revisional - teoria

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  AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS Cont  Sérgio Gilberto Porto Doutor em Direito pela PUC-RS Professor Titular de Direito Processual Civil da PU Ex Procurador-Gera Memb  SUMÁRIO:  1. Considerações preliminares. 2. As demandas e suas cargas de eficácia. 3. Propósito e conseqüências da perfeita compreensão das eficácias. 4. Ação de revisão da obrigação alimentar. 4.1 Ação modificativa. 4.2. Ação exonerativa. 5. Questões  processualm ente consideráveis nas ações de revisão. 5.1. Conteúdo das sentenças revision tempo  1. Consideraçõe   Não é possível enfrentar qualquer espécie de demanda, sem antes compreender, exatamente, seu propósito. Nesta linha, vale destacar que as não são definidas por eventual no o, mas sim se definem pelo conteúdo que contemplam ou, mais precisamente, são identificadas a partir de seu núcleo e conhecendo-se este, naturalmente, será id com importa qu processualmente a eúdo e eficácia temporal das sentenças 1  C-RS l de Justiça do RS ro do Instituto Brasileiro de Direito Processual Advogado. ais. 5.2. O instituto da Coisa julgada em matéria alimentar. 5.3. Limites rais da coisa julgada. s preliminares ações mem iuris que venham receber no batism entificado seu propósito e potencialidade.  Neste passo, cumpre esclarecer que o c onteúdo das demandas é defin ido a partir da  posição d as cargas de eficácias das sentenças potencialmente de procedência , daí sob remodo nte conhecer e dominar as possíveis cargas de eficácias das sentenças de procedência, eis e ferramenta indispensável ao operador, pena de não ser factível concretizar 1  O presente ensaio assemelha- se àquele por nós apresenta do na obra Tendências constitucionai s no Direito de Família, Livraria do Ad Contudo, aqui, mais do ente vogado, POA, 2003, intitulado Constituição e processo nas ações de revisão de alimentos . que lá, acentua-se o debate da ampliação dos limites da coisa julgada que, segundo ndemos, vão para além dos objetivos e subjetivos corriqueira mente apontados pela doutrina, haja vista

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AO REVISIONAL DE ALIMENTOSContedo e eficcia temporal das sentenas 1

Srgio Gilberto Porto Doutor em Direito pela PUC-RS Professor Titular de Direito Processual Civil da PUC-RS Ex Procurador-Geral de Justia do RS Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual Advogado.

SUMRIO: 1. Consideraes preliminares. 2. As demandas e suas cargas de eficcia. 3. Propsito e conseqncias da perfeita compreenso das eficcias. 4. Ao de reviso da obrigao alimentar. 4.1 Ao modificativa. 4.2. Ao exonerativa. 5. Questes processualmente considerveis nas aes de reviso. 5.1. Contedo das sentenas revisionais. 5.2. O instituto da Coisa julgada em matria alimentar. 5.3. Limites temporais da coisa julgada.

1. Consideraes preliminares

No possvel enfrentar qualquer espcie de demanda, sem antes compreender, exatamente, seu propsito. Nesta linha, vale destacar que as aes no so definidas por eventual nomem iuris que venham receber no batismo, mas sim se definem pelo contedo que contemplam ou, mais precisamente, so identificadas a partir de seu ncleo e conhecendo-se este, naturalmente, ser identificado seu propsito e potencialidade.

Neste passo, cumpre esclarecer que o contedo das demandas definido a partir da composio das cargas de eficcias das sentenas potencialmente de procedncia, da sobremodo importante conhecer e dominar as possveis cargas de eficcias das sentenas de procedncia, eis que ferramenta indispensvel ao operador, pena de no ser factvel concretizar processualmente a1

O presente ensaio assemelha-se quele por ns apresentado na obra Tendncias constitucionais no Direito de Famlia, Livraria do Advogado, POA, 2003, intitulado Constituio e processo nas aes de reviso de alimentos. Contudo, aqui, mais do que l, acentua-se o debate da ampliao dos limites da coisa julgada que, segundo entendemos, vo para alm dos objetivos e subjetivos corriqueiramente apontados pela doutrina, haja vista

necessidade imposta pela realidade, mxime em sede alimentar quando se pretende revisar encargo anteriormente fixado, vez que tal idia encontra-se jungida, justamente, aos contedos das demandas modificativas ou exonerativas do encargo alimentar.

Afora o imprescindvel domnio da composio das cargas de eficcia das sentenas, hodiernamente a processualstica contempornea tambm tem se preocupado com os limites eficacias das sentenas e, ainda, mais recentemente, com um novo limite. Assim, ao lado dos clssicos limites subjetivos que dizem respeito a quem est sujeito aos efeitos do resultado da demanda e dos limites objetivos que definem o qu, na deciso, adquire eficcia, h, segundo autorizada doutrina, limites temporais na eficcia da sentena.

Ocorre que a sentena faz coisa julgada nas relaes jurdicas continuativas durante e enquanto persiste a mesma situao ftica do momento da deciso, de modo que a alterao substancial no suporte ftico da sentena importa na possvel alterao da eficcia jurdica do decisum.

Esta realidade opera com muito clareza nas demandas de alimentos, vez que a obrigao alimentar estabelecida numa equao entre a necessidade do alimentado e as possibilidades do alimentante, em determinado momento histrico. Enquanto estiver ntegra esta situao no h que se falar em modificao do quantum devido. Soluo diversa ser tomada, contudo, quando houver alterao em uma das variantes do binmio necessidade/possibilidade.

Neste estudo pretender-se- apresentar algumas consideraes sobre as demandas revisionais de alimentos, discorrendo sobre as suas espcies, contedo e adequando-as aos limites temporais da eficcia da sentena.

2. As demandas e suas cargas de eficcia.

identificarmos tambm limites temporais nas decises jurisdicionais e, mais especificamente, nas demandas revisionais.

A doutrina brasileira sempre inclinou-se, tradicionalmente, por classificar as aes e, por decorrncia, as sentenas, em declaratrias, constitutivas e condenatrias 2 . Tal orientao est, indubitavelmente, vinculada construo germnica do XIX, especialmente em ADOLF WACH 3 que se destaca como um dos corifeus desta linha de pensamento.

Significa isto que, em ultima ratio, a doutrina clssica nacional identifica como nicos caminhos a serem seguidos, para a satisfao de pretenses deduzidas, a via declaratria, a constitutiva e a condenatria.

Assim, deve ser compreendido que na demanda de natureza declaratria, ordinariamente, busca-se a declarao da existncia ou inexistncia de determinada relao jurdica ou, ainda, a declarao em torno da autenticidade ou falsidade de certo documento (art. 4, do CPC); busca-se, enfim, a certeza onde h incerteza. exemplo tpico a ao de investigao de paternidade, haja vista a eficcia de declarao da paternidade do investigando 4 .

Na ao de natureza constitutiva, busca o autor a criao, extino ou modificao de uma relao jurdica. Esta ao pode ter cunho positivo ou negativo. positivo quando cria uma nova relao jurdica a partir da sentena, e negativo quando, atravs da sentena, extinta a relao jurdica pr-existente. Esta ltima tambm chamada, por parte da doutrina, de desconstitutiva ou constitutiva-negativa. exemplo tpico a ao de divrcio, pois nela se extinguir a relao jurdica matrimonial que nasceu com o casamento.

