia, teraputica hormonal e teraputica
direcionada ou alvo, sendo que:
A radioterapia usa a radiao ionizante orientando-a para a localizao especfica do
tumor podendo ser de dois tipos: radiao externa, a mais comum em que a radiao
advm de uma mquina e a radiao interna (braquiterapia) em que a radiao
provm de material radioativo includo internamente na mama; A quimioterapia recorre
a frmacos que destroem as clulas cancergenas ou limitam o seu crescimento.
Habitualmente so administrados por via endovenosa, mas alguns podem ser por via
oral; A teraputica hormonal impede que as clulas cancergenas acedam s
hormonas do organismo (estrognios e progesterona) de que precisam para se
desenvolverem. Se os testes laboratoriais demonstrarem que o tumor "positivo para
os recetores hormonais", usa-se esta teraputica para bloquear os recetores
hormonais; As teraputicas alvo que contm anticorpos monoclonais, so
medicamentos que identificam alvos nas clulas cancergenas e os combatem,
bloqueando o crescimento das clulas malignas e impossibilitando assim a sua
disseminao, sem prejudicar as clulas normais.
O tratamento do cancro da mama no uniforme, dependendo de vrios fatores como
j referimos, e pode exigir a execuo de diversas modalidades de tratamento
(cirurgia, radioterapia, quimioterapia e outras), com interveno de equipas
multidisciplinares, podendo dilatar-se no tempo devido ao aparecimento de
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complicaes no trajeto, obrigando utilizao de mais recursos, mais planos de
tratamento e mais sofrimento para estas mulheres (Cardoso et al, 2015).
1.6. Complicaes da mastectomia
As mulheres com cancro da mama esto expostas a tratamentos agressivos, efeitos
colaterais debilitantes, problemas fsicos graves. Os tratamentos que curam o cancro
da mama tambm podem causar difceis complicaes podendo a cronicidade das
mesmas ser muito limitante com impacto significativo na autonomia e qualidade de
vida pelo compromisso na realizao das atividades de vida da mulher
mastectomizada (Petito et al, 2012), tendo por vezes necessidade de readaptar a sua
atividade laboral ou ausentar-se do trabalho devido sua nova condio (Lago et al,
2015).
A mastectomia um processo cirrgico mutilante que pode acarretar repercusses
fsicas e emocionais desfavorveis conforme varias evidncias atestam (Amorim,
2007; Pinto, 2009; Costa, 2011; Rodrigues, 2012; Merncio, 2016). As mulheres com
cancro da mama, submetidas a mastectomia, confrontam-se com vrias questes
relacionadas com a doena e tratamento que interferem a variados nveis no seu
projeto de vida e que as obrigam a ajustamentos face a esses acontecimentos, tais
como, aprender a lidar com a doena que ameaa a vida e a mudanas no estilo de
vida anterior, devido s dificuldades no funcionamento fsico (Pinto, 2009). As
complicaes fsicas mais frequentes so evidenciadas por vrios autores na
sequncia de estudos desenvolvidos:
Panobianco e Mamede (2002) na investigao que efetuaram com 17 mulheres
submetidas a cirurgia por cancro de mama verificaram que ocorreram complicaes
em todas as mulheres, trs meses depois da cirurgia, das quais destacam: limitao
da amplitude de movimento (64,7%), dor (41 %), edema (64,7%), seroma (41,1%) e
deiscncia (47%).
A diminuio da amplitude de movimentos do ombro causa dificuldade no
desempenho de algumas atividades que envolvem amplitudes de movimento maior,
sendo restritiva na realizao das atividades de vida diria (Cames, 2014), uma vez
que a falta de fora muscular consequente mastectomia altera a funcionalidade do
membro superior homolateral (Silva et al, 2010).
O estudo de Merncio (2016) apresenta como principais complicaes a limitao da
amplitude articular, a dor a nvel da regio cervical, trax e membro superior
homolateral, bem como linfedema.
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O estudo de Lahoz et al (2010) sobre capacidade funcional e qualidade de vida em
mulheres mastectomizadas concluiu que havia diminuio da amplitude de movimento
e da fora muscular nos movimentos de rotao lateral, flexo e abduo do ombro no
membro superior homolateral mastectomia combinada com dor no ombro, os
mesmos autores tambm referem como complicaes o linfedema e a alterao da
funcionalidade do membro homolateral.
Na investigao de Silva et al (2010) os autores concluram que 15% das mulheres
mastectomizadas apresentavam diminuio da amplitude do movimento do ombro e
40% referiam dor no ombro.
Marques-Vieira & Sousa (2016) apoiados em vrios autores referem que o linfedema
surge entre 6% e 83% das mulheres mastectomizada, dependendo do tipo de cirurgia
e radiao, normalmente entre o primeiro e o segundo ano ps-mastectomia mas o
risco mantem-se at uma dcada.
