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Universidade do Estado de Minas Gerais UEMG Fundação Educacional de Divinópolis FUNEDI Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais AS NOVAS TECNOLOGIAS NA FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA OU O HIPERTEXTO NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO Ricardo Viana Velloso Divinópolis 2009

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Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG

Fundação Educacional de Divinópolis – FUNEDI

Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais

AS NOVAS TECNOLOGIAS NA FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA

OU O HIPERTEXTO NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

Ricardo Viana Velloso

Divinópolis

2009

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Ricardo Viana Velloso

AS NOVAS TECNOLOGIAS NA FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA

OU O HIPERTEXTO NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

Divinópolis – MG

2009

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em

Educação, Cultura e Organizações Sociais da

Universidade do Estado de Minas Gerais –

UEMG/FUNEDI, como requisito parcial à

obtenção do título de Mestre em Educação, Cultura

e Organizações Sociais.

Área de concentração: Estudos Contemporâneos

Linha de Pesquisa: Cultura e Linguagem

Orientador: Prof. Dr. Pedro Pires Bessa

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Velloso, Ricardo Viana

V441i As novas tecnologias na formação universitária ou o hipertexto na

construção do conhecimento [manuscrito] / Ricardo Viana Velloso. - 2009.

126 f., enc.

Orientador : Pedro Pires Bessa

Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado de Minas Gerais,

Fundação Educacional de Divinópolis.

Bibliografia: f. 113-117

1. Hipertexto. 2. Ensino superior e tecnologia. 3. Construção do

conhecimento. I. Bessa, Pedro Pires. II. Universidade do Estado de Minas

Gerais. Fundação Educacional de Divinópolis. III. Título.

CDD: 005.7592

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Termo de Autorização

Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total

ou parcial desta dissertação por processos de fotocopiadoras e eletrônicos. Igualmente, autorizo sua

exposição integral nas bibliotecas e no banco virtual de dissertações da FUNEDI/UEMG.

Ricardo Viana Velloso

Divinópolis, 24 de setembro de 2009

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos os educadores que comigo compartilham

o sonho de construir, pela via da educação, sustentada pelo labor que

não transige da determinação e da ética, um mundo melhor para

abrigar a aventura humana.

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AGRADECIMENTOS

O reconhecimento do sucesso de nossas empreitadas passa inevitavelmente pelo reconhecimento de

que não estamos sós, de que não estivemos sós, de que não somos autosuficientes na nossa jornada,

a qual se ressignifica e se enriquece quando compartilhada com aqueles que, do seu lugar e

momento próprio, oferecem-nos sua sensibilidade, solidariedade e cumplicidade para que, dividindo

nossos sonhos e projetos, possamos somar realizações.

Assim, expresso minha gratidão primeiramente aos meus pais, que com sensibilidade, sabedoria e

determinação, iniciaram-me no caminho da existência, encerrando lições de fé e perseverança,

renovando sempre minha convicção de que é preciso sonhar, é preciso ousar, é preciso realizar.

Seus ensinamentos, materializados em palavras e ações, seguramente estão presentes no meu pensar

e no meu fazer na seara da educação, o que os tornam transcendentes, meus pais e suas lições...

Meus agradecimentos dirijo também ao meu orientador, Prof. Dr. Pedro Pires Bessa, que, durante as

aulas enriquecedoras que ministrou e por ocasião dos muitos encontros de orientação acadêmica,

deu-me a exata dimensão da humildade, da serenidade e do despojamento, possíveis somente a

intelectuais que alcançaram seu patamar de sabedoria. Ao compartilhar sua sensibilidade, seus

conhecimentos acadêmicos e os inumeráveis trabalhos publicados, com os quais enriquece o mundo

acadêmico e a sociedade, o estimado Professor permitiu-me converter as dúvidas em convite para a

busca de respostas, assim como renovar meu entusiasmo para com a vida acadêmica e meu

compromisso para com a educação propriamente dita.

Meus agradecimentos se estendem ainda aos colegas e amigos da UFMG e da escola em que

leciono, muitos deles apoiando, direta ou indiretamente, minha empreitada.

Como uma instituição se faz, antes, com os seres humanos que com as coisas de que dispõe em

salas, laboratórios, bibliotecas e outros, a FUNEDI / UEMG revelou-me o valor de profissionais e

pessoas, e inicio agradecendo aos professores Drª Helena Alvim Ameno e Dr. Paulo Sérgio

Carneiro Miranda, que, na composição da Banca Examinadora de Qualificação, contribuíram

significativamente para a consolidação do meu trabalho.

Estendo meus agradecimentos aos demais professores, que, portadores de diferentes formações e

histórias, possibilitaram múltiplos e enriquecedores olhares sobre os objetos de estudo e sobre a

realidade que compusemos e que dia a dia ajudamos a compor.

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Ainda na perspectiva de que uma instituição é o resultado do que delas fazem as pessoas, agradeço

a todo o pessoal da secretaria da FUNEDI / UEMG, em particular na pessoa da Mônica e da Rose,

das quais, para lembrar com carinho, é preciso parafrasear o poeta, registrando que no atendimento

às nossas demandas “traziam sempre um sorriso franco no rostinho encantador”...

Agradeço também o carinho, a cumplicidade e a fraternidade de amigos com quem muito aprendi

na trajetória do mestrado, dentre eles o Ademilson, a Nagete, a Nália e o Túlio

Meus agradecimentos à Coordenadora do Curso de Graduação em Pedagogia da UFMG, Profª. Drª.

Mônica Correia Baptista, que prontamente atendeu à minha demanda por inserção naquela unidade

de ensino, de forma a viabilizar a pesquisa de campo.

Meu agradecimento muito especial, por fim, dirijo às estudantes do curso de Pedagogia – Formação

Complementar em Alfabetização, Leitura e Escrita, com ingresso na instituição em 2006/1, que me

deram mais que testemunhos sobre o pragmatismo da sua relação com o hipertexto na seara do

conhecimento acadêmico. Em cada uma das entrevistadas, o semblante, a voz, os gestos e as

palavras me davam notícia de que, se o universo da educação ainda é tratado com tanta

insensibilidade por parte do Poder Público, existe a possibilidade de que o quadro se reverta com a

abnegação de profissionais como já o são algumas das estudantes e como o serão as demais. Afinal,

muitas delas, depois de uma jornada diária de trabalho (em alguns casos, duas jornadas, no cuidado

com a casa, o marido, os filhos), permitem-se chegar à faculdade para suas aulas noturnas,

superando o cansaço com a força do sorriso e do sonho que perseguem... e hão de realizar!

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“Em geral é um erro pensar as relações entre antigos e novos dispositivos de comunicação em termos de substituição. (...) O cinema não eliminou o teatro, deslocou-o. As pessoas continuam falando-se após a escrita, mas de outra forma. As cartas de amor não impedem os amantes de se beijar. As pessoas que mais se comunicam via telefone são também aquelas que mais encontram outras pessoas.”

Pierre Lévy

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RESUMO

É inconteste a progressiva incorporação das chamadas novas tecnologias da informação e da

comunicação à vida em sociedade e, em seu âmbito, aos ambientes formais de educação, o que

deflagra processos de reorientação de paradigmas conceituais, axiológicos e comportamentais, na

composição de uma outra cultura, a cibercultura. Tendo em vista o cenário que se redesenha na

contemporaneidade face as interações nos diversos ambientes e, em particular no ciberespaço, assim

como a abrangência e relevância do fenômeno hipertextual nesse contexto, a presente pesquisa

adotou como objetivo investigar como se situa, na formação universitária, a exploração do

hipertexto na construção do conhecimento, tendo em vista sua concepção não-linear de

(de)composição textual, disposta em rede, com múltiplos caminhos e possibilidades de produção de

sentidos. Para tanto, a metodologia adotada valeu-se da revisão de literatura, em particular com

recurso aos estudos de autores como Chartier, Lévy e Santaella, bem como a pesquisa de campo

junto a estudantes de graduação do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade

Federal de Minas Gerais – FaE/UFMG, por meio de questionário que foi objeto de análise

quantitativa e qualitativa. Os resultados possibilitaram constatar que há subutilização do hipertexto

para fim de construção do conhecimento no âmbito da formação universitária naquele contexto.

Todavia, verificou-se que o fenômeno não se dá em virtude da dificuldade de acesso aos recursos de

informática, nem como decorrência da falta de domínio das ferramentas tecnológicas ou da

inaptidão para empreender a leitura hipertextual. A subutilização relaciona-se, em última análise, à

prevalência da cultura gutenberguiana, que relega a segundo plano os recursos da rede digital em

favor do suporte impresso (livros, periódicos etc.), considerado mais confiável e mais convidativo

em virtude de sua materialidade. Relaciona-se também à lógica cartesiana que persiste na cena

contemporânea, situando mestre e aprendiz, assim como ensino e aprendizagem, em relações

dicotômicas, fazendo com que o estudante de graduação busque prioritariamente, para fim de

validação das informações acessadas na rede, a intervenção do professor, tomado como detentor do

saber. Essa conduta secundariza outras formas de validação das informações, como, por exemplo,

seu cotejamento a partir de variadas fontes, secundarizando, nesse diapasão, o exercício da

autonomia intelectual na ação cognoscente.

Palavras-chave: Tecnologias e formação universitária. Hipertexto. Construção do conhecimento.

.

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ABSTRACT

It is undisputed the gradual incorporation of so-called new technologies of information and

communication to life in society and in its scope, the formal educational environments, which

triggers the process of paradigm shift conceptual, axiological and behavioral composition of another

culture, the cyberculture. Given the scenario that redraws the contemporary face interactions in

different environments, particularly in cyberspace, as well as the scope and relevance of the

phenomenon of hypertext in this context, this research adopted to investigate how to lie in the

education, exploration of hypertext in the construction of knowledge in order to design non-linear

(de) composition text, ready network, with multiple paths and possibilities of production of

meaning. Therefore, the methodology drew on the literature review, in particular the use of studies

by authors such as Chartier, Levy and Santaella, as well as field research among the graduate

students of the pedagogy course at the Faculty of Education, University Federal de Minas Gerais -

SAF / UFMG, through a questionnaire that was subject to quantitative and qualitative analysis. It

was possible to see that there is underuse of hypertext to knowledge construction in the university in

that context. However, it was found that the phenomenon does not occur due to the difficulty of

access to computing resources, or as a result of lack of knowledge of technology tools or the

inability to engage in reading hypertext. The divergence is related, ultimately, the prevalence of

culture Gutenberg, which relegates to the background features of the digital network in favor of

print media (books, periodicals, etc..), Considered more reliable and more inviting because of its

materiality . It is also related to the Cartesian logic that persists in the contemporary scene, standing

master and apprentice, as well as teaching and learning in dichotomous relations, making the

graduate student seeks primarily for purposes of validating the information accessed on the

network, the intervention of the teacher, taken as a keeper of knowledge. This approach reduce

other forms of validation of information, for example, their collation from various sources,

sidelines, in the tuning fork, the exercise of intellectual autonomy in knowing action.

Keywords: Technology and university education. Hypertext. Construction of knowledge.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Gráfico 1 Distribuição das entrevistadas segundo sua ocupação .......................................... 91

Gráfico 2 Distribuição das entrevistadas por tempo de disponibilidade de

computador/Internet em casa ................................................................................ 92

Gráfico 3 Distribuição das entrevistadas quanto aos conhecimentos/usos de programas ..... 92

Gráfico 4 Distribuição das entrevistadas por local de acesso ................................................ 93

Gráfico 5 Distribuição das entrevistadas por periodicidade de uso/semana .......................... 93

Gráfico 6 Distribuição das entrevistadas por tempo de uso a cada acesso ............................ 94

Gráfico 7 Distribuição das entrevistadas quanto à finalidade dos acessos ............................ 95

Gráfico 8 Distribuição das entrevistadas por sítios utilizados para leitura /pesquisa

acadêmica .............................................................................................................. 95

Gráfico 9 Distribuição das entrevistadas pelos modos de busca na rede ............................... 98

Gráfico 10 Distribuição das entrevistadas quanto ao comportamento na leitura – navegação 98

Gráfico 11 Distribuição das entrevistadas quanto ao uso que fazem das informações ........... 100

Gráfico 12 Distribuição das entrevistadas quanto à confiança dos sítios ................................ 101

Gráfico 13 Distribuição das entrevistadas quanto à busca de validação das informações ...... 102

Quadro 1 Leitor imersivo: níveis de proficiência ..................................................................

82

Quadro 2 Estruturação do curso ............................................................................................

87

Tabela 1 Evolução do número de instituições por categoria administrativa ........................

36

Tabela 2 A UFMG em números ...........................................................................................

85

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas

ANPED – Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEALE – Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita

CECIMIG – Centro de Ensino de Ciências e Matemática de Minas Gerais

CEP – Comitê de Ética em Pesquisa

CETIC.br – Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação

CNE – Conselho Nacional de Educação

CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

ENADE – Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes

FaE – Faculdade de Educação

FUMP – Fundação Mendes Pimentel

FUNEDI – Fundação Educacional de Divinópolis

GAME – Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais

IES – Instituições de Ensino Superior

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação e Cultura

NETE – Núcleo de Estudos Trabalho e Educação

NIC.br – Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR

REUNI – Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior

UEMG – Universidade do Estado de Minas Gerais

UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais

UMG – Universidade de Minas Gerais

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 15

Objetivo geral ........................................................................................................................... 18

Objetivos específicos ................................................................................................................ 18

Problematização ....................................................................................................................... 18

Hipóteses .................................................................................................................................. 19

Referencial teórico-metodológico ............................................................................................ 19

Estrutura ................................................................................................................................... 22

1. EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA EM DIÁLOGO NA CENA CONTEMPORÂNEA 25

1.1. Contextualizando: das incertezas a outras relações com o mundo e com o conhecimento 25

1.2. Tecnologias da informação e da comunicação ou novas tecnologias .............................. 26

1.3. Informação e conhecimento no ciberespaço ...................................................................... 28

1.4. Educação face as novas possibilidades e desafios contemporâneos ................................. 30

1.5. Educação superior e tecnologias: trajetórias que se cruzam ............................................ 33

2. LINGUAGEM, TEXTO E HIPERTEXTO...................................................................... 39

2.1. Do elo perdido às múltiplas concepções de linguagem .................................................... 39

2.2. Texto, possibilidades de leitura ........................................................................................ 43

2.3. Em múltiplos cenários, a prática social da leitura e os diferentes perfis de leitores ........ 47

2.4. Hipertexto: um conceito polifônico, mas não polissêmico .............................................. 52

2.5. Texto e hipertexto, nem iguais, nem opostos ................................................................... 53

2.6. (Hiper)leitura, alfabetização e letramento digital ............................................................. 61

3. CIBERESPAÇO, CIBERCULTURA E CIBERLEITOR .............................................. 68

3.1. Reterritorializações em espaços simbólicos ...................................................................... 68

3.2. O não-lugar como abrigo do coletivo: desafios e possibilidades ...................................... 71

3.3. Cibercultura, comportamentos e movimentos sociais ....................................................... 75

3.4. Cibercultura e educação: um novo cenário ....................................................................... 78

3.5. O ciberleitor ou o leitor imersivo: perfis múltiplos, mas não excludentes ........................ 80

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4. PESQUISA DE CAMPO ................................................................................................... 84

4.1. À guisa de contextualização: a UFMG e o curso de Pedagogia ........................................ 84

4.1.1. A Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG ................................................ 84

4.1.2. O curso de Pedagogia .............................................................................................. 86

4.2. Aplicação do questionário e metodologia de análise dos dados levantados ..................... 88

4.2.1. O perfil dos entrevistados: sexo, faixa etária e ocupação ....................................... 90

4.2.2. Acesso:disponibilidade de recursos e conhecimento de informática ...................... 91

4.2.3. Frequência: local, periodicidade e tempo de acesso ............................................... 93

4.2.4. Intencionalidade: acessos e usos dos recursos da rede ........................................... 94

4.2.5. Leitura hipertextual: categorização, concentração e usos ....................................... 97

4.2.6. Validação: confiabilidade e verificação da (im)procedência das informações ....... 101

4.2.7. Produção e sentido: da informação ao conhecimento ............................................. 102

4.2.8. Ordem de importância dos meios/suportes para as pesquisas acadêmicas ............. 104

4.2.9. Importância do hipertexto eletrônico na vida acadêmica ....................................... 105

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................

109

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 113

APÊNDICES ........................................................................................................................... 118

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INTRODUÇÃO

O saber fragmentado e especializado que se instaura, com a modernidade, sob a lógica cartesiana,

revela-se, na contemporaneidade, insuficiente para o enfrentamento dos desafios locais e globais,

inclusive aqueles atinentes às desigualdades sociais crescentes e à crise ambiental sem precedentes

vivenciadas hodiernamente. O progresso científico e tecnológico, marca definitiva da Modernidade,

não levou a efeito a promessa de um mundo melhor, imune aos impactos das crises de toda ordem

que assolaram a humanidade em tempos idos. O que se tem, como legado do século XX, marcado

pelas contradições materializadas em guerras e destruição ambiental paralelas aos avanços técnicos

e científicos, é um cenário de incertezas, que torna oportuna a consideração de Morin (2005, p. 31)

de que “daí decorre a necessidade de destacar, em qualquer educação, as grandes interrogações

sobre nossas possibilidades de conhecer. Pôr em prática essas interrogações constitui o oxigênio de

qualquer proposta de conhecimento.”

Nesse contexto, para além das reservas que se devam estabelecer face as possibilidades da ciência e

da técnica, que, por si mesmas, não têm o condão de assegurar o progresso e o conforto da

humanidade, há de se ter presente a necessidade de se relacionar com ambas de forma crítico-

reflexiva, buscando a visualização de seus limites e maximizando o aproveitamento de suas

possibilidades. Sob essa orientação, revisitar o tema da formação universitária e, em seu âmbito,

investigar o lugar das novas tecnologias no exercício de construção do conhecimento no âmbito da

graduação, torna-se relevante.

Vale registrar que a sensibilidade e interesse para com esse objeto de estudo decorre, em larga

medida, da trajetória acadêmica e profissional deste pesquisador. Com dupla graduação:

licenciatura em Letras e bacharelado em Direito, seguidos de especialização em Língua Portuguesa,

Direito Civil e Psicopedagogia Institucional, sua atuação profissional se dá, há mais de duas

décadas, no magistério da língua portuguesa na educação básica. Estende-se ainda à atuação na hoje

extinta Delegacia do Ministério da Educação em Minas Gerais (na avaliação de instituições e cursos

para fim de reconhecimento) e atualmente na Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal

de Minas Gerais (na análise técnica de projetos de novos cursos e de reformas curriculares, dentre

outros). O contato com os alunos e com os cursos de graduação, sob óticas diferentes e

complementares, suscitou a importância de se pensar a linguagem (hipertextual) no contexto da

formação universitária.

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Afinal, no bojo dessas tecnologias, revela-se, dentre outros, o hipertexto (eletrônico), que,

tecnicamente, constitui, segundo Lévy:

Um conjunto de nós ligados por conexões. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens,

gráficos ou parte de gráficos, seqüências sonoras, documentos complexos que podem eles

mesmos ser hipertextos. Os itens de informação não são ligados linearmente, como em uma

corda com nós, mas cada um deles, ou a maioria, estende suas conexões em estrela, de

modo reticular. (LÉVY, 2006, p. 33)

Trata-se de uma composição textual, portanto, que extrapola os traços da textualidade tradicional,

para ensejar uma produção de sentido não-linear, dinâmica e não-determinada previamente pelo

autor. É uma concepção que, comprometida com a leitura (e pensamento) em rede, impõe a

necessidade de incorporação de novas habilidades, competências e atitudes por parte do sujeito na

comunidade letrada, sem, contudo, implicar a substituição de muitas das tradicionais, pois, como

lembra Marcuschi (2005, p. 185), “essa idéia, que parece singular e distintiva, atribuindo aos

processos de produção de sentido no hipertexto uma inovação radical em relação aos demais textos

impressos (ou orais) na forma tradicional não parece tão nova.” Consubstanciando essa percepção,

vale o registro de Lévy (2006, p. 10) de que “a sucessão da oralidade, da escrita e da informática

como modos fundamentais de gestão social do conhecimento não se dá por simples substituição,

mas antes por complexificação e deslocamento de centros de gravidade.”

Tais considerações ensejam a percepção de que há nas tecnologias da informação e da comunicação

e no próprio hipertexto uma dimensão inovadora, a qual, no entanto, não prescinde de algumas das

concepções e práticas historicamente constituídas, o que torna oportuno, no presente estudo,

examinar a (im)propriedade e o significado que assume o adjetivo nova que modifica o vocábulo

tecnologia na designação de recursos provenientes da eletrônica, da microeletrônica e das

telecomunicações.

Assim, estabelecidas as reservas necessárias para repelir eventuais mitificações relativamente às

novas tecnologias, vale considerar que, por seus traços conceituais e funcionais, o hipertexto

demanda do leitor-usuário uma conduta autônoma, portanto crítico-reflexiva, que lhe possibilite

relacionar-se com os recursos tecnológicos emergentes não como mero sujeito passivo, que a eles

adere sumariamente, reduzindo-se à condição de objeto. Diferentemente disso, requer, no exercício

dessa relação, a postura de sujeito (inter)ativo, dotado de discernimento e capacidade de decisão,

ciente de que “selecionar é uma operação de poder” (SILVA, 2002, p. 16), não podendo essa

operação, portanto, ser objeto de renúncia nem de subestima de seu valor. Vale lembrar com Motta:

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17

Selecionar informação significa reconhecer a tipificação e codificação dos signos, seu valor

em determinado tempo e espaço. Essa seleção pode não obedecer a nenhuma hierarquia ou

relação causal, e pode estar conectada sem uma lógica pré-determinada. Selecionar

informação é ser capaz de lidar com a não-linearidade e a fragmentação de nossa realidade.

(MOTA, 2001, p. 76)

A complexidade desse exercício – a seleção – invoca dimensões conceituais e funcionais do

hipertexto, o qual ressitua o leitor-usuário no ambiente virtual. Segundo Paiva:

O leitor, agora inserido em uma comunidade virtual desterritorializada e potencialmente

mais informada, terá mais participação na constituição de seu saber pela maior construção

do sentido do hipertexto que vier a ler, já que poderá verificar imediatamente o grau de

veracidade ou fundamentação de certos argumentos que costumam sustentar possibilidades

e ações de personalidades e instituições que exercem forte influência sobre o presente e o

futuro da recém chegada sociedade da informação. (PAIVA, 2005, p. 79)

Os desafios emergentes no ambiente virtual, dado o seu caráter de incipiência, aliados à formação

cartesiana que é ainda marca preponderante da educação formal contemporânea, bem como a

concepção linear que norteia as operações intelectuais de leitura e produção de sentido, em

particular na vida escolar, fazem supor que o hipertexto tem uso limitado, não se dando o

aproveitamento otimizado das suas possibilidades. Afinal, por seu caráter não-linear e pelas

possibilidades múltiplas de produção de sentido, demanda do leitor a mobilização de habilidades e

competências que não têm sido objetos de preocupação precípua da escola contemporânea, dentre

elas a autonomia intelectual para o exercício de seleção, validação e transformação da informação

em conhecimento.

Nessa perspectiva, faz-se oportuno investigar como se situam as novas tecnologias e, em particular,

o hipertexto quanto ao seu uso por estudantes de graduação, que se veem cada vez mais insertos em

ambientes virtuais de múltiplas informações, nos quais a atividade de leitura e pesquisa hipertextual

se pode dar de forma incidental, desprovida de intencionalidade; ou de forma consequente,

orientada por intencionalidade deliberada. Não se pode olvidar que o lugar ocupado pelo hipertexto

no ambiente em questão pode contribuir para determinar a relação entre o sujeito cognoscente e as

novas tecnologias e, por extensão, entre o sujeito cognoscente, a informação e o conhecimento

propriamente dito. Assim, o presente estudo pode se constituir numa contribuição para gestores

educacionais, docentes e discentes quanto a refletir e (re)orientar o uso dos recursos hipertextuais na

construção do conhecimento. Para levá-lo a efeito fixam-se, então, os objetivos que a seguir se

expõem.

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OBJETIVO GERAL

Investigar como se situa, na formação universitária, a exploração do hipertexto na construção do

conhecimento, tendo em vista sua concepção não-linear de (de)composição textual, disposta em

rede, com múltiplos caminhos e possibilidades de produção de sentidos, de presença cada vez mais

frequente na cena contemporânea, no contexto das novas tecnologias.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Situar o hipertexto, sua concepção e significado, bem como as relações que estabelece no exercício

de produção de sentidos, tendo em vista autores e leitores-usuários na cena contemporânea.

Examinar, em diálogo com a literatura pertinente, as possibilidades da atividade hipertextual na

construção do conhecimento universitário no nível da graduação.

Verificar a situação – relevância, pertinência, usos, relações e significados – da atividade

hipertextual no ambiente da graduação em Pedagogia da Universidade Federal de Minas Gerais -

UFMG, a partir da coleta e apreciação de informações de alunos do referido curso, por meio de

questionários a serem respondidos por escrito, individualmente.

PROBLEMATIZAÇÃO

A incorporação crescente das novas tecnologias nos diversos contextos da vida social e, em

particular, no âmbito da educação formal, coloca o hipertexto como alternativa de valor relevante

para o exercício do pensamento em rede e da construção cognitiva, em particular na seara

acadêmica, dada a sua concepção não-linear, dinâmica, e aberta a interferências de um leitor-autor

autônomo e crítico-reflexivo. Dessa situação, emerge a propriedade e relevância de se indagar:

“Qual é o significado do hipertexto, na cena contemporânea, na construção do conhecimento do

estudante de graduação, tendo em vista suas possibilidades estruturais e funcionais e a conduta

adotada pelo sujeito cognoscente quanto a acessar, selecionar, relacionar e validar as informações

disponíveis para fim de produção de sentido, de ressignificação do conteúdo presente no

ciberespaço.”

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HIPÓTESES

A incipiência do conceito e da atividade hipertextual no ambiente eletrônico, aliada à cultura da

linearidade da leitura e do pensamento, levados a efeito no bojo das práticas curriculares que ainda

se fazem presentes na cena contemporânea, levam a supor que o hipertexto é tratado de forma

assistemática, sem a suficiente intencionalidade da parte do usuário, que adotaria práticas

discutíveis de seleção e validação das informações disponíveis. Essa conduta comprometeria, então,

o desejado tratamento da informação, dificultando sua conversão em conhecimento, o que

redundaria na subutilização do hipertexto como recurso de construção cognitiva do graduando para

sua formação universitária.

REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO

A presente investigação parte do conceito de linguagem identificado com as múltiplas interações

sociais, balizado na concepção sociointeracionista de Vygotsky (2003). Aborda tais interações sob a

égide das teorias do discurso e da enunciação bakhtinianas, bem como de seus estudos acerca dos

processos intertextuais, presentes na atividade hipertextual. Considera ainda teorias da construção

cognitiva, abordadas por Santaella (2007a), contextualizando o ato e o processo de cognição na

seara da graduação. Nesse cenário, suscitam-se as variáveis históricas, culturais e sociais imbricadas

com a construção do conhecimento e com o ato de leitura propriamente dita, com lastro também nos

estudos de Chartier (1999, 2007), na medida em que se trata de fenômenos e práticas sociais por

excelência. Contempla-se ainda o trinômio tecnologia, informação e conhecimento,

consubstanciados por estudos de Lévy (2006).

Destaque-se que tais referências teóricas são apropriadas dialógica e dialeticamente para situar a

categoria hipertextual enquanto atividade de produção de sentido no bojo das novas tecnologias na

cena contemporânea, bem como para examinar essa categoria e seu significado na construção do

conhecimento no ambiente universitário. Por fim, consubstancia-se a investigação da atividade

hipertextual na formação universitária, contextualizando-a nesse ambiente em que se consideram as

suas peculiaridades, de modo a possibilitar um olhar complexificador sobre o objeto, no contexto do

curso de graduação em Pedagogia da Universidade Federal de Minas Gerais.

A pesquisa se dá na dupla perspectiva: quantitativa e qualitativa, de modo a favorecer o exame

complexificado dos resultados auferidos por meio da coleta de dados. Segundo Minayo (2001, p.

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22), “a diferença entre o qualitativo-quantitativo é de natureza”. A autora registra que “o conjunto

de dados quantitativos e qualitativos, porém, não se opõem. Ao contrário, se complementam, pois a

realidade abrangida por eles interage dinamicamente, excluindo qualquer dicotomia.”

(MINAYO,2001, p.22). Nessa perspectiva é que adotamos essa orientação para o presente trabalho.

A coleta de dados, realizada por meio de questionário escrito (Apêndice A), incorpora questões de

múltipla escolha; em alguns itens são apresentadas ao pesquisando as opções “outros”,

“especificar”, “comente”; “justifique”. Incluem-se também perguntas abertas.

O universo do público da pesquisa se compõe de estudantes do curso de Pedagogia noturno da

UFMG, ingressantes no primeiro semestre de 2006 (alunos em estágio avançado de sua vida

acadêmica) que optaram por cursar a Formação Complementar em Alfabetização, leitura e escrita,

cujo objeto de trabalho se relaciona diretamente com as linguagens (hiper)textuais.

A título de esclarecimento, vale registrar que o curso de Pedagogia da Universidade Federal de

Minas Gerais (UFMG) tem funcionamento nos turnos diurno e noturno, com duração mínima de

quatro anos e meio. Adota a política de “flexibilização curricular” em curso na Universidade,

oferecendo, assim, formação complementar em: (a) Alfabetização, leitura e escrita; (b) Gestão

Educacional e Coordenação Pedagógica; (c) Educação de Jovens e Adultos e (d) Educação

Infantil.

A população-alvo da pesquisa são todos os estudantes de graduação do curso de Pedagogia –

Formação Complementar em Alfabetização, leitura e escrita, cujo ingresso data do 1° semestre de

2006, totalizando 13 (treze) alunos, conforme consignado no Apêndice B. Os sujeitos da pesquisa

foram selecionados mediante os critérios de inclusão e de exclusão, a saber:

a) Critérios de inclusão: ser aluno integrante do curso de pedagogia - Formação Complementar

em Alfabetização, leitura e escrita, noturno, da UFMG; ter ingressado no curso em 2006/1;

assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

b) Critérios de exclusão: alunos com ingresso por transferência há menos de um ano; alunos

com a matrícula trancada; alunos que se desligassem do curso até a data de aplicação do

questionário; alunos que se recusassem a assinar o Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido.

Nessa perspectiva, os sujeitos da pesquisa, excluídos dois dos respondentes que se recusaram a

participar da atividade, perfizeram um total de 11 alunos, correspondentes a 84,62% dos

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matriculados e frequentes no curso, integrantes da formação complementar em Alfabetização,

leitura e escrita, cujo ingresso se deu no primeiro semestre de 2006.

Os sujeitos foram contactados entre os meses de março e abril de 2009, mediante autorização da

Coordenadora do Curso (Apêndice C), que manifestou expressamente sua anuência para a

realização do trabalho e contou com o facilitador de este pesquisador ser integrante do quadro de

servidores da Universidade, tendo, portanto, trânsito favorecido na Instituição. A aplicação do

questionário foi realizada pessoalmente, nas dependências da Faculdade de Educação –

FaE/UFMG, que abriga o curso, no período noturno, em dia previamente agendado com cada um

dos pesquisandos, observada sua disponibilidade e antecedida da assinatura do Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice D).

Os dados foram registrados por escrito pelos próprios respondentes, em formulário fornecido por

este pesquisador e tabulados para consequente apresentação sob a forma de gráficos e tabelas

representativos dos percentuais de respostas verificadas. Além da análise quantitativa, efetivou-se

também análise qualitativa, com o escopo de conferir complexidade ao exame dos dados coletados,

privilegiando sua pertinência e relevância quanto a elucidar a questão / problema: “Qual é o

significado do hipertexto, na cena contemporânea, na construção do conhecimento do estudante de

graduação, tendo em vista suas possibilidades estruturais e funcionais e a conduta adotada pelo

sujeito cognoscente quanto a acessar, selecionar, relacionar e validar as informações disponíveis

para fim de produção de sentido, de ressignificação do conteúdo presente no ciberespaço.”

Para proceder ao exame dos dados, foi adotada a técnica de Análise de Conteúdo, definida por

Bardin como:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos,

sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores

(quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições

de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens. (BARDIN, 1977, p. 42)

Minayo (2001, p. 74) observa que, com o uso dessa técnica, é possível contemplar duas funções: (a)

verificação de hipóteses ou questões e (b) descoberta do que está por trás dos conteúdos manifestos.

Segundo a autora, “as duas funções podem, na prática, se complementar e podem ser aplicadas a

partir de princípios da pesquisa quantitativa ou da qualitativa.” (MINAYO, 2001, p. 74). Quanto à

análise propriamente dita, vale registrar que se deu sob a mediação dos conceitos e estudos atinentes

à área, em particular com lastro em Chartier (1999, 2007), Lévy (2005, 2006, 2007a, 2007b) e

Santaella (2005, 2007a, 2007b).