Na ao de natureza condenatria pretende o autor impor uma sano ao demandado. So exemplos clssicos as aes de indenizao em geral, nas quais, a partir da sentena, est o ru obrigado a reparar eventual prejuzo causado, e nessa obrigao de reparar identificada a sano imposta.V.g. MOACIR AMARAL SANTOS. Primeiras linhas de Direito Processual Civil. Saraiva, 1977, 1 v. pgs. 147 e ss.; JOS FREDERICO MARQUES. Manual de Direito Processual Civil, Saraiva, 1975, 1 v., p. 164; HUMBERTO THEODORO JNIOR. Curso de Direito Processual Civil, Forense, 1986, pgs. 63/4; VICENTE GRECO FILHO. Direito Processual Civil Brasileiro, Saraiva, 1987, p. 85. 3 Handbuch des deutschen Zivilprozerrechts, 1885, apud Teoria da Aes em Pontes de Miranda, CLVIS DO COUTO E SILVA, in Ajuris 43/69. 4 Merecem especial meditao a ADIN e a ADC que, embora declaratrias, no se emolduram exatamente no contexto descrito.2

A presente orientao gozou de trnsito fcil e, qui, exclusivo na doutrina brasileira durante algum tempo, at que PONTES DE MIRANDA, questionando a limitao de tal classificao, lanou as bases da chamada teoria quinria em torno da classificao das aes quanto s suas cargas de eficcia.

A teoria quinria sustenta, em sntese, que, alm das aes tradicionalmente reconhecidas, outras duas devem ser acrescidas classificao, quais sejam: as mandamentais e as executivas lato sensu, portanto existiriam cinco espcie de aes e no apenas trs 5 .

Quanto ao mandamental, mais uma vez, o festejado mestre, buscando inspirao no direito alemo 6 , demonstra a existncia de uma ao cujo objeto primordial uma ordem do juzo para que algum ou algum rgo faa ou deixe de fazer alguma coisa, pois esse o sentido da pretenso deduzida. Constitui exemplo de ao mandamental a demanda cuja finalidade seja a de retificar um registro pblico, exatamente porque aquilo que mais pretende o autor que o juzo ordene que o oficial de registro pblico proceda, no registro, a modificao desejada.

A ao executiva lato sensu, de sua parte, representa a possibilidade de que aes integrantes do processo de conhecimento tragam em si embutidas capacidade executria. Quer isso dizer que existe um determinado tipo de demanda na qual o juzo, ao reconhecer a procedncia da postulao, determina, desde logo e independentemente de qualquer outra providncia por parte do autor, a entrega do bem da vida 7 que objeto da lide. Note-se que nas aes em geral, por regra, embora condenado o ru, o bem da vida somente ser outorgado ao autor se este tomar novas iniciativas. Assim, por exemplo, na ao de indenizao, muito embora condenado o ru a indenizar, nada acontecer no mundo ftico se o autor no tomar a iniciativa de liquidar a obrigao e, posteriormente, a executar. Somente aps as referidas iniciativas (liquidao e execuo) que receber o autor o bem pretendido (indenizao), vale dizer: o recebimento deste, por parte do autor, est condicionado a novas iniciativas suas, embora a

5 6

V. in Tratado das Aes, RT, 1979. GEORG KUTTNER, in Die Urteilwirkugem ausserhalb des Zivilprozesses e JAMES GOLDSCHIMIDT in Der Prozess als rechstlage,Idem nota 20. 7 Conceito consagradamente destacado por CHIOVENDA ao longo de sua obra.

deciso anterior j lhe tenha reconhecido o direito que alega. Entretanto, h aes em que o juzo, como j dito, ao reconhecer a procedncia da alegao feita pelo autor, lhe deferir o objeto pretendido, provocando alteraes na esfera jurdica do demandado, independentemente de outras iniciativas. Constitui exemplo de demanda dessa natureza a ao de despejo, pois, no momento em que alegada por exemplo, determinada infrao contratual e o juzo a reconhece como existente, resolve, a um s tempo, o contrato, e determina a desocupao do imvel, provocando, portanto, uma alterao por decorrncia da sentena, sem que tenha o autor de se socorrer de nova providncia. E isso somente possvel em razo da capacidade executria que est embutida na sentena. Recentemente, OVDIO BAPTISTA DA SILVA 8 , adepto inquestionvel da classificao quinria de PONTES DE MIRANDA, abre certo dissenso, relativamente a esta orientao, para excluir as aes mandamentais e executivas, lato sensu, do processo de conhecimento e inclu-las no processo de execuo.

Muito embora tal dissidncia em torno da natureza do processo em que estas demandas integram, a verdade que, no que diz respeito a seu contedo esta circunstncia no provoca qualquer invalidade, justamente, por que, antes de mais nada, reconhecido seu

contedo eficacial ou, mais precisamente, a existncia , no que diz respeito a carga de eficcia, de contedos mandamental e executivo.

Deste quadro resulta que, hoje, parcela significativa da doutrina admite a existncia de cinco demandas de contedos diversos e, por decorrncia, de propsito tambm diverso.

Oportuno, por derradeiro, registrar que as cargas de eficcias podem ser compostas, ou seja, as demandas em geral podero contemplar mais de um contedo concomitantemente, havendo, pois, sentenas hbridas, eis que compostas por mais de uma carga de eficcia, muito embora uma carga esteja mais presente do que outra na definio do contedo da deciso.8

In Curso de Processo Civil, vol. II, SAFE, Porto Alegre, 1990, pgs. 12 e ss.

A exposio deste debate tem por escopo, dentre outros propsitos, definir no presente ensaio, justamente, qual o contedo das sentenas proferidas em demandas de cunho revisional, em sede alimentar. Isto propiciar a perfeita identificao dos contornos objetivos, subjetivos e temporais da demanda, bem como do pedido e, finalmente, o alcance da coisa julgada .

3. Propsito e conseqncias da perfeita compreenso das eficcias.

Aps esta breve exposio envolvendo a classificao das aes e sentenas, emerge a necessria indagao relativa s conseqncias prticas do perfeito domnio de tal construo. E a resposta clara: no possvel deduzir pedido adequado (ou prolatar sentena) sem a perfeita compreenso do tema. Com efeito, ainda na fase pr-processual, dever do operador do direito identificar aquilo que a parte necessita; descobrir o verdadeiro objeto da demanda, ou aquilo que o autor deseja obter com a sentena, para, ao depois, adaptar a necessidade ao pedido. Somente haver congruncia entre a sustentao das necessidades do autor e o pedido deduzido se o profissional que trata da questo descortinar com preciso os caminhos de que dispe para a satisfao do interesse posto em causa (declaratrio, constitutivo, condenatrio, executivo ou mandamental).

O pedido, portanto, dever ser compatvel com as cargas de eficcia que integraro a sentena pretendida, ou, mais concretamente, dever o autor e tambm o juiz, ao sentenciar usar verbo ncleo que caracterize a carga de eficcia preponderantemente querida, verbi gratia, se for condenatria, pertinente o uso do verbo condenar; se constitutiva negativa, o verbo decretar; se declaratria, o verbo declarar; se mandamental, o verbo ordenar; e se executiva, por igual, verbo que represente o comando pretendido. Assim procedendo estar-se- adequadamente definindo o contedo eficacial da sentena pretendida ou prolatada.

Outrossim, oportuno esclarecer que, na sentena executiva em sentido amplo, tambm o juzo expede uma ordem, a exemplo da mandamental. Todavia, tais ordens no se confundem, porquanto se distinguem na conseqncia jurdica. Com efeito, enquanto, na

mandamental, o no cumprimento da ordem importa em tese na responsabilidade criminal pela prtica do delito de desobedincia (art. 330 do Cdigo Penal), j na executiva o no atendimento da ordem emanada implica execuo forada, e no responsabilidade criminal.

Essencial, portanto, que o contedo final da sentena seja retratado exatamente pelo comando constante do dispositivo da deciso e, nesta medida, o juzo poder apenas declarar, condenar, constituir, ordenar e/ou executar. No existem outros caminhos ou comandos oferecidos pelo Estado, da, pois, a importncia de seu absoluto domnio, aos efeitos de promover uma perfeita adequao da necessidade da parte que tem razo com as possibilidades do juzo.

