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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
GISELE CRISTINA DE SOUZA
REORIENTAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA
PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR
Itajaí
2011
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GISELE CRISTINA DE SOUZA
REORIENTAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA
PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR
Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre no Programa de Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciência da Saúde Itajaí.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Glória Dittrich
Co-Orientador: Prof. Dr. Santiago Pich
Itajaí
2011
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FICHA CATALOGRÁFICA
S89r
Souza, Gisele Cristina de, 1982‐
Reorientação didático‐pedagógica da educação física na perspectiva da inclusão escolar / Gisele Cristina de Souza, 2011.
131f.
Apêndices
Cópia de computador (Printout(s)).
Dissertação (Mestrado) Universidade do Vale do Itajaí. Centro de Ciências da Saúde. Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho.
“Orientadora: Profª. Drª. Maria Glória Dietrich”
Josete de Almeida Burg – CRB 14.ª 293
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GISELE CRISTINA DE SOUZA
REORIENTAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA
PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR
Esta dissertação fui julgada adequada para a obtenção do título de Mestre, e aprovada pelo Programa de Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho, da Universidade do Vale do Itajaí.
Área de Concentração: Saúde e Gestão do Trabalho.
Itajaí, 29 de julho de 2011.
___________________________________________________ Profa. Dra. Maria Glória Dittrich
UNIVALI – CE de Itajaí Orientadora
___________________________________________________ Prof. Dr. Santiago Pich
Universidade Federal do Paraná – CE de Curitiba Co-Orientador
_________________________________________________ Profa. Dra. Maria Tereza Leopardi
UNIVALI – CE de Itajaí Membro
_________________________________________________
Profa. Dra. Ruth E. A. Cidade Universidade Federal do Paraná – CE de Curitiba
Membro
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Com todo o meu amor para a minha
“vózinha” Maria Bertolini (in memorian).
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AGRADECIMENTOS
Minha sincera gratidão, Em primeiro lugar a Deus, pelas bênçãos de amor e os sagrados ensinamentos. A minha Família, meus queridos: pai, mãe, irmã e afilhada, pelo amor incondicional, compreensão e ajuda durante o tempo de dedicação ao mestrado. As minhas amigas Fernanda Testoni, Francielle Chaves, Francine Reynaud e Dayse Prosperidade; as minhas primas Michelle Vechi, Pâmella Vechi e Alessandra Nunes; e a minha irmã Isabela C. S. da Silva, pela ajuda nos momentos difíceis. As minhas companheiras de mestrado Greice Lessa e Miquela Marcuzzo, pela valiosa companhia em todos os momentos de alegrias, dúvidas, estudos, desafios, frustrações, nas aulas, nas bancas, nas festas, nas compras, nos passeios... E pela grande amizade sincera. A turma 7/2009 e professores, pelos preciosos momentos juntos de estudo e crescimento, em especial a professora Luciane P Grillo por sua compreensão e apoio como minha primeira orientadora. Aos colaboradores: Secretaria Municipal de Educação do município de Itajaí, Departamento de Desporto Escolar, Cemespi, Serviço de Fisioterapia do Cemespi, Unidades Escolares Participantes e em especial a primeira secretária de educação na gestão 2009/2012, Professora Maria Heidman: meu agradecimento pela parceria de todos. Aos professores de educação física que me proporcionaram um valioso aprendizado com suas participações de tamanha paciência, dedicação e sabedoria em cada momento e encontro desta pesquisa. A minha orientadora Maria Glória, por sua dedicada parceria. Ao professor Santiago Pich um verdadeiro mestre que me ensinou o caminho da produção do conhecimento, que confiou na minha inexperiência, que me orientou na dissertação, me acompanhou na coleta de dados, e sempre esteve presente, mesmo a distância. A todos e aos demais amigos e colaboradores que por ventura não destaquei: muito obrigado!!!
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Tratai todos os homens como gostaríeis que eles vos tratassem.
São Lucas, 6:31
Fazei aos homens o que gostaríeis que vos fizessem, pois é nisto que consiste a lei e os
profetas.
São Mateus, 7:12
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RESUMO
A inclusão escolar refere-se à garantia e permanência do acesso de todas as crianças na escola regular, indiscriminadamente. A segregação das crianças com deficiência em diferentes instituições de ensino (as escolas especiais) foi revista socialmente no final da década de 80 no Brasil. Oportunidades de inclusão social são estabelecidas na constituição mediante a concepção moral de igualdade, superando a visão manipuladora que estigmatiza a pessoa com deficiência. No ambiente educacional, como parte integrante da escola, a educação física concebe práticas corporais inclusivas para atender a criança com deficiência e a turma, de forma a valorizar as qualidades de cada um e de todos. Neste contexto pedagógico complexo buscou-se enfrentar as dificuldades dos procedimentos de inclusão proporcionando aos docentes um processo de formação continuada. Neste sentido, este estudo propôs orientar o processo de reconstrução das práticas pedagógicas do professor de educação física na implantação da educação física inclusiva. À luz da abordagem qualitativa em pesquisa social delimitamos o método da pesquisa-ação e convidamos sete professores de educação física das unidades escolares da rede municipal de ensino da cidade de Itajaí – SC para atuarem como sujeitos participantes. Realizamos na coleta de dados: oficina, observação livre e diário de campo das aulas inclusivas; e reuniões de seminários e grupo focal. Para analisar os dados adotamos o procedimento de análise de conteúdo, codificando as mensagens em três categorias: (a) o legado da formação inicial sobre inclusão, (b) o tratamento da inclusão pelo sistema educacional local e (c) as expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar. Por fim, consideramos que as ações e respostas dos professores estavam sujeitas ao conhecimento da sua formação inicial e da formação em serviço, e à sistemática local de trabalho, fatores esses que não criaram condições adequadas para a afirmação do ensino inclusivo e para a reversão do estigma do aluno com deficiência. Contudo destacamos que os professores de educação física se sensibilizaram da importância de trabalhar na perspectiva da educação inclusiva e iniciaram um processo de reorientação das suas práticas didático-pedagógicas. Palavras-chave: Educação Física. Inclusão. Prática Pedagógica.
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Title: DIDACTIC-PEDAGOGICAL REORIENTATION OF PHYSICAL EDUCATION IN THE PERSPECTIVE OF SCHOOL INCLUSION
ABSTRACT School inclusion implies the guarantee and permanence of access to regular education for all children, without discrimination. The segregation of children with disabilities in different educational institutions (special schools) underwent social revision in Brazil in the late 1980s. Opportunities for social inclusion are laid down in the constitution, through the moral notion of equality, going beyond the manipulative view of stigma with regard to people with disabilities. Within the educational environment, as an integral part of the school, physical education involves inclusive bodily practices that are appropriate for the child with a disability and the class as a whole, seeking to enhance the qualities of the individual, and those of the group. Within this complex teaching context, this study addresses the difficulties involved in the procedures of inclusion, by providing teachers with continuing education in this regard. This study therefore proposes to guide the process of reconstruction of the pedagogical practices of the physical education teacher, in the implementation of an inclusive physical education. Based on the qualitative approach in social research, it uses the action-research method, inviting seven physical education teachers from municipal schools in the town of Itajaí, in the Brazilian state of Santa Catarina, to act as subjects. Data were collected by means of a workshop, free observation, a field diary of the inclusive classes, seminars, and focal group meetings. For the analysis of the data, the procedure of content analysis was used, coding the messages into three categories: (a) the legacy of the teachers’ initial training in the area of inclusion, (b) the way inclusion is dealt with by the local educational system, and (c) the expectations of teachers related to school inclusion. Concluding, we believe that the actions and responses of the teachers were subject to the knowledge gained during their initial training and in-service training and the local organization of the work, factors that provide appropriate conditions to inclusive education and to reverse the stigma of students with disabilities. However, we highlight that physical education teachers are aware of the importance of working within the perspective of inclusive education and have already started to change their didactic-pedagogical practice. Keywords: Physical Education. Inclusion. Pedagogical Practice.
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SUMÁRIO
1 APRESENTAÇÃO ......................................................................................... 11
2 INTRODUÇÃO/JUSTIFICATIVA............................................................... 12
3 OBJETIVOS.................................................................................................... 16
3.1 Objetivo geral................................................................................................... 16
3.2 Objetivos específicos........................................................................................ 16
4 REFERENCIAL TEÓRICO.......................................................................... 17
4.1 O estigma social e a pessoa com deficiência .................................................... 17
4.2 A inclusão.......................................................................................................... 25
4.3 A diferença na escola......................................................................................... 30
4.4 A educação física inclusiva............................................................................... 31
5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS................................................. 38
5.1 Tipo de estudo................................................................................................... 38
5.2 Caracterização da pesquisa-ação...................................................................... 39
5.3 Abrangência do estudo...................................................................................... 41
5.4 Participantes do estudo...................................................................................... 41
5.5 A coleta de dados............................................................................................... 42
5.5.1 Observação livre............................................................................................... 42
5.5.2 Oficina............................................................................................................... 43
5.5.3 Grupo focal....................................................................................................... 44
5.5.4 Diário de campo................................................................................................ 44
5.6 Processo do estudo............................................................................................ 45
5.7 Análise de dados............................................................................................... 46
5.8 Considerações éticas......................................................................................... 46
6 A COMPREENSÃO SOBRE A PRÁTICA VIVIDA.................................. 48
10
6.1 Contexto do estudo........................................................................................... 48
6.1.1 Os sujeitos respondentes.................................................................................. 54
6.2 Descrevendo a prática....................................................................................... 56
6.3 Análise sobre as categorias da pesquisa........................................................... 59
6.3.1 Primeira categoria - o legado da formação inicial sobre inclusão................ 60
6.3.2 Segunda categoria - o tratamento da inclusão pelo sistema educacional
local..................................................................................................................
6.3.3 Terceira categoria – as expectativas dos professores relacionadas à inclusão
escolar..................................................................................................................
6.4 Artigo científico................................................................................................ 82
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................... 109
REFERÊNCIAS.............................................................................................. 112
APÊNDICES................................................................................................... 118
ANEXO................................................................................................... 127
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72
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1 APRESENTAÇÃO
A estreita relação e integração das áreas de educação e saúde pode beneficiar os
procedimentos de inclusão das crianças com deficiência no ambiente escolar. Na minha
atuação como fisioterapeuta escolar no município de Itajaí, realizo assessoramento quanto à
acessibilidade, manejo e inclusão da criança com deficiência que está inserida na rede
municipal de ensino.
Nas visitas para orientações aos professores nas unidades escolares, reconheço a
distância entre a concepção do movimento de inclusão e a prática escolar estabelecida. Nos
momentos em que estou com os professores de educação física, em algumas situações deparo-
me com as representações do modelo esportivo, estigmatizando aquelas crianças com poucas
aptidões e com deficiência.
Nas conversas com os professores é apontada a necessidade de um processo dinâmico
de formação continuada devido à complexidade das práticas, com o objetivo de explorar
conhecimentos que priorizem o desenvolvimento da situação local de Itajaí.
Acredito que uma formação em serviço interdisciplinar poderá auxiliar no
desenvolvimento das significações da educação física inclusiva. Neste contexto, a proposta
deste estudo viabiliza um espaço para a discussão e planejamento de ações, baseando-se na
intersetorialidade e multidisciplinaridade através da reflexão e ação, com o sentido de ampliar
e aperfeiçoar os procedimentos de inclusão escolar na prática habitual da educação física.
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2 INTRODUÇÃO/JUSTIFICATIVA
A sociedade no desenvolvimento da institucionalização da infância almejou diferentes
espaços, ou seja, para as crianças com deficiência a escola especial e para as crianças sem
deficiência a escola regular.
Estas diferenças sofreram transformação com o advento da democracia, quando se
identificou que as diferenças devem ser respeitadas - e não segregadas - para tornar possível
uma igualdade/equidade social. Em face da relevância moral da igualdade, Puppin (1999)
salienta a diferença, como tratamento diferente para os diferentes, porque todos têm direitos
iguais e necessidades específicas. Tal relevância identifica-se com o conceito de equidade1
explorado nas ações de atenção e educação em saúde apontada na Constituição de 1988 com a
Reforma Sanitária.
A Constituição de 1988 foi o marco social, no Brasil, que destinou oficialmente
políticas públicas para a inclusão das crianças com deficiência na rede regular de ensino. E,
em 1994, na Declaração de Salamanca, a Conferência Mundial de Educação Especial, dispôs,
no documento das Nações Unidas, “Regras Padrões sobre Equalização de Oportunidades para
Pessoas com Deficiências", traduzidas desde então em políticas públicas.
O marco teórico do processo de inclusão afirma-se nos conceitos de equidade e
inserção das diferenças, proporcionando garantia do acesso à escola regular para todas as
crianças, indiscriminadamente; e incluindo a participação e a diversidade dos alunos no
processo ensino aprendizagem. Neste sentido, a inclusão é um conceito traduzido em um
conjunto de procedimentos que garantem as condições educacionais adequadas para todas as
crianças na escola, sem discriminação (SASSAKI, 2006; MEC, 2006).
No que se refere a dados estatísticos e números que contabilizam a adesão ao processo
de inclusão no Brasil, Antunes (2006, p. 17) afirma que
a organização Mundial de Saúde estima que cerca de 10% da população terrestre possui necessidades especiais - cerca de 600 milhões de pessoas – e dados estatísticos brasileiros recentes, [...] alertam-nos para a existência de 358.987 alunos
1 Equidade refere-se à justa oportunidade para cada pessoa desenvolver o seu pleno potencial. A este respeito busca-se reduzir as diferenças consideradas desnecessárias, evitáveis, além de serem consideradas injustas (VIANA; FAUSTO; LIMA, 2003).
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especiais matriculados [...]. Destes alunos, apenas 144.543 frequentavam salas regulares.
A discrepância de matrículas das crianças com deficiência na educação especial para a
escola regular projeta a dificuldade de garantir o acesso e a permanência na escola comum,
revelando falhas na adesão do processo de incluir todas as crianças. Mediante esta dificuldade
para a operacionalização da inclusão, apontamos a necessidade da pesquisa social como forma
do estudo científico contribuir com as condições educacionais para a inclusão, e, justificados
por esta necessidade, delimitamos o objeto deste estudo na perspectiva inclusiva.
Destacamos que o processo de inclusão garante a permanência de toda a criança na
escola (BRASIL, 1988). E, o ensino pautado na concepção inclusiva é adequado para todas as
crianças, independente de cor, raça, sexo, religião, classe social e deficiência. Contudo, a fim
de delimitar parâmetros para o nosso objeto de estudo, realizamos o recorte para o
atendimento à criança com deficiência na escola regular com relação à reorientação didático-
pedagógica da educação física na perspectiva da inclusão.
Ressaltamos que atualmente, o Ministério da Educação, dispõe em políticas públicas
que asseguram aos alunos com deficiência, ou transtorno global do desenvolvimento ou altas
habilidades/superdotação, a condição de educandos com necessidades educacionais especiais
(conceito apresentado na Declaração de Salamanca, em 1994). O que destinou verba dupla no
pagamento da matrícula (à escola comum) para cada educando com necessidades
educacionais especiais. Tal subsídio auxilia a escola comum a proporcionar para toda criança,
indiscriminadamente, oportunidades de pleno desenvolvimento. No entanto, o atual modelo
curricular, apresenta-se disposto em disciplinas, sistematizando habilidades para alcançar um
grau de conhecimento. Neste modelo almeja-se alcançar a integralidade do aprendizado,
porém esta organicidade apresenta os componentes de ensino segregados em disciplinas a fim
de que o aluno consiga aprender o todo, disposto em partes.
A educação física apresenta-se como componente do currículo da escola regular, e
deve atuar de forma integrante e adjuvante ao processo de inclusão escolar e social das
crianças com deficiência (AGUIAR e DUARTE, 2005). Porém, nas perspectivas atuais, o
exercício da educação física pouco tem superado a organicidade escolar segmentada a fim de
estabelecer uma prática verdadeiramente inclusiva. Costa e Souza (2004) apontam que são
escassos os estudos voltados para a temática da educação física inclusiva, tendo como base
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firmadora a participação do uno e do diverso simultaneamente, o que é o grande desafio do
século XXI.
E, com relação à graduação do professor de Educação Física, que insere a abordagem
da inclusão, Cidade e Freitas (2002) referem que no final da década de 80 foi regulamentado o
contexto inclusivo nos cursos superiores, sendo que, apenas por sua formação inicial o
professor não está totalmente familiarizado à inclusão para a prática habitual.
Cruz (2003) alerta para a inconsistência, da abordagem da inclusão, na formação
inicial do professor de educação física para o atendimento ao aluno com deficiência no ensino
regular, ressaltando a formação do professor como um processo dinâmico longe de ter um fim
pré-estabelecido.
Os autores Silva; Souza e Vidal (2005) apontam que para a Educação física escolar
envolver-se em uma prática pedagógica inclusiva é necessário, dentre outras questões, a
valorização do magistério e investimento na formação profissional continuada. Tais
apontamentos legitimam a necessidade de realizar esta pesquisa social em apoio à educação
física na perspectiva da inclusão escolar, pois há complexidade no atendimento do professor
de educação física ao aluno com deficiência, devido implicações curriculares na formação
deste professor. Inclusive observamos no estudo de Aguiar e Duarte (2005), realizado na
cidade de São Paulo, para investigar os significados da inclusão nas aulas de educação física,
que cerca de 97% dos participantes entrevistados não possuíam conhecimentos suficientes
para lidar com alunos com deficiência nas aulas de Educação Física, e que para realizar a
inclusão os professores necessitam de apoio do estado, no que se refere a oferecimento de
cursos de reciclagem, auxílio técnico pedagógico especializado, estrutura adaptada do espaço
físico e material didático adequado.
Adentrando na história da Educação Física no Brasil verifica-se, no início dos anos 90,
um movimento de introdução dos conceitos de uma educação corporal crítico-social que se
preocupa com a visão ampliada do sujeito, sem o aspecto reducionista das partes
fragmentadas, respeitando o corpo em movimento em sua totalidade, intencionalidade e
complexidade, impossível de ser compreendido e vivido parte por parte (RECHINELI;
PORTO; MOREIRA, 2008). Este referencial marcou o movimento renovador da educação
física, revitalizando perspectivas de trabalho para uma pedagogia progressista propondo outro
olhar para as diferenças dos corpos e suas diversidades de movimento.
Para compreender a proposta de abordar as diferenças na educação corporal, é
necessário relembrar que a educação física está sujeita a estrutura do currículo escolar,
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portanto, de que forma novas perspectivas não pautadas na lógica esportiva estão contribuindo
para a prática da inclusão?
Ao considerar uma formação crítico-reflexiva do professor de educação física na
graduação, em que medida a atuação de um profissional com este perfil, sujeito ao contexto
da pedagogia tradicional, condiciona uma prática inclusiva?
Ponderando que o professor de educação física, ao abordar inovações corporais de
ensino, está subordinado a uma pedagogia categorizadora, como a formação em serviço pode
potencializar mudanças para a implantação de ações pedagógicas inclusivas?
Com base nos questionamentos anteriores e atentos às demandas dos professores de
educação física das escolas da rede municipal de ensino de Itajaí, elaboramos o problema de
pesquisa que propõe: Como orientar o processo de reconstrução das práticas pedagógicas dos
professores de Educação Física na implantação da Educação Física Inclusiva?
Numa visão exploradora do cotidiano escolar nos confrontamos com os fundamentos
da pedagogia de rendimento de um lado, da educação física crítico-reflexiva no outro, e do
contexto da inclusão de crianças com deficiência na outra ponta, triangulando as experiências
da prática docente. Tais experiências circundam o objeto deste estudo, no qual, pressupomos
que quando os professores são orientados à prática didático-pedagógica na reflexão ação,
(abordagem que confere com a estratégia da pesquisa-ação) tornam-se instrumentalizados
para promoverem mudanças; sabendo-se que os sujeitos envolvidos constituem o próprio
processo reflexivo.
No que concerne à aplicação e entendimento do referencial teórico da inclusão escolar
e aproximação deste na prática da educação física, este estudo apresentou por objetivo
orientar o processo de reconstrução das práticas pedagógicas dos professores de Educação
Física na implantação da Educação Física Inclusiva.
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3 OBJETIVOS
3.1 Objetivo geral
Orientar o processo de reconstrução das práticas pedagógicas dos professores de
Educação Física na implantação da Educação Física Inclusiva.
3.2 Objetivos específicos
Estabelecer um referencial teórico para a definição da concepção de Educação
Inclusiva;
Compreender, a partir da discussão da prática dos professores, quais as significações
da Educação Física Inclusiva;
Identificar qual é a influência da representação do modelo esportivo no processo de
inclusão das crianças com deficiência;
Compreender qual é a influência da representação da pedagogia tradicional no
processo de inclusão das crianças com deficiência;
Identificar as dificuldades enfrentadas pelos professores na inclusão dos alunos com
deficiência;
Orientar uma discussão teórica/reflexiva junto aos professores participantes com
referenciais conceituais elucidativos sobre as problemáticas identificadas;
Subsidiar o planejamento e aplicação de ações pedagógicas transformadoras pautadas
na perspectiva da Educação Física Inclusiva;
Refletir sobre as práticas pedagógicas implantadas e a reorientação da ação docente.
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4 REFERENCIAL TEÓRICO
4.1 O estigma social e a pessoa com deficiência
O conceito de estigma, cujo principal representante é o sociólogo Erving Goffman, foi
o norte referencial que deu condições ao entendimento da inclusão da pessoa com deficiência
(PcD) na representação social da diferença.
Goffman (1988) refere em seu estudo sobre estigma que nas interações habituais a
sociedade pode manipular as diferenças da pessoa com deficiência de forma a deteriorá-las,
estigmatizando a PcD.
Atentos à descrição de Goffman a respeito do conceito de estigma e as notas sobre a
diferença como um valor à diversidade social, destacamos a deficiência e as condições que
contribuem para proporcionar à pessoa com deficiência estigmatizada os critérios reais de
identificação social.
A deficiência é um conceito moderno, apareceu após a sociedade enfatizar a eficiência
como marca da vida. Puppin (1999) aponta para a deficiência a criação de uma identidade
social, postulando que a pessoa com deficiência é um diferente que não é eficiente.
Por outro lado são nas relações coletivas que se estabelecem o padrão social de
eficiência e a identidade social da pessoa. Segundo Magalhães (2005), a PcD é diferente das
outras e em torno disso - da diferença - constrói-se a vivência social, sendo fundamentais as
relações com outras pessoas para a construção desta identidade social.
Observamos que à PcD são atribuídas diferenças nas manifestações sociais, e estas
diferenças são delimitadas pelo significado de eficiência, pois o padrão comum é ser
produtivo socialmente. Oliveira (2000) relata que as diferenças reconhecidas e repassadas
perante um número considerável de pessoas constituem representações coletivas, assim as
representações dos grupos sociais constituem o reconhecimento da identificação social de
cada pessoa.
Mas a identificação social não constitui de forma íntegra a identidade pessoal.
Mediante isso, Goffman (1988) explica que o relacionamento sem a reflexão particular, que
adquirimos com outras pessoas que tem um relacionamento social no ambiente, nos
influenciam na formação a identidade social de outro indivíduo. Lembrando que identidade
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social é diferente de status social, pois a identidade engloba não só atributos estruturais como
também qualidades.
Goffman (1988) ainda relata que a sociedade nas suas relações estabelece noções para
categorizar as pessoas, representando concepções de normativas e exigências numa identidade
social virtual, desconsiderando os atributos reais pessoais, ou seja, sua identidade social real.
Sendo a identidade um produto social, é nas relações que se classifica as pessoas
categorizando seu comportamento de acordo com os ambientes, onde as pessoas são
novamente categorizadas adequando-as ao espaço frequentado. Desta forma as expectativas
que criamos em cima de preconceitos, que muitas vezes são exigentes e que acabam supridos
por outros aspectos como a afetividade, transformam-se quando descobrimos a identidade
pessoal que o indivíduo realmente possui.
Neste sentido, o próprio Goffman (1988) coloca que na determinação da categoria
social nem todos os atributos pessoais reais estão presentes, a sociedade observa apenas
aqueles que são incongruentes com a expectativa de eficiência social, ou seja, as diferenças de
produção social. Assim, as diferenças, em relação a esta expectativa, são as características que
a sociedade utiliza para representar a PcD, como aquele que está fora delas na produção
social, colocando-o na categoria de não eficiente (deficiente). As diferenças não produtivas
são então encaradas como as atribuições pessoais que constituem a identidade social virtual,
desconsiderando quaisquer outros atributos - como as qualidades da pessoa - que não a
coloquem na categoria de deficiente.
As diferenças são representadas nas relações sociais e quando estas diferenças
representam marca de descrédito (não eficiência), tem-se a condição do desvio. Segundo
Omote (2004), o desvio é a resposta social que põe em evidência o caráter negativo das
atribuições de uma pessoa, colocando-a em condição desacreditadora, segregando-a do meio
social. Com base no entendimento de desvio podemos observar que a sociedade identifica a
PcD como quem possui diferenças desacreditadoras em termos de respostas sociais,
colocando-a em desvio nas interações sociais, pois não é eficiente. O desvio, portanto,
representa uma forma de segregar a pessoa do meio social, dando a ela um espaço
determinado que não pertença ao modelo de eficiência2.
Goffman (1988) aborda o fato de que em termos sociológicos algumas pessoas podem
viver nas interações sociais, situações que não podem ser compreendidas completamente,
2 Podemos considerar um espaço de desvio com marca de descrédito social, as escolas especiais no período pré inclusão, pois os alunos com deficiência somente frequentavam a escola especial por não responder as normas curriculares de desempenho da escola regular [situação social vivenciada antes da inclusão escolar].
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como o preconceito. Afirma também que o normal - o grupo social dominante - em seu
conjunto pode ter o seu defeito semi-escondido, que de forma inevitável irá ser desmascarado,
criando especulações entre a identidade social virtual e a real. Muitas pessoas por terem suas
diferenças, sejam elas mínimas, compreendem os totalmente estigmatizados. Fica claro o fato
de que não é o diferente que deve chamar atenção por sua diferença e sim o ser comum,
preocupando-se menos com os desvios que deixam outros de lado (GOFFMAN, 1988).
Compreendemos que o grupo social dominante, os normais, estabelece o que é comum
- as normas de conformidade e pertencimento social - mas neste grupo dominante também há
diferenças que podem não estar de acordo com a conformidade. Portanto a diferença de
qualquer pessoa sem deficiência - não somente da PcD - pode ser atribuída como desvio
dependendo do ambiente e da relação social que se encontra. Nesta condição de não
pertencimento social do desvio, apresentamos o conceito contemporâneo de estigma, descrito
por Goffman (1988, p. 7): “estigma é a situação do indivíduo que está inabilitado para a
aceitação social plena”.
Puppin (1999) compreende estigma como o processo social que envolve dois papéis: o
normal e o estigmatizado, ambos gerados nas perspectivas das integrações sociais. Com base
no que foi descrito torna-se evidente que é a organização social quem determina o caráter do
estigma, e elegem quais as características que irão nomear as atribuições estigmatizadoras.
Neste sentido, Goffman (1988, p. 13) escreve
o termo estigma, portanto, será usado em referência a um atributo profundamente depreciativo, mas o que é preciso, na realidade, é uma linguagem de relações e não de atributos. Um atributo que estigmatiza alguém pode confirmar a normalidade de outrem, portanto, ele não é, em si mesmo, nem honroso nem desonroso.
Goffmann (1988) em seu estudo aponta três tipos de estigma, sendo eles: (a) a rejeição
as deformidades físicas; (b) a culpa de caráter individual (como o vício) e, por último, (c) os
estigmas tribais de raça, nação e religião. Estes dificultam a apresentação de outros atributos
pessoais, classificando no estigma todos que fogem do padrão estabelecido pela sociedade
como normais.
Nesta pesquisa delimitamos o recorte do conceito de Goffman (1988) para o estigma
relacionado à rejeição de deformidades. Este caracteriza a manipulação deteriorada da
identidade da PcD. Assim, esclarecemos que o nosso objeto de estudo está direcionado na
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condição do estigma do aluno com deficiência na escola regular, com relação à prática
didático-pedagógica da educação física na perspectiva da inclusão. Tal abordagem, foi
motivada nas condições da PcD estigmatizada encontrando-se, em termos de socialização,
fora do grupo social dominante, os considerados normais. Neste sentido, compreendemos que
a construção social dessa representação é realizada por meio da escolha de atributos
depreciativos, nomeados estigma. Para a PcD os atributos nomeados estigma são aqueles
substantivados nas relações sociais que caracterizam a diferença da PcD com relação à pessoa
sem deficiência, como o atributo não eficiente (desacreditado) à produção social.
Puppin (1999) sugere que frente ao entendimento do descrédito social e isolamento
perante o não enquadramento das expectativas sociais, qualquer pessoa há de experimentar a
condição do estigma, no momento em que a sua identidade social não corresponder às normas
de conformidade do ambiente em questão.
Mais uma vez citamos Goffman (1988) quando esclarece que a identidade social é
deteriorada pelo estigma, quando ocorre a discrepância negativa dos atributos que compõem a
identidade real para a identidade virtual. No meio social, dentre as necessidades de linguagem
e interação, se estabelecem as características que serão consideradas produtivas para a
coletividade. Esta seleção de atributos infere na identidade virtual, que estigmatizada
(apreciada negativamente) compõe a identidade social virtual. Diante deste processo, qualquer
pessoa está sujeita a experienciar o estigma quando estiver substantivada a esta linguagem e
manipulação de seus atributos.
A identidade social é, portanto, manipulada pelo estigma. Omote (2004) aponta que no
conceito atual de estigma, a marca social (os sinais) que o representa não é visível3, mas a
manipulação que se faz do estigma e o tratamento especializado dispensado ao estigmatizado
podem aumentar a visibilidade social da condição de diferente desta pessoa.
E ainda, destacamos que no estudo do estigma toda informação tem suas propriedades
e relevâncias, seja sobre a pessoa ou suas características (GOFFMAN, 1988). Signos por
exemplo são informações transmitidas pela própria pessoa e quando estes signos são
acessíveis e recebidos normalmente podem ser nomeados símbolos. O símbolo por sua vez é
facilitador da identificação de um status social, posição, cargo, etc. No caso do estigma estes
símbolos atraem a atenção para as degradantes discrepâncias de identidades. 3 Os gregos [...] criaram o conceito de estigma para se referirem a sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os apresentava. Os sinais eram feitos com cortes ou fogo no corpo e avisavam que o portador era [...] uma pessoa marcada, ritualmente poluída, que deveria ser evitada especialmente em lugares públicos (GOFFMAN, 1988, p. 11).