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Os pesquisandos foram informados de que cópias da dissertação serão oferecidas à biblioteca da

Faculdade de Educação – FaE/UFMG para fim de consulta de seus usuários. Além disso, os sujeitos

da pesquisa receberão via e-mail informações sobre os resultados da investigação e serão

comunicados sobre o endereço eletrônico para acesso ao trabalho, quando publicado.

ESTRUTURA

Tendo em vista o objetivo geral de investigar o significado (do uso) do hipertexto na construção do

conhecimento no âmbito da graduação, buscou-se tratar a concepção hipertextual não só na

dimensão do conteúdo, mas também da forma e da dinâmica que lhe é intrínseca. Assim é que,

embora os capítulos dialoguem e se complementem, é possível ao leitor adotar caminhos não

lineares para a apreciação do presente trabalho. Nessa perspectiva, a leitura de qualquer dos

capítulos, embora não se esgote em si mesma, possibilita reconhecer a organicidade e a unidade de

sentido constitutiva de cada componente, que guarda certa autonomia. Concomitantemente, assim

como nos hipertextos eletrônicos, enseja o estabelecimento de links entre si e com objetos e temas

correlatos. Esse movimento se dá tanto na leitura da versão eletrônica do texto, que viabiliza visitar

outros textos e ou ambientes por meio de hiperlinks; quanto na leitura do texto impresso, que,

diferentemente do que supõe o senso comum, não impõe necessariamente leitura linear. Ao leitor,

assim, é possibilitada a hipertextualização não só na remissão a notas de rodapé ou a autores e

obras, dentre outros, mas também na articulação flexível entre os capítulos que integram o texto.

Em suma, o presente trabalho fala do hipertexto não apenas por seu conteúdo, mas igualmente por

sua forma e funcionamento, na medida em que convida à leitura hipertextual, no bojo da qual o

leitor elege os caminhos que melhor contemplem suas expectativas e interesses.

Assim, no Capítulo I, privilegia-se a abordagem das categorias educação e tecnologia, tratadas em

diálogo na cena contemporânea. Para tanto, procede-se ao exame desse momento histórico, tendo

em vista as incertezas herdadas da era moderna e a emergência (ou retomada) da perspectiva

complexificadora como alternativa para o exercício de busca de apreensão da realidade, na sua

amplitude e caráter sistêmico. Acrescenta-se ainda o resgate da gênese e evolução das tecnologias,

bem como o exame de seus impactos sobre a vida cotidiana que se processa na sociedade da

informação (ou do conhecimento), para se apreciar, então, a educação formal face o cenário que se

redesenha na esteira da cibercultura, sob a égide da qual interagem sujeitos cada vez mais imersos

no ciberespaço, ambiente marcado pelo descentramento, atopia e dinamismo, que reorientam os

paradigmas espaço-temporais. Discorre-se, então, acerca da educação superior no Brasil, que,

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historicamente elitizada, passa a incorporar hodiernamente outros atores e as tecnologias da

informação e da comunicação, nas modalidades presencial e a distância.

No Capítulo II, o trabalho remete à consideração das categorias linguagem, texto e hipertexto,

buscando o estabelecimento dos nexos sociais, históricos, políticos e culturais, dentre outros, que

guardam entre si tais instâncias. Assim, a linguagem é tratada nas suas dimensões conceituais, as

quais historicamente se ampliam e se redesenham na esteira da oralidade, da escrita e da prática

audiovisual, que, diferentemente de se fazerem excludentes, coexistem, interpenetram-se e se

modificam contínua e dialeticamente. Nesse diapasão, examinam-se as concepções de texto e

hipertexto, bem como suas interseções e diferenças, assim como as possibilidades (e desafios) que

suscitam quanto à prática de produção de sentido, em particular no âmbito da atividade de leitura.

Nessa etapa, consideram-se os papéis cada vez mais híbridos e menos dicotômicos que assumem

leitor e autor, os quais experimentam outros lugares na prática da produção de sentido.

O Capítulo III, por sua vez, considera, de forma dialógica, os conceitos de ciberespaço, cibercultura

e ciberleitor, categorias que emergem na cena contemporânea no bojo das tecnologias da

informação e da comunicação. Tais conceitos demandam e ensejam outros comportamentos e nova

dinâmica nas interações sociais e cognitivas, em virtude da instantaneidade e mutabilidade

intrínsecas ao processo hipertextual que se compõe na esteira dos hiperlinks e das hipermídias,

reveladas sob a égide das novas tecnologias. Assim, sob a consideração de aspectos históricos,

sociais, culturais, políticos e epistemológicos, são examinados os sujeitos sociais e sua interação no

ambiente ciberespacial em que se veem ante o desafio de proceder à leitura (e produção do sentido)

incorporando, às velhas estratégias, novas competências e habilidades. Nessa etapa, realizam-se

estudos acerca do perfil do leitor imersivo1, o qual corresponde ao leitor-navegador, que, a partir

das interfaces no universo eletrônico, navega no ciberespaço.

No Capítulo IV, procede-se, então, à pesquisa de campo, a partir da contextualização deste, sob o

exercício de situação do curso de graduação em Pedagogia, bem como da instituição de ensino que

o abriga, qual seja a Universidade Federal de Minas Gerais. Ainda nessa linha de abordagem, é

retomada, de forma mais detalhada, a definição dos sujeitos da pesquisa, incorporando-se também a

consignação de seu perfil, tendo em vista, dentre outros, seu acesso aos recursos de informática.

Trata-se de forma circunstanciada a explicitação da metodologia adotada, em particular no tocante à

consideração do modus operandi das entrevistas, realizadas por meio de questionário, junto a

1 Leitor imersivo constitui designação adotada por Santaella (2007) para referir-se ao leitor navegador, que, no ambiente

eletrônico, revela variado grau de proficiência.

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estudantes em estágio avançado do curso, para, então, apropriar-se o material coletado para fim de

análise na dupla perspectiva: quantitativa e qualitativa. Tal análise possibilitou apreender o perfil do

hiperleitor, bem como o significado do hipertexto para a construção de seu conhecimento na seara

da graduação. O questionário incluiu abordagens relativas ao perfil do respondente quanto ao acesso

e uso dos recursos de informática, contemplando ainda a frequência, intencionalidade e apropriação

dos suportes eletrônicos, bem como os procedimentos de leitura hipertextual no que se refere à

categorização, concentração, usos e validação das informações, para fim de produção de sentido.

Do exame dos resultados, tem-se a identificação do perfil dos graduandos, além do levantamento de

pistas sobre o significado do hipertexto na sua atividade cognoscente. Observe-se, por fim, que o

perfil desses hiperleitores foi considerado com lastro nas categorias apresentadas por Santaella

(2007a) acerca do leitor imersivo, que a autora identifica como: leitor novato, leigo e experto.

Subsequentemente, apresentamos as considerações finais, que, diferentemente de encerrar

percepções ou conclusões definitivas, buscam, pelo exercício de retomada de toda a trajetória

investigativa, proceder a constatações que suscitem outros questionamentos, ao mesmo tempo em

que possam oferecer subsídios para sua elucidação.

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1. EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA EM DIÁLOGO NA CENA CONTEMPORÂNEA

Compreender a pertinência e relevância de se examinar o significado do hipertexto na construção do

conhecimento no ambiente da graduação requer a apreciação da relação que estabelecem entre si a

educação e as tecnologias da comunicação e informação na contemporaneidade. Para tanto, faz-se

necessário considerar dimensões conceituais, históricas, culturais, sociais e políticas, dentre outras,

com que estão imbricadas as categorias educação e tecnologia, na perspectiva dialógica, que

possibilite captar tais objetos na sua abrangência e complexidade.

1.1. Contextualizando: das incertezas a outras relações com o mundo e com o conhecimento

Num movimento de transcendência da era moderna para a contemporânea, a humanidade se vê

comprometida com a crise de paradigmas. De um lado, são incontestes os avanços científicos e

tecnológicos e, de outro, revelam-se flagrantes as desigualdades entre povos ou entre grupos sociais

no âmbito de uma mesma nação, bem como as incertezas quanto ao futuro, sobretudo em virtude da

crise ambiental sem precedentes que experimenta o planeta.

O ambiente de crise que se instaura desafia a humanidade a lidar com a incerteza. No entanto, não

se trata apenas da incerteza que se vê imbricada com a (des)continuidade da vida na Terra, mas

também aquela que se materializa na seara do conhecimento, pois, como observa Chassot (2006, p.

261), “se a ciência clássica fez da natureza algo acabado e pronto, a ciência dos dias atuais, através

de sua escuta poética, usando uma imagem de Prigogine2, reintegrou o homem ao universo que ele

próprio observa.”

Dessa mudança de perspectiva, das leis eternas para um mundo em movimento, emerge a

necessidade de se retomar, ou, como prefere Morin (2005, p. 38), enfrentar a complexidade, que

remete a “um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e

seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes entre si.”

2 Prêmio Nobel de Química em 1977, o russo Ilya Prigogine traz, com Isabelle Stengers, no livro A nova aliança,

reflexões profundas sobre as ciências e suas metamorfoses e reclama a adoção da “escuta poética” como possibilidade

de nova relação do homem com a natureza e, por extensão, com o conhecimento (inclusive de si mesmo). Da sua

contribuição, tem-se a retomada das incertezas próprias da contemporaneidade, favorecendo um olhar complexificador

da realidade.

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Como constata Bessa (2007, p. 3): “Estamos vivendo novos tempos com uma crise sem precedentes

de todos os valores com uma quebra total de fronteiras.” Fazendo coro com essa percepção, Lima

(2000, p.8) observa que “estamos no meio de um processo de transformação que nos impõe

repensar nossas relações com a realidade. E isto, sem sombra de dúvidas, pode ser considerado uma

mudança paradigmática.”

Trata-se de fenômeno que se impõe em um mundo marcado pela coexistência (e alternância) de

variáveis que deflagram, como registra Delors (2001, p. 14), tensões entre o local e o global, o

universal e o singular, a tradição e a modernidade, a competição e a cooperação, a amplitude dos

conhecimentos e a capacidade de assimilação pelo ser humano, dentre outras. Tais tensões, por

razões ontológicas, produzem olhares duais, percepções dicotômicas, em geral improdutivas,

porque excludentes, tornando pertinente o olhar dialógico e complexificador para sua superação.

Afinal, para além das dicotomizações, há de se empreender o exercício do pensamento complexo3

defendido por Morin (2005), sob a compreensão de que há de ser retomado, na seara do

conhecimento, o olhar integrador e complexificador necessário à desejada busca de apreensão da

realidade. Nas palavras de Antônio:

Precisamos superar os enclausuramentos, as divisões estanques, as rígidas separações que

isolam, que reduzem e desfiguram o conhecimento, anulando os sentidos e a compreensão,

ignorando as inumeráveis inter-relações, tanto na realidade como nas investigações e nas

aprendizagens e ensinos. (ANTÔNIO, 2002, p. 52)

A superação a que se refere Antônio (2002) torna-se ainda mais procedente (e crucial) num mundo

cada vez mais complexificado e integrado por redes de informação e de relações que se instauram

por força da apropriação humana das tecnologias da informática. Também chamadas novas

tecnologias, essas ferramentas ensejam progressivamente novas interfaces e mais amplas interações

entre seres humanos e mundos anteriormente confinados a seus territórios físicos e temporais

próprios e estanques em relação aos demais.

1.2. Tecnologias da informação e da comunicação ou novas tecnologias

O vocábulo tecnologia, cuja composição decorre da associação das palavras gregas téchné (arte) e

logos (tratado, estudo), assume a conotação de um complexo que envolve, como registra Kenski

3 Para o autor, a complexidade, intrínseca à realidade e ao próprio conhecimento, há de ser retomada a partir da ótica

integradora dos saberes, sob pena de se incorrer nos reducionismos que não comportam “o que foi tecido junto”.

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(2007, p. 24), a pesquisa, o planejamento, a criação do produto, o serviço e o processo no seu

conjunto.

As tecnologias da informática, por sua vez, frequentemente designadas por novas tecnologias,

tornam oportuno, para sua melhor compreensão, o resgate de sua significação historicamente

constituída. Assim, vale dizer que a história das tecnologias se confunde com a própria história da

humanidade, em particular a partir do momento em que o ser humano apropria os meios naturais,

objetos de adaptação por exercício de intenção deliberada, para atender as suas necessidades de

sobrevivência. Dessa apropriação resulta a confecção de ferramentas simples pela manipulação de

pedras e materiais ósseos para fim de caça, coleta de frutos e ou defesa no enfrentamento dos

predadores etc. Dessa história faz parte também a descoberta e apropriação do fogo como fonte de

energia para melhor exploração dos alimentos disponíveis in natura, para o aquecimento do

ambiente ante as intempéries e mesmo na defesa contra ataques de outros animais.

Progressivamente, essa fonte de energia se tornou determinante para a transformação de matérias-

primas e constituição de novos materiais, forjados por processos de fusão, liga e outros,

potencializando os avanços tecnológicos até a era contemporânea. De resto, vale dizer com Kenski

(2007, p. 15) que, “desde o início dos tempos, o domínio de determinados tipos de tecnologias,

assim como o domínio de certas informações, distinguem os seres humanos. Tecnologia é poder.”

A retomada das origens da tecnologia evidencia que sua associação imediatista a máquinas

mirabolantes e a complexos microinformáticos constitui concepção simplista e reducionismo

equivocado do que seja efetivamente o processo e ou o produto tecnológico, mesmo porque há

tecnologias que não se materializam exatamente em equipamentos, dentre elas a linguagem e a

própria escrita. Do equívoco conceitual referido, decorrem outros tantos, como o de que as

tecnologias trazem, em si, iminente risco à segurança ou mesmo à existência do homem no planeta;

ou, antes, o mito de que as tecnologias comportam um potencial de magia ou fetiche que pode

assegurar o progresso, a proteção e o sucesso da aventura humana.

A par das polêmicas inspiradas por tais equívocos, Lévy (2006, p. 59) pondera que a discussão

sobre as escolhas pelo “bom” ou “mau” uso da técnica não constitui simplesmente uma prerrogativa

do usuário que, num dado momento adotaria certa posição ou tomaria decisão. O autor lembra que

um computador, por exemplo, cristaliza algumas escolhas relativamente aos usos possíveis de seus

componentes e que cada um deles resulta de uma longa cadeia de decisões, as quais antecedem a

experiência última do usuário. Assim conclui Lévy:

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Estando o uso em toda parte, a questão do bom e do mau (que dependeria “apenas do uso”)

é portanto coextensiva ao processo técnico. Ela não pode ser relegada ao último plano, em

uma região, em uma região ideal e vazia onde os humanos, completamente nus, separados

dos objetos que tecem suas relações e dos meios concretos onde sua vida é constituída,

escolheriam objetivos para o melhor ou o pior e procurariam meios para realizá-los.

(LÉVY, 2006, p. 60)

Dessa forma, diferentemente de conceber as tecnologias como determinantes na condução da

aventura humana ou, numa perspectiva antinômica, conceber, sob a ótica antropocêntrica, o usuário

como o sujeito absoluto dos seus rumos, há de se reconhecer a imbricada relação que guardam,

entre si, tecnologia e ser humano, compreendendo que este a criou e a transforma, ao mesmo tempo

em que é por ela transformado, num movimento dialético.

Sob tal compreensão, vale perceber, então, a contemporaneidade como o cenário das revoluções

tecnológicas e científicas, que não se opõem nem se descolam, na medida em que estabelecem

múltiplas interfaces, assim como o fazem nas relações com a cultura, com as artes etc. Essa relação

entre tecnologia, arte, cultura e ciência, dentre outros, torna-se ainda mais flagrante quando se volta

o olhar para as tecnologias da informática, que ocupam, concomitantemente, o lugar de processo e

produto das interações entre essas instâncias do pensar e do fazer humano.

1.3. Informação e conhecimento no ciberespaço

É fato que a contemporaneidade constitui o cenário de flagrantes efeitos dos recursos tecnológicos,

mais precisamente na seara da informação e da comunicação, que se materializam no bojo dos

progressos da informática. Tais tecnologias, recorrentemente apontadas como novas, tornam

oportuno lembrar com Kenski (2007, p. 25) que, embora o adjetivo novo tenha valor semântico

variável em virtude da intencionalidade e do contexto em que se dá, “ao se falar em novas

tecnologias, na atualidade, estamos nos referindo, principalmente aos processos e produtos

relacionados com os conhecimentos provenientes da eletrônica, da microeletrônica e das

telecomunicações.” Sob essa perspectiva, torna-se, então, procedente, designar por novas as

tecnologias da informação e da comunicação.

Tais tecnologias, que se fazem cada vez mais presentes no cotidiano das diversas sociedades,

encontram campo fértil nas interações entre pessoas, grupos e nações, potencializando (e

potencializando-se) também no bojo do processo de expansão dos limites territoriais, a qual se dá

no movimento que se convencionou chamar de globalização, inicialmente de cunho econômico,

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mas inevitavelmente imbricado com outras e múltiplas dimensões, dentre elas a cultural, política

etc.

Embora não se possa olvidar que um grande contingente de pessoas e grupos sociais se acham

privados do acesso direto aos recursos da informática, estes expandiram-se significativamente nas

últimas décadas e, como registra Bessa:

As novas tecnologias, como extensões do homem, na genial visão de Marshall McLhuan4,

(1979), envolvem-nos diariamente, diante de um caixa eletrônico de banco, com o telefone

celular, com o computador, nas repartições públicas, nos consultórios médicos e em

infinitos outros tópicos. É claro que a literatura não escapa desse rolo compressor. (BESSA,

2007, p. 4)

Igualmente, as demais manifestações, quer na seara das artes, da economia, da política e da própria

educação não poderiam passar ao largo desse processo. Assim, vale dizer que os computadores,

inicialmente concebidos para fins militares e depois circunscritos aos muros da academia, ganharam

rapidamente o uso doméstico e comercial, reconfigurando sobremaneira as interações no seio das

sociedades.

Desse movimento, redesenharam-se as temporalidades e territorialidades convencionais, na medida

em que as telecomunicações possibilitaram a celeridade das informações ou mesmo a

instantaneidade de sua veiculação. Instauraram-se, então, novos parâmetros, a partir do

descentramento e da atopia intrínsecas ao conceito de hipertexto5, um complexo textual cuja lógica

dinâmica e não-linear demanda e enseja crescentemente outras interfaces e interações, constitutivas

do ciberespaço6. Para além das variáveis tempo e espaço, têm-se sujeitos que interagem sem

necessariamente ter de identificar suas referências de gênero, classe social, faixa etária e outros.

Dessa forma sua inserção nos campos de interação e debates se amplia, já que preservados dos

lugares sociais previamente fixados para os indivíduos em virtude de tais condições, isoladas ou

conjuntamente tomadas. Assim, a polifonia se torna traço flagrantemente presente nas interações

4 Filósofo canadense, McLhuan traz grandes contribuições para o exame do mundo contemporâneo a partir de teses do

mundo como uma “aldeia global”, de que “o meio é a mensagem”. Em seu livro Os meios de comunicação como

extensões do homem, examina diacronicamente as tecnologias, evidenciando a profunda implicação dos meios de

comunicação de massa para a vida humana. 5Como observa Marcuschi, “O hipertexto, aliado às vantagens da hipermídia, consegue integrar notas, citações,

bibliografias, referências, imagens, fotos e outros elementos encontrados na obra impressa, de modo eficaz e sem a

sensação de que sejam notas, citações etc. Em suma, subverte os movimentos e redefine as funções dos constituintes

textuais clássicos.” Disponível em: http://rle.ucpel.tche.br/php/edicoes/v4n1/f_marcuschi.pdf (Linguagem & Ensino,

Vol. 4, No. 1, 2001, p. 79-111), acessado em 21 jan. 2009. O hipertexto como um novo espaço de escrita em sala de

aula Luiz Antônio Marcuschi Universidade Federal de Pernambuco 6 O ambiente ciberespacial é tomado aqui com o sentido adotado por Pierre Lévy, que considera não só as informações

presentes nesse cenário, mas os seres humanos e as relações que estabelecem em seu âmbito.

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ciberespaciais, que retomam gêneros e formas discursivas convencionais ao mesmo tempo em que

inauguram novas modalidades. Nesse diapasão, as interações trazem à cena, em diálogo com a

escrita, a retomada da oralidade, que se realiza com diferentes configurações. Dá-se um processo

em que fala e escrita se modificam dialeticamente, incorporando ainda outros recursos expressivos a

exemplo do que se vê em chats, e-mails, blogs, fóruns de discussão, comunidades virtuais e outros,

no âmbito dos quais múltiplas mídias possibilitam agregar ao discurso os recursos gráficos estáticos

da escrita convencional, o movimento das imagens multiformes e uma infinidade de sons, na esteira

das hipermídias.

Em cenário tão diferenciado das interações humanas, a velhas competências se associam outras,

inovadoras por excelência, para fazer frente aos desafios e possibilidades comunicativas no cenário

hipertextual. Como lembra Komesu (2005, p. 107), “o hipertexto obriga a pensar em redefinições

curriculares, na revisão e na identificação de fontes, no estabelecimento de um corpo de

conhecimentos que permita a ordenação do fragmentário.” Concomitantemente às estratégias

interacionais emergentes no mundo virtual, há o volume e a celeridade sem precedentes das

informações disponíveis, demandando cada vez mais dos sujeitos sociais a mobilização de

habilidades e competências para lidar com a informação, sobretudo no sentido de apropriá-la em

favor da construção do conhecimento. É o ambiente em que alternam categorias como sociedade da

informação e sociedade do conhecimento, não como instâncias antinômicas, mas como dimensões

de imprecisos contornos, que se fundem e, não raro, confundem-se. De resto, os efeitos da

tecnologia mostram-se complexos e abrangentes e, como lembra Kenski:

A evolução tecnológica não se restringe apenas aos novos usos de determinados

equipamentos e produtos. Ela altera comportamentos. A ampliação e a banalização do uso

de determinada tecnologia impõem-se à cultura existente e transformam não apenas o

comportamento individual, mas o de todo o grupo social. (KENSKI, 2007, p. 21)

Nesse diapasão, as transformações alcançam os múltiplos espaços e contextos da sociedade, o que

inevitavelmente há de se manifestar na seara da educação.

1.4. Educação face as novas possibilidades e desafios contemporâneos

Comprometida com os processos de ensino e aprendizagem para a vida em sociedade, a educação

assumiu historicamente diferentes papéis e adotou diferentes caminhos e estratégias de forma a

potencializar no indivíduo (e nos grupos) a prática da convivência. Desenvolvendo-se de modo

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informal e ou institucional, nos domínios das escolas nas suas mais diversas configurações, a

educação fez-se mecanismo de transmissão de conceitos e valores em dados momentos e contextos,

sendo também recurso para a formação do indivíduo para a prática social.

Como destaca Portela (2009, p.37): “Em diferentes tempos históricos e nas diferentes sociedades,

então, a educação é apropriada como possibilidade de preparação e transformação do ser humano,

ora para se adaptar (ou se submeter) à ordem vigente, ora para compreendê-la, intervir e transformá-

la.”

Quaisquer que tenham sido as orientações político-filosóficas ou técnico-pedagógicas adotadas, a

prática educacional sempre se deu com imbricadas relações com o contexto histórico em que se

processou, refletindo e constituindo, dialogicamente, referenciais éticos, culturais e conceituais

acerca da sociedade em que se efetivou.

Sendo assim, na cena contemporânea, a educação não poderia passar ao largo das transformações

experimentadas pela sociedade, em âmbito local e global, quanto às mudanças de paradigmas, às

incertezas e às perspectivas face as transformações culturais, tecnológicas e científicas hodiernas.

Trata-se de uma sociedade caracterizada, como já referido, pela instantaneidade e mutabilidade num

processo potencializado pelas tecnologias da informação e da comunicação, que desenham um

cenário de diferentes temporalidades e territorialidades. Nesse ambiente, informação e

conhecimento, como marcas da cena contemporânea, tornam oportuno refletir com Gadotti:

Costuma-se definir nossa era como a era do conhecimento. Se for pela importância dada

hoje ao conhecimento, em todos os setores, pode-se dizer que se vive mesmo na era do

conhecimento, na sociedade do conhecimento, sobretudo em conseqüência da

informatização e do processo de globalização das telecomunicações a ela associado. Pode

ser que, de fato, já se tenha ingressado na era do conhecimento, mesmo admitindo que

grandes massas da população estejam excluídas dele. Todavia, o que se constata é a

predominância da difusão de dados e informações e não de conhecimentos. (GADOTTI,

2000, p. 7)

Embora informação e conhecimento guardem tão estreita relação e tenham seu valor comprometido

com o contexto em que se manifestam, o desafio de lidar com a informação demanda o

desenvolvimento de habilidades e competências, as quais a educação, sobretudo no âmbito formal,

não pode ignorar. Afinal é preciso dispensar intencionalidade política e técnico-pedagógica para

lidar com o cenário em cujo âmbito se revela o desafio de apropriação e conversão da informação

em conhecimento, já que aquela se apresenta com volume e celeridade sem precedentes.

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Face o quadro presente, emerge o desafio para a sociedade (e para a educação) de prover os meios

para que os sujeitos sociais possam se fazer mais que usuários de recursos tecnológicos portadores

de informações. É preciso alcançar o patamar de sujeitos cognoscentes, que constroem seu

conhecimento e contribuem para a sua produção num continuum, tendo presentes as possibilidades

hipertextuais, as quais, ao mesmo tempo em que ensejam intervenção ativa do leitor, por exemplo,

na construção de seus caminhos de leitura, impõem-lhe alguns limites. Acerca de tais limites,

pondera Coscarelli:

A liberdade do leitor no hipertexto, por sua vez, não é tão infinita quanto parece. Para

atingir seus objetivos, o leitor precisa percorrer determinados caminhos e rejeitar outros. Os

links que o leitor de hipertexto vai encontrar não são infinitos, mas foram predefinidos pelo

produtor daquele material e permitem que o leitor vá somente a alguns lugares

determinados no texto e não a qualquer lugar que desejar (ele não pode ir onde não há links,

por exemplo – para isso, vai precisar sair do texto e buscar informações em outros

lugares/sites). Em outras situações, o leitor não tem escolhas, o caminho é um só. Pense,

por exemplo, num site de banco em que para saber o saldo de sua conta bancária, o usuário

deve percorrer sempre o mesmo caminho. (COSCARELLI, 2005, p. 112)

Tendo em vista tais possibilidades e desafios, Kenski considera:

Em relação à educação, as redes de comunicações trazem novas e diferenciadas

possibilidades para que as pessoas possam se relacionar com os conhecimentos e aprender.

Já não se trata apenas de um novo recurso a ser incorporado à sala de aula, mas de uma

verdadeira transformação, que transcende até mesmo os espaços físicos em que ocorre a

educação. (KENSKI, 2007, p. 47)

Assim, face essas possibilidades e os desafios que as acompanham, há de se reconhecer que novas

temporalidades e territorialidades apresentam-se no bojo do progresso tecnológico, em que as

distâncias físicas são superadas pelas interações em rede e o tempo linear se vê coexistindo com os

tempos do usuário, que interage no ciberespaço sob a égide de sua própria referência temporal ou de

forma simultânea nos fóruns, na perspectiva do chamado tempo real.

Há de se ter presente também a impossibilidade (e impropriedade) de se continuar privilegiando a

ótica transmissiva de conteúdos. O conhecimento deve se constituir, antes, em atividade subjetiva,

que o sujeito cognoscente empreende sob o anteparo da autonomia intelectual, que deve

progressivamente desenvolver, sob pena de se fazer mero portador de informações, às quais venha

ter acesso passivo e a-crítico no ambiente ciberespacial.

Igualmente, é preciso estar alerta, de forma a não incorrer em percepções reducionistas e simplistas

de que as tecnologias da informação e da comunicação concorrem para a minimização de esforços

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do sujeito cognoscente, já que dele demandam iniciativa, reflexão e crítica como membro ativo (e

pró-ativo) das redes de conhecimento. Nessa direção, Coscarelli (2005), lembrando que a leitura é

uma atividade cognitiva complexa e multifacetada, destaca:

O hipertexto não traz em si nenhuma transformação miraculosa nos atos de ler e aprender.

O hipertexto precisa ser visto como um formato de texto que exige, como todos os outros,

do leitor envolvimento com o texto e habilidades de leitura variadas dependendo da tarefa

que ele precisa desempenhar (COSCARELLI, 2005, p. 123).

Há de se repelir ainda o equivocado entendimento de que as tecnologias podem tornar menos

oneroso, a priori, o processo de ensino-aprendizagem, cujas novas configurações prescindiriam do

professor. Diferentemente disso, a ele caberá outro papel e, nas palavras de Arruda:

A inovação no trabalho docente pode ser constatada não pelo uso puro e simples do

computador em seu cotidiano, mas a partir do momento em que esses equipamentos alteram

de forma significativa o olhar do docente diante do seu trabalho, suas concepções de

educação, seus modelos de ensino-aprendizagem etc (ARRUDA, 2004, p. 68).

Afinal, ao docente se reserva importante papel nesse contexto, todavia não mais como o detentor de

um saber pronto e acabado a ser transmitido, mas como mediador dos processos de cognição. A ele

cabe, dentre outros, diagnosticar, planejar e levar a efeito estratégias pedagógicas concorrentes para

o sucesso da empreitada de ensino-aprendizagem.

Também com Arruda (2004, p. 126) vale dizer que “a grande discussão não é falar se o computador

entra ou não entra na escola, mas sim como ele entra, como se ensina e como o professor trabalha

com ele.” Em suma, não se trata mais de discutir se as tecnologias da informática, ou novas

tecnologias, devem ou não ser incorporadas ao pensar e ao fazer na seara educacional, uma vez que

esse processo já está deflagrado. Há de se buscar, sim, o necessário e promissor diálogo entre esses

campos, repelindo as correntes que buscam fragmentar “o que foi tecido junto”. (MORIN, 2008, p.

35).

1.5. Educação superior e tecnologias: trajetórias que se cruzam

Nesse diapasão e tendo em vista o objeto do presente trabalho, qual seja o hipertexto na construção

do conhecimento para a formação universitária, vale revisitar o ambiente da educação superior, em

que as tecnologias da informação e da comunicação se fazem cada vez mais presentes; ora por

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iniciativas isoladas dos graduandos, ora por ação deliberada dos docentes e das instituições

propriamente ditas.

Nesse contexto, vale retomar a instauração da educação superior no Brasil, que se inicia com a

vinda da Família Real para a então Colônia Portuguesa, em virtude da iminência da invasão das

tropas de Napoleão a Portugal, que conflitara com o interesse francês ao apoiar a Inglaterra por

razões comerciais. Esse nível de ensino foi objeto de particular cuidado do Governo Imperial, em

detrimento do ensino básico. Segundo Portela:

Enquanto se verificou esse cuidado com a promoção do ensino superior, o que se deu com

os outros graus de ensino foi a sua descentralização, conferindo às províncias a

responsabilidade por administrá-los, fato que concorreu decisivamente para a sua precária

condução, de forma desintegrada e dissonante. (PORTELA, 2009, p. 38)

Na avaliação de Romanelli (2006, p. 38): “A presença do príncipe Regente D. João, por 12 anos,

trouxe sensíveis mudanças no quadro das instituições educacionais da época. A principal delas foi,

sem dúvida, a criação dos primeiros cursos superiores (não-teológicos) na Colônia.”

O movimento que redesenha o quadro da educação no Brasil, no entanto, não se constitui em uma

reforma educacional propriamente dita, mas, ainda conforme Romanelli (2006, p. 38), reflete a

deliberada intenção de assegurar educação para uma elite aristocrática e nobre, em detrimento dos

demais níveis de ensino, que experimentaram flagrante abandono.

Situando o movimento de instauração e crescimento da educação superior no Brasil, é oportuno

retomar com Colossi et al. (2001) algumas datas que constituem referência da trajetória desse nível

de ensino, dentre elas o ano de 1827, em que se dá a criação em São Paulo e Olinda, dos cursos

jurídicos. Já no início da era republicana, em 1889, tem-se a criação de 14 Escolas Superiores. Os

anos de 1909 e 1912 registram, respectivamente, a criação da Universidade de Manaus e a do

Paraná, articuladas à força produtiva de tais estados; este marcado pelo ciclo da cultura cafeeira e

aquele, pelo ciclo da borracha. Registram-se ainda em 1920 a criação das Universidades do Rio de

Janeiro e, em Minas Gerais, no ano de 1927, a fundação da Universidade de Minas Gerais (UMG),

instituição privada, subsidiada pelo Estado, constituída pela união das quatro escolas de nível

superior existentes à época em Belo Horizonte. E também a Universidade de São Paulo em 1937 e a

Universidade de Brasília em 1961.