4. Ao de Reviso da Obrigao Alimentar.

A ao revisional do encargo alimentar, objeto do presente ensaio, apresenta-se de duas formas: a) quando a pretenso meramente modificativa e b) quando a pretenso totalmente exonerativa. Esta ao encontra suporte no artigo 471, inciso I, do CPC, que estabelece: "Nenhum juiz decidir novamente as questes j decididas, relativas mesma lide, salvo: - se, tratando-se de relao jurdica continuativa, sobreveio modificao no estado de fato ou de direito; caso em que poder a parte pedir a reviso do que foi estatudo na sentena".

Este dispositivo consagra a clusula rebus sic stantibus e aplicvel s decises proferidas em processos alimentares, da a possibilidade da reviso do encargo tanto em uma pretenso modificativa - para aumento ou diminuio do encargo - quanto numa pretenso exonerativa de alimentos 9 . Para isso, basta que se alterem as condies econmicas das partes, conforme estatudo no art. 1.699 do Cdigo Civil 10 .

Desta forma, constatamos que a possibilidade jurdica de alterao de penso alimentar repousa em uma questo de fato, representada pelas oscilaes da vida, mais precisamente na flutuao econmica dos envolvidos. Assim, se h um empobrecimento do obrigado ou um enriquecimento do alimentado, ocorre uma modificao de fortuna e, por9

Cf. PORTO, Srgio Gilberto. Doutrina e prtica dos alimentos. 3 ed. So Paulo: RT, 2003, p. 109.

conseguinte, as bases anteriormente ajustadas merecem ser revistas, para diminuio ou exonerao, eis que fica esta reviso tambm dentro dos parmetros necessidade de um, possibilidade de outro (art. 1.694 do Cdigo Civil 11 ).

So incontveis as situaes que justificam a pretenso revisional, seja ela modificativa ou exonerativa, v.g., a perda de emprego por parte do obrigado; a diminuio de ganhos do alimentante; o enriquecimento do alimentado; doenas que esgotem os recursos financeiros do obrigado; maioridade dos filhos beneficiados... enfim uma gama sem nmero de hipteses pode gerar reflexos na situao ftico-financeira tanto do obrigado, quanto do ou dos alimentados e, por conseqncia, torna-se imperiosa a reviso da situao pretrita, com o fito de buscar a proporcionalidade primitiva havida ao tempo da fixao dos alimentos originrios. Porm, necessrio, para que o pedido encontre eco, que as circunstncias modificativas tenham ocorrido posteriormente fixao dos alimentos.

A ao revisional que busca a simples modificao dos alimentos, quer para aument-los, quer para reduzi-los, processar-se- pelo rito estabelecido na Lei 5.478/68, ao passo que a ao que busca a exonerao do encargo processvel por via ordinria, consoante tem ensinado a doutrina. 12

De outro lado, questo que tem merecido ateno dos operadores do direito diz respeito competncia de juzo para conhecimento da ao revisional. Existem aqueles que sustentam ser a ao revisional uma ao acessria e que s existiria em razo da demanda alimentar originria, e, como conseqncia deste fato, geraria necessariamente juzo prevento.

Nesta linha ento seria sempre competente para a ao de reviso o juzo onde foi decidida a lide alimentar. Dentre estes destacamos JORGE FRANKLIN ALVES FELIPE, HLIO TORNAGHI, DOMINGOS SVIO BRANDO LIMA, NELSON CARNEIRO e, inclusive, PONTES DE MIRANDA.V. art. 401 do Cdigo Civil de 1916. V. art. 400, Cdigo Civil de 1916. 12 FELIPE, Jorge Franklin Alves. Prtica das aes de alimentos. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 47; BITTENCOURT, Edgard de Moura. Alimentos. So Paulo, 1979, p. 101; LIMA, Domingos Svio Brando de. A nova lei do divrcio comentada. So Paulo: O. Dip Editores, 1978, p. 167, p. ex.11 10

Todavia, outra corrente doutrinria, respaldada basicamente em YUSSEF SAID CAHALI, sustenta que inocorre preveno do juzo, devendo, portanto, prevalecer nas aes revisionais a regra constante do art. 100, II, do CPC.[EGP1] Comentrio: No existe este verbete.

A nosso juzo, com a devida vnia do respeitvel entendimento contrrio, assiste razo a YUSSEF SAID CAHALI, pois efetivamente a ao revisional uma nova ao, muito embora decorrente da demanda alimentar originria. Com efeito, contempla nova causa de pedir, com outro pedido, fundada em relao jurdica de direito material substancialmente modificada, vez que calcada na nova situao ftica. Esta nova ao no conexa outra, pois somente sero conexas as aes quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir (art. 103 do CPC).

Prevento ser o juzo que, correndo aes conexas em separado, despachar em primeiro lugar (art. 106 do CPC). Ora, na hiptese investigada no h conexo, vez que inexiste identidade de pedido ou de causa de pedir, por conseguinte, resulta excluda eventual preveno.

Efetivamente, na ao originria de alimentos a causa de pedir a relao jurdica de direito material que vincula alimentante e alimentado (p. ex. relao de paternidade); o pedido representado pelos prprios alimentos. J na ao revisional a causa de pedir a mudana que sobreveio na fortuna de uma das partes; o pedido (objeto) representado pelo aumento, reduo ou exonerao que se pretende em relao ao encargo alimentar. Da poder se afirmar que a ao revisional (quer modificativa, quer exonerativa) no se constitui em ao acessria ou conexa demanda alimentar, mas ao autnoma, com identidade prpria. Diante deste quadro no h razo para se falar em preveno de juzo e, por conseqncia, entendemos tambm que a regra aplicvel quanto competncia a constante do art. 100, II, do CPC ou, em outras palavras, o foro competente para propositura da ao revisria o da residncia ou domiclio do alimentado.

4. 1. Ao modificativa.

A ao que visa alterar o quantum devido pelo alimentante ao alimentado deve ser compreendida com ao meramente modificativa. Como se pode extrair do prprio nomem iure, a

ao tem por fito modificar o valor da penso alimentcia no sentido de major-la ou reduzi-la, tendo em vista alterao considervel no binmio necessidade possibilidade.

Com efeito, para que seja procedida a alterao na relao jurdica estabelecida com a sentena proferida na ao de alimentos pretrita necessria a demonstrao da modificao substancial no binmio 13 . Consoante exemplos da jurisprudncia, a alterao substancial do binmio pode ser verificada quando o alimentante encontra-se desempregado 14 , ficando impedido de prover os alimentos no patamar estabelecido anteriormente. No entanto, a situao de desemprego no capaz por si s de proceder modificao no quantum debeatur, devendo, nesse sentido, concorrer outros fatores que autorizem a modificao do encargo alimentar 15 .