O linfedema uma das maiores complicaes da mulher mastectomizada (Vieiros et
al 2007). Segundo a Rede de Referenciao Hospitalar de Medicina Fsica e de
Reabilitao (RRHMFR, 2016), no existem dados consistentes da prevalncia do
linfedema em Portugal. A mesma fonte reporta-nos para os dados publicados pelo
National Cancer Institute (NCI, 2014), que refere uma incidncia nos primeiros dois
anos aps a cirurgia por cancro da mama de 8 a 56%. Em Portugal existiram em 2013,
8 056 registos de alta hospitalar com este diagnstico. A prevalncia estimada de
linfedema de cerca de 20%. Este nmero varia com a existncia de condies que
aumentam a sua ocorrncia, como radioterapia, nmero de gnglios removidos, a
coexistncia de esvaziamento ganglionar com radioterapia, extenso da cirurgia (cerca
de 30% na mastectomia radical e 10% na cirurgia conservadora) (RRHMFR, 2016).
O linfedema caracteriza-se por uma acumulao de linfa nos espaos intersticiais.
Este edema pode variar de um grau reduzido para um mais severo, pode comear
aps a cirurgia, aps a radioterapia ou anos mais tarde. Os sintomas podem incluir
fadiga acentuada, membro tumefacto e pesado pela acumulao localizada de fluido e
eventualmente deformidade (elefantase) causa de importantes alteraes fsicas,
psicolgicas e sociais pela consequente aparncia inesttica e funcionalidade
diminuda. Se o linfedema no tratado o volume do membro aumenta
progressivamente e consequentemente aumentam as complicaes como as
linfangites e erisipelas (Bergman et al, 2004).
Os exerccios teraputicos tm inmeros benefcios para todas as mulheres
submetidas a mastectomia. Os exerccios so essenciais para a preveno do
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encurtamento dos msculos, preveno da contratura de articulaes e a melhoria na
circulao da linfa e sangunea aps a mastectomia (Bergman et al, 2006).
1.7. As sobreviventes de cancro de mama
De acordo com a definio do National Cancer Institute (2003) o sobrevivente toda a
pessoa com o diagnstico de cancro que vive para alm de cinco anos aps o
diagnstico sem evidncia de doena.
As sobreviventes de cancro de mama (incluindo as mastectomizadas) ao ganhar em
anos de vida perdem em qualidade de vida pela toxicidade provocada pelos
tratamentos. Nesta sequncia correm risco de surgirem outros tumores secundrios,
co morbilidades por doenas cardiovasculares ou sseas, doenas crnicas,
cardacas, diabetes e obesidade mantendo as sequelas fsicas e alteraes j
mencionadas (Cardoso et al, 2015). A recorrncia do cancro da mama mais comum
nos primeiros cinco anos, mas pode ocorrer at dcadas aps o tratamento. A gesto
das doenas crnicas instaladas e o acompanhamento e vigilncia das mulheres
sobreviventes no que diz respeito preveno da ocorrncia da recidiva ou de um
segundo tumor constitui-se de grande importncia (Cardoso et al, 2015).
Nas sobreviventes de cancro da mama, impe-se a implicao de uma equipa
multidisciplinar que face s reais necessidades destas mulheres, ajude a encontrar os
cuidados de excelncia e as motivem para um investimento em parcerias com estas
na procura da melhor informao, capacitao e reabilitao para uma efetiva gesto
da doena, num acompanhamento efetivo dos seus percursos de vida e de
sade/doena, onde o enfermeiro de reabilitao tem um papel fundamental.
Silver (2015) refere que as sobreviventes em consequncia dos tratamentos sofrem
um conjunto extremamente complexo de problemas afetando todos os sistemas e
rgos que contribuem para uma diminuio da qualidade de vida. Segundo o autor a
evidncia cientfica mostrou que a reabilitao melhora a dor, funo e qualidade de
vida e as intervenes de reabilitao podem melhorar as limitaes fsicas em todas
as fases.
Face ao referido anteriormente as sobreviventes de cancro de mama podem conseguir
uma re-significao para as suas vidas, experimentarem atividades que no faziam
antes, mudarem o seu modo de viver dando importncia a uma segunda oportunidade
de viver (Frohlich et al, 2014) apesar do processo de cronicidade inerente.
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2. DA GESTO DO PERCURSO DA DOENA PARA A GESTO DO
PERCURSO DE VIDA
A sade de cada pessoa liga-se a mltiplas dimenses especialmente ao seu projeto
de vida mas irrefutvel que todos devem ter acesso aos meios e recursos que lhes
possibilitem desenvolver capacidades e competncias para percorrer um caminho em
direo ao bem-estar fsico, psquico e social (OE, 2011).
Neste contexto devem ser maximizadas as intervenes dos profissionais de sade
que promovam ajustamento s limitaes impostas pela doena ou incapacidades da
mesma e desenvolvam estratgias adaptativas para a resoluo de problemas,
facilitadoras de uma vivncia de emoes e sentimentos positivos, mesmo em
doenas crnicas e restritivas para a capacidade de viver como o cancro. Mas, ainda
persistem modelos de cuidados que no respondem s necessidades
multidimensionais que as pessoas com doena crnica apresentam (Guerra, 2009) e
concretamente no caso de pessoas com cancro encontram-se desajustados.
O atual contexto das polticas de sade favorvel adoo de prticas que
valorizam o percurso das pessoas atravs dos processos de cuidados de sade que
elas experienciam acrescentando a ideia de literacia e educao em sade,
autocuidado e envolvimento como estratgia de capacitao para aumentar o controlo
das pessoas sobre a sua sade e sobre a sua vida. O enfermeiro de reabilitao deve
promover a autonomia e a construo de um novo conceito de ser saudvel (OE,
2012) pessoa com cancro partilhando a reorientao do seu percurso de vida e do
readquirir de um sentido apesar das limitaes que a gesto da doena impe.