21
Para as pessoas com deficiência (PcD) estigmatizadas - consideradas desacreditadas e
fora da categoria dos normais - a marca de visibilidade do estigma encontra-se nos símbolos,
como as próteses e órteses; ou as próprias alterações orgânicas visíveis no corpo. Goffman
(1988) refere os símbolos do estigma como signos capazes de despertar o olhar para uma
enorme discrepância de identidade da pessoa, o que corrompe o entendimento de valorização
social, e proporciona um descrédito acentuado à pessoa portadora desse símbolo.
Quando a valorização da identidade da PcD é adulterada, seja por signo ou por não
pertencimento ao grupo social dominante, temos uma identificação desacreditada.
Oliveira (2000) explica que na identificação desacreditada as representações
estereotipadas e estigmatizadas levam o olhar centralizado nas incapacidades, secundarizando
as potencialidades. As representações expressas por práticas discriminatórias levam à não
aceitação, à segregação e exclusão.
Segundo Goffman (1998), o conceito de identidade permite experimentar, a respeito
do estigma e sua manipulação, os significados que ela recebe mediante as representações
sociais. Consideramos este aspecto entendendo que a identidade e o estigma manifestam-se
nas atribuições do uso da linguagem nas interações sociais, sendo assim, ocorre uma
tendência de comunicação a respeito da identidade da PcD.
Nas trocas sociais, Puppin (1999) fala da tendência no diálogo entre o estigmatizado e
o normal, de existir uma carga de condição de “aceitação fantasma”. Esta condição expõe o
estigmatizado a exibir na sua identidade uma aceitação de si, como se fosse à aceitação total
do grupo dominante.
Esta exploração do modelo de identidade que o estigmatizado tem de si e expõe ao
social, Goffman (1988) aponta como um sentimento de ambivalência do seu próprio eu. E
ainda complementa que as oscilações do pertencimento social do estigma proporcionam as
expressões de ambivalência que a PcD possa sentir. A manifestação ocorre principalmente
quando ela se aproxima de seu semelhante, enquanto está acompanhado de outro indivíduo
(GOFFMAN, 1988).
Para Cruz e Barreto (2005), o contato com a PcD pode estimular sentimentos de pena,
mas diante de toda a luta por um mundo mais igualitário os sentimentos que nos movem são
outros. Deixam-nos levar pela vontade de proporcionar um mundo mais humano e justo onde
as pessoas usufruam de seus direitos. Sabendo que a maior parte das pessoas estigmatizadas
sofre de isolamento social porque são vistas como diferentes, e a sociedade as colocam como
sem utilidade por imaginar que as mesmas não poderão destacar-se na produção social,
tornando-as inúteis por toda uma vida.
22
Não somente a sociedade como também o ambiente que vivemos automaticamente
afasta as PcD, pois a maior parte dos lugares que deveriam ser de acesso a todos não são
adaptados, bloqueando a interação dessas pessoas com a sociedade impedindo que a
identidade real seja descoberta por outros, predominando a imagem de que o estigmatizado
não poderá agir ou viver como pessoas comuns e com as pessoas normais (SASSAKI, 1998).
Goffman (1988) afirma que nesse processo de isolamento social a pessoa com um
estigma particular sofre mudanças, que são efeitos do compromisso com uma sequência de
ajustamentos pessoais. Ela então vive com a condição de aprender a decifrar o ponto de vista
dos normais e as consequências de possuir um estigma particular, além de fazer parte de um
processo de socialização referenciado em modelos. Os modelos formam bases para a distinção
de carreiras morais e desenvolvimento. Neste sentido a pessoa estigmatizada está
substantivada a realizar condutas de ajustamento para fazer parte da vida coletiva que se
espelha em modelos de referência.
Ainda Goffman (1988) sugere que tantos as pessoas estigmatizadas quanto os normais,
tendem a se sentir angustiadas com as situações sociais. Essas situações por sua vez causam
sentimentos desacreditadores nos estigmatizados e na sociedade que o recebe. Enquanto a
PcD tenta se adaptar aos ambientes sociais (e aos modelos) os normais acabam tomando
cuidado ao mostrar interesses diante da situação, causando desconforto e consequentemente
depreciação de sofrimento.
Mediante tais condições relacionais, a pessoa estigmatizada experiencia os
ajustamentos. Segundo Goffman (1988), os ajustamentos são estratégias do estigmatizado
para lidar com a sua condição em relação às condições sociais exigentes. O próprio Goffman
também explica que a gratificação do estigmatizado trazida por sentir-se normal, leva-o a
apresentar o encobrimento do seu atributo estigmatizador.
O encobrimento é realizado porque há um descrédito do que se torna aparente
(GOFFMAN, 1988). Um exemplo do encobrimento do estigma é quando a PcD oculta seu
atributo desacreditado na interação social, por exemplo, quando um surdo não deixa aparente
seu aparelho auditivo, estando num ambiente ruidoso, e atribui ao alto nível sonoro o fato de
não conseguir ouvir.
Há pessoas que raramente tentam encobrir o estigma, realizando com frequência o
acobertamento. O acobertamento implica em atitudes que tentam restringir a exibição dos
atributos mais desacreditados do estigma (GOFFMAN, 1988).
23
Outro exemplo de acobertamento é quando a pessoa cega usa óculos escuros, deixando
identificar a cegueira, mas acobertando a deformidade visual ou desfiguração facial, para que
sua aparência esteja menos centralizada no estigma (GOFFMAN, 1988).
O encobrimento e acobertamento são ajustamentos do estigmatizado nas interações
habituais. Marteleira (2002) aponta que o estigmatizado utiliza-se dos ajustamentos para que a
identidade real do seu eu, aproxime-se a identidade dominante no social.
Podemos compreender os ajustes como medidas de tornar comum o significado do
estigma atribuindo ao estigmatizado à aceitação real da sua identidade. No entanto, Goffman
(1988) relata que é possível a dificuldade de conviver com as exigências feitas sobre a PcD e
mesmo assim continuar indiferente, não realizar nenhuma conduta de ajustamento, quando se
está protegido por crenças de identidades próprias acreditando que se é completamente
normal e que na verdade o grupo social dominante não é suficientemente normal. E ainda
refere que no momento em que um estigma particular conquista uma alta posição (seja ela
política, financeira ou ocupacional) é possível que esta pessoa possa representar a sua
categoria, sem impor qualquer condição de ajustamento.
Também para o grupo social dos informados não são necessários os ajustamentos
sociais, pois este grupo constitui as pessoas que simpatizam a aceitação real do
estigmatizado4.
Estão no grupo dos informados os profissionais (enfermeiras, terapeutas...); as pessoas
marginalizadas (que dispõem de alguma situação secreta social: prostitutas, presidiários); e as
pessoas que se relacionam afetivamente com os estigmatizados. Este grupo de informados é
composto por pessoas normais cuja situação especial em que se encontram levam os
estigmatizados a não utilizarem os ajustamentos, porque sabem que serão considerados por
eles como pessoas comuns (GOFFMAN, 1988).
As pessoas informadas constituirão parte integrante das relações habituais dos
estigmatizados, porque têm significado de pertencimento real da identidade do estigma.
No pertencimento real da identidade do estigmatizado, observamos nas relações
habituais os alinhamentos intragrupais e exogrupais (GOFFMAN, 1988). No alinhamento
intragrupal o indivíduo estigmatizado relaciona-se com seus semelhantes e no alinhamento
exogrupal, relaciona-se com a sociedade mais ampla, os normais.
4 Nas turmas inclusivas esperamos que os professores sejam o grupo dos informados e não exijam que seus alunos com deficiência realizem condutas de ajustamento para se sentirem aceitos e inclusos na escola regular.
24
A situação especial do estigmatizado é que a sociedade lhe diz que ele é um membro do grupo mais amplo, o que significa que é um ser humano normal, mas também que ele é, até certo ponto, “diferente”, e que seria absurdo negar esta diferença. A diferença, em si, deriva da sociedade, porque, em geral, antes que uma diferença seja importante ela deve ser coletivamente conceituada pela sociedade como um todo (GOFFMAN, 1988, p 134).
Com base na citação acima, percebemos que as diferenças da deficiência podem ser
consideradas aspectos depreciativos nas relações habituais. A sociedade procedeu a
estigmatizar e segregar a PcD, colocando-a em organizações específicas, como as escolas
especiais.
A reversão deste quadro acontece quando há o amadurecimento de valores socais
(PUPPIN, 1999). Quando a sociedade contempla a diferença da PcD sem a manipulação do
estigma, evidencia nas linguagens sociais o verdadeiro valor à identidade de cada pessoa.
Bourdieu (1989) acredita que o próprio estigma causa revolta contra o estigma. E as
escolas são as instituições fundamentais para a reversão do mesmo, pois é nas escolas que se
procura levar em conta o que é a real necessidade de cada aluno e assim constrói-se uma
imagem social das crianças com a valorização dos alunos e o reconhecimento deste valor por
parte dos familiares e da comunidade.
Para Costa (2010) somente uma luta coletiva, ou seja, ações em conjunto de grupos
sociais possibilitam a reversão do estigma, alertando que apenas pequenas ações isoladas não
podem possibilitar a reversão do estigma de fato, nesta situação há apenas a possibilidade de
aceitação do estigma, não de reversão.
E Bourdieu (1989) acredita que a reversão do estigma deve ser um processo abarcado
pela maioria para que, de fato, a opinião da sociedade sobre a classificação dos estigmatizados
possa mudar. Desta forma acreditamos que nas escolas inclusivas é fundamental a reversão do
estigma e tal situação só se confirmará mediante o comprometimento dos professores.
Minuchin (1982) contribui dizendo que a família, como uma unidade social, é
essencial no desenvolvimento da reversão do estigma. Proporcionando apoio, proteção,
limites e socialização para a criança com deficiência, seja ela estigmatizada ou não, faz-se
necessária a interação da família para possibilitar a proximidade da identidade social na
identidade pessoal.
Neste sentido, compreendemos que a valorização da identidade pessoal da PcD está
presente quando não é atribuída a deterioração do estigma à diferença. Quando o valor social
da PcD é construído tendo por base na sua identidade real. Goffman (1988) refere que o
25
estigmatizado pode também ser capaz de mudar a sua identidade social, aderindo a novos
desafios como atividades que não sejam direcionadas as PcD. A partir do novo aprendizado
agregam-se novos atributos a quem o vê. Sendo a superação de limites impostos por uma
deficiência uma das grandes facilitadoras da construção de uma identidade real nas interações
sociais.
Goffman (1988) ainda relata que para validar sua identidade pessoal real e reverter o
estigma, a pessoa estigmatizada pode agir com signos desidentificadores, ou seja, controlar a
informação da sua identidade no ambiente e a relação que experienciar. Por exemplo, quando
uma pessoa com deficiência física apresentar-se com boa aparência, boa linguagem e
conversação culta nos ambientes sociais. Mas ressaltamos que este estudo tem como
pressuposto que a escola regular seja o espaço que não exija dos alunos com deficiência o
controle da reversão do estigma, ao contrário, que seja a escola a dar o passo de reversão do
estigma, aceitação e inclusão de todos os alunos (com e sem deficiência).
Diante disso, destacamos a importância da consideração completa da identidade de
cada pessoa sem a necessidade de realizar ajustamentos para o pertencimento social da
diferença dessa PcD. A este respeito consideramos que a concepção de inclusão escolar,
emergente nas últimas décadas, expressa o cuidado da estruturação da sociedade para
identificar o valor de cada pessoa desconstruindo o protótipo deteriorado do estigma. Este
marco conceitual do movimento de inclusão escolar descrevemos a seguir.
4.2 A inclusão
Compreendemos que a inclusão é um processo que destina ações coletivas de inserção
e equidade a todas as pessoas, independente de cor, raça, sexo, classe social ou deficiência. A
partir deste conceito geral, seguimos, neste estudo, o recorte na inclusão como um movimento
social que procura desconstruir a estigmatização da PcD colocando-a como sujeito ativo no
processo de significar sua identidade pessoal.
Num resgate histórico destacamos em 1981 o Ano Internacional das Pessoas
Deficientes, no qual uma parte da sociedade passou a realizar ações para que as PcD
realmente pudessem ter participação plena e igualdade de oportunidades, não de forma que se
adaptassem ao social, e sim de forma a adaptar a sociedade as pessoas. Isto deu início ao
surgimento do conceito de inclusão a partir do final da década de 80 (SASSAKI, 2008).
26
E desde então, embora a inclusão seja cada vez mais abordada na sociedade, nas
escolas e meios de comunicação, muitas vezes ainda é interpretada de forma distorcida, pois
as pessoas têm dificuldade em aceitar a diferença da PcD. Sabemos que a inserção das PcD
nos ambientes sociais é de extrema importância e direito total dos mesmos, mas nem sempre
essas pessoas são bem recebidas ou têm o espaço e o apoio que necessitam. A luta por este
direito é cheia de desafios e ainda é preciso rever as ações da sociedade para tornar a inclusão
um grande projeto de vida comum à coletividade, pois as PcD não precisam de limitações
sociais para conquistar o que lhe são de direito (MANTOAN, 1988).
No Brasil a Constituição Federal de 1988 delimitou políticas públicas para favorecer a
inclusão na sociedade. E no artigo 205 instituiu a educação como direito de todos,
indiscriminadamente, e atribuiu a colaboração da sociedade para o pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL,
1998).
No entanto, atualmente, o estudo de Mittler (2002) explica que apenas cerca de 1%
dos deficientes físicos frequentam algum tipo de escola na maioria dos países em
desenvolvimento; destacando também que a situação de exclusão social no Brasil é imensa
assim como a quantidade de PcD que vivem em conflitos com a lei e sofrem na sociedade sem
justiça social.
Diante desta realidade, a inclusão veio acontecer para a mudança da sociedade, na
busca de outras formas de interpretar e ressignificar o imaginário social sobre as pessoas com
deficiência, o que implica numa mudança do atual paradigma educacional, tão racionalista e
formal na oferta dos serviços educacionais (MANTOAN, 2003).
Karagiannis; Stainback; Stainback (1999) apontam que o ensino inclusivo é o valor
social da igualdade, e é através do exemplo que as escolas ensinam que, apesar da diferença,
todos temos direitos iguais. A este respeito, o Ministério Público Federal (2004) afirma que
transformar o modelo de ensino da escola comum não é exigência do processo de inclusão de
PcD, a transformação deve ser encarada como compromisso inadiável socialmente, que terá
por consequência a inclusão escolar. Diante disso, ressaltamos que a inclusão da criança com
deficiência na escola comum, é parte do movimento de inclusão, pois a concepção inclusiva
se destina a todas as crianças, indiscriminadamente, garantindo o acesso e a permanência de
todos na escola comum.
No entanto, adentrando na história da civilização observamos que a educação foi
destinada para a elite, e as práticas educacionais têm refletido esta orientação elitista
(BLANKENSHIP; LILLY, 1981). Diante desta situação reconhecida é necessário que as
27
pessoas unam-se em prol de soluções para tornar o ensino mais acessível a todas as pessoas,
sejam PcD ou pessoas sem deficiência. Neste sentido, Mantoan (2003, p. 60) afirma que
mudar a escola no sentido de uma educação inclusiva [para as PcD e para as pessoas sem deficiência] é um trabalho com base fundamental em: • recriar o modelo educativo escolar, tendo como eixo o ensino para todos; • reorganizar pedagogicamente as escolas, abrindo espaços para que a cooperação, o diálogo, a solidariedade, a criatividade e o espírito crítico sejam exercitados nas escolas, por professores, administradores, funcionários e alunos, porque são habilidades mínimas para o exercício da verdadeira cidadania; • garantir aos alunos tempo e liberdade para aprender e um ensino que não segrega e reprova a repetência; • formar, aprimorar continuamente e valorizar o professor para que tenha condições e estímulo para ensinar a turma toda, sem exclusões e exceções.
A prática inclusiva não é aquela marcada por um método de ensino diferenciado, é a
garantia do processo de aprendizagem com participação total da criança, em que se
caracteriza o ser humano não por saber mais, e sim por envolver-se no conhecimento que faz
sentido particular e no mundo (ANTUNES, 1996).
Mazzota (1998) acredita que construir para uma educação ampla requer que a inclusão
haja de todos os lados, por menor que seja a limitação individual. Compreender o verdadeiro
sentido da inclusão e suas aplicações possibilita o sucesso na aceitação da PcD na sociedade.
Neste sentido, observamos que a educação escolar tem dupla função: é uma das
formadoras dos valores que serão adquiridos no ambiente social e também é formada pelos
valores do ambiente social. Desta forma, o que era chamado de problema pode ser
solucionado e adaptado pela própria escola. Assim explica Barth (1990), quando coloca o fato
das diferenças serem oportunidades de aprendizado para a escola na forma de recurso grátis,
abundante e renovável, ressaltando a importância do que é diferente e não do que é igual.
Os defensores da inclusão, educadores de todas as partes do mundo, acreditam que a
entrada dos alunos com deficiência no ambiente educacional regular vai pressionar as escolas
a se reestruturarem física e pedagogicamente, respeitando o ritmo de aprendizagem de cada
aluno, tenha ele uma deficiência ou não. No entanto, no Brasil a realidade da rede pública de
ensino ainda é de salas superlotadas, baixos salários, má formação de professores, projetos
pedagógicos ultrapassados e estrutura precária, o que dificulta a aprendizagem de qualquer
criança (CINTRA, 2008).
A respeito das escolas brasileiras, Mantoan (2003) refere que para acontecer a inclusão
é necessário inovar esforços de modernização e de reestruturação das condições atuais de
28
ensino, especialmente no nível básico. Ainda relata que quando a escola comum assumir que
as dificuldades de alguns alunos não são apenas deles, mas resultam em grande parte do modo
como o ensino é ministrado, a aprendizagem será concebida e avaliada.
Para Villa et al. (1996) educadores e pais serão sempre os responsáveis pela melhoria
da educação sendo peças fundamentais no movimento de inclusão escolar. Mas as mudanças
não acontecem por ações individuais isoladas, advêm através de pequenas ações mútuas que
conectadas se transformam em um grande conjunto de procedimento com o poder de derrubar
os maiores obstáculos. Assim acreditamos que a união de educadores, pais e comunitários
podem realizar grandes atitudes que transformem a visão das pessoas e, consequentemente,
abram espaço para as crianças com deficiência na escola, possibilitando o aprendizado junto
com crianças sem deficiência.
Quando a escola exclui os alunos com dificuldades no ensino, o preconceito inserido é
levado para a vida adulta, o que reflete num conflito social e num processo de competição
cruel (KARAGIANNIS; STAINBACK; STAINBACK, 1999). Para evitar tal situação a
escola tem que acreditar que o aluno também é responsável pelo processo de aprendizagem, e
ele pode contribuir com as modificações e alterações que precisam ser realizadas para adequar
o ensino à inclusão (SASSAKI, 2008).
Ser uma escola inclusiva é enfrentar um desafio, pois para que os alunos com e sem
deficiência possam exercer o direito a educação em sua plenitude, é indispensável que a
escola aperfeiçoe seu modelo didático a fim de atender a total diversidade do alunado, que
não pode passar pelo processo escolar com qualquer comprometimento do desenvolvimento,
ou seja, é meta da escola inclusiva caracterizar o desempenho dos alunos com o sucesso ativo
na aprendizagem das atividades escolares, e não como um nível ou rendimento. Assim incluir
é acolher a diversidade de desenvolvimento de cada um (MPF, 2004).
Rodrigues (2001) relata que é direito de toda criança ter acesso à escola e receber
educação básica, mas é fato que, muitas vezes, este direito não é utilizado por todos e sim
apenas pelas crianças que não possuem uma cultura totalmente diferente (da cultura social
dominante) e que possuem as mesmas capacidades pessoais que os alunos sem deficiência
portam. Para superar esta situação a inclusão pode ser a ponte para a possibilidade de usufruir
o direito de garantia e acesso a toda criança indiscriminadamente na escola (RODRIGUES,
2000).
Sob a luz da concepção inclusiva acreditamos que toda criança sabe algo, embora
precise ser estimulada. E é preciso que a escola se adapte a cada criança de uma maneira
29
diferente descobrindo suas dificuldades e trabalhando nelas para que a criança aprenda e não
desista. Isto é possibilitar que a criança crie capacidades para superar seus obstáculos
escolares. O professor pode usar dos talentos individuais para valorizar cada criança. Afinal
todos possuem defeitos e sobre tudo talentos e esses quando valorizados e acreditados podem
influenciar na capacidade e vontade de aprender. Por maior que seja o desafio de ensinar uma
turma que possui aluno com deficiência é preciso se apegar às particularidades de cada
criança, somente dessa maneira podemos descobrir as barreiras do ensino e superá-las. As
barreiras podem ser descobertas simplesmente através de diálogos e transparência. Essa
proposta pedagógica referenda a educação não-disciplinar que favorece a educação inclusiva
(GALLO, 1999).
Para superar as barreiras do ensino à inclusão, a avaliação não pode continuar sendo
feita como é. É importante aperfeiçoá-la ao processo de aprendizagem, avaliar cada aluno de
acordo com suas particularidades e potencialidades de forma reflexiva e assim monitorar seu
desenvolvimento e conseguir uma avaliação adequada à aprendizagem de cada aluno
(RODRIGUES, 2001).
Para alcançar o ensino inclusivo a escola em um todo deve observar o seu próprio
crescimento: desde os professores e alunos até sua estrutura e participação da comunidade,
para perceber se está indo em um caminho que seja adequado para a reorganização do ensino.
Desta forma torna-se possível ensinar a todos sem qualquer exclusão da diferença da
deficiência, aproveitando o direito de todos de aprender para formar cidadãos capacitados a
enxergar o mundo de maneira que a diversidade seja um alto valor social.
Quando alcançada a inclusão no ensino escolar as diferenças de cada aluno possuirão
um caráter de aperfeiçoamento para o processo de aprendizagem. Dessa maneira, a escola
incluirá as diferenças da deficiência significando valores sociais ao processo de aquisição dos
conhecimentos.
Neste sentido, Rodrigues (2001) comenta que podemos criar uma escola que
disponibilize direitos iguais para todos, com profissionais capacitados para ensinar os alunos
com e sem deficiência. Isto é algo possível, basta que a conquista seja feita da maneira certa e
graças aos vários motivadores da inclusão. Diante disso, construímos como pressuposto, neste
estudo, que quando menos esperarmos teremos escolas renovadas que acolherão
perfeitamente todos os alunos sem distinção.
30
4.3 A diferença na escola
Orientados no movimento de inclusão escolar apresentamos adiante um recorte do
referencial inclusivo baseado no modelo social de incluir as diferenças das PcD na escola,
assim, abordamos adiante a relação das práticas educacionais com relação ao estigma social
da diferença da deficiência.
Consideramos no cotidiano escolar a dependência de relação dos professores e o
sistema escolar para a realização da inclusão. Com relação aos professores, Puppin (1999),
sugere que as condições de inclusão desenvolvem-se nas discussões pedagógicas que retirem
a escola da condição de espaço estigmatizador.
Souza (2003) alerta que os educadores carregam os conteúdos, valores e condutas das
concepções da sociedade, de forma a gerar os procedimentos e as práticas educativas. E
Ghiraldelli Jr (2003) também afirma que o professor sofre inúmeras caracterizações devido o
significado do papel social condicionado nas relações entre o mercado de trabalho e a
produção social.
Neste sentido o professor está subordinado à produção e aceitação social de incluir as
diferenças, sendo responsável, no ambiente escolar, por protagonizar práticas de ensino-
aprendizagem que valorizem as diferenças, pois tendo o professor uma postura acessível à
inclusão, tem-se um grande valor favorável, já que as atitudes inclusivas são possíveis de
serem realizadas nas aulas, mesmo quando o sistema escolar não apresentar os recursos e
adaptações razoáveis adequados a PcD.
Neste sentido, Oliveira (2000) relata que a postura pedagógica do professor é muito
importante no movimento de inclusão, pois na instituição escolar há a representação
estigmatizada do aluno com deficiência, cujo conceito está manipulado a uma perspectiva
desacreditadora da diferença da deficiência, segregando-a.
Diante disso, entendemos que a representação de que a condição de deficiência limita
o aluno nas expectativas educacionais precisa ser desconstruída para que o professor alcance
as práticas didático-pedagógicas inclusivas (OMOTE, 2004; OLIVEIRA, 2000).
Em consequência deste olhar é necessário construir práticas de aprendizagem que
combatam as formas de exclusão dos alunos com deficiência, como o fato da escola tratar as
diferenças dos alunos com deficiência e não as barreiras da aprendizagem (SANTOS;
CARVALHO, 1999).
31
Esta atitude do sistema escolar de deslocar o aluno com deficiência para o atendimento
especializado, sem questionar o processo de aprendizado que a escola regular impõe,
representa o valor de negação da PcD, estigmatizando sua condição de diferença como um
atributo incapacitante ao aprendizado (OLIVEIRA, 2000).
Sobre a idéia de protagonizar o professor nas intervenções pedagógicas da inclusão,
Omote (2004, p. 302) contribui
muitos alunos deficientes ou egressos de classes especiais podem encontrar oportunidade de aprendizagem em ambiente educativo, no qual os bons professores, simplesmente munidos daquelas soluções didático-pedagógicas, adquiridas na sua formação ou desenvolvidas nos seus vários anos de experiência docente, realizam com competência a tarefa de ensinar alunos que não aprendem sozinhos, mas não chegam a ser tão especiais que requeiram grandes adaptações por parte da escola.
Entendemos que incluir não é simplesmente aceitar o aluno com deficiência na escola
estigmatizando o seu aprendizado por práticas especializadas que a educação especial possa
elaborar. Inclusão é uma educação na qual há a consciência de que toda a criança é única e
diferente, e que as condições das diferenças são capacidades para aperfeiçoar as interações do
processo de aprendizagem.
Diante do pertencimento da diferença como contribuição social no cotidiano escolar
destacamos a partir de agora a educação física no currículo da escola e sua atuação na
exploração das práticas corporais inclusivas.
4.4 A educação física inclusiva
A Educação Física (EF) é uma disciplina integrante do currículo da escola comum,
assim destacamos neste estudo a atenção com relação a prática didático-pedagógica na
perspectiva da inclusão para o atendimento aos alunos com deficiência.
Rodrigues (2000) afirma que os professores podem ver um grande desafio na inclusão
de alunos com deficiência nas aulas de EF, mas excluí-los das aulas não irá resolver, pelo
contrário. A inclusão está nas escolas e na sociedade e os professores de educação física
deverão exercer as aulas sem deixar os alunos com deficiência de fora das atividades. Diante
32
disso, pontuamos que a disciplina EF pode ser usada a favor da inclusão quando o professor
entende a diversidade da cultura de corpo e movimento de cada aluno.
Para Marston e Leslie (1983) os professores que conhecem melhor o conteúdo
científico das deficiências apresentam atitudes mais positivas para a inclusão, pois as atitudes
e ações inclusivas dependem da deficiência do aluno, e sendo ela física a dificuldade pode ser
maior. Fica em questão o fato de que quanto maior o tempo que o aluno com deficiência
frequenta a escola, mais fácil sua inserção na aula de educação física, sendo que a idéia real
de avaliação inclusiva é a experiência específica e não a somatória dos conteúdos (RIZZO;
VISPOEL, 1991).
Destacamos a importância da disciplina EF para a criança com deficiência com base
em Chateu (1987) que refere que o homem só é completo quando brinca, o que torna notória a
necessidade da EF inclusiva para o desenvolvimento do aluno com deficiência, pois participar
das aulas é saudável física e psicologicamente. O professor de EF deve apenas saber explorar
as atividades e desenvolvê-las respeitando os limites, paciências e cooperação de todos.
Portanto, o professor precisa auxiliar seus alunos, tenham eles deficiência ou não, assim Glat
(1998, p. 44) aponta
se aproximar desse indivíduo, e entende-lo com suas especificidades e suas dificuldades individuais - incluindo sua deficiência. E aí sim junto com ele, criar um programa individual de integração que atenda às suas necessidades, possibilidades e desejos. Não podemos carregá-lo no colo, podemos apenas ajudá-lo a percorrer o seu caminho, que no final das contas, será solitário e individual, como o de todos nós.
Desta forma compreende-se que o professor de EF deve auxiliar seu aluno atendendo
suas necessidades, mas conforme Silva (1993) a formação pedagógica do professor de EF
voltada para a perspectiva inclusiva está sendo colocada em segundo plano, pois a formação
prioriza disciplinas de cunho técnico - desportivo corporal e biológico. Entende-se então que a
formação supervaloriza as habilidades que priorizam o desempenho físico, técnico e o corpo
como objeto de repetição de procedimentos normatizados.
Diante disso, para entender a formação pedagógica do professor de educação física,
descrevemos a seguir a trajetória da formação (graduação) do currículo da educação física sob
a luz do entendimento social do corpo, relacionando ao significado da educação corporal
inclusiva.
33
O corpo possui atribuições sociais e é considerado um elemento para o entendimento
das relações humanas. Bracht (1999) explica que o corpo é multideterminado pelas exigências
sociais produtivas, sanitárias, morais e pelas formas de controle social.
O corpo no resgate histórico da educação física escolar no Brasil, a partir de 1920, foi
condicionado à educação de corpos saudáveis para a produção social de habilidades físicas,
rendimento indispensável ao Estado mediante o regime militar e a medicina higienista
(BRACHT, 1999; CHICON, 2008).
Neste momento fica clara a produção da exclusão da PcD nas práticas de ginástica que
mobilizaram a educação física, pois a essas pessoas não se atribuiu o pertencimento no grupo
dominante dos normais devido o descrédito de seu rendimento aos padrões de habilidades
corporais exigidas (RECHINELI; PORTO; MOREIRA, 2008).
Na busca do referencial científico, período entre 1950 e 1980, a educação física aborda
a concepção positivista em pesquisa e o modelo biologicista e medicalizado. Nesta abordagem
tecnicista a PcD foi excluída das práticas pedagógicas escolares, tão fortemente voltadas a
excelência e aptidão física da performance de modalidades esportivas (CHICON, 2008).
A escola valorizava a eficiência do corpo na educação física com base nas
modalidades esportivas, este modelo de educação corporal não integrava o aluno com
deficiência, então iniciou a educação física adaptada, segregando o aluno com deficiência da
escola comum. Por outro lado, é importante registrar que o esporte não se trata de uma prática
excludente, e sim, a forma social da prática do esporte é que pode constituir-se em parâmetros
excludentes, como a competição, a seleção, e a produção social do atleta. Desta forma,
apontamos que a orientação social da EF é que desencadeou as condições de exclusão ou
inclusão dos corpos.
Neste sentido, a partir da década de 80 vemos a educação física incorporar discussões
pedagógicas influenciada pelas ciências humanas, com base na filosofia e sociologia de
educação marxista. Neste momento, começa a ser rompido o paradigma da aptidão física e
esportiva devido à análise da função social da educação nas diferenças sociais (BRACHT,
1999).
Neste período, iniciado em 1980, acontece o movimento renovador da educação física.