De outra sorte, o aumento da necessidade do alimentante pode autorizar a majorao dos alimentos de acordo com as peculiaridades que o sustento do credor da prestao alimentcia impem. corrente o exemplo da famlia que dividida pela separao dos pais e que

A respeito da discusso, o Tribunal de Justia do RS j firmou entendimento: Apelao cvel. Ao revisional de alimentos. Minorao. Prova. Binmio alimentar. Custas e honorrios. A reduo de penso alimentcia, estipulada por acordo, somente e possvel mediante prova cabal e robusta da modificao da situao de fazenda de quem presta os alimentos ou da diminuio das necessidades de quem os recebe, conforme exigncia do artigo 401 do cdigo civil e reiterada jurisprudncia das cmaras especializadas em direito de famlia deste tribunal. No estando nos autos prova com esse quilate o pleito de reduo no pode ser atendido. O vencido responde por custas judiciais e honorrios advocatcios. Sentena reformada. Primeiro apelo improvido. Segundo apelo provido. (segredo de justia) (9 fls) (Apelao Cvel n 70004818415, Oitava Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Jos Atades Siqueira Trindade, julgado em 12/09/2002); Alimentos reviso. Pedido de reduo. Prova. Indemonstrada a substancial alterao das condies de vida dos litigantes desde a celebrao do acordo em que os alimentos foram fixados, descabida se mostra a pretendida reduo, ainda mais quando h indicativos de que permaneceu inalterado o binmio possibilidade-necessidade, sendo que o valor se mostra necessrio para o sustento dos filhos. Inteligncia do art. 401 do CPC. Recurso desprovido.(segredo de justica) (7 fls) (Apelao Cvel n 70005007026, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 06/11/2002); Apelao cvel. Ao revisional de alimentos. Binmio legal. A reduo de penso alimentar estabelecida mediante acordo, somente e possvel quando suficientemente demonstradas modificaes substanciais na situao de fazenda de quem presta os alimentos e/ou nas necessidades de quem os recebem, o que esta ausente nos autos. Apelao desprovida. (segredo de justia) (5 fls) (Apelao Cvel n 70004962890, Oitava Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Jos Atades Siqueira Trindade, julgado em 03/10/2002). 14 Alimentos. Revisional. A situao inesperada de desemprego significa alterao substancial em sua possibilidade que no pode ser ignorada. Deram provimento, por maioria, vencido o relator. (Agravo de instrumento n 70006305684, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Jos Carlos Teixeira Giorgis, julgado em 18/06/2003). 15 Alimentos. Reviso. Desemprego momentneo. O desemprego momentneo do prestador da verba, por si s, no autoriza a reviso do pensionamento. Apelo improvido. (segredo de justica) (5 fls) (Apelao Cvel n 70004962874, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Jos Carlos Teixeira Giorgis, julgado em 06/11/2002)

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o cnjuge com a guarda do filho impelido morar em nova residncia, desencadeando uma srie sucessiva de dispndios, como, por exemplo, a locao de imvel para residir 16 ,

Outra questo emergente refere-se ao nus probatrio. A demonstrao na alterao da situao ftica dos litigantes fator determinante para procedncia da demanda. Dessa forma, a simples alegao de que houve aumento da necessidade por parte do alimentado ou a mera afirmao de que houve diminuio da possibilidade por parte do alimentante, no capaz formar o convencimento do magistrado. indispensvel a formao de provas robustas de tais modificaes, sem as quais fica impossibilitado o acolhimento da pretenso 17 .

Ainda, dentro da problemtica da prova nas demandas modificativas da prestao alimentcia, merece ateno dos operadores do direito a questo da antecipao da tutela requerida em tais litgios. Ocorre que o encargo alimentar foi estabelecido em processo ordinrio com ampla cognio no podendo ser agora ser alterado no limiar do novo processo sem a presena de subsdios para formar o convencimento do julgador. Por bvio, deve restar demonstrados os requisitos autorizadores da antecipao de tutela previstos no artigo 273 do Cdigo de Processo Civil, consoante reiteradamente aponta a jurisprudncia 18 .

Reviso de alimentos. Aumento das necessidades. Possibilidade do alimentante. Sendo incontroverso o aumento das necessidades dos alimentandos, que passaram a residir em imvel locado, diante da retomada daquele que fora cedido pelo av paterno em comodato, e havendo indicativos de que o alimentante teve melhorada sua situao econmico-financeira, justificado est o redimensionamento do encargo alimentar. Recurso desprovido. (segredo de justia) (Apelao Cvel n 70006324180, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 04/06/2003) 17 Revisional de alimentos. Reduo. A ao revisional de alimentos exige comprovao robusta acerca da diminuio nas possibilidades do alimentante ou nas necessidades da alimentada. As declaraes de imposto de renda do genitor, por si s, no justificam a reduo pleiteada, porquanto prestadas pelo prprio contribuinte ao fisco, no consistindo meio de prova apto a demonstrar a alegada reduo nos ganhos. Apelo desprovido. (segredo de justica) (Apelao Cvel n 70006245575, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Maria Berenice Dias, julgado em 27/08/2003). Apelao. Revisional de alimentos. A sentena que julgou improcedente a pretenso de reduzir os alimentos adequada e no merece reparo. No h prova de eventual alterao em algum dos elementos do trinmio alimentar. Negaram provimento. (apelao cvel n 70006160865, Oitava Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Rui Portanova, julgado em 12/06/2003) 18 Alimento. Tutela antecipada. Revisional. O deferimento de antecipao de tutela exige a concorrncia dos requisitos de existncia de prova inequvoca, entendido como aquela que no admite dvida razovel, e de fundado receio de dano. Tratando-se de revisional de alimentos, necessria prova inequvoca da alterao da possibilidade do alimentante e/ou necessidade do alimentando. Proverem. Unnime. (segredo de justia) (4 fls) (agravo de instrumento n 70004867487, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 02/10/2002); Reviso de alimentos. Antecipao da tutela . Indeferimento. Descabe a antecipao da tutela para reduzir a penso alimentcia fixada recentemente por sentena, se no ha prova inequvoca que convena sobre a reduo das possibilidades do alimentante. Agravo de instrumento provido. Fls.6 (agravo de instrumento n

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4.2. Ao exonerativa.

Ao lado das aes modificativas do encargo alimentar, h as aes de cunho exonerativo. Vale dizer, o alimentante para se ver desonerado da obrigao de alimentos, pode veicular demanda de exonerao que poder suspender a exigibilidade do crdito temporariamente ou extinguir por completo a relao jurdica entre o credor e o devedor de alimentos.

Com efeito, a demanda de cunho exonerativo pode apresentar suportes fticos que ensejam conseqncias jurdicas diferenciadas e, como conseqncia, gerar demandas de projeo distinta. Nesta linha, vale destacar que a exonerao poder ser definitiva ou temporria. Ser definitiva quando ocorrer , no plano material, fato capaz de extinguir a obrigao alimentar e temporria quando ocorrer, no plano material, fato apto apenas a, em determinado momento, reconhecer a incapacidade momentnea de adimplemento integral da obrigao, mas no a extino material desta.

A demanda revisional de pretenso exonerativa, com foro de definitiva, poder, por exemplo, ter por fundamento substancial a morte do beneficiado ou a indignidade de parte do alimentado.

J a demanda exonerativa, temporria, no reconhece a extino da obrigao, mas apenas admite a impossibilidade do adimplemento frente as circunstncias fticas postas a exame. Poder ser tido como exemplo a circunstncia de que o obrigado contraia doena que, durante determinado perodo, esgote, por completo, seus recursos financeiros. Superada a fase de dificuldades e recuperada a sade, nada obsta, seja demandado a adimplir sua obrigao que continuou existindo, apenas, frente a sua impossibilidade momentnea, deixou de se tornar exigvel naquele determinado momento e frente quelas circunstncias especficas.

70004956306, Oitava Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Jos Atades Siqueira Trindade, julgado em

5 Questes processualmente considerveis nas aes revisionais.

Algumas questes, no que diz respeito aos propsitos deste ensaio, merecem ateno particular, eis que contemplam hipteses no to corriqueiras na doutrina. Dentre estas, como j destacado anteriormente, aquela referente ao contedo das sentenas das aes revisionais, bem como as eficcias destas, sua capacidade de adquirir autoridade de coisa julgada e sua projeo no tempo.

5.1 Contedo das sentenas revisionais

Questo decorrente da natureza do presente ensaio e vinculada a seu propsito, diz respeito a natureza da sentena proferida em demanda de contedo revisional, seja ele modificativo ou exonerativo.

Nesta linha, cumpre destacar que o contedo preponderante das demandas revisionais tem natureza diversa, dependendo, evidentemente, da situao substancial posta apreciao do juzo e, portanto, sob o ponto de vista pragmtico, ensejaro, como visto anteriormente, pedidos tambm diversos.