2.1. Gesto da doena crnica
As doenas crnicas matam 40 milhes de pessoas a cada ano, o equivalente a 70%
das mortes que ocorrem no mundo (WHO, 2017). Em Portugal, semelhana dos
outros pases da Europa estima-se que 50% da populao tem uma doena crnica e
25% tem duas ou mais (DGS, 2014).
A doena crnica carateriza-se pela sua progresso lenta e longa durao no
resolvida habitualmente num curto espao de tempo (DGS, 2016) sendo que o
sofrimento e os custos que estas doenas causam transformam-nas em doenas
sociais para os sistemas de sade (Escoval, 2010).
Os sistemas de sade e as organizaes que os integram numa tentativa de
proporcionarem a resposta mais ajustada s crescentes necessidades dos indivduos
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enfrentam desafios que se ligam a novos paradigmas. A identificao desta realidade
tem levado os governos de vrios pases a determinar polticas norteadas pelos
problemas de sade em concreto e a definir estratgias de interveno que favoream
uma abordagem integrada de melhoria do nvel de sade das populaes, da
qualidade dos cuidados de sade e de eficincia no uso de recursos disponveis
(Escoval, 2009).
O governo portugus ao determinar a Coordenao Estratgica para a Preveno e
Gesto da Doena Crnica atravs do Despacho n. 4027-A/2016 reconhece o
importante desafio para os sistemas de sade das doenas de evoluo
prolongada/doenas crnicas e a necessidade de integrao de atuaes preventivas
e de continuidade de cuidados. No mesmo documento considera que a obteno de
bons resultados na preveno e gesto das doenas crnicas implicam um elevado
nvel de literacia em sade e defende sistemas centrados na pessoa e no seu
percurso de vida, nos processos de cuidados de sade que experimenta e na
capacidade que cada um tem de realizar o seu potencial de bem-estar.
A redefinio dos cuidados de sade em Portugal que as novas politicas emanam
visam transformar os cuidados de sade, recentrando-os mais nas pessoas do que
nas organizaes de sade. Neste sentido torna-se fundamental um cuidar centrado
na educao em sade e na promoo da autonomia ao longo do percurso de vida
das pessoas considerando as expectativas e necessidades especficas de cada
doente.
Na Estratgia Nacional para a Preveno e Gesto da Doena Crnica a DGS
considera a educao teraputica do doente uma interveno com muito potencial de
efetividade na melhoria dos resultados em sade. Nesta sequncia surge o Programa
Nacional de Educao para a Sade, Literacia e Autocuidados que refora o papel do
cidado no sistema de sade portugus e o papel da informao e do conhecimento
no percurso de sade/doena (DGS, 2016).
O desenvolvimento de estratgias para alinhar as polticas de sade do PNS 2011-
2016, atravs de aes efetivas fundamentadas na evidncia, torna-se vital.
Desconsiderar o peso desta evidncia concretizada em experincias internacionais
eficazes e no a aceitar como estratgia de futuro para a gesto das doenas
crnicas, pode representar desperdcio (Guerra, 2010).
A aplicao dos princpios que esto na base dos modelos de gesto da doena
orienta para um modelo de Gesto Integrada da Doena (GID), que incorpora a gesto
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clnica da doena, centrada na pessoa, com especial enfoque na sua autogesto e na
clarificao das melhores prticas profissionais (Escoval, 2009).
A aplicao do modelo GID j est a ser feita para a insuficincia renal crnica,
conforme Circular Normativa N03/ DGS: 22/02/08 e planeada ou em implementao
para a obesidade, esclerose mltipla, retinopatia diabtica entre outros.
Os modelos de GID segundo a DGS (2016) num futuro prximo podero ser
facilitadores para todos os envolvidos: pessoas, mdicos, enfermeiros ou ainda outros
profissionais, como os das reas psicossociais e de reabilitao na medida em que
articula a melhoria da prestao de cuidados de sade, maior efetividade e eficincia
dos cuidados de sade, mais ganhos em sade e a satisfao de todos os implicados.
Este modelo prope uma ao harmonizada mobilizando os recursos de forma
ajustada para otimizar o estado de sade, a qualidade de vida e o bem-estar global
das pessoas. Esta abordagem atravessa os diferentes nveis de prestao de
cuidados perspetivando cuidados integrados de sade, com nveis de qualidade na
preveno, diagnstico, tratamento, reabilitao e acompanhamento (Escoval, 2010).
Sakedelallarides et al (2016) no artigo contrariar o destino, refere que no contexto
portugus e europeu as reformas de proximidade na sade assumem-se de grande
importncia assim como a inteligncia colaborativa para as levar a cabo. A este
propsito refere que as reformas de proximidade resultam essencialmente de
inovaes organizacionais e tem a ver com mudana da gesto das organizaes para
a gesto do percurso das pessoas atravs dos processos de cuidados de sade que
elas experienciam acrescentando a ideia de literacia e educao em sade,
autocuidado e envolvimento como estratgia de capacitao para aumentar o controlo
das pessoas sobre a sua sade.