Historicamente, a educação superior constituiu-se em ambiente de acesso a minorias privilegiadas,

tanto em virtude dos mecanismos de seleção, que restringiram sobremaneira o acesso, quanto em

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decorrência da dificuldade de permanência, já que impunha a necessidade de adiamento da inserção

do estudante no mercado de trabalho. O caráter seletivo e excludente que marcou a educação no

Brasil fez com que a busca pela educação superior deixasse de ser objeto sequer de ambição por

expressiva faixa da população, que via na formação básica ou propedêutica, muitas vezes aliada à

formação técnica e ou profissionalizante, a resposta mais imediata aos seus anseios e necessidades.

Nesse sentido, vale dizer com Colossi et al.:

A expansão do ensino superior até 1994, no Brasil, tem traços de qualidade insuficiente,

resultado de um processo de crescimento destituído de avaliações das instituições e cursos.

A marca do ensino superior nesta fase é dada pelo caráter elitista do setor público, que

restringe o número de vagas oferecidas no período noturno. O cidadão que trabalhasse, em

sua maioria integrante da população de menor renda, teria oportunidade de acesso apenas às

instituições privadas, com qualidade inferior (COLOSSI et al., 2001, p. 52).

Nos anos que precederam a promulgação da Lei 9394/96, que fixou as Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, antecedida de exaustivos debates, correlações de forças e tentativa de

prevalência de interesses segmentados, deu-se, no entanto, grande efervescência no cenário da

educação no Brasil.

Como extensão e reflexo desse movimento, a educação superior extrapola de uma concepção rígida

e controlada por instrumentos como os Currículos Mínimos fixados para os cursos de graduação e

por instituições como o Conselho Federal de Educação, a Secretaria de Educação Superior e as

Delegacias Regionais do MEC; para uma concepção flexível, ancorada em Diretrizes Curriculares e

avaliações sistêmicas, representadas na atualidade pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação

Superior - SINAES e pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes - ENADE, em políticas

e ações orquestradas pelo Conselho Nacional de Educação – CNE e pelo Instituto Nacional de

Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, órgãos integrantes do Ministério da

Educação.

Como novidade, para além da flexibilidade relativa no monitoramento federal (e estadual) aos

cursos de graduação das Instituições de Ensino Superior – IES, deflagra-se um processo de

expansão, sem precedentes desse nível de ensino. Inicialmente, a expansão se dá de forma mais

expressiva na esteira da iniciativa privada, haja vista o que destaca o Censo da Educação Superior /

INEP/ 2003, nos termos da tabela seguinte:

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TABELA 1

Evolução do Número de Instituições por Categoria

Administrativa - Brasil 1997-2003

Ano Pública Δ% Privada Δ% Total Δ%

1997 211 - 689 - 900 -

1998 209 – 0,9 764 10,9 973 8,1

1999 192 – 8,1 905 18,5 1.097 12,7

2000 176 – 8,3 1.004 10,9 1.180 7,6

2001 183 4,0 1.208 20,3 1.391 17,9

2002 195 6,6 1.442 19,4 1.637 17,7

2003 207 6,2 1.652 14,6 1.859 13,6

Fonte: Deaes/INEP/MEC7, 2003, p. 8.

Mediante os dados em exame, que se referem à evolução do número de vagas nos processos

seletivos para ingresso na graduação entre 1993 e 2003, “observa-se que a partir de 1997 as taxas

passam a distanciar-se, mostrando maior crescimento no setor privado, coincidindo com o período

em que houve um acelerado crescimento do número de instituições privadas no Brasil.” (BRASIL,

2004, p. 19)

No ano de 2003, no entanto, a partir de iniciativa do Governo Federal, deflagra-se um processo de

expansão da oferta pública de ensino de graduação, que encontra, no ano de 2006, o seu ápice com

o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – REUNI8, instituído pelo

Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007, sob a égide da Secretaria de Educação Superior do

Ministério da Educação, que provoca as universidades públicas a adotarem a ampliação das vagas e

a criarem novos cursos com ênfase na oferta noturna.

7 Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Diretoria de

Estatísticas e Avaliação da Educação Superior. Censo da Educação Superior 2003. Resumo Técnico. Brasília, 2004.

Disponível em: < http://www.inep.gov.br/download/superior/censo/2004/resumo_tecnico_050105.pdf > Acesso em: 02

mai. 2009. 8 O programa REUNI constitui o segundo ciclo do processo de expansão da oferta pública de ensino superior, que se

constitui de três etapas: (i) Expansão para o interior (2003/2006), com a criação de dez universidades federais em todas

as regiões e ampliação da oferta de vagas em instituições de ensino superior públicas já existentes; (ii)Expansão com

Reestruturação (2007/2012), por meio do REUNI, que, de caráter voluntário, alcançou a adesão das 54 instituições de

ensino superior existentes até 2007; (iii) Expansão com ênfase nas interfaces internacionais (2008), prevendo a criação

de universidades federais em regiões territoriais estratégicas, para fim de cooperação internacional sob liderança

brasileira. (BRASIL, 2009) REUNI: reestruturação e expansão as universidades federais. Ministério da Educação.

Disponível em: < http://reuni.mec.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=15&Itemid=2 > Acesso em:

27 abr. 2009.

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Potencializando o movimento de expansão da oferta, dá-se a adoção, sob o anteparo também da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, da modalidade de educação a distância e semi-

presencial, incorporando as chamadas novas tecnologias da informação e da comunicação. Essa

modalidade possibilitou, mediante a racionalização dos recursos disponíveis, explorar estratégias e

dinâmicas de ensino-aprendizagem que favoreceram o expressivo incremento da oferta de vagas,

que vão se fazendo acessíveis a estudantes de menor poder aquisitivo, os quais demandam

flexibilidade quanto à gestão de seu tempo e mobilidade que o território virtual favorece,

diferentemente do ambiente material, que requer deslocamento e presença física.

Esse movimento suscita reflexões e críticas, a exemplo do que se vê em Colossi et al. que destaca:

É sempre preciso observar que nas transformações econômicas é que se encontram regras e

padrões para a adequação do ensino. A educação dos tempos atuais relaciona-se

profundamente com um “campo de forças” ligado ao futuro. MENEZES (1983)9 considera

que a busca pela educação reflete a crença disseminada na função de instrumento de

qualificação profissional e de promoção de desenvolvimento político-econômico, social e

cultural. Neste novo cenário, as IES passam a representar a fonte de propostas para superar

desafios de desenvolvimento social e econômico. (COLOSSI et al., 2001, p. 52)

Ao longo de sua trajetória, a educação superior no Brasil incorpora, como se vê, diferentes

contornos e orientações, como expressão e síntese do contexto histórico, político e social em que é

forjada. Todavia seu caráter seletivo e excludente, que se fez marca de sua trajetória histórica, vê-se

agora diante da possibilidade de se reorientar, na esteira de ações afirmativas e das chamadas

políticas inclusivas, dentre elas a fixação de quotas étnicas, reserva de vagas para estudantes

oriundos de escolas públicas de educação básica etc., além da proposta da parte do Ministério da

Educação de adotar, em conjunto com o sistema de ensino superior público, a partir das

universidades públicas federais, forma de ingresso alternativa ao vestibular convencional. Trata-se,

no entanto, de movimento incipiente, que deixa em aberto muitas indagações: o acesso facilitado à

educação superior no nível da graduação bastará para romper com a ótica elitista dominante na

seara do ensino superior? Haverá políticas públicas eficazes de viabilização da permanência dos

estudantes carentes na vida universitária e para sua condução bem sucedida nesse ambiente? Estará

a universidade (docentes, dirigentes e alunos etc.) apta a lidar com demandas diferenciadas que o

novo perfil de corpo discente, resultado da hibridação de origens culturais, sociais, econômicas e

políticas, haverá de demandar? Irá a educação superior cumprir trajetória diferente da que se deu no

âmbito da educação básica, em que a universalização progressiva do acesso à escola se fez

acompanhar de contínuo movimento de renúncia da parte do Poder Público para com o

compromisso efetivo com a promoção da qualidade dos processos e resultados em educação? Sabe-

9 MENEZES, P.E. Universidade: ação e reflexão. Fortaleza: UFC, 1983.

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se que a escola pública vem, há décadas, incorporando práticas assistencialistas e populistas de

progressão automática dos alunos independentemente do aproveitamento escolar, com a

descaracterização da escola como ambiente de produção de conhecimento em favor de serviços na

seara da saúde, alimentação e outros. É o quadro que se coaduna com o que registra Gadotti:

Neste começo de um novo milênio, a educação apresenta-se numa dupla encruzilhada: de

um lado, o desempenho do sistema escolar não tem dado conta da universalização da

educação básica de qualidade; de outro, as novas matrizes teóricas não apresentam ainda a

consistência global necessária para indicar caminhos realmente seguros numa época de

profundas e rápidas transformações. (GADOTTI, 2000, p. 6)

O fato é que a educação superior se revela, na cena contemporânea, em meio a um movimento, algo

incipiente mas significativo, de demanda por outros paradigmas. Afinal, como observa Lévy (2005,

p. 157): “Pela primeira vez na história da humanidade, a maioria das competências adquiridas por

uma pessoa no início de seu percurso profissional estarão obsoletas no fim de sua carreira.”

Há de se rever então o fazer pedagógico centrado na transmissão de saber, no ensino que coloca em

segundo plano a aprendizagem e na quantidade de informações, que nem sempre redunda

propriamente em conhecimento. Há de se criar condições efetivas para a promoção da autonomia

intelectual, com foco no aprender a aprender, pois, de acordo com Lévy (2005, p. 173): “O velho

esquema segundo o qual aprende-se uma profissão na juventude para exercê-la durante o restante da

vida encontra-se, portanto, ultrapassado. Os indivíduos são levados a mudar de profissão várias

vezes em suas carreiras, e a própria noção de profissão torna-se cada vez mais problemática.”

Ademais, na cena da educação superior em particular, verifica-se também o redesenho de seus

contornos humanos, na medida em que incorpora novos atores e, portanto, outros papéis, ao mesmo

tempo em que dialoga, ora de forma espontaneísta, ora de forma deliberada com as tecnologias da

informação e da comunicação, que revelam progressivamente implicações para com o seu pensar e

o seu fazer político-pedagógico. Sob esse aspecto, tem implicações sobre as relações sociais e

culturais também, tanto na academia quanto na própria sociedade, na medida em que deflagra outras

formas de transitar no campo do conhecimento, inclusive nas suas imbricadas relações com a

perspectiva do ensino colaborativo10

, que se processa com o recurso às tecnologias da informação e

da comunicação, potencializado pelas dinâmicas e condutas reveladas no bojo da lógica

hipertextual.

10

A lógica do ensino (ou construção do conhecimento) colaborativo, que aflora como possibilidade a partir das novas

conexões possíveis numa dinâmica de comunicação mais fluida e ampliada no bojo das novas tecnologias, tende a

ressituar professor e aluno como co-autores na produção de conhecimento; os docentes assumindo-se na qualidade de

tutores, enquanto os alunos, extrapolando a condição de receptores passivos de informações, passam a se revelar

sujeitos efetivos na condução de seu processo de aprendizagem.

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2. LINGUAGEM, TEXTO E HIPERTEXTO

A compreensão do hipertexto eletrônico, que possibilite o exame de seu significado na construção

do conhecimento no âmbito da graduação, demanda a consideração da linguagem enquanto

atividade humana social e historicamente constituída, quanto à sua gênese, significado e

modalidades de realização no contexto da oralidade, da escrita e ou da audiovisão.

2.1. Do elo perdido às múltiplas concepções de linguagem

É fato que a linguagem, via de regra associada à natureza humana, é reconhecida como uma

faculdade própria também dos não-humanos, todavia “a linguagem humana, em seus componentes

físico e mental, não é igual a nenhum outro tipo de linguagem animal conhecida, embora diversas

espécies apresentem sistemas de comunicação bastante desenvolvidos.” (FRANCHETTO; LEITE,

2004, p. 38)

Assim, constituindo-se como traço distintivo da natureza humana, a linguagem se traduz como ato e

processo que se vale de um sistema de signos convencionados e compartilhados num lugar sócio-

histórico-cultural, possibilitando, no processo interacional, a expressão (e percepção) de impressões,

ideias, indagações, proposições, emoções e sentimentos, dentre outros, constitutivos da reflexão e

da ação, que, em última análise, também a constituem num movimento dialógico e dialético. Esse

movimento seria, nesse diapasão, o que conforma o universo histórico, social, cultural e político no

seio do qual, por seu turno, a linguagem é também forjada.

Em seu processo evolutivo, a linguagem constitui-se em objeto fugidio quanto às suas origens, na

medida em que os atos expressivos e ou comunicativos nos primórdios da humanidade deram-se,

possivelmente, por meio de gestos, movimentos e emissão de sons cujo registro, obviamente, não se

fez possível. A busca de respostas para a inquietante questão da origem da linguagem humana é

desafio que se põe de longa data para os estudiosos, que se valem de analogias, inferências e

achados arqueológicos, como as pinturas rupestres, na tentativa de reconstituir essa intrigante

trajetória. Muitas foram as hipóteses11

adotadas para explicar na sua origem a linguagem humana,

11 Dentre as hipóteses, têm-se as que relacionam as origens da linguagem com explicações onomatopaicas: tentativa de

imitar sons produzidos por animais e ruídos da natureza circundante (o farfalhar das folhas, o correr das águas, o vento

etc.); ou ainda sons (interjeições) produzidos pelos seres humanos em situações de dor, alegria, surpresa, medo etc.

Outra teoria, também inverossímil, atribui a origem da linguagem (oral) a esforços musculares que provocariam

impactos e ação da glote, da língua, dos lábios e do palato mole, por ocasião do acasalamento, da alimentação, das lutas

ou ocasiões festivas etc. (FRANCHETTO; LEITE, 2004)

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todavia o que se pode asseverar é que sua gênese guarda imbricadas relações com a origem da

própria espécie humana.

A par das muitas teorias afetas à origem e à evolução da linguagem humana, coexistem as

realizações no contexto da prática oral, escrita e audiovisual, instâncias com contornos muito

próprios, todavia não excludentes, mas, antes, relacionados e, não raro, complementares entre si.

Autores como Geraldi (1996), Koch (2007a) e Traváglia (1997) observam que, de acordo com o

foco conceitual e histórico, é recorrente a situação da linguagem na literatura, ora como expressão

do pensamento; ora como instrumento de comunicação e ainda como meio / forma de interação.

Tais concepções não só expressam percepções acerca de linguagem, de ser humano e de mundo,

como orientam ou determinam práticas pedagógicas, em particular quanto ao ensino da língua

materna ou estrangeira. Nessa perspectiva, depois de considerar os objetivos do ensino de língua

portuguesa, Traváglia destaca:

Outra questão importante para o ensino de língua materna é a maneira como o professor

concebe a linguagem e a língua, pois o modo como se concebe a natureza fundamental da

língua altera em muito o como se estrutura o trabalho com a língua em termos de ensino. A

concepção de linguagem é tão importante quanto a postura que se tem relativamente à

educação. (TRAVÁGLIA, 1997, p. 21)

Em última análise, uma concepção de linguagem encerra uma concepção de ser e estar no mundo,

com todas as suas implicações históricas, sociais, culturais e políticas.

Das diferentes concepções de linguagem, aquela que lhe confere função representativa, ou

linguagem como “espelho” (KOCH, 2007a, p. 7), a despeito de ser a mais antiga, encontra ainda

seus adeptos na contemporaneidade, os quais são apologistas da tese de que a ela compete

estritamente representar o pensamento e o conhecimento do mundo. Ainda conforme Koch (2007a,

p. 7), é a concepção segundo a qual “o homem representa para si o mundo através da linguagem e,

assim sendo, a função da língua é representar (= refletir) seu pensamento e seu conhecimento de

mundo.” Trata-se de uma concepção que toma a linguagem como uma atividade mental, que se

sustenta em certa universalidade de esquemas, cuja apreensão seria imprescindível para a adequada

expressão linguística. Sob essa convicção, estabelecem-se relações com a língua e com o seu

ensino-aprendizagem que tendem a conferir foco metalinguístico às práticas pedagógicas

marcadamente tradicionais. Embora remonte à tradição gramatical grega, atravessando a Idade

Média e Moderna, na qual encontra eco nos paradigmas cartesianos, essa referência conceitual

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experimenta sua ruptura, na primeira metade do século XX, com os estudos de Saussure12

. No

entanto, persevera no imaginário do usuário comum da língua e, não raro, domina o pensar e o fazer

pedagógico na seara da linguagem em um sem número de escolas da educação básica.

Outro conceito identifica a linguagem com a função comunicativa, tributando-lhe valor

instrumental, como “ferramenta” (KOCH, 2007a, p. 7) que, sustentada num conjunto de signos

combinados com base em regras próprias, compõe um código capaz de assegurar a efetiva

transmissão da mensagem na relação entre um emissor e um receptor. Essa concepção de linguagem

tende a dicotomizar o lugar dos interlocutores no ato interacional e, nesse diapasão, o receptor, em

particular, vê-se reduzido quanto ao seu papel, que parece não incorporar a faculdade de produção

do sentido dos enunciados produzidos pelo emissor. Sob tal orientação conceitual, à língua se

confere foco quanto à dimensão estrutural, o que resulta em práticas didático-pedagógicas relativas

ao seu ensino que exploram e valorizam estruturas geradoras, em exercícios mecânicos de repetição

para fim de internalização das práticas (ou normas) gramaticais, isolando, em última análise a

língua do contexto em que se realiza. É o que constata Traváglia quando registra: “Isso fez com que

a Lingüística não considerasse os interlocutores e a situação de uso como determinantes das

unidades e regras que constituem a língua, isto é, afastou o indivíduo falante do processo de

produção, do que é social e histórico na língua.” (TRAVÁGLIA, 1997, p. 22)

Por fim e para além dos conceitos de linguagem como representação ou como instrumento de

comunicação, tem-se a sua concepção como forma de (inter)ação. Assim, como decorrência da ação

humana, a prática linguística incorpora dimensões pragmáticas, ensejando a consideração do

enunciado ou do discurso quanto às condições em que são produzidos, tendo em vista a

intencionalidade do ato enunciativo, as relações que guardam entre si os interlocutores quanto aos

seus papéis e as imagens que reciprocamente constroem, assim como o assunto e o lugar temporal e

espacial da interação. Nessa perspectiva, a linguagem carrega em si, como traço constitutivo, o

princípio dialógico, que supera o caráter de representação e, portanto, de atividade mental que se

sustenta em certa universalidade de esquemas; assim como o caráter de instrumento de

comunicação, que reduz a língua a um código de que se valem, em lugares dicotômicos, emissor e

receptor. Sob a ótica interacional da linguagem, o sujeito da prática linguística:

12

A partir da dicotomia Langue/Parole, dentre outras, o autor situa a língua como objeto de estudo científico,

conceituando-a como um sistema de caráter social, homogêneo, abstrato, internalizado na mente do falante, que dele se

vale em situações reais e diversificadas de comunicação. Sua tese inspira as correntes de estudo identificadas com o

estruturalismo, que, grosso modo, concebe como passíveis de identificação estruturas básicas na variedade de

fenômenos, seja na seara da lingüística, da antropologia, da sociologia etc.

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Internaliza a linguagem e constitui-se como ser social, pois a linguagem não é o trabalho de

um artesão, mas trabalho social e histórico seu e dos outros e para os outros e com os outros

que ela se constitui. Isto implica que não há um sujeito dado, pronto, que entra em

interação, mas um sujeito se completando e se construindo nas suas falas e nas falas dos

outros. (GERALDI, 1996, p. 19)

Tais premissas conceituais, por sua vez, impactam diretamente no modo de lidar com a prática

pedagógica que tenha como objeto a linguagem. Assim:

O estudo e o ensino de uma língua não podem, neste sentido, deixar de considerar – como

se fossem não-pertinentes – as diferentes instâncias sociais, pois os processos interlocutivos

se dão no interior das múltiplas e complexas instituições de uma dada formação social. A

língua, enquanto produto desta história e enquanto condição de produção da história

presente, vem marcada pelos seus usos e pelos espaços sociais destes usos. (GERALDI,

1996, p. 28)

Em síntese, concebida com seu caráter dialógico, a linguagem ressitua-se como prática interacional,

ressituando-se também os interlocutores, em contínuo diálogo, que enseja e revela fenômenos como

a polifonia e a intertextualidade, já que o discurso veicula as diferentes vozes, que dialogam não só

no e com o terreno dos atores diretamente presentes na cena interacional, mas também no território

de outros discursos e textos que se põem em conexão, quando são mobilizados para a emissão de

enunciados, para a enunciação e para a produção de sentido propriamente dita. Acerca do fenômeno

intertextual, Koch (2007b, p.59) registra que “todo texto é um objeto heterogêneo, que revela uma

relação radical de seu interior com seu exterior; e, desse exterior, evidentemente, fazem parte outros

textos que lhe dão origem, que o predeterminam, com os quais dialoga, que retoma, a que alude, ou

a que se opõe.”

O redimensionamento do conceito de linguagem, nessa perspectiva, repele nas práticas didático-

pedagógicas a redução do estudo da língua a sinônimo de metalinguagem ou a reprodução de

esquemas universais (e descontextualizados), em favor da prática reflexiva, crítica e de recriação

contínua da língua, num movimento que, em última análise, privilegia o lugar do interlocutor como

sujeito do ato e processo de interação pela linguagem. Afinal, como observa Koch (2006, p. 44), “a

língua não existe fora dos sujeitos sociais que a falam e fora dos eventos discursivos nos quais eles

intervêm e nos quais mobilizam seus saberes quer de ordem linguística, quer de ordem

sociocognitiva, ou seja, seus modelos de mundo.”

A tese de Koch (2006) dá eco aos estudos de Bakhtin acerca do tema, na medida em que, para o

autor, “a língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema

linguístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo individual dos falantes.” (BAKHTIN,

1992, p. 124)

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Bakhtin oferece singular contribuição para a ressituação da língua (e da linguística propriamente

dita), em particular quando, contrapondo-se às correntes que tomam a língua e o discurso como

prerrogativas de um sujeito monádico, concebe ambos nas suas dimensões dialógicas e dialéticas.

Sob essa ótica, o sujeito bakhtiniano se constrói permanentemente na interação com outros sujeitos

e, nesse diapasão, seu discurso se modifica na interação social, face as intervenções reais ou

imaginárias. Esse processo faz emergir os fenômenos da intertextualidade e da polifonia, na medida

em que a linguagem, assim como o próprio estudo da língua e de seus objetos constitutivos, tais

quais o texto, o suporte textual, o intertexto e as práticas discursivas propriamente ditas, ganham

mais expressiva reorientação, já que são considerados em novo lugar e com novas relações no

contexto das realizações humanas. Tendo em vista o objeto precípuo deste trabalho, faz-se

oportuno, então, proceder a análise mais detida acerca do texto e das possibilidades de leitura,

ensejando melhor compreensão do hipertexto eletrônico como categoria que, embora não

substituindo o texto tradicional e sua leitura supostamente linear, incorpora outras dinâmicas,

complexificando o ato de leitura (e produção de sentido), que passa a demandar, ao lado de velhas

habilidades e competências, a mobilização de outras tantas, para o trânsito no ciberespaço e para a

prática da ciberleitura.

2.2. Texto, possibilidades de leitura

A par das diferentes concepções de linguagem, há de se tratar as suas modalidades de realização

imbricadas com a oralidade, a escrita e audiovisão. Inicialmente, faz-se mister compreender que

essas instâncias da prática linguística, embora guardem traços próprios que as identificam e

diferenciam, não são necessariamente dicotômicas. Acerca da oralidade e da escrita, por exemplo,

vale lembrar com Marcuschi que, “embora entre o código gráfico e fônico se verifique uma

dicotomia estrita, entre a fala e a escrita não se pode postular tal polaridade absoluta, mas sim um

continuum: uma é a diferença entre grafia e som e outra entre o discurso escrito e o discurso oral.”

(MARCUSCHI, 1995, p. 42)

O autor destaca ainda, quanto ao texto falado e ao texto escrito, algumas diferenças, dentre elas: (a)

os recursos organizacionais, que, na fala, articulam o verbal e o não verbal (efeitos de prosódia e

gestos), enquanto, na escrita, prendem-se mais ao canal verbal; (b) o tempo social da fala, que se dá

de forma mais imediata, enquanto, na escrita, o tempo de produção e recepção, via de regra, não

coincidem; (c) e ainda a organização textual, que, na fala, tende a trazer marcas de redundâncias,

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elipses, anacolutos, autocorreções, diferentemente da escrita, que tende a explorar recursos mais

lineares. (MARCUSCHI, 1995, p. 42)

Desmitificam-se, nessa perspectiva, alguns conceitos que, embora equivocados, permeiam o

universo do pensar e do fazer na seara da aprendizagem (e do ensino) da língua. Dentre eles, a ideia

de que a escrita é reprodução da fala; ou que a fala e a escrita são instâncias absolutamente

dicotômicas. Evidencia-se ainda o recurso às estratégias audiovisuais, que, na realização oral se

fazem presentes, em meio a gestos, expressões faciais, acompanhadas ou não de efeitos sonoros,

como inflexões de voz e ou pausas e silêncios; assim como os recursos visuais na escrita, na

constituição de textos verbais e ou não-verbais.

Esse complexo linguístico remete aos estudos de Santaella (2005), que, em meio à profusão de

signos no universo de múltiplos meios e códigos, reconhece, com lastro na teoria peirciana13

dos

signos, na teoria da modularidade da mente humana legada por cognitivistas como Jackendoff14

e

na tese da natureza híbrida da cultura desenvolvida por Canclini15

, três matrizes do pensamento e da

linguagem, quais sejam a verbal, visual e sonora.

Segundo a autora:

Não obstante a variedade de suportes, meios, canais ( foto, cinema, televisão, vídeo, jornal,

rádio etc.) em que as linguagens se materializam e são veiculadas, não obstante as

diferenças específicas que elas adquirem em cada um dos diferentes meios, subjacentes a

essa variedade e a essas diferenças estão tão-só e apenas três matrizes. (SANTAELLA,

2005, p. 21)

As matrizes a que se refere Santaella (2005) se manifestam na esfera verbal, visual e sonora da

linguagem e do pensamento, dialogando em combinações e misturas que redundam na

multiplicidade de manifestações linguísticas. A cada matriz referida pela autora se associam,

respectivamente, nove modalidades do discurso verbal escrito, nove modalidades das formas

visuais, nove modalidades da sintaxe sonora, às quais se articulam de diferentes formas e em

variadas proporções, redundando na constituição de linguagens híbridas, dentre as quais a sonoro-

13

Nos seus estudos sobre semiótica, Peirce considera que não há pensamento sem signos, os quais guardam em si o

traço da incompletude, na medida em que remetem continuamente a outros tantos. 14

A teoria de Jackendoff de que, na base dos processos cognitivos, há três módulos basilares: o verbal, o visual e o

musical se identifica com a teoria das três matrizes, salvo no que esta considera quanto aos sistemas de signos e

linguagens manifestas. 15

Nestor Canclini desenvolve a tese do hibridismo cultural a partir da consideração dos papéis dos agentes sociais

comprometidos com o movimento de construção dos produtos culturais tomados por cultos, populares ou massivos e

suas relações com a modernidade. Para o autor, é tão improcedente a oposição sumária entre o tradicional e o moderno

quanto o é a fixação de fronteiras entre o culto e o popular. Sua tese de natureza híbrida da cultura remete Santaella à

consideração do caráter híbrido das linguagens.

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verbal, sonoro-visual, visual-sonora, visual-verbal, verbo-sonora, verbo-visual e verbo-visual-

sonora.

O conceito de hibridização das linguagens referido se apresenta sob a consideração de que a

profusão das mídias tende a mobilizar o olhar para o meio (ou suporte), como se fosse este o

componente primeiro dos processos comunicativos, quando, em última análise, o que há de mais

relevante nesse contexto são os processos sígnicos, já que os signos se constituem nos mediadores

entre os seres humanos e o mundo que integram.

Nessa perspectiva e segundo Santaella:

Sob o ponto de vista das matrizes da linguagem e pensamento, linguagens concretizadas

são na realidade corporificações de uma lógica semiótica abstrata que lhes está subjacente e

que é sustentada pelos eixos da sintaxe na sonoridade, da forma na visualidade e pela

discursividade no verbal escrito. (SANTAELLA, 2005, p.379)

Essa tese é compartilhada por Lévy (2007b), que tributa às novas tecnologias da informação e da

comunicação, em particular no seu aspecto multimidiático e interacional, o fato de contribuir para

evidenciar que tais matrizes se fazem presentes de forma simultânea nas realizações linguísticas

humanas. Segundo o autor:

É provável que a linguagem humana tenha aparecido simultaneamente sob diversas formas:

oral, gestual, musical, icônica, plástica, cada expressão singular ativando esta ou aquela

zona de um continuum semiótico, repercutindo de uma língua a outra, de um sentido a

outro, seguindo os rizomas de significação, atingindo tanto mais as potências do espírito

por atravessar os corpos e os afetos. (LÉVY, 2007b, p. 105)

Assim, o recurso ao oral, escrito e audiovisual coexistem e alternam-se quanto ao lugar hegemônico

que ocupam nos diversos contextos da vida social e que assumem na história da linguagem humana,

ensejando sua abordagem na perspectiva adotada por Lévy (2006, p.75) para tratar “os três tempos

do espírito”, uma metáfora de que se vale o autor para examinar a era da oralidade, da escrita e da

informática. O autor explora as temporalidades humanas que se veem imbricadas com a linguagem,

a qual, como já observado no corpo do presente trabalho, é constituída e constituinte do cenário

social, histórico, político e cultural em que se engendra.

Nesse sentido, Lévy (2006) destaca a oralidade (nas sociedades sem escrita) identificada com o

tempo circular, ancorado em repetições. O autor observa:

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Nessas culturas, qualquer proposição que não seja periodicamente retomada e repetida em

voz alta está condenada a desaparecer. Não existe nenhum modo de armazenar as

representações verbais para futura reutilização. A transmissão, a passagem do tempo

supõem portanto um incessante movimento de recomeço, de reiteração. Ritos e mitos são

retidos, quase intocados, pela roda das gerações. (LÉVY, 2006, p. 83)

É o ambiente em que a palavra se põe a serviço da memória e se revela, dentre outros, em narrativas

míticas, no tempo compartilhado face a face por interlocutores em relações diretas, pessoais.

A escrita, por sua vez, enseja outras temporalidades, num contexto em que a memória humana já

não é mais a ferramenta principal de retenção da informação, da experiência e do conhecimento.

Nesse contexto:

O aparecimento da escrita acelerou um processo de artificialização, de exteriorização e de

virtualização da memória que certamente começou com a hominização. Virtualização e não

simples prolongamento; ou seja, separação parcial de um corpo vivo, colocação em comum,

heterogênese. Não se pode reduzir a escrita a um registro da fala. Em contrapartida, ao nos

fazer conceber a lembrança como um registro, ela transformou o rosto de Mnemósine16

.

(LÉVY, 2007a, p.38)

A expressão do impacto da escrita, ao menos nas sociedades letradas, quanto a romper com o

paradigma temporal da circularidade sustentado pela oralidade é captada pelo autor, que destaca a

instauração crescente de outra temporalidade, de caráter linear, proporcional à evolução da escrita:

À medida que passamos da ideografia ao alfabeto e da caligrafia à impressão, o tempo

torna-se cada vez mais linear, histórico. A ordem seqüencial dos signos aparece sobre a

página ou monumento. A acumulação, o aumento potencialmente infinito do corpus

transmissível distendem o círculo da oralidade até quebrá-lo. Calendários, datas, anais,

arquivos, ao instaurarem referências fixas, permitem o nascimento da história se não como

disciplina, ao menos como gênero literário. (LÉVY, 2006, p. 94)

Para além da referência temporal que enseja, a escrita estabelece marcos relacionais também

diferenciados para com a oralidade. Nas sociedades letradas, assume caráter hegemônico e, no

mundo do conhecimento marcado pela ordem positivista, incorpora autoridade que se sobrepõe à

oralidade. Passa, então, a ser a modalidade privilegiada nos ambientes formais da educação em

detrimento da prática oral e remete a posturas filosóficas e pedagógicas que repelem a

16 Da mitologia grega, Mnemósine, deusa da memória, é aquela que preserva o ser humano do esquecimento dos fatos.

Com o advento da escrita, a faculdade da memória, que Mnemósine suscita, extrapola do mecanismo da repetição em

rituais e ou narrativas, para sua potencialização não como mero prolongamento da memória humana, mas como sua

virtualização. As outras temporalidades que enseja a escrita dão à memória outro lugar e outro sentido nas sociedades

letradas, o que “transformou o rosto de Mnemósine”.

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informalidade da linguagem oral em favor do rigor formal, da gramática prescritiva, no contexto

escolar.