A demanda de exonerao de carter definitivo tem contedo preponderantemente constitutivo (rectius desconstitutivo ou constitutivo-negativo), vez que extingue a obrigao alimentar, por sentena, ferindo de morte o encargo existente no plano material. A demanda, exonerativa temporria, de sua parte, tem contedo tambm preponderantemente constitutivo, porm no no plano da relao jurdica material, mas no plano da pretenso, haja vista que, embora persista a obrigao alimentar, a sentena outorga eficcia paralizante pretenso, impedindo que o credor, diante das circunstncias reconhecidas por sentena, exera com eficcia sua pretenso. A deciso temporariamente desconstitutiva reconhece que, naquele momento, embora exista obrigao material alimentar, no h como exigir seu cumprimento, em face da no incidncia - naquele tempo - do binmio necessidade/possibilidade.

21/11/2002);

Nessa linha, cumpre lembrar que nenhuma destas demandas possui contedo exclusivamente constitutivo, eis que as sentenas de procedncia, em realidade, como j destacado, combinam cargas de eficcia. Portanto a demanda exonerativa com foros de definitividade ao lado do contedo preponderantemente constitutivo, tambm dispor de do vnculo

contedo declaratrio. O contedo constitutivo est representado pela extino

obrigacional e o declaratrio pelo reconhecimento da ocorrncia da situao substancial alegada. A demanda exonerativa de ndole temporria, alm do contedo preponderantemente constitutivo-negativo, possuir, tambm contedo declaratrio, representado este pelo reconhecimento da impossibilidade de exerccio de pretenso material naquele momento e enquanto persistirem as mesmas circunstncias reconhecidas na sentena.

A demanda meramente modificativa, de sua parte, possuir contedo preponderantemente declaratrio se tiver por fito a reduo da verba alimentar e contedo preponderantemente condenatrio se tiver por pretenso a majorao dos alimentos. Aquela, representado pelo reconhecimento da situao da necessidade de diminuio dos limites do encargo, reequalizando o binmio necessidade/possibilidade. Esta, de seu lado, impondo, cogentemente, o agravamento da sano, portanto, sobrecondenando o demandado a majorar. Tudo, evidentemente, sem embargo de contedos de menor intensidade presentes tanto na sentena redutora, quanto na majorante.[EGP2] Comentrio: No seria mediato?

5.2 O instituto da Coisa julgada em matria alimentar.

O estudo das eficcias das sentenas desemboca, logicamente, no instituto da coisa julgada, a qual para ENRICO TULLIO LIEBMAN se constitui na imutabilidade do comando emergente de uma sentena. "No se identifica ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando; , pelo contrrio, uma qualidade mais intensa e mais profunda, que reveste o ato tambm em seu contedo e torna assim imutveis, alm do ato em sua existncia formal, os efeitos, quaisquer que sejam, do prprio ato" 19 .

LIEBMAN, Enrico Tulio. Eficcia e Autoridade da Sentena com notas de Ada Pellegrini Grinover. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 50.

19

Esta orientao, embora aceita por parcela significativa da doutrina, gerou dissenso e mereceu a crtica da pena talentosa de BARBOSA MOREIRA e de OVDIO BAPTISTA DA SILVA, na medida em que os respeitveis mestres no admitem a imutabilidade dos efeitos da sentena, vez que sustentam, justamente, a possibilidade de mudana dos efeitos da sentena passada em julgado.

Contudo, vnia deferida, em nosso sentir, como j exposto em outras oportunidades , no h como enfrentar o tema sem antes identificar a natureza do direito posto em causa, quer sob o ponto de vista dos limites objetivos (representados pela tentativa de identificar o qu, da sentena, passa em julgado), quer sob o prisma dos limites subjetivos (representados pela tentativa de identificar quem est sujeito a autoridade da coisa julgada) ou ainda sob o enfoque dos limites temporais (representados pela medida da eficcia da deciso no tempo), consoante anteriormente j registrado.20

Embora a divergncia doutrinria reinante em torno da perfeita identificao dos limites da autoridade da coisa julgada, a verdade que o instituto em si se forma a partir dos elementos identificadores da ao, os quais, segundo a clssica teoria dos tria eadem, intuda em tempos idos por MATEO PESCATORE, so: partes, pedido e causa de pedir. Parte, em sentido processual, aquele que demanda em seu prprio nome (ou em cujo nome demandado) a atuao da vontade da lei, e aquele em face de quem essa atuao demandada; pedido, de sua parte, se constitui no objeto da demanda, dividindo-se em mediato e imediato como ensina, dentre tantos, GIANCARLO GIANNOZZI 21 ; ao passo que a causa de pedir , segundo JOS IGNCIO BOTELHO DE MESQUITA: "o fato ou o complexo de fatos aptos a suportarem a pretenso do autor, ou assim por ele considerados". 22

Assim, torna-se clara a lio que em havendo entre uma e outra demanda identidade de partes, pedido e causa de pedir, haver tambm identidade de aes. Desta forma, estando uma das demandas j decidida e com sentena passada em julgado, pode-se afirmar que h coisa julgada em relao quela lide. Coisa julgada esta que poder ser formal ou material.20 21

PORTO, Srgio Gilberto. Coisa Julgada Civil. Rio de Janeiro: Aide Editora, p. ex. GIANOZZI, Giancarlo. La Modificazione Della Domanda Nel Processo Civile. Milano: Giuffr, 1958, p. 95. 22 MESQUITA, Jos Igncio Botelho de. A causa 'petendi' nas aes reivindicatria. In: Revista da AJURIS 20/169.

A coisa julgada formal apresenta-se como a impossibilidade de ser submetida a demanda a novo julgamento por vias recursais, ou porque este julgamento foi proferido por rgo do mais alto grau de jurisdio, ou porque transcorreu o prazo para recorrer sem que o sucumbente apresentasse recurso contra a deciso. Vale dizer: operou-se a precluso porque a parte vencida exerceu todos os recursos que podia; ou usou de uns e no usou de outros ou ainda porque no usou de nenhum dos recursos que podia e, por esta razo, surgiu a impossibilidade de nova impugnao. Seus efeitos limitam-se ao processo em que foi proferida a deciso. J a coisa julgada material extrapola os parmetros do processo em que foi proferida a deciso e caracteriza-se, segundo forte orientao doutrinria, pela imutabilidade do elemento declaratrio da sentena. Declarao esta que, ao reconhecer a nova situao jurdica decorrente da sentena, torna-se imodificvel tanto no processo em que foi pronunciada, como em qualquer outro.

Em matria alimentar o estudo da coisa julgada, a exemplo de outros ramos, tambm enfrenta alguma dificuldade de interpretao. Com efeito, muitas vezes encontram-se opinies que afirmam que a deciso proferida em processo de alimentos no transita em julgado outros, contudo, sustentam o inverso 23 .