Tendo em ateno as aes circunscritas ao percurso de vida das pessoas e os
respetivos percursos atravs dos servios de sade, o enfermeiro deve ter um papel
facilitador no processo de autogesto da doena crnica, implementando intervenes
centradas na pessoa, proporcionando a aquisio de conhecimento que permite ao
doente ultrapassar obstculos e constrangimentos. O enfermeiro de reabilitao ao
intervir em situaes particulares de sade/doena refora o potencial de cada pessoa
para o autocuidado e contribui para a minimizao do impacto da doena nas suas
atividades de vida promovendo o processo de autonomia e a construo de um novo
conceito de ser saudvel no indivduo.
No atual contexto das polticas de sade as reformas de proximidade centradas nos
percursos das pessoas tm como objetivo obter sinergias entre os diversos nveis de
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cuidados, incentivam o desenvolvimento de programas de acompanhamento e
educao para a gesto da doena e potenciam a adoo de prticas de autogesto.
Por outro lado advogam a criao de condies necessrias ao bem-estar e melhor
gesto da doena crnica integrando reformas de proximidade como programas de
apoio domicilirio (visita domiciliria) e modalidades de hospitalizao domiciliria,
entre outros.
Neste enquadramento valoriza-se a inovao das prticas e de modelos de cuidados
onde a informao fornecida pelos profissionais na aquisio do conhecimento
capacita para o autocuidado e a gesto do seu projeto de sade e de vida, criando
valor para todos, contrariando o destino e respondendo s efetivas necessidades em
sade das pessoas (Sakedelallarides et al, 2016). Segundo a DGS (2014, p.6) ...os
enfermeiros tm particular vocao para prestarem cuidados numa lgica de
proximidade devido disponibilidade, viso holstica e integrada que incorporam no
momento das suas intervenes.
Face ao referido anteriormente os enfermeiros e particularmente os enfermeiros de
reabilitao tem a possibilidade, a competncia e a responsabilidade de intervir
eficazmente nestes processos. Na atualidade precisamos de enfermeiros
empreendedores e investigadores que aliem prticas de cuidados investigao e a
outras evidencias demonstradas. Urge pensar criticamente e encontrar alternativas
que possam oferecer servios que anteriormente nunca foram prestados (ou foram
pouco), face a novos problemas da prtica fundamental projetar novos olhares
(Lemos, 2012 in OE).
2.2. Da informao capacitao na doena crnica
A informao constitui uma real necessidade para as pessoas uma vez que possibilita
o desenvolvimento de atitudes positivas no lidar com a doena, o encontrar de
solues ajustadas s condies situacionais, participao real nos processos de
deciso e gesto do processo de sade/doena. A informao conquista papel
essencial nas intervenes de educao para a sade (Martins, 2003).
Para as pessoas com doena crnica a informao torna-se um instrumento
significativo para a gesto da sua vida na medida em que reduz a incerteza, ajuda o
individuo a lidar com a doena e auxilia no desenvolvimento de ajustamentos. A
informao fundamental porque regula a atitude face doena, tomada de deciso
e s aes da pessoa e famlia, influenciando a sua qualidade de vida. Todavia na
prtica, nem sempre os profissionais tm observado o seu dever de informar de um
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modo completo e efetivo, nem as pessoas conseguem ter satisfeito um direito
fundamental (Martins, 2003).
Face ao supradito consideramos que alguns profissionais de sade na qual se incluem
os enfermeiros tm receio de fornecer informao, sobretudo em situaes de doena
com prognstico reservado. No entanto, concordamos com Martins (2008) ao
considerar que o enfermeiro sabe perceber quando o momento apropriado para
fornecer a informao e quanta informao a pessoa consegue suportar. Esta
apreciao assumida pelo autor como um privilgio de interao com o doente, de
ajuda e de proximidade.
Neste sentido salientamos o dever tico demandado na Carta dos Direitos e Deveres
do Doente sobre o direito a ser informado sobre a sua situao de sade (DGS, 1999)
e o dever de informao do cdigo deontolgico (2015) que legitima a
responsabilidade do enfermeiro em garantir o direito informao. Para o conseguir
dever disponibilizar informao adequada conforme a capacidade de entendimento, a
personalidade e todas as especificidades de cada situao e da pessoa em causa.
Apesar de fazermos referncia ao direito a ser informada (da pessoa) e ao dever de
informar (do enfermeiro) e valorizarmos a sua importncia optamos por no explanar a
problemtica da informao na perspetiva tica balizando-a na perspetiva funcional ou
seja contedo de informao de sade a fornecer, forma tima para otimizar o
conhecimento permitindo a apropriao da mesma, j que muitas vezes as estratgias
circunstanciais falham por no estarem centradas nas reais necessidades das
pessoas, havendo discrepncias entre o que os profissionais consideram ser as
necessidades de informao e as que efetivamente as pessoas necessitam. Importa
ainda, atender a outro tipo de barreiras que se constituam como obstculo a uma
efetiva educao para a sade.