No contexto das diferentes modalidades de linguagem, o recurso audiovisual, presente

historicamente na oralidade (gestual, inflexões de voz, ruídos e silêncios), assim como o recurso

visual na escrita (diagramação dos textos, fontes, imagens etc) ganham novo status por ocasião do

século XIX, com o advento das então novas tecnologias da comunicação, tais quais o rádio, o

cinema, a fotografia etc. Vale ressaltar, no entanto, que a linguagem visual é muito anterior,

remontando à própria origem da humanidade, haja vista sua manifestação, por exemplo, sob a

forma de pinturas rupestres nos primórdios da existência humana.

O fato é que tais instâncias da linguagem ensejam e instauram diferentes (mas não excludentes)

possibilidades e desafios para a leitura, assim como novos perfis de leitores, que mobilizam

diferentes (e não raro complementares) habilidades e competências, para interagir e produzir

sentido no mundo que integram, transitando em meio ao dialogismo e à polifonia que o

caracterizam.

2.3. Em múltiplos cenários, a prática social da leitura e os diferentes perfis de leitores

A sucessão e coexistência das diversas modalidades de linguagem ensejam e demandam variadas

formas de percepção e cognição no mundo de relações comprometidas com diferentes suportes de

expressão na seara da informação e da comunicação.

Interessante se faz, no presente trabalho, a abordagem da prática de leitura e do leitor que se

constrói e se revela no bojo desse movimento. Assim, extrapolando da oralidade, com seus traços de

interação face a face, com as possibilidades e limitações que comporta essa modalidade

interacional, há de se buscar na história da leitura (e do livro), com lastro nos estudos Chartier

(1999, 2007), Lévy (2005, 2006, 2007a, 2007b) e Santaella (2005, 2007a, 2007b), dentre outros,

subsídios que possibilitem delinear as múltiplas cenas da leitura e os diferentes perfis de leitores.

Empreendendo o olhar histórico sobre o livro, Chartier trata-o nas imbricadas relações que guarda

com o ato de ler, oferecendo inestimáveis contribuições para a compreensão da prática social da

leitura, por ele frequentemente relacionada ao suporte em que se apresenta o texto, assim como ao

seu lugar histórico e social. Assim é que, segundo o autor:

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Toda história da leitura supõe, em seu princípio, esta liberdade do leitor que se desloca e

subverte aquilo que o livro lhe pretende impor. Mas esta liberdade leitora não é jamais

absoluta. Ela é cercada por limitações derivadas das capacidades, convenções e hábitos que

caracterizam, em suas diferenças, as práticas de leitura. Os gestos mudam segundo os

tempos e lugares, os objetos lidos e as razões de ler. Novas atitudes são inventadas, outras

se extinguem. (CHARTIER, 1999, p. 77)

Em outras palavras, o livro é mais que o meio ou suporte; e a leitura, mais que decifração do código

escrito, constitui-se em prática social imbricada com tempos, lugares, sujeitos, valores e atitudes no

contexto cultural, histórico, político e social em que se processa.

Assim, é possível estender a tese do autor para além do livro, sobretudo se se considerar com

Santaella um conceito ampliado de leitura. A autora observa que, embora haja resistência quanto ao

uso do termo em relações que a extrapolem a mera decifração letrada,

o ato de ler passou a não se restringir apenas à decifração de letras, mas veio também

incorporando, cada vez mais, as relações entre palavra e imagem, desenho e tamanho de

tipos gráficos, texto e diagramação. Além disso, com o surgimento dos grandes centros

urbanos e com a explosão da publicidade, o escrito, inextricavelmente unido à imagem,

veio crescentemente se colocar diante dos nossos olhos na vida cotidiana por meio das

embalagens dos produtos, do cartaz, dos sinais de trânsito, nos pontos de ônibus, nas

estações de metrô, enfim, em um grande número de situações em que praticamos o ato de

ler de modo tão automático que nem chegamos a nos dar conta disso. (SANTAELLA,

2007a, p. 17)

Retomando com Chartier (1999) a temática da leitura e sua perspectiva histórica, o autor nos

apresenta as categorias de leitura extensiva e intensiva. Esta corresponderia ao ato e processo que se

dava para com o livro produzido ainda em menor escala, portanto de mais restrito acesso. Liam-se

intensivamente, então, os poucos livros disponíveis, com os quais se guardava uma relação de

estima diferenciada. A leitura extensiva, por sua vez, ganha terreno séculos depois do advento da

imprensa, quando, no século XIII, assumindo status de mídia de massa, é levada a efeito por um

tipo de leitor que se vê às voltas com um volume muito mais expressivo de textos.

Santaella (2007a), por sua vez, dedica-se ao exame dos cenários de leitura que se instauram, bem

como de suas implicações sobre os leitores que os habitam. A autora assinala que a prática da

leitura (e produção de livros), que era prerrogativa do clero e que se limitava aos mosteiros e demais

ambientes eclesiásticos, ganha outro cenário a partir do século XII, particularmente em virtude da

criação das universidades e da ampliação do acesso aos livros, que passam a alcançar os leitores

leigos no bojo do movimento de ascensão da classe burguesa. O livro, nesse contexto, assume

outros contornos de produção e consumo, e a leitura, por seu turno, ganha status de atividade

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individualizada, silenciosa, ensejando uma relação (ou diálogo) entre livro e leitor não mais

mediada ou testemunhada por outros sujeitos, mas, antes, caracterizada, por certa aura introspectiva

e intimista.

Esse tipo de leitura nasce da relação íntima entre o leitor e o livro, leitura de manuseio, da

intimidade, em retiro voluntário, num espaço retirado e privado, que tem na biblioteca seu

lugar de recolhimento, pois o espaço da leitura deve ser separado dos lugares de um

divertimento mundano. Mesmo quando se dá em tais lugares, o leitor se concentra na sua

atividade interior, separando-se do ambiente circundante. É uma atividade de leitores

sentados e imóveis, em abandono, desprendidos das circunstâncias externas.

(SANTAELLA, 2007a, p. 23)

Vale ressalvar, no entanto, que a imobilidade atribuída ao leitor constituinte dessa cena não se há de

confundir com passividade deliberada, na medida em que o ato de ler mobiliza um sem número de

habilidades, competências e atitudes com que o leitor atribui significados ao texto, num contínuo

exercício de produção de sentido. Afinal,

um texto se constitui enquanto tal no momento em que os parceiros de uma atividade

comunicativa global, diante de uma manifestação comunicativa global, diante de uma

manifestação linguística, pela atuação conjunta de uma complexa rede de fatores de ordem

situacional, cognitiva, sociocultural e interacional, são capazes de construir, para ela,

determinado sentido. (KOCH, 2007b, p. 30)

O texto é tomado aqui no seu sentido permanentemente inacabado, que se (re)constrói na atividade

interacional no âmbito da qual o leitor, interagindo com o autor, com a malha textual, seu suporte,

suas condições sociais e históricas, dentre outras, confere-lhe um sentido; não necessariamente o

sentido originário da ação discursiva do autor, nem o sentido definitivo no ambiente histórico de

sua apropriação, mas aquele possível pela (inter)ação do leitor com os demais componentes da

atividade de leitura.

Santaella (2007a) extrapola, então, para a apreciação de outro cenário que se instaura com a

reconfiguração das cidades sob a égide da Revolução Industrial com seus expressivos impactos no

século XIX, inaugurando outros modos de viver e relacionar-se na cena social. Nesse contexto, dá-

se progressivo declínio da atividade rural e artesanal em favor do crescimento urbano e da produção

em série, num ambiente de impactantes avanços tecnológicos, valendo destacar, na seara da

comunicação, o surgimento do telégrafo, do telefone e o incremento das redes de opinião com mais

ampla e sistemática circulação de publicações de periódicos, conferindo celeridade e volume às

informações veiculadas no dia a dia. E ainda as tecnologias da imagem, da fotografia, do cinema e,

a posteriori, da televisão e do vídeo. É o cenário apreendido pela autora, que registra:

Na cidade-luz, das lanternas a gás, da eletricidade e do néon, na cidade-vitrina, com seus

boulevards, galerias, parques, cafés, museus e teatros, na cidade-passarela que estetiza as

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aparências e os gostos, a identidade do homem moderno se desconstrói em uma

multiplicidade infinita de imagens e registros, tipos, estilos e perfis urbanos. Na

sensorialidade alucinógena que o excesso de estímulos produz, só pode encontrar sua

identidade o flâneur, aquele que passeia pela cidade com olhar contemplativo, ondulante e

aberto à vertigem das alteridades. (SANTAELLA, 2007a, p. 26)

Envolvido com e por esse ambiente, o leitor, antes solitário, introspectivo, contemplativo e estático,

embora não menos sujeito de elaborações intelectuais na prática da leitura, vê-se agora diante do

fragmentado, do fugidio, da sucessão de imagens céleres, que se revelam num continuum,

demandando-lhe o olhar imediatista, apressado, efêmero, ágil... Desse cenário, Santaella (2007a)

identifica o sujeito da modernidade, que se posiciona face os novos desafios (e possibilidades) da

atividade de leitura:

É o leitor que foi se ajustando a novos ritmos de atenção, ritmos que passam com igual

velocidade de um estado fixo para um móvel. É o leitor treinado nas distrações fugazes e

sensações evanescentes cuja percepção se tornou uma atividade instável, de intensidades

desiguais. É, enfim, o leitor apressado de linguagens efêmeras, híbridas, misturadas.

Mistura que está no cerne do jornal, primeiro grande rival do livro. A impressão mecânica

aliada ao telégrafo e à fotografia gerou essa linguagem híbrida, a do jornal, testemunha do

cotidiano, fadada a durar o tempo exato daquilo que noticia. Aparece assim, com o jornal, o

leitor fugaz, novidadeiro, de memória curta, mas ágil. Um leitor que precisa esquecer, pelo

excesso de estímulos, e na falta do tempo para retê-los. Um leitor de fragmentos, leitor de

tiras de jornal e fatias de realidade. (SANTAELLA, 2007a, p. 29)

Todavia, a reconfiguração do cenário social no seio do qual emerge, para além do leitor

contemplativo, o leitor movente, não se tem a morte do primeiro em favor do segundo, que,

flanando sobre os múltiplos apelos de leitura na sua mais ampla acepção, mobiliza outras

habilidades e competências, assumindo diferentes atitudes. Santaella observa:

O leitor do livro, mediativo, observador ancorado, leitor sem urgências, provido de férteis

faculdades imaginativas, aprende assim a conviver com o leitor movente; leitor de formas,

volumes, massas, interações de forças, movimentos, leitor de direções, traços, cores; leitor

de luzes que se acendem e se apagam; leitor cujo organismo mudou de marcha,

sincronizando-se à aceleração do mundo. (SANTAELLA, 2007a, p. 30)

O aprendizado da convivência desses leitores se dá no mundo social de múltiplos espaços e tempos,

em que um mesmo sujeito abriga em si, concomitantemente, o leitor contemplativo e o movente,

cujas habilidades e competências ele mobiliza conforme as possibilidades e limites do contexto em

que se há de processar a leitura.

Assim, é possível ao leitor observador sair da introspecção de uma biblioteca pública ou de seu ato

solitário de leitura de um livro no trem de um metrô, para ir ao encontro das manchetes de jornais

nas bancas e dos anúncios de out doors ou luminosos intermitentes das cidades.

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De qualquer modo, a incorporação do perfil movente pelo leitor enseja-lhe o exercício, por

incorporação (e não por substituição) de novas habilidades e competências que lhe darão a aptidão

para assumir-se também como um terceiro tipo de leitor, que Santaella (2007a) identifica como o

leitor imersivo.

Embora reconheça que as características desse leitor tenham sido ainda pouco exploradas, Santaella

(2007a) considera que não se trata de um sujeito distinto do leitor contemplativo da linguagem

impressa e do movente, que transita (e tropeça) entre signos físicos, materiais.

O imersivo é o leitor que, segundo a autora, “navega numa tela, programando leituras, num

universo de signos evanescentes e eternamente disponíveis, contanto que não se perca a rota que

leva a eles.” (SANTAELLA, 2007a, p. 33) Em outras palavras, é o leitor-navegador, que desliza

pela tela, faz escolhas, adota caminhos e, a cada leitura, constrói trajetórias hipertextuais. Todavia,

sua conduta (e condução) não deve sugerir deliberada e absoluta expressão de autonomia, mas o

resultado da interação entre o leitor e a malha (hiper)textual que ele constitui ao mesmo tempo em

que é por ela constituído enquanto leitor-autor.

Nas palavras de Santaella (2007a, p. 33), “trata-se, na verdade, de um leitor implodido, cuja

subjetividade se mescla na hipersubjetividade de infinitos textos num grande caleidoscópio

tridimensional onde cada novo nó e nexo pode conter uma outra grande rede numa outra dimensão.”

Como se vê, a empreitada desse leitor-autor, que extrapola a mera decifração letrada no ato da

leitura e incorpora um lugar de (co)autor ao navegar na tela, implica relações intertextuais, já que

um texto remete a outro(s), assim como de outros tantos advém, tal quais os signos que, na ótica

peirciana, dialogam num continuum. Concomitantemente, suscita o fenômeno da polifonia,

revelando e potencializando a relação dialógica (e dialética) que os textos e hipertextos encerram

em si, fazendo interagirem os sujeitos e as hipersubjetividades.

O aprofundamento do estudo acerca do perfil do leitor imersivo, não obstante o fato de constituir-se

em tema ainda pouco explorado, enseja a abordagem do hipertexto propriamente dito, cujas

dimensões estruturais, funcionais e simbólicas serão apreciadas a seguir, na medida em que,

conhecendo a malha (hiper)textual com que interage o leitor, tem-se mais elementos para

compreender as interações de que é sujeito o hiperleitor. O exame da categoria hipertextual poderá

contribuir para a melhor compreensão das habilidades, competências e atitudes imbricadas com a

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prática do leitor imersivo, de modo que seja possível verificar em que medida se revela parcial ou

inteiramente novo o ato de leitura por ele empreendida.

2.4. Hipertexto: um conceito polifônico, mas não polissêmico

Face o objetivo da presente pesquisa, qual seja investigar como se situa, na formação universitária,

a exploração do hipertexto na construção do conhecimento, faz-se pertinente apreender o seu

conceito a partir das contribuições de diferentes estudiosos do assunto.

Autores como Chartier (2007), Coscarelli (2003), Lévy (2006), Marcuschi (2005) e Xavier (2005)

situam o hipertexto como um complexo não-linear, multidimensional, que, marcado pelo

descentramento e atopia, possibilita inúmeras conexões, na composição de uma rede infinita de nós.

Chartier (2007, p. 217), pensando o hipertexto e a leitura hipertextual na perspectiva do leitor,

observa que “tal leitura constitui sobre a tela unidades textuais efêmeras, múltiplas e singulares,

compostas à vontade do leitor, que não são nada das páginas definidas de uma vez por todas.” Essa

percepção ressalta o caráter interacional da malha hipertextual, sobre a qual o leitor intervém,

procedendo a escolhas e assumindo tomadas de decisão que vão ao encontro de seus interesses.

Coscarelli (2003, p. 73) refere-se ao caráter rizomático do hipertexto ao asseverar que “o hipertexto

é, grosso modo, um texto que traz conexões, chamadas links, com outros textos que, por sua vez, se

conectam a outros, e assim por diante, formando uma grande rede de textos.” A concepção da

autora remete ao caráter dialógico do hipertexto, cujas conexões se dão num continuum.

Lévy considera que o hipertexto é “um texto móvel, caleidoscópico, que apresenta suas facetas,

gira, dobra-se e desdobra-se à vontade frente ao leitor.” (LÉVY, 2006, p. 5). Considera, nessa

perspectiva, um complexo textual que traz, em si, a deslinearização e o descentramento, deixando a

cargo do leitor a adoção de foco e a fixação de percursos.

Marcuschi, por sua vez, registra que:

O hipertexto não tem um centro, ou seja, não tem um vetor que o determine. Ele não é uma

unidade com contornos nítidos, como já dissemos. Ele é um feixe de possibilidades, uma

espécie de leque de ligações possíveis, mas não-aleatórias. Serve-lhe de metáfora a noção

de “estrela”, que não forma um centro, mas vários vértices que se ligam a outros vértices.

(MARCUSCHI, 2005, p. 193)

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O caráter reticular do hipertexto, um complexo rizomático, corrobora-se nessa assertiva, que

destaca as múltiplas possibilidades, as quais, embora ensejem a leitura deslinearizada, não redunda

em estruturas não-aleatórias, mas em caminhos definidos pelo leitor.

Xavier (2005, p. 175), por seu turno, ressalta que “a inovação trazida pelo hipertexto eletrônico está

em transformar a deslinearização, a ausência de um foco dominante de leitura, em princípio básico

de sua construção.” Nesse sentido, o autor destaca como traço inovador no hipertexto o fato de não

ter centro nem linha, isto é, de se apresentar sem um foco dominante de leitura, cuja definição é,

também segundo o autor, uma prerrogativa do leitor.

Tais conceitos, cujos focos são variados, diferentemente de redundar em polissemia, guardam

consonância quanto a reconhecer o caráter não-linear, descentrado, atópico, intertextual e mutável

da malha hipertextual. Todavia um exame superficial poderia suscitar dúvida quanto à semelhança

ou à oposição que comporta essa categoria em relação ao texto gutenberguiano. Faz-se mister,

então, examinar essa questão, na medida em que a concepção que se tenha acerca de texto e

hipertexto vê-se imbricada com as concepções e práticas concernentes à leitura (hiper)textual

propriamente dita. Nesse sentido, faz-se oportuno situar historicamente o hipertexto, bem como

examinar suas supostas semelhanças e diferenças para com o texto impresso.

2.5. Texto e hipertexto, nem iguais, nem opostos

Historicamente, vale dizer, com Lévy (2006, p. 28) que o termo hipertexto, cunhado por Theodor H.

Nelson17 em 1964, para designar um tipo de escrita/leitura não-linear, não sequencial, disposta em meio

eletrônico, remete a uma concepção muito anterior, expressa em 1945, pelo matemático e físico

Vannevar Bush em artigo publicado na revista The Atlantic Monthly sob o título “As We May Think”,

inventariando algumas invenções empreendidas no bojo dos conflitos bélicos que poderiam contribuir,

no pós-guerra, para uma vida melhor. No trabalho em questão, Bush apresentava a ideia de um

complexo de informações dispostas em rede, inspirada no funcionamento da mente humana por

associações, que redundaria numa espécie de memória estendida, o Memex, a qual mais que exercer a

função de banco de dados, possibilitaria sistematização e o fácil acesso às informações. Esse recurso

deveria possibilitar o armazenamento de livros, registros, fotografias, documentos e comunicações em

17

Theodore Nelson apresenta, em 1965, numa conferência nacional da Association for Computing Machinery, um

projeto chamado Xanadu, que situava o que ele chamaria de hipertexto, trazendo blocos de textos de forma não-linear,

não sequencial, tal como se dá com o pensamento.

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microfilmes, os quais pudessem ser acessados por meio de um teclado e de projeção numa tela, de forma

mecanizada, assegurando a disponibilização simultânea de vários arquivos, de forma ágil.

Tomado no suporte eletrônico, o hipertexto poderia ter sua origem situada nesse contexto histórico

sem maiores celeumas, todavia, considerado nos seus aspectos estruturais e funcionais: não

linearidade, atopia, interconexão etc., esse complexo textual remete a tempos mais remotos. Afinal,

o texto convencional impresso traz marcas análogas, quando não idênticas, às que se atribuem ao

hipertexto eletrônico.

A desejada compreensão dessa tese requer a caracterização do hipertexto, de modo que se possam

reconhecer os traços que o aproximam ou diferenciam do texto propriamente dito. Lévy (2006, p.

25) explora o conceito hipertextual na perspectiva metafórica, que incorpora, assim, mais que a

pretensão informativa ou comunicativa, alcançando a interação na sua ampla acepção, o que remete

a concepção de um mundo sem barreiras, em que se revelam “as esferas da realidade em que

significações estejam em jogo.” (LEVY, 2006, p.25).

Nesse exercício, o autor apresenta seis características próprias do hipertexto, identificadas com os

princípios de: metamorfose; heterogeneidade; multiplicidade e de encaixe das escalas;

exterioridade; topologia e mobilidade dos centros. Tais características são apresentadas, em parte,

de forma muito similar por autores como Nelson e Bolter18

, citados por Marcuschi (1999).

Para melhor situação conceitual, discorrer-se-á a seguir acerca de cada umas das referidas

características ou princípios hipertextuais:

(a) Metamorfose: refere-se ao contínuo movimento de (re)configurações da rede, por força da

interação dos atores envolvidos, quais sejam os usuários, as palavras, as imagens, objetos técnicos

etc.

(b) Heterogeneidade: as associações ou as hiperrelações no ambiente eletrônico colocam em contato

efetivo ou potencial pessoas, grupos, artefatos e símbolos de variadas dimensões.

18 Marcuschi reporta-se aos textos: BOLTER, J. D. 1991. Writing Space. The Computer, Hypertext, and the Hystory of

Writing. Hillsdale, N.J.: Lawrence Erlbaum Associates e NELSON, TH. H. 1992. Opening Hypertext: A Memoir. In:

Myron C. Tuman (ed), pp. 43-57, nos quais os autores tratam, dentre outros, a concepção e os traços próprios do

hipertexto.

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(c) Multiplicidade e encaixe das escalas: quaisquer nós e conexões podem assumir graus de efeito e

valor de maior ou menor escala, tendo em vista seu lugar e a apropriação que deles se faça.

(d) Exterioridade: corresponde ao princípio de ação e efeito dos elementos externos sobre a rede,

cuja recomposição permanente se compromete com um exterior indeterminado, o qual lhe confere

novos elementos, conexões etc.

(e) Topologia: parte da ideia de que a rede não está no espaço, ela é o espaço. Assim, tudo que

concerne às relações e ao movimento hipertextual está imbricado com a proximidade entre os

elementos da rede, está relacionado aos caminhos percorridos.

(f) Mobilidade dos centros: identificada com a lógica rizomática, a rede não tem centro, ou, antes,

revela diversos centros, compondo-se num movimento reticular que se desenha nas construções de

sentidos.

De tais características, pode-se depreender, dentre outros, a condição inacabada, dinâmica e

dialógica do hipertexto, que se reconfigura e se redimensiona pela incorporação de elementos, pelas

conexões determinadas a partir dos caminhos que adota o leitor na produção de sentido que sobre e

com a malha hipertextual empreende. Igualmente, pode-se dizer que o texto traz em si tal

propriedade, haja vista seu caráter dialógico, sua condição de produto inacabado e de processo

contínuo na perspectiva da produção de sentido. Essa propriedade do texto se evidencia na

percepção de autores como Coscarelli (2003), Koch (2007b), e Traváglia (1997).

Com Coscarelli (2003, p. 67), vale dizer que “todo texto é produzido para ser recebido (não

necessariamente compreendido) por alguém; é produzido com alguma intenção comunicativa que o

leitor tem o trabalho de recuperar.”

Segundo Koch (2007b, p. 26) “textos são resultados da atividade verbal de indivíduos socialmente

atuantes, na qual estes coordenam suas ações no intuito de alcançar um fim social, de conformidade

com as condições sob as quais a atividade verbal se realiza.”

Traváglia (1997, p. 67), por sua vez, situa o texto como “o resultado, o produto concreto da

atividade comunicativa que se faz seguindo regras e princípios discursivos sócio-historicamente

estabelecidos que têm de ser considerados.”

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Essas perspectivas possibilitam vislumbrar certa relação entre textos e hipertextos, se

considerarmos, sob a ótica sociointeracionista da linguagem, o texto como um complexo inacabado,

que carrega em si traços intra- e intertextuais, dimensões polifônicas e possibilidades interacionais

com o contexto social, histórico, político e cultural em que é apropriado, assim como os sujeitos que

com ele se comprometem, tanto na perspectiva da autoria quanto da recepção. É o texto tomado

como um complexo cujos sentidos, individuais e múltiplos, estão por serem construídos, pois “a

leitura é sempre apropriação, invenção, produção de significados.” (CHARTIER, 1999, p. 77)

Nesse sentido, vale considerar que a não-linearidade, a mobilidade de centros, a multiplicidade,

dentre outros, próprias do hipertexto, são traços que se tem potencialmente no texto convencional,

que, quanto à forma e o suporte em que se dá, possibilita remissões a índices e sumários, a notas de

rodapé, a outros textos e autores etc.; assim como quanto às informações e conceitos veiculados,

que remetem a outros textos e outros ambientes, extrapolando a suposta unidade textual

eventualmente captada por um sujeito, em deliberado exercício de produção de sentido.

Por outro lado, seria simplista asseverar, a partir dos traços comuns que apresentam essas duas

categorias, que o texto e o hipertexto eletrônico guardam exata correspondência. Afinal, como

destaca Chartier (1999, p.71), “a obra não é jamais a mesma quando inscrita em formas distintas,

ela carrega, a cada vez, outro significado” e os significados são produzidos em gestos de leitura que

“mudam segundo os tempos e lugares, os objetos lidos e as razões de ler. Novas atitudes são

inventadas, outras se extinguem.” (CHARTIER, 1999, p. 77)

Evidencia-se aí a compreensão de que o suporte, assim como o contexto em que se processa a

atividade de leitura, com suas dimensões materiais e ou simbólicas, estabelece múltiplas interações

e diferentes possibilidades de produção de sentido.

A relevância do suporte é destacada igualmente por Maingueneau, que registra:

Hoje, estamos cada vez mais conscientes de que o mídium não é simples “meio” de

transmissão do discurso, mas que ele imprime um certo aspecto a seus conteúdos e

comanda os usos que dele podemos fazer. O mídium não é um simples “meio”, um

instrumento para transportar uma mensagem estável: uma mudança importante do mídium

modifica o conjunto de um gênero do discurso. (MAINGUENEAU, 2008, p. 71)

Embora reconhecendo as zonas em que, sob seus aspectos conceituais, texto e hipertexto não

diferem significativamente quanto ao seu caráter dialógico, intertextual, polifônico e interacional;

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há de se reconhecer que, quanto aos aspectos funcionais, guardam contornos diferenciados, que se

evidenciam quando o hipertexto é tomado como mecanismo de cognição e de enunciação.

Assim, vale examinar, por seu turno, traços hipertextuais que, ainda que não oponham

necessariamente texto e hipertexto, possibilitam reconhecer diferenças entre ambos. É o que Xavier

(2002) identifica como “dessemelhanças” entre tais categorias, as quais o autor explora com o

escopo de possibilitar a visualização de suas potencialidades no processo enunciativo digital

propriamente dito. As dessemelhanças corresponderiam, nesse diapasão, à imaterialidade, à

confluência de modos enunciativos, à não linearidade, à intertextualidade infinita.

Acerca da imaterialidade, Xavier (2002) destaca o paradoxo entre o que pode ser “tocado” sob o

comando de um mouse, por exemplo, sem que, no entanto, possa-se sentir fisicamente. Não

obstante a imaterialidade, pode-se deslocar o objeto hipertextual, transportá-lo virtualmente, cortá-

lo, reconstruí-lo ou editá-lo. Pode-se até imprimir um hipertexto eletrônico, todavia essa operação

não o identificaria com o texto, porque perderia muitas de suas propriedades originárias, tais como a

animação das imagens e os efeitos de som, que o diferenciam do texto gutenberguiano.

Relativamente aos modos enunciativos, o hipertexto eletrônico possibilita a coexistência de

diferentes formas de textualidade, traduzidas na apropriação de imagens em vídeo, ícones animados

e sons, que, na tela, não instauram concorrência entre si, mas tão somente a co-ocorrência, que

enseja (e demanda) a leitura multissensorial, mobilizando, para além das habilidades de leitura

convencionais, outras habilidades e competências no exercício de produção de sentido.

Já a não-linearidade, embora, como já reconhecido no corpo do presente trabalho, ainda que não se

constitua traço exclusivo do hipertexto eletrônico, uma vez que no texto convencional se faz

presente, por exemplo, em sumários e índices, notas de rodapé e outros; ganha expressiva

relevância na tela. Xavier (2002) ressalta que, no texto impresso, a não-linearidade constitui uma

forma de recepção, ao passo que, no hipertexto eletrônico, apresenta-se como uma exigência de sua

produção. Assim, a não-linearidade nesse contexto enseja ao leitor (e dele demanda) o exercício de

reorganização de sua estrutura, na eleição de caminhos que vão ao encontro de seus interesses no

exercício de navegação.

Por fim, a intertextualidade infinita é tratada pelo autor como um diferencial do hipertexto que não

só o caracteriza como potencializa a não-linearidade que lhe é própria. É fato que a

intertextualidade está presente no texto convencional, assim como no discurso e no pensamento do

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sujeito lingüístico, no entanto, no âmbito do hipertexto, acentuam-se as funções e possibilidades

intertextuais. De resto, a intertextualidade, potencializando a não-linearidade e o caráter dialógico

da atividade textual, possibilita asseverar que a leitura hipertextual é exercício que se dá sobre e

com um complexo discursivo mutante e plural, cujo acesso requer a imersão na sua infinitude

textual, em ambiente no qual relações se estabelecem, de um lado, pelo (hiper)leitor e de outro,

pelos hiperlinks.

Os estudos de Xavier (2002), quando postos em diálogo com as características hipertextuais

correntes na literatura e apresentadas no presente trabalho: metamorfose, heterogeneidade,

multiplicidade, exterioridade, topologia e mobilidade dos centros, relacionadas ainda aos múltiplos

conceitos sobre texto e hipertexto, possibilitam constatar que não há oposição deliberada entre texto

e hipertexto, todavia não se pode olvidar que entre ambos há traços distintivos. Enquanto modo de

enunciação digital, o hipertexto potencializa as operações da escrita (e da leitura), quando aos

recursos já existentes alia outros, compondo uma malha textual multidimodal, que articula textos

verbais (orais e escritos), sons diversos, imagens, ícones e animações, ora articulados previamente,

ora a serem mobilizados pelo leitor, complexificando, em última análise o ato de ler. Em outras

palavras, se, do texto, o hipertexto preserva traços como a polifonia e a intertextualidade, de outro, a

malha hipertextual potencializa algumas de suas características, fazendo emergir outras formas e

gêneros textuais, assim como outro perfil de leitor, ou o leitor imersivo (Santaella, 2007a), que,

navegando sobre as dimensões desse complexo discursivo permanentemente inacabado, reinventa-

o, reinventando-se também continuamente.

Lévy (2007a) aborda o hipertexto na perspectiva da cognição, considerando sua (re)construção e

movimento permanentes, sob a seguinte percepção: “Assim, como no rio de Heráclito19

, o

hipertexto jamais é duas vezes o mesmo. Alimentado por captadores, ele abre uma janela para o

fluxo cósmico e a instabilidade social.” (LÉVY, 2007a, p. 48). Nesse contexto, estabelecem-se

marcos diferenciais entre o potencial e o virtual.

Para o autor, o potencial está na dimensão do computador, envolvendo hardware e software, no

armazenamento de uma memória digital, que instaura possibilidades de leitura. Essa concepção

poderia reduzir o computador a mera ferramenta, que guardasse mais sofisticação que uma máquina

19

Heráclito, pensador grego pré-socrático, era apologista da tese de que tudo é movimento, permanente mutação.

Consonante com essa idéia, fez-se a máxima de que “não se entra duas vezes no mesmo rio”, uma vez que, no segundo

evento, as águas já não seriam as mesmas, assim como não o seria o sujeito que o fizesse. A analogia é pertinente, na

medida em que vai ao encontro da efemeridade e mutabilidade do hipertexto, o qual se modifica sob a ação do leitor,

que na interação com a malha textual, também se modifica.

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de escrever mecânica. Todavia tanto a sua conotação simbólica, enquanto ícone de progresso

tecnológico com todas as implicações culturais que suscita, quanto às suas possibilidades sígnicas,

quando articula textos, imagens, animações e sons, que, mobilizados pelo leitor, implicam novas

interfaces, outras interações e, em seu bojo, o aparecimento de novos gêneros (digitais), situam-no

em outro patamar que não o de apenas um entre tantos artefatos que a tecnologia pôde conceber.

O virtual, por sua vez, dá-se como uma realização que se efetiva a partir da atuação do leitor, o

qual, face o novo suporte (e ambiente) textual, vê-se compelido a mobilizar, para além das

habilidades e competências de que dispõe para a leitura do texto gutenberguiano, atitudes

identificadas com a seleção, a validação e a apropriação pertinente da informação, cuja atualização

(ou interpretação) é condição sine qua non para a atividade de cognição, já que “toda leitura em

computador é uma edição, uma montagem singular.” (LÉVY, 2007a, p. 41). Assim, enquanto o

computador traz em si a potencialização (ou uma exibição a ser realizada), a sua virtualização

constitui fenômeno que requer a interação do sujeito com esse ambiente. Nesse sentido, “o virtual

só eclode com a entrada da subjetividade humana no circuito, quando num mesmo movimento

surgem a indeterminação do sentido e a propensão do texto a significar, tensão que uma atualização,

ou seja, uma interpretação resolverá na leitura.” (LÉVY, 2007a, p. 40)

Como já reportado no presente trabalho, é recorrente a situação do hipertexto numa relação de

oposição ao texto convencional, na medida em que o complexo hipertextual comporta uma

deslinearização que a estrutura textual gutenberguiana não comportaria. É recorrente ainda a

percepção de que, com a hipertextualização, leitor e autor seriam reduzidos a uma única e indistinta

categoria.