Caparroz (2007) explica este movimento em virtude da necessidade da educação física escolar
negar as concepções anteriores procurando compreender o corpo e o movimento humano de
forma mais abrangente e menos específica. Este movimento vem delimitar a formação do
professor de educação física para uma abordagem mais crítico-reflexiva e menos técnica.
Segundo Kunz (1991) o professor que está sob a proposta de orientação crítica-reflexiva atua
34
no sentido social de educação do corpo e do movimento. A este respeito, observamos grande
aproximação do movimento renovador da educação física com a perspectiva inclusiva.
Para compreender o percurso cronológico de orientação da educação física, Rechineli;
Porto; Moreira (2008, p. 305) apresentam um quadro ilustrativo, que esclarece as abordagens
pedagógicas, relacionando se apresentam propostas inclusivas. Contudo, a coluna com as
Datas é grifo nosso.
Quadro 1- Abordagens da Educação Física e as propostas inclusivas.
DATAS
1920
1950
1988
1989
1990
1990
2000
1996
1988
35
Como podemos observar no quadro, as abordagens seguintes a tecnicista, delimitam o
movimento renovador incorporando propostas inclusivas para a educação física escolar.
A indicação da sigla PCN, que aparece no quadro, é a referência aos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN). Em 1998 os PCN incluem um documento específico destinado
a área da educação física que adota ações pedagógicas na perspectiva da inclusão (AGUIAR;
DUARTE, 2005; RECHINELI; PORTO; MOREIRA, 2008).
Podemos compreender com esta síntese apresentada, que a abordagem pedagógica
crítico-reflexiva do professor de educação física implicará em ações que podem fortalecer o
processo de inclusão no contexto da educação física escolar.
Destacamos ainda, que o desenvolvimento da educação física como componente
escolar possui a carga de determinação das estruturas macrossociais. Neste contexto a
educação física escolar foi desenhada num caráter instrumental, no qual o modelo de corpo
forte e sadio foi articulado em função da sociedade e do regime capitalista emergente no
século XIX (CAPARROZ, 2007).
Na atualidade a educação corporal segundo Bracht (1999), vive um momento de
cultura pós-moderna numa visão de corpo humano delimitada por um novo significado,
bastante complexo e ainda indefinido, que não admite simplificações em corpo máquina e
corpo ter.
Rechineli; Porto; Moreira, (2008), apontam que atualmente a educação física aborda o
significado da eficiência dos corpos deficientes quando inclui propostas participativas num
processo de aprendizagem inclusivo.
No sentido de uma educação corporal que não estigmatiza o corpo na eficiência como
sinônimo de performance e aptidão física, vemos o movimento da pedagogia progressista se
apropriando do processo de educar o corpo nas últimas duas décadas. Ghiraldelli Jr. (2003)
contribui que neste movimento a educação física buscou encontrar o trabalho corporal e o
movimento com outros instrumentos desligados das antigas concepções conservadoras.
Este contexto colabora para a prática pedagógica inclusiva na educação física. Neste
entendimento Aguiar e Duarte (2005), sugerem o papel do professor de educação física na
direção de uma abordagem de cooperação e participação na convivência com a diversidade,
incluindo nos jogos e campeonatos escolares com todo o alunado, inclusive aquele que não
demonstra talento ou que apresenta dificuldades no controle do corpo e dos movimentos.
Desta forma, o professor de educação física, utiliza-se da técnica do esporte para realizar
práticas didático-pedagógicas na perspectiva inclusiva.
36
Compreendemos que a inclusão refere-se a uma educação física com o significado de
educar o corpo e o movimento e, para tanto, envolve o processo de desconstruir a identidade
estigmatizada de rendimento que o sistema escolar e o meio social possam ter atribuído à
técnica do esporte.
Observando o avanço do currículo de formação do professor de educação física,
encontramos a abordagem do rendimento na primeira estruturação, o modelo tradicional-
esportivo. Nesta proposta o rendimento do corpo estava inserido, estigmatizando as práticas
corporais no paradigma do corpo sadio e forte. Kunz (1991) comenta que quando a educação
física está orientada sob o modelo esportivo, atende aos interesses de uma minoria, que são os
alunos talentosos e aptos para competir, deixando a maioria sem atendimento educacional.
No final da década de 80, inicia-se a proposta de abordagem técnico-científica. Betti e
Betti (1996) relatam que este currículo de formação está em vigor na maioria das
universidades brasileiras.
Encontramos na orientação técnico-científica a valorização das disciplinas gerais e
aplicadas e o envolvimento com as ciências humanas e a filosofia (BETTI; BETTI, 1996).
Nesta proposta curricular encontramos a inclusão sendo mencionada em determinadas
disciplinas, que em geral ocorrem voltadas ao trabalho do esporte adaptado.
Mediante o conteúdo curricular que forma o professor de educação física, ainda
identificamos o marco da eficiência dos corpos, mesmo tendo a proposta de inclusão
delimitada nos parâmetros curriculares nacionais (PCN).
Desta forma, o professor está formado em conformidade com a representação social de
rendimento do corpo, mas possui no cotidiano da educação física escolar, um papel ativo no
sentido de operacionalizar práticas corporais inclusivas. Contudo, destacamos que o professor
é capaz de desenvolver o seu papel social como educador na escola, já que os alunos sentem-
se, de forma geral, com disponibilidade à educação física. Conforme relata Rodrigues (2003),
os alunos são na maior parte receptivos nas aulas de educação física, pois elas proporcionam
prazer e diversão, levando-os a um mundo onde os problemas não são o centro das atenções.
Sob este referencial compreendemos que as aulas de educação física contribuem para a
inclusão dos alunos com deficiência, ajudando-os a superarem seus limites transformando-os
em crianças com uma identidade social de satisfação.
Ao considerarmos o conflito estabelecido entre a formação do professor e a atuação
profissional inclusiva - conforme descrevemos neste item do capítulo - transpareceu-nos a
necessidade de se trabalhar a escola como espaço de desconstrução das representações do
estigma que interpõem o desenvolvimento das práticas inclusivas. A esse respeito, buscamos
37
com este estudo contribuir com os professores de educação física para incluir as diferenças da
cultura de corpo e movimento dos alunos desconstruindo a carga do estigma social do corpo
no rendimento físico que segrega o aluno com deficiência.
38
5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Neste estudo adotamos o referencial teórico da abordagem qualitativa de pesquisa
social. Segundo Minayo (2004), a pesquisa social compreende uma marca histórica de grande
significação para a interpretação do objeto do estudo quando delineia a importância dos
questionamentos qualitativos sobre o mundo real.
Desenvolvemos o processo de investigação, com o recorte no objeto: a reorientação
didático-pedagógica da educação física na perspectiva da inclusão escolar; e para o plano
conceitual metodológico adotamos a interpretação dos dados com ênfase na dialética. A
seguir, descrevemos o método proposto.
5.1 Tipo de estudo
Para a nossa proposta de trabalho seguimos o método da Pesquisa-ação. A área das
ciências sociais considera a pesquisa-ação como um método ou estratégia de pesquisa que
agrega instrumentos e técnicas de pesquisa social 5 (THIOLLENT, 1996).
Segundo Dionne (2007), a pesquisa-ação é definida como um procedimento de
levantamento de decisões na qual a contribuição para modificar a situação é o principal
aspecto levantado na ação, tendo como eixo uma estratégia de pesquisa para contribuir com
um conhecimento referencial sobre o objeto adotado.
Adotamos a pesquisa-ação partindo do referencial que conceitua o método como
forma de investigar e contribuir com a realidade do nosso objeto de estudo, e, neste sentido,
Cruz (2003, p. 3) aponta que a pesquisa-ação contribui como estudo que aprimora o processo
escolar
do ponto de vista da investigação, observar e apreender uma situação dinâmica como a que diz respeito ao processo ensino-aprendizagem deflagrado em um ambiente destinado à educação escolarizada de crianças, implica em considerar procedimentos
5 Os instrumentos e técnicas de pesquisa social que adotamos neste estudo foram apresentados no item 5.5 deste capítulo.
39
metodológicos que não engessem o fenômeno em questão a ponto de empobrecê-lo em sua complexidade e profundidade. O necessário aprimoramento da convivência entre reflexão e ação, sem preterir uma em relação à outra, numa perspectiva de mudança de algum aspecto da realidade conduz a apontamentos realizados acerca da pesquisa-ação.
Dentre os autores descritos optamos por estruturar nossa proposta de pesquisa segundo
a concepção e organização da pesquisa-ação referida por Thiollent (1996). O autor aponta o
planejamento da pesquisa-ação de forma flexível, sem estabelecer fases ordenadas, propondo
o roteiro no qual há um ponto de partida e chegada, sabendo que no decorrer da trajetória se
articulam os passos do percurso e as ferramentas em função das circunstâncias investigadas.
5.2 Caracterização da pesquisa-ação
Na pesquisa-ação, Thiollent (1996) aponta que a produção do conhecimento não se
limita a descrever ou avaliar, mas se insere numa concepção que também seja ação.
A vocação prática da pesquisa-ação considera que é fundamental que a pesquisa seja
articulada a um marco de referencial teórico. A concepção teórica acompanha todos os passos
do processo da pesquisa (THIOLLENT, 1996).
O ponto de partida da pesquisa-ação, referido por Thiollent (1996), foi a fase
exploratória. Esta tarefa compreendeu o levantamento do tema e do objeto de pesquisa, do
diagnóstico situacional, deliberação dos problemas e anuência dos participantes.
Após a exploração inicial destas informações, seguimos o desenvolvimento da
pesquisa-ação na colocação dos problemas que se pretendeu resolver, considerando o campo
teórico e prático (as aulas de educação física na perspectiva da inclusão escolar).
Os problemas apontados na realidade dos professores de educação física foram
tratados a fim de procurar soluções para se chegar a alcançar os objetivos propostos ou
realizar uma possível transformação dentro da situação encontrada. Desta forma, trabalhamos
como propõe Thiollent (1996), a partir da situação inicial colocam-se os problemas para
chegar ao alcance de uma situação final ou desejada.
40
Neste ponto da trajetória elaboramos algumas hipóteses6. Thiollent (1996) define
hipótese como uma suposição a respeito de possíveis soluções ao(s) problema(s) levantado(s)
na pesquisa. Mediante a suposição de possíveis soluções para os problemas colocados pelos
professores participantes, direcionamos o percurso da pesquisa para o encontro de interesse de
todos na operacionalização da investigação e ação nas aulas de educação física.
Começamos, a partir de então, a constituição das estratégias que condicionaram as
ações didático-pedagógicas nas aulas de educação física inclusivas. Neste momento,
adotamos a técnica do seminário central para reunir as informações dos instrumentos de coleta
de dados, das quais o grupo discutiu, analisou e interpretou os dados. Para Thiollent (1996) a
técnica de seminário operacionaliza os encontros coletivos para elaborar as interpretações,
definir as diretrizes das ações, acompanhá-las e avaliá-las. Realizamos cinco seminários,
sendo que esta técnica de coleta de dados possibilitou reorientar as ações didático-
pedagógicas para as aulas de educação física inclusivas dos professores participantes.
O planejamento das ações envolveu a reconstrução das práticas educacionais, e assim
planejamos ações didático-pedagógicas que os professores participantes realizaram nas aulas
de educação física das turmas que tinham alunos com deficiência de sua própria escolha.
Seguimos o percurso no plano de aplicação prática das ações incluindo avaliação processual,
análise das intervenções, possível continuidade, modificações e aprendizado dos participantes.
Para Thiollent (1996), neste momento a pesquisadora desempenha um papel auxiliar, ou do
tipo “assessoramento” nas ações desempenhadas para realizar a solução dos problemas
propostos. As ações realizadas aconteceram nas aulas dos professores, portanto, o pesquisador
não atuou diretamente como professor, os próprios sujeitos participantes realizaram a prática
educacional no seu cotidiano escolar a partir da reorientação proposta neste estudo.
O ponto de chegada para finalizar a investigação e ação foi a divulgação dos
resultados. Segundo Thiollent (1996), este procedimento inicia-se num encontro com os
participantes para fortalecer os resultados das ações aplicadas, o conhecimento adquirido e a
contribuição da pesquisa. Após este procedimento, realizamos o retorno da informação a
todos os participantes para viabilizar a divulgação dos resultados também em outros meios,
bem como para outros setores interessados.
O roteiro supracitado, baseado no método da pesquisa-ação proposto por Thiollent
(1996), compreendeu a utilização de técnicas de coleta de dados descritas adiante no item 5.5.
6 Descrevemos a elaboração das hipóteses no item 2 do capítulo 6.
41
5.3 Abrangência do estudo
A cidade escolhida para o desenvolvimento do estudo foi o município de Itajaí. A
opção parte da relação entre a pesquisadora e os sujeitos, ambos com atuação profissional na
rede municipal de ensino desta cidade e comprometidos com o processo de inclusão escolar.
Sendo todos os atores do estudo envolvidos para o desenvolvimento e transformação
local do serviço de educação, a gestão mostrou-se favorável a prática da pesquisa.
No período de realização do estudo, a cidade de Itajaí contava com 39 unidades
escolares pertinentes à gestão da Secretaria Municipal de Educação, sendo que, em todas as
escolas havia abrangência de turmas que tinham alunos com deficiência.
Na sistemática do trabalho da rede municipal de ensino de Itajaí havia na jornada de
trabalho do professor horário disponibilizado para atividade extraclasse, e esses momentos
eram destinados para discussão e construção de estratégias de intervenção, como a proposta
deste estudo, que proporcionou melhoramentos no cotidiano escolar.
5.4 Participantes do estudo
Foram convidados para participar deste estudo 13 (treze) professores de Educação
Física, sendo que 4 (quatro) professores recusaram o convite e 2 (dois) professores desistiram
de permanecer na pesquisa durante os procedimentos de coleta de dados (os motivos de
recusa e desistência eram pessoais e os sujeitos não desejaram que fossem revelados na
pesquisa).
A escolha dos docentes foi mediada pela Secretaria Municipal de Educação
juntamente com a pesquisadora, no sentido de organizar quais professores se encontravam em
acordo com os critérios de inclusão da pesquisa. Os critérios estabelecidos competiam:
professores admitidos em caráter efetivo no município de Itajaí e atuação profissional com
turmas que possuíam alunos com deficiência (a gestão auxiliou nesse processo, pois uma
grande parte dos professores efetivos desempenhavam outra função que não exigia atuação
direta em sala de aula).
Os professores foram convidados em caráter intencional, segundo a relevância que
representavam em relação ao objeto deste estudo, ou seja, consideramos a representação
42
saliente que desempenhavam enquanto professores no sentido de sobressair-se mediante a
postura de comprometimento com a prática do ensino. Para Thiollent (1996) a amostra
intencional é aplicada para o caso da pesquisa-ação.
O convite teve caráter voluntário e foi estabelecido mediante assinatura do termo de
consentimento livre e esclarecido conforme Resolução 196/96 (os aspectos éticos foram
descritos no final deste capítulo).
5.5 A coleta de dados
No procedimento de coleta de dados utilizamos técnicas e instrumentos da abordagem
qualitativa em pesquisa social, dispostos como uma gama de ferramentas que se interpolaram
e se ajustaram no desenvolvimento do percurso da pesquisa-ação7.
Segundo Minayo (2004), os recursos metodológicos da abordagem qualitativa em
pesquisa garantem um conjunto de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade do
objeto de trabalho, das quais mostramos a seguir.
5.5.1 Observação livre
Para Triviños (1987), a pesquisa qualitativa utiliza a observação livre do
desenvolvimento de determinada situação, como instrumento para satisfazer as necessidades
de objeto do estudo.
Utilizamos a técnica de observação livre quando assistimos as aulas de educação física
dos participantes nas unidades escolares de Itajaí. A observação foi realizada a partir de
critérios, que serviram de orientação para o registro das informações mais relevantes
(Apêndice A).
Os critérios norteadores da observação livre foram estabelecidos como base para que
este instrumento, junto aos demais, possibilitasse reorientar a prática da educação física
inclusiva. Desta forma, delimitamos observar: as estratégias didático-metodológicas do 7 Destacamos que a técnica do Seminário foi utilizada na coleta de dados e foi descrita no item 5.2, segundo a referência do autor Thiollent (1996) para o desenvolvimento da pesquisa-ação.
43
professor para promover a inclusão; a participação dos alunos na proposição de atividades; e a
apropriação da aplicação de conhecimentos sobre as deficiências.
A observação livre foi uma forma de coleta de dados, sendo que observamos os
professores participantes em suas próprias atuações escolares, antes de planejarmos as aulas
inclusivas e também durante e após a aplicação das estratégias reorientadas para a prática
pedagógica inclusiva (para cada professor de educação física observamos aproximadamente
quatro aulas).
As informações coletadas na observação livre foram transferidas ao grupo durante os
seminários, conforme a necessidade da colocação dos dados. Segundo Thiollent (1996), a
transferência de informações tem por finalidade serem discutidas, analisadas e interpretadas
com todos os envolvidos.
5.5.2 Oficina
A técnica de oficina aconteceu na fase exploratória da pesquisa-ação, logo no início da
coleta de dados8.
A oficina configurou-se um espaço de trabalho de pesquisa que trabalhou as bases
materiais da existência dos sujeitos participantes da pesquisa, pois tal técnica é o espaço em
que se produzem as relações de acordo com a participação nos instrumentos de trabalho.
Desta forma, realizamos a técnica de oficina utilizando a escrita individual (com
leitura para o grupo) de um roteiro biográfico (Apêndice B) para conhecer a história de cada
professor participante. E na sequência exploramos a realidade local, mediante as dificuldades,
limites, alcances e desafios (Apêndice E) dos professores de educação física, trabalhando a
problematizarão da prática didático-pedagógica na perspectiva da inclusão, seguindo com a
teorização, reflexão e propostas para a mudança da realidade.
8 A estruturação da Oficina está descrita no capítulo 6, item 6.2.
44
5.5.3 Grupo focal
O encontro final da pesquisa-ação foi destinado à experiência com o grupo focal.
Beck; Gonzales; Leopardi (2002) referem o grupo focal como uma forma de coletar dados
diretamente das falas de um grupo, que relata suas experiências e percepções em torno de um
tema de interesse coletivo.
O tema coletivo proposto pelos professores de educação física foi o enfrentamento das
ações didático-pedagógicas reorientadas durante o processo da pesquisa-ação. Os professores
relataram as experiências e a percepção da contribuição desta pesquisa sobre o significado do
professor para o aluno com deficiência, e o levantamento de perspectivas de continuidade
sobre as práticas reorientadas na ação docente.
Realizamos o grupo focal em dois encontros, a pedido dos professores, focando o
segundo encontro no roteiro (Apêndice C) que possibilitou a escrita individual com leitura e
discussão coletiva, conforme a temática do primeiro encontro. O roteiro foi delimitado no
referencial do conceito de estigma e das representações sobre a pessoa com deficiência.
Norteados por este marco teórico buscamos abordar as representações do professor sobre o
aluno com deficiência e enfrentar as problemáticas do cotidiano escolar em relação à
Educação Física Inclusiva.
5.5.4 Diário de campo
O diário de campo é o instrumento no qual o ator é o observador da sua própria
atuação. Ele mesmo escreve uma narração da sua experiência colocando-se da forma que
considerar mais relevante à situação (ZABALZA, 2004).
Delimitamos o uso do instrumento diário de campo, para que os professores
participantes escrevessem no diário o que achassem ser relevante para a pesquisa-ação. Para
Zabalza (2004), no método da pesquisa-ação é muito importante escrever o diário para
documentar o processo, reconhecer as dificuldades, as proposições utilizadas e as
transformações que foram ocorrendo no percurso.
Os participantes escreveram no diário a sua própria aula de educação física inclusiva,
reorientada durante a pesquisa, sendo que a escrita aconteceu na escola que cada professor
45
trabalhava. Nos seminários, os professores direcionaram as informações que acharam ser
pertinentes para o conhecimento, análise e discussão do grupo. A utilização do diário de
campo foi feita durante o desenvolvimento da pesquisa-ação, interpondo-se entre o ponto
inicial e final do percurso (cada professor escreveu aproximadamente cinco diários).
5.6 Processo do estudo
Para esclarecer a trajetória deste estudo, apresentamos uma proposta de trabalho que é
delimitada conforme os pontos descritos no item 5.2, segundo o desenvolvimento da
pesquisa-ação referido por Thiollent (1996). Contudo, apresentamos uma síntese obtendo as
características da pesquisa-ação, os instrumentos de coleta de dados e o período de realização:
• Ponto de partida do percurso: fase de exploração. Incluiu na coleta de dados: oficina e
observação livre. O cronograma compreendeu o mês de julho e parte de agosto;
• Desenvolvimento: colocação dos problemas, hipóteses, planos e estratégias de ação.
Incluiu na coleta de dados: observação livre, diário de campo e seminário. O
cronograma compreenderam os meses de agosto a novembro;
• Ponto de chegada: divulgação dos resultados. Incluiu na coleta de dados: grupo focal.
O cronograma compreendeu o mês de novembro.
Em síntese esta foi a estrutura da pesquisa, esclarecemos que os encontros coletivos
dos instrumentos metodológicos para a coleta de dados (oficina, seminários e grupo focal),
aconteceram nas sextas-feiras, no período da manhã e/ou tarde nos meses de agosto a
novembro de 2010 (as datas foram pré-agendadas e houve prorrogação do calendário,
acrescentando um encontro final conforme a decisão do grupo).
O local para os encontros foi a Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), sendo que
a escolha deu-se devido à estrutura física e tecnológica adequada e a permissão do acesso
devido ao vínculo com os pesquisadores.
Após o último encontro coletivo, o cronograma continuou com a análise de dados e a
elaboração do relatório de pesquisa. E, após a defesa para a banca examinadora, segue ainda a
elaboração da redação final da dissertação e a devolutiva final aos participantes, unidades
escolares e Secretaria Municipal de Educação.
46
5.7 Análise de dados
Para o procedimento de análise de dados, adotamos a análise de conteúdo proposta por
Bardin (2004). A autora propõe a análise de conteúdo como um conjunto de técnicas de
investigação da comunicação para descrever com objetividade e sistemática as mensagens da
comunicação, bem como, a finalidade e a interpretação das mesmas.
A análise de conteúdo não é um único instrumento, e sim um leque de materiais com
procedimentos rigorosos que organizam o processo de investigação com a seguinte
apresentação: pré-análise, exploração do material, inferência, tratamento e interpretação dos
dados (BARDIN, 2004).
Na classificação do conteúdo, as mensagens apresentam-se na forma de categorias de
análise. As categorias reúnem os núcleos de sentido da informação através das unidades de
registro e contexto presentes na codificação da comunicação (BARDIN, 2004). No item 3 do
capítulo 6 descrevemos como aconteceu o processo de análise de conteúdo dos dados desta
pesquisa e apresentamos as categorias de análise.
5.8 Considerações éticas
Este estudo adotou as considerações estabelecidas na Resolução 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde que se refere às Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas
Envolvendo Seres Humanos. E foi julgado aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade do Vale do Itajaí em 25/06/2010, conforme o Parecer 178/10 em protocolo
(Anexo A).
O desenvolvimento ético desta pesquisa foi atribuído nos referenciais básicos da
bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça, entre outros.
Em respeito à comunidade e individualidade humana, realizamos o cumprimento dos
seguintes aspectos: esclarecimento da pesquisa para todos os participantes; obtenção da
anuência do participante no termo de consentimento livre e esclarecido (apêndice D); garantia
do anonimato e sigilo das informações que não desejaram ser divulgadas; segurança aos
participantes para retirarem-se da pesquisa ou permanecerem sem que lhes ocasione qualquer
47
dano; respeito aos valores, hábitos e costumes das pessoas envolvidas e garantia da devolução
dos dados após o término da pesquisa.
As considerações abordadas proporcionaram o desenvolvimento da pesquisa dentro
dos parâmetros que preconizam a lei.
48
6 A COMPREENSÃO SOBRE A PRÁTICA VIVIDA
O desenvolvimento da pesquisa-ação mostrou-se um percurso contínuo no qual os
sujeitos e seus contextos próximos adquiriram o despertar da consciência perante as ações
inclusivas implementadas, tanto as ações coletivas quanto as ações específicas (que
descrevemos no item 6.2).
Para compreender a situação local apresentamos a seguir o contexto do estudo.
6.1 Contexto do estudo
Inicialmente vamos descrever como se estruturava a disposição do serviço de
educação no município de Itajaí, no período de realização deste estudo. Para a supervisão do
ensino, todas as unidades escolares recebiam o subsídio das supervisoras de gestão escolar,
trabalho itinerante supervisionando as questões pedagógicas organizado por pólos (uma
supervisora por pólo, determinado pelo agrupamento geográfico das unidades de ensino). As
escolas recebiam o apoio educacional especializado do Centro de Educação Alternativa de
Itajaí (Cemespi) que realizava serviço itinerante de assessoramento para as escolas e
atendimento específico nas áreas de educação especial, psicopedagogia, psicologia,
fisioterapia e fonoaudiologia. A partir do trabalho desenvolvido no Cemespi, surgiu a questão
problema desta pesquisa com a proposta de articulação intersetorial do serviço de fisioterapia
com a educação física escolar, certos da necessidade de ações de educação em saúde para a
prevenção e intervenção do sedentarismo infanto-juvenil, sob a perspectiva da concepção
ampliada em saúde, visando contribuir com as práticas corporais destinadas para as turmas
que frequentam os alunos com deficiência ou transtorno global do desenvolvimento ou altas
habilidades/superdotação.
Ainda referente à disposição de serviços, aconteceu no decorrer do ano de 2010 a
instalação das salas multifuncionais destinadas ao atendimento educacional de crianças com
necessidades educacionais especiais. Segundo MEC (2007), a implantação de salas de
recursos multifuncionais foi lançada no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) em
2007, reafirmado pela Agenda Social, tendo como eixo a educação especial destinada aos
49
educandos com necessidades educacionais especiais dentro da escola regular de forma
transversal a classe comum.
As unidades escolares compreendiam 29 (vinte e nove) escolas básicas que
contemplavam os anos iniciais e finais do ensino fundamental, 6 (seis) escolas isoladas e 4
(quatro) grupos escolares que contemplavam os anos iniciais do ensino fundamental.
O corpo docente da educação física compreendeu aproximadamente 70 (setenta)
professores, sendo que quase a metade foi admitida por contrato temporário. Dentre,
aproximadamente, 40 (quarenta) professores admitidos em caráter efetivo, alguns ocupavam
outra função (na direção escolar, no desporto escolar, na Fundação de Esporte e Lazer), o que
ocasionou a contratação de professores temporários para ocupar a função original dos
efetivos. Na sistemática do trabalho da rede havia na jornada docente um horário destinado
para atividades extraclasses, denominado hora-atividade, que correspondia a 20% da carga
horária. Nestes momentos os professores realizavam planejamento das aulas, frequentavam
cursos, ou participavam de outros eventos afins ao ensino, como feira de ciências e jogos
escolares.
Quanto à gestão da educação física, era atribuição do Departamento de Desporto
Escolar, vinculado à Secretaria de Educação, as seguintes funções: supervisionar o desporto
escolar, realizar compra de materiais, organização de eventos municipais como: Jogos
Recreativos Municipais Escolares9 (JORME), Jogos Escolares de Itajaí (JEI), Passeio
Ciclístico, Desfile de Sete de Setembro, e outros eventos em parceria com demais
departamentos. Uma importante observação foi que o Departamento de Desporto Escolar não
tinha a função de supervisionar as questões pedagógicas da educação física escolar, o que
proporcionou um distanciamento entre os professores de educação física na escola e a gestão
da Secretaria de Educação. Além disso, o Departamento de Desporto Escolar não incentivou e
nem realizou jogos escolares adaptados (por exemplo: PARAJORME) e jogos ou
campeonatos cooperativos (não competitivos) entre as unidades escolares, que
proporcionassem ações desportivas com os alunos com deficiência e com os alunos menos
habilidosos. Diante disso, observamos que a gestão abordou o esporte na forma de
rendimento, apenas voltado para a competição; mas pontuamos que a técnica esportiva pode
ser usada para proporcionar o ensino na perspectiva inclusiva, conforme o tratamento e a
intenção selecionados para a sua aplicação.
9 Os Jogos Recreativos Escolares (JORME) possuíam caráter competitivo; durante o período de coleta de dados da pesquisa, observamos em algumas unidades escolares que os professores organizavam “escolinha” de modalidades esportivas com treino frequencial semanal para as competições.
50
As competições do JORME eram realizadas bimestralmente por modalidades
esportivas selecionadas, sendo que o conteúdo administrado pelos professores de educação
física na escola seguia a sequência bimestral da modalidade proposta no JORME. Também
competia ao professor da escola realizar a escolha e/ou seleção dos alunos que frequentavam
o JORME e treinar o time.
Percebemos que o conteúdo ministrado na escola foi subordinado à dinâmica do
JORME, esta situação criou um foco no qual a competição validou o trabalho dos professores
na escola, como comentou a professora Mariane10: Nós temos professores maravilhosos que
não enaltecem a competição, mas daí não são valorizados, porque quem aparece na mídia é
aquele que ganha troféu, que leva o nome da escola. (informação verbal)11. O valor do
trabalho docente foi afirmado no resultado da competição, essa proposta assumiu com
prioridade os códigos12 da instituição esportiva.
Segundo Bracht (1992), o tema da educação física é o movimento que não se restringe
somente aos códigos propostos do esporte na escola. O mesmo autor ainda refere que a
identidade da educação física na escola compreende uma reflexão do próprio papel da escola
na sociedade.
Na leitura de nosso contexto entendemos que os professores de educação física do
município estavam submetidos à sistemática da gestão do sistema escolar que se destinava
exclusivamente ao desporto escolar. O sistema assumiu os códigos da instituição esportiva,
sem a dimensão reflexiva da cultura do movimento e sem aplicar a técnica do esporte à outra
orientação que não fosse o rendimento.
Neste sentido, encontramos como prática corporal hegemônica, o esporte, e durante a
pesquisa-ação em muitos momentos nos deparamos com os conceitos da inclusão sem a
aceitação e legitimação dos professores, pois a proposta da inclusão foi entendida de forma
alternativa e não conseguiu afirmar-se com a presença maciça do esporte. E ainda o esporte
não conseguiu afirmar-se na prática inclusiva, pois estava dotado de parâmetros de
rendimento e competição.
Outro ponto a destacar foi à formação continuada administrada pela gestão, pois os
professores não relataram nenhuma abordagem relacionada à concepção de inclusão, o que
confirmou mais uma vez que a gestão manteve o foco voltado para o esporte sem estudar um
conteúdo crítico reflexivo das demais abordagens pedagógicas (ver no capítulo 4.4 a síntese 10 Todos os nomes descritos são nomes fictícios. 11 Oficina em 13/08/2010. 12 Código é o que expressa/denuncia o sentido que está incorporado no condicionamento de determinado contexto (BRACHT, 1992).