Assim, o enfermeiro deve identificar as necessidades de aprendizagem especficas,
valorizando as preocupaes, reconhecendo as barreiras existentes aprendizagem e
as estratgias facilitadoras. A educao para a sade algo "vivo" e deve ser
redefinida em funo de novas necessidades e situaes que surjam ao longo deste
percurso. Nunca poder ser uma mera transmisso de informao, mas pelo contrrio
uma resposta adequada s necessidades de informao de cada pessoa (OE, 2009).
Apesar de ser benfico existir padres ou linhas orientadoras baseadas na evidncia
para situaes de cuidados especficos, que se revelam estruturantes na informao a
transmitir, esta dever ser personalizada, considerando cada pessoa e toda a sua
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singularidade, tendo por base um programa estruturante (Pereira, 2005; Martins, 2008;
Alves et al, 2010; Costa, 2011; Rodrigues, 2012; Silva, 2016).
Neste seguimento impem-se estratgias para criar tempo e espao que muitas
vezes os profissionais no tm e os servios no disponibilizam. Exige-se ateno e
empatia, escuta ativa e interao, uma verdadeira preocupao com a pessoa, um
atender s diferenas individuais e atitudes potenciadoras de capacitao. Justifica-se,
pois, um maior investimento na procura das melhores estratgias de informao para
que o doente crnico adquira conhecimento e capacitao e consequentemente
melhor qualidade de vida pela gesto do seu processo de doena.
A OMS preconiza que deve haver oportunidades conscientemente construdas para
aprender e processos de comunicao destinados a melhorar o conhecimento e a
desenvolver habilidades para a vida. Desta maneira deve incluir-se neste processo
todo o contexto de vida da pessoa como as condies familiares, sociais, econmicas
e ambientais, o risco clinico individual (comorbilidades e complicaes da doena) e
uso do sistema de sade.
O desafio atual o de conceber dinmicas que incitem evoluo de uma situao
onde prevalece a diminuta informao e a subordinao aos conhecimentos e s
aes dos profissionais de sade para inter-relaes de desenvolvimento e partilha
contnua de informao e de conhecimento (literacia em sade), de pro-atividade, de
auto- gesto (capacitao) com vista autonomia possvel na sade de cada um (PNS
2011-2016).
A OMS enuncia que existe evidncia importante no que se refere implementao de
prticas de acompanhamento, aconselhamento, educao e confirmao da
informao apreendida, com a melhoria de resultados de sade das pessoas sujeitas
a condies de cronicidade (WHO, 2002). O reconhecimento de que as doenas
crnicas so incurveis torna essencial a participao contnua da pessoa nas prticas
de sade de forma a maximizar a sade e prevenir incapacidades.
O conceito de literacia em sade hoje percebido como integrador de vrios nveis de
capacitao, podendo ser definido como a capacidade para processar e compreender
informao e orientao nos servios de sade, fazer escolhas de sade adequadas,
(Santos, 2010) e adoo de um papel ativo relativamente gesto da sua doena e
autocuidado. Este conceito dinmico de literacia em sade integra competncias
cognitivas e sociais e a capacidade de cada um aceder e compreender a informao
que lhes permita agir para promover e manter uma boa sade bem como tomar
decises na sua sade e projeto de vida. A OMS considera a literacia em sade como
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o conhecimento, motivao e competncia dos indivduos para aceder, perceber,
avaliar e aplicar informao em sade, para tomar decises e manter ou melhorar a
qualidade de vida sendo que a qualidade de vida constitui um objetivo na vida de
qualquer pessoa e na construo do caminho imposto pelos obstculos que vo
surgindo (Soares, 2012).
A sade de cada pessoa conecta-se a mltiplas dimenses especialmente ao seu
projeto de vida em consonncia com a interpretao que cada um faz de si e do
mundo, da sua trajetria de vida, sade/doena e das pessoas com as quais se
relaciona percorrendo um caminho em direo ao bem-estar fsico, psquico e social
(OE,2011). Este processo de aquisio de conhecimentos e competncias reconhece
os indivduos como sujeitos ativos no seu processo de sade, concordando que os
mesmos possuem capacidades que lhes permitem desenvolver a autonomia, para isso
os profissionais devem envolver a pessoa no processo de cuidados considerando a
cultura onde est inserida (Uwazie, 2016).
A DGS (2016) considera que a capacitao em sade constitui uma estratgia de
grande pertinncia para dotar o sistema de sade de parceiros ativos na gesto da
sade e da doena face s emergentes necessidades de mudana na sade. Esta
estratgia permite ganhos em sade manifestados por ganhos em anos de vida, por
diminuio de eventos de doena ou com menos gravidade, pela reduo de
incapacidades transitrias ou definitivas melhorando a funcionalidade fsica e
psicossocial e aumentando a qualidade de vida imposta pela condio de sade.
Para ajudar a gerir eficazmente os processos de sade/ doena das pessoas os
enfermeiros devem reforar a confiana destas nas suas prprias capacidades e
habilidades de vida porque estas levam a comportamentos adaptativos e positivos, e
permitem-lhes lidar eficazmente com os desafios da sua vida, que incluem as
situaes de sade/doena.