Examinando tais pontos de vista, Lévy (2007a) observa que a suposta oposição entre texto e

hipertexto não se dá, na medida em que os textos enciclopédicos, por exemplo, guardam as mesmas

propriedades remissivas que se veem no hipertexto eletrônico. Todavia, o autor tem o cuidado de

não incorrer no caminho inverso, que relacionaria indistintamente tais categorias e, nesse diapasão,

destaca, como relevantes diferenças aí presentes, a velocidade com que se pode empreender a ação

hipertextual e ainda o fato de que, enquanto no texto impresso é o leitor que se desloca na superfície

da escrita, virando páginas, remetendo-se a índices ou notas de rodapé, percorrendo os espaços

físicos de uma biblioteca; no ambiente digital, as facetas do movimento da leitura estão diante do

leitor como um apelo muito mais eloquente, que o desafia e incita a empreender, com velocidade

sem precedentes, o estabelecimento de nexos e a incursão por caminhos que o conduzam no mar de

informações continuamente crescentes e mutáveis.

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Tratando a interação na esfera hipertextual, há de se considerar o hipertexto também na perspectiva

da produção. Nesse sentido, enquanto o texto, mesmo que tomado como obra aberta, inacabada, em

virtude da polifonia e da intertextualidade que lhe são intrínsecas, traz um contingente menor de

possibilidades de adoção de caminhos alternativos; o hipertexto o faz de maneira mais célere, em

um sem número de alternativas, como já observado, já que potencializa os traços que eram

inicialmente da ontogênese do texto. O conhecimento dessa diferença, muito mais de grau do que

de sentido das propriedades textuais e hipertextuais, leva o sujeito, na posição inicial de produtor de

hipertexto, a identificar caminhos e atitudes do hiperleitor, de modo a reorientar a apresentação

hipertextual, enfatizando ou enfraquecendo as ligações, em virtude de suas intenções e ou do

comportamento do navegador. Nas atitudes do leitor-navegador é possível encontrar pistas para se

repensar as interfaces na tela, o que, em última análise, ressitua autor e leitor, bem como o diálogo

que se processa na esfera hipertextual, na qual os hiperlinks se podem constituir em anáforas20

no

processo discursivo, revelando-se imbricados com os movimentos de leitura empreendidos.

Ao considerar o potencial e o virtual, inevitável se faz considerar autoria, leitura, assim como o

fenômeno e a atividade hipertextual propriamente dita, que colocam escrita e leitura como

atividades imbricadas, que se processam na esteira de hiperdocumentos, descentrados,

deslinearizados e atópicos, possibilitando concluir com Lévy:

Assim a escrita e a leitura trocam seus papéis. Todo aquele que participa da estruturação do

hipertexto, do traçado pontilhado das possíveis dobras do sentido já é um leitor.

Simetricamente, quem atualiza um percurso ou manifesta este ou aquele aspecto da reserva

documental contribui para a redação, conclui momentaneamente uma escrita interminável.

As costuras e remissões, os caminhos de sentido originais que o leitor inventa podem ser

incorporados à estrutura mesma do corpus. A partir do hipertexto, toda leitura tornou-se um

ato de escrita. (LÉVY, 2007a, p. 46)

A retomada dos estudos de Xavier (2002) e Lévy (2007a) possibilita um olhar crítico sobre a

equivocada atribuição de polaridade entre texto e hipertexto e sobre sua suposta identidade,

repelindo tanto as correntes que sumariamente situam ambos como categorias absolutamente

similares, quanto as teses de que o hipertexto se opõe deliberadamente ao texto. Assim, soa

eloquente a constatação de Lévy (2007a), que merece, no entanto, algumas ressalvas:

20

A abordagem dos hiperlinks como anáforas, que os coloca mais que como meros indicadores de caminhos, mas como

elementos de interligação semântica relevantes para a produção de sentido do leitor navegador é matéria que se acha

sobejamente tratada na dissertação de mestrado em Teorias do Texto e do Discurso, intitulada: A produção de sentidos

em hipertexto: os hiperlinks como anáforas, de Tânia Jurema Flores da Rosa, acessada em 28 mai. 2009, disponível em

<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/8668/000585566.pdf?sequence=1>, que explora os estudos de

Antônio Carlos dos Santos Xavier, quando o autor reconhece os hiperlinks como insertos no processo subjetivo de

construção textual.

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Longe de aniquilar o texto, a virtualização parece fazê-lo coincidir com sua essência

subitamente desvelada. Como se a virtualização contemporânea realizasse o devir do texto.

Enfim, como se saíssemos de uma pré-história e a aventura do texto começasse realmente.

Como se acabássemos de inventar a escrita. (LÉVY, 2007a, p. 50)

O autor trata o hipertexto como o devir do texto, numa referência aos traços que são intrínsecos a

este, dentre os quais a condição dialógica, intertextual, portanto inacabada, que agora se poderiam

ver exploradas de forma potencializada pelas múltiplas conexões que se podem empreender com

velocidade sem precedentes no ambiente virtual. Essa tese se torna procedente se entendermos o

uso da expressão “devir do texto” como força de retórica. Merece ressalva, no entanto, a idéia

invocada de que o período anterior à escrita seria “pré-histórico”, afinal, na era da oralidade, o ser

humano, desde os primórdios da sua existência, já se constituía em sujeito histórico (e lingüístico),

que tinha na comunicação oral tecnologias de linguagem que lhe permitiam gerenciar o seu tempo,

na circularidade das narrativas míticas, e compor uma memória, cuja extensão e ressituação de fato

se deram com a escrita e se vêm reconfigurando na era digital. Assim, não se há de falar, salvo se

tomados por otimismo e paixão que inevitavelmente as tecnologias da informação e da

comunicação suscitam, em início da “aventura do texto”, mas talvez em outro capítulo dessa

aventura a partir da reinvenção (ou redimensionamento) da escrita como uma tecnologia

multimodal e multimidiática, que tem potencializados muitos dos seus traços originários.

Essas considerações se fazem relevantes porque, assim como as concepções de linguagem,

examinadas nesse capítulo, redundam em concepções de ensino (e aprendizagem) da língua

materna; as concepções de texto e hipertexto serão significativas para balizar concepções e práticas

de leitura e produção de sentido (hiper)textual na escola e, por extensão, na vida social.

2.6. (Hiper)leitura, alfabetização e letramento digital

Nessa perspectiva, vale lembrar que a aprendizagem da leitura viu-se historicamente associada à

possibilidade de ascensão social, já que nas sociedades letradas a escrita se fez modalidade de

linguagem hegemônica. Autores como Geraldi (1996), Kleiman (2004), Silva (2002, 2009) e Soares

(2006, 2008) dão visibilidade, em seus estudos, aos desafios que o ensino da língua e da leitura

propriamente dita experimentam no âmbito da educação básica, com suas inevitáveis conseqüências

na educação superior e na vida social em sentido amplo, no seio da qual o ato de ler constitui prática

cada vez mais demandada e determinante para a inserção, trânsito e interação do sujeito na cena

contemporânea.

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Geraldi (1996) reflete sobre o significado que assume a leitura na escola face os desafios da

sociedade em que se situa. Para o autor, “aprender a ler é, assim, ampliar as possibilidades de

interlocução com pessoas que jamais encontraremos frente a frente e, por interagirmos com elas,

sermos capazes de compreender, criticar e avaliar seus modos de compreender o mundo, as coisas,

as gentes e suas relações.” (GERALDI, 1996, p. 70)

Depois de destacar o caráter interacional da leitura e a necessidade de empreender operações

intelectuais de compreensão, crítica e avaliação, Geraldi (2002) considera a dimensão política da

prática da leitura na sala de aula:

Construção de significados, mudanças de significados, atribuição de sentidos: partem

sempre do texto, são trabalhos de leitura. Numa sociedade onde a leitura não é uma prática

social, ler na sala de aula para construir possibilidades, construir significações, torna-se

perigosa subversão. Lutar por ela é lutar, onde se está, contra o status quo. (GERALDI,

2002, p. 84)

Kleiman (2004, p. 11) situa a leitura como “uma prática social que remete a outros textos e outras

leituras. Em outras palavras, ao lermos um texto, qualquer texto, colocamos em ação todo o nosso

sistema de valores, crenças e atitudes que refletem o grupo social em que fomos criados.”

Assim, para a autora a prática de leitura na escola não se pode descolar da prática social, sob pena

de não se cumprir seu papel na construção do conhecimento e na formação do sujeito letrado.

Silva (2009), para abordar a leitura crítica como prática que demanda competências a serem

exploradas com intencionalidade deliberada pela escola, registra:

Em sociedade, são múltiplos e diversificados os usos da leitura. Lê-se para conhecer. Lê-se

para ficar informado. Lê-se para aprimorar a sensibilidade estética. Lê-se para fantasiar e

imaginar. Lê-se para resolver problemas. E lê-se também para criticar e, dessa forma,

desenvolver um posicionamento diante dos fatos e das idéias que circulam por meio dos

textos. (SILVA, 2009, p. 28)

Soares (2008, p.30), ao examinar a (im)procedência da afirmativa recorrente de que “o brasileiro lê

pouco ou lê mal”, pondera:

Ler só é verbo intransitivo, sem complemento, enquanto seus referentes forem as

habilidades básicas de decodificar palavras e frases: diz-se de alguém que sabe ler, assim,

sem complemento, ou que não sabe ler, quando se quer com isso dizer que alguém é

alfabetizado ou é analfabeto. Para além desse nível básico, ler como prática social de

interação com material escrito torna-se verbo transitivo, exige complemento: o

alfabetizado, o letrado lê (ou não lê) o quê? Lê mal (ou lê bem) o quê? O jornal? O best-

seller? Sabrina? Machado de Assis? Drummond? A revista Capricho? Playboy? Bravo?

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Caros Amigos? Veja, Isto É, Época? A conta de luz, de água, de telefone? A bula do

remédio? O verbete do dicionário, da enciclopédia? (SOARES, 2008, p. 30)

A partir dessa reflexão, a autora suscita a consideração da leitura identificada com uma prática de

variados graus de complexidade, o que remete à percepção de que as habilidades, competências e

atitudes do leitor devem-se desenvolver continuamente nos diversos estágios de sua vida escolar,

tanto na educação básica, como na educação superior e nos níveis subseqüentes.

Ao tratar a prática social da leitura e da escrita, Soares (2002) discute, dentre outros, a origem e

pertinência do termo letramento, observando que “palavras novas aparecem quando novas idéias ou

novos fenômenos surgem.” (SOARES, 2002, p. 45). A autora esclarece que a alfabetização

historicamente designou o estado ou condição daquele que sabia ler e escrever, acrescentando que,

com a ampliação e complexificação dessas práticas, o termo letramento ganhou a cena

contemporânea como designação adequada para referir o domínio das práticas sociais da escrita.

Reconhece, nesse diapasão, o letramento como o estado ou condição daquele que domina a leitura

e a escrita como práticas sociais, que se constituem em fenômenos distintos. Assim, relacionando a

prática da escrita a um conjunto de habilidades e comportamentos que se estendem desde

simplesmente escrever o próprio nome até elaborar textos complexos, a autora situa o ato de ler nos

seguintes termos:

É um conjunto de habilidades e comportamentos que se estendem desde simplesmente

decodificar sílabas ou palavras até ler Grande Sertão Veredas de Guimarães Rosa... uma

pessoa pode ser capaz de ler um bilhete, ou uma história em quadrinhos e não ser capaz de

ler um romance, um editorial de jornal... (SOARES, 2002, p. 48)

Nesse diapasão, retoma os diferentes graus de complexidade da leitura, prática cujo domínio se dá

num continuum, em que as habilidades e competências não se esgotam nem se superam, mas, antes,

incorporam níveis de complexificação crescentes. Ademais suscita dimensões da prática social da

leitura com seu caráter de fruição e ou utilitário, que não se opõem necessariamente, podendo se

complementar no ato de ler.

De resto, vale dizer que no, âmbito da escola, o que se tem constatado, de forma recorrente, é a

escolarização da leitura, esvaziada quase sempre de sua articulação com a vida social. Apesar de, na

última década, verificarem-se tentativas de reorientação dessa conduta, ainda é recorrente o trato da

leitura textual a pretexto de se explorar a sua dimensão gramatical, bem como a adoção de fichas de

leitura, que pelo estudante são recebidas como “ônus” da experiência literária; prática que se

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legitima também na lógica do ensino superior, cujo ingresso pressupõe vestibulares que tratam

autores e obras fixados como programa de prova de literatura.

Por outro lado, ainda que de forma incipiente, vem se manifestando algum nível de sensibilidade e

percepção para com a necessidade de lidar com o ensino da língua e com a prática de leitura na sua

articulação com a vida social. Um indício desse quadro pode ser verificado, por exemplo, na ampla

acolhida que vêm encontrando, nas escolas, as propostas e materiais didáticos que trazem em seu

bojo o conceito de letramento.

O termo, que tem sido objeto de muita polêmica, em geral é tomado como tentativa de marcar a

diferença entre a escrita tomada como código e a leitura como prática reduzida a mera

decodificação (alfabetização); em relação a escrita e leitura como práticas sociointeracionais, que se

dão no seio da sociedade, isto é, como letramento, ou uso social da língua escrita, seja na produção

ou na recepção / leitura de textos.

Na esteira do letramento, com o status de prática social da leitura e escrita, emergem outras

linguagens, no bojo das tecnologias da informação e da comunicação, que não só incorporam à

prática linguística um caráter multimodal, pelo uso (e articulação) de palavras (orais e ou escritas),

imagens, ícones, animações e sons; como redimensionam o conceito de texto, que já não se pode

mais traduzir, de forma reducionista, numa unidade com começo, meio e fim, consubstanciada no

binômio coesão e coerência, que se dariam prontos ao leitor. Nesse diapasão, o texto assume, como

já assinalado no presente trabalho, suas dimensões polifônicas e intertextuais, bem como seu caráter

inacabado, de um sentido que está por ser construído a partir da interação entre o leitor e esse

complexo enunciativo, envolvendo contexto e repertório que o leitor invoca, ao mobilizar

habilidades, competências e atitudes para a produção de sentido.

Nessa perspectiva, o letramento, que poderia encerrar a abrangência e complexidade da escrita,

agora redimensionada pelas tecnologias da informação e da comunicação, passa a ser distinguido

recorrentemente na literatura como letramento digital21

, de forma a sugerir que se dá sobre uma

outra concepção de texto (ou hipertexto). Xavier (2008) esclarece que:

O Letramento digital implica realizar práticas de leitura e escrita diferentes das formas

tradicionais de letramento e alfabetização. Ser letrado digital pressupõe assumir mudanças

nos modos de ler e escrever os códigos e sinais verbais e não-verbais, como imagens e

21

A categoria letramento digital é referida por autores como Coscarelli (2003), Ribeiro (2005), Soares (2002) e Xavier

(2008), dentre outros.

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desenhos, se compararmos às formas de leitura e escrita feitas no livro, até porque o suporte

sobre o qual estão os textos digitais é a tela, também digital. (XAVIER, 2002, p. 2)

Embora não se deva fazer distinção simplista entre texto e hipertexto, tendo em vista suas

semelhanças e dessemelhanças já examinadas na pesquisa em questão, não se há de olvidar que os

novos suportes e os múltiplos contextos em que se dão os complexos hipertextuais demandam a

mobilização de outras habilidades e competências para a sua leitura e consequente produção de

sentido. Ressalte-se que não há um processo de superação do texto nem de obsolescência das

tradicionais habilidades e competências, mas um movimento de complexificação que demanda, para

além destas, a incorporação de outras tantas.

O texto cada vez mais deslinearizado, portanto, hipertextualizado, reclama a adoção de outro olhar

sobre a realidade, multifacetada e aparentemente fragmentada, na busca do estabelecimento de

nexos (links) os quais possibilitem alcançar a organicidade que torna o todo mais que a soma das

partes. Esse caminho demanda outro perfil de leitor e uma prática de leitura complexificada, que

potencialize as habilidades e competências convencionais na sua articulação com outras tantas, de

forma a produzir sentido sobre e com um complexo hipertextual que, nas palavras de Lévy (2007a),

revela o “devir do texto”.

Nesse contexto, ganha ainda mais relevo a assertiva de Soares (2006):

O letramento é, sem dúvida alguma, pelo menos nas modernas sociedades industrializadas,

um direito humano absoluto, independentemente das condições econômicas e sociais em que

um dado grupo humano esteja inserido; dados sobre letramento representam, assim, o grau

em que esse direito está distribuído entre a população e foi efetivamente alcançado por ela.

(SOARES, 2006, p.120).

De resto, o redimensionamento do uso social da escrita tendo em vista o advento das tecnologias da

informação e da comunicação - ou letramento digital - requer repensar as competências

secularmente concebidas como suficientes para o movimento predominantemente linear de

produção de sentido textual; não necessariamente no sentido de as substituir, mas de a muitas delas

agregar competências identificadas com o movimento em rede, dando eco aos desafios dos cenários

que se descortinam sob a égide das hipermídias e especificamente do hipertexto, sob pena de se

levar à exclusão um contingente expressivo de cidadãos que, na sociedade letrada e

tecnologicamente redimensionada, não estejam aptos a transitar e estabelecer trocas em condições

igualitárias, ao menos do ponto de vista da competência na seara da linguagem.

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A ressituação da linguagem (hipertextualizada) impõe uma retomada de postura desde os níveis

iniciais até os mais avançados, ou desde a educação básica até a educação superior, sob a convicção

de que as habilidades de leitura, ou letramento propriamente dito, requerem permanente exercício

face os desafios que a complexificação da malha hipertextual apresenta.

Com relação a esse exercício, oportuno se faz considerar com Kato (2007, p. 135) a prática da

leitura nas suas dimensões cognitivas e metacognitivas, as quais operam sob a forma de estratégias

que marcam diferentes fases no desenvolvimento do conhecimento.

As estratégias cognitivas corresponderiam, segundo a autora, àquelas que “munem o leitor de

procedimentos altamente eficazes e econômicos, responsáveis pelo processamento automático e

inconsciente”. (KATO, 2007, p. 135) Tais estratégias desenvolvem-se naturalmente, sobretudo se a

escola promove situação favorável para esse fim, sob a forma de estímulo compreensivo e de

incentivação que possa redundar em motivação da parte do leitor.

As estratégias metacognitivas, por sua vez, corresponderiam aos “princípios que regulam a

desautomatização consciente das estratégias cognitivas” (KATO, 2007, p. 124), implicando um

processo de conhecimento (não intuitivo, mas consciente) dos processos e estratégias de leitura. As

estratégias em questão estariam relacionadas, segundo a autora, ao estabelecimento de um objetivo

explícito para a atividade de leitura, bem como ao monitoramento da compreensão com lastro nesse

objetivo.

Embora a autora trate as estratégias cognitivas e metacognitivas na perspectiva do texto

convencional, sua aplicabilidade à leitura hipertextual revela-se factível, na medida em que há

habilidades de leitura do texto eletrônico que são mobilizadas de forma inconsciente (estratégias

cognitivas) e que resultam em práticas de produção de sentido. Outras há também que se dão de

forma consciente, eivadas de intencionalidade, refletindo a concepção de estratégias

metacognitivas, as quais, quanto mais presentes na prática da leitura hipertextual, mais favorecem a

proficiência do hiperleitor. Como observa Santaella:

Analisar as habilidades cognitivas das infovias envolve dar-se conta de uma teia intrincada

de processos sensórios, perceptivos, estados de alerta, de reconhecimento e identificação,

habilidades discriminativas e seletivas, processos decisórios, memória, aprendizagem,

controle motor, tatilidade e, sobretudo, processos de raciocínio. (SANTAELLA, 2007, p.

87)

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Tais processos requerem o seu reconhecimento e exploração, de forma a potencializar a proficiência

da prática de leitura (e produção) hipertextual, já que o texto eletrônico, tendo em vista seus traços

constitutivos, dentre eles a multiplicidade, o descentramento e a não-linearidade, tende a conduzir o

leitor a vagar sem rumo por entre a malha textual, salvo se adotar estratégias metacognitivas que lhe

preservem a capacidade de empreender a leitura com intencionalidade, concentração ou foco,

habilidade para validação da informação, bem como para convertê-la em conhecimento.

O exame do perfil desse leitor, imersivo ou leitor navegador, tendo em vista seu nível de

proficiência ante a malha hipertextual e, por extensão, a consideração do significado do hipertexto

para sua construção de conhecimento, demandam a apreciação do ambiente em que se processa a

prática da leitura propriamente dita, qual seja o ciberespaço, cenário em que se instaura (e se revela)

a cibercultura, com os consequentes desafios e possibilidades para o ciberleitor. Assim, o capítulo

subsequente buscará proceder à abordagem desse cenário, situando, na presente pesquisa, o leitor

imersivo, cujo perfil balizará, em larga medida, a análise dos resultados auferidos por meio do

questionário aplicado a estudantes de graduação do curso de pedagogia da UFMG.

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3. CIBERESPAÇO, CIBERCULTURA E CIBERLEITOR

O (ciber)espaço que se constitui sob a égide de componentes simbólicos, assim como os processos e

relações que em seu âmbito se engendram são determinantes quanto a situar o sujeito que nele

transita, enquanto o constitui e é por ele constituído, redefinindo paradigmas e valores. Nessa

perspectiva é que passamos a examinar sua constituição e caracterização.

3.1. Reterritorializações em espaços simbólicos

Outros marcos temporais e espaciais se instauram com o advento das novas tecnologias da

informação e da comunicação, assim como diferentes relações, lastreadas em novas interações e em

variadas interfaces no ambiente digital, em que interconexões inumeráveis se processam de forma

contínua e em constante movimento.

Imbricadas com as dimensões temporais, revelam-se a velocidade e a instantaneidade sem

precedentes do fluxo de informações, bem como a mutabilidade contínua. Sob a égide desses

fenômenos, tem-se a coexistência e ou alternância do tempo real, nas interações on line, e as

temporalidades mais flexíveis, em interações assíncronas, numa ruptura com a linearidade temporal.

Historicamente, as concepções de espaço e as territorializações empreendidas a partir da interação

do ser humano com o meio de que é parte integrante, possibilitaram o reconhecimento do que Lévy

(2007b, p. 22) designa como espaços antropológicos, na medida em que o envolvem em relações de

significações múltiplas, imbricadas com técnicas, linguagens, culturas e afetos. Nesse sentido, para

o autor, o primeiro espaço antropológico teria sido a Terra, sobre a qual só os seres humanos vivem,

enquanto os animais a habitam; outro espaço seria o Território, o qual, embora não suprimindo o

anterior, tenta domesticá-lo, no bojo dos fenômenos da posse e exploração do campo nas atividades

agropastoris. O autor identifica ainda o Espaço das Mercadorias, que tem como marca o fluxo (de

mercadorias, capitais, mão-de-obra, energia, informações). Por último, estaríamos às voltas com o

surgimento de um novo espaço, o Espaço do Saber, que, diferentemente de substituir os demais,

viria para comandá-los. Para Lévy:

A novidade, nesse domínio, é pelo menos tripla: deve-se à velocidade de evolução dos

saberes, à massa de pessoas convocadas a aprender e produzir novos conhecimentos e,

enfim, ao surgimento de novas ferramentas (as do ciberespaço) que podem fazer surgir, por

trás do nevoeiro informacional, paisagens inéditas e distintas, identidades singulares,

específicas desse espaço, novas figuras sócio-históricas. (LÉVY, 2007b, p. 24)

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Assim, na relação com a velocidade do fluxo de informações e das interações, aliada à abrangência

destas, que alcançam múltiplas extensões do planeta, alternando e ensejando fenômenos locais e

globais, instaura-se uma outra geografia (e novos espaços), no bojo de um movimento que,

nômades por excelência, empreendemos por vias simbólicas.

Segundo Lévy:

O espaço do novo nomadismo não é o território geográfico, nem o das instituições ou o dos

Estados, mas um espaço invisível de conhecimentos, saberes, potências de pensamento em

que brotam e se transformam qualidades do ser, maneiras de constituir sociedade. Não os

organogramas do poder, nem as fronteiras das disciplinas, tampouco as estatísticas dos

comerciantes, mas o espaço qualitativo, dinâmico, vivo da humanidade em vias de se auto-

investir, produzindo seu mundo. (LÉVY, 2007b, p. 15)

Nesse contexto, redesenha-se, então, o espaço das interações humanas, fazendo emergir, face as

novas territorialidades nem sempre reconhecidas, nem sempre compreendidas em virtude de sua

incipiência, teses identificadas com o fim dos territórios, que, diferentemente de se confirmarem,

revelam, antes, outras territorializações, as quais, segundo Haesbaert (2004), traduzem-se na

redefinição dos espaços, que, passam a incorporar dimensões materiais e ou simbólicas. Desse

movimento resultam territórios físicos, virtuais, políticos e culturais, dentre outros, possibilitando a

vivência de multiterritorialidades, num contexto em que se permite,

(...) pela comunicação instantânea, contatar e mesmo agir sobre territórios completamente

distintos do nosso, sem a necessidade de mobilidade física. Trata-se de uma

multiterritorialidade envolvida nos diferentes graus daquilo que poderíamos denominar

como sendo a conectividade e/ou vulnerabilidade informacional (ou virtual) dos territórios.

(HAESBAERT, 2004, p. 345)

Nesse diapasão, a noção de espaço se reorienta, mas não se confunde com o fim dos territórios

locais e ou globais; diferentemente disso, incorpora, para além dos referenciais físicos, as

dimensões simbólicas, na composição de uma outra geografia. Os movimentos que se dão nesse

ambiente já não se fazem notar por rastros de sua materialidade, que poderiam desenhar a trajetória

nômade cumprida pelo ser humano, na medida em que assumem outra dinâmica, na sua imbricada

relação com as tecnologias da informação e da comunicação. Nesse sentido, segundo Lévy (2007b,

p. 15): “O desenvolvimento dos novos instrumentos de comunicação inscreve-se em uma mutação

de grande alcance, à qual ele impulsiona, mas que o ultrapassa. Numa palavra: voltamos a ser

nômades.”

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Dá-se, nesse contexto, uma nova geografia, cujas referências temporais e espaciais não podem ser

apreendidas pelos paradigmas que a modernidade concebeu, já que suas marcas assumem caráter

simbólico e fugidio, sob a égide da instantaneidade e mutabilidade presentes nesse cenário.

Diferentemente disso, essa outra geografia, que se define sob a égide das tecnologias da informação

e da comunicação, segundo Castells (2003, p. 170), “pode ser analisada de três perspectivas: sua

geografia técnica, a distribuição espacial de seus usuários e a geografia econômica da produção da

Internet.” O aspecto técnico envolve, grosso modo, a estrutura e a evolução da rede técnica da

Internet, tendo em vista as interconexões e sua abrangência. A geografia dos usuários, por sua vez,

refere-se à difusão do uso da Internet, que se vê imbricada com padrões de riqueza, tecnologia e

poder. No que tange o aspecto econômico, esclarece o autor que seria reducionista pensar

simplesmente na relação de países com a produção de hardwares, softwares, já que, sendo a

informação o produto-chave da era da informação, a geografia econômica estaria relacionada com a

distribuição e hegemonia dos provedores de conteúdos da Internet.

Nas considerações do autor, evidencia-se a necessidade de problematizar a expansão tecnológica e o

próprio crescimento do ciberespaço nas suas dimensões histórico-político-sociais, que comportam

em seu âmago relações de poder, as quais podem redundar em caminhos para a busca da

interlocução democrática, ou, antes, para a dominação ideológica, no bojo do jogo de poder que se

faz presente e se desenrola no cenário da civilização, em variadas escalas, desde a mais remota era.

De resto, as multiterritorialidades a que se refere Haesbaert (2004) compõem um cenário em que

coexistem variáveis de toda ordem, envolvendo, de forma imbricada, aspectos técnicos, humanos e

econômicos, entre os quais transitamos e com os quais interagimos, em processo permanente de

relação com sujeitos que se reconfiguram enquanto nos transformam também, num movimento

dialético. Nesse contexto, segundo Lévy:

Mexer-se não é mais deslocar-se de um ponto a outro da superfície terrestre, mas atravessar

universos de problemas, mundos vividos, paisagens de sentidos. Essas derivas nas texturas

da humanidade podem recortar as trajetórias balizadas dos circuitos de comunicação e de

transporte, mas as navegações transversais, heterogêneas dos novos nômades exploram

outro espaço. Somos imigrantes da subjetividade. (LÉVY, 2007b p. 14)

Embora empreendendo novas territorializações, não estariam os seres humanos simplesmente

inaugurando novas possibilidades e desafios, mas, paralelamente a estes, retomando seculares

problemas que refletem relações hierárquicas e jogos de poder que se manifestam no âmbito da vida

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social em sentido amplo, já que, segundo Castells (2003, p. 100), a Internet22

“é uma extensão da

vida como ela é, em todas as suas dimensões e sob todas as suas modalidades.”

Esse outro ambiente, sem centro nem linha, sem prévio contorno, em constante processo de

redimensionamento, de reconfiguração, vem sendo recorrentemente designado na literatura como

ciberespaço, uma categoria que emerge sob o efeito das novas tecnologias da informação e da

comunicação, ressituando o ser humano e suas relações e interfaces em outras temporalidades e

territorialidades.

3.2. O não-lugar como abrigo do coletivo: desafios e possibilidades

O termo ciberespaço foi criado em 1984 por Willian Gibson23

, que o adota para se referir ao

universo de interconexões digitais, presentes na obra Neuromante, um romance de ficção científica

em que o enredo traz à cena as tecnologias com suas dimensões intrínsecas, ensejando a

visualização e ou a deflagração de considerações sobre a sociedade que se vai descobrindo (e

revelando) no contexto do que alguns estudiosos identificam como pós-modernidade.

Ressignificado na atualidade a partir da visão ampliada das tecnologias da informação e da

comunicação, que se fazem progressivamente acessíveis a mais amplo espectro da população

mundial, o ciberespaço é referido por autores como Castells (2003), Lévy (2005, 2007b), Santaella

(2007a) e Wertheim (2001), dentre outros.

Castells (2003) refere-se ao ciberespaço como o ambiente e fenômeno tecnológico, social e político

em que correlações clássicas de forças antagônicas se fazem presentes, ainda que com novos

contornos, possibilitando asseverar que “na co-evolução da Internet e da sociedade, a dimensão

política de nossas vidas está sendo profundamente transformada.” (CASTELLS, 2003, p. 135)

Nesse contexto, o autor destaca três desafios: a conquista e preservação da liberdade; o

enfrentamento da ameaça de exclusão das redes, com a consequente condenação dos cidadãos e

sociedades à marginalidade; e o desafio de estabelecer a capacidade de processar informação e gerar

conhecimento, que passa, inexoravelmente, pela educação formal. (CASTELLS, 2003, p. 226)

22

É recorrente na literatura o uso de Internet tomada como sinônimo de ciberespaço, como o faz Castells em seu texto.

Lévy (2005, p.126), no entanto, compara a Internet a um grande oceano do novo planeta informacional, alimentado por

redes independentes de empresas, universidades e pelas mídias clássicas (bibliotecas, museus, jornais etc.), que, nessa

“rede hidrográfica”, constitui, mais que a Internet, o próprio ciberespaço. 23

Willian Ford Gibson, fundador e referência no chamado gênero Cyberpunk, criou e consagrou o termo ciberespaço

em sua novela Neuromante. Seus conceitos influenciaram a trilogia dos Irmãos Wachowski, Matrix.

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A par das teses que sacralizam o ciberespaço, como espaço de redenção da humanidade pela via da

ampla e democrática interação, ou que execram a sua instauração, como ambiente de exclusão dos

cidadãos não “plugados”, há de se ter presente que constitui ambiente social, não sustentado por

referências materiais, mas comprometido com dimensões simbólicas. Nesse sentido, assume a

conotação de cenário que comporta as tensões e os conflitos inerentes à vida social em sentido

amplo, demandando a inserção e o trânsito competente nesse contexto, sob pena de se dar a

exclusão social. Levar a efeito o desenvolvimento das competências para o trânsito e interação na

cena ciberespacial requer, dentre outros, a ação deliberada no âmbito da educação formal, sob a

égide de políticas e programas que se comprometam com a formação cidadã.

Lévy (2005, p.93) situa o ciberespaço como “o espaço de comunicação aberto pela interconexão

mundial dos computadores e das memórias dos computadores.” Ressalta o autor que “o termo

especifica não apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo

oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam

esse universo.” (LÉVY, 2005, p. 17)

Nessa perspectiva, como espaço simbólico das interfaces e das interações humanas de caráter

social, cultural, político etc., o ciberespaço não é um “lugar” que o leitor percorre (ou navega), mas

um complexo do qual é parte integrante.