51
das abordagens pedagógicas da educação física) e sem aplicar a técnica do esporte à
concepção de inclusão. Todos os professores relataram que nunca receberam uma formação
continuada em inclusão, somente para o desporto adaptado: O que não responde as
necessidades e expectativas (informação verbal)13, diz a professora Mariane.
Compreendemos que o desporto adaptado pode ser indicado como forma de inclusão
social, mas a gestão atual destinava tal modalidade para os parâmetros do desporto de
rendimento e competição (parâmetros que não proporcionam a inclusão).
Após esta breve descrição delimitamos agora como se desenvolveu o estudo neste
contexto. Inicialmente nosso contato foi com o Departamento de Desporto Escolar e a
anuência da Secretaria Municipal de Educação.
Obtidos a permissão e incentivo à pesquisa, fomos realizar o convite de participação
para os professores de educação física, estimados colegas servidores da rede. No contato
inicial partilhamos nossos antigos anseios sobre a dificuldade de incluir e a necessidade da
formação permanente do professor. Definimos os encontros coletivos às sextas-feiras, dia
destinado ao cumprimento da hora-atividade para os professores do componente curricular
Educação Física, escolhendo as datas conforme as janelas disponíveis no calendário de
eventos do Departamento de Desporto Escolar. Conversamos sobre as turmas que tinham
alunos com deficiência, nas quais os professores lecionam suas aulas de educação física e
determinamos que: para cada professor fosse acompanhada uma turma, sendo a escolha
apontada pelo professor e motivada na dificuldade da ação docente na perspectiva da
inclusão.
Destacamos que não houve escolha das escolas envolvidas no estudo, houve escolha
dos participantes da pesquisa e, consequentemente, a escola em que trabalhavam. As unidades
escolares abrangidas compreenderam uma escola isolada, um grupo escolar e cinco escolas
básicas, o que revelou diferentes realidades.
Na primeira tínhamos uma escola pequena, uma comunidade presente no ensino com
representações do interior rural da cidade, que incluíam preconceito com o “novo” na
comunidade, superproteção com algumas crianças, facilidade de acesso dos alunos aos locais
privados próximos, facilidade na divulgação do trabalho da escola na localidade, um corpo
docente pequeno e predominantemente residente na comunidade; além da situação de difícil
acesso com transporte urbano interferindo no horário de funcionamento da escola: o período
13 Oficina em 13/08/2010.
52
matutino começa mais tarde e o período vespertino começa mais cedo com relação às demais
escolas da cidade.
A acessibilidade física compreendia o acesso as salas, refeitório e banheiros, no
entanto, não havia fraldário, sendo as trocas de fralda realizadas sem as adaptações
adequadas, o que também aconteceu nas demais escolas acompanhadas. Uma questão que
podemos apontar é que a escola isolada não apresentava quadra esportiva coberta, nem
qualquer área coberta que o professor de Educação Física pudesse utilizar. Nos dias de chuva
ele precisou usar o refeitório, dividindo o espaço com a merenda das crianças, ou até mesmo a
própria sala de aula.
O grupo escolar é uma unidade que se envolveu intensamente nas atividades que o
professor de educação física (participante deste estudo) propôs. Era um corpo docente
pequeno, a especialista na função de orientadora escolar fortaleceu o trabalho, por estar
envolvida em um curso também relacionado à inclusão, e por estar trabalhando na escola há
11 anos, apresentando um grande vínculo com a comunidade. O que caracterizou fortemente o
grupo escolar foram salas com poucos alunos e com idade homogênea, todos frequentando os
primeiros anos do ensino fundamental, sendo que esta oportunidade facilitou o planejamento
das ações inclusivas deste estudo na (pequena) quadra coberta da escola. A comunidade da
qual estava localizada o grupo escolar tem características sociais que compreendiam famílias
carentes e famílias de classe mais privilegiada, esta combinação proporcionou algumas
situações, por exemplo, quando uma família mais esclarecida ao chegar à escola questionou:
Nesta escola não é trabalhado inclusão? (informação verbal)14. A professora Paula foi quem
nos contou esse comentário da família.
As cinco escolas básicas possuíam características diversas. Duas não possuíam quadra
coberta, e nas que possuíam, era realizada a divisão da quadra com mais de uma turma,
algumas vezes, até três turmas ao mesmo tempo.
Uma realidade das escolas básicas é que tínhamos alunos pequenos muito próximos a
alunos grandes nas aulas de educação física, o que requer do professor toda uma estratégia de
trabalho para evitar acidentes com bola, chutes fortes, interferência dos maiores na aula dos
menores, etc. Outro aspecto que chamou atenção foi a grande circulação de alunos em quadra
sem a limpeza frequente do chão. Em uma escola a quadra era varrida pelo próprio professor
de educação física, quando precisava utilizar uma didática que necessitasse do contato direto
do corpo com o solo.
14 Seminário 3 em 17/09/2010.
53
As comunidades em que estavam localizadas as escolas básicas eram de famílias mais
carentes, apenas uma escola apresentava um público “mais elitizado”, como falavam os
próprios professores. Das comunidades mais comprometidas economicamente, uma escola
estava em contato próximo com moradores que traficavam drogas ilícitas, e violência,
chegando a receber, por alguns dias, ameaça de invasão por alguns moradores. A situação foi
controlada pela Secretaria Municipal de Educação e pelo Serviço de Segurança Pública do
Município.
Uma escola básica viveu a forte presença do Bullying, ou seja, os alunos falavam
muitos xingamentos, palavrões, agressões verbais entre eles, sendo necessário muito empenho
dos professores para o controle desta situação.
Lembramos que no início da coleta de dados um participante trocou seu local de
trabalho, passou a lecionar em outra escola básica, e neste momento ele elegeu outra turma
para dar continuidade às ações docentes abordadas neste estudo.
Nas escolas básicas, os anos finais no currículo do ensino fundamental são
organizados por disciplinas. Este fato dificultou a divulgação e cooperação das ações
propostas pelos professores de educação física - participantes deste estudo - com o corpo
docente. Antunes (2006) e Mantoan (2003) apontam que a segmentação em disciplinas
escolares leva ao pensamento subdividido em áreas, o que proporciona barreiras ao
desenvolvimento das diferentes inteligências, à compreensão integral do conhecimento e ao
ensino inclusivo.
Pontuamos que nenhuma escola apresentava adaptações razoáveis para a inclusão na
forma de tecnologia assistiva mecânica, eletrônica ou digital (indicadas de acordo com a
necessidade educacional especial do aluno com deficiência). As adaptações razoáveis na área
da educação estão asseguradas no Artigo 24 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência (2008).
Para finalizar este item do capítulo, vamos apresentar como procederam as matrículas
dos educandos com necessidades educacionais especiais e o serviço de monitoria. Todas as
escolas do município recebiam a matrícula de alunos com deficiência, ou transtorno global do
desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação (condições que caracterizam os alunos
com necessidades educacionais especiais). A gestão escolar realizava o arquivamento do
laudo médico (o diagnóstico clínico da criança), as características do aluno eram respeitadas
provendo outros profissionais da educação, quando necessário, como: tradutor e intérprete de
Língua Brasileira de Sinais, guia-intérprete e monitor (lembrando que na rede não havia
disponível o serviço do segundo professor em sala).
54
Os “alunos com laudo”, como são chamados nas escolas, podiam receber um monitor
individualmente, sendo que os critérios para receberem o serviço de monitoria não pareciam
estar bem definidos. Observamos que em algumas situações as escolas solicitavam o parecer
do Cemespi, mas na maior parte das vezes as escolas ou famílias solicitavam diretamente na
Secretaria de Educação. Nesta falta de condição e esclarecimentos encontramos uma turma
com dois monitores na sala, sendo que o entendimento da função do monitor não estava muito
claro e não observamos um trabalho em parceria do corpo docente da escola com o monitor.
A professora Ivana, durante a realização desta pesquisa, falou: Eu achava que o trabalho delas
[monitoras] era a parte, e não, tem que ta integrado com o professor, porque o professor é ele
que é o responsável por aquilo ali. (informação verbal)15.
Segundo a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva, o monitor ou cuidador realiza apoio nas atividades de higiene, alimentação,
locomoção, entre outras, que exijam auxílio constante no cotidiano escolar (MEC, 2007).
Após esta explanação do contexto podemos sintetizar uma realidade local onde havia o
cumprimento de normas na perspectiva inclusiva: sala de recursos multifuncionais, intérprete,
monitor, serviço educacional especializado (não havia disponível o serviço do segundo
professor); mas este conjunto apresentou-se confuso perante o entendimento de funções, a
proximidade da gestão aos profissionais e a integração e formação dos professores. Agora
continuamos o capítulo com uma breve descrição sobre os sujeitos participantes da pesquisa.
6.1.1 Os sujeitos respondentes
Participaram da pesquisa durante toda a fase de coleta de dados, 5 professoras e 2
professores de educação física. Para apresentar os participantes utilizamos nomes fictícios:
Mariane, 36 anos de idade, graduada em 2006, atua há 15 anos na educação física escolar;
Paula, 46 anos, graduada em 1985, atua há 20 anos na educação física escolar; João, 31 anos,
graduado em 2005, atua há 12 anos na educação física escolar; Fernanda, 27 anos, graduada
em 2007, atua há 2 anos na educação física escolar; Rodrigo, 50 anos, graduado em 2008,
atua há mais de 20 anos na educação física escolar; e Gorete, 40 anos, graduada em 1991, atua
há 21 anos na educação física escolar.
15 Seminário 5 em 29/10/2010.
55
Os participantes eram sujeitos com características em comum: um longo tempo
destinado à educação, sendo que apenas Fernanda atuava há dois anos, os demais tinham mais
de dez anos de serviço na educação física. Todos iniciaram a prática docente durante o
período de formação inicial.
Além disso, destacamos algumas características: dois professores tinham sua atividade
com os alunos intensamente direcionada ao esporte, João voltado à competição e Fernanda
não, formando um vínculo extremamente forte com seus alunos e com manifestações das
famílias (presentes, bilhetes). A professora Paula tinha um perfil de liderança, destacando-se e
envolvendo a escola na sua prática; duas professoras, Mariane e Ivana, eram muito criativas
nas suas aulas, exploravam situações com o corpo docente voltadas à necessidade local,
contextualizando-as na educação física. Somente um professor tinha um comportamento mais
introspectivo, mais passivo, e seu trabalho revelava uma exploração do movimento, com
cultura popular e brincadeiras.
Participou deste estudo uma professora que ocupou um cargo na secretaria municipal
de educação, sendo que, no meio do período de coleta de dados ela retornou para a sua função
docente no grupo escolar de sua lotação efetiva. Esta professora participou do grupo pelo
interesse manifestado, porém não foi considerada para fins de análise do trabalho
desenvolvido (da reorientação pedagógica) junto às turmas que tinham alunos com
deficiência.
O grupo de professores apontou que foi na graduação que tiveram o primeiro contato
com a inclusão, mas que o conteúdo não dava suporte a uma prática pedagógica condizente.
Ao escutar as primeiras experiências inclusivas da vida docente ouvimos que as dificuldades
eram muitas, e nem todas as aulas eram inclusivas; geralmente os professores focavam o
aluno com deficiência e não conseguiam encontrar resultados: Foi muito difícil trabalhar com
ele, pois ele não queria participar das aulas... (informação verbal)16, diz a professora
Fernanda. Além disso, as formações continuadas não oportunizaram discussões nesse sentido,
conforme apontado anteriormente.
As experiências antigas revelaram dificuldades na escola em que os professores vivem
até hoje, como a falta de capacitação em serviço, de recursos adaptáveis, de acessibilidade, de
conhecimento científico, turmas numerosas e mais de uma turma na quadra. Mesmo com
todas as barreiras, os professores contavam que desenvolviam e implementavam estratégias
para incluírem seus alunos com deficiência, estratégias que construíram com a própria
16 Oficina em 13/08/2010.
56
necessidade, relataram que adaptaram com a experiência, com parte do conteúdo da
graduação e com a busca de dados na internet.
De forma geral, os professores do grupo continham na sua história docente vontade e
determinação na busca de inovações, procurando respostas aos interesses e dúvidas. Esta
mesma maneira de agir apresentaram no desenvolvimento da pesquisa-ação, criando um
vínculo importante e o desejo de dar continuidade aos encontros do grupo, mesmo após o
término da coleta de dados.
6.2 Descrevendo a prática
O percurso inicial da pesquisa-ação foi a fase exploratória referida por Thiollent
(1996) conforme descrevemos no item 5.2. Os procedimentos metodológicos compreenderam
a observação livre (realizada na escola) das aulas de educação física, das turmas que tinham
alunos com deficiência. Este instrumento proporcionou o encontro com a situação local,
quando exploramos a escola no seu dia-a-dia, observando a docência adentrando na clareza do
objeto do estudo: a prática didático-pedagógica da educação física. As visitas para a
observação livre não eram pré-agendadas, sendo positiva a receptividade das escolas. No
momento da chegada a acolhida era realizada pela equipe diretiva ou pela supervisão e em
seguida observávamos a aula do professor de educação física.
Ainda na fase de exploração do contexto do estudo realizamos um encontro coletivo
com todos os sujeitos participantes. Neste encontro utilizamos a técnica de Oficina. Iniciamos
com uma dinâmica de grupo para despertar a construção da identidade grupal, cada professor
tinha escrito em sua face o nome de uma personalidade conhecida e questionava ao colega
com perguntas que envolviam a resposta sim ou não, para conseguir identificar a pessoa.
Representar a construção da identidade levou-nos a discutir a construção da
identidade da PcD. Goffman (1985) refere que quando uma pessoa chega à presença de
outros, permite-se utilizar a experiência anterior que se tenha tido com pessoas parecidas para
identificá-la, ou ainda utiliza-se estereótipos não comprovados. Neste sentido, apontou-se na
discussão o signo17, ou seja, o que mais chama atenção para o reconhecimento da pessoa, o
17 Os signos são as informações transmitidas da pessoa estigmatizada nas interações sociais, tais informações podem ser gestos, palavras, marcas corporais e o jeito de se comunicar. Pontuamos que a pessoa estigmatizada
57
que identificamos serem as características físicas. Para tanto, na reflexão apontamos que o
signo atribuído a PcD, é a própria deficiência, como respondeu a professora Ivana quando
realizado este questionamento: Deficiente! É a deficiência que é atribuída a pessoa
(informação verbal)18.
A reflexão permitiu socializar as experiências anteriores, então a professora Mariane
falou que quando trabalhou com um aluno surdo, uma professora a questionou: Como ele vai
dançar se não ouve? (informação verbal)19; e a professora Mariane acrescentou: Não ouve
como você acha, mas ele ouve do jeito dele. A mãe dele disse que ele tem um resíduo
(informação verbal)20. Nas falas ficou explícito, que na escola, a representação dos
professores sobre o significado da identidade do aluno com deficiência esteve diretamente
relacionada com o estigma da deficiência, reduzindo a identidade do aluno a própria
deficiência e utilizando um estereótipo marcado na condição de inabilidade para a produção
educacional.
Segundo Goffman (1985), a representação social serve principalmente para expressar
as características da função social em questão, limitando a representação pessoal como um
todo. Neste sentido, a representação social exigida na escola limitava o aluno as funções
estabelecidas dentro do currículo funcional; cabendo aos professores, neste meio,
proporcionar subsídios que levassem a interação social do ambiente escolar a contribuir com a
construção da identidade real de cada aluno, promovendo assim, a reversão do estigma da
deficiência. No entanto, a interação social dos professores com os alunos ainda não
desempenhava tais condições necessárias para colaborar com as representações pessoais reais
do aluno com deficiência. E ainda, na reversão do estigma torna-se necessário um conjunto de
ações coletivas, sendo que, a gestão não incentivou ou proporcionou tal situação, desta forma,
os professores trabalhavam sozinhos na construção da identidade dos alunos.
Quanto à coleta de dados, ainda no encontro inicial e utilizando a técnica de Oficina,
exploramos a biografia de cada professor, seguimos o roteiro apresentado no apêndice B, do
qual cada professor colocou (de forma escrita e oral) a sua história, pontuando sua vivência na
escola com a educação física inclusiva e sua experiência com o aluno com deficiência. Após
este tema iniciamos a problematizarão da inclusão nas escolas levantando as dificuldades,
limites, alcances e desafios (Apêndice E) das quais os professores de educação física viveram
pode exercer o controle da informação, ou seja, o controle do signo para a reversão do estigma na sua identidade social (GOFFMAN, 1988). 18 Oficina em 13/08/2010. 19 Oficina em 13/08/2010. 20 Oficina em 13/08/2010.
58
na sua prática coletiva (as situações dentro da escola e a relação dela com a gestão municipal);
e na sua prática específica (as ações didático-pedagógicas realizadas nas aulas). Depois de
realizada a problematização, a oficina seguiu para a teorização e reflexão, sendo que nosso
referencial inicial foi um vídeo sonoro de apoio ao professor sobre Educação Inclusiva do
Ministério da Educação (TODA, 2007).
Na reflexão elaboramos o quadro ilustrativo (Apêndice E), e a partir dele seguimos
uma perspectiva de mudança da realidade. Neste momento, adentramos nas hipóteses da
pesquisa-ação propostas por Thiollent (1996), pautados nos registros da reflexão sobre
“Dificuldades e Limites”, construímos os “Alcances e Desafios”, ou seja, nossas hipóteses
abordaram diretamente suposições de possíveis soluções aos problemas levantados. Desta
forma, pontuamos no Apêndice E a projeção esquemática de ações individuais e coletivas da
prática didático-pedagógica inclusiva. A fim de exemplificar a elaboração das suposições
desta pesquisa-ação, descrevemos uma hipótese: quando os professores, monitor e família são
orientados, sobre o problema da carência do conhecimento científico sobre a deficiência,
podem realizar a elucidação deste conteúdo para subsidiar mudanças na prática inclusiva do
atendimento ao aluno com deficiência.
Na pesquisa-ação contribuímos para elucidar a carência deste conteúdo científico com
tais ações: estudo elucidativo do conteúdo científico das deficiências com os professores
participantes nas reuniões de Seminário, apresentação e reflexão (do conteúdo) na Reunião
Pedagógica/Conselho de Classe das escolas e Estudos de Caso com as famílias dos alunos
com deficiência21. Depois de abordadas as hipóteses, começamos, a partir de então, a
constituição das estratégias que condicionaram as ações didático-pedagógicas nas aulas de
educação física inclusivas. Para auxiliar tais ações, ao fim da oficina, estudamos o modo de
escrever o instrumento Diário de Campo.
Segundo Zabalza (2004), os professores podem escrever o Diário como meio de
expressão pessoal para facilitar o processo docente, principalmente quando o trabalho envolve
o atendimento ao aluno com deficiência. Neste estudo os professores participantes escreveram
o diário de campo das suas aulas (cada professor escreveu aproximadamente cinco diários
durante a coleta de dados).
Após a oficina, realizamos cinco encontros com a técnica do seminário e reunimos as
informações dos instrumentos de coleta de dados: diário de campo dos professores e a
21 Cada professor participante realizou o que achou pertinente na Reunião Pedagógica/Conselho de Classe e no Estudo de Caso com a família do aluno com deficiência.
59
observação livre. Em cada encontro, conforme aponta Thiollent (1996), discutimos,
analisamos e interpretamos as informações coletadas, de forma que, sentados em roda,
iniciávamos a leitura e reflexão de um diário de campo (ou dois) de uma aula de educação
física lecionada. Na sequência buscávamos o apoio teórico e para finalizar eram construídas
as estratégias que condicionavam as ações didático-pedagógicas para as aulas de educação
física das turmas que tinham alunos com deficiência.
Quanto à técnica de observação livre, os dados foram coletados nas aulas de educação
física dos professores participantes e serviram de apoio à pesquisadora para subsidiar a
construção das ações durante os seminários.
O diário de campo e a observação livre acompanharam todo o percurso da pesquisa-
ação e no último mês da coleta de dados realizamos uma experiência com grupo focal.
Inicialmente estava agendado um encontro, mas a pedido dos sujeitos estendemos o trabalho
com grupo focal para dois encontros. O tema solicitado para reflexão no grupo foi o
enfrentamento das ações iniciais que implicavam as dificuldades, limites, alcances e desafios
previstos anteriormente (Apêndice E), além disso, também trabalhamos questões sobre a
contribuição desta pesquisa sobre o significado dos professores ao aluno com deficiência, e o
levantamento de perspectivas de continuidade sobre as práticas reorientadas na ação docente.
Após esta breve descrição de como se deu a coleta de dados, expomos adiante a
análise dos dados.
6.3 Análise sobre as categorias da pesquisa
Neste item identificamos as categorias de análise do conteúdo. Segundo Bardin
(2004), as categorias são o produto da codificação das mensagens que reúnem as unidades de
contexto e registro com o grupo de elementos que significam a mensagem. No tratamento dos
dados observamos três categorias que ajudam a explicitar o objeto deste estudo: (a) o legado
da formação inicial sobre a inclusão; (b) o tratamento da inclusão pelo sistema educacional
local; e (c) as expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar.
Iniciamos a análise de conteúdo com a pré-análise para a exploração do material e
recorte das mensagens. Portanto, organizamos os instrumentos de coleta de dados para a
escolha dos significados que fundamentaram a elaboração das hipóteses e a formulação dos
objetivos da pré-análise.
60
No processo de investigação das hipóteses (Apêndice F) realizamos o agrupamento
dos aspectos e qualidades dos elementos que permitiu iniciar a edição das categorias. Bardin
(2004) relata que o processo de categorização realiza a condensação dos dados brutos para
dados organizados, permitindo entender as unidades de sentido (unidades de registro e
contexto) que estavam invisíveis antes da classificação do conteúdo.
Portanto, a partir da pré-análise realizamos a codificação do conteúdo com as unidades
de registro e contexto, que classificadas, constituíram as unidades de categorização. Desta
forma, perpassamos o percurso das hipóteses de investigação e da categorização. Entretanto,
analisar o conteúdo não é somente descrevê-lo, e sim, tencionar o interesse e o aprendizado a
que se destina a mensagem tratada. Destacamos que o método de análise de conteúdo que
adotamos nesta pesquisa possui o rigor metodológico proposto por Bardin (2004), e esta
autora refere procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens
(os processos de pré-análise e categorização acima descritos).
Na sequência, para se chegar à compreensão do objeto, avançamos a análise para a
inferência e o tratamento dos dados. A inferência é a técnica de extrair uma consequência, de
maneira lógica, produzindo o conhecimento que a mensagem possui (BARDIN, 2004). Desta
forma, a análise de conteúdo não somente se restringe a apresentar o conteúdo das mensagens,
mas também avança a fim de evidenciar a finalidade, a intenção da comunicação, as
condições que levaram àquela produção e a interpretação dos significados (BARDIN, 2004).
Neste sentido, finalizamos o tratamento e a interpretação dos dados resultando na
apresentação das categorias com a devida tensão do interesse e do aprendizado do conteúdo
que envolveu o objeto deste estudo e sua compreensão. Apresentamos estes dados a seguir.
6.3.1 Primeira categoria – o legado da formação inicial sobre inclusão
A primeira categoria refere-se ao legado da formação inicial sobre inclusão. Diante da
análise, o conteúdo evidenciou que a formação inicial dos professores mostrou-se uma
formação tradicional que não implicava em propostas inclusivas e apresentou uma concepção
de educação física pautada pelos códigos da instituição esportiva. Neste recorte observamos
que o conteúdo presente na formação inicial proporcionou uma prática carente da concepção
inclusiva, sem a devida apropriação deste referencial. O grupo de professores apontou que foi
na graduação que tiveram o primeiro contato com a inclusão, mas que o conteúdo não dava
61
suporte a uma prática pedagógica condizente. Neste sentido, apresentamos os comentários dos
professores participantes com relação ao estudo da inclusão na sua graduação (formação
inicial). O professor João disse que: Na graduação foram realizados muitos estágios com
equipes de rendimento e muitos possuíam limitações físicas, intelectuais, visuais e auditivas
(informação verbal)22. E o professor Rodrigo falou: As estratégias [de inclusão] adaptei na
graduação, que apesar de não atender as expectativas, deu idéias (informação verbal)23.
Os dados empíricos descritos acima confirmam que o referencial inclusivo não foi
explorado na formação inicial, e, além disso, asseguram a presença do conteúdo de
rendimento físico, tão característico da formação tradicional esportiva. Para complementar os
dados da análise, também destacamos a seguir, as primeiras experiências inclusivas da vida
docente dos professores, pois, ouvimos que as dificuldades eram muitas, e nem todas as aulas
eram inclusivas. Geralmente os professores focavam no aluno com deficiência, não
conseguindo encontrar resultados, como escutamos nas falas da professora Mariane: Contra as
regras do sistema onde não se aceitava certa deficiência por desconhecê-la... Aos trancos e
barrancos, sem conhecimento prévio, baseada apenas na convivência diária e adequação a
linguagem do aluno, ele fez parte dos jogos escolares contra a vontade de muitos e ajudou a
trazer o título com muita eficiência, o que me trouxe profissionalmente muita satisfação
(informação verbal)24.
A primeira experiência inclusiva da professora Mariane aponta que a inclusão só
ocorreu a partir da adesão do aluno com deficiência aos códigos da instituição esportiva. E
ainda denota que a professora incluiu o aluno nos jogos escolares sem o apoio da gestão local
e sem o conhecimento que sustentasse a prática inclusiva. Além disso, destacando este recorte
da fala “não se aceitava certa deficiência”, verificamos o conceito de estigma marcado pela
identificação desacreditada do aluno com deficiência. Segundo Goffman (1988), o estigma se
estabelece substantivando às interações relacionais quando não há a aceitação social plena da
PcD. De fato, o estigma esteve presente na relação entre o “sistema” e o aluno com
deficiência, conforme o depoimento da professora Mariane, o que apontou que as regras do
sistema escolar não são inclusivas, pois não aceitam a diferença do aluno com deficiência, tal
situação é inadmissível, pois cabe ao sistema escolar a reversão25 do estigma perante a
deficiência, criando um conjunto de procedimentos educacionais que eliminem as condições
22 Oficina em 13/08/2010. 23 Oficina em 13/08/2010. 24 Oficina em 13/08/2010. 25 A reversão do estigma é possível quando há um conjunto de ações mutua das pessoas que se relacionam com a pessoa estigmatizada para atribuir na identidade social o valor real pessoal. (COSTA, 2010)
62
adversas do aluno com deficiência e inclua-o de forma igualitária no processo ensino-
aprendizagem.
A seguir descrevemos a experiência da professora Paula: Minha primeira aluna [com
deficiência] foi Carol não tive muito sucesso e continuo com a mesma aluna e na mesma
situação, sem resultado [deficiência múltipla, 2006-2010] (informação verbal)26.
A professora Paula lecionou há quatro anos para as turmas que a Carol frequentou, e
relatou que não conseguiu realizar uma aula inclusiva com sucesso, porque não encontrou
desempenho motor padrão como resultado para a sua aluna com transtorno global do
desenvolvimento.
O professor João relatou sobre a sua primeira experiência inclusiva: [Em] 2009 na
escola Victor Hugo no ensino fundamental com aluno de 6º série, hoje [ele está] na 7º série,
está sendo realizado as aulas inclusivas (não todas), mas as atividades xadrez, tênis de mesa,
voleibol este realiza muito bem conforme suas características. Já as atividades de jogos
coletivos procuro não incluí-lo, por medo de quedas, de acidente (informação verbal)27.
Já o professor Rodrigo descreveu: Meu primeiro contato com aluno foi na U. E.
Adolfo Konder em 1987. Eu tinha um deficiente físico hiperativo e um aluno gênio. Foi difícil
lidar com o deficiente físico (informação verbal)28.
Nas experiências descritas acima, os professores João e Rodrigo apontaram para a
dificuldade de incluir o aluno com deficiência física, porque esse aluno não demonstrou
desempenho físico hábil para o conteúdo requerido, que se sustentou na prática esportiva
competitiva. A professora Ivana também referiu o aluno com deficiência física quando
comentou: Minha primeira experiência foi em 2007, pouco trabalhei com este aluno
(cadeirante), solicitei ajuda, mas devido a burocracia não consegui incluí-lo nas aulas
(informação verbal)29.
A dificuldade encontrada pela professora Ivana na sua primeira experiência inclusiva,
apontou para problemas burocráticos como limite para realizar a inclusão, ou seja, esteve
relacionada à gestão escolar e a falta de apoio ao professor para alcançar a inclusão.
Diante dos dados apresentados nas falas dos professores verificamos que a formação
inicial não ofereceu fundamentação suficiente para que realizassem com sucesso suas
primeiras experiências inclusivas, ressaltando que a maioria destas experiências foram vividas
recentemente, portanto, as escolas já estavam sob a LDB 9394/1996, que normaliza a 26 Oficina em 13/08/2010. 27 Oficina em 13/08/2010. 28 Oficina em 1/08/2010. 29 Oficina em 13/08/2010.
63
obrigatoriedade da inclusão no ensino regular. Além disso, a partir de 1987, a formação inicial
da educação física já estava sob a orientação da Resolução n. 03/87 do Conselho Nacional de
Educação, portanto, esperava-se uma formação com maior caráter crítico-reflexivo na
orientação do professor (BRACHT et al., 2002).
No entanto, as formações iniciais dos professores deixaram uma lacuna de orientação
pedagógica crítico-reflexiva, o que proporcionou a eles o enfrentamento das dificuldades para
trabalharem na perspectiva da inclusão e expressarem dúvidas sobre como intervir com alunos
com deficiência no momento deles passarem a fazer parte da escola regular. Exemplificamos
essa dúvida também com esta fala do professor Rodrigo: Eu digo assim: eu faço o que em
relação ao Pedro? (informação verbal)30.
Podemos considerar que na concepção dos professores de educação física, o aluno
com deficiência não cumpre o conjunto de expectativas proposto na singularidade do
conteúdo esportivo31, legado da formação inicial reforçado ao longo da carreira docente do
professor. Desta forma, os códigos (de competição e rendimento) sustentados pelo esporte não
eram questionados, o professor questionava-se sobre o que fazer com o aluno com deficiência,
sobre o que fazer com este aluno identificado como o desviante das competências requeridas
para a aula. Goffman (1988) refere que só é possível estabelecer a identidade de desviante
quando há a relação direta do eu-outro, ou seja, desviante-normal. Pontuamos que nesta
relação (desviante-normal), o aluno com deficiência está substantivado à identidade de
desviante, enquanto que o aluno com competência às habilidades requeridas pelas normas
educacionais está substantivado à identidade de normal.
Na literatura sobre inclusão vemos justamente o contrário, ou seja, há necessidade de
adequar as normas de ensino para respeitar a identidade do aluno (sem depreciá-lo como o
desviante). Portanto, há o questionamento da prática do ensino, no qual o processo de
aprendizagem é mediado pelo professor de forma a estabelecer uma relação de significado
entre o mundo particular da identidade do aluno e o conteúdo apresentado no currículo
funcional. Como aponta Mantoan (2003), a inclusão visa ressignificar o modelo pedagógico
tradicional que não consegue proporcionar uma educação igualitária para todos. Neste sentido
a educação está incorporada a concepção de equidade no processo ensino-aprendizagem.