Destas habilidades de vida constam habilidades pessoais, interpessoais, cognitivas e
fsicas que permitem s pessoas controlar e nortear as suas vidas, desenvolvendo a
capacidade de viver. Neste contexto as intervenes dos profissionais de sade
promovem ajustamento s limitaes impostas pela doena ou complicaes da
mesma, tornam-se uma mais-valia no desenvolvimento de estratgias adaptativas
para a resoluo de problemas, facilitadoras de uma vivncia de emoes e
sentimentos positivos, mesmo em doenas crnicas e restritivas para essa capacidade
de viver como o cancro.
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2.3. O cancro, uma doena crnica
Os avanos cientficos na rea da oncologia so responsveis pela mudana de
paradigma em relao ao cancro tendo a doena passado de fatal a crnica. As
pessoas com cancro atualmente sobrevivem cada vez mais anos devido ao
diagnstico precoce e a tratamentos mais eficazes. O Programa Nacional para as
doenas oncolgicas (DGS, 2013) refere que os sobreviventes com cancro com
problemas clnicos e sociais especficos constituem uma nova populao em
crescimento que impem uma abordagem multidisciplinar que continua para l das
instituies de sade. Conforme menciona Hoeman (2011) o cancro assume assim o
estatuto de doena crnica com sequelas a nvel funcional, fsico, psicolgico,
emocional, espiritual e os sobreviventes de cancro tm que lidar com a incapacidade e
o compromisso funcional como a maioria dos doentes em reabilitao.
As doenas oncolgicas tm um profundo impacto nos doentes, nos familiares e na
sociedade em geral (DGS, 2007) e as pessoas com cancro tm vivncias do seu
processo de doena nicas e individuais que derivam da sua unicidade como pessoas
e do decurso da doena. A maior ou menor qualidade de vida reflete-se nessas
vivncias bem como na perceo dos mesmos em relao forma como as suas
necessidades so satisfeitas ou se lhes esto a ser negadas oportunidades para
alcanar a felicidade e a realizao do seu projeto de vida.
Cada vez mais, a doena oncolgica vista como uma condio crnica com
cuidados complexos e uma problemtica que exige processos de qualidade
centralizados na pessoa e na sua trajetria da doena. O acompanhamento constitui
um processo importante na passagem de pessoa com cancro para sobrevivente de
cancro. O valor dos cuidados de enfermagem neste processo referido em diferentes
territrios e populaes com cancro no domnio da gesto da doena. No
acompanhamento destas pessoas o grande objetivo que se impe o de desenvolver
abordagens que promovam o conhecimento, as habilidade e capacidades para a
pessoa gerir a doena e os efeitos desfavorveis dos tratamentos.
A efetiva resposta s necessidades da pessoa de forma holstica engloba aes de
preveno de doenas, diagnstico, tratamento e cuidados de reabilitao e almeja a
articulao de estratgias na abordagem ao doente com cancro, com intervenes de
acompanhamento, com vista capacitao e melhoria da qualidade de vida de que
so exemplos muitas abordagens internacionais e algumas nacionais.
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3. REABILITAO DA MULHER MASTECTOMIZADA NUM
CONTINUUM DE CUIDADOS
Segundo a Rede Nacional de Especialidade Hospitalar e de Referenciao de
Medicina Fsica e Reabilitao A Reabilitao eficaz na reduo da sobrecarga da
incapacidade e na potenciao das oportunidades de vida para os indivduos
incapacitados. Os seus custos so habitualmente inferiores aos que teriam que ser
assumidos pelos servios de sade caso no se proporcionassem tais servios (2016,
p.13).
A mesma rede adianta que a reabilitao constitui uma conquista civilizacional
reconhecida como direito fundamental na Carta das Naes Unidas e na Resoluo da
Assembleia Mundial da Sade de 2005 e deve inspirar-se num espirito humanista e
multidisciplinar integrando o trabalho de vrios profissionais com objetivos partilhados
centrados no doente e com intervenes geradoras de sinergias de forma a potenciar
a sade a nvel fsico, cognitivo e motivacional e no s a vertente da funcionalidade.
Nesta sequncia propem processos de reabilitao segundo um modelo de atuao
precoce, com inicio durante a fase aguda da doena (internamento hospitalar)
recomendando para as fases posteriores (ps-alta) a continuidade de cuidados de
reabilitao em ambulatrio e cuidados de manuteno (domicilirio ou em servios
especficos) numa verdadeira continuidade de cuidados. Acrescenta, ainda, que
considerando a reabilitao, ...imbuda de um esprito globalizante, humanista e
multidisciplinar, a reabilitao, para atingir as metas que se prope alcanar, deve
assentar num trabalho integrado de diferentes profissionais, onde as aes
desenvolvidas devero ser convergentes e sinrgicas, segundo uma estratgia com
objetivos comuns, centrados no doente( 2016, p.14), em todos os contextos desde os
cuidados intensivos at aos cuidados de ambulatrio, domicilirios e paliativos.
A viso contempornea da reabilitao na pessoa com cancro assinalada na
orientao National Institute for Health and Care Excellence (NICE) (2010) que a
considera como um conjunto integrado de dinmicas teraputicas direcionadas para a
pessoa desenvolver o seu potencial fsico, psicolgico e social otimizando a mxima
independncia nas atividades da vida diria e qualidade de vida para se adaptar sua
nova condio.