Considerando a complexidade inerente ao ambiente em questão, Lévy destaca seu caráter

inacabado, quando assevera: “O ciberespaço constitui um campo vasto, aberto, ainda parcialmente

indeterminado, que não se deve reduzir a um só de seus componentes. Ele tem vocação para

interconectar-se e combinar-se com todos os dispositivos de criação, gravação, comunicação e

simulação.” (LÉVY, 2007b, p. 104)

É também o cenário que enseja a constituição do que o autor identifica como inteligência coletiva,

“uma inteligência distribuída por toda a parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo

real, que resulta em uma mobilização efetiva das competências.” (LÉVY, 2007b, p. 28). Nesse

sentido, considera:

Se o pensamento dos indivíduos é lacunar porque eles dormem, ficam doentes, fatigados ou

entram em férias, o intelectual coletivo jamais se extingue. Quando um espírito cai no sono,

cem outros velam e assumem seu posto. De tal modo que o mundo virtual está

permanentemente iluminado, animado pelas flamas de inteligências vivas. Unindo milhares

de luzes intermitentes obtém-se um luminar coletivo, que brilha sempre. (LÉVY, 2007b, p.

95)

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73

Dessa percepção, evidencia-se, no caráter coletivo dessa inteligência constituída, sua supremacia

sobre o caráter individual. Em outras palavras, o ciberespaço, como locus de informação e produção

de saberes, compõe-se e sustenta-se no seu movimento complexo, de interações e interfaces entre

tecnologias, seres humanos e nos laços sociais que se manifestam em seu bojo.

Santaella (2007a), por seu turno, reconhece o ciberespaço como um complexo que envolve

realidade virtual, informação, interfaces gráficas dos usuários, as redes, as mídias e a hipermídia,

num movimento dialógico que se dá em torno de um objetivo comum, qual seja a interação no e

com o universo informacional em que se engendram múltiplas relações. Nesse diapasão, constitui

um universo virtual de abrangência global, que guarda independência em relação aos acessos ou ao

modo como nele se navega. Segundo a autora:

Tal qual uma língua, cuja consistência interna não depende de que os seus falantes estejam,

de fato, pronunciando-a, pois eles podem estar todos dormindo, em um dado momento

imaginário, o ciberespaço, como uma virtualidade disponível, independe das configurações

específicas que um usuário particular consegue extrair dele. (SANTAELLA, 2007a, p. 40)

Sob a ótica do caráter autônomo do ciberespaço, extrapola-se da conotação antropocêntrica que se

poderia atribuir a essa categoria, para reconhecer, na sua ontogênese, imbricadas interfaces e

interações das quais o ser humano constitui uma das dimensões constitutivas, mas não o centro de

sua existência.

O caráter coletivizado e interacional que assume o ciberespaço é também registrado por Castells

(2003), quando situa esse ambiente como uma “ágora pública”. Nesse contexto, a rede digital não

constitui, por si mesma, nem instrumento de dominação nem de liberdade. Segundo o autor:

Encerra um potencial extraordinário para a expressão dos direitos dos cidadãos e a

comunicação de valores humanos. Certamente não pode substituir a mudança social ou a

reforma política. Contudo, ao nivelar relativamente o terreno da manipulação simbólica, e

ao ampliar as fontes de comunicação, contribui de fato para a democratização.

(CASTELLS, 2003, p. 135)

A imagem do ciberespaço como uma ágora é também explorada por Lévy, que, ao considerar

possibilidades democráticas na cena contemporânea, tendo em vista as potencialidades do

ciberespaço, observa:

Essa ágora virtual facilitaria a navegação e a orientação no conhecimento, promoveria

trocas de saberes, acolheria a construção coletiva do sentido, proporcionaria visualização

dinâmica das situações coletivas, permitiria, enfim, a avaliação, por múltiplos critérios, em

tempo real, de uma enorme quantidade de proposições, informações e processos em

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andamento. O ciberespaço poderia tornar-se o lugar de uma nova forma de democracia

direta em grande escala. (LÉVY, 2007b, p. 64)

Como se vê, os autores associam o ciberespaço à imagem de uma ágora contemporânea, todavia

não o situam como a alternativa inconteste para a conquista da democracia. Não obstante o fato de

se constituir no ambiente das interações múltiplas, não-hierarquizadas, polifônicas, atópicas, o

ciberespaço é um não-lugar em que se engendram, ainda que sob a marca de outras temporalidades,

espacialidades, de diferentes agenciamentos e de processos diversos de subjetivação, relações

imbricadas com as velhas questões da humanidade, identificadas com os jogos de poder, com a

iniquidade e com todas as mazelas da civilização.

Wertheim (2001), por seu turno, busca, a partir do exame do conceito de espaço historicamente

constituído no mundo ocidental, desde a Idade Média, considerar o ciberespaço contemporâneo.

Partindo da Divina Comédia, de Dante Alighieri, a autora explora a conotação medieval do espaço,

integrador, por excelência, do corpo e da alma, dimensões constitutivas de uma totalidade. “Em vez

de nos atrair para uma fuga da realidade, Dante nos convida a ver a totalidade dela, em toda a sua

abrangência dualista.” (WERTHEIM, 2001, p. 41)

Dessa perspectiva dualista, extrapola-se, na era moderna, sob a égide do império da razão, para a

ótica monista, em que o espaço físico é a tradução de como se concebe a realidade. E segundo a

autora, “é um completo equívoco chamar a imagem científica moderna do mundo de dualista; ela é

monista, admitindo a realidade somente dos fenômenos físicos.” (WERTHEIM, 2001, p. 113)

No entanto, hoje estaríamos vivendo o novo dualismo, com a criação e o crescimento exponencial

do ciberespaço, que, embora se coloque como “um subproduto tecnológico da física”

(WERTHEIM, 2001, p. 167), não se limita ao universo material, mas reflete e acolhe anseios de

imortalidade, transcendência, espiritualidade. Segundo Wertheim:

Com o advento do ciberespaço, somos portanto alertados para o fato de que nossa

concepção de nosso mundo, e de nós mesmos, tende a mudar. Assim como o advento de

outros tipos de espaço sempre lançou a visão de mundo de uma época num estado de fluxo,

assim também o ciberespaço vai provavelmente alterar nossa visão da realidade de

maneiras poderosas. (WERTHEIM, 2001, p. 225)

Vale registrar que, a despeito do crescimento exponencial do ciberespaço e do fato de as tecnologias

da informação e da comunicação nos envolverem em larga medida, de forma direta e ou indireta, na

vida social, a incipiência do processo impossibilita o desenho mais preciso de um cenário após o

advento desse novo contorno espacial e da (ciber)cultura que comporta. Muitas são as especulações

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mas pouco se pode categoricamente afirmar acerca de inclusão / exclusão social; de regimes de

governo e de relações políticas; de processos de subjetivação, dentre outros.

Na percepção de Wertheim:

Ainda não podemos responder a estas perguntas porque é muito cedo para saber. Em certo

sentido, estamos numa posição semelhante à dos europeus do século XVI, que estavam

apenas começando a tomar conhecimento do espaço físico dos astros, um espaço totalmente

alheio à sua concepção anterior da realidade. Como Copérnico, estamos tendo o privilégio

de testemunhar a aurora de um novo tipo de espaço. O que a história fará desse espaço, de

maneira muito apropriada, só o tempo irá dizer. (WERTHEIM, 2001, p. 225)

Afinal, o ciberespaço é um não-lugar e um não–tempo, em permanente movimento, que se

reconfigura e se redimensiona permanentemente sob a ação do ser humano que o modifica,

enquanto é por ele modificado, num exercício dialógico e dialético por excelência. Ademais, guarda

uma complexidade que torna ingênuo ou precipitado vaticinar sua condição de redenção ou de

infortúnio para a humanidade.

No entanto, a perplexidade que inevitavelmente se instaura face a velocidade e o dinamismo que

impacta as variáveis tempo e espaço na contemporaneidade, traduz-se em posturas, não raro,

antagônicas quanto àquilo em que resultará da interação ser humano e novas tecnologias da

informação e da comunicação, cujo movimento dialógico e dialético, transforma um e outras, assim

como redimensiona o seu ambiente espaço-temporal e os paradigmas (ciber)culturais que em seu

bojo se engendram e se expressam.

Nessa perspectiva, ainda que sem guardar a pretensão de buscar compreender, de forma definitiva,

o que “só o tempo irá dizer”, vale examinar a cultura que se instaura e se revela no e a partir do

ambiente ciberespacial: a cibercultura.

3.3. Cibercultura, comportamentos e movimentos sociais

Tomado como espaço antropológico, na ótica de Lévy (2007b), o ambiente ciberespacial se

constitui no cenário em que se engendra e se processa a cibercultura, à qual o autor se refere como

“o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento

e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço. (LÉVY, 2005, p.

17)

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Nesse diapasão, a cultura que se tem presente nem é resultado da técnica (ou da tecnologia), nem é

objeto de seus impactos, na medida em que no contexto da cultura é que efetivamente se produz a

técnica. Ao mesmo tempo, não há procedência em situar técnica e cultura (e também sociedade)

como instâncias estanques, concorrentes e em dicotômica relação de determinantes e determinados,

pois o que de fato se dá é uma relação complexa e dialógica, em que, no exercício interacional,

efetiva-se o movimento dialético, no qual tais dimensões da vida humana modificam-se enquanto

são também modificadas.

Buscando situar com pertinência as tecnologias face as transformações, Santaella adverte:

Não devemos cair no equívoco de julgar que as transformações culturais são devidas apenas

ao advento de novas tecnologias e novos meios de comunicação e cultura. São, isto sim, os

tipos de signos que circulam nesses meios, os tipos de mensagens e processos de

comunicação que neles se engendram os verdadeiros responsáveis não só por moldar o

comportamento e a sensibilidade dos seres humanos, mas também por propiciar o

surgimento de novos ambientes socioculturais. (SANTAELLA, 2003, p. 24)

Dessa assertiva, ficam evidentes as implicações das tecnologias no processo de constituição

cibercultural, mas e sobretudo a contribuição da linguagem, que perpassa os meios, as mensagens e

os processos de comunicação, o que repele a mitificação da técnica como fator hegemônico de

transformação social. A ressituação dos recursos tecnológicos é basilar para sua apropriação na e

pela sociedade, de forma a evitar tomá-los, nos extremos, como a panaceia para os males da

civilização ou como a causa da desumanização. Nem as tecnologias determinam os rumos da

humanidade, nem o ser humano, no seu ideal antropocêntrico, realiza por si mesmo esse mister, mas

a interação entre essas dimensões da existência, incorporando as demais, é que vai resultar na

(re)construção dialética da sociedade, no seio da qual valores, conceitos e condutas se expressam

em relações no âmbito local e global.

Todavia, sem olvidar que com as novas tecnologias foi possível a instauração do ciberespaço, vale

lembrar que, nesse ambiente, é possível estabelecer relações quase descoladas dos lugares

geográficos e da coincidência temporal. É verdade que, em certa medida, isso já se fez possível, por

exemplo, com o advento da escrita e com o telefone. No entanto, como lembra Lévy:

apenas as particularidades técnicas do ciberespaço permitem que os membros de um grupo

humano (que podem ser tantos quantos se quiser) se coordenem, cooperem, alimentem e

consultem uma memória comum, e isto quase em tempo real, apesar da distribuição

geográfica e da diferença de horários. (LÉVY, 2005, p. 49).

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Por outro lado, se o ciberespaço possibilita tais níveis de interação, não assegura por si só o caráter

das relações que se irão perpetrar nesse ambiente, no seio do qual compõem-se territórios

cognitivos coletivizados, em que se inserem atores nas mais diversas condições e circunstâncias,

dotados de repertório cultural também variado. Para Lévy:

A cibercultura é a expressão da aspiração de construção de um laço social, que não seria

fundado nem sobre links territoriais, nem sobre relações institucionais, nem sobre as

relações de poder, mas sobre a reunião em torno de centros de interesses comuns, sobre o

jogo, sobre o compartilhamento do saber, sobre a aprendizagem cooperativa, sobre

processos abertos de colaboração. (LÉVY, 2005, p. 130)

Vale ressaltar, no entanto, que, embora não tenha por elementos fundantes os territórios físicos e as

relações de poder, estes se expressam, ainda que de forma subliminar, nos laços sociais firmados, já

que a cultura tem, na sua ontogênese, imbricações com as referências do território material dos

sujeitos e com seus valores, cuja defesa ou renúncia se dá sob a égide de jogos de poder, na seara

das relações sociais, que são também políticas.

Situando com propriedade o fenômeno da cibercultura, Lévy (2005, p. 126) destaca traços que o

caracterizam, como a interconexão, que lhe confere a tendência à universalidade; as comunidades

virtuais, como extensão do primeiro, que não substituiria os encontros físicos, revelando-se, tão

somente, como um complemento; e finalmente o princípio da inteligência coletiva, que, mais que

uma solução no contexto social, “é um campo aberto de problemas e pesquisas práticas” (LÉVY,

2005, p. 132), na medida em que traz, em si, ambivalências, podendo ser tanto o espaço da

participação, da autonomia, da liberdade, quanto o território do controle, que subordina o individual

a um organismo que o suplanta.

O fato é que, sob o princípio da interconexão, é possível interagir na rede com certo grau de

anonimato, como se dá, por exemplo, nas diversas salas de bate-papo em que os interlocutores usam

apelidos, os nicks, que ora os revelam (e as suas intenções comunicativas), ora os ocultam. De

outro, todavia, concebem-se ambientes de cooperação, como as listas de discussão, os fóruns

temáticos virtuais e outros, em que os interlocutores podem se inserir, em muitos dos casos,

devidamente identificados, empreendendo a interação e a colaboração.

Assim, nessas territorialidades, em que se sobrepõem as dimensões simbólicas às materiais,

situações antagônicas tendem a se definir em territorializações que se processam sob a égide do

relativo anonimato, ou da deliberada identificação dos sujeitos sociais que vivenciam a

coletivização de seu pensar (e fazer) em cenários de interação e ou cooperação, constituindo outras

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ecologias cognitivas. Trata-se de ambientes de relações que, para além da seara cognitiva, envolvem

variáveis conceituais, axiológicas, estéticas e afetivas, dentre outras. Afinal, como observa Lévy:

“A informática não intervém apenas na ecologia cognitiva, mas também nos processos de

subjetivação individuais e coletivos.” (LÉVY, 2006, p. 56)

Nesse contexto, pronunciam-se, no bojo de uma outra cultura, ou da cibercultura, processos de

interação e de interlocução os quais compõem espaços (ou territórios) virtuais que trazem à cena

conexões mais amplas e maior dinamismo, presentes nos movimentos sociais em rede, que se

identificam, constituem-se e alimentam-se, dentre outros, por valores culturais, revelando-se,

inclusive, como registra Castells (2003), em militâncias ambientais, feministas, pelos direitos

humanos e dos ativistas ligados a um sem-número de projetos culturais e causas políticas. Para o

autor, nessa perspectiva, “o ciberespaço tornou-se uma ágora eletrônica global em que a diversidade

da divergência humana explode numa cacofonia de sotaques.” (CASTELLS, 2003, p.115)

De resto, sob a égide da interconexão, em interações nas comunidades virtuais, constituindo

inteligências coletivas, compõe-se a cibercultura num processo contínuo e inacabado, que se traduz

como a expressão e síntese de relações humanas (e sociais) redimensionadas pelas temporalidades e

territorialidades com que estão imbricadas, nos seus aspectos éticos, estéticos, conceituais e

comportamentais, dentre outros.

O trânsito e o diálogo no ciberespaço, sob a égide da cibercultura que constituímos, enquanto somos

por ela constituídos, remetem à necessidade de considerar sua relação com a educação, em

particular no âmbito formal, que se vê agora sob o imperativo da necessidade de reconsiderar

paradigmas norteadores do pensamento e da prática propriamente dita.

3.4. Cibercultura e educação, um novo cenário

O fluxo de informações e da própria vida, ressituado face as novas tecnologias da informação e da

comunicação, revela novas possibilidades, ao mesmo tempo que impõe outros desafios para os

indivíduos e para a sociedade, os quais passam inevitavelmente pela educação formal.

De um lado, as tecnologias apontam para a possibilidade de mais amplo acesso e iniciativas na área

da educação, favorecendo não só a troca de experiências entre comunidades de diferentes lugares,

em tempo real ou não, como o acesso a fontes de informações as mais variadas, constitutivas das

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midiatecas, num contexto de destotalização das fontes, que tendem a se universalizar. Afinal,

segundo Lévy, (2005, p. 147): “A obra da cibercultura atinge uma certa forma de universalidade por

presença ubiqüitária na rede, por conexão com as outras obras e co-presença, por abertura material,

e não mais necessariamente pela significação válida ou conservada em todas as partes.”

O acesso ampliado às informações tende a redimensionar as vivências dos indivíduos, agora

envolvidos com outras interfaces e em mais variadas interações, o que lhes confere outro repertório

de conhecimentos, de experiências, que a escola pode (e deve) valorizar. Afinal, se isso já se dava

antes do advento das novas tecnologias da informação e da comunicação, ensejando à escola e dela

demandando a valorização de experiências e saberes constituídos na vida social para além dos

muros da sala de aula, não poderá ser diferente hoje. Nesse sentido implicará não só incorporar

equipamentos e a inserção em redes pela via da interconexão, como demandará repensar as práticas

pedagógicas a serem empreendidas. Nesse contexto, com a amplitude das informações disponíveis e

com a celeridade com que se renovam no ambiente ciberespacial, onde se leva a efeito o movimento

identificado com a constituição de uma inteligência coletiva, o professor haverá de assumir outro

papel, exercendo a mediação na seara da aprendizagem. Como assevera Lévy (2005, p.171) “o

professor torna-se um animador da inteligência coletiva dos grupos que estão a seu encargo.”

Outro aspecto presente na cena contemporânea é a progressiva ampliação do acesso à educação, nos

diversos níveis, indo ao encontro das aspirações dos múltiplos segmentos da população. Esse

movimento se dá em variada escala e com caráter qualitativo diferenciado nos múltiplos países, mas

o crescimento da demanda pela educação formal é inconteste e pode encontrar óbice na dificuldade

de aumentar o número de professores para fazer frente ao quadro que se redesenha. Ademais, o

investimento necessário para esse fim é um complicador para os países pobres, o que torna

oportuno, por questões quantitativas e qualitativas, considerar a incorporação da lógica da educação

aberta e a distância, que, segundo Lévy (2005, p. 170), pode contemplar não só a racionalização dos

custos como responder à demanda por mudança qualitativa, identificada com a ótica da

aprendizagem, sob a qual o estudante se permite os benefícios de mais fácil acesso à educação

formal, assim como construir de forma complexificada seu conhecimento, navegando no

ciberespaço e compartilhando ambientes de inteligência coletiva.

Nesse diapasão, colocam-se, face as possibilidades apontadas, desafios para o seu aproveitamento e

para manter a conexão com a vida social propriamente dita. Dentre os desafios, vale considerar a

necessidade de estabelecer outras relações com o conhecimento, que possam contemplar:

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Aprendizagens permanentes e personalizadas através da navegação, orientação dos

estudantes em um espaço de saber flutuante e destotalizado, aprendizagens cooperativas,

inteligência coletiva no centro das comunidades virtuais, desregulamentação parcial dos

modos de reconhecimento dos saberes, gerenciamento dinâmico das competências em

tempo real... (LÉVY, 2005, p. 177)

Dialogar no contexto da inteligência coletiva requer a mobilização de habilidades, competências e

atitudes, que a escola contemporânea não pode ignorar, sob pena de se afastar da dinâmica social,

perdendo, então, seu sentido e seu valor para o indivíduo e para a própria sociedade. Nesse sentido,

vale lembrar com Lévy (2005, p. 175): “Uma vez que os indivíduos aprendem cada vez mais fora

do sistema acadêmico, cabe aos sistemas de educação implementar procedimentos de

reconhecimento dos saberes e savoir-faire adquiridos na vida social e profissional.”

O reconhecimento de tais saberes, assim como a sua potencialização por parte da escola demanda a

compreensão dos perfis de usuários do ambiente ciberespacial, de forma a compreender os desafios

e possibilidades com que se deparam nesse âmbito, favorecendo a intervenção deliberada e

consciente no sentido de empreender propostas e ações para a otimização dos usos hipertextuais em

favor da relação produtiva com a informação e da construção do conhecimento propriamente dito.

3.5. O ciberleitor ou o leitor imersivo, perfis múltiplos, mas não excludentes

Santaella (2007a), depois de identificar o leitor contemplativo, comprometido com a prática

intimista da leitura; o leitor movente, que se comporta como flâneur em meio a mensagens verbais e

não verbais, entrecortadas e céleres, que compõem a cena da sociedade moderna; aponta o leitor

imersivo, que emerge no cenário das tecnologias da informação e da comunicação, em que as

mensagens têm na multimídia o seu suporte e na hipermídia, a sua linguagem.

Embora tais perfis de leitores não se revelem excludentes, mas se definam num continuum, a autora

reconhece que cada um mobiliza diferentes habilidades e competências para seu exercício de leitura

e de construção cognitiva.

No caso do leitor imersivo, perfil cuja apreciação constitui importante subsídio para o exame de

parte dos dados coletados na pesquisa de campo empreendida, a autora considera as habilidades

perceptivas e cognitivas que mobiliza o ciberleitor diante da tela, imerso no universo da

multilinearidade, atopia, descentramento e fragmentação, face o mister de produzir sentido sobre o

(hiper)texto com que interage.

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Esse tipo de leitor, segundo a autora, embora guarde algumas interseções com o leitor do livro

convencional, goza de uma liberdade maior, sem a qual não é possível empreender a

cibernavegação, adotando, assim, direções e rotas, estabelecendo nexos em constantes atos de

escolha e decisão quanto ao que lhe é interessante e ou relevante. Nessa perspectiva, o imersivo é

“um leitor em estado de prontidão, conectando-se entre nós e nexos, num roteiro multilinear,

multissequencial e labiríntico que ele próprio ajudou a construir ao interagir com os nós entre

palavras, imagens, documentação, músicas, vídeo etc.” (SANTAELLA, 2007a, p. 3)

Examinando a aptidão do leitor imersivo para a atividade de navegação e produção de sentido no

ciberespaço, Santaella (2007a, p. 58), ao considerar que o universo de usuários não poderia ser dual,

comportando, então, um perfil intermediário, identifica três tipos: o novato; o leigo e o experto.

Numa pesquisa que aborda dimensões teóricas e práticas do objeto, a autora explora conceitos

cognitivos aplicáveis aos processos de navegação no ciberespaço, assim como a entrevista

participativa com os usuários, aos quais é proposta uma tarefa de navegação específica, ligada ao

levantamento de informações na Internet.

Para examinar sua conduta no ciberespaço, a autora parte do princípio de que a navegação envolve

(a) um estado inicial; (b) um conjunto de operadores24

de navegação; (c) compreensão desses

operadores; (d) manipulação dos operadores; (e) mudança de estados como resultado de

manipulação de operadores. A autora considera ainda que a navegação comporta estados novos e

estados precedentes. Sob a égide dessas percepções, ao examinar os três perfis do leitor em sua

prática imersiva, Santaella (2007a, p.66) identifica à luz das teorias cognitivas variados traços, dos

quais apropriamos aqueles atinentes aos aspectos comportamentais do leitor, dada sua pertinência

ao objeto da pesquisa, para a composição do quadro 1 subsequente.

Os traços em questão evidenciam diferentes níveis de proficiência no ato de navegar no

ciberespaço. Assim, enquanto os expertos25

se conduzem mais pelo reconhecimento instantâneo dos

signos e esquemas; os leigos exercitam a busca, em avanços e recuos, em tentativa e erro, portanto

num processo mais lento. O novato, por sua vez, é tomado pela perplexidade e ansiedade, por não

24

O que a autora designa por operadores é, em geral designado por ferramentas. Sua opção por tal denominação busca

extrapolar a conotação de mecanismos manuais para incorporar também os mecanismos mentais. 25

Vale lembrar com Santaella (2007a, p.93) que dos tipos de leitores em questão, “o segundo tipo inclui o primeiro, e o

terceiro inclui o segundo e o primeiro.” A errância permanece como uma prática em todos os níveis de proficiência, na

medida em que o ciberespaço é sempre um campo aberto ao inesperado.

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compreender os signos e os lugares que estes ocupam, assim como os esquemas gerais que se

apresentam na tela.

QUADRO 1

Leitor imersivo: níveis de proficiência

Categorias novato leigo experto

Com

port

am

ento

/ C

ara

cter

ísti

cas

Entra na rede pelo menos

uma vez por dia

Desorientação diante da

profusão de signos que se

apresentam na tela,

ansiedade e insegurança

nas operações de

navegação

Tem conhecimento

específico de algumas

rotas e vai se virando para

encontrar outras

Tem conhecimento dos

aplicativos no seu todo,

manipulando as

ferramentas e os

comandos com

desenvoltura e velocidade

Impaciência,

desconcentração, grande

incidência de erros,

confusão e incapacidade

para encontrar um

caminho de volta. É o

leitor errante.

Examina a situação a cada

passo e já sabe eliminar

alternativas falsas e

escolher as corretas.

Capacidade de examinar o

lugar mais provável para

clicar, avançando por

tentativa e erro. Trata-se

do leitor detetive.

Transita pela rede com

familiaridade em função

da representação mental

clara que tem da estrutura,

da qualidade e das

idiossincrasias dos

mecanismos de

navegação. É o leitor

previdente.

Prevalência da heurística

no processo de navegação,

que experimenta

continuamente a novidade

e a surpresa

Depende menos da

heurística, em favor de

desempenhos de busca e

de relativo

reconhecimento das pistas

de navegação

Depende ainda menos da

heurística pela grande

familiaridade com os

inputs e pela previsão das

consequências das

escolhas feitas

Assume o papel de

internauta errante,

navegando por

adivinhação

Corresponde ao internauta

detetive, que segue pistas

e aprende com a

experiência

Corresponde ao internauta

previdente, com

habilidade para antecipar

as consequências de suas

ações

Fonte: adaptado de Santaella (2007a)

Para Santaella (2007a, p.72), os diferentes níveis de aptidão para a atividade de navegação ou

leitura hipertextual relacionam-se com aspectos perceptivo-motores e operações mentais complexas,

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como compreensão, identificação, seleção, decisão e avaliação. Nesse sentido é que o leitor

imersivo experimenta, então, importantes transformações de ordem sensório-perceptiva (visual,

auditiva, tátil) e motora (controle de movimentos do mouse, digitação, prontidão etc.).

De resto, o que há de comum a todo e qualquer perfil de leitor imersivo é a interatividade, que

rompe com a lógica dicotômica de emissão e recepção, na medida em que autor e leitor já não

guardam mais a clássica polaridade. Como lembra Lévy (2007a, p. 46), na relação hipertextual,

leitura e escritura guardam imbricada relação, tornando híbridos os papéis do leitor e do autor.

Nesse diapasão, é possível asseverar que a mensagem habita o campo da comutação, que não

comporta a polaridade de quem emite ou recebe mensagem, mas o trânsito informacional

propriamente dito.

Vale acrescentar que, embora muitas transformações estejam em curso, inclusive na seara

tecnológica, em que a convergência de mídias tende a avançar e se potencializar, “navegar veio para

ficar, pois se trata de uma atividade performativa e cognitiva que não está presa a um único tipo de

equipamento.” (SANTAELLA, 2007a, p. 183)

Esse horizonte torna, assim, ainda mais relevante pensar a relação entre navegador e ciberespaço,

entre leitor / autor e hipertexto, de tal forma que se possa divisar o significado do hipertexto na

construção do conhecimento, buscando, face as constatações nessa seara, o desenvolvimento de

estratégias metacognitivas, que favoreçam continuamente a superação do estágio incipiente do leitor

errante ou novato em favor do leitor detetive ou leigo, que, na evolução de sua performance e de sua

atividade cognoscente, possa alcançar o patamar do leitor previdente ou experto.

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4. PESQUISA DE CAMPO

A problematização do hipertexto quanto ao seu uso por estudantes da graduação ensejou, como já

mencionado, a interlocução com estudantes do curso de pedagogia da Universidade Federal de

Minas Gerais, bem como os resultados que são abordados nesta etapa.

4.1. À guisa de contextualização: a UFMG e o curso de Pedagogia

A presente pesquisa, para sua melhor apresentação, torna oportuno o exercício de contextualização

a partir da situação da instituição de ensino, bem como do curso de graduação que oferece no

âmbito da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais – FaE/UFMG.

4.1.1. A Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG

A Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, autarquia pública federal, tem sua origem em

1875, quando é criada a Escola de Minas, que passa, em 1927, a Universidade de Minas Gerais,

instituição privada, subsidiada pelo Estado, resultante da união das quatro escolas de nível superior

então existentes em Belo Horizonte. A UMG permanece na esfera estadual até 1949, quando é

federalizada. Em 1965, passa a adotar o nome de Universidade Federal de Minas Gerais.

Observando o princípio constitucional da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, a

UFMG conta com cursos e programas de graduação, pós-graduação e extensão. Na seara da

graduação, a oferta preponderante é de estudos presenciais, que perfazem o total de 65 cursos

disponíveis nas modalidades bacharelado e ou licenciatura, com oferta diurna e ou noturna, nas

seguintes áreas de conhecimento: ciências agrárias; ciências biológicas; ciências da saúde; ciências

exatas e da terra; ciências humanas; ciências sociais e aplicadas; engenharia e tecnologia;

linguística, letras e artes.

Há ainda a oferta de cursos de graduação pela UFMG no âmbito do Sistema Universidade Aberta

do Brasil, um programa do Ministério da Educação, criado no ano de 2005, que busca articular um

sistema sob a égide do Forum das Estatais pela Educação, com foco na capacitação de professores

para a educação básica, a partir da exploração de estratégias do ensino a distância, como expressão

da articulação e integração de instituições públicas de ensino superior em um sistema nacional de

educação superior

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A comunidade acadêmica da UFMG conta com cerca de 22.000 alunos de graduação e

aproximadamente 11.000 alunos de pós-graduação, atendidos por 2.365 professores, a maioria deles

mestres e doutores, e 4.162 funcionários técnico-administrativos. O cenário da instituição, no que se

refere ao ensino, à extensão e à pesquisa pode ser traduzido nos seguintes termos:

TABELA 2

A UFMG em números

VESTIBULAR 2008

Candidatos inscritos 66.052

Vagas oferecidas 4.714

Relação candidato/vaga 14,01

Opções para o vestibular 62

ENSINO

Graduação

Cursos 65

Bacharelado 34

Licenciatura 1

Bacharelado e Licenciatura 14

A distância

Cursos de graduação 4

Especialização 4

Pós-Graduação

Doutorado 56

Mestrado 65

Especialização 77 (oferta regular)

Residência Médica 38

Total de vagas 5.780

PESQUISA

Grupos de pesquisa 645 (2008)

Linhas de pesquisa 817

Publicações científicas 10.816 (2006)

Patentes nacionais 238

Patentes internacionais 55

Contratos de transferência tecnológica 14

Marcas registradas e software 46

EXTENSÃO

Projetos 359

Cursos 545

Promoção de eventos 573

Prestação de serviços 598

Público beneficiado 7.978.238

Fonte: disponível em http://www.ufmg.br/conheca/nu_index.shtml

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A instituição tem a maior parte de seus cursos e programas sediados no campus Pampulha, em Belo

Horizonte, contando ainda com uma unidade acadêmica em Montes Claros.

No que se refere à sua orientação político-pedagógica, vale dizer que a Universidade adota o

currículo

concebido como um sistema articulado. Além da transmissão de conteúdos e da produção

do conhecimento, inclui o desenvolvimento por parte do aluno, de habilidades básicas,

específicas e globais, de atitudes formativas, de análise crítica e de percepção mais global

da sua atuação futura como profissional e como membro da sociedade. (UFMG, 2001, p. 1)

Ademais, o currículo deve apresentar variado nível de flexibilidade, possibilitando, para além da

formação geral do graduando, a composição de perfis profissiográficos diferenciados, em virtude

das vocações e trajetória acadêmica de cada universitário. Assim, além do núcleo específico,

quanto à estrutura, o currículo deve contemplar necessariamente um núcleo de formação

complementar e um conjunto de atividades livres. É importante salientar que os três

elementos constitutivos dessa estrutura não estão condicionados pelo período letivo ou pelo

seqüenciamento do curso. (UFMG, 2001, p. 1)

A flexibilidade do currículo se dá sob a ótica vertical, quando prevê formações complementares

resultantes de rol de disciplinas optativas, ao passo que a ótica horizontal se refere a atividades

extracurriculares que possibilitam integralizar créditos, como, por exemplo, participação em

eventos acadêmicos, publicação de trabalhos científicos e participação em projetos de ensino,

extensão e pesquisa.