Com relação às abordagens pedagógicas na formação da educação física, entendemos
que as pedagogias progressistas apresentam propostas inclusivas32, no entanto, os professores
30 Seminário 3 em 17/09/2010. 31 As expectativas voltadas ao conteúdo esportivo descrevemos de forma aprofundada na terceira categoria. 32 Rever no item 4.4, Quadro 1: Abordagens da Educação Física e as Propostas Inclusivas.
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não demonstraram estar orientados pelas propostas progressistas, já que, havia nas suas
primeiras experiências a dificuldade de incluir. Kunz (1991) relata que para o professor de
educação física há falta de uma orientação baseada na concepção crítico-progressista, sendo
que pontuamos que tal orientação proporciona práticas educacionais inclusivas.
Neste sentido, em virtude da concepção adquirida na formação inicial e reforçada ao
longo do processo de atuação profissional, a visão tradicional fundamentada no esporte
(voltado a competição) se refletiu no tratamento do conteúdo. Com relação a esse aspecto,
verificamos que os professores aceitam como meta suficiente para o aluno com deficiência, a
inclusão (aceitação) da turma, já, para o aluno sem deficiência almejam a aptidão motora, o
rendimento. Os professores não conseguem aceitar a prática docente de ensinar o aluno que
não alcança o rendimento conforme o conjunto de regras sustentado pelo conteúdo disciplinar
previsto no currículo tradicional. Um exemplo dessa situação foi observada quando a
professora Paula comentou sobre o planejamento de uma aula sem o foco no rendimento
esportivo, e ela disse: Não, eu não acredito, o terceiro ano, quarto ano, tudo bem fazer uma
aula mais passiva, mais moderada. Mas precisa dar aula agitada, necessitam o corre-corre, o
agito, eles necessitam disso. E quando a Carol ta, eu não consigo fazer nada disso (informação
verbal)33.
A Carol é uma aluna com deficiência que a professora não aceita na proposta da aula
de rendimento esportivo. Nesta situação vimos a condição de desvio, pois a aluna com
deficiência esteve fora das normas de conformidade que a professora planejava para a aula.
Segundo Goffman (1988), o desvio se estabelece quando as pessoas compartilham de um
conjunto de regras e expectativas normativas, que estão presentes porque foram incorporadas.
Os dados da pesquisa mostraram que a formação inicial dos professores foi perpassada
por uma pedagogia que categoriza e seleciona os alunos por níveis de rendimento, ou seja,
ofereceu um conteúdo sem a concepção da prática do ensino inclusivo, sem abordar um
modelo pedagógico igualitário que permita desenvolver as diversas habilidades do alunado.
Tal modelo baseia-se na abordagem tecnicista, com foco na descoberta de talentos esportivos.
Escutando a fala do professor João, entendemos como a necessidade de desempenho esportivo
estava presente: Como o Luiz vai jogar futebol? (informação verbal)34. Luiz é um aluno com
deficiência física que não apresenta um desempenho competitivo para o jogo de futebol,
devido sua necessidade de auxílio de órtese (duas muletas) para caminhar. Neste aspecto o
professor estava dotado de estratégias metodológicas que visavam a aptidão física e seleção 33 Seminário 3 em 17/09/2010. 34 Seminário 4 em 22/10/2010.
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dos mais habilidosos para o esporte. Segundo Ghiraldelli Junior (2003), a abordagem
tecnicista faz parte de um conjunto de concepções que se pode denominar de ideologia
dominante na literatura da educação física. Esta orientação (voltada ao foco no rendimento e
competição) não atinge uma prática de ensino inclusiva que potencialize as capacidades que
não estão presentes no currículo funcional35.
Na pesquisa-ação nos confrontamos fortemente com a falta de conteúdo que a
orientação da formação inicial dos professores deixou para a educação física inclusiva. Neste
sentido, destacamos os comentários da professora Paula no Seminário que registram bem a
falta da compreensão do que seja a educação física inclusiva: Eu vim por causa da Carol, mas
eu to usando tudo que a gente fala com todos (informação verbal)36. Pontuamos na fala que a
intenção inicial da professora envolvia aprender a tratar diferente quem é diferente37, pois sua
formação inicial estava dotada de um modelo de aptidão motora padronizada e não lhe
proporcionou entender que todos os seus alunos são a mais pura diversidade da cultura do
movimento, sendo um aluno com deficiência, ou sendo um aluno sem deficiência; e que o
processo de ensinar envolve saber abordar e explorar as potencialidades, respeitando os
limites individuais e construindo um ritmo próprio do saber de forma harmoniosa para a
turma toda.
Observamos que o processo da pesquisa-ação ressignificou o olhar da professora Paula
para o sentido de igualdade da inclusão, pois após termos, dentre outros objetivos desta
pesquisa, estabelecido num referencial teórico de educação inclusiva, a professora falou:
Antes eu preparava uma aula sem a Carol. Agora eu preparo uma aula quando a Carol vai e
uma aula quando a Carol não vai. Mas eu ainda quero preparar uma aula só! (informação
verbal)38.
O depoimento da professora demonstrou as oscilações do pertencimento social do
estigma39 do aluno com deficiência. Antes do processo da pesquisa-ação, este aluno esteve
estigmatizado e fora do pertencimento do grupo social dominante, os alunos sem deficiência;
e a posterior da pesquisa-ação (e com perspectivas futuras) a professora almejou o
35 Destacamos que a técnica do esporte, sem os códigos de rendimento e competição da instituição esportiva, pode ser instrumentalizada pelos professores como prática inclusiva. 36 Seminário 3 em 17/09/2010. 37 Nesta concepção está presente a condição do estigma à diferença da deficiência. 38 Seminário 3 em 17/09/2010. 39 Segundo Goffman (1988), as oscilações do pertencimento social do estigma proporcionam ao estigmatizado o sentimento de ambivalência do seu próprio eu. Vivendo a ambivalência o aluno com deficiência poderá sentir-se com dupla orientação de sua identidade e valor próprio nas interações e tratamentos desiguais que acontecem nas relações dentro da escola. Portanto, é função social da escola trabalhar no sentido de incluir o aluno e construir sua identidade mediante os valores de aceitação e igualdade [descaracterizando o sentimento de ambivalência].
66
pertencimento pleno deste aluno no grupo sem o descrédito do estigma. Neste sentido a
professora Paula, permitindo-se compreender a concepção inclusiva, reorientou sua prática
didático-pedagógica e almejou conquistar uma pedagogia verdadeiramente inclusiva,
entendendo que a concepção de inclusão não é estigmatizar o aluno com deficiência e tratá-lo
com diferença. Incluir é educar com um conjunto de procedimentos adequados para também
ensinar aquele aluno que possui uma condição adversa, que por ventura pode levá-lo a um
atributo de desvantagem perante as interações coletivas de normalização da escola. Condições
essas que, por sua vez, estão fortemente presentes na prática da educação física (devido os
parâmetros apresentados no currículo funcional, fundamentados nos códigos da instituição
esportiva). Com isto, foi se evidenciando na pesquisa que a formação inicial desta professora
foi sendo superada para o sentido de uma orientação de ensino inclusivo, proposto nesta
pesquisa-ação. Esta percepção é legítima porque os alunos reconheceram a mudança na
prática dos professores, como é o caso do testemunho da mãe de uma aluna sem deficiência
que disse o seguinte para a professora Mariane: A Marta me contou o que você tem feito com
a Eliza (informação verbal)40. Destacamos nesta fala que a relevância do ensino inclusivo
perpassou as fronteiras da escola, pois a aluna Marta relatou em sua casa as aulas de educação
física inclusivas, tal relato foi tão significativo para a família que a mãe da aluna falou sobre
isso com a professora Mariane.
Também nas aulas da professora Ivana, observamos como a educação inclusiva dotou
os alunos de crescimento para um conhecimento integral e igualitário, vencendo o estigma, o
Bullying e contemplando a diversidade da turma. Apresentamos as observações das aulas da
professora, escritas pela pesquisadora, destacando que nos primeiros contatos observamos a
seguinte situação: “A professora explica como fazer a bandeja: quem é destro de um lado, e
sinistro do outro [...] Todos arremessam. A turma se agita. Muita falação, xingamentos
diversos: ‘Vai negão!’, etc.” (Observação Livre em 17/08/2010).
Após duas semanas constatamos uma postura diferente da mesma turma, conforme
observamos na situação descrita a seguir: “A professora pediu que eles sentassem na
arquibancada e que um grupo de alunos realizasse a apresentação da atividade. O grupo
ensinou aos colegas como fazer o arremesso. A turma fez fila e foi praticar: o grupo ficou
orientando os colegas, mas também orientaram o aluno com deficiência intelectual. Não
houve xingamentos.” (Observação Livre em 31/08/2010). A proposta da professora de
integração dos alunos, durante o processo ensino-aprendizagem, foi a ação inclusiva
40 Seminário 3 em 17/09/2010.
67
necessária para aquela turma, sendo que, na aula uma aluna falou em nome de todos: “Em
nome da turma eu queria pedir desculpas pelo mau comportamento. Nós já conversamos entre
nós.” (Observação Livre em 31/08/2010).
Os valores do ensino inclusivo foram incorporados aos alunos da turma, adentrando no
esporte, pois a professora Ivana criou as ações didático-pedagógicas de interação que
envolveu toda a turma, sem o aspecto da competição e rendimento do tradicional conteúdo
esportivo,41 tão fortemente presentes na formação inicial destes professores.
Além disso, nesta primeira categoria também destacamos que no processo da
pesquisa-ação se revelou a carência de formação pedagógica adequada para atuar na
perspectiva da inclusão com relação às bases científicas das diferentes deficiências dos
alunos. Para isso, os professores solicitaram que se fizesse uma apostila. Retratamos esse
movimento na fala do professor Rodrigo: Você podia fazer, assim, uma apostila? (informação
verbal)42. Rodrigo sugeriu a apostila com o conteúdo científico sobre as deficiências, pois esta
dimensão ficou ausente na formação inicial, sendo a falta de apropriação deste conhecimento
uma dificuldade para alcançar a prática educacional inclusiva. Tal necessidade está baseada
na forma tecnicista do modelo de apostilamento e na necessidade padrão de se praticar a
pedagogia. Desta forma, com o objetivo de superar esta metodologia, o pedido foi atendido da
seguinte forma: durante os seminários, após a apresentação dos diários de aula dos
professores, tomamos o conteúdo científico das deficiências (impresso na forma de apostila),
para estudar e elucidar as dúvidas com relação a esta temática. Tal estudo subsidiou a
elaboração das aulas inclusivas, sendo que juntos produzimos as ações inclusivas com o
objetivo de superar um modelo técnico que apresentasse de forma padronizada a prática
pedagógica da educação física.
Observamos a relevância deste estudo das bases científicas das deficiências nos diários
de campo do professor Rodrigo. Ressaltamos o aporte do estudo para a evolução do
referencial teórico na sua proposta de aula inclusiva no recorte do segundo diário, havendo
uma diferença de ações inclusivas entre os diários de Rodrigo, descritos a seguir: “Minha
proposta: que o Pedro se desloque (como sempre faz) no meio dos alunos, enquanto fazem
atividades” (Diário de Campo em 16/08/2010). “Iniciei a aula falando para o Pedro várias
vezes: ‘Hoje tem aula com bola e balão na cesta’ (6 vezes). Na quinta ou sexta vez ele parou
de andar e pareceu me dar atenção, embora estivesse de costas. Pedi aos alunos: Os colegas 41 A professora Ivana utilizou a técnica do esporte como instrumento para a prática inclusiva, pois se baseou na concepção de colaboração e participação do ensino inclusivo e destituiu os códigos de competição e rendimento da instituição esportiva. 42 Seminário 1 em 20/08/2010.
68
estimularam o Pedro para colocar o balão na cesta, ele sorriu” (Diário de Campo em
26/08/2010).
Após compreender as características científicas da deficiência múltipla, o professor
entendeu que as necessidades educacionais especiais do aluno Pedro estavam diretamente
relacionadas aos seus atributos de interação social, comunicação e comportamento; a partir
daí as ações pedagógicas nas aulas de educação física foram incorporando o sentido da
concepção do ensino inclusivo, de forma que o professor Rodrigo não deixou mais que o
Pedro se deslocasse voluntariamente na aula (recorte de dados descritos no primeiro diário), e
sim, proporcionou as ações inclusivas necessárias para suprir a ele sua condição de
desvantagem para a socialização e interação durante a aula (recorte de dados descritos no
segundo diário).
Com a professora Paula o conhecimento científico da deficiência também
proporcionou aporte teórico para as ações de inclusão. Destacamos seu comentário sobre o
aluno Otávio, antes de realizarmos o estudo científico no percurso da pesquisa-ação: Eu tenho
dificuldade, ele vai atrofiando, né? (informação verbal)43.
E, após realizarmos o estudo sobre a deficiência do aluno Otavio, a professora
compreendeu que os achados científicos do diagnóstico clínico não apresentavam evolução do
quadro para atrofia, e escreveu no seu diário de campo da aula de educação física inclusiva:
“As dificuldades encontradas com o aluno Otavio pelo seu pouco desenvolvimento motor
foram superadas, e [ele] realizou todos os exercícios” (Diário de Campo em 17/08/2010).
Ressaltamos que a inclusão não acontece pronta e que as ações didático-pedagógicas
não estão descritas na literatura sob uma técnica padronizada que se possa seguir. Com base
neste sentido optamos pela proposta de trabalho na pesquisa-ação, para que os professores
participantes adquirissem esta consciência na vivência das ações habituais das suas aulas de
educação física inclusivas. Diante dos dados expostos nesta primeira categoria mostramos que
este entendimento foi se revelando no percurso da pesquisa-ação, levando os professores a
compreenderem que o ensino inclusivo é um conjunto de procedimentos que emanam de
acordo com as necessidades educacionais especiais dos alunos de cada turma que possui aluno
com deficiência. Tal conceito ficou carente na formação inicial (tradicional) dos professores,
e, procedeu durante o tempo de docência devido aos condicionamentos do sistema
educacional, local pautado nas normas da instituição esportiva e a falta da abordagem
43 Oficina em 13/08/2010.
69
inclusiva na formação continuada dos professores e de reformas de infra-estrutura adequadas
para o trabalho docente na perspectiva da inclusão, o que descrevemos na segunda categoria.
6.3.2 Segunda categoria – o tratamento da inclusão pelo sistema educacional local
A segunda categoria se refere ao tratamento da inclusão pelo sistema educacional do
município de Itajaí, em particular no componente curricular da Educação Física, e se compõe
de três dimensões: a formação continuada, a infraestrutura das escolas e a concepção de
educação física hegemônica no sistema educacional, pautada nas normas da instituição
esportiva.
A primeira dimensão relata a formação continuada sobre inclusão no contexto local.
Eis as falas das professoras Mariane, Fernanda e Ivana, respectivamente: Não participei de
nenhuma formação que me dessem subsídios para trabalhar com inclusão, porém a
necessidade faz com que eu mesma procure recursos para enfrentar este obstáculo
(informação verbal)44. Não me recordo de fazer parte efetivamente de alguma “capacitação”
[...] Falando em necessidade eu enquanto educadora venho me adaptando na medida do
possível baseada no senso comum e em experiências diárias, sem formação alguma e sim
evidentemente a necessidade vigente (informação verbal)45. Agora tenho um pouco mais de
conhecimento para trabalhar com alunos com deficiência, mas por estudos em casa (nas
conversas com os pais) e pela experiência, pois não tive oportunidade de fazer uma formação
continuada sobre o assunto (informação verbal)46.
As três professoras relataram a falta da formação continuada na perspectiva da
inclusão tendo procurado recurso ao senso comum ou a tentativa e erro da própria
experiência, o que demonstrou o isolamento dos professores para abordar a concepção
inclusiva no contexto local. Tal condição revelou que os professores se sentem impotentes,
distantes da gestão e isolados na busca de ações inclusivas para as suas aulas de educação
física. Segundo Falkenbach; Ordobas e Machado (2008), os professores realmente sentem
insegurança por medo e falta de preparo para atuar na perspectiva inclusiva. Daí justifica-se
na literatura e nos dados desta categoria a importância de formar continuamente os
44 Oficina em 13/08/2010. 45 Oficina em 13/08/2010. 46 Oficina em 13/08/2010.
70
professores. Além disso, devemos considerar que o conjunto de procedimentos que asseguram
o ensino inclusivo perpassa a necessidade de adaptações físicas, acessibilidade e tecnologias
assistivas, avançando, de forma essencial, para a necessidade de formar e capacitar
permanentemente os professores. Esse conceito encontramos na fala do professor Rodrigo: É,
mas as pessoas acham que colocando a rampa e adaptação no banheiro, pronto! A escola já
esta pronta! (informação verbal)47.
O comentário do professor demonstrou com angústia o isolamento dos professores no
sistema local para trabalhar a inclusão em sua plenitude. Tal situação revelou a necessidade
do amparo da formação em serviço para o ensino inclusivo.
Adentrando na segunda dimensão desta categoria, a infra-estrutura das escolas,
ressaltamos neste sentido que não basta apenas incluir a matrícula de alunos com deficiência
na escola regular e apenas estruturá-la fisicamente (como falou o professor Rodrigo), mas
também se torna imprescindível formar o docente. Para Mantoan (2003) é tarefa fundamental
da escola inclusiva formar e aprimorar continuamente o professor. Diante disto não podemos
separar a primeira dimensão da segunda. Lembramos que quando nos referimos à formação
profissional continuada, enfatizamos um processo que deve ser realizado de forma reflexiva e
crítico-social para dar possibilidades ao professor de assegurar-se com um saber próprio para
atuar com coerência ao contexto local. Assegurar conhecimento e empoderamento ao
professor necessita condicionar a estrutura/sistema macro e microssocial para proporcionar
continuamente ações de formação profissional que oportunizem o professor a trabalhar com a
inclusão de forma plena e contínua e não de maneira eventual.
Diante dos elementos apresentados nesta categoria constata-se que não houve registros
sobre a formação continuada na prática profissional dos professores investigados. Com isso,
ficou evidente que o tema inclusão escolar não foi foco temático na formação.
A gestão local condicionou a infraestrutura das escolas para a inclusão somente no
sentido relacionado a vencer a barreira física e edificar com acessibilidade os espaços das
escolas. No entanto, o ensino inclusivo envolve um conjunto de procedimentos que vão além
da edificação (SASSAKI, 2006), torna-se necessário considerar o conceito de infraestrutura
relacionado também com o sentido da sistemática, organização e gestão do trabalho dispostos
de forma a viabilizar efetividade à inclusão nas escolas. Mediante a introdução deste aspecto,
47 Seminário 3 em 17/09/2010.
71
contemplamos as três dimensões desta categoria, apresentando que a concepção de educação
física hegemônica no sistema educacional foi pautada nas normas da instituição esportiva.
Tal concepção do sistema local já foi pontuada, inicialmente, no item 6.1 deste
capítulo. Referimos que o contexto local priorizou, na sistemática e gestão do trabalho, a
abordagem esportiva através do condicionamento do conteúdo escolar relacionado
diretamente ao JORME e JEI e através das formações destinadas ao esporte adaptado48, como
pontuou o professor Rodrigo nesta fala: Não tive formação continuada em inclusão escolar, só
esporte adaptado (informação verbal)49. O comentário do professor revelou que o contexto
local fundamentou as ações escolares nos códigos da instituição esportiva tão fortemente, que
capacitou para o esporte adaptado e não capacitou para a inclusão. Desta forma, observamos
que as ações locais condicionaram os professores participantes a encarar a concepção
inclusiva como uma proposta extraordinária que não se sustentou perante o sistema de
validação do trabalho disposto no município, que direcionou o conteúdo da educação física
escolar bimestralmente a sequência de modalidades esportivas realizadas no JORME.
Neste sentido, encontramos durante o percurso da pesquisa-ação os professores
divididos entre orientar a aula pautada nas normas do esporte de rendimento e orientar na
lógica inclusiva, pois o isolamento local para trabalhar a inclusão refletiu este sentimento de
angústia e dúvida, como falou a professora Ivana: Eu fico com o aluno tento fazer alguma
coisa por ele e muitos não dão força, fica lá, o sistema colocou ele lá, o professor faz o
possível, eu tenho mágoa, coisas do sistema que não é de hoje (informação verbal)50.
Desvelando o sentimento na fala da professora Ivana, compreendemos que o sistema
se estruturou apenas fisicamente para a inclusão e sistematicamente voltou-se para os códigos
do esporte, então a professora sentiu-se sozinha e distante da organização e gestão escolar,
sentindo mágoa e dúvidas de como vencer os desafios da inclusão neste contexto que se
fundamentou conceitualmente no esporte com rendimento e competição, sem abordar a
concepção inclusiva em momento algum da vivência escolar e em nenhuma formação
continuada. Mediante tal realidade de tratamento da inclusão pelo sistema educacional do
município de Itajaí (tema desta categoria), pontuamos que encontramos alcances e limites no
48 O esporte adaptado trabalhado na forma de competição e rendimento, situação que aconteceu no contexto local, não é procedimento destinado para uma turma escolar, pois segrega os alunos com deficiência dos alunos sem deficiência, além de classificar o esportista e incentivar a competição. Por outro lado, os professores podem trabalhar a técnica do esporte adaptado sem evidenciar os códigos de competição e rendimento, adentrando num ensino igualitário que desenvolva as potencialidades diversas das turmas que têm alunos com deficiência. 49 Oficina em 13/08/2010. 50 Oficina em 13/08/2010.
72
processo desta pesquisa-ação. Com relação a este aspecto apresentamos uma situação que
proporcionou limite para os professores participantes devido, justamente, a hegemonia do
esporte e a falta de nenhum senso com relação à inclusão por parte da gestão. Contamos este
exemplo no depoimento do professor João: Na minha escola apareceu um professor de
educação física para dar aula para as pessoas com deficiência. Aí apareceu só para trabalhar
com um aluno, só um aluno. Então, assim não é inclusão (informação verbal)51.
Esclarecendo detalhes desta situação, o professor que foi trabalhar na escola retirava o
aluno com deficiência no período regular de aula e fazia um trabalho com o esporte adaptado
individualmente com este aluno. O que devemos ressaltar é que para a inclusão o período
regular de aula deve ser respeitado e o aluno não deve sair para realizar nenhum atendimento
especializado (como o caso do esporte adaptado). O atendimento especializado deve
acontecer no contra-turno do ensino regular para não segregar o aluno com deficiência. Tal
atitude da gestão expõe a inclusão a uma proposta de trabalho eventual. Diante disso,
enfrentamos limites do contexto sob a pesquisa-ação para consolidar e afirmar nas ações dos
professores participantes a concepção inclusiva de forma legítima na proposta da educação
física escolar.
O sentido de consolidar a inclusão como um trabalho pleno e legítimo é ainda
colocado por Freitas (2006), que relata que o professor idealiza o aluno e não se dá conta que
a diversidade de uma turma que possui aluno com deficiência valoriza a ação docente. Este
tema aprofundaremos a seguir na terceira categoria.
6.3.3 Terceira categoria – as expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar
A terceira categoria se refere às expectativas dos professores relacionadas à inclusão
escolar. Os dados revelaram que as expectativas dos professores estavam voltadas ao
rendimento esportivo, ao desenvolvimento motor normal e ao sistema de avaliação do
componente curricular Educação Física da rede municipal de ensino de Itajaí, tais aspectos
não sustentavam as expectativas na concepção da inclusão escolar.
Com relação às expectativas dos professores voltadas ao rendimento esportivo,
pontuamos que a abordagem tradicional-esportiva na educação física seleciona os alunos por
51 Seminário 4 em 22/10/2010.
73
aptidão para as modalidades do esporte, sem proporcionar a inclusão das singularidades nas
diversas habilidades de movimento da corporeidade. Tal pressuposto apareceu na fala do
professor João: Mas assim oh: porque a gente ta acostumado com resultados, né? É muito
fácil a gente ir lá, monta uma equipe, jogar, ganhar. E ali [inclusão] é o mínimo!(informação
verbal)52.
O comentário do professor revelou a prática da educação física escolar com a proposta
de rendimento esportivo, o que considera o corpo e as práticas corporais voltadas à concepção
social de produção do atleta. Diante disso, o professor relatou (apontando para o diário de
campo da aula inclusiva) que a proposta de inclusão não apresentou efeito perante o resultado
de aptidão esportiva que ele almejava e que condicionou sua atuação na escola. Segundo
Aguiar e Duarte (2005), a cultura desportiva e competitiva é dominante na proposta da
educação física e proporciona resistência à inclusão dos alunos que não apresentam bom
desempenho para uma competição.
O sentido competitivo esteve presente nas aulas de educação física dos professores, de
forma que quando o aluno não demonstrou interesse na prática de concorrência, a professora
apresentou uma reação de surpresa, como verificamos no diário de campo da Mariane: “Bom
no momento do chute do Sérgio da primeira vez aproximei ele da trave, posicionei a bola para
facilitar seu chute, pra minha surpresa o goleiro simulou um frango a favor do Sérgio” (Diário
de Campo em 16/08/2010).
Para o aluno que estava de goleiro o resultado competitivo não contava, mas para a
professora Mariane sim, por isso o “frango” simulado a surpreendeu. Diante disso, vemos que
a prática docente mostrou a condição do estigma e esteve voltada aos códigos (de competição
e concorrência) da instituição esportiva. Bracht (1999) relata que a partir da década de 70 (no
Brasil) a pedagogia da educação física incorporou o esporte com seus sentidos e significados
e até hoje a prática pedagógica da educação física acontece balizada no paradigma da aptidão
física e do esporte.
Na pesquisa-ação as ações inclusivas propostas nas aulas de educação física sofreram
resistência para legitimação por parte dos professores que condicionaram sua prática escolar
aos códigos do esporte. No entanto, os alunos demonstraram não estar contaminados aos
significados de rendimento e concorrência esportiva, e neste sentido, apresentamos o
comentário da professora Paula: Aí na hora do recreio dei bola, e os grandes jogando e o
pequeno lá [fez gestos para pedir a bola]. Aí eles incluíram e excluíram ao mesmo tempo,
52 Seminário 4 em 22/10/10.
74
porque colocaram ele [o pequeno] para jogar, mas a regra era: não podia acertar nele, e cada
um tinha que passar uma vez a bola para ele. Aí ele chegou em casa e disse que a aula de
Educação Física foi maravilhosa, não tinha nada haver comigo, foi no recreio. Mas ele chegou
em casa falando da aula de Educação Física (informação verbal)53.
É notável que os alunos sentem a necessidade de incluir e percebem que as regras de
competição de um jogo não contemplam as diferenças de desempenho entre os maiores e os
menores, por isso, houve a necessidade de proteger o pequeno e não acertá-lo com a bola,
sendo também necessário lançar a bola para ele pelo menos uma vez, já que, sua aptidão o
coloca em desvantagem nas regras padrões de competição do jogo. Diante disso, a professora
Paula sentiu que o aluno foi excluído, pois as regras do jogo foram adaptadas para o seu
desempenho. Este conceito da professora revela a resistência para destituir-se das regras e
normas da instituição esportiva na prática escolar, não aceitando adequar os padrões
esportivos mediante a necessidade do procedimento inclusivo.
Tal conflito expressou este paradigma entre os professores: destituir-se dos
significados da instituição esportiva para adequar procedimentos na prática escolar que
efetivassem uma aula verdadeiramente inclusiva. Esta situação confere com os apontamentos
de Bracht et al. (2002) sobre a identidade social que os professores de educação física foram
levados a construir na atribuição específica da instituição esportiva, representando mais o
papel social como treinadores e menos como professores ou educadores. Com relação à
representação social de educadores inclusivos, os professores pertencem ao grupo dos
informados, descrito por Goffman (1988) como as pessoas que se relacionam com a pessoa
estigmatizada e consideram-nas como pessoas comuns. Sob esta orientação os professores,
nas relações com o aluno com deficiência, devem ser os mediadores do processo de reversão
do estigma da deficiência proporcionando ao aluno a aceitação social comum dentro do
ambiente escolar. No entanto, os professores almejavam as respostas dos alunos direcionados
ao desempenho do treino, caracterizando mais a representação de treinadores e menos de
educadores. Portanto, estando os professores providos da orientação desportiva a reflexão no
seminário sobre as respostas dos alunos com deficiência gerou sentimentos mistos de
frustração e valorização. A professora Mariane disse: As crianças estão tendo esta noção
[inclusão], as crianças. Não que a gente esteja atingindo o objetivo nosso, mas o social, o
moral, ta sendo relatado em casa. Aí assim, eu não me senti ferida (informação verbal)54. Já
João relatou que: Eu mudei a visão, né? Passei a não deixar mais tão de lado, lá no cantinho. 53 Seminário 3 em 17/09/2010. 54 Seminário 3 em 17/09/2010.
75
Eu to tentando colocar ele, é muito difícil, eu programo uma aula, muitas vezes voltado para
ele, e ele vem doente, vem dopado, né? (informação verbal)55.
A professora Mariane compreendeu que a inclusão contemplou o sentido do ensino
moral de aceitação das diferenças na educação física, pois as crianças identificaram o aluno
com deficiência como uma criança comum, mas ela pontuou que o objetivo coletivo da
educação física pode não estar sendo atingido. Tal fala evidenciou que este sentido está
atribuído na abordagem de aptidão física e esportiva, tão dominante na prática da educação
física escolar.
Já o professor João sentiu dificuldades em enfrentar os desafios do ensino inclusivo,
pois não conseguiu entender que o aluno com deficiência não apresentou, naquele dia, a
habilidade hígida exigida para o desempenho motor normal esperado no planejamento da aula
do professor.
Chicon (2008) aponta que a prática educacional revela que os professores que
vivenciaram a orientação higienista demonstram sinais, até os dias atuais, de não aceitação do
aluno com deficiência e do aluno não habilidoso. Neste sentido, confirmamos que os
professores de educação física, voltados ao desenvolvimento motor normal, ansiavam que o
aluno com deficiência realizasse condutas de ajustamento social56 para se adaptar e ter a
capacidade de responder com habilidade à prática do esporte na escola. Verificamos este
pressuposto com a fala do professor João: To pensando o que eu vou fazer com o Luiz para
ele jogar futebol? (informação verbal)57.
O planejamento do professor visava adaptar o aluno ao ensino do futebol, ou seja, o
professor na interação educacional desejou que o aluno com deficiência realizasse
ajustamento de conduta com relação à sua condição de deficiência, estigmatizando-o. No
entanto, cabe ao professor proporcionar ao aluno estigmatizado procedimentos adequados no
ensino que oportunizem a inclusão, sem exigir deste aluno qualquer estratégia de ajustamento
social para que se enquadre dentro das expectativas de normalidade.