Esta discrdia, por certo, radica no teor equivocado do art. 15 da Lei de Alimentos, que reza: A deciso judicial sobre alimentos no transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista em face da modificao da situao financeira dos interessados. Da, parte dos estudiosos passarem a afirmar que, no mximo, a sentena proferida em ao de alimentos

23 Alimentos. Revisional. Coisa julgada. Ante a inexistncia de fato novo desde a data em que foram os alimentos acordados, a pretenso esbarra na coisa julgada material, que, consoante a melhor doutrina, produzida pela deciso judicial sobre alimentos, no obstante a equivocada e atcnica dico do art. 15 da lei 5.478/68. Inteligncia do artigo 1.699 do cdigo civil. Proveram. Unnime. (segredo de justica) (apelao cvel n 70006572283, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 20/08/2003). REVISIONAL DE ALIMENTOS. O pressuposto para qualquer modificao no montante dos alimentos a mudana na situao financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe. Fora de tais parmetros, rigidamente delimitados em lei, qualquer pretenso revisional esbarrar inexoravelmente na coisa julgada formada pela deciso anterior que fixou os alimentos (e que se produz, inclusive em sentido material, no obstante a equivocada redao do art. 15, da Lei 5.478/68 ver, por todos, ADROALDO FABRCIO, in REVISTA AJURIS 52/05). No caso, entretanto, atenta leitura da inicial e de todas as manifestaes do apelado ao longo do feito, inclusive as razes recursais, evidencia que sua pretenso no se arrima em qualquer alterao seja em sua possibilidade contributiva seja na necessidade do alimentado, seno que espelha, nica e exclusivamente, seu arrependimento com relao ao ajuste alimentar em vigor, o que esbarra na coisa julgada. PROVERAM. UNNIME. (Apelao Cvel N 70005520317, Stima Cmara Cvel, Tribunal de Justia do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, JULGADO EM 02/04/2003).

atingiria o estgio de coisa julgada formal. Nesta linha encontramos algumas vozes na doutrina, p. ex., PAULO LCIO NOGUEIRA e JOO CLAUDINO DE OLIVEIRA E CRUZ.

Todavia, com a mxima vnia daqueles que esposam este entendimento, no esta a interpretao que deve ser dada ao texto legal, pois a sentena proferida em ao de alimentos, no que tange ao mrito, transita em julgado e atinge, sim, o estado de coisa julgada material.

Note-se, neste passo, que uma relao jurdica continuativa d suporte material a ao de alimentos, ou seja, uma relao jurdica em que a situao ftica sofre alteraes com o passar dos tempos. Deste modo, quando se diz que "inexiste" coisa julgada material nas aes de alimentos, faz-se referncia apenas ao quantum fixado na deciso, pois, se resultar alterada faticamente a situao das partes, poder-se- alterar os valores da obrigao alimentar. Mas, uma vez reconhecida esta, que envolve inclusive o estado familiar das partes, transita ela em julgado e atinge a condio de coisa julgada material, no podendo novamente esta questo ser reexaminada. Aqui, a declarao da obrigao alimentar, por representar o mrito da demanda e definir a nova situao jurdica existente, adquire o selo da imutabilidade e, portanto, faz coisa julgada material. Neste sentido, p. ex., OVDIO BATISTA DA SILVA e PINTO FERREIRA. 24

Na verdade, aqueles que argumentam que as sentenas proferidas em ao de alimentos no transitam em julgado confundem a "inexistncia" de coisa julgada com a existncia implcita da clusula rebus sic stantibus (art. 471 do CPC) nas sentenas alimentares, pois representando estas dvidas de valor, sujeitam-se correo, da a pertinncia dos limites temporais da coisa julgada, vez que a deciso eficaz e possui autoridade apenas e enquanto no se alterarem as circunstncias fticas que a ditaram.

Assim, certo que, modificando-se os valores por deciso judicial, a "nova" sentena no desconhece nem contraria a anterior. Ao revs, por reconhec-la e atender ao julgado, que, como j se disse, contm implcita a clusula rebus sic stantibus, a adapta ao estado

24 SILVA, Ovdio Baptista da. Comentrios ao Cdigo de Processo Civil. Do Processo Cautelar. V. XI. Porto Alegre, 1985, p. 197 e FERREIRA, Pinto. Investigao de paternidade, concubinato e alimentos. 2 ed. So Paulo: Saraiva, 1982, p. 153.

de fato superveniente. E esta adaptao no atenua ou atinge a coisa julgada, mas antes a reconhece como tal.

Exatamente, com base nos fundamentos retro expostos que se define a orientao de que as decises proferidas nas demandas revisionais no ofendam a autoridade da coisa julgada anterior e, tal qual, as aes de alimentos propriamente ditas, tambm transitem em julgado e, portanto, na medida e nos limites da eficcia temporal da deciso, tambm adquiram autoridade de coisa julgada material.

5.2.1. Limites temporais da coisa julgada.

A matria referente aos limites atribudos coisa julgada tem sido, ordinariamente, tratada pela doutrina brasileira apenas sob o ponto de vista objetivo e subjetivo, vez que esta tem concentrado esforos prioritariamente na tentativa de identificar "quem" est sujeito a autoridade da coisa julgada e "o qu" na sentena, transita em julgado, torna-se imutvel.

Contudo, vnia concedida, os limites de incidncia da autoridade da coisa julgada no se esgotam somente nestas medidas, eis que as relaes jurdicas, embora normadas por deciso jurisdicional, tambm esto sujeitas a variao dos fatos no tempo, ou seja, a autoridade da coisa julgada no capaz de imunizar a relao jurdica contra fatos futuros, embora vinculados relao jurdica anteriormente jurisdicionada. Merece, portanto, especial ateno a questo referente eficcia da deciso no tempo, como se tratasse de uma capacidade intertemporal da deciso jurisdicional.

Para que se conclua neste sentido basta que se atente para a matria referente a coisa julgada quando posta em causa, p. ex., relao jurdica de natureza continuativa, tais como as relaes tributrias ou as relaes alimentares, nas quais, por existirem prestaes peridicas o julgamento regula - evidentemente - apenas a relao jurdica no seu tempo e vale na medida do

debate estabelecido, sem, entretanto, definitivar as conseqncias e projees frente a novos fatos nascidos em razo desta mesma relao jurdica que sofre adequao com o passar do tempo 25 .

Portanto, a idia da existncia de limites temporais para o caso julgado ou mais precisamente da triplicidade - e no apenas da duplicidade - dos limites da coisa julgada realidade e no nova, encontrando, inclusive, qualificado respaldo doutrinrio, tanto que expressamente tratada por OTHMAR JAUERNIG 26 : "O caso julgado est triplamente limitado: objectivamente pelo objecto, subjectivamente pelo crculo das pessoas atingidas e temporalmente com respeito ao momento em que se aplica a constatao." Segue JAUERNIG 27 , ilustre professor da Universidade de Heidelberg, elucidando que "A sentena transitada estabelece a situao jurdica apenas em determinado momento, no para todo o porvir; pois normalmente a situao jurdica altera-se mais tarde: o direito satisfeito e extingue-se, a propriedade reconhecida ao autor transmitida, etc. A alegao destas alteraes no pode ser excluda num novo processo pelo caso julgado."

Portanto, parece de lgica irrefutvel a

circunstncia de que a deciso

jurisdicional adquire a fora de caso julgado em razo de fatos passados (aqueles alegados ou que deveriam ter sido alegados e que coexistiam com a deciso) e no em torno de fatos futuros, vez que estes ensejam, em face da teoria da substanciao28 , nova demanda, pois representam outra causa de pedir. toda evidncia que a tese aqui sustentada encaixa-se com perfeio s aes revisionais de alimentos, haja vista que a relao entre as partes de carter continuativo, merecendo pois adequao no tempo. Da, pois, a existncia dos limites temporais da coisa25 REMO CAPONI, ao discorrer sobre os efeitos temporais da sentena, faz distino entre situao jurdica instantnea e situao jurdica duradoura, dizendo: Listantaneit o la durevolezza delle situazioni giuridiche rispecchiano invece listantaneit o la durevolezza dellinteresse Che esse mirano a realizzare. Instantneo solo linteresse a conseguire um bene Che il soggetto desidera, ma non h. Durevole sempre linteresse a conservare um bene che il soggetto h gi nella sua disponibilit e a difenderlo da ogni ingerenza altrui; durevole tavolta anche linteresse a conservare um bene Che il soggetto non h, quando il bisogno Che il bene da acquisire diretto a soddisfare si ricollega ad um modo di essere Del soggetto o h comunque um apprezzabile sviluppo temporale (ad esempio: i bisogni soddisfatti da contratti di somministrazione: artt. 1559 ss. c.c. ). CAPONI, Remo. Lefficacia del Giudicato civile nel tempo. Milo: Giuffr, 1991. 26 JAUERNIG, Othmar. Direito Processual Civil. 25 ed., Coimbra: Almedina, 2002, 63. Traduo de F. Silveira Ramos. 27 63, V. 28 Vale lembrar que a teoria da substanciao identifica a causa de pedir na soma da relao jurdica afirmada aos fatos que a concretizam, fazendo que o direito saia do mundo das hipteses e espalhe-se pelo mundo dos sentidos.