4.1.2. O curso de Pedagogia

Criado no ano de 1941, o curso de graduação em Pedagogia da UFMG26

tem sua oferta iniciada em

1943 na então denominada Faculdade de Filosofia. No ano de 1968, o curso passa a ser ofertado sob

o abrigo da Faculdade de Educação – FaE. Inicialmente concebido para a formação de técnicos em

educação para o exercício de funções de administração, planejamento, orientação, inspeção,

avaliação e pesquisa nos ambientes formais de educação, bem como para a prática do magistério

nos chamados cursos normais, o curso de Pedagogia experimenta significativas transformações.

26

Disponível no sítio: https://proteu.adm-serv.ufmg.br/scg/, acesso em 06 de julho de 2009, que apresenta o curso de

graduação em exame.

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Estruturada, via de regra, sob o “esquema 3 + 1”, em que aos estudos do bacharelado se deveriam

justapor disciplinas de formação pedagógica, a graduação em Pedagogia – licenciatura incorpora, a

partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, nova orientação conceitual e

curricular, que, superando o modelo anterior, busca consolidar identidade na formação para as

atividades típicas do magistério, compreendido aí não apenas no âmbito do ensino, mas também da

pesquisa, do diagnóstico, do planejamento, das políticas e da avaliação, dentre outros. Nos termos

das Diretrizes Curriculares MEC para os cursos de graduação em Pedagogia – Resolução CNE/CP

N° 1, de 15 de maio de 200627:

O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer

funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos

cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de

serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos

pedagógicos. (BRASIL, 2006)

O curso de Pedagogia da UFMG, que prevê formação na modalidade licenciatura, visa à “formação

de profissional comprometido com a melhoria das condições em que se desenvolve a educação na

realidade brasileira.” A proposta privilegia a articulação teórico-prática e se organiza em torno de

percursos curriculares sem prejuízo da formação geral, como expressão da flexibilidade curricular

adotada na UFMG e já mencionada, possibilitando aos egressos do curso, em síntese, a graduação

em pedagogia, com formação complementar em:

QUADRO 2

Estruturação do Curso

Código Modalidade Formação Complementar

2.99.01 Licenciatura Magist. Anos Iniciais do Ens.Fund./Form. Compl. em Gestão Educacional e

Coord. Pedag./Form. Livre

2.99.02 Licenciatura Magist. Anos Iniciais do Ens.Fundamental/Form.Compl. em Alfabetização,

Leitura e Escrita/Form.Livre

2.99.03 Licenciatura Magistério Anos Iniciais do Ensino Fundamental/Form. Compl. em Educ.

de Jovens e Adultos/Form.Livre

2.99.04 Licenciatura Magistério Anos Iniciais do Ensino Fundamental/Form. Complementar em

Educação Infantil/Form. Livre

2.99.05 Licenciatura Magistério Anos Iniciais do Ensino Fundamental/Formação Complementar

Aberta/Formação Livre

Fonte: disponível em https://proteu.adm-serv.ufmg.br/scg/

27 A partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, são abolidos os currículos mínimos

fixados pelo MEC para os cursos de graduação, passando-se a adotar as Diretrizes Curriculares. A Resolução em apreço

“Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura.”, inovando quanto a

extinguir o recorte curricular em habilitações a partir do período letivo seguinte à publicação da referida Resolução.

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O curso, com regime de matrícula semestral, tem funcionamento diurno e noturno. Enquanto o

diurno prevê a duração média de oito períodos com ingresso de 66 alunos no segundo semestre do

ano, o noturno tem duração de nove períodos, admitindo 66 alunos no primeiro semestre de cada

ano. Sua infraestrutura inclui, além de biblioteca específica na unidade de ensino em que está

lotado, três laboratórios de Informática. Conta também com o Centro de Alfabetização, Leitura e

Escrita (CEALE), o Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais (GAME), o Núcleo de Estudos

Trabalho e Educação (NETE), o Projeto Veredas e o Centro de Ensino de Ciências e Matemática de

Minas Gerais (CECIMIG), entre outros, que possibilitam o diálogo com centros geradores de

conhecimento em atividades de pesquisa, articuladas com o ensino e a extensão.

A Formação Complementar em Alfabetização, Leitura e Escrita, constante da versão curricular

afeta aos ingressos no primeiro semestre de 2006, contempla, além da carga horária obrigatória de

disciplinas do Núcleo Específico e das disciplinas (optativas) da Formação Livre, o seguinte rol de

disciplinas obrigatórias: Metodologia de Ensino de Ciências; Metodologia de Ensino de História;

Metodologia de Ensino de Geografia; Produção de Textos Escritos: Teoria e Prática; Dificuldades

no Ensino-Aprendizagem da Leitura e Escrita; As Interfaces do Ensino-Aprendizagem da Língua

Escrita; A Leitura: Teoria e Prática e Estágio Curricular em Alfabetização, Leitura e Escrita.

4.2. Aplicação do questionário e metodologia de análise dos dados levantados

O levantamento dos dados deu-se por meio de questionário escrito, totalizando 21 questões (abertas

e ou fechadas) que abordaram os seguintes pontos: a) perfil do entrevistado (inclusive enquanto

usuário dos recursos de informática); b) acesso (disponibilidade de recursos de informática no

ambiente acadêmico, em casa etc.); c) frequência (periodicidade e intervalos de uso do computador

/ Internet); d) intencionalidade (fatores que determinam o acesso e uso do hipertexto eletrônico); e)

apropriação (critérios para escolha de sítios eletrônicos); f) leitura hipertextual (categorização /

concentração / usos: dinâmica da leitura hipertextual); g) validação (estratégias de verificação da

procedência das informações e das fontes); h) produção de sentido (adoção de estratégias de leitura,

análise, síntese, contextualização, inferência, extrapolação etc.).

O roteiro adotado para composição do questionário buscou pautar-se pela necessidade de responder

a pergunta-problema, situando, então, o uso de hipertexto na graduação quanto à sua importância na

construção do conhecimento, considerados, além de seus traços estruturais e funcionais, as ações do

ciberleitor quanto a acessar, selecionar, relacionar e validar as informações.

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Antes de levar a efeito a aplicação do questionário, as perguntas foram dirigidas a um grupo de

quatro estudantes de diferentes cursos de graduação e a dois alunos do mestrado, de forma a

verificar sua (in)consistência e (im)pertinência face os objetivos da pesquisa, o que foi significativo

no sentido de apontar algumas fragilidades da proposta inicial, que foram, então, sanadas.

A aplicação do questionário realizou-se junto aos graduandos do curso de Pedagogia noturno,

ingressantes no primeiro semestre de 2006, que optaram por cursar a formação complementar em

Alfabetização, Leitura e Escrita. O universo pesquisado refere-se a estudantes cuja formação

complementar os habilita para o trabalho com a leitura e a escrita, que, paulatinamente, incorporam

também a leitura e a escrita digital. A opção por delimitar a população-alvo, adstrita ao primeiro

semestre de 2006, deve-se ao fato de tais estudantes se encontrarem em estágio avançado da

graduação, possibilitando-lhes a visão diacrônica de sua inserção e trânsito na vida acadêmica e na

seara do universo digital, com as consequentes experiências com o hipertexto.

O elenco de alunos, bem como sua situação acadêmica foram levantados junto à Pró-Reitoria de

Graduação da UFMG, da qual este pesquisador é membro do quadro efetivo, atuando como Técnico

em Assuntos Educacionais no Setor Acadêmico, o que lhe facilitou o acesso às informações

necessárias ao trabalho.

Assim, de posse dos dados, contatamos os estudantes, entre os meses de março e abril de 2009,

mediante autorização expressa da Coordenação do Colegiado do Curso de Graduação em Pedagogia

e sob o anteparo do Projeto de Pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética da FUNEDI / UEMG, nos

termos do Parecer CEP/FUNEDI N° 12/2009, de 30 de março de 2009 (Apêndice E).

O contato com os estudantes se deu em diferentes ocasiões, observada sua disponibilidade. Na

primeira ocasião, a interação se deu com um número maior de alunos, num total de cinco

respondentes, que receberam este pesquisador nas dependências da Faculdade de Educação em

horário anterior às suas aulas. Foi-lhes apresentada a proposta da investigação, com a explicitação

dos objetivos, sendo-lhes ainda ressaltado o caráter voluntário da participação na pesquisa, bem

como a preservação de sua identidade. Os estudantes foram informados ainda de que haverá

posterior apresentação dos resultados, via e-mail e sob a forma de cópias impressas da dissertação

para inclusão no acervo da biblioteca da Faculdade de Educação – FaE/UFMG. O mesmo

procedimento foi adotado para com os demais entrevistados.

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A resposta aos questionários foi realizada de forma individualizada, em formulário escrito,

distribuído aos respondentes nas diferentes oportunidades.

Como já registrado, o exame dos dados pautou-se pela técnica de análise de conteúdo, defendida

por Bardin (1977, p. 42), de forma a possibilitar, por exercício de inferência, ancorada em

procedimentos sistemáticos, o acesso aos elementos presentes nas mensagens, tendo em vista suas

condições de produção e recepção. Vale lembrar que essa técnica, segundo Minayo (2006, p. 74),

contribui para a verificação das hipóteses prescritas, assim como para o exame do que esteja

presente por trás dos conteúdos manifestos. Por fim, é de se registrar que se dispensou aos dados

levantados o caráter quantitativo, sob a forma de tabulação dos resultados e de sua apresentação em

gráficos, acompanhados de análise qualitativa, por comungarmos com Minayo (2006, p. 74), para

quem tais funções – quantitativa e qualitativa – não são excludentes, mas antes complementares,

podendo, portanto, aplicarem-se a pesquisas cujo objeto (e objetivo) comporte essa articulação.

A partir da análise dos dados levantados, buscou-se verificar a hipótese de subutilização do

hipertexto (eletrônico), dada sua incipiência na sociedade e no ambiente acadêmico, no seio do qual

a visão cartesiana do conhecimento e do currículo, muitas vezes fragmentados e dicotomizados,

comprometem a instauração de outras relações com o conhecimento, que passaria a se caracterizar,

dentre outros, pela maior autonomia intelectual e diálogo no contexto da inteligência coletiva, sob a

referência de outras habilidades, competências e atitudes.

4.2.1. O perfil dos entrevistados: sexo, faixa etária e ocupação

Os entrevistados do sexo feminino compõem a totalidade da população-alvo da pesquisa. Como a

formação complementar em Alfabetização, Leitura e Escrita é opcional e há, no curso de pedagogia,

também estudantes do sexo masculino, evidencia-se, especificamente nesse contexto, uma

tendência à perpetuação da função de alfabetização, nos anos iniciais, como atividade

eminentemente feminina. Alfabetizadores do sexo masculino, no curso, verificam-se com maior

frequência na formação complementar em Educação de Jovens e Adultos.

Quanto à faixa etária, esta varia entre 21 e 40 anos, verificando-se a prevalência de estudantes

acima dos 25 anos, o que constitui traço muito comum em cursos noturnos, os quais abrigam alunos

com perfil socioeconômico diferenciado, cujo poder aquisitivo em geral obriga a estabelecer outros

marcos temporais para a vida acadêmica. Em outras palavras, a média de idade ideal para esse

estágio da graduação seria entre 21 e 22 anos, o que revela o adiamento do início da carreira

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universitária. Todavia, se de um lado é postergado o início do curso superior, de outro, o

engajamento à vida acadêmica não se vê comprometido, já que, no caso em exame, não houve

qualquer registro de evasão, com o quinto período já em curso.

No que se refere à sua ocupação, vale o exame do gráfico 1:

Os dados levantados revelam que a predominância é de alunas que (i) estudam e trabalham e que

(ii) estudam e são bolsistas. A presente característica coaduna-se com o perfil do aluno noturno,

que, em geral, paralelamente aos estudos, exerce alguma atividade remunerada para sua

manutenção. No caso das bolsistas, em particular, o número expressivo (55%) refere-se a alunas

que se valem de políticas institucionais da UFMG, as quais consideram não só as questões de

acesso à Universidade, mas também as condições de permanência do estudante, o que leva a

iniciativas assistenciais como as da Fundação Mendes Pimentel – FUMP28

no sentido de viabilizar

programas e ações de apoio ao estudante, dentre eles o benefício da Moradia Universitária, dos

Restaurantes Universitários e das Bolsas de Estágio.

4.2.2. Acesso: disponibilidade de recursos e conhecimentos de informática

Indagadas quanto a dispor de computador (com acesso à Internet) em casa, a totalidade das

estudantes respondeu afirmativamente. O cenário verificado coaduna-se com os resultados da

pesquisa realizada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação

28

Instituição de direito privado e sem fins lucrativos, a FUMP presta assistência a estudantes carentes da UFMG.

Disponível no sítio: <http://www.fump.ufmg.br/site/modules/multi/index.php?pagenum=2>, acesso em 06 de julho de

2009, que apresenta a referida Fundação.

Gráfico 1 – Distribuição das entrevistadas segundo sua ocupação

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(CETIC.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), que, realizando

estudos sobre a expansão do acesso aos recursos de informática, constata o crescimento dos índices

de domicílios com computador em todas as regiões entre 2006 e 2007. De acordo com os

resultados: “Este aumento é maior nas regiões Centro-Oeste (de 19% em 2006 para 26% em 2007),

Sul (de 25% para 31%) e Sudeste (24% para 30%).”29

Quanto à data de disponibilidade de computador em casa, conforme gráfico 2 abaixo, as estudantes,

na sua maioria, já tinham a posse e o acesso aos recursos de informática desde o início de seu curso

de graduação, antecipando-se ao movimento de expansão constatado pelo Centro de Estudos sobre

as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CETIC.br), retromencionado.

29 Disponível em <http://www.cetic.br/tic/2007/indicadores-cgibr-2007.pdf>, acesso em 6 de julho de 2009.

Gráfico 2 – Distribuição das entrevistadas por tempo de disponibilidade de computador/Internet em casa

Gráfico 3 – Distribuição das entrevistadas quanto aos conhecimentos/usos de programas

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Questionadas quanto a ter conhecimentos e fazer uso de programas de informática, 100% das

respondentes afirmam, conforme gráfico 3, conhecer e utilizar editor de texto e navegador,

enquanto cerca de 80% têm conhecimentos de planilhas. Mais de 50% informam conhecer e fazer

uso de outros softwares, dentre eles power point, media player, outlook express etc.

4.2.3. Frequência: local, periodicidade e tempo de acesso

Perguntadas sobre os ambientes em que usam o computador com mais frequência, as estudantes

informaram, conforme gráfico 4, que, em geral, usam o computador, com acesso à Internet, em casa

e ou no trabalho, ou no laboratório de informática da Universidade. Apenas 27% fazem uso desse

recurso em lan house. O uso mais frequente se dá em casa (91%) e na universidade (82%), o que

evidencia a importância do laboratório de informática nas instituições de ensino superior.

Gráfico 4 – Distribuição das entrevistadas por local de acesso

Gráfico 5 – Distribuição das entrevistadas por periodicidade de uso/semana

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O uso do computador com acesso à Internet é realizado diariamente por 73% das alunas, enquanto

18% usam-no até cinco vezes por semana e 9% o utilizam somente nos fins de semana. Os números

evidenciam a incorporação dessa ferramenta de forma cotidiana pela maioria das respondentes e

conferem relevo a um dos traços com que Santaella (2007-a) identifica o leitor imersivo experto,

que, segundo a autora, entra na rede pelo menos uma vez por dia, conforme constatado nos termos

da tabela 2, página 83 – Leitor imersivo: níveis de proficiência.

De acordo com o gráfico 6, grande parte das entrevistadas (45%) acessa a Internet por um período

que varia entre duas e três horas, seguidas de usuários que utilizam o computador por até duas horas

a cada acesso. Apenas 9% utilizam o computador com Internet por até meia hora, assim como o

mesmo percentual o faz por muitas horas. O acesso por longos períodos – entre duas e três horas –

sugere que as usuárias da rede apresentam conduta que corresponde à do leitor imersivo, cujo perfil

transita entre o leigo, “que revela capacidade de examinar o lugar mais provável para clicar,

avançando por tentativa e erro” (Santaella, 2007a, p. 65), e o experto, “que tem conhecimento dos

aplicativos no seu todo, manipulando as ferramentas e os comandos com desenvoltura e velocidade”

(Santaella, 2007a, p.66), diferentemente dos leitores novatos, que, desorientados e perplexos diante

da tela, experimentam a confusão e a incapacidade de prosseguir. (Santaella, 2007a, p. 65)

4.2.4. Intencionalidade: acessos e usos dos recursos da rede

Perguntadas sobre as razões para os acessos, as respondentes informaram que as intenções são

variadas, isto é, vão desde pesquisas pessoais na rede, passando por atividades profissionais,

trabalhos acadêmicos, leitura ou estudo de iniciativa própria, bate-papos, visitas a blogs e

Gráfico 6 – Distribuição das entrevistadas por tempo de uso a cada acesso

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entretenimentos, até compras e outros. Esse trânsito (e interação) na rede encontra eco na tese de

que:

O ciberespaço permite a combinação de vários momentos de comunicação. Encontramos,

em graus de complexidade crescente: o correio eletrônico, as conferências eletrônicas, o

hiperdocumento compartilhado, os sistemas avançados de aprendizagem ou de trabalho

cooperativo e, enfim, os mundos virtuais multiusuários. (LÉVY, 2005, p. 104)

Quanto aos tipos de acesso por ordem de importância e frequência, de acordo com o gráfico 7, cerca

de 80% das respondentes afirmam usar a rede prioritariamente para fim de realização de trabalhos

acadêmicos, enquanto 9% dão prioridade ao uso da Internet para atividades profissionais, e outros

9% o fazem para pesquisas pessoais.

Gráfico 8 – Distribuição das entrevistadas por sítios utilizados para leitura /pesquisa acadêmica

Gráfico 7: Distribuição das entrevistadas quanto à finalidade dos acessos

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Dos sítios utilizados para leitura/pesquisa, há predomínio do recurso ao Scielo por 100% das

estudantes, seguido do Google Acadêmico, acessado por 90% das estudantes, e ainda do Google,

por cerca de 80% das respondentes. Os números corroboram os dados constantes do gráfico 7, que

colocam os acessos (e a leitura hipertextual) para fins acadêmicos como prioridade, na medida em

que os sítios destacados no gráfico 8 são, à exceção do Google, de cunho eminentemente

acadêmico. Sítios como Yahoo, Youtube e “outros”, acessados por um percentual entre 30% e 50%

das respondentes, mostram o recurso a outros ambientes, ainda que sua função precípua seja o trato

de generalidades, entretenimento e outros.

As estudantes foram concitadas ainda a justificar a opção pelos sítios apontados, o que se deu nos

seguintes termos:

Respondente Justificativa para opção pelos sítios

R1 Não precisam de login, é de fácil compreensão dos conteúdos pesquisados e por ter

uma ampla bibliografia de temas a serem pesquisados.

R2 Apresentam uma grande variedade de textos, e também todas são de fácil acesso,

mesmo que alguns precisem de cadastro isso não dificulta. Um outro ponto são os

sítios indicados por alguns professores.

R3 Pela forma como as informações estão dispostas e pela facilidade de navegação.

Acho mais completo.

R4 Eu utilizo mais esses sítios pelas razões que grifei no enunciado (facilidade de

acesso, facilidade de navegação, forma como as informações estão dispostas,

indicação de professores de seu curso).

R5 Pela facilidade das informações e também pela forma como estão dispostas.

R6 Acha-se de um tudo, desde meios de pesquisa a entretenimento.

R7 Pela facilidade de acesso e navegação, conhecimento prévio da natureza de seus

conteúdos.

R8 Pela forma como as informações estão dispostas.

R9 Indicação de professores. Facilidade de navegação e facilidade de acesso.

R10 Pela indicação de professores e colegas.

R11 Em alguns momentos pela facilidade (não ser necessário cadastro) e na maioria dos

casos por recomendação de professores.

O que se verifica, a partir do quadro em exame, é que o principal critério de escolha dos sítios é a

facilidade de acesso e navegação. Uma grande diferença entre as possibilidades hipertextuais

presentes no texto impresso (índices, sumários, notas de rodapé, remissões a outros textos e autores

etc.) em relação ao hipertexto eletrônico é a facilidade (e velocidade) com que se podem linkar

elementos diversos no exercício de leitura-navegação. Lembramos, com Lévy, que:

O suporte digital traz uma diferença considerável em relação aos hipertextos que antecedem

a informática: a pesquisa nos sumários, o uso dos instrumentos de orientação, a passagem

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de um nó a outro são feitos, no computador, com grande rapidez, da ordem de alguns

segundos. Por outro lado, a digitalização permite a associação na mesma mídia e a

mixagem precisa de sons, imagens e textos. De acordo com esta primeira abordagem, o

hipertexto digital seria definido como informação multimodal disposta em uma rede de

navegação rápida e “intuitiva”. Em relação às técnicas de ajuda à leitura, a digitalização

introduz uma pequena revolução copernicana: não é mais o navegador que segue os

instrumentos de leitura e se desloca fisicamente no hipertexto, virando as páginas,

deslocando volumes pesados, percorrendo a biblioteca. Agora é um texto móvel,

caleidoscópico, que apresenta suas facetas, gira, dobra-se e desdobra-se à vontade frente ao

leitor. (LÉVY, 2005, p. 56)

Assim, o hipertexto eletrônico se revela uma alternativa promissora no meio acadêmico, no qual

tende a contar com grande e crescente adesão.

Outro critério adotado para escolha dos sítios, também presente nas respostas das estudantes, é a

indicação do professor, situação que, de um lado, revela a credibilidade do aluno no docente, ao

qual, não raro, atribui-se a condição de “detentor do saber”, possivelmente como decorrência da

relação dicotômica secularmente instaurada nos ambientes de educação formal, em que ao professor

competiria ensinar e ao aluno, aprender. Essa relação, que incorre, de longa data, em anacronismo,

requer a sua efetiva superação, em particular no contexto em que se inserem as tecnologias da

informação e da comunicação e, em seu bojo, o hipertexto eletrônico, cuja exploração requer

autonomia intelectual da parte do leitor-aluno e ressituação do professor quanto ao seu papel na

atividade cognoscente. Nesse sentido, destaca Lévy que:

A principal função do professor não pode mais ser uma difusão dos conhecimentos, que

agora é feita de forma mais eficaz por outros meios. Sua competência deve deslocar-se no

sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento. (...) Sua atividade será centrada no

acompanhamento e na gestão das aprendizagens: o incitamento à troca de saberes, a

mediação relacional e simbólica, a pilotagem personalizada dos recursos de aprendizagem

etc. (LÉVY, 2005, p. 171)

Nesse diapasão, a leitura hipertextual, imbricada com a “pilotagem personalizada” no ciberespaço,

há de mobilizar outros mecanismos de busca, seleção e validação das informações disponíveis, que

possam extrapolar a sumária consulta ao professor, agora não mais o detentor absoluto do saber,

mas o portador de saberes e mediador dos processos de aprendizagem.

4.2.5. Leitura hipertextual: categorização, concentração e usos

Perguntadas sobre os mecanismos de busca para a seleção dos temas de interesse na Internet as

respondentes informaram que se valem das referências por assunto, autor instituição e outros,

predominando, no entanto, a busca por assunto, que totaliza 73%. Esse fenômeno dá eco às razões

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apresentadas para a preferência por sítios de busca, como Google, Google Acadêmico, dentre

outros, sob justificativas do tipo: “acha-se de um tudo” na Internet. Ademais, mostra-se na

contramão da busca “avançada”, que poderia valorizar a autoria dos conteúdos, na medida em que

as leitoras hipertextuais em exame são graduandas em avançado estágio da vida acadêmica, o que

lhes poderia conferir mais amplo repertório sobre os temas de interesse, evitando busca tão ampla a

partir da referência genérica “assunto”. O fato de relegar a busca avançada a segundo plano pode

sugerir a incipiência da vivência (leitura) hipertextual e ou a fragilidade do repertório acadêmico

das graduandas relativamente aos temas objetos de pesquisa.

Visando a examinar o comportamento do leitor-navegador, foi perguntado às estudantes se, durante

seu acesso: (a) nunca se desviam do foco de sua pesquisa; se (b) às vezes; ou (c) muitas vezes; ou se

(d) sempre se desviam do foco de sua pesquisa, atraídas por um ou mais links. As respostas

possibilitaram a composição do gráfico 10:

Gráfico 10: Distribuição das entrevistadas quanto ao comportamento na leitura – navegação

Gráfico 9: Distribuição das entrevistadas pelos modos de busca na rede

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Como se pode observar, a maioria das respondentes desviam-se do foco de sua pesquisa, atraídas

por um ou mais links. Os desvios refletem um traço intrínseco ao próprio conceito do hipertexto,

não havendo, portanto, surpresa quanto à sua incidência. Todavia, é significativo o comportamento

que assumem as leitoras hipertextuais face os desvios de foco, razão pela qual lhes foi perguntado

se esse fenômeno é positivo, negativo, “outros” e por quê, sendo as respostas consignadas nos

termos que se seguem:

Respondente Resposta / justificativa

R1 Positivo, porque esses outros links podem contribuir para acrescentar informações.

R2 Positivo, porque muitas vezes as respostas ou temas que pesquisamos estão mais

detalhadas nos links.

R3 Positivo, porque sempre consigo resolver algumas pendências em outros sítios

enquanto faço minha pesquisa.

R4 “Outros”, porque às vezes a atração por um link pode trazer algumas informações

pertinentes mas às vezes não tem nada de informativo.

R5 Positivo, porque esse “desvio” ajuda a incrementar a pesquisa com focos

diversificados.

R6 “Outros”. Vai depender do link; às vezes é besteira (entretenimento) mas às vezes é

outro foco que a pesquisa proporcionou.

R7 Positivo, porque consigo adquirir conhecimento sobre vários assuntos.

R8 Positivo, porque há possibilidade de adquirir novas informações.

R9 Positivo, porque pesquiso outros assuntos que me ajudam muitas vezes a ter um

entendimento mais amplo da temática.

R10 Não respondeu

R11 Não respondeu

Os resultados, aliados às justificativas, evidenciam que o perfil de leitor predominante não se

identifica com o leitor imersivo novato descrito por Santaella (2007a) como aquele que,

desorientado diante da profusão de signos que se apresentam na tela, revela-se impaciente,

desconcentrado e confuso, um leitor errante. Tendo em vista sua periodicidade de acesso a rede

(gráficos 5 e 6), bem como seus avanços por tentativa e erro, dependendo menos da heurística, em

favor de desempenhos de busca e de relativo reconhecimento de pistas de navegação, o perfil que se

tem, na sua maioria entre as entrevistadas, transita entre o do leitor detetive e o do leitor previdente;

isto é, o tipo de ciberleitor que se tem, entre as respondentes do presente questionário, transita entre

o leigo e o experto.

Essa constatação, já perpetrada no exame dos dados anteriores, corrobora-se nas respostas à

presente questão. Quanto ao fato de o perfil de leitor em exame transitar entre o leigo e o experto,

vale lembrar, com Santaella (2007a, p.93), que tais perfis não são excludentes, mas antes

coexistentes, alternando-se na prática da leitura hipertextual. Segundo a autora, os imersivos são

leitores que incorrem em errância, que é fenômeno que se dá em todos os níveis de proficiência de

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leitura hipertextual, embora com incidência variada ante o caráter dinâmico e sempre inacabado do

ciberespaço, um campo sempre aberto ao inesperado. Nesse ambiente, como observa Lévy:

Podemos definir duas grandes atitudes de navegação opostas, cada navegação real

ilustrando geralmente essa mistura das duas. A primeira é a “caçada”. Procuramos uma

informação precisa, que desejamos obter o mais rapidamente possível. A segunda é a

“pilhagem”30

. Vagamente interessados por um assunto, mas prontos a nos desviar a

qualquer instante de acordo com o clima do momento, não sabendo exatamente o que

procuramos, mas acabando sempre por encontrar alguma coisa, derivamos de site em site,

de link em link, recolhendo aqui e ali coisas de nosso interesse. (LÉVY, 2005, p.85)

Indagadas quanto ao uso que fazem das informações acessadas na tela, as estudantes apresentaram

respostas que redundaram na composição do seguinte gráfico:

A predominância do recurso de transposição do suporte eletrônico para o papel (anotações em papel

– 18%; impressão para leitura detalhada – 46%) revela a presença inconteste e flagrante dos efeitos

da cultura gutenberguiana31

que, não raro, sobrepõe-se ao registro digital. O comentário de uma das

respondentes sintetiza bem o fenômeno em questão: “tenho um pouco de dificuldade de ler na tela

do computador”. Essa situação se deve, dentre outros, tanto ao caráter de incipiência das novas

30

Lévy compara a pilhagem na Internet com o vagar em uma imensa biblioteca-discoteca ilustrada, ressaltando a

facilidade de acesso e o caráter interativo potencializado pelo mundo digital, uma midiateca que “é povoada, mundial e

aumenta constantemente.” (LÉVY, 2005, p. 91) 31

A expressão é usada doravante para referir não só às práticas de leitura no meio impresso, imbricadas com a

materialidade do suporte, mas para aludir à carga simbólica que assumem para os leitores iniciados no mundo da

escrita, sob a égide da escola que privilegia a linguagem escrita (impressa) em detrimento das outras modalidades,

atribuindo-lhe maior confiabilidade se comparada à oralidade e ou ao audiovisual e ao hipertexto eletrônico, multimodal

e multimidiático.

Gráfico 11: Distribuição das entrevistadas quanto ao uso que fazem das informações

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tecnologias da informação e da comunicação e, por extensão, da cultura da escrita e leitura digital

(ou letramento digital); como ao caráter secular da cultura gutenberguiana, perpetuada pela escola

contemporânea, em que a palavra escrita (e impressa) sobrepõe-se à oralidade e ao audiovisual em

sentido amplo, assumindo suposta superioridade quanto à confiabilidade em relação às demais

modalidades de linguagem. Silva (2002) faz referência ao fenômeno quando assevera que:

O caráter livresco do ensino e as formas autoritárias através das quais os livros são

apresentados em sala de aula tendem a contribuir para a docilização dos estudantes,

gerando a falsa crença de que tudo que está escrito ou impresso é necessariamente

verdadeiro. (SILVA, 2002, p. 3)

4.2.6. Validação: confiabilidade e verificação da (im)procedência das informações

Questionadas sobre a confiabilidade das informações acessadas no espaço virtual, as respondentes,

num total de 73%, afirmaram que consideram os dados “muito confiáveis”, enquanto apenas 27%

os consideram “pouco confiáveis”. A opção “não confiáveis” não foi assinalada por nenhuma das

respondentes.

Das que consideram as informações “muito confiáveis”, as justificativas passam pela confiabilidade

dos sítios de pesquisa: “Acredito que por fazerem parte de um site tão idôneo é difícil ter

informações fraudulentas”; “Já tenho os sites de minha confiança, portanto nunca tive problemas

com a autenticidade das informações”. Contemplam ainda a “recomendação” das fontes: “Os sites

que eu procuro são sempre recomendados, ou são aqueles que já estou acostumada a acessar”.

Já aquelas que consideram as informações “pouco confiáveis”, reconhecem a vulnerabilidade de

alguns sítios: “Muitas informações que circulam na Internet as vezes, não são checadas pelas

Gráfico 12: Distribuição das entrevistadas quanto à confiança dos sítios

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pessoas que as soltam quanto à sua veracidade. Por isso, procuro sites mais conhecidos, com

nome”. Além disso, tentam ainda alguma forma de checagem e ou validação das informações:

“Sempre procuro saber a respeito do autor, de qual instituição faz parte, o nível de formação e se é

ou foi autor utilizado no decorrer do curso por nossos professores.”

Indagadas se procuram validar as informações acessadas ou se julgam desnecessário, 18%

responderam que consideram desnecessário; 18% afirmaram não buscar a validação “por não dispor

de tempo para verificação” e 9% não responderam. Todavia, a maioria das respondentes, num total

de 55% afirmaram buscar a validação, ainda que, para a maioria, os sítios em geral sejam muito

confiáveis (gráfico 12). As estudantes buscam validar as informações, dentre outros, através dos

professores ou por meio de livros “porque os autores são mais confiáveis.” Nesse contexto,

evidencia-se, novamente, a situação do professor, na perspectiva do aluno, como o detentor do saber

e ainda a prevalência da cultura gutenberguiana, que vê, no texto impresso (dos livros) maior

confiabilidade.

4.2.7. Produção de sentido: da informação ao conhecimento

No que se refere à produção de sentido, 100% das entrevistadas responderam que, uma vez

localizada a informação de interesse, “copiam e colam trechos, acrescentando seu próprio texto,

mas citam a fonte”. A conduta sugere, a priori, que as respondentes estabelecem relação dialógica

com as fontes de informação, assumindo, para além da condição de leitoras, convencionalmente

Gráfico 13: Distribuição das entrevistadas quanto à busca de validação das informações

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associada à mera recepção do (hiper)texto, a posição de (co)autoras do texto, portanto de sujeito de

sua construção cognitiva. Essa perspectiva se faria presente não só na articulação final de seu texto

com as informações hipertextuais coletadas (e registradas com identificação da fonte, da autoria),

mas, antes, na seleção dos conteúdos relevantes face os seus objetivos.