Para Goffman (1988) também cabe ao grupo dos informados a aceitação da pessoa
estigmatizada como uma pessoa comum sem impor a necessidade de ajustamentos. Diante
disso, entendemos que os professores, como membros do grupo dos informados, não podem
impor que o aluno com deficiência realize condutas de ajustamentos, portanto, os professores
55 Seminário 3 em 17/09/2010. 56 No item 1 do capítulo 5 estão descritos o conceito e as condutas de ajustamento social, segundo Goffman (1988). 57 Seminário 3 em 17/09/2010.
76
podem lecionar uma aula com procedimentos de adequação do ensino para o aluno com
deficiência.
Neste capítulo já descrevemos tais exemplos inclusivos, quando os alunos adequaram
as regras do jogo sozinhos no recreio, quando o aluno sem deficiência simulou o “frango”,
houve nestas situações uma percepção natural dos alunos para acolher e incluir, e portanto,
mudar as regras do jogo tornou-se apropriado e legítimo. Perante a reorientação didático-
pedagógica desta pesquisa-ação, os professores conseguiram alcançar aulas inclusivas, pois
aconteceu um processo de conscientização dos professores para o sentido real de inclusão e
eles foram reconsiderando suas expectativas voltadas ao rendimento esportivo e ao
desenvolvimento motor normal, pontuando a necessidade de adequar a prática pedagógica.
Para tanto, apresentamos as seguintes falas em sequência e continuidade na
conversação. Professora Mariane: Estamos adaptando a educação física. Professora Ivana: Aí
eu vejo o aluno, não posso deixar o aluno lá. Professora Mariane: É a necessidade desse
aluno. Professor João: E a nossa também. Que nem chegou aquele aluno que eu falei pra você,
que é autista. Peraí, já to sabendo!!! (informações verbais)58.
O diálogo expõe a mudança de conceito na apropriação da educação inclusiva, no
entanto, estavam tão balizados ao desempenho tradicional, na forma de praticar a educação
física escolar direcionada aos padrões esportivos e ao desenvolvimento motor normal, que
viveram um conflito de idéias, um paradigma. O que fazer diante do despertar da concepção
inclusiva, pois, o sistema local e a formação inicial e profissional não incentivam a inclusão?
(Como já pontuamos na primeira e segunda categoria).
Desta forma, os professores se sentiram desmotivados, pois almejavam resultados
padronizados, repostas reconhecidas nos protótipos do esporte e nos marcos do
desenvolvimento motor, entretanto, os alunos com deficiência não apresentavam atributos em
potenciais para tais parâmetros. Havia a necessidade de avaliar as potencialidades do aluno
com deficiência para planejar as expectativas de aprendizagem e então conceituar (ou
quantificar) o desempenho do aluno. No entanto, a avaliação no contexto local era um
procedimento padrão, que conceituava o desempenho do aluno bimestralmente, sem permitir
o decréscimo da nota ou conceito, não proporcionando tal necessidade de planejamento para o
aluno com deficiência, sendo de caráter mais técnico que reflexivo. Este processo de
avaliação local subordinou as expectativas no resultado de padrão ótimo, o que gerou uma
lacuna de discordância de parâmetros de resultados entre a avaliação técnica e a avaliação
58 Seminário 3 em 17/09/2010.
77
reflexiva que compõe o ensino inclusivo. Mediante tal conflito, ressalvamos que os
professores sentiram-se frustrados na avaliação dos resultados inclusivos, como observamos
nos seguintes comentários dos professores Rodrigo e Paula, respectivamente: Eu consegui o
mínimo do mínimo com ele porque eu repeti as aulas (informação verbal)59. Eu não sei. Eu to
tentando. Tem hora que eu me desmotivo. É que eu não vejo nada na Carol, nada, nenhuma
resposta (informação verbal)60.
Refletindo sob as falas verificamos que os professores avaliaram o ensino inclusivo
sob o padrão técnico de avaliação do contexto local. Esta forma de avaliação técnica impõe
que as notas bimestrais avaliem o todo do aprendizado sem permitir o decréscimo dos valores
ou conceitos a cada bimestre, mas o conhecimento foi fornecido fragmentadamente, ou seja,
há um paradoxo/dicotomia entre o processo de oferecer o conhecimento e o processo de
avaliar. Tal situação se refletiu quando os professores foram avaliar o conhecimento proposto
na aula inclusiva que é de natureza integral, e se confrontou com a natureza técnica da
avaliação. Desta forma, os professores não conseguiram visualizar os resultados das ações
inclusivas, eles reduziram e até mesmo anularam as respostas, pois a avaliação de caráter
reflexivo é que constitui o procedimento adequado para examinar o ensino inclusivo.
Mediante ao que já pontuamos, ressaltamos que na reorientação pedagógica desta
pesquisa os professores realizaram as ações inclusivas propostas e planejadas, mas estavam
com dificuldade de legitimar a abordagem inclusiva mediante o enfrentamento dos conceitos
de inclusão em relação aos conceitos tradicionais de aprendizagem e avaliação da educação
física escolar voltada ao rendimento esportivo e às habilidades motoras normais. Diante disso,
verificamos no percurso da pesquisa que os professores realizaram as ações inclusivas
reorientadas com sucesso, mas apresentaram dificuldades para internalizar a concepção de
inclusão e afirmar esta abordagem como a orientação legítima à prática habitual da educação
física escolar devido o condicionamento a fortes resultados relacionados ao desempenho
físico e a competição esportiva (legados do currículo tradicional esportivo, do currículo
técnico-científico e da sistemática da gestão local).
Situação semelhante revelou-se no estudo de Bracht et al. (2002), que apresentaram
uma proposta com professores de educação física, de mudança na prática pedagógica a partir
do método da pesquisa-ação e encontrou por parte dos participantes resistência à mudança
para uma prática crítico-reflexiva, devido a influência da orientação tradicional. Neste
sentido, podemos considerar que os professores experienciaram com dificuldade a 59 Seminário 3 em 17/09/2010. 60 Seminário 3 em 17/09/2010.
78
reorientação da prática didático-pedagógica, além de viverem o conflito entre a necessidade
da inclusão na prática e a concepção ideológica tradicional voltada ao rendimento esportivo,
ao desenvolvimento motor normal e ao sistema de avaliação local. Contudo, destacamos que
os professores realizaram com vontade o enfrentamento das dificuldades e das barreiras para
vencer o desafio de mudança, assim, expomos a seguir partes das ações que os professores
alcançaram com sucesso. Professora Fernanda: “Tirei o Marcos da cadeira [de rodas] para
fazer rolamento, ele teve muita dificuldade, fez cara de choro, fizemos uma vez só e fiquei
com medo de estar machucando ele, aí sentamos no tatame e fizemos alguns abdominais (a
monitora ajudou), os outros alunos que também estavam nesta atividade também fizeram”
(Diário de Campo em 07/10/2010). Professor João: É um jogo tipo o playbolin, só que como o
Gustavo tem a movimentação limitada, anda com dificuldade, se ele andar rápido vai se
machucar. Então eu vou reduzir o espaço, fazer jogo de passe, usar os cones (informação
verbal)61. Professora Paula: “Na atividade com corda a professora e a monitora auxiliaram a
Carol para passar por cima da corda e por baixo. Durante a aula Carol gritava, se dispersava,
olhava para a outra turma que estava próxima da quadra, a professora a todo o momento
realizava a intervenção. Em seguida na prática direcionada da corrida, Carol andava e corria
com a turma, participando da proposta. Na atividade em dupla com o bambolê, a professora
foi dupla com a Carol e realizaram a prática com sucesso” (Observação livre em 17/08/2010).
As descrições acima referiram as aulas dos professores realizadas na perspectiva
inclusiva. No dado seguinte, verificamos a intervenção do professor e da monitora como
mediadores para evitar o alinhamento intragrupal que aconteceu entre o aluno com deficiência
(Pedro) e uma aluna com obesidade (Silvia), através das observações da pesquisadora: “No
circuito as crianças não interagiam com o Pedro e o professor orientava: ‘Estimulem o Pedro
no circuito.’ A monitora falou: ‘Deixa ele Silvia, vai com os outros.’ Outra colega pegou na
mão do Pedro e andaram um pouco no circuito, depois mais uma e logo Silvia veio e tirou a
colega, pegando na mão dele. Aquela que saiu, queixou-se: ‘Ah Silvia, eu tava ali.’ A
monitora orientou-os e caminharam os três juntos no circuito.” (Observação Livre em
14/10/2010).
O professor Rodrigo e a monitora intercederam na aula para impedir o alinhamento
intragrupal, estimulando os demais alunos a favorecerem o alinhamento exogrupal. Para
Goffman (1988), o alinhamento exogrupal está substantivado pelas relações habituais que
61 Seminário 4 em 22/10/2010.
79
manifestam a aceitação social plena da identidade real da pessoa com deficiência. Durante a
pesquisa-ação priorizamos o alinhamento exogrupal nas aulas inclusivas de educação física.
O próximo comentário diz respeito à ação que os professores desempenharam no
conselho de classe escolar. Eles realizaram uma conversa sobre inclusão com o corpo docente
da escola que atuavam, e foi a professora Paula quem falou: A aceitação foi bem legal... Todo
mundo ta trabalhando, a Joana [diretora] também trabalha em cima disso, né? Da inclusão. Ta
bem tranquilo Gisele, bem a jeito (informação verbal)62.
Na escola da professora Paula houve aceitação de sua intervenção inclusiva, o que
também aconteceu na escola da professora Mariane, como segue no comentário:
Programaram [equipe diretiva da escola] o conselho de classe todinho em cima da minha fala
e da professora da sala multifuncional também... Falei da importância da educação física na
escola, do nosso estudo com a Gisele, o nosso trabalho em comum acordo sobre inclusão que
só ta engrandecendo o nosso profissionalismo no ambiente escolar, só que não depende só da
nossa disciplina, e sim do âmbito escolar geral... Foi tão bom... Eu repeti para a turma da tarde
e depois no outro dia tive que estender para a turma do ginásio da manhã e da tarde
(informação verbal)63.
A professora Mariane sentiu que foi bom o reconhecimento da escola com relação à
prática da educação física inclusiva que esta pesquisa reorientou. Isto reflete também o
reconhecimento do professor sobre a contribuição da pesquisa-ação na docência. A ação de
apropriar a inclusão no conselho de classe foi um alcance proposto durante a técnica de
oficina64. Tal ação denominamos na pesquisa de ação coletiva, pois todos os professores
participantes realizaram com o corpo docente das suas escolas esta conversa sobre inclusão,
(dois professores exibiram uma apresentação digital elaborada nos seminários 3 e 4). Diante
disso, ressaltamos que os professores se empenharam nas ações inclusivas reorientadas, pois
tal conteúdo mostrou-se nas seguintes falas, começando pelo professor Rodrigo: Nós estamos
revisando isso, na forma como a gente ta dando a aula (informação verbal)65; Paula: Tu
[professor] tem que facilitar para ele [aluno com deficiência] poder participar (informação
verbal)66 e fechando com Mariane: Já ta mais produtivo [a aula inclusiva]. Não que antes não
62 Seminário 5 em 29/10/2010. 63 Seminário 4 em 22/10/2010. 64 Consultar Apêndice E. 65 Seminário 3 em 17/09/2010. 66 Seminário 3 em 17/09/2010.
80
fazia, só que bem leiga, entendesse? Bem leiga, agora to me fundamentando no que falamos,
nos materiais (informação verbal)67.
A partir das descrições refletimos que a reorientação da ação docente, através da
pesquisa-ação proporcionou novos significados a educação física inclusiva, planejamento
adequado para a aula inclusiva e olhar com caráter de equidade ao aluno com deficiência em
relação ao aluno sem deficiência. Tal reflexão confirma-se nos dados subsequentes de Ivana:
“Bom, pra mim valeu a pena o que consegui com este grupo, pois muito tempo fiquei sozinha,
sem apoio administrativo, hoje estão me ouvindo mais, quanto minhas dificuldades e minhas
angústias, como profissional que acredito que sou” (Diário de campo em 28/10/2010); bem
como da sua fala: E assim, eu aprendi muito aqui, foi bom me ajudou com o meu artigo, e eu
vi com outros olhos os meus alunos também, sabe?... Então, tem que ser trabalhado, eu
primeiro, eu tenho que estar aberta, preparada, porque todo dia é diferente e o resultado? Às
vezes eu nem tenho, mas vamos! (informação verbal)68.
A professora Ivana relatou em seu diário de campo o quanto o grupo da pesquisa-ação
a auxiliou retificando seu sentimento de isolamento. Cruz (2003) referiu em seu estudo que a
mudança na prática pedagógica da educação física a partir da pesquisa-ação denotou com
significância este aspecto, e os professores não se sentiram mais sozinhos, encorajando-se a
dar o primeiro passo e enfrentar as angústias decorrentes das interações sociais e
profissionais. Diante disso anunciamos, no próximo comentário, que na reunião de grupo
focal houve perspectiva de continuidade da reorientação didático pedagógica que vivemos na
pesquisa-ação, na fala do professor Rodrigo: O grupo me auxiliou para reavaliar a prática
pedagógica e a reconstruir o planejamento para o próximo ano. Ajudou a melhorar e criar
meios de desenvolver aulas inclusivas. Segundo o grande grupo, a inclusão deve ser um
processo amplo em que eu possa transformar promovendo uma aceitação e valorizando as
diferenças (informação verbal)69; Também registramos a fala da professora Paula a esse
respeito: Um novo olhar para a inclusão, um novo pensar para o diferente. Saber que cada dia
é um novo desafio e temos que enfrentá-lo. Não desanimar, pois quase ou nunca alcançamos
nossos objetivos. Fazer com que a criança se sinta bem, e fazer com que ela entenda que sua
deficiência apenas o limita em alguns aspectos. Temos que ter o cuidado e respeitar o ser
diferente (informação verbal)70.
67 Seminário 3 em 17/09/2010. 68 Seminário 5 em 29/10/2010. 69 Grupo Focal em 19/11/2010. 70 Grupo Focal em 19/11/2010.
81
Por fim, trazemos a escrita do Professor João com relação à contribuição para a sua
formação profissional do fato de ter participado da pesquisa-ação: “Conquistas: a minha
mudança de pensamento sobre a deficiência. A forma de planejar a aula, pensando em como e
quão inumeráveis são os problemas e a forma que esses alunos enfrentam... Podem ser
minimizadas através de uma aula bem planejada e executada” (Diário de Campo em
22/10/2010).
Como falaram os professores, as conquistas da pesquisa-ação atingiram a consciência
com relação ao aluno com deficiência e o planejamento didático-pedagógico na perspectiva
inclusiva. Entretanto, dotados de resultados de desempenho esportivo, eles permanecem com
a dificuldade de avaliar as potencialidades e as respostas dos alunos com deficiência, pois
comparam o resultado da inclusão ao rendimento tradicional atribuindo nesta relação o
mínimo ou há falta de resultados. Segundo Rechineli; Porto; Moreira, (2008), a educação
física com critérios nos princípios da diversidade possibilita o professor a trabalhar as
diferenças dos alunos com deficiência no sentido de ressignificá-las e respeitá-las, não
devendo mais possibilitar a aprendizagem do movimento no privilégio de conteúdos
esportivos e na realização de exercícios tradicionais. Para afirmar esta reflexão apresentamos
as falas seguintes que sugerem o privilégio do esporte e a dificuldade de validar o resultado da
prática inclusiva; professora Mariane: Na inclusão a visão é ampla e o resultado é uma
incógnita! (informação verbal)71, e da professora Ivana: Educação física inclusiva tem
resistência dos alunos porque não gostam do esporte, participam pouco” (informação
verbal)72.
Os códigos da instituição esportiva balizaram a educação física escolar como condição
de conteúdo referencial e como parâmetro para a avaliação do aluno. Desta forma, a
fundamentação do ensino inclusivo de respeitar as individualidades e as potencialidades do
alunado não foi validada pelos professores na prática real da educação física. Por mais que
tenham realizado as ações inclusivas com sucesso, este estado de reconhecimento da
concepção inclusiva na educação física os professores não conseguiram internalizar
plenamente. Neste sentido destacamos que não houve suporte para a aceitação da inclusão de
forma verdadeira e integral na educação física escolar por parte do conteúdo tradicional
esportivo e do sistema de avaliação local do componente curricular Educação Física da rede
municipal de ensino de Itajaí, pois conceituou com caráter técnico a avaliação bimestral do
aluno. 71 Grupo Focal em 29/11/2010. 72 Grupo Focal em 29/11/2010.
82
6.4 Artigo científico
A INCLUSÃO ESCOLAR E AS EXPECTATIVAS DOS PROFESSORES
DE EDUCAÇÃO FÍSICA1
Gisele Cristina de Souza*
Maria Glória Dittrich**
Santiago Pich***
RESUMO
Este artigo é resultante da investigação da inclusão escolar no componente curricular
Educação Física junto a um grupo de 7 (sete) professores da rede municipal de ensino de
Itajaí - SC. O desenvolvimento deu-se sob o referencial do estigma da pessoa com deficiência.
O objetivo foi orientar o processo de reconstrução das práticas pedagógicas do professor na
implantação da educação física inclusiva. Adotamos a abordagem qualitativa em pesquisa
social com a proposta de trabalho na pesquisa-ação. Os dados revelaram nova percepção dos
professores sob a inclusão escolar, a reorientação de ações inclusivas na prática pedagógica,
as expectativas dos professores voltadas ao rendimento esportivo e ao desenvolvimento motor
normal, condicionadas pela formação inicial e continuada, e pelo sistema de avaliação e
gestão do componente curricular educação física da rede municipal de ensino de Itajaí.
Palavras-chave: Educação Física. Inclusão. Prática Pedagógica.
1 Este artigo tem sua origem na dissertação de mestrado intitulada “Reorientação didático-pedagógica da educação física na perspectiva da inclusão escolar” – Programa de Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho, Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI –SC, 2011. * Mestranda em Saúde e Gestão do Trabalho pela Universidade do Vale do Itajaí, Fisioterapeuta Efetiva da Prefeitura Municipal de Itajaí. Itajaí, SC, Brasil. E-mail: [email protected] ** Doutora em Teologia pelo pela Escola Superior de Teologia, RS – Brasil; Mestre em Educação pela Universidade Regional de Blumenau, SC – Brasil e Filósofa pela Fundação Educacional de Brusque, SC – Brasil. Professora e pesquisadora da Universidade do Vale do Itajaí. É membro integrante da Red de Formación Universitaria Transdisciplinar - REDFUT , da Comunidad Internacional Científica Virtual para el Cambio – CCVC e do Projeto ADESTE – com sede na Universidade de Barcelona - Espanha. É presidente fundadora da Associação Catarinenese de Arteterapia - ACAT, membro da UBAAT. Autora e organizadora do I ENCONTRO INTERNACIONAL E CIÊNCIAS ECO-ESPIRITUALIAIS - Transdisciplinaridade, Ecoformação e Saúde- 2010. Escritora e promotora de eventos culturais e científicos. E-mail: [email protected] *** Doutor em Ciências Humanas PPGICH/UFSC, Professor do Departamento de Educação Física da UFPR. Curitiba, PR, Brasil. E-mail: [email protected]
83
ABSTRACT
The Inclusion at School and the Expectations of the Teachers of Physical Education
This article is the result of the research inclusion in school physical education curriculum
component with a group of (seven) teachers of municipal schools in the town of Itajaí, in the
Brazilian state of Santa Catarina. The development was issued under the referential of the
stigma of the person with a disability. The aim was to guide the process of reconstruction of
the pedagogical practices of teachers in the deployment of physical education inclusive. We
used a qualitative approach in social research with the proposed work in action-research. The
data revealed new perception of the teachers in the school inclusion, the reorientation of
inclusive actions in the pedagogical practice, the expectations of the teachers focused on the
sports performance and the normal motor development, conditioned by graduation and
continuous training, and the system of evaluation and management of the education of Itajaí.
Keywords: Physical Education. Inclusion. Practice Pedagogic.
Introdução
Pensar o fenômeno da inclusão escolar dentro do século XXI é começarmos a
perceber que fazer educação demanda compreensão sobre o ser humano como um todo vivo
que detém a vida como instância ética e estética de acolhimento, de cuidado e de tratamento
com respeito e dignidade, co-responsabilidade e solidariedade no ensinar e aprender. A ação
pedagógica inclusiva tem um olhar integral sobre o aluno como pessoa, com sua história de
vida, seu contexto geográfico e cultural.
84
Nessa perspectiva, os professores agem como pessoas sensíveis e capazes de
reconhecer e lidar com diferentes saberes e seres, abrindo mão de modelos e métodos
mecânicos, pré-estabelecidos para obterem somente resultados que estigmatizam o ser
humano com deficiência. Com efeito, o professor que vive a prática educacional inclusiva se
coloca como pessoa aberta ao acolhimento e ao cuidado do aluno, focando possibilidades de
descobertas criativas, que ampliem a qualidade de suas ações no desenvolvimento do aluno. Esta idéia nos contextualiza no mundo das ciências que, por sua vez, está dentro de
uma sociedade globalizada, complexa e sistêmica no tecido eco-sócio-político-econômico-
cultural. Esta sociedade é dinamizada pela criatividade da vida manifestada nos diferentes
olhares, saberes e seres e isso têm impactos na educação escolar. O que percebemos é que os
tempos das certezas nos modelos pedagógicos já não dão mais conta de atender as demandas
diversas com suas singularidades. Saber incluir demanda enfrentar as incertezas, as
provisoriedades e as diferenças nas relações e no conhecimento.
Nesse contexto, o ser humano, aluno e professor, cada vez mais sente-se
desprotegido, angustiado, triste, desesperançado e agressivo diante de suas dificuldades.
Vivemos um tempo da crise do ensino mecânico, do vazio existencial diante de uma educação
excludente, ativista e instigadora da competitividade pelos resultados. O que fazer?
Certamente não temos as respostas prontas, mas a busca é de entender que a
educação tem um compromisso ético-estético de implementar ações pedagógicas inclusivas,
ou seja, aquelas que oportunizem ao aluno um reencantar consigo mesmo, redescobrindo nas
suas potencialidades e limitações a sua essência criadora, que misteriosamente o coloca como
um ser que vai além de si mesmo, por isso clama sempre por uma educação que lhe ensine a
descobrir um sentido maior para sua vida.
Refletindo sobre isso apontamos que na década de 80, no Brasil, surgiu oficialmente,
no bojo das políticas públicas emanadas da Constituição de 1988, o marco do movimento de
inclusão escolar das crianças com deficiência na escola regular. Os dados estatísticos e
números revelam a dificuldade de adesão à inclusão no ensino comum, pois há discrepância
entre o número de matrículas de crianças com deficiência na escola especial para a escola
regular, segundo Antunes (2006, p. 17)
a organização Mundial de Saúde estima que cerca de 10% da população terrestre possui necessidades especiais - cerca de 600 milhões de pessoas – e dados estatísticos brasileiros recentes, [...] alertam-nos para a existência de 358.987 alunos especiais matriculados [...]. Destes alunos, apenas 144.543 frequentavam salas regulares.
85
Os dados projetam a dificuldade de garantir o acesso e a permanência de toda a criança
indiscriminadamente, na escola comum, revelando falhas na adesão do processo de incluir
todas as crianças. Mediante esta dificuldade para a operacionalização da inclusão, apontamos
a necessidade da pesquisa social, como forma do estudo científico contribuir com as
condições educacionais para a inclusão, diante dessa necessidade, delimitamos o objeto deste
estudo nas expectativas dos professores de educação física na reconstrução das práticas
pedagógicas na perspectiva da inclusão escolar.
Segundo Sassaki (1997) inclusão é um conjunto de procedimentos para a adequação
do sistema educacional geral as necessidades, habilidades e aspirações dos alunos com e sem
deficiência, os quais são aceitos com as suas diferenças, pois elas nos fazem seres humanos
únicos. Neste sentido compreendemos que a educação inclusiva é aquela acessível para todas
as crianças, com e sem deficiência, contudo anunciamos o recorte do objeto deste estudo
destinou-se à inclusão do aluno com deficiência na escola regular.
Para dar condições teóricas ao entendimento da inclusão do aluno com deficiência
adotamos o norte teórico do estigma proposto pelo sociólogo Erving Goffman. O autor
apresenta o seguinte conceito (Goffman, 1988, p. 7): “estigma é a situação do indivíduo que
está inabilitado para a aceitação social plena”. Além disso, Goffmann (1988) aponta três tipos
de estigma, sendo eles: (a) a rejeição as deformidades físicas; (b) a culpa de caráter individual
(como o vício) e, por último, (c) os estigmas tribais de raça, nação e religião. Delimitamos o
recorte do conceito do estigma relacionado à rejeição de deformidades, pois este se relaciona
a manipulação deteriorada da identidade do aluno com deficiência na escola.
Atentos a descrição de Goffman a respeito do conceito de estigma e as notas sobre a
diferença (da deficiência) como um valor à diversidade social; destacamos a deficiência e as
condições que contribuem para proporcionar à pessoa com deficiência estigmatizada os
critérios reais de identificação social.
A deficiência é um conceito moderno apareceu após a sociedade enfatizar a eficiência
como marca da vida. Puppin (1999) aponta para a deficiência a criação de uma identidade
social, postulando a pessoa com deficiência como o diferente que não é eficiente. À pessoa
com deficiência (PcD) é atribuído diferenças nas manifestações sociais. Oliveira (2000) relata
que as diferenças reconhecidas e repassadas perante um número considerável de pessoas
constituem representações coletivas, assim as representações dos grupos sociais inferem no
reconhecimento da identificação social de cada pessoa.
86
Goffman (1988) explica que a sociedade nas suas relações estabelece noções para
categorizar as pessoas, representando concepções de normativas e exigências numa identidade
social virtual, desconsiderando os atributos reais pessoais, ou seja, sua identidade social real.
O próprio Goffman (1988) coloca que na determinação da categoria social nem todos
os atributos estão presentes, a sociedade observa apenas aqueles que são incongruentes com a
expectativa de eficiência social, ou seja, as diferenças.
Neste sentido as diferenças são as características que a sociedade utiliza para
representar a PcD como aquele que está fora das expectativas de produção social, colocando-o
na categoria de não eficiente (deficiente). As diferenças são então encaradas como as
atribuições pessoais que constituem a identidade social virtual, desconsiderando quaisquer
outros atributos que não o coloquem na categoria de deficiente.
Dotados deste marco teórico compreendemos que a escola regular é o espaço que
possui na sua essência o sentido de inclusão e aceitação social plena da pessoa com e sem
deficiência almejando o desenvolvimento integral de cada um. No entanto, segundo Mantoan
(2003) na maioria das escolas brasileiras a inclusão implica em inovar esforços de
modernização e de reestruturação das condições atuais de ensino. Pois a escola comum, para
realizar verdadeiramente a inclusão, necessita assumir que as dificuldades de alguns alunos
não são apenas deles, mas resultam em grande parte do modo como o ensino é ministrado.
Neste sentido torna-se necessário a transformação do processo de ensino-
aprendizagem para garantir a inclusão e o desenvolvimento de todo o aluno com equidade.
Ministério Público Federal (2004) aponta como meta da escola inclusiva o desempenho dos
alunos com o sucesso ativo na aprendizagem das atividades escolares, e não somente na forma
de avaliar o desempenho como um nível ou rendimento, pontual da mera expressão física de
uma função.
Mediante o processo de inclusão as diferenças de cada aluno possuem um caráter de
aperfeiçoamento para o processo de aprendizagem. Desta forma, a escola inclui as diferenças
significando valores sociais na participação ativa de cada criança na aquisição dos
conhecimentos, e ainda, para Sassaki (1997) a escola sob a concepção da inclusão é aquela
que, diariamente, vai se tornando adequada a cada um dos alunos nas suas diferenças e
necessidades.
A Educação Física é um componente do currículo da escola regular e deve estar de
forma atuante e adjuvante ao processo de inclusão escolar e social das crianças com
deficiência (AGUIAR E DUARTE, 2005). Porém, nas perspectivas atuais o exercício da
Educação Física pouco tem superado a organicidade escolar segmentalizada a fim de
87
estabelecer uma prática verdadeiramente inclusiva. Costa e Souza (2004) apontam que são
escassos os estudos voltados para a temática da educação física inclusiva, tendo como base
firmadora a participação do uno e do diverso simultaneamente, o que é o grande desafio do
século XXI.
Destacamos ainda, que o desenvolvimento da educação física como componente
curricular possui a carga de determinação das estruturas macrossociais. Neste contexto a
educação física escolar desenhou-se a partir de um caráter instrumental, no qual o modelo de
corpo forte e sadio foi articulado em função da sociedade e do regime capitalista emergente
no século XIX (CAPARROZ, 2007).
Nesse sentido, Bracht (1992) aponta que o tema da educação física não se restringe
somente aos códigos2 propostos do esporte na escola, balizado ao contexto macrossocial da
descoberta do atleta. O mesmo autor ainda refere que a identidade da educação física na
escola compreende uma reflexão do próprio papel da escola na sociedade.
Aguiar e Duarte (2005) sugerem o papel do professor de educação física na direção de
uma abordagem de cooperação e participação na convivência com a diversidade, incluindo
nos jogos e campeonatos escolares, todo o alunado, inclusive aquele que não demonstra
talento ou que apresenta dificuldades no controle do corpo e dos movimentos.
Compreendemos que a inclusão se refere a uma educação física com o significado de
educar para a diferença, para a convivência e a aceitação das diferentes configurações
possíveis da corporeidade humana. No entanto, o professor está sujeito as atribuições do
sistema escolar e o meio social que condicionam a prática pedagógica a se adequar aos
códigos da instituição esportiva.
Sob esta ótica a prática pedagógica dos professores de educação física está
substantivada pelos fundamentos da pedagogia de rendimento de um lado e do contexto da
inclusão de crianças com deficiência no outro, tal experiência delimita o objeto deste estudo,
no qual, pressupomos que quando os professores são orientados à prática didático-pedagógica
na reflexão ação, (abordagem que confere com a estratégia da pesquisa-ação) tornam-se
capazes para promoverem mudanças; sabendo-se que os sujeitos envolvidos constituem o
próprio processo reflexivo.
No que concerne a aplicação e entendimento da inclusão escolar e aproximação desta
na prática pedagógica da educação física; este estudo apresentou por objetivo orientar o
2 Código é o que expressa/denuncia o sentido que está incorporado no condicionamento de determinado contexto (BRACHT, 1992).
88
processo de reconstrução das práticas pedagógicas dos professores de educação física na
implantação da educação física inclusiva.
Procedimentos metodológicos: um percurso a partir da pesquisa-ação
Neste estudo adotamos o referencial teórico dentro da abordagem qualitativa de
pesquisa social. Desenvolvemos o processo de investigação sob a proposta de trabalho da
pesquisa-ação. A metodologia das ciências sociais considera a pesquisa-ação como um
método ou estratégia de pesquisa que agrega instrumentos e técnicas de pesquisa social
(THIOLLENT, 1996).