Nesta conceptualizao a NICE considera que a reabilitao possibilita um caminho
significativo para melhorar a qualidade de vida no sendo importante o tempo de vida
que se espera que a pessoa tenha. Este sentido valida a maximizao da dignidade e
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o impacto que o cancro tem na vida da pessoa nos vrios domnios: fsico, psicolgico
e social, introduzindo tambm a ideia de poder haver finitude. Nesta conceptualizao
inclui o reconhecimento de que, a reabilitao na doena oncolgica pode ser
preventiva, restauradora, solidria e paliativa e neste sentido a reabilitao para
pessoas com cancro deve destinar-se a todos, num continuum de ligao entre dois
ou mais estdios que se misturam de modo que seja impossvel identificar a transio
de um estadio para o outro. Salienta que ao longo do percurso de tratamento do
cancro importante que cada pessoa seja capaz de autogerir a sua condio e caso
as suas necessidades se tornem complexas, possa aceder a cuidados especficos
multidisciplinares.
A autogesto deve ser gerida atravs de um continuum dando nfase reabilitao e
informao. A reabilitao na pessoa com cancro deve ser flexvel, compartilhando
conhecimentos e ajudando a pessoa a viver bem dentro de sua doena dando
resposta s suas necessidades. Leblanc (2015) referindo-se reabilitao oncolgica
considera que, se estimado como uma resoluo de qualidade inferior no receber
reabilitao em doenas ortopdicas ou cerebrovasculares, tambm o dever ser em
doenas oncolgicas.
Silver (2015) introduz um novo conceito na reabilitao do doente com cancro o da
pr-reabilitao considerando-a um contnuo de cuidados que ocorre desde o
diagnstico at ao incio dos tratamentos e que inclui avaliaes fsicas e psicolgicas
para caraterizar o nvel funcional basal e reconhecer eventuais limitaes ou
compromissos que orientariam as intervenes a definir posteriormente. Considera
que a pr-reabilitao apoia a preparao das pessoas recm-diagnosticadas e
otimiza a sua sade antes de iniciar tratamentos agudos. Sugere abordagens
multidimensionais seguindo o princpio de uma avaliao global e integral de cada
pessoa.
A nvel global surgem configuraes de cuidados de acompanhamento da pessoa com
doena crnica oncolgica congruentes com o estado de desenvolvimento das
polticas de sade, do desenvolvimento das profisses de sade e da abertura da
sociedade a novos modelos. Estas novas configuraes incluem a (re) definio e
qualificao dos profissionais de sade face aos novos desafios e formatos inovadores
variados onde se incluiu a reabilitao. No que se refere reabilitao as equipas
incluem modalidades de acompanhamento fsico, mas tambm como complemento
por telefone ou com recurso a outras tecnologias.
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Na globalidade das filosofias todos incorporam a equipa multidisciplinar como a pedra
angular da melhoria da qualidade dos cuidados prestados pessoa com cancro e a
integrao da enfermagem e da reabilitao na melhor prtica, considerando-se que
as duas podem ser coexistentes no enfermeiro de reabilitao.
Na Blgica existe um plano de reabilitao funcional para as pessoas com cancro em
fase de remisso a nvel nacional. Trata-se de um plano integrado de auxlio
reintegrao na sociedade para melhorar a qualidade de vida englobando a pessoa
como parceira na definio de metas para a sua vida. As atividades so organizadas
sob coordenao de um grupo de profissionais de sade em oncologia e reabilitao,
mas tambm, incluem profissionais ligados educao fsica com programas de
atividade fsica concebida para pessoas com cancro. Este programa para pessoas
com cancro durante o tratamento ou at um ano depois. Paralelamente existe um
projeto de reabilitao oncolgica para pessoas com cancro de mama, para garantir a
melhor qualidade possvel de vida aps os tratamentos e visa reduzir o impacto de
efeitos colaterais atravs da reabilitao.
Na Austrlia, na Amrica e em Inglaterra existem enfermeiros especializados a cuidar
de mulheres com cancro da mama (Breast care nurses). Estes enfermeiros tm um
conhecimento aprofundado da condio das mulheres com cancro da mama e fazem o
acompanhamento desde o diagnstico, tratamento e follow-up destas mulheres,
integrados numa equipa multidisciplinar. Fornecem, tambm, apoio e informao sobre
a gesto da doena e tratamento, assumindo-se como facilitadores que auxiliam a
travessia atravs do emaranhado do sistema de sade (patient navigator) (Pedro,
2015).
No Reino Unido existem enfermeiros de ligao (liaison nurses) que so responsveis
pelos cuidados de Enfermagem ps-alta e acompanhamento em processos de
reabilitao, educao e seguimento das pessoas com cancro.
No Qubec a enfermeira piv em oncologia (infirmire pivot en oncologie) est
integrada numa equipe interdisciplinar especializada. A sua funo consiste em avaliar
todas as necessidades da pessoa com cancro: ensina, fornece informaes, orienta e
fornece suporte. A sua contribuio para a equipe essencial para a coordenao dos
cuidados. Pommaz ( 2016) reala o seu papel fundamental na compreenso da pessoa
e na promoo da adaptao doena, ajudando-a a lidar com o cancro.