Ao comentar essa prática, declarada como usual por 100% das entrevistadas, fizeram as

considerações a seguir:

Respondente Comentário

R1 Acredito que assim eu posso utilizar as boas ideias colocando minhas impressões

pessoais também.

R2 Sempre gosto de dialogar com os autores pois assim coloco meu ponto de vista,

mas quando acho necessário coloco uma citação.

R3 Algumas vezes é preciso colocar trechos de outros trabalhos. Acredito que é

enriquecedor.

R4 Ao copiar e colar algum trecho e acrescentá-lo ao meu texto procuro citar a fonte

para não representar um plágio e sim uma citação.

R5 Sempre coloco a fonte, até porque não sou eu quem está dizendo, estou

concordando com o que está escrito e utilizando para embasar minha opinião /

pensamento / tema de pesquisa.

R6 Não é errado utilizar pequenos trechos para incrementar um trabalho que eu estou

desenvolvendo, desde que eu cite a fonte.

R7 É necessário citar a fonte e acrescentar o meu próprio texto para que meu trabalho

seja válido para o professor e para que possa compreender o que está escrito.

R8 As “regras” da escrita acadêmica permitem fazer uso das “falas” do autor, mas

procuro sempre esclarecer que a idéia não partiu de mim.

R9 Cito a fonte porque o trecho em questão não foi elaborado por mim, mesmo

fazendo parte de um trabalho meu.

R10 Às vezes a idéia presente em algum texto é boa e não tem como transformar essa

idéia com a nossa própria interpretação; nesses casos copio e colo o trecho de

acordo com as normas da ABNT.

R11 Não fez comentário.

Os comentários tornam perceptível a relação dialógica que as ciberleitoras estabelecem com o

hipertexto, incorporando citações aos seus textos, com a devida preservação da autoria, mas sem

renunciar ao seu papel autoral no processo de cognição. É o contexto em que o conteúdo da

mensagem não se insere no campo da emissão, nem da recepção; situa-se, antes, no campo da

comutação, já que, segundo Lévy (2007a, p. 46), leitura e escritura no ambiente hipertextual trocam

seus papéis e quem participa das possíveis dobras do sentido já é um leitor, assim como quem

atualiza um percurso, nos seus acessos, escolhas e decisões, empreende a contínua escritura.

Todavia, quando indagadas sobre como a maioria das colegas utilizam o hipertexto eletrônico, as

estudantes apresentaram respostas que identificavam a prática de copiar e colar informações,

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citando a fonte (18%); copiar e colar conforme os objetivos da pesquisa (18%) e copiar e colar

trechos, acrescentando seu próprio texto, sem citar a fonte (18%) e, por fim, de forma

preponderante (46%), apontaram a percepção de que a prática que se dá entre as colegas é copiar e

colar trechos, acrescentando seu próprio texto, mas citando a fonte. Não obstante a discrepância

entre os resultados para a mesma questão, quando o sujeito a ela relacionado é diverso; prevalece a

percepção de que a leitura hipertextual é dialógica, que o leitor é também autor.

4.2.8. Ordem de importância dos meios / suportes para as pesquisas acadêmicas

Perguntadas quanto à ordem de importância dos suportes/fontes para seus estudos/pesquisas

acadêmicas, as estudantes, num total de 73% apontaram o livro impresso como fonte primeira para

estudos e pesquisas acadêmicas. Revistas e periódicos em geral ocupam o segundo lugar em

relevância na vida acadêmica de 55% das entrevistadas. Subsequentemente, apresenta-se a Internet,

apontada como terceira fonte para estudos e pesquisas por 55% das entrevistadas, seguida de

apostilas e outros suportes ou fontes.

Em seus comentários, as estudantes deixam entrever alguns aspectos relevantes a observar:

(R2) “Sempre vou primeiro nos livros e ou materiais impressos (imprimo muitos textos da

internet), mas dou sempre uma olhadinha na internet, até mesmo para buscar materiais.” Do

comentário em apreço, vale destacar a prevalência da cultura gutenberguiana e o caráter

secundário da Internet, em que se dá sempre uma “olhadinha”...

(R10) “Acredito que a fonte mais “confiável” para pesquisas são os impressos (livros, revistas e

periódicos) além de proporcionar o contato direto. Sendo também estas fontes que trazem

mais informações sobre os autores.” A visão gutenberguiana, que atribui caráter “mais

confiável” aos impressos, revela-se também na sensação de “contato direto” e na suposta

segurança da materialidade do suporte, que traria “mais informações sobre os autores.” Esse

ponto de vista ignora que, no ambiente virtual, por força do volume de informações

hipertextualizadas, os dados sobre o autor poderiam ser mais numerosas do que aquelas que,

via de regra, acham-se no livro impresso, o qual traz, na sua perigrafia, dados biográficos do

autor, nas orelhas, prefácios, rodapés e outros.

(R3) “Busco utilizar livros por me possibilitarem conhecer a teoria de um determinado autor com

mais profundidade.” Novamente, sob a égide da lógica gutenberguiana, ao livro impresso se

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atribui “mais profundidade”, sem que seja considerado que, no ambiente virtual, multimodal

e hipermidiático, é possível acessar muitos dos livros impressos, ali digitalizados, acrescidos

de links capazes de ampliar as informações, de forma imediata e célere, por acesso a

resenhas, artigos e obras correlatas, palestras e fóruns temáticos, dentre outros, em que

sejam tratados temas afins.

(R6) “Apesar da facilidade de acesso a textos acadêmicos e até mesmo livros na internet, manusear

o livro, passar as páginas é algo que a internet não pode propiciar.” Dessa assertiva, tem-se o

apego à materialidade do suporte gutenberguiano, que nem o recurso à simulação, na seara

digital, a “virada de página” parece poder substituir.

(R9) “Acredito que os livros sejam de suma importância para minha formação e a internet serve

como suporte.” O depoimento coloca de forma inequívoca o hipertexto eletrônico (ou a

internet) como fonte secundária, um “suporte” na vida acadêmica.

(R7) “Geralmente procuro utilizar mais os livros, depois a internet (a qual uso para acessar

periódicos).” Igualmente o hipertexto é colocado em segundo plano, já que a prioridade são

os livros, “depois a internet”.

Afora os depoimentos apresentados, dois comentários, embora não situem o livro impresso como

fonte primeira de estudo e pesquisa na vida acadêmica, destacam “a facilidade de utilização” da

Internet, ou a falta de hábito de leitura do “livro todo”:

(R1) “A internet é mais importante por causa da facilidade de utilização pois você encontra um

título em menos de 10 segundos, coisa que com livro demoraria mais de uma hora.”

(R5) “Leio muito texto retirado dos livros, mas o livro todo em si (manuseando-o) não leio muito.”

Apenas três entrevistadas não fizeram comentários quanto à ordem de importância dos

suportes/fontes para seus estudos/pesquisas acadêmicas.

4.2.9. Importância do hipertexto eletrônico na vida acadêmica

Por fim, questionadas sobre o hipertexto (eletrônico) na sua vida acadêmica, as respondentes o

situaram nos seguintes termos:

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Respondente Resposta

R1 É de fundamental importância pois me ajuda a customizar o meu tempo para

realizar os trabalhos (...) Além disso posso acessar de qualquer lugar e hora.

R2 Acredito que a tecnologia do hipertexto é interessante e se souber utilizá-lo é um

ambiente repleto de textos, de informações que sem dúvida alguma favorecem para

a formação acadêmica. No meu caso uso muito (...) para buscar textos, porém

sempre imprimo, pois ainda tenho dificuldade de leitura na tela.

R3 De grande importância. Como tenho pouco material impresso utilizo mais a

Internet que me dá acesso a tudo.

R4 Ele [o hipertexto] facilita a busca das informações que eu preciso para a realização

da minha pesquisa.

R5 O hipertexto eletrônico é algo de muita importância na minha vida acadêmica.

Através dele obtenho várias informações (boas e ruins, por isso é necessário filtrar)

sobre pesquisas e trabalhos acadêmicos e tenho acesso a muitos artigos e até

mesmo livros. Não acho que a Internet possa substituir o livro e o seu manuseio,

mas por estar na internet e esta ser um meio mais barato, o livro pode estar ficando

em segundo plano na vida dos acadêmicos.

R6 Uso muito a internet e acho que é uma excelente ferramenta para estudo, além de

ser (no meu caso) de fácil acesso, possibilita ter várias informações em um só local

(veículo).

R7 É muito importante pois é de fácil acesso para mim (mesmo em casa eu posso

acessar). Me economiza tempo em bibliotecas e compra de livros.

R8 O hipertexto é de grande importância, mas não é a principal fonte de informações.

R9 A internet de modo geral tem uma importância bem significativa na vida

acadêmica, a facilidade e a diversidade de conteúdos que encontramos de certo

modo gera uma “comodidade” que nem sempre pode ser considerada como

benéfica, pois às vezes o seu uso extrapola a pesquisa e configura simplesmente em

plágio.

R10 O hipertexto tem um papel significativo na minha vida acadêmica, pois possibilita-

me ter acesso a uma gama de assuntos em pouco tempo.

R11 Não respondeu.

Dos diversos depoimentos, tem-se recorrentemente destacada a facilidade de acesso e a

racionalização do tempo dispensado à busca de informações, uma vez que “ajuda a customizar o

meu tempo” e “posso acessar de qualquer lugar e hora”; “facilita a busca de informações”;

“possibilita ter várias informações num só local (veículo)”; “me economiza tempo em bibliotecas e

compra de livros”; apresenta facilidade e diversidade que “gera uma comodidade” etc.

Destaca-se ainda o volume e diversidade de informações disponíveis, já que “é um ambiente repleto

de textos, de informações”; “me dá acesso a tudo”; “tenho acesso a muitos artigos e até mesmo

livros”; “acesso a uma gama de assuntos em pouco tempo” etc.

Por outro lado, manifesta-se certa reserva quanto a essa fonte de informação, que é vista como

sendo “de grande importância, mas não é a principal fonte de informações”; traz comodidade “que

nem sempre pode ser considerada benéfica, pois as vezes o seu uso extrapola a pesquisa e configura

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simplesmente plágio” e que, embora sendo o hipertexto eletrônico “algo de muita importância (...)

não acho que a Internet possa substituir o livro e seu manuseio.”

A estudantes reconhecem a importância do hipertexto em sua vida acadêmica em virtude da

facilidade de acesso, pela economia de tempo e em função da diversidade de informações, mas

situam-no como opção secundária, que “não é a principal fonte de informações”, já que não se crê

“que a Internet possa substituir o livro e seu manuseio”.

Dos resultados alcançados, é possível então constatar que, no seu conjunto, as estudantes têm

suficiente acesso e disponibilidade de recursos de informática (Gráficos 2 e 4), assim como

conhecimentos importantes para uso do hipertexto eletrônico (Gráfico 3). Ademais, utilizam o

hipertexto com significativa frequência no seu dia a dia (Gráfico 5), com intencionalidade

predominantemente acadêmica (Gráfico 7) e conhecimento de fontes pertinentes (Gráfico 8).

Revelam proficiência na leitura hipertextual que possibilita situá-las, à luz dos estudos de Santaella

(2007a), entre os leitores imersivos de perfil leigo e experto, já que acessam com muita frequência a

rede (Gráficos 5 e 6) e assumem comportamento que transita entre o que é próprio dos navegadores

detetives e previdentes, que dependem menos da heurística que o leitor novato.

Vale destacar que pesquisas afins, realizadas em outros contextos, auferiram resultados análogos

aos que se apresentam no presente trabalho. É o que se constata, por exemplo, nos estudos de

Andalécio (2004), que, empreendendo pesquisa acerca do uso dos recursos de informática no

desenvolvimento da pesquisa em Ciências Sociais, constata: “A suposição inicial de que a não

utilização de determinadas ferramentas de tecnologia da informação e da comunicação se deveria à

ausência de competências no seu uso não se confirmou, pois os relatos mostraram um certo

pragmatismo nessa questão.” (ANDALÉCIO, 2004, p. 102).

Igualmente, Maia (2007), realizando investigação sobre o uso das ferramentas de informática por

professores da educação básica de escolas públicas e privadas nos municípios de Divinópolis-MG e

Itaúna-MG, observa, com relação aos docentes que: “Muitos deles utilizam de seus próprios

recursos financeiros e materiais para produzir e levar conteúdos em mídias alternativas, com ênfase

nas mídias da tecnologia que fazem brilhar os olhos dos alunos e que estes ficam desejosos para as

próximas aulas.” (MAIA, 2007, p. 121) E acrescenta: “Conclui-se que a hipótese de que há grande

resistência por parte dos docentes na utilização da Informática, principalmente na sala de aula, por

falta de conhecimento e receio dos impactos das transformações que a tecnologia pode produzir na

relação professor/aluno, não se confirmou.” (MAIA, 2007, p.122)

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Diniz e Olinto (2006), por sua vez, numa pesquisa por meio de estudo de caso junto a universitários

do curso de Administração em escolas privadas do Rio de Janeiro no tocante ao uso das tecnologias

da informação por aquele público, constata:

Apesar de os alunos demonstrem pouco conhecimento de alguns tipos de software, como de

banco de dados e de apresentação, os dados obtidos sobre a competência em TI

surpreendem positivamente, pois os alunos focalizados – alunos que estão finalizando a

graduação em Administração de duas escolas privadas do Rio de Janeiro - demonstram ter

acesso a softwares considerados básicos e, mesmo, já revelam hábitos regulares relativos ao

uso do computador e da Internet. Parece haver também uma consciência clara, entre os

alunos, da importância da TI para as suas perspectivas profissionais, o que talvez explique a

postura por demanda de mais acesso a essas tecnologias nos seus cursos de graduação,

apesar de considerarem que os professores as utilizam bastante. (DINIZ; OLINTO, 2006,

p.8)

Os resultados das pesquisas mencionadas, consonantes com aqueles que atingimos na presente

investigação explicam-se, em parte, pela ampla e célere disseminação das tecnologias da

informação e da comunicação nas diversas sociedades, se comparadas a outras tecnologias como a

própria escrita impressa. Explicam-se ainda pelo perfil socioeconômico e cultural dos sujeitos da

pesquisa.

Por outro lado, há expressiva marca da ordem cartesiana a orientar os valores e a conduta das

estudantes na relação com as informações em meio digital e com o conhecimento propriamente

dito. Assim, ainda que transitando com frequência e facilidade no ciberespaço, em contato com a

diversidade de informações e fontes, as entrevistadas recorrem ao professor para fim de validação

dos conteúdos acessados, sob a lógica da relação entre o professor que detém (e transmite) o saber e

o aluno que o recebe passivamente. Validam ainda os conteúdos, reportando-se aos livros, tomados,

na ótica gutenberguiana, como dotados de materialidade e confiabilidade que o meio digital não

ofereceria.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo realizado possibilitou evidenciar que a cena contemporânea comporta e demanda outro

olhar sobre o conhecimento e sobre as relações que se devem estabelecer para sua produção e

difusão, sobretudo se se tiver presente que os efeitos das tecnologias da informação e da

comunicação reorientam os marcos espaciais e temporais, assim como a (ciber)cultura que em seu

bojo se processa.

A linguagem, que constitui marca distintiva da humanidade em relação aos demais seres vivos, dá-

se num continuum, em que as mudanças historicamente perpetradas não instauram um movimento

de ruptura definitiva e absoluta para com os paradigmas e práticas, os quais, antes, coexistem e

modificam-se dialeticamente.

O estudo possibilita também identificar o hipertexto como um complexo que não se opõe, a priori,

ao texto convencional. Diferentemente disso guarda com este imbricadas relações que revelam a

lógica textual como anterior à concepção do hipertexto eletrônico, portadora dos muitos traços

dialógicos e abertos à ressignificação, que extrapola a mera emissão ou recepção da mensagem.

Nesse cenário, as práticas de comunicação e, em particular, de leitura, reorientam-se, sem contudo,

prescindir de habilidades e competências que historicamente se consolidaram. Todavia, a desejada

exploração do hipertexto, com muitas das suas potencialidades, para fim de construção do

conhecimento na seara da graduação, requer mais que a instrumentalização dos estudantes para

operar o computador, estabelecer interfaces e interações, reformular conceitos e valores. Demanda,

em última análise, a potencialização de antigas habilidades e competências e o desenvolvimento de

outras tantas, para reorientar posicionamentos imbricados com ações de acesso, categorização,

seleção, validação e ressignificação das informações disponíveis, de forma a otimizar o uso e

exploração das possibilidades hipertextuais.

Não se pode olvidar que as tecnologias da informação e da comunicação incorporam-se

paulatinamente ao cotidiano das pessoas, nos mais variados contextos e com as mais diversas

funções, ensejando e demandando outros comportamentos e relações sob a égide de uma outra

cultura, a cibercultura. Por extensão, no cenário hipertextual que se tem, veem-se em xeque relações

historicamente sedimentadas que, não raro, marcavam de forma mais rígida a posição de autor e

leitor no processo de produção e leitura textual; assim como as dicotômicas relações entre saber

científico e popular, entre ensino e aprendizagem etc.

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Tais relações inevitavelmente se manifestam nos ambientes formais de educação, nos quais os

atores do processo ensino-aprendizagem revelam-se portadores de saberes, bem como sujeitos de

práticas que a escola, nos seus diversos níveis, não pode ignorar. Assim é que, no âmbito da

educação superior, faz-se necessário repensar o fazer pedagógico e a própria relação com a

produção e difusão do conhecimento.

Há de se ter presente que aos atores competem papéis diferentes dos que historicamente se

consolidaram. Para além da pretensa posição de detentor do saber, ao professor compete assumir-se

como mediador do processo ensino-aprendizagem, reconhecendo no aluno o sujeito cognoscente,

que, no ambiente ciberespacial, tem de exercitar a autonomia intelectual e a capacidade de

interlocução nos mais variados níveis. Ao aluno, nesse diapasão, reserva-se o papel de sujeito que,

constituído e constituinte da sociedade da informação e do conhecimento, vê-se ante o mister de

estabelecer interações no cenário da inteligência coletiva, transitando no ambiente em que se

instauram outras ecologias cognitivas.

Especificamente em relação ao uso do hipertexto para fim de construção de conhecimento no

âmbito da formação universitária na contemporaneidade, a pesquisa realizada possibilitou a

confirmação parcial da hipótese levantada, qual seja a de que há subutilização do hipertexto no

âmbito da graduação.

As razões, entretanto, não se traduzem precisamente no que se consignou como hipótese. Em outras

palavras, a subutilização do hipertexto eletrônico não se dá propriamente em virtude da incipiência

das tecnologias da informação e do conhecimento na sociedade e na vida das estudantes, que

limitaria o domínio instrumental, nem da linearidade da leitura, que antecederia a lógica

hipertextual no meio digital. Diferentemente disso, vê-se comprometida com conceitos e valores

próprios da cultura gutenberguiana. Nesse sentido, a incipiência das tecnologias da informação e da

comunicação não compromete os sujeitos da pesquisa quanto ao acesso aos recursos de informática

e quanto ao uso dos softwares, não comprometendo, em última análise, a proficiência na prática da

leitura hipertextual. Quanto à referida prática, aliás, merece relevo o fato de que as estudantes

revelam maturidade como sujeitos cognoscentes, não se limitando a reproduzir informações do

meio digital; diferentemente disso, estabelecem interlocução com as fontes, assumindo o papel

híbrido do leitor-autor, que o hipertexto eletrônico enseja com mais ênfase que o texto

gutenberguiano.

Por outro lado, a lógica cartesiana, marca da era moderna, que se faz expressivamente presente nos

ambientes formais da educação nos diversos níveis, na contemporaneidade, é forte condicionante

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quanto a orientar a relação que as estudantes estabelecem com o ciberespaço e, em seu âmbito, com

o hipertexto eletrônico.

Assim, diante da multiplicidade de informações e fontes disponíveis na rede, embora os acessos se

deem preponderantemente por interesse acadêmico, determinando a busca prioritária por sítios

como o Scielo, Google Acadêmico e Google, as estudantes buscam a validação das informações

pela consulta ao professor, possivelmente situado na condição de detentor do saber, na dicotômica

relação da escola tradicional. Fazem-no ainda a partir do recurso a fontes impressas, em particular

aos livros, tidos como mais confiáveis, numa expressão de apego à cultura gutenberguiana.

Ademais, a despeito da facilidade de acesso e navegação que experimentam no ciberespaço, bem

como do reconhecimento do volume e diversidade de informações disponíveis nesse ambiente, as

estudantes situam o livro impresso como sua fonte primeira de estudos e pesquisas; em seguida

apontam as revistas e periódicos, para, subsequentemente, identificarem o hipertexto eletrônico

como alternativa para a construção do conhecimento na sua vida universitária.

Dentre outras razões, como já examinado no corpo do presente trabalho, o hipertexto eletrônico

tende a ser preterido por força da materialidade do texto gutenberguiano e da suposta superioridade

em relação à informação disponível no meio digital, o que se traduz de forma emblemática no

depoimento de uma dos respondentes: “Acredito que a fonte mais „confiável‟ para pesquisas são os

impressos (livros, revistas e periódicos) além de proporcionar o contato direto. Sendo também estas

fontes que trazem mais informações sobre os autores.”

Em suma a prevalência da cultura gutenberguiana faz com que se dê o apego à materialidade do

texto impresso, bem como o estabelecimento de maior relação de confiança com o suporte material

(livros, revistas e periódicos em geral), em detrimento das possibilidades do hipertexto eletrônico.

Aliado a isso, e em consequência, os mecanismos de validação das informações hipertextuais, a

qual se poderia dar, dentre outros, pelo cotejamento de diferentes fontes, mais rápidas e múltiplas

no ciberespaço, reduz-se a consulta ao professor e ao livro impresso, tidos como mais confiáveis,

sob a égide cartesiana, que situa, numa relação dicotômica, professor e aluno, ensino e

aprendizagem, dentre outros.

Destaque-se, por fim, que o reconhecimento da subutilização do hipertexto a partir de sua

secundarização em relação ao texto impresso não se dá sob a premissa de que aquele se deveria

sobrepor a este em virtude da celeridade, acessibilidade, volume e diversidade das informações. O

presente estudo não se constitui na apologia de que as novas tecnologias da informação e da

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comunicação devem-se fazer hegemônicas em relação à tecnologia gutenberguiana ou a quaisquer

outras, as quais, entendemos, podem (e devem) coexistir, completando-se e ressignificando-se.

Afinal, comungamos com Lévy, que assevera:

Em geral é um erro pensar as relações entre antigos e novos dispositivos de comunicação

em termos de substituição. (...) O cinema não eliminou o teatro, deslocou-o. As pessoas

continuam falando-se após a escrita, mas de outra forma. As cartas de amor não impedem

os amantes de se beijar. As pessoas que mais se comunicam via telefone são também

aquelas que mais encontram outras pessoas. (LÉVY, 2005, p.129)

Por fim, a presente investigação, mais que responder a pergunta-problema fixada quanto ao lugar

das novas tecnologias na formação universitária ou quanto ao hipertexto na construção do

conhecimento, vem suscitar outras indagações, dentre elas sobre as políticas públicas para a

educação superior, sobre a apropriação das tecnologias da informação e da comunicação na cena

contemporânea, em particular no contexto da educação formal no contexto universitário, e acerca

das relações que se haverão de estabelecer com o conhecimento nos mais diversos níveis e

ambientes, tendo em vista o fenômeno da cibercultura. A exploração dos resultados do presente

estudo, bem como a apropriação de uma ou mais indagações que o trabalho suscita constituem, no

entanto, objetos de tomada de decisão do leitor-autor, que, mais uma vez, vê-se diante do desafio

hipertextual de navegar nas dobras de sentido, elegendo rotas e apropriando informações para a

produção de novos conhecimentos.

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APÊNDICE A

Questionário aplicado

QUESTIONÁRIO

RESPONDENTE n° ( ) Data: / / 2009

INTRODUÇÃO

Este questionário tem como objetivo colher subsídios para minha pesquisa de mestrado, que tem

por objeto O lugar das novas tecnologias na formação universitária ou o hipertexto na construção

do conhecimento. Sua contribuição é muito importante.

PERFIL

Idade: Sexo:

Ingresso na UFMG: ( ) vestibular ( ) transferência

( ) obtenção de novo título ( ) outros Especificar: __________________

________________________________________________________________________________

1) Atualmente, você: ( ) estuda ( ) estuda e é bolsista na UFMG ( ) estuda e trabalha

2) Tem PC em casa? ( ) sim ( ) não Em caso afirmativo, há quanto tempo? _________

3) Tem conhecimentos de informática? ( ) sim ( ) não

Em caso afirmativo, tem conhecimento e faz uso de :

( ) editor de texto ( ) planilhas ( ) navegação (Internet) ( )outros Citar: ____________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

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ACESSO

4) Usa computador (com Internet):

( ) em casa ( ) na Universidade, laboratório de informática ( ) no trabalho

( ) na lan house ( ) outros

5) Em qual desses ambientes seu uso é mais freqüente? __________________________________

FREQUENCIA

6) Se você usa computador com Internet, seu uso se dá:

( ) todos os dias ( ) até 5 vezes por semana ( ) até 3 vezes por semana

( ) nos fins de semana ( ) raramente

7) Em geral, você usa o computador com Internet, a cada acesso:

( ) por até 15 min ( ) por meia hora ( ) entre uma e duas horas

( ) entre duas e três horas ( ) entre três e quatro horas ( ) muitas horas a cada acesso

Comente: ________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

INTENCIONALIDADE

8) Em geral, você usa o computador com Internet para: (numere conforme a ordem de importância)

( ) pesquisas pessoais na rede

( ) atividade profissional

( ) trabalhos acadêmicas

( ) leitura e ou estudo de iniciativa própria para ampliação de conhecimentos que contribuam para

a formação universitária

( ) bate-papo (chats), blogs, entretenimento

( ) compras

( ) outros

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APROPRIAÇÃO

9) Se você usa a Internet para trabalhos acadêmicos e ou leituras e estudo para ampliação de

conhecimentos de interesse para a formação universitária, assinale os sítios de pesquisa que

você utiliza:

( ) Google

( ) Google Acadêmico

( ) Yahoo

( ) Youtube

( ) Capes

( ) CNPQ

( ) Anped

( ) Wikipédia

( ) Domínio público

( ) Scielo

( ) UFMG ( ) Outros

Especificar:

_____________________________________________________________________________

_____________________________________________________________________________

_____________________________________________________________________________

10) Dos sítios apontados, quais são os 3 mais utilizados por você paras pesquisas acadêmicas?

_____________________________________________________________________________

_____________________________________________________________________________

_____________________________________________________________________________

11) Por que você utiliza com mais freqüência os sítios apontados? (facilidade de acesso, porque

dispensa cadastro e senha (login)? facilidade de navegação, pela forma como as informações

estão dispostas? conhecimento prévio da natureza de seus conteúdos? indicação de professores

de seu curso? indicação de colegas? Outros.)

Justifique:

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

_______________________________________________________________________

LEITURA HIPERTEXTUAL (CATEGORIZAÇÃO / CONCENTRAÇÃO / USOS)

12) Você seleciona os temas de seu interesse na Internet (marque a ordem de importância):

( ) por assunto ( ) por autor ( ) por instituição ( ) outros: Especificar:

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:_______________________________________________________________________________

13) Durante o seu acesso, você:

( ) nunca se desvia do foco de sua pesquisa

( ) às vezes se desvia do foco de sua pesquisa, atraído (a) por um ou mais links

( ) muitas vezes se desvia do foco de sua pesquisa, atraído (a) por um ou mais links

( ) sempre se desvia do foco de sua pesquisa, atraído (a) por um ou mais links

14) Se você assinalou que se desvia “às vezes”, “muitas vezes” ou “sempre”, pode afirmar que isso:

( ) é positivo, porque _____________________________________________________________

________________________________________________________________________________

( ) é negativo, porque _____________________________________________________________

________________________________________________________________________________

( ) outros. Justifique ______________________________________________________________

________________________________________________________________________________

15) Em geral, para fazer a leitura de hipertextos (textos e imagens com links, animações e ou sons),

você:

( ) faz a leitura na tela e salva trechos de seu interesse em arquivo à parte

( ) faz leitura na tela e salva links nos seus “favoritos”

( ) faz leitura na tela e anotações em papel

( ) imprime os arquivos e depois faz leitura detalhada

( ) outros ______________________________________________________________________

VALIDAÇÃO

16) Você considera as informações encontradas:

( ) muito confiáveis ( ) pouco confiáveis ( ) não confiáveis

Justifique sua resposta:_____________________________________________________________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

17) Você busca validar as informações encontradas (verificar sua procedência) ou considera

desnecessário? Em caso afirmativo, como você valida as informações? Justifique .

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________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

PRODUÇÃO DE SENTIDO

18) Para atender as necessidades de suas pesquisas para fim de trabalho acadêmico, você:

( ) Copia e cola as informações, sem citar a fonte

( ) Copia e cola as informações, mas cita a fonte

( ) Copia e cola trechos, organizados conforme os objetivos de sua pesquisa

( ) Copia e cola trechos, acrescentando seu próprio texto, sem citar a fonte.

( ) Copia e cola trechos, acrescentando seu próprio texto, mas cita a fonte.

( ) Nunca copia, usando apenas os conteúdos para fazer seu próprio texto

Comente sua conduta: ____________________________________________________________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

19) Na sua opinião, como a maioria dos colegas de curso utilizam o hipertexto eletrônico?

( ) Copiam e colam as informações, sem citar a fonte

( ) Copiam e colam as informações, mas citam a fonte

( ) Copiam e colam trechos, organizados conforme os objetivos de sua pesquisa

( ) Copiam e colam trechos, acrescentando seu próprio texto, sem citar a fonte.

( ) Copiam e colam trechos, acrescentando seu próprio texto, mas cita a fonte.

( ) Nunca copiam, usando apenas os conteúdos para fazer seu próprio texto

20) Numere os parênteses, considerando a ordem de importância dos suportes/fontes para seus

estudos/pesquisas acadêmicas:

( ) apostilas ( ) Internet ( ) livros

( ) revistas e periódicos impressos em geral ( ) outros

Comente ________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

21) Qual a importância do uso do hipertexto eletrônico (Internet) na sua vida acadêmica? Justifique.

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________

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APÊNDICE B

População-alvo da pesquisa: estudantes de graduação do curso de Pedagogia – Formação

Complementar em Alfabetização, leitura e escrita – Ingresso no 1º semestre de 2006

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO SETOR ACADÊMICO - (0xx31) 3499-4056/3499-4057 FAX: (0xx31) 3499-4060

E-mail: [email protected]

Relação* alunos do curso de graduação em PEDAGOGIA Formação Complementar em Alfabetização, Leitura e Escrita

1. ANA PAULA DE SOUZA

2. ANA PAULA PEDERSOLI PEREIRA

3. HALLEY ESCARLET ALMEIDA

4. INGRETT DA SILVA CAMPOS

5. KARINA MARCIA RODRIGUES ALVES BRAZ

6. LETICIA CRISTINA FERRAZ GIOVANNINI

7. LILIANE BARCELOS SILVA MELO

8. MARIA JOVITA BRAGA GONCALVES

9. PAULA KELLY DE FREITAS MENEZES

10. ROSANA ODETTE DA SILVA

11. SHIRLEY SENA DUTRA

12. SIMONE ALVES DA SILVA

13. ANTONIA MARIA GERALDO TEIXEIRA

*Obtida em 11 de março de 2008, na Pró-Reitoria de Graduação – PROGRAD /UFMG

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APÊNDICE C

Autorização da Coordenadora

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APÊNDICE D

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Comitê de Ética em Pesquisa da FUNEDI-UEMG

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (Em duas vias, sendo uma para o sujeito da pesquisa)

Eu, ____________________________________________________________________,

do sexo __________________________________ ,de _________ anos de idade, residente na

_________________________________________________________________________,

declaro ter sido informado e estar devidamente esclarecido sobre os objetivos e intenções deste

estudo, sobre as técnicas (procedimentos) que serão adotados para esse fim. Recebi garantias de

total sigilo e de obter esclarecimentos sempre que o desejar. Sei que minha participação está isenta

de despesas. Concordo em participar voluntariamente deste estudo e sei que posso retirar meu

consentimento a qualquer momento, sem que tenha de assumir quaisquer ônus.

_________________________________________________________________________

Assinatura do sujeito de pesquisa ______/______/_______

__________________________________________________________________________

Assinatura da testemunha ______/______/______

Pesquisador responsável

Eu, Ricardo Viana Velloso, responsável pelo projeto O lugar das novas tecnologias na formação

universitária (ou o hipertexto na construção do conhecimento) declaro que obtive

espontaneamente o consentimento deste sujeito de pesquisa (ou do seu representante legal) para

realizar este estudo.

Assinatura___________________________________________ _______/______/_____

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Apêndice E

Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa da FUNEDI