Adotamos a pesquisa-ação partindo do referencial que conceitua o método como
forma de investigar e contribuir com a realidade do nosso objeto de estudo (CRUZ, 2003).
Neste sentido, optamos por estruturar nossa proposta de pesquisa segundo a concepção e
organização da pesquisa-ação referida por Thiollent (1996). O autor aponta o planejamento da
pesquisa-ação de forma flexível, sem estabelecer fases ordenadas; propondo o roteiro no qual
há um ponto de partida (fase de exploração) e de chegada (divulgação dos resultados),
sabendo que no desenvolvimento da pesquisa se articulam os passos do percurso e as
ferramentas em função das circunstancias investigadas.
Foram convidados para participar deste professores de Educação Física efetivos na
Rede Municipal de Ensino no município de Itajaí. Os professores foram convidados com
caráter intencional segundo a relevância que eles representavam em relação ao objeto deste
estudo, ou seja, consideramos a representação saliente que desempenhavam enquanto
professores, no sentido de sobressair-se mediante a postura de comprometimento com a sua
prática profissional. Para Thiollent (1996) a amostra intencional é aplicada para o caso da
pesquisa-ação.
A pesquisa compreendeu sete professores que participaram por toda a coleta de dados.
O convite teve caráter voluntário e foi estabelecido mediante assinatura do termo de
consentimento livre e esclarecido conforme as considerações3 estabelecidas na Resolução 3 Em respeito à comunidade e individualidade humana realizamos o cumprimento dos seguintes aspectos éticos: esclarecimento da pesquisa para todos os participantes; obtenção da anuência da gestão municipal local e dos participantes; garantia do anonimato e sigilo das informações que não desejaram ser divulgadas; segurança aos participantes para retirarem-se da pesquisa ou permanecerem sem que lhes ocasione qualquer dano; respeito aos valores, hábitos e costumes das pessoas envolvidas e garantia da devolução dos dados após o término da pesquisa.
89
196/96 do Conselho Nacional de Saúde que se refere às Diretrizes e Normas
Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos. Registramos que o projeto de
pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Vale do Itajaí
(UNIVALI) e recebeu aprovação com parecer favorável documentado e protocolado.
Destacamos que para salvaguardar o sigilo da identidade dos participantes todos os nomes
descritos são nomes fictícios.
Nosso percurso de pesquisa envolveu: levantamento do diagnóstico situacional,
deliberação dos problemas locais, estudo dos problemas sob o campo teórico e prático,
hipóteses de solução, planejamento e aplicação de ações para a possível solução dos
problemas levantados. A trajetória também compreendeu análise no plano de aplicação
prática das ações incluindo avaliação processual, análise das intervenções, possível
continuidade, modificações e aprendizado dos participantes, segundo a proposta de Thiollent
(1996).
Para coletar os dados utilizamos técnicas e instrumentos da abordagem qualitativa em
pesquisa social dispostos como uma gama de ferramentas que se ajustaram no
desenvolvimento do percurso da pesquisa-ação. Portanto descrevemos nossa trajetória de
pesquisa esquematicamente:
• Ponto de partida do percurso: fase de exploração. Incluiu na coleta de dados: oficina e
observação livre das aulas de educação física dos professores participantes;
• Desenvolvimento: colocação dos problemas, hipóteses, plano e aplicação de ações.
Incluiu na coleta de dados: observação livre das aulas de educação física dos
professores participantes, diário de campo dos professores participantes e reuniões de
seminário;
• Ponto de chegada: divulgação dos resultados. Incluiu na coleta de dados: reuniões de
grupo focal.
Em síntese iniciamos a coleta de dados com observação livre das aulas e demos a
continuidade desta técnica até o final da coleta de dados. Já no momento inicial realizamos a
técnica de oficina e na sequência produzimos os diários de campo com a continuidade deste
instrumento até o final da coleta de dados. Então seguimos o percurso com as reuniões de
seminário, concomitante as observações livres e aos diários de campo. Ao final realizamos as
reuniões de grupo focal.
Para o procedimento de análise de dados adotamos a análise de conteúdo proposta por
Bardin (2004). A autora propõe a análise de conteúdo como um conjunto de técnicas de
90
investigação da comunicação para descrever com objetividade e com sistemática as
mensagens da comunicação, bem como, a finalidade e a interpretação das mesmas.
No tratamento dos dados identificamos as categorias de análise do conteúdo. Segundo
Bardin (2004), as categorias são o produto da codificação das mensagens que reúne as
unidades de contexto e registro com o grupo de elementos que significam a mensagem. Nos
dados analisados observamos três categorias de análise que ajudam a explicitar o objeto deste
estudo: o legado da formação inicial sobre a inclusão; o tratamento da inclusão pelo sistema
educacional local; e as expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar.
O legado da formação inicial sobre inclusão
Diante da análise o conteúdo evidenciou que a formação inicial dos professores
mostrou-se uma formação tradicional que não implicava em propostas inclusivas e apresentou
uma concepção de educação física pautada pelos códigos da instituição esportiva. Neste
recorte observamos que o conteúdo presente na formação inicial proporcionou uma prática
carente da concepção inclusiva sem a devida apropriação deste referencial. O grupo de
professores apontou que foi na graduação que tiveram o primeiro contato com a inclusão, mas
que o conteúdo não dava suporte a uma prática pedagógica condizente. Neste sentido,
apresentamos os comentários dos professores participantes com relação ao estudo da inclusão
na sua graduação (formação inicial): Na graduação foram realizados muitos estágios com
equipes de rendimento e muitos possuíam limitações físicas, intelectuais, visuais e auditivas
(informação verbal)74. As estratégias [de inclusão] adaptei na graduação, que apesar de não
atender as expectativas, deu idéias (informação verbal)75.
Os dados empíricos descritos acima confirmam que o referencial inclusivo não foi
explorado na formação inicial, e, além disso, assegura a presença do conteúdo de rendimento
físico, tão característico da formação tradicional esportiva (BETTI e BETTI, 1996).
Para complementar os dados da análise, também destacamos (a seguir) as primeiras
experiências inclusivas da vida docente dos professores, pois, ouvimos que as dificuldades
eram muitas, e nem todas as aulas eram inclusivas; geralmente os professores focavam no
aluno com deficiência, não conseguindo encontrar resultados, como escutamos na fala: Contra
74 Fala do professor João na Oficina em 13/08/2010. 75 Fala do professor Rodrigo na Oficina em 13/08/2010.
91
as regras do sistema onde não se aceitava certa deficiência por desconhecê-la... Aos trancos e
barrancos, sem conhecimento prévio, baseada apenas na convivência diária e adequação a
linguagem do aluno, ele fez parte dos jogos escolares contra a vontade de muitos e ajudou a
trazer o título com muita eficiência, o que me trouxe profissionalmente muita satisfação.
(informação verbal)76
A primeira experiência inclusiva da professora Mariane aponta que a inclusão só
ocorreu a partir da adesão do aluno com deficiência aos códigos da instituição esportiva. E
ainda denota que a professora incluiu o aluno nos jogos escolares sem o apoio da gestão local
e sem o conhecimento que sustentasse a prática inclusiva. Além disso, destacando este recorte
da fala: “não se aceitava certa deficiência” verificamos o conceito de estigma, marcado pela
identificação desacreditada do aluno com deficiência. Segundo Goffman (1988) o estigma se
estabelece substantivando as interações relacionais quando não há a aceitação social plena da
pessoa (com deficiência). De fato, o estigma esteve presente na relação entre o “sistema” e o
aluno com deficiência, conforme o depoimento da professora Mariane, o que apontou que as
regras do sistema escolar não são inclusivas, pois não aceitam a diferença do aluno com
deficiência, tal situação é inadmissível, pois cabe ao sistema escolar a reversão77 do estigma
perante a deficiência, criando um conjunto de procedimentos educacionais que eliminem as
condições adversas do aluno com deficiência e inclua-o de forma igualitária no processo
ensino-aprendizagem.
Diante dos dados apresentados verificamos que a formação inicial não ofereceu
fundamentação suficiente para que realizassem com sucesso suas primeiras experiências
inclusivas, ressaltando que a maioria das experiências foram vividas recentemente, portanto,
as escolas já estavam sob a LDB 9394/1996, que normaliza a obrigatoriedade da inclusão no
ensino regular. Além disso, a partir de 1987 a formação inicial da educação física já estava
sob a orientação da Resolução n. 03/87 do Conselho Nacional de Educação, portanto,
esperava-se uma formação com maior caráter crítico reflexivo na orientação do professor
(BRACHT et al., 2002).
No entanto, as formações iniciais dos professores deixaram uma lacuna de orientação
pedagógica crítica-reflexiva, o que proporcionou aos professores enfrentarem dificuldades
para trabalhar na perspectiva da inclusão e expressarem dúvidas sobre como intervir com
alunos com deficiência no momento deles passarem a fazer parte da escola regular.
76 Fala da professora Mariane na Oficina em 13/08/2010. 77 A reversão do estigma é possível quando há um conjunto de ações mutua das pessoas que se relacionam com a pessoa estigmatizada para atribuir na identidade social o valor real pessoal (COSTA, 2010).
92
Exemplificamos essa dúvida também com esta fala do professor Rodrigo: Eu digo assim: eu
faço o que em relação ao Pedro? (informação verbal)78.
Podemos considerar que na concepção dos professores de educação física, o aluno
com deficiência não cumpre o conjunto de expectativas proposto na singularidade do
conteúdo esportivo79, legado da formação inicial reforçado ao longo da carreira docente do
professor. Desta forma, os códigos (de competição e rendimento) sustentados pelo esporte não
eram questionados, o professor questionava-se sobre o que fazer com o aluno com deficiência,
sobre o que fazer com este aluno identificado como o desviante das competências requeridas
para a aula. Goffman (1988) refere que só é possível estabelecer a identidade de desviante
quando há a relação direta do eu-outro, ou seja, desviante-normal; pontuamos que nesta
relação (desviante-normal), o aluno com deficiência está substantivado a identidade de
desviante enquanto que o aluno com competência às habilidades requeridas pelas normas
educacionais está substantivado a identidade de normal.
Na literatura sobre inclusão vemos justamente o contrário, ou seja, há necessidade de
adequar as normas de ensino para respeitar a identidade do aluno (sem depreciá-lo como o
desviante). Portanto, há o questionamento da prática do ensino, no qual o processo de
aprendizagem é mediado pelo professor de forma a estabelecer uma relação de significado
entre o mundo particular da identidade do aluno e o conteúdo apresentado no currículo
funcional. Como aponta Mantoan (2003), a inclusão visa ressignificar o modelo pedagógico
tradicional que não consegue proporcionar uma educação igualitária para todos. Neste sentido
de educação está incorporada a concepção de equidade no processo ensino-aprendizagem.
Com relação às abordagens pedagógicas na formação da educação física, entendemos
que as pedagogias progressistas apresentam propostas inclusivas, no entanto, os professores
não demonstraram estar orientados pelas propostas progressistas, já que, havia nas suas
primeiras experiências a dificuldade de incluir. Kunz (1991) relata que para o professor de
educação física há falta de uma orientação baseada na concepção crítico-progressista; sendo
que, pontuamos que tal orientação proporciona práticas educacionais inclusivas.
Neste sentido, em virtude da concepção adquirida na formação inicial e reforçada ao
longo do processo de atuação profissional a visão tradicional fundamentada no esporte se
refletiu no tratamento do conteúdo. Com relação a esse aspecto, verificamos que os
professores aceitam como meta suficiente para o aluno com deficiência, a inclusão (aceitação)
da turma; já, para o aluno sem deficiência almejam como meta a aptidão motora, o
78 Fala do professor Rodrigo no Seminário 3 em 17/09/2010. 79 As expectativas voltadas ao conteúdo esportivo descrevemos de forma aprofundada no item relacionado à terceira categoria de análise.
93
rendimento. Os professores não conseguem aceitar a prática docente de ensinar o aluno que
não alcança o rendimento conforme o conjunto de regras sustentado pelo conteúdo disciplinar
previsto no currículo tradicional. Um exemplo dessa situação observamos quando a
professora Paula comentou sobre o planejamento de uma aula sem o foco no rendimento
esportivo, disse ela: Não, eu não acredito, o terceiro ano, quarto ano, tudo bem fazer uma aula
mais passiva, mais moderada. Mas precisa dar aula agitada, necessitam o corre-corre, o agito,
eles necessitam disso. E quando a Carol ta, eu não consigo fazer nada disso (informação
verbal)80.
A Carol é uma aluna com deficiência que a professora não aceita na proposta da aula
de rendimento esportivo. Nesta situação vimos a condição de desvio, pois a aluna com
deficiência está fora das normas de conformidade, que o professor planejava para a aula.
Segundo Goffman (1988) o desvio se estabelece quando as pessoas compartilham de um
conjunto de regras e expectativas normativas, que estão presentes porque foram incorporadas.
Ressaltamos que inclusão não acontece pronta e que as ações didático-pedagógicas
não estão descritas na literatura sob uma técnica padronizada que se possa seguir. Com base
neste sentido optamos pela proposta de trabalho na pesquisa-ação, para que os professores
participantes adquirissem esta consciência na vivência das ações habituais das suas aulas de
educação física inclusivas.
O tratamento da inclusão pelo sistema educacional local
No tratamento da inclusão pelo sistema educacional do município de Itajaí em
particular no componente curricular da Educação Física realizamos o recorte da análise
focados na formação continuada sobre inclusão no contexto local, para tanto, destacamos os
comentários das professoras Paula, Mariane e Fernanda (respectivamente): Não participei de
nenhuma formação que me dessem subsídios para trabalhar com inclusão, porém a
necessidade faz com que eu mesma procure recursos para enfrentar este obstáculo
(informação verbal)81.
80 Fala da professora Paula no Seminário 3 em 17/09/2010. 81 Fala da Professora Paula na Oficina em 13/08/2010.
94
Não me recordo de fazer parte efetivamente de alguma “capacitação” (formação
específica)[...] Falando em necessidade eu enquanto educadora venho me adaptando na
medida do possível baseada no senso comum e em experiências diárias, sem formação alguma
e sim evidentemente a necessidade vigente (informação verbal)82.
Agora tenho um pouco mais de conhecimento para trabalhar com alunos com
deficiência, mas por estudos em casa (nas conversas com os pais) e pela experiência, pois não
tive oportunidade de fazer uma formação continuada sobre o assunto (informação verbal)83.
As três professoras relataram a falta da formação continuada na perspectiva da
inclusão tendo procurado recurso ao senso comum ou a tentativa e erro da própria
experiência, o que demonstrou o isolamento dos professores para abordar a concepção
inclusiva no contexto local. Tal condição revelou que os professores se sentem impotentes,
distantes da gestão e isolados na busca de ações inclusivas para as suas aulas de educação
física. Segundo Falkenbach; Ordobas; Machado (2008) e Medeiros e Falkenbach (2008), os
professores realmente sentem insegurança por medo e falta de preparo para atuar na
perspectiva inclusiva. Daí justifica-se na literatura e nos dados apresentados a importância de
formar continuamente os professores. Além disso, devemos considerar que o conjunto de
procedimentos que asseguram o ensino inclusivo perpassa a necessidade de adaptações
físicas, acessibilidade e tecnologias assistivas, avançando, de forma essencial, para a
necessidade de formar e capacitar permanentemente os professores. Esse conceito
encontramos na fala do professor Rodrigo:
É, mas as pessoas acham que colocando a rampa e adaptação no banheiro, pronto! A
escola já esta pronta! (informação verbal)84. O comentário do professor demonstrou com
angústia o isolamento dos professores no sistema local para trabalhar a inclusão em sua
plenitude. Tal situação revelou a necessidade do amparo da formação em serviço para o
ensino inclusivo. Para Mantoan (2003) é tarefa fundamental da escola inclusiva, formar e
aprimorar continuamente o professor. Lembramos que quando nos referimos à formação
profissional continuada, enfatizamos um processo que deve ser realizado de forma reflexiva e
crítico-social para dar possibilidades ao professor de assegurar-se com um saber próprio para
atuar com coerência ao contexto local. Assegurar conhecimento e empoderamento ao
professor necessita condicionar a estrutura/sistema macro e micro social para proporcionar
continuamente ações de formação profissional que oportunizem o professor a trabalhar com a
inclusão de forma plena e contínua e não de maneira eventual. 82 Fala da Professora Mariane na Oficina em 13/08/2010. 83 Fala da Professora Fernanda na Oficina em 13/08/2010. 84 Fala do professor Rodrigo no Seminário 3 em 17/09/2010.
95
Diante dos dados apresentados constatamos que não houve registros sobre a formação
continuada na prática profissional dos professores investigados. Com isso, ficou evidente que
o tema inclusão escolar não foi foco temática na formação em serviço para a componente
curricular educação física na rede municipal de ensino de Itajaí.
O rendimento esportivo e o desenvolvimento motor normal
Partindo do referencial teórico de Mantoan (2003), a inclusão veio acontecer no
contexto da mudança da sociedade, na busca de outras formas de interpretar e ressignificar o
imaginário social sobre as pessoas com deficiência, o que implica numa mudança do atual
paradigma educacional, tão racionalista e formal na oferta dos serviços educacionais. Neste
sentido o Ministério Público Federal (2004) refere que transformar o modelo de ensino da
escola não é exigência do processo de inclusão de pessoas com deficiência, a transformação
deve ser encarada como compromisso social inadiável, que terá por conseqüência a inclusão
escolar.
O professor de educação física necessita assumir seu papel social de educador no
processo inclusivo atribuindo à prática pedagógica a concepção crítica reflexiva sobre e com a
cultura corporal de movimento. Rechineli; Porto; Moreira, (2008), apontam que atualmente a
educação física aborda o significado da eficiência dos corpos deficientes quando inclui
propostas participativas num processo de aprendizagem inclusivo.
Adentrando na história da educação física, nas orientações higienista e tecnicista,
verifica-se que o aluno com deficiência foi excluído das práticas pedagógicas escolares, tão
fortemente voltadas a ginástica e a aptidão física da performance de modalidades esportivas
(CHICON, 2008; RECHINELI; PORTO; MOREIRA, 2008). Já no período subsequente
vemos a educação física incorporar discussões pedagógicas influenciada pelas ciências
humanas, com base na filosofia e sociologia da educação progressista. Começa a ser rompido
o paradigma da aptidão física e esportiva devido à análise da função social da educação nas
diferenças sociais (BRACHT, 1999).
Contudo, ainda é necessário para a educação física superar os conceitos de aptidão
física e rendimento padronizado incluindo todas as dimensões envolvidas em cada prática
corporal (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DESPORTO, 1998). Portanto, compreendemos
96
os limites desta pesquisa-ação perante as orientações pedagógicas que condicionam a
educação física escolar. Diante disso, a coleta de dados revelou os seguintes resultados com
relação às expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar: professor João: Mas
assim oh, porque a gente ta acostumado com resultados, né? É muito fácil a gente ir lá, monta
uma equipe, jogar, ganhar. E ali [inclusão] é o mínimo! (informação verbal)85. O comentário
do professor revelou que a prática da educação física escolar envolveu-se com a proposta de
rendimento esportivo, a qual considera o corpo e as práticas corporais voltadas à concepção
social de produção do atleta. Diante disso, o professor relatou (apontando para o diário de
campo que escreveu de sua aula inclusiva) que a proposta de inclusão não apresentou efeito
perante o resultado de aptidão esportiva que ele almejava e que condicionou sua atuação na
escola. Tal relato demonstra que as expectativas dos professores estavam voltadas ao
rendimento esportivo.
Segundo Aguiar e Duarte (2005), a cultura desportiva e competitiva é dominante na
proposta da educação física e proporciona resistência à inclusão dos alunos que não
apresentam bom desempenho para uma competição. Por outro lado, o conteúdo esportivo
pode ser utilizado pelos professores para trabalhar a prática inclusiva, desde que não esteja
dotado dos códigos de competição e rendimento da instituição esportiva, e garanta a
concepção do ensino inclusivo na participação e cooperação.
Pontuamos que o código do esporte no sentido competitivo esteve presente nas aulas
de educação física dos professores, de forma que, quando o aluno não demonstrou interesse
nas práticas de caráter competitivo, o professor apresentou uma reação de surpresa, como
verificamos no diário de campo da professora Mariane: “Bom no momento do chute do
Sérgio da primeira vez aproximei ele da trave, posicionei a bola para facilitar seu chute, pra
minha surpresa o goleiro simulou um frango a favor do Sérgio” (Diário de Campo em
16/08/2010). Para o aluno que estava de goleiro o resultado competitivo não contava, para a
professora Mariane sim, por isso o “frango” simulado a surpreendeu. O que percebemos são
os códigos (de competição e concorrência) da instituição esportiva presentes na educação
física escolar; Bracht (1999) relata que esses valores se tornaram hegemônicos na pedagogia
da educação física a partir do momento em que o esporte se torna a prática corporal
hegemônica da Educação Física escolar; e até hoje a prática pedagógica da educação física
acontece balizada no paradigma da aptidão física e do esporte.
85 Fala do professor João no Seminário 4 em 22/10/10.
97
Na pesquisa-ação as ações inclusivas propostas nas aulas de educação física sofreram
resistência para sua legitimação por parte dos professores que condicionaram suas práticas
escolares aos códigos do esporte; no entanto, os alunos demonstraram não estar contaminados
aos significados de rendimento e concorrência esportiva. Nesse sentido, apresentamos o
comentário da professora Paula: Aí na hora do recreio dei bola, e os grandes jogando e o
pequeno lá [fez gestos para pedir a bola]. Aí eles incluíram e excluíram ao mesmo tempo,
porque colocaram ele [o pequeno] para jogar, mas a regra era: não podia acertar nele, e cada
um tinha que passar uma vez a bola para ele. Aí ele chegou em casa e disse que a aula de
Educação Física foi maravilhosa, não tinha nada haver comigo, foi no recreio. Mas ele chegou
em casa falando da aula de Educação Física (informação verbal)86.
É notável que os alunos sentem a necessidade de incluir e percebem que as regras de
competição de um jogo (de futebol neste caso) não consideram as diferenças de desempenho
entre os maiores e os menores como um limite, por isso, houve a necessidade de proteger o
pequeno e não acertá-lo com a bola, sendo também necessário lançar a bola para ele pelo
menos uma vez, já que, sua aptidão o coloca em desvantagem, se o jogo fosse pautado nas
regras formais do esporte. Logo, a professora Paula sentiu que o aluno foi excluído, pois as
regras do jogo foram adaptadas para o seu desempenho; este conceito da professora revela a
resistência para destituir-se das regras e normas da instituição esportiva na prática escolar, não
aceitando adequar os padrões esportivos mediante a necessidade do procedimento inclusivo.
Tal conflito expressou esse paradigma entre os professores: destituir-se dos significados da
instituição esportiva para adequar procedimentos na prática escolar que efetivassem uma aula
verdadeiramente inclusiva. Esta situação confere com os apontamentos de Brancht et al.
(2002) sobre a identidade social que os professores de educação física foram levados a
construir na atribuição específica da instituição esportiva, representando mais o papel social
como treinadores e menos como professores ou educadores. Sob a representação social de
educadores inclusivos os professores pertencem ao grupo dos informados, descrito por
Goffman (1988) como as pessoas que se relacionam com a pessoa estigmatizada e
consideram-nas como pessoas comuns. Sob esta orientação os professores, nas relações com o
aluno com deficiência, devem ser os mediadores do processo de reversão do estigma da
deficiência proporcionando ao aluno a aceitação social comum dentro do ambiente escolar.
No entanto, os professores almejavam as respostas dos alunos direcionados ao desempenho
ótimo do treino, caracterizando mais a representação de treinadores e menos de educadores.
86 Fala da professora Paula no Seminário 3 em 17/09/2010.
98
Portanto, estando os professores providos da orientação desportiva a reflexão no
seminário sobre as respostas dos alunos com deficiência gerou sentimentos mistos de
frustração e valorização, tais como na fala da professora Mariane: As crianças estão tendo esta
noção [inclusão], as crianças. Não que a gente esteja atingindo o objetivo nosso, mas o social,
o moral, ta sendo relatado em casa. Aí assim, eu não me senti ferida (informação verbal)87; e
do professor João: Eu mudei a visão, né? Passei a não deixar mais tão de lado, lá no cantinho.
Eu estou tentando colocar ele, é muito difícil, eu programo uma aula, muitas vezes voltado
para ele, e ele vem doente, vem dopado, né? (informação verbal)88.
A professora Mariane compreendeu que a inclusão contemplou o sentido do ensino
moral de aceitação das diferenças na educação física, pois as crianças identificaram o aluno
com deficiência como uma criança comum, mas ela (a professora) pontuou que o objetivo
coletivo da educação física pode não estar sendo atingido. Tal fala evidenciou que este sentido
está atribuído na abordagem de aptidão física e esportiva, tão dominante na prática da
educação física escolar. Já o professor João sentiu dificuldades em enfrentar os desafios do
ensino inclusivo, pois não conseguiu entender que o aluno com deficiência não apresentou
(naquele dia) a habilidade hígida para o de desempenho motor normal esperado no seu
planejamento.
Chicon (2008) aponta que a prática educacional revela que os professores que viveram
a orientação higienista demonstram sinais até os dias atuais de não aceitação do aluno com
deficiência e do aluno não habilidoso. Neste sentido, confirmamos que as expectativas dos
professores de educação física voltadas ao desenvolvimento motor normal, ansiavam que o
aluno com deficiência realizasse condutas de ajustamento social89 para se adaptar e ter a
capacidade de responder com habilidade à prática do esporte na escola, verificamos este
pressuposto com a fala do professor João: To pensando o que eu vou fazer com o Luiz para
ele jogar futebol? (informação verbal)90.
O planejamento do professor visava adaptar o aluno ao ensino do futebol, ou seja, o
professor na interação educacional desejou que o aluno com deficiência realizasse
ajustamento de conduta com relação à sua condição de deficiência, estigmatizando-o. No
entanto, cabe ao professor proporcionar ao aluno estigmatizado oportunizar procedimentos de
ensino adequados a inclusão sem exigir deste aluno qualquer estratégia de ajustamento social
para que se enquadre dentro das expectativas de normalidade. 87 Fala da professora Mariane no Seminário 3 em 17/09/2010. 88 Fala do professor João no Seminário 3em 17/09/201. 89 Os ajustamentos sociais são estratégias que a pessoa estigmatizada é substantivada a utilizar para lidar com a condição de deterioração da sua identidade nas interações sociais (GOFFMAN, 1998). 90 Fala da professora Mariane no Seminário 3 em 17/09/2010.
99
Para Goffman (1988) também cabe ao grupo dos informados a aceitação da pessoa
estigmatizada como uma pessoa comum sem impor a necessidade de ajustamentos. E
entendemos que os professores, como membros do grupo dos informados, não podem impor
que o aluno com deficiência realize condutas de ajustamentos; portanto, os professores podem
lecionar uma aula inclusiva executando procedimentos de adaptação do ensino para o aluno.
Neste artigo já descrevemos tais exemplos inclusivos, quando os alunos adequaram as regras
do jogo sozinhos no recreio, quando o aluno sem deficiência simulou o “frango”; houve
nestas situações uma percepção natural dos alunos para acolher e incluir, portanto, mudar as
regras do jogo tornou-se apropriado e legítimo.
No que tange à reorientação didático-pedagógica desta pesquisa-ação, os professores
conseguiram alcançar aulas inclusivas, pois aconteceu uma concientização dos professores
para o sentido real de inclusão e eles foram reconsiderando suas expectativas que estavam
voltadas ao rendimento esportivo e ao desenvolvimento motor normal, para relacioná-las à
concepção legítima de inclusão escolar. Para tanto, apresentamos os registros da professora
Mariane: Estamos adaptando a educação física (informação verbal)91 e da professora Ivana:
Aí eu vejo o aluno, não posso deixar o aluno lá. (informação verbal)92. E o registro escrito da
professora Ivana: As dificuldades encontradas com o aluno Otávio pelo seu pouco
desenvolvimento motor foi superado e realizou todos os exercícios (Diário de Campo em
17/08/2010).
Os dados demonstram a mudança de conceito por parte dos professores, na
apropriação da educação inclusiva. No entanto, estavam tão balizados pelo desempenho
tradicional, na forma de praticar a educação física escolar direcionada aos códigos esportivos
e ao desenvolvimento motor normal; que viveram um conflito de idéias. O que fazer diante do
despertar da concepção inclusiva, pois, o sistema local e a orientação profissional desportiva
não incentivam a inclusão?
Desta forma, os professores experienciaram um misto de sentimentos entre o
reconhecimento e a desconsideração. E se sentiram desmotivados, pois habitualmente
almejavam resultados padronizados, repostas reconhecidas nos protótipos do esporte e nos
marcos do desenvolvimento motor, entretanto, os alunos com deficiência não apresentavam
atributos em potenciais para tais parâmetros, havia a necessidade de avaliar as potencialidades
do aluno com deficiência para planejar as expectativas de aprendizagem e então conceituar
91 Fala da professora Ivana no Seminário 3 em 17/09/2010. 92 Fala do professor João no Seminário 3 em 17/09/2010.
100
(ou quantificar) o desempenho do aluno. Diante disso, descrevemos a seguir os dados da
pesquisa que se referem à forma de avaliação da educação física no contexto local.
O sistema de avaliação do componente curricular Educação Física da rede
municipal de ensino de Itajaí
A avaliação pedagógica no contexto local era um procedimento padrão implementado
em todas as unidades escolares da rede municipal, que conceituava o desempenho do aluno
em relação a diversas capacidades psicomotoras e era aplicado bimestralmente (sem permitir
a redução da nota ou conceito), não favorecendo a implementação de um processo avaliativo
que atendesse as especificidades dos alunos com deficiência e dos alunos sem deficiência,
assumindo um caráter mais técnico que reflexivo. Este processo de avaliação técnico
subordinou as expectativas dos professores de educação física ao resultado de padrão ótimo, o
que gerou uma discordância de parâmetros avaliativos técnicos que não asseguram a
avaliação do ensino inclusivo, pois na sua essência possui caráter reflexivo.
Para os professores esse conflito entre avaliar os resultados a partir de expectativas
técnicas e atender aos princípios reflexivos da inclusão, denotou um paradigma. Mediante tal
conflito, ressalvamos que os professores sentiram-se frustrados na avaliação dos resultados
inclusivos, como observamos nos seguintes comentários:
Eu consegui o mínimo do mínimo com ele porque eu repeti as aulas (informação
verbal)93.
Eu não sei. Eu to tentando. Tem hora que eu me desmotivo. É que eu não vejo nada na
Carol, nada, nenhuma resposta (informação verbal)94.