julgada, vez que a projeo de sua incidncia tambm limitada no tempo da deciso ou, mais uma vez, na palavra autorizada de JAUERNIG 29 "Tudo o que, antes deste momento, podia ser alegado, est excludo num processo posterior(...). Todas as posteriores alteraes na configurao dos efeitos jurdicos declarados, no so atingidas pelo caso julgado." A propsito do tema aqui debatido, prossegue o mestre tedesco: Nas prestaes perdicas, por motivos prticos, condena-se o ru por longo perodo (importante sobretudo nos pedidos de alimentos), 258; vd. Supra 35 II 2 c. O seu dever de prestar fixado quanto existncia, durao e montante, muitas vezes por muitos anos. Sendo o ru condenado no todo ou em parte, a sentena baseia-se num prognstico das circunstncias futuras. Isso legitima atribuir sentena caso julgado a mostrar no futuro que tambm abrange no mbito prognosticado as futuras prestaes (de alimentos; BGHZ 103, 398; douto parecer, MK-ZPO 323, 7, com outras notas). Os limites temporais do caso julgado so aqui, assim, mais largos que normalmente (vd. Supra V). O prognstico pode constatar-se estar errado, pois as circunstncia que foram determinantes para a condenao, evoluram de modo diverso do admitido: o devedor de alimentos ganha mais ou empobreceu, o lesado supreendentemente curou-se ou incapacitou-se totalmente, o poder de compra do dinheiro e com isso o montante da sentena desceu, etc. Mudando assim as circunstncias, seriam a existncia, durao e montante do dever de prestar fixadas hoje diferentemente da sentena transitada; mas o caso julgado temporalmente impede outra condenao. Contudo, a discrepncia entre a sentena e a situao actual excede o tolervel quando as circunstncias se alteram substancialmente. Ento o caso julgado tem de ceder. A lei permite sua ofensa: ela concede uma aco para alterao da sentena (aco de reforma), 323. Esta aco restringe-se aos casos em que tem de ser afastado o efeito de caso julgado (H. Roth, NJW 88, 1234, 1236; no tendo ainda transitado a sentena a alterar, est em jogo a ingerncia na sua aptido para o caso julgado, vd. STJ 323, 1). A favor da (em princpio) ingerncia no caso julgado fala j a colocao do 323 a seguir ao 322, que regula os limites objectivos do caso julgado 30 .

Esta idia parte da premissa de que a relao jurdica somente normada nos limites da situao substancial posta apreciao, vez que pode, com o transcurso do tempo, sofrer alteraes fticas. Contudo, deve ser registrado que esta limitao no ocorre apenas29

Idem nota 17.

quando a relao jurdica controvertida for tipicamente continuativa, tais as antes citadas, ou seja, as alimentares e tributrias, dentre outras igualmente de periodicidade intrnseca. Com efeito, tambm as relaes no-continuativas esto sujeitas as variaes temporais, haja vista que toda a relao jurdica possui, com maior ou menor intensidade, a presena da clusula rebus sic stantibus31 . Assim, (a) o locatrio que por fora de deciso revisional est obrigado a pagar mil de aluguel, no est garantido que sempre pagar este valor, eis que uma nova realidade poder determinar, mais uma vez, a reviso do valor locatcio; (b) a deciso que regula a guarda dos filhos poder, a qualquer tempo, ser revista com nova disciplina, basta que ocorram alteraes fticas que recomendem a reviso; (c) o credor que leva penhora bem do devedor, perder seu direito material expropriatrio, mediante o adimplemento da obrigao e outras tantas hipteses. No h, nos exemplos, ofensa autoridade da coisa julgada, vez que, muito embora se trate da mesma relao jurdica j normada por deciso, a nova situao no foi e nem poderia ser abrangida pela deciso anterior, vez que posterior a esta. H, nos exemplos, mudana da situao substancial, portanto fora do alcance temporal da coisa julgada.

Assim, resulta evidenciado que a deciso jurisdicional regula a relao jurdica somente em face da situao substancial posta sub judice e no para todo o sempre. Desta forma, pois, possvel afirmar que a autoridade da coisa julgada tem sua capacidade eficacial tambm limitada pelo tempo da deciso ou ainda, mais precisamente, quer as conseqncias jurdicas estejam sujeitas a adequaes em face da natureza da relao jurdica de direito material ou no, a verdade que a deciso tem seus limites tambm determinados pelo tempo dos fatos que foram considerados ou que deveriam ter sido considerados pela deciso, portanto pr-existentes a esta.

Alis, sobre a eficcia temporal, REMO CAPONI, igualmente, observa que "Di efficacia della sentenza nel tempo si pu parlare fondamentalmente in due sensi. Il primo porta a individuare il momento del tempo nel quale la sentenza comincia a produrre i suoi effetti e laJAUERNIG, op. cit., p. 332. A respeito do tema, REMO CAPONI ressalta que a origem da teoria alem, com difuso na giustizia administrativa. Segundo o autor: la nozione di sentenza con la clausola rebus sic stantibus pu essere correttamente riferita a tutte quelle pronunce che contengono un accertamento condizionato al permanere invariato anche in futuro dello stato di fatto presente al tempo del processo, Che ha formato la base per la pronuncia. Si tratta dunque dei casi in cui il nostro ordinamento riferisce lefficacia della dichiarazione giudiziale anche al futuro: le condanne in futuro concerneti situazioni durevoli collegate da um nesso permanente di condizionalit alla propria fattispecie costitutiva, a sua volta durevole. CAPONI, op. Cit., p. 105.31 30

loro stabilit. Il secondo concerne l'incidenza dell'efficacia della sentenza passata in giudicato nel tempo delle situazioni sostanziali oggetto del giudizio. 32

O ilustrado mestre peninsular supra, como se pode verificar, aponta duas formas de eficcia temporal da coisa julgada. Uma vinculada a partir do momento em que a deciso comea a produzir efeitos e outro, exatamente, vinculado a situao substancial normada. Todavia, a matria referente aos limites temporais da coisa julgada, como o prprio CAPONI, no mesmo ensaio adiante obtempera, no se esgota apenas nesta disciplina, vinculada a situao substancial normada ou na mera identificao do termo a quo da eficcia da deciso, mas envolve, por evidente, tambm as chamadas condenaes para o futuro, onde a deciso consolida sua eficcia no para regular situao jurdica pretrita, mas sim, projetando sua eficcia para alm do imediato, tem por escopo disciplinar previamente eventual comportamento futuro.

Alis, essa posio no desconhecida pela doutrina brasileira e muitos enfrentaram a temtica referente a condenao para o futuro 33 . Contemporaneamente, na Itlia, como j destacado, a doutrina, por exemplo, sustenta que o objetivo da condenao para o futuro (condanna in futuro) justamente regular condutas ainda no realizadas pelas partes: "in queste ipotesi laccertamento esprime dunque una regola di condotta per le parti che non diretta a rimuovere un illecito del passato, ma si riferisce a fatti futuri" 34 .