Em Frana existe a figura de enfermeiro coordenador do caminho complexo dos
cuidados (infirmir coordinateur de parcours complexe de soins). Segundo a definio
fornecida pela Escola Francesa de Sade Pblica caracteriza-se principalmente por
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intervenes que contribui para a eficincia da deciso do cuidado interdisciplinar e
para o sucesso do percurso de doena da pessoa.
Em todas estas experincias existem aspetos coincidentes e unificadores que se
resumem ao papel de fio condutor ou elo de ligao entre as vrias necessidades de
cuidados que a pessoa necessita, onde o enfermeiro proporciona uma experincia de
cuidado centralizadora.
Baseados na viso contempornea da reabilitao em pessoas com cancro
assinalada na orientao NICE princpios que vrios especialistas de reabilitao
estabeleceram acerca das intervenes de reabilitao para estas pessoas,
nomeadamente, disponibilidade dos profissionais para oferecer cuidados abrangentes;
abordagem multidisciplinar para as necessidades dos doentes e dos seus problemas
reais ou potenciais; equipas de sade que devem desenvolver objetivos de
reabilitao dentro das limitaes impostas pela doena; definio de objetivos
realistas e atingveis para motivar as pessoas com cancro e demonstrar resultados
obtidos pela sua participao; a reabilitao deve prestar cuidados ao longo do curso
da doena e os planos de reabilitao devem ser individualizados e adequados s
necessidades especficas de cada pessoa.
Implcito ao patenteado acerca da reabilitao da pessoa com cancro situa-se a
especialidade de enfermagem de reabilitao por se incluir nos conceitos e contributos
advindos das suas intervenes no cenrio da sade portugus permitindo ganhos em
sade no mbito da independncia funcional e de autonomia entre outros.
Assume-se assim a reabilitao da pessoa (com cancro) como um processo contnuo
de respostas de reabilitao no desenvolvimento da doena e das necessidades da
pessoa, pois considera-se que conduz a ganhos em sade com respetivos ganhos
econmico-financeiros para a pessoa e para a sociedade (Rocha, 2016).
Corroboramos o referido por Rocha (2016) na convico de que os Enfermeiros
Especialistas em Enfermagem de Reabilitao (EEER) possuem competncias
acrescidas e de proximidade e esto mais aptos a integrar todas as vertentes dos
cuidados essenciais pessoa com incapacidade para o autocuidado, proporcionando-
lhe o readquirir de habilidades e/ou diminuio de limitaes que surgirem neste
percurso de doena.
As competncias especficas do EEER permitem conceber, implementar e avaliar um
plano individual de intervenes especficas de cuidados de Enfermagem de
Reabilitao apropriadas s necessidades e objetivos teraputicos de cada pessoa no
sentido de responder aos seus problemas.
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A Association of Rehabilitation Nurses (ARN) (2008) refere-se aos enfermeiros de
reabilitao como aqueles que possuem um conjunto de habilidades nicas, que
compreende o conhecimento e a compreenso da gesto de cuidados e que esse
conjunto de habilidades permite prestar cuidados com base nas necessidades da
pessoa/famlia. Defende que ao centrar os cuidados na pessoa atuando de forma
holstica, promovem maior qualidade, segurana e eficincia nos cuidados, resultando
em melhores resultados de sade.
A American Nurses Association (ANA, 2012) refere que um enfermeiro com formao
em enfermagem de reabilitao o profissional de sade que mais capaz para
coordenar, apoiar, facilitar, educar e informar qualquer pessoa com doena crnica.
A ARN (2008) recomenda que deve ser avaliado o impacto dos enfermeiros de
reabilitao no sistema de prestao de cuidados de sade, incluindo o papel de
gestor de caso na gesto da doena mantendo a perspetiva da trajetria da doena e
a recuperao no continuum de cuidados ao longo da vida. Nestas situaes
considera que o enfermeiro de reabilitao auxilia as pessoas na adaptao a um
estilo de vida, proporcionando um ambiente teraputico.
Os cuidados de enfermagem de reabilitao s pessoas com cancro so imperativos
para a qualidade de vida das pessoas e norteiam-se pela mxima autonomia e
independncia das pessoas portadoras de limitao potencialmente recupervel ou
pela manuteno e preveno de complicaes daquelas que forem irreversveis,
ajudando-as a viver o melhor possvel.
A ARN (2008) considera que a enfermagem de reabilitao na pessoa com cancro tem
um papel fundamental na equipe interdisciplinar e essencial na criao de um
ambiente favorvel para a qualidade dos cuidados pessoa. As orientaes da ARN
relativamente aos cuidados de reabilitao na pessoa com cancro so que: a
reabilitao faz parte dos cuidados de qualidade e um direito para todas as pessoas
com cancro e deve ser uma opo para todas as pessoas que tenham capacidade de
participao. Salienta, ainda, que a reabilitao incorpora o indivduo e a famlia como
parceiros plenamente informados e decisores e que a reabilitao na pessoa com
cancro inclui acesso oportuno para uma abordagem coordenada, abrangente e
interdisciplinar. Destaca ainda que a reabilitao melhor coordenada por enfermeiros
com especialidade de reabilitao, podendo s-lo por enfermeiros certificados em
oncologia e que os programas de reabilitao so colaborativos e interdisciplinares,
seja em que contexto for a sua prestao e esto focados na qualidade de vida.
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3.1. A Consulta de Enfermag