Notamos nas falas anteriores que os professores avaliaram o ensino inclusivo sob o
padrão técnico de avaliação do contexto local. Esta forma de avaliação técnica presume que o
resultado bimestral implica o domínio integral dos conhecimentos tematizados durante o
período em questão, não permitindo abordar o domínio dos saberes relativos à inclusão. Desta
forma, os resultados e as respostas das ações inclusivas foram reduzidos e anulados, pois a
avaliação de caráter reflexivo é o procedimento mais adequado para acompanhar o processo
de ensino aprendizagem disposto na inclusão.
93 Fala do professor Rodrigo no Seminário 3 em 17/09/2010. 94 Fala da professora Paula no Seminário 3 em 17/09/2010.
101
Segundo Gramorelli e Neira (2009) a avaliação com enfoque quantitativo estratifica os
alunos em aptos e inaptos, sendo que, tal procedimento leva aos professores a avaliarem
elementos pouco afeitos à função da educação física escolar de promover a apropriação crítica
das práticas corporais, no sentido de reproduzi-las e recriá-las. Mediante este caráter
avaliativo que se fez presente na situação local, ressaltamos que na pesquisa-ação os
professores realizaram as ações inclusivas propostas e planejadas, mas estavam com
dificuldade de legitimar a abordagem inclusiva mediante o enfrentamento dos conceitos de
inclusão em relação aos conceitos tradicionais de aprendizagem e avaliação da educação
física escolar voltada a modalidades esportivas e habilidades motoras normais.
No município de Itajaí a prática pedagógica da educação física escolar foi
condicionada aos jogos escolares, Jogos Recreativos Municipais Escolares (JORME) e Jogos
Escolares de Itajaí (JEI), tanto que o conteúdo administrado nas aulas acompanha a sequência
de apresentação das competições das modalidades esportivas dos jogos municipais. Frente a
essas percepções verificamos no percurso da pesquisa que os professores realizaram as ações
inclusivas reorientadas com sucesso, mas apresentaram dificuldades para internalizar a
concepção de inclusão e afirmar esta abordagem como a orientação legítima da prática
habitual da educação física escolar devido o condicionamento a expressivos resultados
relacionados à competição esportiva. Situação semelhante revelou-se nos estudos de Bracht et
al. (2002), que apresentaram uma proposta com os professores de educação física, de
mudança na prática pedagógica a partir do método da pesquisa-ação e encontrou por parte dos
participantes resistência à mudança para uma prática crítica-reflexiva, devido a influência da
orientação tradicional.
Contudo, destacamos que os professores participantes desta pesquisa realizaram com
vontade o enfrentamento das barreiras para vencerem este desafio de mudança e atuarem na
perspectiva da educação inclusiva na prática da educação física, e mesmo sem o
reconhecimento da gestão local os professores alcançaram com sucesso ações inclusivas nas
suas práticas pedagógicas, como descrevemos a seguir na escrita da professora Fernanda:
“Tirei o Marcos da cadeira para fazer rolamento, ele teve muita dificuldade, fez cara de choro,
fizemos uma vez só e fiquei com medo de estar machucando ele, aí sentamos no tatame e
fizemos alguns abdominais (a monitora ajudou), os outros alunos que também estavam nesta
atividade também fizeram” (Diário de Campo em 07/10/2010).
Neste contexto, também destacamos a prática efetuada pelo professor João: É um jogo
tipo o playbolin, só que como o Luiz tem a movimentação limitada, anda com dificuldade, se
102
ele andar rápido vai se machucar. Então eu vou reduzir o espaço, fazer jogo de passe, usar os
cones (informação verbal)95.
As descrições acima referiram as aulas dos professores realizadas na perspectiva
inclusiva. No dado seguinte verificamos a intervenção do professor e da monitora como
mediadores para evitar o alinhamento intragrupal96 que aconteceu entre o aluno com
deficiência (Pedro) e uma aluna com obesidade (Silvia), segundo as observações da
mestranda: “No circuito as crianças não interagiam com o Pedro o professor orientava:
Estimulem o Pedro no circuito. A monitora falou: Deixa ele Silvia, vai com os outros. Outra
colega pegou na mão do Pedro e andaram um pouco no circuito, depois mais uma e logo
Silvia veio e tirou a colega, pegando na mão dele, aquela que saiu, queixou-se: Ah Silvia, eu
tava ali. A monitora orientou e caminharam os três juntos no circuito.” (Observação Livre em
14/10/2010).
O professor Rodrigo e a monitora intercederam na aula inclusiva para impedir o
alinhamento intragrupal, estimulando os demais alunos a favorecerem o alinhamento
exogrupal. Para Goffman (1988) o alinhamento exogrupal está substantivado pelas relações
habituais que manifestam a aceitação social plena da identidade real da pessoa com
deficiência. Durante a pesquisa-ação priorizamos o alinhamento exogrupal nas aulas
inclusivas de educação física. Adiante ressaltamos que os professores se empenharam nas
ações inclusivas reorientadas, pois tal conteúdo mostrou-se nas seguintes falas dos professores
Rodrigo, Paula e Mariane, respectivamente: Nós estamos revisando isso, na forma como a
gente ta dando a aula (informação verbal)97.
Tu [professor] tem que facilitar para ele [aluno com deficiência] poder participar
(informação verbal)98.
Já ta mais produtivo [a aula inclusiva]. Não que antes não fazia, só que bem leiga,
entendesse? Bem leiga, agora to me fundamentando no que falamos, nos materiais
(informação verbal)99.
A partir das descrições refletimos que a reorientação da ação docente, através da
pesquisa-ação proporcionou novos significados a educação física inclusiva, planejamento
adequado para a aula inclusiva e olhar com caráter de equidade ao aluno com deficiência em
relação ao aluno sem deficiência. Tal reflexão confirma-se nos dados subsequentes, como a 95 Fala do professor João no Seminário 4 em 22/10/2010. 96 A pessoa estigmatizada realiza o alinhamento intragrupal para se ajustar a sociedade. No alinhamento intragrupal o indivíduo estigmatizado relaciona-se com seus semelhantes (GOFFMAN 1988). A aluna Silvia estigmatizada devido a obesidade procurava se relacionar continuamente com o aluno Pedro, já que ele é um aluno com deficiência e não pertence ao grupo social dominante [os normais]. 97 Fala do professor Rodrigo no Seminário 3 em 17/09/2010. 98 Fala da professora Paula no Seminário 3 em 17/09/2010. 99 Fala da professora Mariane no Seminário 3 em 17/09/2010.
103
escrita da professora Ivana: “Bom, pra mim valeu a pena o que consegui com este grupo, pois
muito tempo fiquei sozinha, sem apoio administrativo, hoje estão me ouvindo mais, quanto
minhas dificuldades e minhas angústias, como profissional que acredito que sou” (Diário de
campo em 28/10/2010).
E também na fala: E assim, eu aprendi muito aqui, foi bom me ajudou com o meu
artigo, e eu vi com outros olhos os meus alunos também, sabe?... Então, tem que ser
trabalhado, eu primeiro, eu tenho que estar aberta, preparada, porque todo dia é diferente e o
resultado? Às vezes eu nem tenho, mas vamos! (informação verbal)100.
A professora Ivana relatou em seu diário de campo o quanto o grupo da pesquisa-ação
a auxiliou retificando seu sentimento de isolamento; Cruz (2003); referiu em seu estudo que a
mudança na prática pedagógica da educação física a partir da pesquisa-ação denotou com
significância este aspecto, e os professores não se sentiram mais sozinhos, encorajando-se
para dar o primeiro passo e enfrentar as angústias decorrentes das interações sociais e
profissionais. Diante disso, anunciamos no próximo comentário, que na reunião de grupo
focal o professor Rodrigo demonstrou perspectiva de continuidade da reorientação didático
pedagógica que vivemos na pesquisa-ação: O grupo me auxiliou para reavaliar a prática
pedagógica e a reconstruir o planejamento para o próximo ano. Ajudou a melhorar e criar
meios de desenvolver aulas inclusivas. Segundo o grande grupo, a inclusão deve ser um
processo amplo em que eu possa transformar promovendo uma aceitação e valorizando as
diferenças (informação verbal)101.
Também registramos a fala da professora Paula a esse respeito:
“Um novo olhar para a inclusão, um novo pensar para o diferente. Saber que cada dia
é um novo desafio e temos que enfrentá-lo. Não desanimar, pois quase ou nunca alcançamos
nossos objetivos. Fazer com que a criança se sinta bem, e fazer com que ela entenda que sua
deficiência apenas o limita em alguns aspectos. Temos que ter o cuidado e respeitar o ser
diferente” (informação verbal)102.
Por fim, trazemos a fala do Professor João com relação à contribuição para a sua
formação profissional do fato de ter participado da pesquisa-ação, através do escrito:
“Conquistas: a minha mudança de pensamento sobre a deficiência. A forma de planejar a
aula, pensando em como e quão inumeráveis são os problemas e a forma que esses alunos
enfrentam... Podem ser minimizadas através de uma aula bem planejada e executada” (Diário
de Campo em 22/10/2010). 100 Fala da professora Ivana no Seminário 5 em 29/10/2010. 101 Fala do professor Rodrigo no Grupo Focal em 19/11/2010. 102 Fala da professora Paula no Grupo Focal em 19/11/2010.
104
Como falaram os professores: as conquistas da pesquisa-ação atingiram a consciência
com relação ao aluno com deficiência e o planejamento da prática pedagógica da aula
inclusiva. Entretanto, dotados de resultados de desempenho esportivo, eles permaneceram
com a dificuldade de avaliar as potencialidades e as respostas dos alunos com deficiência,
pois comparam o resultado da inclusão ao rendimento tradicional atribuindo nesta relação o
mínimo ou a falta de resultados. Segundo Rechineli, Porto e Moreira, (2008), a educação
física com critérios nos princípios da diversidade possibilita ao professor trabalhar as
diferenças dos alunos com deficiência no sentido de re-significá-las e respeitá-las, não
devendo mais possibilitar a aprendizagem do movimento no privilégio de conteúdos
esportivos e na realização de exercícios tradicionais. Para afirmar esta reflexão apresentamos
as falas seguintes que sugerem o privilégio do esporte e a dificuldade de validar o resultado da
prática inclusiva: Na inclusão a visão é ampla e o resultado é uma incógnita! (informação
verbal)103.
Os códigos da instituição esportiva balizaram a educação física escolar como condição
de conteúdo referencial e como parâmetro para a avaliação do aluno, desta forma, os
professores experienciaram o paradigma da dicotomia entre a fundamentação do ensino
inclusivo de respeitar as individualidades e as potencialidades do alunado e os códigos do
esporte. Diante disso, compreendemos que os professores realizaram a reorientação das
práticas inclusivas com sucesso, mas não sabemos se o estado de reconhecimento da
concepção inclusiva permanecerá na docência. Destacamos que não houve suporte para a
aceitação da inclusão de forma verdadeira e integral na educação física escolar por parte do
conteúdo tradicional esportivo e do sistema de avaliação local do componente curricular
Educação Física da rede municipal de ensino de Itajaí, pois conceituou com caráter técnico a
avaliação do aluno (sem permitir o decréscimo do conceito ou da nota a cada bimestre).
Considerações Finais
Os dados revelaram a sensibilização do professor sobre a prática pedagógica inclusiva
na educação física escolar. Destacamos que houve um processo de reflexão e ação
103 Fala da professora Mariane no Grupo Focal em 29/11/2010.
105
significativo por parte dos professores que começaram a mudar aspectos de sua prática com
inserções de procedimentos para inclusão do aluno com deficiência nas aulas de educação
física, porém não sabemos dimensionar se as conquistas garantem a legitimação da concepção
inclusiva na permanência em definitivo na prática docente dos professores.
Diante disso, verificamos que a prática da educação física escolar aconteceu
subordinada e focada nas normas institucionais locais e não nos alunos e suas diversas
realidades de cultura do corpo e movimento. O sistema educacional local não ofereceu
formação continuada na perspectiva da inclusão para os professores, além da carência na
infra-estrutura nas escolas para as adaptações razoáveis na forma de tecnologia assistiva à
inclusão. O sistema de gestão não orientou a prática da educação física escolar para o ensino
inclusivo, pois o sistema educacional foi pautado nas normas da instituição esportiva
(condicionados pelo JEI e JORME), referências que pouco proporcionam ou mesmo recusam
a prática da inclusão na escola.
Quanto ao estigma do aluno com deficiência, não encontramos ações coletivas mútuas
dispostas a proporcionar a reversão desta condição, pois os professores trabalharam sozinhos
na reorientação da educação física escolar, na perspectiva da inclusão, sem o reconhecimento
e o apoio da gestão local.
Neste sentido, as expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar estavam
voltadas ao rendimento esportivo e ao desenvolvimento motor normal, pois na prática docente
eles não reconheceram as diversas respostas dos alunos com deficiência alegando não haver
resultados ou haver resultados mínimos na inclusão. Essa visão foi reforçada pelo sistema
local que apresentou uma avaliação de natureza técnica de forma a avaliar o aluno a partir de
diversas capacidades motoras ou psicomotoras a cada bimestre letivo (sem permitir o
decréscimo da nota ou conceito) e sem avaliar de forma reflexiva a aprendizagem.
Com relação à formação inicial dos professores identificamos a influência do modelo
esportivo e da pedagogia tradicional que não implicou em propostas inclusivas para orientar
os procedimentos inclusivos no processo ensino-aprendizagem; balizando a educação física
escolar aos códigos da instituição esportiva e sem proporcionar a formação pedagógica
adequada para a atuação dos professores com bases científicas sob as condições das diferentes
deficiências dos alunos.
Apontamos à necessidade e possibilidade de novas pesquisas sociais para subsidiar o
desenvolvimento local do município de Itajaí, concentradas no sistema de avaliação local do
componente curricular educação física, na gestão do trabalho na área da educação escolar
inclusiva e na reversão do estigma do aluno com deficiência. E finalmente consideramos e
106
compreendemos que as ações e respostas dos professores estavam sujeitas ao conhecimento
da sua formação inicial e da formação em serviço, e à sistemática local de trabalho, estes por
sua vez, estavam distantes de viabilizar condições para a afirmação do ensino inclusivo na
prática didático-pedagógica da educação física e apresentaram-se sem expressividade para
realizar a reversão do estigma do aluno com deficiência no ambiente escolar, contudo os
professores se sensibilizaram da importância de trabalhar na perspectiva da educação
inclusiva e iniciaram um processo de reorientação das suas práticas didático-pedagógicas.
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109
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa-ação contribuiu com a oportunidade de experimentar a inclusão para os
sujeitos participantes. Durante o período de realização da pesquisa aconteceu à sensibilização
dos professores para uma percepção de prática educacional com ações inclusivas, o
levantamento da consciência foi despertando pouco a pouco a concepção de inclusão na
docência.
A pesquisa partiu do ponto de prática docente sem nenhuma relevância de inclusão e
houve um processo de reflexão e ação significativo por parte dos professores que começaram
a mudar aspectos de sua prática com inserções de procedimentos para inclusão do aluno com
deficiência nas aulas de educação física, porém não sabemos dimensionar se as conquistas
garantem a legitimação da concepção inclusiva na permanência em definitivo na prática
docente dos professores de educação física.
Os dados revelaram a sensibilização dos professores sobre a representação do aluno
com deficiência, eles passaram a reconhecer o aluno com deficiência com um novo olhar,
significando na representação da identidade social virtual deste aluno novas atribuições
relacionadas à identidade real pessoal. A família, os alunos sem deficiência e parte das escolas
envolvidas também viveram esta nova percepção, o que revela um início de aprendizado
social para a inclusão.
Quanto ao estigma do aluno com deficiência, não encontramos ações coletivas mútuas
dispostas a proporcionar a reversão desta condição, pois os professores trabalharam sozinhos
na reorientação da educação física escolar, na perspectiva da inclusão, sem o reconhecimento
e o apoio da gestão local.
Além disso, verificamos que a prática da educação física escolar aconteceu
subordinada e focada nas normas institucionais locais e não nos alunos e suas diversas
realidades de cultura do corpo e do movimento, sendo que, o sistema educacional local não
ofereceu formação continuada na perspectiva da inclusão para os professores. E ainda,
podemos apontar a carência na infra-estrutura das escolas para as adaptações razoáveis na
forma de tecnologia assistiva à inclusão, e um sistema de gestão que não orientou a prática da
educação física escolar para o ensino inclusivo. Pois, o sistema educacional estava (e ainda
está até o final desta pesquisa) pautado nos códigos da instituição esportiva (condicionados
pelo JEI e JORME), referências que pouco proporcionam ou mesmo recusam a prática da
inclusão na escola.
110
Neste sentido, as expectativas dos professores relacionadas à inclusão escolar estavam
voltadas ao rendimento esportivo e ao desenvolvimento motor normal, pois na prática docente
eles não reconheceram as diversas respostas dos alunos com deficiência alegando não haver
resultados ou haver resultados mínimos na inclusão. Essa visão foi reforçada pelo sistema
local que apresentou uma avaliação de natureza técnica de forma a avaliar o aluno a partir de
diversas capacidades motoras ou psicomotoras a cada bimestre letivo (sem permitir o
decréscimo da nota ou conceito) e sem avaliar de forma reflexiva a aprendizagem.
Com relação à formação inicial dos professores identificamos a influência do modelo
esportivo e da pedagogia tradicional que não implicou em propostas inclusivas para orientar
os procedimentos inclusivos no processo ensino-aprendizagem; balizando a educação física
escolar aos códigos da instituição esportiva e sem proporcionar a formação pedagógica
adequada para a atuação dos professores com bases científicas sob as condições das diferentes
deficiências dos alunos.
Considerando os dados expostos, registramos algumas reflexões em forma de
questionamentos para colaborar com o contexto situacional do município de Itajaí em
particular na gestão educacional do componente curricular educação física. Pode-se implantar
a função de supervisor pedagógico da educação física para orientar a educação física escolar
mediante as necessidades das práticas didático-pedagógicas de cada escola? O Departamento
de Desporto Escolar pode realizar algum evento social incentivando as unidades escolares e a
comunidade a promoverem jogos inclusivos participativos (não competitivos)? A direção e
supervisão escolar podem auxiliar para colaborar ou criar temas geradores de cooperação e
interdisciplinaridade nos conteúdos dos anos iniciais e finais do ensino fundamental? A gestão
educacional municipal pode oferecer formação continuada na perspectiva da inclusão para os
professores de forma a capacitá-los na reflexão-ação? A gestão educacional municipal pode
proporcionar adaptações razoáveis para a PcD sob a orientação do terapeuta ocupacional?
Com base nestes questionamentos apontamos possibilidades de novas pesquisas e
estudos para subsidiar o desenvolvimento local do município de Itajaí, concentradas no
sistema de avaliação local do componente curricular educação física, na gestão do trabalho na
área da educação inclusiva, no aspecto interdisciplinar com integração entre as áreas de
educação e saúde para auxiliar a complexidade de atendimento requerida às turmas que têm
alunos com deficiência, na reversão do estigma do aluno com deficiência e na disponibilidade
e oferta de formação continuada na perspectiva da inclusão para os professores com ênfase na
pesquisa social.
111
Gostaria de registrar minha reflexão particular de extrema satisfação por ter
experienciado esta pesquisa-ação ao lado dos professores de educação física, meus estimados
colegas servidores no município de Itajaí, ressaltando o grande valor desta experiência para a
minha atuação profissional, e de forma indissociável, para o meu crescimento pessoal.
E, com relação à atribuição desta pesquisa-ação como forma de integração
interdisciplinar entre a fisioterapia escolar e a educação física enfatizamos a contribuição de
tamanho engrandecimento para a saúde na perspectiva social que considera a importância dos
determinantes do processo saúde doença além das barreiras do consultório. Desta forma, ter
contribuído com a reorientação didático-pedagógica dos professores envolvidos neste
trabalho, e acompanhá-los na oferta de oportunidades à prática de atividades corporais para as
crianças com deficiência dentro da escola, foi de grande relevância para o aspecto saúde e
educação destes menores. E ainda, considerando os dados do campo da saúde coletiva nos
deparamos com um grande número de crianças e adolescentes sedentárias, sendo que, nesta
mesma condição estão as crianças com deficiência. Tal situação clínica verifica-se nos
estudos epidemiológicos clássicos, e mediante estes estudos esta pesquisa delimitou a
epidemiologia crítica social104 para investigar e contribuir com o objeto de trabalho.
Considerando nossa pergunta desencadeadora do estudo, destacamos que a estratégia
da pesquisa-ação como contribuição para a reconstrução das práticas pedagógicas dos
professores de Educação Física na perspectiva da inclusão escolar, demonstrou-se uma forma
profícua para capacitar os professores na reflexão ação, compreendendo que o processo de
reorientação esteve sujeito a própria atitude dos professores envolvidos e, de forma
indissociável, ao contexto local e social da função da educação física escolar, desta forma,
entendemos haver alcances e limites nos resultados deste estudo.
Finalmente considerando nosso objeto de estudo: a reorientação didático-pedagógica
da educação física escolar na perspectiva da inclusão compreendemos que as ações e
respostas dos professores estavam sujeitas ao conhecimento da sua formação inicial e da
formação em serviço, e à sistemática local de trabalho, estes por sua vez, estavam distantes de
viabilizar condições para a afirmação do ensino inclusivo na prática didático-pedagógica da
educação física e apresentaram-se sem expressividade para realizar a reversão do estigma do
aluno com deficiência no ambiente escolar, contudo os professores se sensibilizaram da
importância de trabalhar na perspectiva da educação inclusiva e iniciaram um processo de
reorientação das suas práticas didático-pedagógicas. 104 A escolha da epidemiologia crítica social se refletiu durante o processo de formação adquirido no Programa de Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho da UNIVALI.
112
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APÊNDICES
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APÊNDICE A – Instrumento de coleta de dados da pesquisa
ROTEIRO PARA OBSERVAÇÃO LIVRE
Delimitamos observar nas aulas de educação física inclusivas dos participantes:
• As estratégias didático-metodológicas do professor para promover a inclusão;
• A participação dos alunos na proposição de atividades;
• A apropriação da aplicação de conhecimentos sobre as deficiências.
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APÊNDICE B – Instrumento de coleta de dados da pesquisa
ROTEIRO PARA OFICINA
Dados de identificação:
Nome:__________________________________________________________
Idade:___________________ Sexo:___________________________
Unidade escolar:__________________________________________________
1. Qual foi o ano da sua graduação?
2. Qual o seu nível de formação acadêmica?
3. Você participa de formações continuadas? Conte sua trajetória.
4. Já atuou na área esportiva? Quando e como foi?
5. Que outras atividades profissionais você desenvolve além da atuação na escola?
Descreva a relação entre elas.
6. Há quanto tempo atua na área da educação física escolar?
7. Quando foi a sua primeira experiência com aluno com deficiência na escola regular?
Relate o processo de desenvolvimento da sua experiência docente com alunos
deficientes.
8. O que você entende por inclusão escolar?
9. Quais as estratégias que você prioriza para incluir os alunos deficientes durante a aula?
10. Onde você obteve esses conhecimentos?
11. Na sua experiência atual conte-nos o que você considera como possibilidades e limites
enfrentados no cotidiano escolar na inclusão de alunos com deficiência.
12. Você poderia sugerir aspectos de seu interesse sobre a inclusão escolar para serem
abordados numa formação continuada?
13. Há outra informação que você considera importante comentar?
Adotamos este roteiro no momento inicial da técnica de oficina para conhecer a biografia de
cada professor participante.
121
APÊNDICE C – Instrumento de coleta de dados da pesquisa
ROTEIRO PARA A REUNIÃO DE GRUPO FOCAL
O roteiro para o grupo focal foi delimitado no conceito de estigma e das representações
sobre a pessoa com deficiência. Norteados por este marco buscamos abordar a contribuição da
pesquisa na representação do professor sobre o aluno com deficiência e enfrentar as
problemáticas do cotidiano escolar em relação à educação física inclusiva.
1. O que é inclusão?
2. Como é a prática da educação física inclusiva?
3. Como a pesquisa contribuiu para reorientar a prática inclusiva?
4. Qual a contribuição da pesquisa na representação do professor sobre o aluno com
deficiência?
5. Quais são as perspectivas das ações reorientadas para a continuidade na prática docente?
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APÊNDICE D – Instrumento de coleta de dados da pesquisa
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
Você está sendo convidado (a) para participar, como voluntário, em uma pesquisa. Após ser esclarecido (a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa você não será penalizado (a) de forma alguma. A pesquisa apresenta como título: Reorientação didático-pedagógica da Educação Física na perspectiva da Inclusão Escolar.
Tem como objetivo geral: Orientar o processo de reconstrução das práticas
pedagógicas do Educador Físico na implantação da Educação Física Inclusiva. Você participará diretamente da pesquisa em três momentos distintos:
Inicialmente participando nos encontros coletivos/reuniões de um grupo composto por professores de educação física. Em seguida, realizando um diário (relatório escrito), dos aspectos que você considerar importantes sobre a sua aula inclusiva. E realizando as ações de reorientação das práticas inclusivas nas suas aulas de educação física, conforme o planejamento de todos do grupo.
Esclarecemos que as informações obtidas nesse estudo servirão apenas para
execução de uma pesquisa científica tendo em vista que seus dados serão mantidos em total sigilo e serão respeitados os seguintes princípios éticos: esclarecimento de todos os pontos da pesquisa para os participantes; garantia da privacidade, do anonimato dos participantes do estudo e sigilo das informações que não desejem ser divulgadas; desenvolvimento de procedimentos que assegurem a confidencialidade e a privacidade; garantia aos participantes do estudo para permanecerem ou retirar-se da pesquisa a qualquer momento, sem que isso lhes ocasione prejuízos; respeito aos valores culturais, religiosos, sociais, morais e éticos, bem como os hábitos e costumes das pessoas envolvidas; e garantia da devolução dos dados ao término da pesquisa.
Eu, ___________________________________________________, concordo em participar deste estudo permitindo ( ) gravação, ( ) fotografia, ( ) filmagem, ( )nenhum dos itens; desde que sejam respeitados os aspectos éticos citados.
Desde já agradecemos sua valiosa colaboração para o desenvolvimento deste
estudo. CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DO SUJEITO
Eu, _________________________________________________, RG _______________, CPF ______________________, abaixo assinado, concordo em participar do presente estudo como sujeito. Fui devidamente informado e esclarecido sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha
123
participação. Foi-me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto leve à qualquer penalidade ou interrupção de meu acompanhamento/assistência/tratamento. Local e data: _______________________________________________________ Nome: ____________________________________________________________ Assinatura do Sujeito ou Responsável: ___________________________________ Telefone para contato:________________________________________________
Pesquisador: SANTIAGO PICH
Assinatura:____________________________________
Telefone para contato: (48) 96118415
Pesquisador: GISELE CRISTINA DE SOUZA
Assinatura:____________________________________
Telefone para contato: (47) 84181470 E (47) 33411739
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APÊNDICE E – Instrumento de coleta de dados da pesquisa
SÍNTESE DA TÉCNICA DE OFICINA
DIFICULDADES LIMITES ALCANCES DESAFIOS Quantidade grande de alunos por turma;
Comprometimento de toda a escola com a turma que possui aluno com deficiência;
Parada pedagógica/Conselho de Classe: apropriação sobre a inclusão e a deficiência;
Estudo de Caso: profissionais e família;
Formação inicial e contínua do professor (pouco aborda a inclusão);
Comunidade e a valorização do professor;
Ficha com o histórico de vida da criança;
Registro sobre o histórico pedagógico;
Contato pouco presente da família na escola;
Apropriação da Inclusão no Projeto Político-pedagógico;
Capacitação não adequada da família;
Capacitação não adequada do monitor;
Pouca apropriação do conhecimento sobre a deficiência por parte da família, monitor e professores;
Ambiente físico: quadra descoberta, buracos, goteiras, acesso sem proteção do tempo, entulhos na quadra.
Sistema de avaliação; Pouca interação da turma de forma inclusiva: comportamento inadequado e Bullying;
Falta de materiais adaptados;
Dividir a quadra com mais de uma turma: espaço pequeno.
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PLANEJAMENTO e REALIZAÇÃO:
• AÇÕES COLETIVAS: baseados nos problemas coletivos denunciados nas
dificuldades (acima descritas) construímos ações coletivas às turmas que possuíam
alunos com deficiência: Parada pedagógica/Conselho de Classe; Ficha com o histórico
de vida da criança; Registro sobre o histórico Pedagógico; Estudo de Caso; Estudo do
Projeto Político-pedagógico e Parcerias Interdisciplinares.
• AÇÕES INDIVIDUAIS OU AÇÕES ESPECÍFICAS: baseados nos problemas
individuais presentes de forma específica em cada truma que tinha alunos com
deficiência construímos ações didático-pedagógicas inclusivas nas aulas de educação
física.
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APÊNDICE F – Instrumento de análise de dados da pesquisa
GRELHA DA PRÉ-ANÁLISE DO CONTEÚDO - SEGUNDO BARDIN (2004)
HIPÓTESES OBJETIVOS
H1 A carência da concepção de inclusão na formação inicial e continuada leva a insuficiência da abordagem inclusiva no planejamento das aulas;
Identificar a contribuição do processo de formação continuada no sentido de suprir a carência da formação inicial e permanente na perspectiva da inclusão.
H2 A falta do posicionamento da rede municipal na formação em serviço sobre o tema inclusão proporciona uma multiplicidade do entendimento deste conceito, o que induz o professor a construir estratégias inclusivas baseadas na identidade do professor e na necessidade local;
Estabelecer um referencial teórico para a definição da concepção de educação inclusiva para auxilio da construção da prática docente.
H3 As expectativas universais do processo de ensino aprendizagem dificultam o entendimento do professor às respostas diversificadas que os alunos apresentam;
Compreender a diversidade do potencial do alunado no processo ensino-aprendizagem.
H4 Nas aulas de educação física os professores mantêm expectativas de resultado padrão restritos no rendimento esportivo e no desenvolvimento motor normal, o que dificulta o entendimento dos avanços dos alunos no sentido da educação inclusiva;
Reorientar a didática de ensinos nas aulas de educação física no entendimento da educação inclusiva.
H4a No sistema didático-pedagógico do município a legitimidade da educação física escolar é reforçada na proposta do esporte, o que aponta a educação física inclusiva como uma proposta alternativa;
H5 A falta de conhecimento científico sobre as deficiências impossibilita ou dificulta o entendimento do professor para orientar a ação docente de maneira adequada aos limites e potencialidades do aluno com deficiência.
Apresentar/estudar o conteúdo referencial sobre a pessoa com deficiência.
H6 A formação inicial e continuada do professor sugere que ele considere as respostas do aluno dentro de regras e expectativas de normalidade, o que leva a um estado de surpresa quando os alunos têm reações voluntárias e positivas de inclusão;
Compreender o sentido da prática dialética e cooperativa de lecionar sob a concepção da educação inclusiva.
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ANEXO
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ANEXO A – Parecer do comitê de ética
Parecer: 178/10 - Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Vale do Itajaí,
25/06/2011
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