No direito indgena, especialmente, a eficcia temporal da coisa julgada aparece com nitidez na chamada tutela inibitria, cujo fito primordial evitar a prtica de ato ilcito, cumprindo, desta forma, funo de cunho preventivo. Assim , exatamente, porqu, a cognio e disciplina da situao projetada torna-se imune a discusses futuras, haja vista que j normada situao por vir, portanto antes da prpria violao do direito. A disciplina sentencial define a conseqncia do futuro ato e esta conseqncia imunizada pelo trnsito em julgado da sentena, definindo, pois, tambm sob esta faceta, os limites temporais da coisa julgada, j que esta dispe de autoridade sobre eventual fato futuro.[EGP3] Comentrio: Neste caso o que se observa o efeito para o futuro (condanna in futuro), pois, ao contrrio do que se sustentou at ento, nessas aes a sentena no tem os limites restringidos, mas sim ampliados.

CAPONI, Remo. L'Efficacia del Giudicato Civile nel Tempo. Milano: Giuffr, 1991, p. 3. V, por todos, BARBOSA MOREIRA, Tutela Sancionatria e Tutela Preventiva, Temas de Direito Processual, Segunda Srie, p. 27. 34 CAPONI. Op. cit., p. 83.33

32

A idia dos limites temporais da autoridade da coisa julgada est, pois, intensamente presente nas demandas revisionais, sejam estas de cunho simplesmente modificativo, sejam de cunho exonerativo, pois, como dito, contemplam relaes jurdicas de ndole marcadamente continuativa, reclamando, portanto, adequao no tempo.

Releva destacar, entretanto, que internamente merecem distino. Com efeito, como visto no corpo deste ensaio, as demandas podem ser modificativas e exonerativas. Estas ltimas, de seu turno, podem ser definitivas e temporrias, dependendo da situao substancial posta apreciao. As definitivas, diversamente das demais, no ensejam posterior reviso, eis que a relao jurdica de direito material que obrigava ao encargo alimentar foi ferida de morte, estirpando o dever obrigacional do mundo jurdico. Isto, contudo, no significa que a deciso nela proferida seja destituda de limites temporais, na medida em que a sentena nela proferida por ter contedo constitutivo limita-se a produzir eficcia to-somente ex nunc ou seja seus limites temporais de eficcia projetam-se apenas para o futuro e no para o passado.

Como anteriormente destacado, nas aes de reviso de alimentos (modificativas ou exonerativas) o termo ad quem da sentena proferida marcado pela alterao substancial da situao ftica, que nas palavras de JAUERNIG a discrepncia entre a sentena e a situao atual, excedendo o tolervel. Prossegue, o ilustre mestre, exemplificando com a legislao alem,: Porm, a aco pode basear-se apenas nas modificaes essenciais das circunstncias de facto que s ocorreram aps o momento em que deveriam ter sido, o mais tardar, invocadas no processo anterior (no: podiam, pois o conhecimento pela parte irrelevante), portanto, no processo principal sobre tais modificaes que apenas ocorreram aps o ltimo julgamento dos factos no processo anterior, p. ex., a elevao do custo de vida (para a terminologia, BB 72m 152 e seg.) perto de 15% ( 323, II). As modificaes anteriores no so de atender (mesmo se posteriormente ocorreram modificaes essenciais; douto parecer, BGH NJW 87; 1553 e seg., para o caso em que o autor faz pleno vencimento, mas poderia ainda exigir mais, e agora ocorreu, posteriormente, uma modificao essencial; isso flui do conhecimento duma aco parcial dissimulada para alm dos respectivos limites do caso julgado que, todavia, o BGH recusa, vd. Supra). As modificaes posteriores no so de atender, em conta na sentena, como, por ex., o imedianto atinger de novo nvel etrio, de relevo no plano dos alimentos (OLG Kln FamRZ 80,

398). No se realiza a completa repetio do processo antigo (vd. BGH RR 90, 194). A sentena determina, no caso de julgar a aco procedente, a revogao da sentena anterior e eventualmente a nova condenao prestao (mas sempre para o perodo aps a interposio da ao, 323 III; para isso, crtico, Braun, JuS 93, 353 e segs.) 35 .

Ainda valendo-se da experincia jurdica germnica, pode-se afirmar que h muito existe previso legal para uma pretenso baseada em fato futuro, onde o exemplo clssico so as relaes jurdicas continuativas, em especial as aes de alimentos 36 . Nessas demandas a condenao firmada com suposies de que no futuro a situao ftica deduzida em juzo permanecer idntica. Dessa forma, considerando que a probabilidade de erro na prestao jurisdicional ou inadequao desta com a situao ftica futura grande, tornou-se necessrio aparelhar o sistema processual alemo com ao prpria para solucionar o problema 37 . Contudo, cumpre ressaltar que a posio majoritria na doutrina processual tedesca a de que a modificao dos julgados excepcional, admitida somente em casos que a deciso revela-se substancialmente errada, ou melhor dizendo, temporalmente inadequada 38 .

De outro lado, na experincia italiana possvel encontrar previso legal semelhante. A adequao da situao normada pela sentena com a realidade ftica encontra guarida no ordenamento jurdico italiano nos artigos 440 a 445 que disciplina especificamente as

JAUERNIG, op. Cit., p. 334. REMO CAPONI comenta o modelo germnico: Lordinamento processuale tedesco h ammesso, a partire dalla Novella del 1898, la possibilita di agire in giudizio per la condanna a prestazioni ancora da scadere nei casi previsti da parr. 257 a 259 ZPO. La disposizione che interessa il par. 258 ZPO, dove si prevede che, trattandosi di prestazioni periodiche, pu proporsi domanda anche per il futuro pagamento delle prestazioni che verranno a scadere solo dopo, lemanazione della sentenza. Op. cit., p. 92. 37 Refere CAPONI que: Giacch per uma decisione che si fonda su uma previsione di fatti futuri pu rivelarsi pi facilmente e freqentemente errata di uma che si fonda solo sullaccertamento di fatti passati, la ZPO prevede, per motivi di equit, unazione per la modificazione (Abnderungsklage) di queste decisioni, disciplinata nel par. 323, che prevede, nella parte che interessa: ove si verifichi, in caso di condanna a prestazioni periodiche che scadono in futuro, una modificazione sostanziale di quelle circostanze che furono determinanti per la condanna al pagamento delle prestazioni, per la determinazione del loro ammontare o della loro durata, ciascuna parte pu chiedere, in via di azione, una corrispondente modificazione della sentenza. Adiante, o autor enfatiza que Lazione ammissibile solo se i motivi, sui quali essa viene fondata, sono sorti dopo la chiusura delludienza di discussione, nella quale avrebbero potuto al pi tardi avere luogo una modificazione della domanda o la sollevazione delle eccezioni, e se (detti motivi) non possono essere fatti valere con lappello. La sentenza pu essere modificata solo per il tempo successivo alla proposizione dellazione. Idem, ibidem. 38 Idem, p. 94. REMO CAPONI refere-se a dois limites: In primo luogo ci si deve trovare davanti a uma modificazione esseziale (eine wesentliche Aenderung)delle circonstanze determinanti il contenuto della pronuncia. In secondo luogo successivo all proposizione della Abnderungsklage.36

35

obrigaes alimentares 39 . A doutrina italiana majoritria posiciona-se no sentido de que asF F

normas legais antes referidas so, na verdade, manifestao expressa dos limites temporais da coisa julgada.

39 A propsito do tema, assinala REMO CAPONI: "Nella parte che interessa l'art. 440 c.c. dispone: 'se dopo l'assegnazione degli alimenti mutano le condizioni economiche di chi li somministra o di chi li ricebe, l'autorit giudiziaria provvede per la cessazione, la riduzione o l'aumento, secondo le circostanze'. L'art. 445 c.c. dispone, sempre nella parte che interessa: 'gli alimenti sono dovuti dal giorno della domanda giudiziale". Idem, p. 97.